nº 01 | ano 01 abril maio junho de 2022
REVISTA DA
15+ ANOS DE HISTÓRIA A trajetória de lutas da Associação Nacional de Desembargadores - ANDES
Magistratura brasileira luta para restabelecer seus direitos constitucionais Home office ou presencial, eis a questão
CONVÊNIOS
andes-jur.com.br/convenios
MOMENTO
CARO LEITOR. Apresento a Revista
, que, para além das relevantes matérias que
se seguirão – como a referente aos subsídios da Magistratura nacional, afetados por sucessivas omissões, cujo legado de perdas se traduz na mera reposição inflacionária –, registrará os primeiros 15 anos da Associação Nacional de Desembargadores –
.
Associação esta que congrega três ramos da Justiça Brasileira, ou seja, Tribunais e Justiça, Tribunais Regionais Federais e Tribunais Regionais do Trabalho, criada em março de 2006, por diletas lideranças que viram, naquele momento, a necessidade de instituir uma entidade destinada à defesa das matérias mais ligadas ao segundo grau de jurisdição. Sem pretender estabelecer divisões, entenderam que havia, e, penso, há, matérias específicas que, devido às dimensões do Poder Judiciário, as demais associações acabariam por não dar conta das vicissitudes de uma parcela, numericamente menor, de seus integrantes, os Desembargadores. MARCELO BUHATEM Aqui, o espaço estará aberto aos tribunais e formadores de opinião
Presidente da ANDES
que queiram participar e dividir suas ações e ideias para contribuir com a magistratura nacional. Nesse histórico de uma década e meia, muita coisa mudou. O Direito, os Tribunais, a jurisprudência, a sociedade brasileira e, porque não dizer, o mundo, notadamente após o enfrentamento da Covid-19. Esse foi o grande desafio dos últimos dois séculos. Depois da inegável campanha para aprovação da PEC dos 75 anos, ocasião em que a
desempenhou papel relevante, seguimos
vigilantes na defesa da Magistratura, como, por exemplo, na luta pela garantia mínima de sua data base. A Magistratura sabe que tem uma dívida com a população brasileira, qual seja, a de julgar mais e mais rápido. Muito se pode falar sobre isso, já que são vários os vetores que apresentam desafios à eficiência, como a falta de juízes, o alto grau de litigiosidade do povo brasileiro, a má prestação dos serviços concessionados etc. Apenas 30 empresas são responsáveis por mais de 70% dos processos que tramitam pelo Judiciário, sendo que, do saldo, 50% dessas ações dizem respeito a execuções fiscais. O certo é que, nos próximos 15 anos, a
atuará na discussão de
todas essas questões, pois tem como escopo, além da defesa intransigente da classe, participar do debate dos importantes temas que permeiam o Poder Judiciário. BOA LEITURA!
Foto: Divulgação
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“(...) seguimos vigilantes na defesa da Magistratura (...).” abril maio junho de 2022
SUMÁRIO SUBSÍDIOS EM QUEDA
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Entidades lutam pela reposição inflacionária do teto constitucional
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A HORA E A VEZ DA ANDES A história da entidade criada para defender o direito de juízes de trabalhar até os 75 anos
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PERFIL Desembargador José Ribamar Oliveira
ARTIGO por Robson Braga de Andrade
Os artigos publicados não representam a opinião da Revista Andes e são de responsabilidade de seus autores.
Revista da
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EXPEDIENTE
COMPOSIÇÃO DA CHAPA (MANDATO 2021 - 2024):
nº 01 | ano 01 abril maio junho de 2022
03 06 08 11 20 21 22 24 25
MOMENTO COMPARTILHE ENTREVISTA com Juiz Luiz Antonio Colussi
ARTIGO por Raduan Miguel Filho
ARTIGO por Luciana Yeung
ARTIGO por Robson de Andrade
CONTRAPONTO Magistrados divergem sobre audiências à distância ou presenciais
Presidente: Des. Marcelo Lima Buhatem - TJRJ 1º Vice-Presidente: Des. Fernando Foch de Lemos Arigony da Silva - TJRJ
2º Vice-Presidente: Des. Carlos Eduardo Pugliesi - TRT 6 3º Vice-Presidente: Des. André Ricardo Cruz Fontes - TRF 2 - RJ
Diretorias Nacionais: Diretor Nacional de Assuntos Legislativos e de Relações Institucionais: Des. Henrique Nelson Calandra - TJSP Diretor Nacional Cultural e de Eventos: Des. José Eduardo de Resende Chaves Júnior - TRT 3 - MG Diretor Nacional de assuntos Jurídicos e Prerrogativas:
Des. Jurandir Sousa Oliveira - TJSP Diretor Nacional de Inativos: Des. Eduardo Augusto Paurá Peres - TJPE Diretor Nacional de Relações com os Tribunais: Des. José de Ribamar Froz Sobrinho - TJMA
Conselho Deliberativo: Des. Adriano Celso Guimarães - TJRJ Des. Carlos Santos de Oliveira - TJRJ Des. Fernando Fernandy Fernandes - TJRJ Des. Helvécio de Brito Maia Neto - TJTO
Des. James Magno Araújo Farias - TRT 16 - MA Des. José Ribamar Oliveira - TJPI Des. Marcio Vidal - TJMT
Suplentes do Deliberativo: Des. Alberto Nogueira Virgínio - TJPE Des. Mônica Maria Costa Di Piero - TJRJ
Des. José Jorge Figueiredo - TJMA
Conselho Fiscal: Des. Ricardo Tadeu Bugarin Duailibe - TJMA Des. Roberto Guimarães - TJRJ
Des. Nise Pedroso Lins de Sousa - TRT 6 - PE
Suplentes do Fiscal: Des. Cleber Ghelfenstein - TJRJ Des. Luiz Eduardo Canabarro - TJRJ
Des. Renata Machado Cotta - TJRJ
Diretores representantes junto aos tribunais: Des. Otávio Portes - TJMG Des. Fábio Eugênio D. de Des. Paulo Airton Oliveira Lima - TJPE Albuquerque Filho - TJCE Des. Itamar de Lima - TJGO Des. Paulo Sérgio Velten Pereira - TJMA Des. Jayme Henrique Ferreira - TJAP Des. Sonia Mascaro Des. João Alves da Silva - TJPB Nascimento - TJSP Des. José Torres Ferreira - TJRO Des. Sideni Soncini Pimentel - TJMS Des. Marcelo Augusto Souto Des. Valdir Jose Silva de de Oliveira - TRT 1 Carvalho - TRT 6 Des. Maria do Carmo Cardoso - TRF 1 Des. Yedo Simões de Oliveira - TJAM Des. Maria Erotides Kneip - TJMT Diretores Culturais: Des. Erik Simões - TJPE Des. Jamil de Miranda Gedeon Neto - TJMA
Des. Marco Antonio Ibrahim - TJRJ Des. Marcos Machado - TJMT Des. Jones Figueiredo Alves - TJPE
REVISTA EuroCom
ARTIGO por Etelvina Maria Sampaio Felipe
ESPAÇO CULTURAL Fotos: Shutterstock e divulgação
Jornalista responsável: Monica Martelli Redação: Elenilce Bottari Fotografia: Marcos Tristão
Projeto gráfico e diagramação: Andréa Miranda Impressão: Gráfica MEC Tiragem: 3.000
/ RJ CONTATO / Tel.: +55 (21) 3133-4720 | 3133-4721
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abril maio junho de 2022
COMPARTILHE
A MEDALHA ANDES Após 15 anos de fundação, a Associação Nacional de Desembargadores instituiu a medalha ANDES do Mérito. A ideia é homenagear pessoas que tenham prestado, direta ou indiretamente, relevantes serviços à instituição ou se destacado, com bravura e honradez, em seu trabalho. Nesta primeira edição do prêmio, o presidente da ANDES, desembargador Marcelo Buhatem, depois de ouvir a Diretoria e o Conselho deliberativo da entidade, outorgou a Medalha a 19 autoridades que se destacaram no ano de 2021. A premiação também reforça a posição da entidade de respeito à harmonia dos poderes.
Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro
Revista da
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Fotos: Fellipe-Sampaio-SCO-STF e arquivo/ANDES
COMPARTILHE
Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira
Conheça as autoridades agraciadas nesta primeira edição da medalha
Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Humberto Martins
Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Luiz Fux
Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco
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Jair Messias Bolsonaro Presidente da República Senador Rodrigo Pacheco Presidente do Senado Federal Deputado Arthur Lira - Presidente da Câmara dos Deputados Ministro Luiz Fux - Presidente do Supremo Tribunal Federal Ministro Humberto Martins - Presidente do Superior Tribunal de Justiça Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes - do Tribunal Superior do Trabalho Des. Geraldo Pinheiro Franco - Presidente do Colégio de Presidentes dos Tribunais de Justiça Des. Luiz Eduardo Guimarães Rabello, do TJRJ Des. Carlos Eduardo Pugliesi, do TRT - PE - 2º Vice-Presidente da ANDES Des. Jurandir de Sousa Oliveira, do TJSP - 3º Vice-Presidente da ANDES Des. Fernando Fernandy Fernandes, doTJRJ - SecretárioGeral Executivo da ANDES Des. Eduardo Augusto Paurá Peres, do TJPE - 1º Secretário da ANDES Des. Henrique Nelson Calandra, do TJSP - Diretor Nacional de Relações Institucionais Des. Jose de Ribamar Froz Sobrinho, do TJMA - Diretor representante junto aos Tribunais Des. Marcos Henrique Machado, do TJMT - Diretor representante Cultural e de Eventos da ANDES Des. Bernardino Leituga, do TJRJ Des. Sergio Cavalieri Filho, do TJRJ (idealizador da ANDES em 2006) Comandante Renato de Oliveira Souza, post mortem Des. Helena Bekhor - Coordenadora do ANDES Mulher
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ENTREVISTA
“A missão da magistratura é a pacificação social.” Para Anamatra, respeito às prerrogativas é fundamental para independência da Justiça por Elenilce Bottari
Revista da
R
esponsáveis por quase três milhões de novos processos só em 2021, coube aos juízes trabalhistas garantir, além das audiências telepresenciais, o cumprimento pelas empresas do distanciamento social no ambiente de trabalho e a implantação de medidas sanitárias, como a distribuição de máscaras e de álcool em gel para os trabalhadores, durante os piores momentos da pandemia. Em muitos casos, a Justiça Trabalhista determinou ainda a compra de balões de oxigênio para hospitais. Diante de tantos novos desafios, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) realizou, em abril, seu 20º congresso nacional (Conamat) para discutir as políticas associativas que serão encampadas pela entidade. Segundo o presidente da ANAMATRA, juiz Luiz Antonio Colussi, a entidade tem como principal bandeira a valorização da magistratura: “Nossa missão como juízes é a pacificação social, mas, para isto, faz-se necessária a garantia de uma remuneração digna para a magistratura.”
08
ENTREVISTA
Juiz Luiz Antonio Colussi, presidente da ANAMATRA
“Estamos preocupados e tentando buscar uma recomposição dos subsídios (...).”
REVISTA ANDES Quais hoje as principais bandeiras da ANAMATRA?
mantidas para que ela possa, com a devi-
JUIZ LUIZ ANTONIO COLUSSI “Trabalha-
sociedade naquilo para o que ela existe,
mos em defesa das prerrogativas da magis-
que é a pacificação, a busca da paz social.”
da isenção, devida segurança, atender a
tratura. Este é o nosso principal foco. No momento, nós estamos preocupados e ten-
REVISTA ANDES Qual foi o impacto da pan-
tando buscar uma recomposição dos sub-
demia para a Justiça Trabalhista?
sídios que, pelo menos, recomponha em
JUIZ LUIZ ANTONIO COLUSSI “Ela enfren-
parte as perdas inflacionárias. E estamos
tou uma dificuldade adicional porque a
na luta pela aprovação da PEC 63, que é a
justiça do trabalho sempre foi uma Justiça
concessão do adicional de tempo de serviço
com uma quantidade enorme audiências
como forma de valorização da carreira. Há
e, de repente, toda esta prova passou a ser
uma crítica injusta feita à magistratura. A
produzida de forma digital. Nós observa-
magistratura não tem privilégios, o que tem
mos que ainda há uma dificuldade gran-
são prerrogativas asseguradas na Consti-
de, uma carência na questão que envolve
tuição para que possamos servir e atender
a internet. Muitas comunidades não têm
a sociedade. No caso particular da Justiça
internet adequada, muitas pessoas não
do Trabalho, a nossa preocupação sempre
têm acesso a uma internet de qualidade e
foi a de solucionar os conflitos de natureza
isso dificultou tudo. Mas por outro lado, a
trabalhista, atuando muito na conciliação
Justiça do Trabalho realizou um grande
e julgando. A magistratura brasileira tem
trabalho durante a pandemia. Nós obser-
um trabalho relevante, daí a importância
varmos inúmeras, incontáveis decisões,
que ela tenha uma remuneração digna, que
assegurando a saúde e a segurança do
tenha as suas prerrogativas asseguradas e
trabalhador, com decisões determinando
Foto: Alessandro Dias
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abril maio junho de 2022
ENTREVISTA
o fornecimento de álcool em gel, fornecimento de máscaras, o distanciamento dos empregados, enfim medidas sanitárias adequadas para a execução dos trabalhos.
Comparativo de perdas do subsídio R$ 84.840,00
Um outro aspecto também muito relevante, muitas decisões destinando recursos para hospitais e outras entidades, determinando a compra de balões de oxigênio.”
R$ 59.139,00
REVISTA ANDES O que muda após a pandemia? JUIZ LUIZ ANTONIO COLUSSI “Estamos
R$ 39.500,00
nos aproximando do final da pandemia e do retorno à normalidade, mas ainda há riscos e, por isso, toda a cautela e segu-
R$ 24.500,00
rança são necessárias ainda neste momen-
Teto STF Inflação* 70 salários-mínimos
to. De qualquer maneira, há uma mudança muito significativa em curso, e as audiências à distância, o trabalho à distância vão coexistir com o trabalho presencial. Acre-
2006
2022
dito que teremos uma Justiça brasileira mais híbrida, para se adequar inclusive à realidade dos novos tempos. Mas, ainda é
orientar nosso trabalho, seja divulgando
uma situação preocupante porque temos
aos nossos associados os resultados do
realidades diferentes em todo o país.”
congresso, seja na nossa atuação parlamentar junto ao Congresso.”
REVISTA ANDES Quais os principais temas
do 20º Conamat? tral foi a ‘Justiça do trabalho de proteção
REVISTA ANDES Como a ANAMATRA analisa a reforma trabalhista? Em que ela impactou a Justiça do Trabalho?
social, contemporaneidade e futuro’. Qual
JUIZ LUIZ ANTONIO COLUSSI “Nós sem-
o futuro do trabalho? Três comissões
pre fomos contra a sucumbência recípro-
avaliaram as 119 teses que foram apresen-
ca porque ela foi uma medida inconstitu-
tadas pelos associados, e as aprovadas
cional, por dificultar ao público o pedido
foram levadas para votação em plenário.
de acesso à Justiça. Tanto é verdade que
Tratamos de temas muito atuais, como
o STF reconheceu que aqueles dispositi-
a magistratura e a liberdade de expres-
vos colocados na CLT eram inconstitu-
são, e gênero, identidade e diversidade no
cionais. Houve sim uma redução signi-
poder judiciário. Também discutimos os
ficativa dos ajuizamentos, que se estima
desafios do direito do trabalho contem-
em 35% no primeiro ano, mas aos poucos
porâneo, o trabalho da magistratura e as
foram sendo retomados os ajuizamentos,
novas jornadas de trabalho: teletrabalho,
na medida em que notadamente o traba-
trabalho hibrido e o futuro do trabalho,
lhador e seus advogados passaram a sen-
além do o vínculo de emprego para traba-
tir mais confiança e mais segurança. A
lhadores das plataformas digitais, como
tendência é que a situação se normalize.
no caso dos aplicativos de transportes.
As partes começam novamente a buscar
As decisões plenárias do Conamat irão
os seus direitos como sempre foi feito.”
JUIZ LUIZ ANTONIO COLUSSI “O tema cen-
Revista da
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* IPCA-IBGE
ARTIGO
RONDÔNIA TEM TRIBUNAL DE EXCELÊNCIA
À
s margens de um dos maiores afluentes do Rio Amazonas, surge Porto Velho, banhada pelo Rio Madeira, na época, 1912, como pátio da construção de uma Ferrovia, a Estrada de Ferro da Madeira-Mamoré. O empreendimento no meio da floresta tinha o objetivo de transportar a borracha da Bolívia
para o Atlântico, no trecho em que as cachoeiras impediam a navegação. Os primeiros processos judiciais na região, ainda fronteira dos estados do Amazonas e do Mato Grosso, datam dessa época. A linha telegráfica de Rondon delinearia o novo território, antes chamado Guaporé e depois rebatizado, em homenagem ao Marechal, como Rondônia. Daí em diante, foram vários ciclos econômicos semelhantes ao do apogeu da borracha, como o da mineração e, finalmente, o eldorado migratório, a partir da década de 60 e 70. Só na década de 80 é que surge o Estado de Rondônia. Comparado ao de outros estados, o Poder Judiciário de Rondônia é bastante novo, pois sua criação data de 25 de janeiro de 1982, quando tomaram posse os primeiros desembargadores, batizados, na ocasião, de 7 Samurais da Justiça, devido à abnegação com que enfrentaram tal missão. Ao longo de 4 décadas, o Tribunal de Justiça despontou como um dos mais vanguardistas. Não por acaso, é o único que conquistou o Selo de Qualidade Diamante do Conselho Nacional de Justiça - CNJ por três vezes consecutivas, em 2019, 2020 e 2021. Esse resultado decorre de uma soma de fatores, dentre os quais, a decisão pelo investimento em tecnologia, uma característica que sempre esteve no DNA da instituição. Para isso, desenvolve todos os aspectos envolvidos: infraestrutura, governança, pessoal e, sobretudo, implantação e desenvolvimento de programas que facilitem o atendimento ao usuário. Destaque para a inteligência artificial Sinapses, que empresta a todo o Judiciário brasileiro a expertise rondoniense. Mas não há uso para a tecnologia sem a participação de pessoas, tanto no que diz respeito à força de trabalho quanto ao olhar aos assistidos. O nível de excelência de magistrados e servidores, consequência do apoio institucional, é notado pelos resultados obtidos nos comparativos com outros tribunais brasileiros. O maior empenho do Tribunal de Rondônia está direcionado à missão de oferecer efetivo acesso à Justiça. Isso se aplica a todos, desde o cidadão munido de computador e internet até o ribeirinho, morador das longínquas localidades do Rio Madeira, que recebe o barco da Justiça Itinerante com serviços básicos de Justiça e Cidadania. Nos municípios onde não há fóruns, o TJRO tem instalado postos para assistir aos excluídos digitais, inclusive participação em audiências virtuais. A certificação em forma de Selo Diamante - uma aferição com 137 critérios, complexa e sistematizada - pontua, ainda, a eficiência administrativa, a transparência, a produtividade, a qualidade da informação e as ações inclusivas dos que se enquadram nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável - ODS, definidos pela ONU. O TJRO é um tribunal de pequeno porte,
Raduan Miguel Filho Desembargador e Diretor da Escola da Magistratura de Rondônia, Magistrado do TJRO há 34 anos
bem jovem, porém de excelência comprovada, reconhecida referência para outros tribunais.
Foto: Divulgação
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PERFIL
A longa estrada do menino que queria ser juiz De origem humilde, o desembargador José Ribamar Oliveira transpôs barreiras sociais até chegar à presidência do TJPI por Elenilce Bottari
D
uas palavras definem a história do desembargador José Ribamar Oliveira, presidente do Tribunal de Justiça do Piauí: determinação e resiliência. Em menos de um ano de mandato, ele retirou o estado da última posição do ranking de produtividade do Conselho Nacional de Justiça, em 2020, para colocá-lo na 20ª,
entre os 27 tribunais do país. E apesar das graves restrições orçamentárias que sua gestão enfrentou, conseguiu informatizar 100% das mais de 60 comarcas do estado e está implantando as salas de acessibilidade no interior, espaços com computadores, internet e servidores que possibilitam o acesso virtual para quem não tem meios tecnológicos e sequer condições financeiras para se dirigir a uma audiência no fórum da capital.
“Temos um índice de empobrecimento muito
itinerante
alto e uma área territorial muito grande. São
regiões mais carentes do Piauí.
para
construir
açudes
nas
252 mil quilômetros quadrados. Então nosso desafio é estar presente e prestar assistência
Entre os 4 e os 18 anos, José Ribamar viveu
jurisdicional a essa população, mesmo com
em seis cidades: “Quando terminava o ano,
todas as dificuldades e limitações orçamen-
a gente já corria para se matricular, fora de
tárias que um estado pobre, com segundo
época, em outro município. Essas coisas
pior índice de desenvolvimento humano do
eram difíceis de se efetivar nos anos 60. A
país, enfrenta”, defende José Ribamar.
gente teve que se virar para estudar. Foi uma luta muito grande. A gente não tinha livros
Mas não foram apenas os mais de 40 anos
e andava quilômetros a pé até a escola”,
de magistratura, nos quais atuou em várias
conta o magistrado, que aos 18 anos chegou
comarcas, que pavimentaram seu caminho
à capital e, aos 21, passou em um concurso
até a presidência do TJ-PI. José Ribamar
público para perito criminal, quando então,
nasceu na pequena cidade de Monsenhor
com mais dois colegas, fundou o atual Insti-
Gil e é o sexto dos onze filhos de uma famí-
tuto de Polícia Técnica do estado.
lia muito humilde, cujo pai, um servidor
Revista da
público do Departamento de Combate à
Aos 22 anos, ingressou na Universidade Fede-
Seca, carregava a família em seu trabalho
ral do Piauí e, aos 28, passou no concurso
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PERFIL
Desembargador José Ribamar Oliveira
para a magistratura. Ao completar 29 anos, tornou-se o segundo juiz mais novo da história de seu estado natal: “Meu pai me via como uma pessoa muito dedicada ao estudo, uma
“Chegar até aqui foi fruto de um crescimento sofrido.”
pessoa um tanto séria, apesar de muito jovem. Ele dizia: ‘Você vai ser um juiz, tem jeito de juiz’. Acho que sempre quis ser juiz”, confessa, orgulhoso, o magistrado que rompeu as barreiras sociais que o afastavam de seus sonhos: “O determinismo social impõe que você seja uma pessoa sem muitas ambições. Assim, uma pessoa com a origem modesta que tenho, para chegar ao topo da carreira, precisa quebrar muitas barreiras. Não adianta apenas determinação, é necessário dispor também de resiliência. Chegar até aqui foi fruto de um crescimento sofrido. Isso tempera o caráter, fortalece o espírito e dá a você a capacidade de lutar por algo maior”.
Foto: Divulgação/TJPI
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15 ANOS +
A HORA EA VEZ DA A TRAJETÓRIA DE UMA ENTIDADE CRIADA PARA DEFENDER O DIREITO DOS DESEMBARGADORES AO DESEMPENHO DA FUNÇÃO ATÉ 75 ANOS
A
s reformas da previdência são historicamente marcadas por acaloradas discussões entre trabalhadores. Isto acontece em todo o mundo e faz parte da democracia. Mas, no Brasil, uma em especial, a referente à PEC da Bengala, mobilizou uma classe que, até aquele momento, não havia se manifestado para além do espaço silencioso dos recursos de Segun-
do Grau. Para lutar pelo direito de trabalhar até os 75 anos, desembar-
por Elenilce Bottari
Revista da
gadores dos tribunais brasileiros e conselheiros de Contas de todo o país fundaram a Associação Nacional de Desembargadores, a ANDES.
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15 ANOS +
Assembleia Geral da Andes (à esq.) e Des.Luiz Eduardo Guimarães Rabello
Em 2005, o déficit previdenciário batia a casa dos R$ 33 bilhões e o governo focava na aposentadoria dos servidores públicos. Entre as propostas discutidas, estava a PEC 42, do senador Pedro Simon (PMDB), que alterava o artigo 40 da Constituição Federal para aumentar, de 70 para 75 anos, o limite de idade para a aposentadoria compulsória de ministros do Supremo Tribunal Federal, dos demais Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas. A PEC foi defendida por desembargadores, que enfrentaram oposição interna em sua própria associação de classe. Fundador da ANDES, o desembargador Luiz Eduardo Guimarães Rabello explica que os desembargadores defendiam o aumento da idade para aposentadoria compulsória por entenderem que aos 70 anos estavam em plena produtividade e que, com a experiência que acumulavam, poderiam servir seu país por mais cinco anos, e, adicionalmente, aliviariam a pressão sobre a previdência. Mas a proposta não agradou aos juízes, que temiam que a medida prejudicasse suas promoções. “Por serem bem mais numerosos, os juízes controlavam a associação. Como decorrência dessa representatividade, seus pleitos vinham sendo priorizados. Mas, à época, havia um clima amigável entre
Fotos: Divulgação
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A JUSTIÇA SÓ ESTARÁ PRÓXIMA AO CIDADÃO QUANDO FOR MAIS CÉLERE E EFICAZ abril maio junho de 2022
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todos, até aquele momento, quando alguns juízes tiveram uma atitude, a meu ver, não muito digna de um magistrado. Passaram a chamar a PEC 42 de ‘Pec da Bengala’. Foi uma forma de discriminar o idoso e isso acirrou os ânimos”, recorda o magistrado. Mais do que o estopim de uma crise institucional, a “PEC da Bengala” foi um divisor de águas. Entendendo que era chegado o momento de os desembargadores terem sua própria representação, Rabello encaminhou um ofício a todos os presidentes e corregedores de todos os tribunais do país, e também para os conselheiros de Contas, que têm as mesmas prerrogativas. A reunião aconteceria no gabinete do Centro de Estudos de Debates do TJRJ (Cedes), mas na data marcada, 8 de março de 2006, uma multidão compareceu para aclamar a nova entidade de classe: “Vieram centenas de colegas, presidentes e corregedores de tribunais e conselheiros de todo o país. Não havia espaço para tanta gente e tivemos que transferir a reunião para o auditório do TJRJ. Foi uma grande surpresa”, relembra Rabello, ao falar da assembleia histórica de fundação da Associação Nacional de Desembargadores - ANDES. Ficou acordado que o presidente da ANDES seria o desembargador Manoel Joaquim Carpena, que cuidaria de conseguir uma sede e tratar da organização da entidade, ao passo que Rabello, como
‘PEC DA BENGALA’. FOI UMA FORMA DE DISCRIMINAR O IDOSO Revista da
vice-presidente, se dedicaria à campanha para a aprovação da proposta, com apoio, inclusive, de conselheiros de Contas, que, em razão de serem oriundos do Legislativo, contam com mais acesso ao Congresso Nacional. A PEC do senador Pedro Simon recebeu emendas que ampliaram, para todos os servidores públicos, a idade de 75 anos para a aposentadoria compulsória, mas sua aprovação só ocorreu em 2015, após anos de luta. Vitoriosa em sua primeira grande campanha, a ANDES vivenciou, nos últimos anos, momentos de crise, com esvaziamento de seus quadros. Ao mesmo tempo, a Justiça vem sofrendo críticas, acusada de ser onerosa, lenta e ineficiente. Para tentar reverter esse quadro, ao completar seus 15 anos, a instituição passou por um processo de renovação, elegendo o desembargador Marcelo Buhatem para comandar uma nova virada na entidade.
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OS 15 ANOS + 1
AS NOVAS BANDEIRAS DA ANDES MELHORIA DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL “A Justiça está em situação préfalimentar. Estamos com 90 milhões de processos, não há orçamento que suporte. O problema não é mais enxugar o gelo, mas ter dinheiro para comprar o pano. Por isso, uma das nossas propostas legislativas é para que apenas causas superiores a 40 salários cheguem às instâncias superiores. As demais seriam resolvidas na Primeira Instância.” Encontro Nacional da Andes em defesa da PEC
“Aceitei o desafio porque acho que a ANDES é uma instituição de excelência dos desembargadores e tem um mega potencial a ser desenvolvido. Nosso trabalho tem como pilar a defesa das prerroga-
A NEGOCIAÇÃO PRÉ-PROCESSUAL “O caminho é a conciliação processual. As partes deveriam comprovar que tentaram fazer um acordo. O mesmo para as execuções fiscais. O ente deveria primeiro entrar com o protesto, e, se não houvesse pagamento, aí, sim, entrar com a execução.”
tivas, mas queremos também contribuir para fazer com que a magistratura se aproxime mais do cidadão, entregando à população uma Justiça mais célere e mais eficiente. Hoje, a relação com o jurisdicionado está muito agastada”. Eleito em 2020 para um mandato tampão, após a saída prematura do desembargador Bartolomeu Bueno, Buhatem foi reeleito em 2021 para um mandato de três anos. Desde então, vem imprimindo uma série de ações para ampliar a representatividade da instituição. Como sua administração teve início em uma das mais graves crises sanitárias da história, a pandemia que levou o país a fechar temporariamente as portas de suas instituições, Buhatem se utilizou de todas as plataformas digitais disponíveis para impulsionar a entidade, promovendo debates remotos entre a magistratura e diversas instituições e mantendo um canal direto de comunicação com os desembargadores. Como resultado desses esforços,
RELACIONAMENTO INSTITUCIONAL “O maior desafio de uma associação de classe é construir pontes. Isso é fundamental. Construir pontes significa poder bater à porta dos Três Poderes de forma altiva, mas entendendo das dificuldades e das agendas de cada um deles. E, para Andes, é fundamental estar com todos os matizes políticos brasileiros, de direita e esquerda. Isso mostra a seriedade com que a Andes se propõe a trabalhar.”
a entidade saltou de 340 associados, em 2020, para 600 nesse momento.
Foto: Divulgação
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SUBSÍDIOS
Subsídios em queda Andes recorre ao STF em defesa da revisão do teto constitucional por Elenilce Bottari
R
esponsável por garantir os direitos individuais, coletivos e sociais no julgamento de conflitos, a magistratura brasileira luta agora
O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO FEDERAL:
para restabelecer seus próprios direitos constitucionais. Os sub-
sídios da classe estão congelados há pelo menos quatro anos. A última revisão foi em 2018, mas as perdas vão bem além dos mais de 23% da inflação acumulada nesse período. A aplicação do teto remuneratório constitucional — que rege os subsídios dos membros da magistratura — foi regulamentada para acabar com discrepâncias salariais que ocorriam entre estados da federação. Ela entrou em vigor a partir de janeiro de 2006, mas a revisão anual desse teto, prevista na Constituição Federal, não aconteceu. Em 16 anos, ocorreu em apenas seis ocasiões. “Se em 2006, o subsídio mensal de um ministro do STF era equivalente a 71 salários-mínimos, hoje esse valor corresponde a 32. O que significa dizer que o poder aquisitivo da magistratura caiu à metade”, avalia o pre-
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
sidente da ANDES, desembargador Marcelo Buhatem. Num momento em que a economia brasileira amarga uma inflação anual de dois dígitos, a lei orçamentária para 2022 sequer previu qualquer reajuste. “Isso acendeu a luz amarela. Quando o orçamento encaminhado pelo STF não prevê qualquer revisão, ele tira da magistratura até mesmo o direito básico de reivindicar, previsto na Constituição Federal”, considera Buhatem. O presidente da Andes protocolizou Anteprojeto de Lei, junto ao STF, com pedido para que o Supremo encaminhe ao Congresso Nacional projeto de revisão orçamentária suplementar ao Orçamento de 2022, com reajuste de 10,6%. “Pedimos que o Supremo avalie a possibilidade de enviar um projeto de revisão que cubra ao menos a inflação de 2021. Se este será aprovado no parlamento ou vetado pelo presidente da República, face ao princípio da autonomia dos Poderes, são outros quinhentos. Mas a remessa de lei orçamentária
Revista da
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X - A remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento)
SUBSÍDIOS
“(...) está no forno o maior desmantelamento de todo um Poder da República”, afirma Buhatem.
constitucional que contemple, no mínimo, a reposição inflacionária, como determina a Constituição, essa me parece obrigatória, uma questão de justiça”. A Constituição Federal estabeleceu que o teto dos servidores públicos é o subsídio do Ministro do STF. A cada ano, os entes da federação devem encaminhar ao Congresso e às assembleias estaduais suas propostas orçamentárias com a proposição de reajuste de seus servidores. Mas, em vez disso, passaram a replicar o percentual do STF em seus orçamentos. “Hoje, qualquer percentual de aumento do subsídio do Ministro do STF desce em cascata até as funções mais básicas dos demais Poderes, fazendo com que a revisão do subsídio da magistratura, que é um pequeno grupo, repercuta para quase 600 mil servidores públicos brasileiros. Não há como suportar isso”. Segundo o presidente da ANDES, a distorção da regra está levando a magistratura a ser a única carreira estatal a não poder obter reajustes salariais. “Desse modo, está no forno o maior desmantelamento de todo um Poder da República”. Buhatem aposta na Proposta de Emenda Constitucional nº 63 de 2013 para corrigir o sistema. “A PEC nº 63 quebra essa deletéria vinculação ao estabelecer uma escala ou percentual que leva em conta o tempo de serviço do magistrado. E essa desvinculação é imperativa”.
AJUFE: Falta de revisão do teto é injustificável
O presidente da Associação de Juízes Federai do Brasil - AJUFE, Eduardo André
Linha do tempo do teto do STF Lei nº 11.143/05 Jan. a dez./2005 R$ 21.500,00 (71 salários) Jan./2006 a ago./2009 R$ 24.500,00 (70 salários) Lei nº 12.041/09 Set./2009 a jan./2010 R$ 25.725,00 (55 salários) A partir de fev./2010 R$ 26.723,13 (52 salários) Lei nº 12.771/2012 De 31/12/2012 Alterado pela Lei nº 13.091/2015
Jan./2013 a dez./2013 R$ 28.059,29 (41 salários) Jan./2014 a dez./2014 R$ 29.462,25 (40 salários) Jan./2015 a dez./2015 R$ 33.763,00 (42 salários) Lei nº 13.752/ 2018 Nov./2018 R$ 39.293,32 (41 salários) Jan./2022 R$ 39.293,32 (32 salários) Se o valor fosse atualizado apenas pela inflação, segundo o IPCA (IBGE), o teto do STF seria hoje de R$ 59.139,25.
Brandão de Brito Fernandes, defende a tese de que o problema não está na legislação, mas no desrespeito à regra básica de revisão anual do teto do STF: “O que precisa ser combatido é esse desrespeito constante à regra constitucional. O teto salarial só funciona se tiver a revisão anual do subsídio. Sem isso, o teto perde toda a razão de ser. Esse é um tema que tem que ser enfrentado pelo Legislativo e pelo Supremo Tribunal Federal.”, afirma Brandão. O magistrado adverte que a revisão anual é direito de todos os servidores e não pode ser desculpa para o congelamen-
INFLAÇÃO IPCA (IBGE) Jan. 2006 dez. 2021 10,6%
to do teto do Supremo. “Os tributos que o governo arrecada são atualizados pela inflação, portanto é injustificável que não ocorra a revisão constitucional”.
Foto: Marcos Tristão
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139,63%
2021
4,52%
4,31%
3,75%
2020
2019
2018
abril maio junho de 2022
ARTIGO
OS DADOS E A JUSTIÇA BRASILEIRA
“E
m Deus confiamos; todos os outros devem trazer dados”, dizia o estatístico W. Edwards Deming. Na 2ª década do século 21, com dados superabundantes à nossa volta, essa frase faz mais sentido do que o fez à época de Deming (meados do século passado). E isso também é muito válido para o Direito brasileiro,
sobretudo com relação a dados judiciais. Estudiosos do Judiciário (como eu) são privilegiados no Brasil, por termos tantos dados à nossa disposição. E o que eles dizem? Para começar, que enquanto os EUA têm, anualmente, 5.800 novos processos judiciais para cada 100 mil habitantes, e a Alemanha (considerada o país mais litigioso do mundo) tem 12.300 casos, no Brasil, em 2019, tivemos 14.300 novos processos para cada 100 mil pessoas. Também mostra que, enquanto a Suprema Corte americana, no ano letivo de 2020-2021, julgou 61 casos, o Supremo Tribunal Federal emitiu 18.112 decisões monocráticas, além de 2.816 decisões colegiadas, das quais 715 pautadas em plenário. Na Justiça comum, o recorde de julgados aconteceu nas vésperas da pandemia de Covid19, com quase 23 milhões nas duas instâncias. Na Justiça Federal, o ano recorde foi também o de 2019, com 4,1 milhões de julgados. Já a Justiça Trabalhista teve seu pico em 2017, com 4,6 milhões de casos, período desde o qual houve grande queda causada pela Reforma Trabalhista. Se o movimento de queda, acompanhada por uma redução ainda mais acelerada no estoque de processos pendentes, continuará ou não, dependerá dos impactos do julgado do STF na ADI 5.766, em 20 de outubro do ano passado. Mas apesar dos dados acima – inegavelmente surpreendentes –, temos o outro lado: uma percepção pelo público mais amplo (de pessoas menos escolarizadas e com menos recursos materiais) de que a Justiça é muito afastada “daqueles que mais precisam”. E, infelizmente, essa percepção é igualmente real, tanto quanto os dados de superprodutividade dos magistrados brasileiros ora apresentados. Em pesquisa realizada no Insper, 73,7% dos consultados afirmaram que a Justiça é muito demorada; 57,6% res-
Luciana Yeung Professora Associada e Coordenadora do Núcleo de Análise Econômica do Direito do Insper. Estudiosa do Judiciário brasileiro
ponderam que, mesmo precisando, não acessam o Judiciário por considerar “muito complicado” e “demorado”. Vale lembrar que a pesquisa contou com participantes com escolaridade acima da média nacional. Como se explica isso? Faço uma provocação, argumentando que existe um “paradoxo do acesso à justiça”: ao mesmo tempo em que alguns poucos acessam excessivamente a Justiça, há uma grande massa de pessoas completamente afastadas dos serviços judiciais. Infelizmente, o Acesso Gratuito à Justiça não resolve esse tipo de problema, pelo contrário, ele afastará ainda mais essas pessoas realmente necessitadas, pois quem utiliza o AGJ ainda é a classe média brasileira, ou mesmo a classe média alta. Vale relembrar que o salário médio no Brasil em 2021 foi de R$ 1.149. Os dados raramente mentem. Precisamos urgentemente discutir e refletir sobre tudo isso.
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Foto: Divulgação
ARTIGO
SEGURANÇA JURÍDICA É FUNDAMENTAL
A
segurança jurídica é uma das bases do estado de direito. Sua ausência abala a certeza sobre o passado, a confiança no presente e a expectativa em relação ao futuro. É um direito de toda a sociedade: famílias e empresas fazem seus planejamentos com base em regras e valores vigentes, bus-
cando retornos proporcionais a partir de perspectivas legítimas. Portanto, promover a segurança jurídica é um dever do Estado. O Brasil tem muito a melhorar nesse quesito, conforme mostram os dados disponíveis. O relatório Competitividade Brasil 2019-2020, produzido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), aponta que estamos no 15º lugar no ranking que avalia a segurança jurídica em 18 países. Em outro estudo, o Rule of Law Index, divulgado pelo World Justice Project, o Brasil ocupava a 77ª posição entre 139 países analisados em 2021, com uma pontuação abaixo das médias global e regional (América Latina). A instabilidade causada pela falta de segurança jurídica reduz a atratividade do país para novos investimentos, inibe a tomada de decisões e a inovação, abala planejamentos, e corrói a confiança geral nas leis e nas instituições. Todas essas consequências elevam os custos de transação nos negócios e obrigam as empresas a provisionar recursos para se defenderem de imprevistos não tão eventuais. Há inegável prejuízo à competitividade e ao bem-estar social. É um quadro inaceitável para um país que tem a 11ª maior economia do mundo, candidato a ingressar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com um potencial extraordinário para liderar a transição para a economia de baixo carbono. Para a indústria, a segurança jurídica se torna ainda mais necessária, na medida em que os investimentos do setor costumam ser de longo prazo, com tempos de operação e de retorno bem maiores do que os de outras áreas econômicas. Por isso, estabilidade, previsibilidade e racionalidade são fundamentais para a atração de capitais produtivos. A indústria brasileira tem consciência de que deve colaborar com o Estado. Nesse sentido, a CNI propõe e promove ações que objetivam dar maior qualidade à formação das normas, garantir a previsibilidade na sua aplicação e reduzir a judicialização dos conflitos. O Mapa Estratégico da Indústria 2018-2022 é um bom exemplo de como o setor contribui para a melhoria do ambiente institucional, pois funciona como um guia para que o país desenvolva novas competências e realize mudanças estruturais. Com um contexto menos incerto, espera-se que o setor público cumpra o seu papel de transformar o direito em instrumento de orientação, proteção e tranquilidade. Para que isso ocorra, a segurança jurídica precisa ser encarada como uma política de Estado, capaz de fomentar a retomada dos investimentos, que são o alicerce para a construção
Robson Braga de Andrade Empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
de uma sociedade econômica, política e socialmente desenvolvida.
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CONTRAPONTO
HOME OFFICE OU PRESENCIAL, EIS A QUESTÃO Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde declarou como pandemia o estado de contaminação de Covid-19 e aconselhou a suspensão de atividades presenciais. A partir daí, as relações de trabalho em todo o mundo mudaram. Cada vez mais, empresas e serviços públicos estão adotando o sistema híbrido. Mas qual o melhor modelo para a Justiça brasileira? O assunto divide a magistratura.
“A garantia da existência da Justiça se faz com a presença do juiz (...).”
telepresencial poderão, claro, ocorrer em casos de exceção. Caberá ao juiz fixar o que é excepcional, como, por exemplo, uma teste-
Para a presidente do Tribunal Regional do
munha com a perna quebrada que não pode
Trabalho da 6ª Região (TRT – PE), desem-
comparecer. A Justiça do Trabalho é diferen-
bargadora Maria Clara Saboya Albuquerque
te, ela tem que ser feita na presença das par-
Bernardino, as audiências presenciais são
tes. Porque são pessoas diferenciadas. Aqui,
essenciais para garantir o acesso à justiça aos
vem o trabalhador humilde. Atendemos, por
excluídos digitais. “Nós temos uma resolu-
exemplo, a muitos canavieiros, pessoas mais
ção, aprovada pelo Pleno, já regulamentan-
simples, que estarão excluídas automatica-
do o retorno. Desde primeiro de abril, todas
mente do acesso à Justiça se as audiências
as audiências de instrução estão sendo fei-
forem telepresenciais. As audiências de ins-
tas de forma presencial com partes e advo-
trução presencial também garantirão uma
gados presentes. As audiências na forma
melhor avaliação, pelo juiz, da possibilidade
Des. Maria Clara Saboya Albuquerque Bernardino
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CONTRAPONTO
Des. Marco Antonio Ibrahim
de a testemunha estar ou não falando a verda-
Instância, o desembargador Marco Antonio
de, pois as partes se encontram em um olho a
Ibrahim defende o trabalho remoto. Segun-
olho diante do juiz. Além disso, eu acho que o
do ele, as audiências presenciais estão com
espaço da Justiça tem que ser defendido. Se a
os dias contados e a pandemia serviu para
Justiça do Trabalho começar a extinguir suas
acelerar o processo. “Estou convencido de
varas, a reduzir o seu espaço, ela automati-
que o trabalho remoto é muito melhor para o
camente estará reduzindo a sua jurisdição. A
país. Quando começou a pandemia, a maioria
garantia da existência da Justiça do Trabalho
começou a trabalhar em casa. E esse trabalho
se faz com a presença do juiz na Vara”.
remoto trouxe muitos benefícios. Eu ganhei
“Estou convencido que o trabalho remoto é muito melhor para o país.”
Com 33 anos de magistratura, 19 deles na 2ª
uma liberdade de horário para trabalhar que nunca tive, porque eliminou-se o tempo gasto com o deslocamento. Faço audiências remotas e atendo advogados por celular ou FaceTime. Minha produtividade triplicou. Isto aconteceu com colegas de todo o país. Se hoje o presidente da maior potência do mundo está
Magistrados divergem sobre melhor sistema de trabalho Fotos: Divulgação e Marcos Tristão
discutindo por teleconferência com outros presidentes sobre um conflito que pode levar a uma guerra mundial, por que não podemos realizar audiências por teleconferência? Há tecnologia para isso. Mas o maior benefício que a suspensão do trabalho presencial trouxe foi a economia de bilhões de reais, que deixaram de ser gastos com a manutenção dos prédios. O governo poderia utilizar esse valor para equipar melhor a Justiça, fazer convênios com a OAB para melhorar o acesso de advogados a essa tecnologia. Poderia contratar mais profissionais, reduzindo o número de processos por juiz e promovendo uma justiça mais eficiente e célere. A pandemia mostrou que o trabalho remoto é o futuro e ele já começou”.
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ARTIGO
O PAPEL DO JUDICIÁRIO E A PROMOÇÃO DA CIDADANIA
O
sonho de todo brasileiro é ter em mãos o documento da sua casa própria, mas a realidade do nosso país continental está longe de proporcionar, principalmente aos menos favorecidos, o direito constitucional de possuir uma moradia digna para chamar de sua. Os problemas fun-
diários ultrapassam os séculos, e registram, muitas vezes, na história do Brasil, a mancha da extrema pobreza, da fome e da desigualdade social. A solução para essa mazela passa diretamente pela Regularização Fundiária, que precisa, em regime de urgência, ser vista como uma pauta prioritária em todo território nacional. Nesse contexto, o Poder Judiciário, por meio das Corregedorias-Gerais da Justiça, se apresenta como um importante indutor de políticas públicas, de modo a garantir a dignidade humana e cidadania a quem mais precisa. No nosso Estado, o Tocantins, a Regularização Fundiária é uma importante pauta da Corregedoria-Geral da Justiça (CGJUS-TO), que atua em parceria com cartórios de registro de imóveis e gestores públicos, visando encerrar o ciclo da irregularidade, informalidade e da desigualdade. O trabalho é feito pelo Núcleo de Prevenção e Regularização Fundiária - Nupref, unidade da CGJUS-TO. Até o último mês de abril,89 municípios tocantinenses, de um total de 139,assinaram Termos de Cooperação Técnicacom o Judiciário, o que permitiu a entrega de 3.413 títulos definitivos de imóveis, devidamente registrados. A maioria dos beneficiados é de baixa renda, chefes de família que receberam o documento de forma gratuita. Mas o retorno maior não se comprova em números, e, sim, no humano, no olhar de satisfação de quem, por vezes, esperou anos e anos para ser dono, de direito, de seu imóvel. Um exemplo vivo em minha memória foi ver a felicidade do tocantinense Amélio Gomes Soares, com mais de 100 anos de idade, ao ter nas mãos o
Etelvina Maria Sampaio Felipe Desembargadora, CorregedoraGeral da Justiça do Tocantins e Presidente do Colégio Permanente de CorregedoresGerais dos Tribunais de Justiça do Brasil (CCOGE)
título definitivo, registrado, de sua casa. Sair da condição de possuidor para proprietário foi a maior realização de uma vida inteira. Muitos podem se perguntar, o que o Judiciário tem a ver com este tema. Eu respondo. Tudo. A simples posse gera problemas fundiários, como grilagem de terra, conflitos de vizinhança, violência, que acabam às portas da Justiça em busca de solução. Esse é um trabalho social e de cidadania do Judiciário. O país não se desenvolve sem uma boa política fundiária. E esse avanço deve ser capitaneado pelo Judiciário, por meio doFórum Nacional de Regularização Fundiária das Corregedorias-Gerais, que abraça de forma séria, transparente e legítima a pauta da regularização fundiária.
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Foto: Divulgação
ESPAÇO CULTURAL
SÍTIO DAS PALAVRAS Código Civil, reforma tributária, execuções e conceitos sobre liberdade são temas cada vez mais atuais. A ANDES elencou algumas obras produzidas neste período de pandemia para a estreia do seu espaço cultural.
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LIBERDADE, LIBERDADE! O direito de agir pensar e crer Nesta obra, publicada pela LVM Editora, Antonio Cabrera e William Douglas abordam conceitos importantes sobre a liberdade, desde a liberdade religiosa, os limites das interferências estatais nas vidas dos indivíduos, até a liberdade de expressão.
MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL Neste livro, 1ª edição, publicado pela Atlas, este ano, o de-
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sembargador Alexandre Freitas Câmara tem como propósito apresentar o sistema das suas ideias acerca do processo civil brasileiro, e, por esse motivo, os leitores perceberão que não há na obra notas de rodapé.
Capas: Divulgação
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