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Para o estado voar alto

Parlamento lidera mobilização para impedir esvaziamento do Aeroporto Tom Jobim (Galeão)

DIVULGAÇÃO RIOGALEÃO

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TEXTO ROSAYNE MACEDO

Omovimento em defesa do Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão (GIG), liderado pela Alerj, mobilizou, nos últimos meses, autoridades, políticos de diversas correntes, entidades empresariais e ambientalistas. A preocupação é garantir que a concessão, prevista para 2023, e que deverá incluir o Aeroporto Santos Dumont (SDU), estabeleça uma operação complementar entre os dois terminais. A concorrência entre eles é avaliada pelo grupo como extremamente danosa ao desenvolvimento econômico do Estado do Rio de Janeiro.

Para o presidente da Alerj, deputado André Ceciliano (PT), a proposta inicialmente elaborada pelo Ministério da Infraestrutura (Minfra), por meio da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), põe em risco não apenas a competitividade logística do Galeão, principal porta de entrada dos voos internacionais, mas a sobrevivência de toda a cadeia produtiva industrial do estado. “Estão quebrando o Galeão, que chegou a gerar mais de 20 mil empregos, e hoje não passa de sete mil. É um crime transferir os voos do Galeão para aumentar a outorga no leilão do Santos Dumont. Quando a gente defende o Galeão, a gente defende todo o Estado do Rio de Janeiro, porque é o hub aéreo (centro de distribuição de voos) que vai fazer as interligações de outros aeroportos do Brasil inteiro. É imprescindível a união de forças para salvar o terminal”, afirma Ceciliano.

Aperda de relevância do Tom Jobim, que já ocorria antes da pandemia, levou a empresa de Singapura Changi, que controla a concessionária RioGaleão, a informar à Anac que anunciou desistência do negócio. O órgão negou pedido da empresa para rever o equilíbrio do conAEROPORTO INTERNACIONAL Tom Jobim recebeu, em 2012, mais de 17 mil passageiros e, em 2021, esse fluxo caiu para pouco mais de três mil pessoas

Para o estado VOAR ALTO

trato que, segundo a Changi, já somam R$ 7,5 bilhões de perdas com a redução do tráfego aéreo durante a pandemia. A notícia não poderia ser pior para a economia do Estado do Rio de Janeiro e para a imagem do Brasil. Na esteira dessa decisão, a empresa aérea Gol decidiu transferir parte dos seus voos do Galeão para o Santos Dumont.

“A decisão da companhia aérea, mesmo depois de aderir ao benefício da redução do ICMS do querosene de aviação aprovado pela Alerj, contribui fortemente para inviabilizar o Galeão. Principalmente, após o anúncio do grupo Changi de sair da operação, notícia péssima para quem quer investir no Brasil. Não há como abrir mão do terminal que tem a melhor infraestrutura para transporte de carga e passa-

RAFAEL WALLACE

DEPUTADOS e técnicos realizaram visita técnica ao Aeroporto do Galeão. Assessoria Fiscal da Alerj enviou estudo sobre o edital à Agência de Aviação

geiros. Isso é fruto de má vontade com o Rio. Uma perversidade da Anac, que está omissa na coordenação dos aeroportos”, lamenta Ceciliano.

Diante da saida da Changi, o Ministério da Infraestrutura decidiu adiar para 2023 a licitação que ocorreria este ano. A proposta agora é de que Galeão e Santos Dumont sejam leiloados em conjunto. O edital anterior vinha sofrendo críticas de políticos e representantes de setores empresariais, que chegaram a formar um grupo de trabalho - com a participação da Alerj, do Governo do Estado, da Prefeitura do Rio e representantes das empresas aéreas - para discutir a modelagem da concessão. O argumento contrário à proposta do Governo federal era de que o fluxo de passageiros do Rio não comporta dois aeroportos concorrendo por voos internacionais.

IMPACTO DA PANDEMIA NO SETOR O Galeão, que em 2012 chegou a ter um movimento de 17.294.761 passageiros/ano, em 2021, viu o fluxo cair para 3.094.280, contra 5.911.081 do Santos Dumont. O terminal da Ilha do Governador hoje tem menos passageiros que os aeroportos de Guarulhos, Brasília, Campinas, Congonhas, Recife, Confins, Salvador e Porto Alegre. Conta com apenas 23 conexões domésticas, contra 62 em Campinas, 61 em Guarulhos, 42 em Confins, 42 em Brasília, 40 em Congonhas, 39 em Porto Alegre, 36 em Recife, e 31 em Salvador. Estudo realizado pela Prefeitura do Rio demonstra que a falta de coordenação entre os aeroportos fez com que a cidade tivesse desempenho pior que a média nacional na retomada dos voos pós-pandemia. Em novembro de 2020, enquanto o país recuperou 60% da oferta de assentos existentes antes da chegada da covid-19, o Rio recuperou só 50%. No Santos Dumont, a retomada foi de 62%, enquanto no Galeão, de 33%. A redução do fluxo de passageiros afeta diretamente o transporte de cargas e a receita do aeroporto, com reflexo também na arrecadação de impostos pelo estado. Atualmente, 86% da carga aérea doméstica movimentada são transportadas pelo Aeroporto do Galeão, sendo boa parte dela levada na “barriga” de aviões comerciais.

A concessionária RioGaleão ressaltou que, quando assumiu o aeroporto, 30% da carga chegava por São Paulo, contribuindo para a arrecadação de ICMS de lá, e vinha de caminhão para o Rio. A redução do movimento ameaça a permanência de empresas que atuam no terminal. O Tom Jobim abriga, por exemplo, a GE Aviation Brasil (GE Celma), uma das mais conceituadas oficinas de aviação mecânica do mundo e uma das principais empregadoras do setor.

MODELO DE CONCESSÃO FOI CRITICADO A proposta inicial da 7ª Rodada de Licitações de Aeroportos incluía o Santos Dumont num pacote com os terminais de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, Montes Claros, Uberlândia e Uberaba, em Minas Gerais. Com a pressão contra o edital, a Anac resolveu leiloar o aeroporto do Centro em separado. O valor de lance inicial previsto era de, no mínimo, R$ 355 milhões, e o contrato de 30 anos. Uma nova proposta deve ser elaborada juntando Santos Dumont e Galeão. Pela proposta original do Minfra, que passou por consulta pública entre setembro e novembro, o SDU poderia ampliar seus voos domésticos - dos 10,1 milhões projetados para 2023 para 14,6 milhões previstos para 2052, prazo final da concessão. O ministério argumenta maior interesse dos passageiros em voar a partir do Santos Dumont. Mas opositores do modelo de concessão dizem que os números apresentados pela pasta não são tecnicamente factíveis e não dimensionam os impactos negativos da mudança sobre a economia do estado. Para o presidente da Alerj, o Governo Federal tem que ouvir não só passageiros e companhias aéreas, mas o estado, municípios e as forças produtivas. Para ele, é fundamental que

os dois aeroportos atuem de forma complementar: "Se o Santos Dumont puder operar voos regionais e internacionais, haverá uma concorrência que vai prejudicar o hub, a nossa conexão com os outros estados e com o resto do mundo, quebrando o Galeão.

A Assessoria Fiscal da Alerj elaborou nota técnica sobre a questão, propondo que os voos do SDU sejam limitados a um raio máximo de 500 km, fazendo conexão com demais capitais do Sudeste e mantendo a conexão direta com Brasília. Desta forma, evita-se a concorrência predatória. Para o deputado Luiz Paulo (PSD), o modelo proposto para o leilão do SDU é frágil e reflete uma “política arrecadatória da outorga” praticada nas concessões de aeroportos. “Representantes do Governo Federal desconhecem que o Rio está no Regime de Recuperação Fiscal e para cumpri-lo precisa de um Plano Estratégico de Desenvolvimento. A proposta do Governo Federal é arrecadatória, não pensa no estado, na capital e nos outros 91 municípios fluminenses. Agride o pacto federativo, desrespeita prefeitos municipais e governo do estado”, critica Luiz Paulo.

ENTIDADES TEMEM PREJUÍZO AO TRANSPORTE DE CARGA O senador Carlos Portinho (PL), que participou ativamente do debate, ressalta a importância do Galeão para o desenvolvimento estratégico do estado e da cidade do Rio. “A possibilidade, a se confirmar a saída do operador, de unir num mesmo bloco de concessão GIG e Santos Dumont (SDU) milita a favor do bom funcionamento do sistema multiaeroportos no Rio de Janeiro. Isso facilitará a discussão e a operação dos equipamentos de forma harmônica e complementar, geridos por um mesmo concessionário”, disse. Um estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) aponta que a coordenação operacional entre os dois aeroportos elevaria em 0,6% o PIB estadual, o equivalente a R$ 4,5 bilhões. Segundo a entidade, SDU e GIG constituem um sistema multiaeroportos, atendendo a uma mesma região - a Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Atualmente, uma série de destinos já são servidos a partir do SDU e do GIG, prejudicando a conectividade do aeroporto internacional. Ainda de acordo com o estudo, a competição desenfreada entre os aeroportos ocasiona perdas profunALERJ SUGERE QUE ESTADO ASSUMA A LICITAÇÃO A Alerj enviou à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e ao Tribunal de Contas da União (TCU) documento solicitando que a concessão do Santos Dumont seja realizada pelo Governo do Estado, como ocorreu com o terminal de Pampulha, em Minas Gerais. Uma comitiva do Parlamento fluminense - representada pelo presidente Ceciliano, o deputado Luiz Paulo (PSD), o diretor-geral, engenheiro Wagner Victer, e o diretor-presidente da Assessoria Fiscal, economista Mauro Osório - realizou visita técnica ao GIG, em novembro.

“O Santos Dumont concentra, atualmente, mais que o triplo do número de voos do Galeão e as consequências têm sido nefastas para a economia fluminense. Não só com o fechamento de terminais do Galeão como pelo fim do sistema de hub, prejudicando atividades voltadas à própria geração de empregos no tradicional conceito de “Aeroporto Indústria”, destaca Victer. O diretor da Alerj aponta consequências negativas da decisão da empresa Changi de deixar a operação no Galeão. Primeiramente, o desestímulo para captação de novos investidores internacionais. Ele acredita que o grupo atual ficará até a realização da nova licitação, mas, provavelmente, não fará investimentos ou reduzirá gastos em manutenção.

“Há obrigação de devolver os investimentos já feitos. Como, possivelmente, terá que ser abatida da futura outorga parte do que foi investido pelo grupo de Singapura, os valores a serem obtidos pelo Governo na nova concessão serão muito menores do que os do contrato de concessão atual”, avalia Victer. Recentemente, a Alerj aprovou medida para reduzir o impacto da crise econômica sobre o setor da aviação no estado. A Lei 9.281/21 reduziu de 13% para 7% a alíquota do ICMS na venda do querosene de aviação, até 2035, para empresas que operam nos terminais do Rio de Janeiro. O combustível pode chegar a 40% dos custos de voo.

PROJETO PREVÊ ampliação das pistas do Aeroporto Santos Dumont

das para a economia fluminense, em especial para o transporte de cargas. “Essa competição entre os dois aeroportos se torna insustentável e traz um prejuízo enorme para viajantes, que têm opções reduzidas, e para o transporte de cargas, que está ligado a esses voos”, avalia o vice-presidente da Firjan, Luiz Césio Caetano.

A Alerj aprovou decreto legislativo que cassou a licença prévia emitida pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) para as obras de ampliação das pistas do Santos Dumont. Também apresentou denúncia no Tribunal de Contas da União (TCU) com pedido de medida cautelar para suspender a licitação, alegando irregularidades no edital, coordenado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A justificativa apresentada na ação do Parlamento foi de que a instalação de estacas nas pontas das pistas sobre a Baía de Guanabara é ilegal, vedada pela Constituição Federal e pela Lei Estadual 1.700/90.

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