Trabalho de Conclusão de Curso-André Fraga Damasceno

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APROXIMAÇÕES DE UMA PRÁTICA AUTÔNOMA CONSTRUTIVA NA ARQUITETURA: diálogos entre Brasil e Colômbia pela vivência construtiva com o bambu

ANDRÉ FRAGA DAMASCENO UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

ANDRÉ FRAGA DAMASCENO

APROXIMAÇÕES DE UMA PRÁTICA AUTÔNOMA CONSTRUTIVA NA ARQUITETURA: diálogos entre Brasil e Colômbia pela vivência construtiva com o bambu

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade Federal Fluminense como requisito para a obtenção do grau Bacharel em Arquitetura e Urbanismo 1


ORIENTADOR: Prof. Dr. Ronaldo Brilhante

Niterói 2019

Sumário 1.0_INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 3 2.0_ETAPAS ............................................................................................................... 6 2.1_VIVÊNCIA_COLÔMBIA ........................................................................................ 6 2.2_PROJETO CASA DAS MARITACAS ................................................................... 9 2.3_PRÁTICA ............................................................................................................ 18 2.4_LEVANTAMENTO E PESQUISA DE CAMPO ................................................... 21 2.5_ENTREVISTAS .................................................................................................. 23 3.0_CONTEXTO DE PRODUÇÃO DA ARQUIETURA EM BAMBU ......................... 63 3.1_A QUESTÃO CULTURAL................................................................................... 63 3.2_A QUESTÃO NORMATIVA ................................................................................ 67 3.3_LOCAIS DE PRODUÇÃO E A QUESTÃO DO TRANSPORTE .......................... 70 3.4_A QUESTÃO DA MANUFATURA: ...................................................................... 72 3.5_A QUESTÃO DA PROFISSIONALIZAÇÃO ........................................................ 73 CONSIDERAÇÕES FINAIS: uma análise preliminar ................................................ 76 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 77

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1.0_INTRODUÇÃO Durante minha trajetória acadêmica investiguei meus interesses no âmbito da arquitetura e do urbanismo. Das experiências que colhi, aquelas que mais me atentavam quase sempre envolviam o contato com a natureza, técnicas construtivas naturais e a consciência de todas as fases do processo construtivo de maneira íntima do processo. A partir daí me surgiram duas questões: Por que o contato com a natureza sempre me atraiu? Por que sempre me identifiquei com trabalhos executados manualmente? Para tentar responder tais perguntas, procurei compreender melhor a história de meus antepassados indígenas. Minha bisavó materna, Jacira era filha de pai indígena e, segundo a antropóloga Miriam Martins Alvares, muito provavelmente pertencente ao grupo étnico dos Boruns (Krenáks). Infelizmente consegui coletar poucas informações sobre ela.

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Figura 1 Bizavó Jacira Maia Carvalhar Fonte:autor

Entretanto, depois dessa constatação, comecei a estudar mais sobre esses povos e conversando com a Miriam, bem como lendo revistas de antropologia. Assim, percebi que minha vontade de trabalhar manualmente com os materiais e de estar em contato mais íntimo com a natureza, estava muito provavelmente relacionado com essas origens. Os povos originários possuem uma visão de mundo e uma postura de atuação diante da realidade bastante distinta do pensamento e cultura ocidental. Umas dessas diferenças é a sua relação com a natureza, de maneira que não existe a separação do indivíduo com a natureza, mas sim uma relação mais íntima de construção em comunhão com o espaço onde se habita. Outra distinção do pensamento ocidental que me chamou atenção é da produção manual de seus espaços e utensílios, estes carregados de originalidade e identidade. Deste modo, percebi que essas questões sutis são pouco abordadas no campo da arquitetura e urbanismo. Durante a graduação, somos ensinados a desenvolver habilidades ligadas à concepção do objeto arquitetônico. Entretanto somos pouco instigados a investigar nossas capacidades e habilidades manuais. Assim, diante de tais ponderações, sentia a necessidade de experimentar a materialidade das minhas ideias e concepções. Somado a essa inquietação, existia 4


ainda a volumosa carga horária de trabalho exigida para tais processos de concepção projetual e, muitas vezes, sem qualquer reflexão a respeito do porquê estávamos produzindo aquilo. Assim, dada essa distância entre a ideia e sua materialização, o processo de concepção na arquitetura parecia muitas vezes alienante. A partir daí, comecei a buscar caminhos que poderiam me conduzir a uma concepção de arquitetura mais independente e, consequentemente, menos alienada, e que me levasse a trabalhar manualmente com materiais naturais. Assim, como forma de sistematizar minha investigação, dividido aqui minha trajetória em cinco etapas. São elas: Vivência Colômbia(1), Projeto(2), Prática(3), Levantamento e pesquisa de campo (4) e Entrevistas(5). As três primeiras etapas foram experiências que precederam a realização dessa monografia, sendo as duas últimas etapas realizadas durante a realização da mesma.

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2.0_ETAPAS 2.1_VIVÊNCIA_COLÔMBIA A etapa do intercâmbio foi muito importante pois, a partir dela, desencadeou minha busca por um caminho mais autônomo na produção da arquitetura. No segundo semestre de 2017 participei do programa de intercâmbio da UFF escolhendo a Colômbia como país de destino. A escolha de um país latino americano, em primeiro lugar, devia-se ao fato de ser um país de formação histórica e social muito parecida com a do Brasil, o que resultou em uma cultura similar e, portanto, possibilitaria maiores diálogos entre essas duas realidades. Por outro lado, não menos importante, a Colômbia é uns dois países que mais desenvolveu a técnica construtiva com o bambu. A gramínea está presente na arquitetura pré-colombiana dos povos originários, na arquitetura colonial e hoje continua sendo desenvolvida por arquitetos, camponeses e construtores. Sem dúvida ,China Índia e Colômbia são os países que melhor desenvolveram técnicas com a construção com bambu. Os dois primeiros o que se refere a construções de todo tipo que inclui desde cúpulas até pontes atirantadas.O terceiro, Colômbia no que se refere a construção da habitação e a aplicação desse material na fabricação de lajes de concretos de grandes edifícios; técnicas que foram idealizadas respectivamente por camponeses e construtores vindos do Estado de Caldas.(MANUAL DE CONSTRUÇÃO COM BAMBU, OSCAR HIDALGO LOPES)

Minha chegada se dá na cidade de Manizales, capital do Estado de Caldas que está localizado no chamado Eixo Cafeeiro do país. Essa mesma região caracteriza-se por concentrar centros de pesquisa, ensino, fazendas de cultivo do bambu, artífices bambuzeiros, ou seja, toda uma cultura construtiva milenar, sendo esse o motivo para a escolha da Universidade Nacional de Colômbia com a sede em Manizales. Aqui vou apresentar um pouco do que foi essa experiência do intercâmbio envolvendo meus estudos na Escola de Arquitetura e Urbanismo, a viagem pelo país, bem como minha participação no congresso e em oficinas. Todas essas experiências serviram como ponto de partida das reflexões aqui expostas e compõem boa parte do trabalho em si. Meu primeiro contato com a técnica construtiva com o bambu no intercâmbio acontece na Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Nacional de Colômbia em dois momentos. O primeiro quando cursei a matéria de Desenho e 6


Construção com Guadua e Bahareque. Aqui não irei aprofundar a análise dessa experiência pois falarei de forma mais detalhada quando for falar do projeto Casa das Maritacas. Em um segundo momento, quando cursei a matéria “A poética do caminhar”. O proposta das aulas consistia em fazer caminhadas semanais ao redor da cidade de Manizales que é caracterizada por apresentar um entorno muito rural e por isso tínhamos a oportunidade de vivenciar essa transição da periferia para a zona rural. E foram nessas localidades onde pude encontrar muitas casas feitas com bambu. Pude observar os diferentes tipos de construção. Desde edificações antigas do período da colonização até de recente produção. Ainda durante o período letivo participei do (International Bamboo and Guadua Symposium – SIBGUADUA) Simpósio Internacional de Bambu e Guadua. Dentro do evento participei de duas atividades: “oficina de desenho paramétrico e construção de estrutura espaciais laminares em bambu” e o Simpósio em Bogotá. A oficina aconteceu na cidade de Manizales foi ministradas pelos arquitetos Héctor Archila (Colombia/Inglaterra), Jed Long (Austrália) , Ricardo Leyva (México) e durante 3 dias desenvolvemos 2 estrutura de bambu: uma estrutura laminada trançada com latas de bambu e outra estrutura de bambu em “grid shell”.

Figura 2-Oficina de bambu trançado

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Essa experiência possibilitou uma aproximação com o material que ,até aquele momento, não tinha vivenciado. Aprendemos a traçar o bambu de forma a criar cada vez mais rigidez na peça, a observar a estrutura, a manusear ferramentas como serra em arco, furadeiras, lixadeiras, parafusadeiras e outros equipamentos necessários a produção daquele objeto arquitetônico.

Figura 3-Estrutura laminada.Teste de cargas

No Simpósio ocorrido em Bogotá ,na Universidade Nacional de Colômbia pude assistir palestras de bambuzeiros, arquitetos, engenheiros, pesquisadores acadêmicos , empresários ligados ao setor produtivo com o bambu de várias partes do país e do mundo que compartilharam suas experiências , em pesquisas e projetos com o bambu nas mais diferentes áreas do conhecimento como: arquitetura,

Figura 4 Simpósio Internacional Bambu e Guadua

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agronomia,

engenharia,

farmacêutica,

a

alimentícia,

de

energia,

ecologia,

demostrando assim a pluralidade de possibilidades de uso do bambu. Após o período letivo, início juntos a amigos uma viagem em direção ao sul do país, a até a cidade de Quito, no Equador. Ao longo desse trajeto continuei minha pesquisa empírica de caminhar, ver, observar e documentar essa cultura construtiva com o bambu que aqui e ali apareciam na paisagem durante a viagem.

Figura 5 Parque Arqueológico de San Agustin

2.2_PROJETO CASA DAS MARITACAS Projeto casa das Maritacas, teve início com a realização da matéria Desenho e Construçao com Guadua e bahareque, ministrada pelo professor Gilberto Flores na Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Nacional de Colômbia.O projeto foi um pedido de minha mãe, Marilane,que necessitava de um ateliê e que fosse também sua casa. O programa continha em um primeiro pavimento: um ateliê, uma sala, uma cozinha ,uma área de serviço ,um lavabo e uma varanda. Já no segundo pavimento: um quarto e um banheiro. Antes de introduzir o projeto é importante ressaltar aqui duas observações. A primeira refere-se ao fato de que quando realizei o projeto, no intercâmbio, apesar de estar buscando objetivos semelhantes aos que relato no TCC ainda não estava totalmente cristalizado os porque daquela concepção arquitetônica. Por esse motivo irei dividir a análise do projeto em dois momentos: na realização do trabalho na Colômbia e no entendimento posterior do projeto levando em conta as reflexões 9


levantadas no TCC. A segunda observação diz respeito ao fato de, já nesse momento, estar utilizando trechos das entrevistas (as entrevistas virão posteriormente no trabalho) como forma de me ajudar no entendimento do projeto. No primeiro momento a realização do projeto tinha como principal objetivo, a utilização do bambu, no caso da espécie Guadua angustifólia e da técnica construtiva bahareque como técnica/material de construção para o projeto. Outra diretriz importante era a utilização da topografia local como parte da concepção da forma arquitetônica. O relevo de aclive é caracterizado por afloramentos rochosos espalhados pelo terreno. Essas rochas são pensadas como estruturas que cumpririam o papel das sapatas da construção. Outra demanda importante: o ateliê deveria ter um pé direito alto para a exposição dos quadros e ter pouco pilares proporcionando um ambiente amplo.

Figura 6 Detalhe construtivo - pilar e sapatas

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Figura 7 Detalhe construtivo – parede

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Figura 8_Plantas baixa segundo pavimento

Figura 9 Plantas baixa primeiro pavimento

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Figura 11 Casa das Maritacas - Entrada

Figura 10 Casa das Maritacas - Estrutura Figura 12 Casa das Maritacas - Varanda

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Figura 13 Casa das Maritacas - vista interna

Figura 14 Casa das Maritacas - vista interna

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Figura 15- Fotos da Maquete

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Figura 16- Maquete

Em um segundo momento o projeto assume um outro sentido de análise. Agora me interessa vê-lo como objeto de investigação para uma aproximação de uma arquitetura com mais autonomia em sua produção. Desse modo, busquei pensar em como poderia compreender todas etapas da produção dessa arquitetura ou mesmo participar na prática dessas etapas.

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Figura 17- Esquema estrutural.Restaurante na Colômbia

Figura 18- Base em concreto e metal-Fonte: Fabiana Carvalho

Figura 19

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Figura 20-Detalhe ligação do pilar com a pedra

2.3_PRÁTICA

Figura 21 Oficina Cerbambu

Após a volta do intercâmbio, apesar de ter participado das oficinas relatadas acima, sentia que me faltava ainda uma maior aproximação com a experiência manual produtiva do bambu. Assim, busquei lugares nos quais poderia aprender esses conhecimentos. Isso me levou a dois locais: ao Instituto Cerbambu e ao EscritórioOficina Bambuê Arquitetura Viva.

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Figura 22 Ferramentas para produção de mobiliário

Figura 23 Galpão de Armazanemento dos bambus

Figura 24 Mesa de cabeceira produzida no curso

Figura 25 Lúcio Ventania e autor

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O primeiro local, Cerbambu - Centro de Referência do Bambu e das Tecnologias Sociais, criado pelo mestre bambuzeiro Lúcio Ventania ,na cidade de Ravena em Minas Gerais é “um espaço voltado para pesquisa e desenvolvimento de metodologias para a popularização do bambu no Brasil” (Site Cerbambu).Ali participei do curso de movelaria em bambu durante quatro dias aprendendo todos os processos necessários a produção de um pequeno móvel de bambu: desde o corte das varas a serem usadas ,o tratamento , o esquema para montagem , os tipos de uniões entre as peças, os acabamentos finais , as ferramentas e as técnicas necessárias para a produção do móvel.

O segundo local procurado foi o Escritório Oficina Bambuê Arquitetura Viva. Inicialmente entrei em contato com a arquiteta Fabiana Carvalho e expliquei sobre minha vontade de aprofundar meus conhecimentos sobre a prática construtiva com o bambu. Dessa conversa surgiu o convite para a trabalhar durante, duas semanas, na construção de um mezanino em um apartamento da Zona Sul do Rio de Janeiro. O projeto, se desenvolveu no ateliê compartilhado com o coletivo Organicidade, localizado na Fundição Progresso e foi executado a 6 mãos: Fabiana Carvalho, o bioconstrutor Leonardo Soares e eu. Ali pude ampliar um pouco mais meu conhecimento das técnicas de marcenaria com bambu e compreender uma escala de produção do objeto de trabalho que já não era mais a de um móvel, mais de um mezanino o que se aproximava a escala da arquitetura e trazia novos desafios e aprendizados construtivos.

Figura 26 mezanino produzido pela Bambuê Arquitetura Viva

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2.4_LEVANTAMENTO E PESQUISA DE CAMPO O levantamento de campo era necessário por dois motivos: o primeiro para adaptar o projeto da Casa das Maritacas as medidas encontradas em campo, uma vez que o projeto foi feito inicialmente com fotos do terreno. Desse modo, alguns pilares sofreram alteração de tamanho e algumas sapatas foram retiradas dando lugar as próprias rochas que cumpririam o papel das sapatas. O segundo motivo, para que o levantamento pudesse ser uma possibilidade de experimentação daquele espaço. O ato de colocar as estacas, amarrar o barbante e identificar os afloramentos rochosos e as árvores no local me possibilitava uma aproximação com o espaço que não a teria se tivesse recebido um levantamento pronto. Como o trabalho ocorreu de manhã até de tarde durante três dias, também pude observar os ciclos da natureza e da dinâmica local. Por sua vez a pesquisa de campo objetivava identificar e mapear os bambuzais presentes na área com fim de pensar um manejo, e tratamento local. São identificadas duas espécies que seriam propícias para essa fim da construção civil são elas: o Philostaquis aurea e o Dendrocalamus giganteus. A primeira de característica alastrante, pode ser tratada com fogo e por seu diâmetro menor, é mais indicada para a construção de mobiliários, mas quanto usadas em feixes amarradas também pode ser usada na construção civil. Já a segunda espécie de tipo entoucerante também cumpre função estrutural e seria uma ótima espécie para fins construtivos. Para o tratamento do Dendrocalamus giganteus (Bambu Gigante), poderia ser utilizado o método de tratamento por imersão como segue a explicação da arquiteta Fabiana Carvalho abaixo: Eu acho que se tiver o bambu bom tipo isso o gigante, um bambu bom para a construção, tratar é a melhor escolha. O impacto é muito menor. Pelo transporte e o custo também seria menor. A própria pessoa pode tratar ne.Não precisa de uma estação de tratamento. Você faz um tratamento local, temporário e com certeza ficaria muito mais barato e é muito mais interessante. .(FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA ,Pg 4) Eu acho que essa é uma boa solução de fazer um buraco e colocar lona é infalível. Funciona com certeza. Ou aquele método de furar cada gomo e injetar o produto. Só que o gigante ele tende a rachar ,ele costuma a ter muita rachadura então o produto pode vazar um pouco. Acho que o gigante valeria a pena ele é muito pesado para manusear tem a parede grossa pra ficar furando.Eu faria o tanque de imersão com uma lona grossa para não vazar .(FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA AO AUTOR)

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Os produtos utilizados para esse tratamento são conhecidos como sais de boro e borax que se cristalizam dentro da parede do bambu tornando-o “amargo” para os cupins e consequentemente imunizando a peça. O interessante desse método, como relatado por Fabiana Carvalho, é que ele pode ser feito no canteiro de obras, de forma fácil de ser executada e com baixo custo de produção.

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2.5_ENTREVISTAS As entrevistas serviram para tentar compreender de forma mais ampla o processo de produção da arquitetura com bambu e cumpriram a função de ocupar as lacunas que a pesquisa nas outras etapas não consegui preeencher. Dessa forma, deveria me debruçar no entendimento da cadeia produtiva desse material. Quais os maiores desafios para produção dessa arquitetura? Como se estabelece a cadeia produtiva desse material, a produção, o transporte, amanufatura? Em relação ao projeto, Casa das Maritacas procurei fazer perguntas que me ajudassem a entender como poderia funcionar o processo de produção da casa. Para isso, precisaria conversar com pessoas que estivessem envolvidas nesses processos produtivos com o bambu. Essa necessidade deu origem a 6 entrevistas semiestruturadas com: Guilherme Naoum, Lúcio Ventania, Fabiana Carvalho, Chepe Monõz e Jaime Peña e Thiago Oscar. A partir da realização das entrevistas foram identificados alguns temas principais dentro do contexto de produção da arquitetura em bambu: Questão Cultural; Normativa; produção/transporte, manufatura e profissionalização. A questão cultural foi colocada em primeiro lugar por sua maior importância que será justificada em sua parte especifica.

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GUILHERME NAOUM Entrevista não está na integra

Figura 28 Guilherme NaoumFonte:facebook.com/guilherme.naoum

Eu gosto muito da estética do bambu de como pode trabalhar ele, da facilidade de se produzir de gerar peça de gerar esse trabalho. O bambu é democrático qualquer um consegue cortar furar sabe. O aço por exemplo você tem que ter uma siderúrgica pra gerar sabe. É um sistema produtivo que qualquer um pode ter uma touceira e plantar bambu. Ta gerando essa matéria prima e trabalhando e gerando esse produto final. Qual a cadeia produtiva do aço? Eu não consigo fazer. Você também acredita que não. Se juntar todo mundo aqui não faz. Então é muito mais democrático mais fácil.

E esse bambu que vocês utilizaram você comprou desse mesmo fornecedor ou foi difícil chegar na obra?

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Não, foi sempre tranquilo. Esse fornecedor é um fornecedor que eu compro de Angra que é o Bambujango. Não conheci nem procurando na internet não. De um meio conhecido meu mesmo .Daqui eu não conheço que venda perto guadua. Na hora eu estava procurando sem saber até eu procurei, umas arquitetas que me indicaram que usavam, talvez comprariam e que teriam estoque de guadua. Eu queria fazer com guadua não queria fazer com outro. Ai nessa eu lembrei que tinha esse contato ai eu fui e virou um parceiro bem interessante. É eles tem um sistema muito bom da produção ,do tratamento é uma produtora mesmo sabe? Bem refinada assim. O sistema deles é muito bem-sucedido então eu. Ai que entra a questão só do frete, então é bom sempre estar comprando em escala, criar parcerias assim sempre vai ajudar. Quer comprar um frete já fala com outros parceiros que aí também insere já no montante mais peças ai paga o mesmo frete todo mundo escolhe suas peças. Então dá pra ir fazendo umas parceiras pra ir diminuindo esse custo porque e isso, por sinal, é essa dificuldade dessa questão da cultura que dificulta muito esse trabalho de bambu. Na Colômbia acredito que você possa até falar melhor do que eu que não fui mas acredito que lá você encontra muito mais manufatura a sua disposição. Desde a produção dessa matéria prima quanto das variadas manufaturas de placas de telas de não sei o que sabe, de corte de peça, de rolo, esteira qualquer coisa sabe. A manufatura é muito abundante. Que aqui não é. Então você acaba tendo muito pouco fornecedores ,pouco poder de escolha ,pouca concorrência, a produção fica mais complicada e você tem muita. Você acaba tendo que fazer todo processo ,você não consegue ter uma facilidade como aqui por exemplo a nossa cultura é essa convencional a construção nossa convencional ,tijolo, cimento, concreto armado. Então aqui a cada esquina vai ter uma loja dessa de construção que eu vou lá eu compro tudo que eu quero e eu construo, se eu quiser uma malha de ferro soldada eu compro do tamanho que eu quero, da grossura que eu quero ,então você tem esse leque de opções assim facilita a sua construção com essa tipo de material. Então assim por faltar essa produção de manufatura que pra mi é só cultura até por conta dessa questão democrática do bambu, da facilidade de se produzir o bambu e de se gerar manufatura de ser bem democrático isso é só questão de cultura que eu acho que empaca, mas dificulta pra quem começa porque você acaba tendo que fazer o procedimento compra bambu ai eu to comprando desse que vem guadua ,mas 25


geralmente eles não tem bambu fino ai vou ter que comprar de outro produtor que tem ai esse produtor não trata da mesma forma. Ai se eu quiser um bambu tratado eu vou ter que fazer esse pedaço dessa cadeia produtiva ,dessa matéria ,então dificulta porque você, obviamente se tivesse a cada esquina eu vou ali do lado e compro uma tela pronta de bambu eu fazia já umas telas pra montar a casa de pau-a-pique. Olha a facilidade que isso entra na nossa economia. Eu acho que tem um potencial do caramba. Isso que é maneiro do bambu. Como ele é democrático essa palavra é muito importante, é fácil de produzir ,é aqui do nosso clima, dá pra caramba, a gente entra em qualquer estrada tem bambu, é só a pessoas se interessarem por produzir isso ter demanda de giro dessa matéria e tenho certeza que a capacitação disso é muito fácil de mexer. Qualquer artesão que mexe com madeira pode se capacitar pra mexer com bambu também e é muito mais fácil acesso da matéria.- Joar Arquitetura e Bambuê Arquitetura Viva.

Figura 29 área de lazer Pendotiba Joar Arquitetura e Bambuê Arquitetura Viva. Fonte:https://www.facebook.com/joararquitetura/

E na questão desse projeto você acha que se fosse com outro material teria saído mais barato? Se fosse com madeira teria saído mais barato? Ou o bambu foi pau a pau?

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A madeira de cara ela já tem uma trabalhabilidade mais difícil pelo peso. Quando você está trabalhando com uns madeirões, um bambu muito grosso que eu tenho aqui por sinal você chegou a ver umas peças bem grossas ali. É muito mais leve então po, aquela madeira que eu fiz de degrau ali é muito mais pesada e é metade do tamanho. Então a trabalhabilidade já muda nisso. Duas pessoas tranquilo, sem fazer muito esforço, levantam uma peça de bambu. Qualquer peça. Duas pessoas tranquilo levantam sabe? É madeira não. Dependendo da peça.3 ,4 marmanjos segurando aí fazendo muita força sabe. Então a trabalhabilidade vai ter a produtividade de eu pegar conseguir botar um pilar no prumo ali levar, transportar. Bambu e. madeira são dois ritmos diferentes é .Mas por ia.Os preços por aqui no Brasil ,os preços vão se equivaler. O bambu vai tá um preço caro por causa da pequena produtividade, poucas pessoas fazendo pouco acesso, longe. Então quanto mais pessoas tiverem produzindo aquilo ali sabe ai entrando a concorrência. O cara vai tentar produzir melhor e mais barato de forma melhor, mais quantidade, qualidade então vai gerando esse padrão de qualidade agora se você tem um fornecedor só perto você comprar 3 ,4 peças a mais para poder selecionar as peças boas pra ter padrão de qualidade é esse que tem sabe?

Você compra de uma pessoa que produz lá em Angra.Se você resolvesse produzir aqui e tratar aqui seria viável isso?

Então é aquilo a gente ta entrando exatamente, na necessidade de eu fazer toda cadeia produtiva desse material então o tempo energia .Depende de seu foco tempo energia ,capital tudo mais. Não é difícil é fácil. Mas ai você tem que ter um terreno num local legal pra botar. e tem que ter uma manutenção muito boa .Tem que ter o manejo sabe? Manejo ele vai crescendo vai quebrando você volta lá dois anos ta o ninho de mafagafinho. Não consegue ter acesso direito. Então é difícil é isso eu ter necessidade de ter que fazer toda cadeia produtiva e não ter acesso alguém que ta fazendo cada ponta dessa cadeia produtiva e facilitar. Aí facilita a produção. Quanto mais eu tenho que fazer todo o trabalho mais eu fico limitado no tempo na ação, na quantidade de trabalho que eu tenho que executar para fazer um serviço. Então fazer uma casa, tenho que cortar o bambu, tratar o bambu, posso comprar tratado posso comprar uma tela pronta,sabe.? Você consegue articular o tempo de uma forma muito 27


melhor e até custo também. É isso vai ter que ter mini tudo sabe? A estação de tratamento, uma oficina de trabalho, um manejo de bambu, olha quantas infraestruturas eu vou tendo que criar pra a fazer . A dificuldade é essa ter toda a cadeia produtiva,ter poucos fornecedores, poucos agentes desse universo. Pô a Colômbia é uma quantidade enorme ai já facilita . Qualquer projeto que você tenha na cabeça você dá uma volta vê quem ta vendendo.Que.po já comprar as coisas prontas como você compra o painel ,como você compra uma grade é uma manufatura fácil de executar .É muito pratica.

Figura 30 àrea de lazer Pendotiba. Fonte:https://www.facebook.com/joararquitetura/

Joar

Arquitetura

e

Bambuê

Arquitetura

Viva.

Uma demanda de projeto, quais são os campos férteis de trabalho?

Eu tenho sentido crescer, eu acho que ta crescendo é, desde construções civis assim residências acho que mais pesadas quanto efêmeras. Então a estética entrando em muitos lugares eventos, entrando em feiras, esse crescente ambiental, o bambu é carregado também junto. A nesse bolo, nesse universo. Conforme o universo traz o bambu ele está nessa pegada. Então a pessoa que faz evento vegano pô vai 28


se interessar muito mais em fazer as barraquinhas de bambu. Então esse universo criado. E essa tendência está aumentando com a questão ambiental aumenta. Eu acho há uma tendência crescente porque a gente não vai despreocupar com o meio ambiente .Você não vai ter a gelera, “o agora pode sujar o rio “ se não vai ter esse processo é sempre o processo pra mais. Mais eficiência, mais sustentabilidade, mais empreendimentos de outras formas ,começar repensar todo urbano, toda a forma de produção. Sempre o bambu ele vai ta dentro disso .Ele vai ta nesse escopo. Por mérito próprio dele .Não é por que ele ta de marketing .É uma espécie ,que cresce rápido ,ela bate velocidade ,tem todas essas qualidades do bambu que faz ele ta umas das principais matérias dessa cara, dessa universo ai meio ambiente, preocupação.

E em questão de manutenção você, por exemplo essa obra que você fez como é feita essa manutenção ?

Eu mantenho muito contato com todos os clientes assim do trabalho, sabe? Visito é criado assim um manual de uso, de tempo em tempo você tem que ficar aplicando a manutenção das estruturas de lixar, envernizar, tanto pode ser pela estética. Qualquer material em natura vai sofrer ação do tempo. Madeira ,aço, qualquer coisa, minhas grades estão enferrujas , em natura sofre até. Mas você não tem proteção química alguma coisa assim. Então você vai ter que aplicar manutenção. Então você tem num tempo curto uma manutenção estética. Pô descascou um pouquinho pelo uso ,acabou rabiscando pra manter um aspecto como uma madeira e você tem a manutenção do tempo assim. Eu ainda estou na fase de teste mantendo essa presença assim acompanhando e não tem uma produção em padrão . Não é um material que ele é produzido. Então ele vem todo diferente então ele vai tentar selecionar os mais parecidos de espessura de parede. Então você vai ter que fazer um trabalho de seleção das peças, já dependendo essa cadeia produtiva anterior que é seu fornecedor se ele ta colhendo certo se ele ta plantando certo se ele ta fazendo os esquemas certo sabe. De produção do bambu então você vai pegar um material que ele é todo disforme. Que são tamanhos entre colmos diferentes, são espessuras de parede diferentes, então é um leque muito aberto assim. Eu até fiz uns testes. Eu faço uns testes assim. Quando eu faço uma estrutura que é pra peso eu faço o cálculo faço o teste e eu pego uma peça padrão assim até mais fina geralmente escolho uma 29


das piores peças e faço o teste nela de esforço. Nessa daqui eu fiz e na última de Botafogo também e aí faço o teste para ver qual é o esforço pra romper a peça e ai eu mesmo que faço o cálculo estrutura então eu já dimensiono assim com certeza do que eu estou fazendo usando a peça mais frágil.

Mas aí esse teste que você faz é colocar peso nela?

Eu apoio geralmente no andaime na obra que eu to .Apoio lá .Deixo um vão ai de dois metros, menos entre os andaime e a peça .Pra ter esse vão 2m e com corda vou pendurando saco de cimento que eu já comprei pra obra e ai no momento ela vai romper .Vou ter ali um vão, uma carga e a seção do bambu de parede e de seção inteira ,transversal e ai você consegue fazer o cálculo de tensão admissível daquela peça toma com base .Majora também pra caramba. Bota o coeficiente de segurança grande alto, porque ne é uma peça produzida com um sistema de controle forte então você desconta isso num coeficiente de segurança em várias etapas desde a carga. Todo o processo. Etapa do cálculo. Você vai colocar o fator de segurança e ai pra mim aqui eu faço teste. Então por exemplo essa peça que eu usei aqui eu acho frágil considero uma peça frágil mas eu botei pra segurar uma peça pesadíssima .segurando os bambus mas eu to querendo testar pra ver até aonde vai. Mas nas obras pra cliente eu não inovo nesses esquemas. Quer dizer inovo. Que nem aquele apoio que eu fiz em Botafogo .Só que ai eu calculei também. Fiz todo cálculo estrutural da sapata do piso do dimensionamento do ferro .Não tem muito que fugir sabe.

Ai é o calculo parecido com a estrutura de concreto?

O trabalho é parecido quando você trabalha com pilares de aço tubulares. Ai praticamente mesma formula de cálculo só que você tem os vãos de bambu ne? Mas a seção a formula de cálculo é a mesma coisa. Você vai tirar a resistência do material por esse teste. A única coisa que muda nesses calculo é realmente se é um material misto, que é concreto armado para o aço. Ta fazendo a conta só com aço. A geometria da peça que você ta usando e a tensão admissível de cada material especifico do material que aí você faz esse teste de rompimento aí tira a tensão admissível joga no cálculo e faz o cálculo normal. 30


Esse teste faz não tem erro?

É isso você usa a peça mais fina.aA gente fez um corpo de prova também da sapata .Ai e fizemos esse testizinho ai você tem certeza que é uma peça boa se ta rachada .Ai a gente reforça as peças com as braçadeiras nos pontos de fragilidades já

vai

fazendo

assim

reforços

pontuais

e

sempre

fica

uma

estrutura

hiperdimencionada. Você acaba hiperdimencionando pra aquela fator de segurança muito grande sabe.

Figura 4 -àrea de lazer Pendotiba Fonte:https://www.facebook.com/joararquitetura/

.Joar

Arquitetura

e

Bambuê

Arquitetura

Viva.

Mas assim sabe qual que é a formula de tratamento, tratamento por imersão, sais de boro?

Esse é tem o outro ácido que eu sempre esqueço o nome que você faz uma imersão depois eles fazem enxerto eles furam cada gomo ali e enxertando esse produto. Ele vem até dependendo da peça que eu peço que as vezes já tem uma peça 31


la parada .Quando eu peço um carregamento grande eles tem que cortar e trazer e produzir mais peças e ainda vem toda melada desse produto ai sabe. “Então assim o ideal é que a gente já tenha isso tabelado e a produtora também já te vender a peça com tais resistências ter uma organização de uma forma. Como eu ligo para uma empresa de concreto, de fazer laje, né de comprar cimento concreto e você fala eu quero 20 Mpa,15Mpa,10Mpa você escolhe e sabe o traço exato para fazer aquilo que a necessidade manda O bambu poderia ser assim também como uma viga de aço que você compra ,eu quero tal tamanho para aguentar tanto peso com a tal resistência. Então o bambu se tiver um sistema de tratamento, ai vem a excelência também de toda cadeia produtiva em estar cortando no tempo certo.O manejo da touceira ser mais preciso e correto e não burlar e ter fiscalização.Ai você começa entrar em um campo de burocracias organizacional de toda essa cadeia produtiva ne. E é necessário pra gente ter segurança do que faz também e respaldo quando faz de forma correta , sabe?. Isso dá respaldo. Você cria uma norma para poder seguir e ter o respaldo que você está fazendo aquilo corretamente. Então a gente aqui como não tem essa norma não tem nada a gente vai pesquisando como é feito lá em um lugar ou em outro e utiliza a norma técnica de outro lugar e tenta aplicar. O ideal seria isso essas cadeias produtivas serem mais eficientes. O cara comprar essa peça com um padrão de parede interna pois todas teriam sido colhidas em um tempo próximo de tempo de vida, você começa conseguir padronizar por mais que seja em natura por mais que seja bambu, tem as peculiaridades você vai ter um mínimo de padronização acontecendo. Facilita toda essa parte de cálculo. No caso o fato de não ter isso me acarreta ter que comprar 3 ou 4 vezes a mais de peças para fazer uma seleção boa, isso é um fator muito importante eu compro sempre a mais.Isso já encarece o preço final pro cliente por que eu to tendo que comprar a mais até por que se ele ta me contratando pros trabalhos e ele sabe que do meu acabamento.Ele vai me exigir um acabamento muito bom ,refinado de qualidade .Ai minha proposta é essa tirar esse jeito desleixado de fazer as coisas e sempre deixar com aspecto bem refinado Até pra tentar entrar no mercado de áreas de lazeres assim. Pra eu fazer esse trabalho como eu não tenho essa segurança de comprar peças e ela vir toda perfeitinha eu tenho que comprar a mais sempre a mais pra ter a garantia de que eu vou conseguir entregar peças boas e com paredes parecidas. Eu uso as vigas tento selecionar. A gente tem esse trabalho de seleção o que vai ser viga 32


,o que vai ser pilar e analise pelo peso. A peça em si o que ela vai se comportar de forma melhor e o que você consegue padronizar melhor e ai vai trabalhando assim.

Eu fico pensando também que o desafio é mão de obra

Mas como eu to trabalhando com uma turma eu pego muito mais obra convencional eu to trabalhando com uma turma de pedreiro mesmo, marceneiro, eletricista pô eu já to ensinando eles assim, eles já estão fazendo. Cortando bambu fazendo encaixe. Os caras são safos ne cara. Pega a manquita sabe usar, tem quase um gancho do capitão gancho a maquita na mão do pedreitro.Igual o Jean fazendo aquela brincadeira lá. Pô isso é talento sabe? Aqueça afinada que ele deu ali na maquita não passa desapercebido do meu olhar não,cara. Isso é muito talento e pedreiro tem isso. Ele só não teve acesso a executar sabe eles têm o talento de uma confiança de uma segurança e po eles vão tirar de letra e já tiraram. Os que trabalham comigo já fazem, já boto o cara pra fazer, faço um dois mostro e fiscalizo obviamente fico ali exigindo o padrão de qualidade que eu tenho que entregar. Mas é isso não é tanto problema se você vai depender realmente deu saber passar o que eu quero e ensinar.

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FABIANA CARVALHO Entrevista não está na integra.

Figura32 - Fabiana Carvalho Fonte: Site Bambuê Arquitetura Viva

Quando eu fui pra lá ,eu fui justamente pra pesquisar como o Brasil assim o Rio de Janeiro mais o Brasil poderia se devolver na construção com bambu assim como lá e desenvolvido ne.Isso era umas das grandes coisas que eu queria entender porque lá tem tanta construção é pais vizinho e aqui não tem. Ai acho que são duas coisas principais que eu senti que lá tem. Primeiro a norma construtiva, aqui no brasil está sendo estudada. Acho que alguns anos a gente tenha. Mas acho que a norma traz uma credibilidade muito grande por escritórios e pros clientes de que eles conseguem projetar e construir de acordo com a norma então traz muita segurança. Outro ponto que eu senti que lá tem é o curso profissionalizante. Alguns cursos profissionalizantes, no Sena que equivale a nosso Senai isso eu achei fundamental, que cria mão de obra especializada então pra gente arquiteto que projeta é muitas vezes eu sinto que a gente precisa ,está numa obra convencional a gente faz o projeto a gente tem nossa equipe de mão de obra ,já especializada mais na construção convencional ,mas se a gente precisa contratar um cara pra ,sei lá ,pra mexer na 34


elétrica ,mexer na hidráulica a gente consegue contratar , na construção com bambu não .Tem um grupo ali formado mas é um grupo que não está tão coeso. Não é uma equipe que a gente consegue enquanto arquiteto manter. Uma equipe sempre, porque não é sempre que tem trabalho. Então você acaba fazendo uma coisa mas quando surge o projeto você fica meio sem ter mão de obra pra contratar e por não ter um ensino no profissionalizante eu acho que se deixa uma base muito fraca pra profissionalizar realmente a construção e eu vi essa diferença lá. De tipo fulano fechou uma obra e que os encaixes vão ter muitas bocas de peixe e ai você consegue contratar especialistas em boca de peixe .Você viu isso lá? Não sei se você viu? Muito arquitetos e engenheiros falavam isso. Cara genial sabe aqui isso né. A gente fica cassando quem já fez cursos.Quem já aprendeu a técnica, mas não tem um órgão que regulamenta .Então eu acho que a profissionalização é um passo importante pra construção de bambu aqui no Brasil vingar. Mais para ter mercado realmente, pra quem quer trabalhar com isso assim cola lá eu vi que isso acontecia. Lá eu vi além disso, a cadeia produtiva do bambu era bem desenvolvida além de mão de obra para a execução tinha as fazendas certificadas que plantam e vendem. Está tudo ali no diâmetro que você quer na humidade certinha que foi tratado, que não poluiu. Você consegue comprar a quantidade e aqui no Brasil ainda é meio você vai tocar um projeto e você ainda fica preocupado será que eu vou realmente conseguir o bambu e ai vai vir não sei de onde que ainda são poucos que produzem e ai fica caro, e ai nem sempre o cliente entende o bambu era para ser barato? Mas não tem uma cadeia por traz né.Então eu vi que na Colômbia que tava rolando. A gente visitou vários locais de plantio e locais de tratamento e deu para ver que tem um monte. E tem um monte que a gente não visitou também porque não dava. Então tinha quem plantava, tinha quem tratava, escritório de arquitetura de engenharia e mão de obra para contratar e Norma construtiva e curso profissionalizante e aí para mim foi um grande recado aqui para o Brasil que a gente precisa desenvolver isso, para conseguir ganhar mercado.

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Figura 5- Bambuzeria Tiba Fonte :Site ambuÊ Arquitetura Viva

Figura 33 - Simpósio de Bioarquitetura Fonte:Site Bambuê Arquitetura Viva

Mas você sentiu essa cadeia produtiva mais nas áreas rurais ou estavam no ambiente das grandes cidades também?

Pelas cidades que eu passei eu vi nos dois, Bogotá tem escritório é o Zuarq que faz um monte de obra que faz obras tanto urbana, mais rural. Mas faz obra urbana também. As plantações no Rural claro, mas tinha na cidade.

Em relação a essa questão do transporte para você assim fazer um projeto aí .De onde você tem uma facilidade aqui no Rio para pegar bambu. Você tem que pegar de muito longe?

No Rio dependendo da obra, dependendo do tipo de projeto,vai ser um tipo de bambu A gente tem alguns fornecedores de confiança para comprar Já compramos de alguns que não deu certo a gente mantem alguns. A gente compra de Angra dos Reis a guadua.O mossô o que a gente mais gosta é de São Paulo e o Mirim a gente comprava aqui do Rio, mas agora tem um novo fornecedor que compra na verdade 36


de Curitiba e aí vem um frete cheio, caminhão cheio.Isso é bom. E aí ele revende aqui no Rio e aí esse bambu é muito bom é melhor do que o daqui aí não vem de longe. O interessante desse fornecedor que eu gostei é que é isso como você falou: o transporte traz muito impacto né no ciclo de vida da construção, no ciclo de materiais a energia embutida fica muito grande pelo transporte. Bambu é legal mas vem de longe, mas na prática todo material vem de longe então a coisa se equilibra. A gente consegue ser menos pior, eu acho. Em alguns aspectos. Se eu Fabiana Bambuê comprasse um carregamento do Sul e que, viesse vazio isso é muito ruim. Mas se eu compro de um fornecedor que comprou do Sul com caminhão cheio isso é bem melhor. Energia embutida reduz. Em relação ao custo da produção você acha que para os materiais convencionais tem essa questão, o frete do bambu acaba encarecendo. O bambu tem essa questão do preço.

Se pra você ter que comprar de longe o bambu.Isso sai pau a pau numa obra convencional com bambu ou não?

Sai, sai meio pau a pau sim. Assim, das experiências que eu tenho já tive é fica um pouquinho abaixo. Mas não significativamente, não vira um motivo de escolha o preço. Isso eu já falei para vários clientes. Não escolha o bambu porque ele é mais barato.Nao.voce vai economizar muito pouco. Você tem que escolher por outros fatores, principalmente pelo motivo ambiental.

Figura 34 - Quintal Pendotiba- Bambuê Arquitetura Viva Arquitetura . Fonte: Site Bambuê Arquitetura Viva.

e Joar

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E sobre os projetos que são em áreas rurais você acha que vale a pena se ter um bambuzal perto? Vale a pena você fazer o manejo, tratamento local daquela obra ou é melhor você comprar tratado? Eu acho que se tiver o bambu bom tipo isso o gigante, um bambu bom para a construção, tratar é a melhor escolha. O impacto é muito menor. Pelo transporte e o custo também seria menor. A própria pessoa pode tratar ne.Não precisa de uma estação de tratamento. Você faz um tratamento local, temporário e com certeza ficaria muito mais barato e é muito mais interessante.

Esse é o caso desse projeto que eu te mostrei lá tem um bambuzal a uns 100m, 150 m do terreno. É um terreno de pessoas conhecidas e aí eu fico me questionando assim como seria feito esse tratamento. Você teria que criar um tanque de alvenaria. Você poderia fazer um buraco no chão, colocar uma lona o que você acha?

Eu acho que essa é uma boa solução de fazer um buraco e colocar lona é infalível. Funciona com certeza. Ou aquele método de furar cada gomo e injetar o produto só que o gigante ele tende a rachar ele costuma a ter muita rachadura então o produto pode vazar um pouco. Acho que o gigante valeria a pena ele é muito pesado

Figura 35 - Mezanino em Vila Isabel Fonte: Site Bambuê Arquitetura Viva

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para manusear parede grossa pra ficar furando.Eu faria o tanque de imersão com uma lona grossa para não vazar .

Tem alguma coisa que você queira acrescentar, quais são suas maiores dificuldades?

Eu acho que a maior dificuldade é um mercado estruturado e cliente e mão de obra aí que é uma coisa puxa a outra, mas eu acho que ainda tem muito a evoluir. Assim acho que para gente de certa forma e que a gente precisa ter experiência para trabalhar às vezes é difícil esperar esse tempo sabe trabalhar exclusivamente com o bambu.Eu percebi que eu não consigo trabalhar exclusivamente com bambu. Em termos de renda. Teria até trabalho, mas, alguns trabalhos muito pingados muito sem ser de arquitetura mesmo. Tem uma grande busca por painel de bambu por exemplo. Não tenho interesse em ficar fazendo painel de bambu por exemplo, fazer um ou outro, mas assim não é a minha formação de arquiteta.Eu quero fazer estruturas, eu quero pensar no ambiente, no espaço. Então eu sinto dificuldade em arranjar mercado de trabalho confiança nas pessoas e que pague um valor justo pra todo mundo pra quem está trabalhando que, para quem está coordenando, mas sigo ai trabalhando ai com bambu não 100%.

Figura 36 - Virada Sustentável 2018 Fonte : Site Bambuê Arquitetura Viva

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Ele corresponde quanto por cento do seu trabalho hoje em dia?

Olha esse ano ele corresponde a uns 15% talvez. Esse ano está menos. Por que surgiu esse projeto da Fundição e que valia muito tempo fazer. E que eu to me dedicando muito a ele. Em termos de horário e energia. Então não sobra muito tempo e que meu intuito não é trabalhar só com bambu também. Eu gosto muito. A eu tenho outros materiais também que dá vontade de trabalhar até pra expansão da cabeça. Abrir o leque. Não ficar tão especializado numa coisa e se isso não dá certo você não tem o resto pra se virar, mais ou menos isso.

Em relação ao cálculo estrutural da dificuldade na literatura ou vocês conseguem fazer isso como que é?

Cara a gente faz, mas o lance da Norma, não tem norma. Então você pega o valor se for usar a guadua a norma colombiana ou se não pega o valor que tem já em algumas literaturas de alguns artigos. Então tem uma tabelinha lá com valores de referência.

Você pensa em fazer algum tipo de curso ou algum lugar que você recomendaria aqui no Brasil pra capacitação, continuando os estudos, você acha que existe esse espaço aqui no Brasil para isso ou mais na Colômbia?

Acho que não existe muito nao.Acho que existe só um nível 1 assim. Em termos de cursos acho que não tem curso realmente avançado para quem já sabe construir e quer desenvolver uma outra técnica. Não tem muito não.

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LÚCIO VENTANIA

Figura 37 - Lúcio Ventania Fonte:nosnobambu.blogspot.com

Entrevista não está na integra.

Quais as maiores dificuldades que você vê para construir com bambu?

Bom é as moires dificuldades é a falta de conhecimento e a falta de profissionais especializados porque o bambu ele é diferente de madeira, é diferente de ferro, é diferente de plástico e é diferente de cimento. Tem que ter o conhecimento especializado pra você entender como que funciona o bambu. Então as pessoas elas começam a querer trabalhar com bambu através de pesquisas na internet, mas o bambu se dá mesmo pela relação presencial com a planta e com a orientação de quem tem no mínimo 10 anos de experiência. Para poder transmitir realmente aquelas peculiaridades materiais que são inerentes a composição física, química e mecânica do bambu. Então a maior dificuldade é essa.Relamente a falta de mão de obra especializada. 41


Como está essa questão da norma e quais são as maiores dificuldades comentadas no seminário que você participou na Bahia?

Nós temos vários campos de visão sobre essa questão de regulamentação. Ambos os campos apresentam aspectos negativos e positivos. A ausência de uma norma que indique parâmetros para construção com bambu é mais sentida por profissionais que estão saindo das academias. São os arquitetos e engenheiros formados .Mas para isso já está saindo, dentro de poucos dias, deve entrar para comentários e críticas no site da ABNT a primeira norma para cálculo estrutural de bambu que foi feita por acadêmicos liderados pelo professor da Paraíba senhor Normando Perazzo entre outros e que tem colaboração inclusive do Luiz Eustáquio Moreira que é aqui ,engenheiro ,professor de engenharia da UFMG que é uns dos mais especializados em cálculo estrutural .Isso daí pode abrir algum caminho para facilitar a regulamentação em áreas urbanas e até mesmo rurais e poder ter licenciamento ambiental e o habite-se que os órgão de burocracias exigem .Ao mesmo tempo podem intimidar também pessoas da área rural que estão experimentando construções com bambu e realmente tem dificuldade para enfrentar o grande arcabouço burocrático que existe né.Então eu vejo que do ponto vista de quem preocupa-se com a popularização devia ter essas cordas mais afrouxadas porque essa norma também é baseada em normas de outros países .Só cálculo estrutural não basta. É necessário que tenha uma norma mais ampla ou com capítulos que trate realmente dá imunização, do tratamento das espécies adequadas, da idade dos bambus e uma série de outros parâmetros que só depois o cálculo estrutural venha ter realmente função. Não adianta fazer cálculo estrutural para um bambu que não foi tratado, que foi colhido verde, que foi colhido fora da época. Então essa norma deve preceder. Ao mesmo tempo eu entendo que não deve ter norma nenhuma por enquanto no Brasil que ainda é muito incipiente, ainda é muito novo o processo de relacionamento da população com a planta. Se população começa a relacionar com a planta e já existe norma ela desiste. É necessário que haja o afrouxamento para que a população possa ter sua experiência e se desenvolver com a planta também. Por outro lado, aproxima o bambu dessas relações mais convencionais que tem com todos outros materiais como o concreto com o ferro com tudo. 42


Figura 38 - Núcleo de Permacultura Fonte:https://pindorama.org.br/o-arquiteto-como-uma-coisa-horizontal/

Ia te perguntar essa questão da popularização aqui no Brasil quais são esses passos? É veja bem ,aqui no Brasil também existe construções históricas com o bambu.Essa construções do período colonial principalmente da Bahia e de Minas Gerias de Ouro Preto Mariana ,tudo tem bambu. As próprias cúpulas das igrejas eram feitas com bambu também, e adobe e barro e tudo. É mais isso ai foi esquecido porque realmente a indústria madeireira e a indústria do cimento entraram deliberadamente com um lobby muito forte para descredibilizar o bambu como um material e isso ficou na mente do homem do campo. O homem do campo olha pro bambu como se fosse uma praga, um covil de cobras, mas na verdade não é isso. O bambu é um excelente material, que pode prestar excelentes serviços para a sociedade brasileira. Porém ele não tem a durabilidade do concreto e nem a mesma a rigidez do ferro, então é um material que precisa ter entendimento para que ele possa ser incorporado à cultura de construção do país, seu tempo de durabilidade e suas outras especificidades. Agora o Brasil ele precisa realmente passar por um processo onde o povo brasileiro possa ter acesso a metodologias e as tecnologias e materiais mais sustentáveis o bambu ele não pode ser um material que fique apenas nas classes mais favorecidas e seja absorvida pelas classes mais favorecidas e entendido por arquitetos que formam em universidade. Isso seria uma grande coisa: se os arquitetos entendessem. 43


Mas a universidade precisa mudar. Quem ensina arquitetura no brasil precisa parar de ensinar concreto, parar de ensinar ferro porque nós não podermos mais conviver com usura das mineradoras sobre o patrimônio nacional. As mineradoras hoje fazem o que querem. Exploram da maneira que querem. Detonam, e destroem de maneira muita agressiva o patrimônio natural brasileiro. Se as universidades brasileiras ensinam para os seus formandos que você deve construir com concreto e ferro logo a universidade corrobora, colabora e aprova o modus destrutivo das mineradoras e isso não pode acontecer entendeu? Então eu acredito que deve ocorrer duas coisas .Primeiro as academias, as universidades particulares as universidades federais tem que fazer investimento em conhecimento para que ela possa ministrar esse conhecimento e reformar a sua grade curricular inserindo bambu como um material principal e não como um material alternativo, mas como um material substitutivo ao ferro ,ao cimento e a madeira nativa de florestas ok?Agora em relação ao outro aspecto da popularização nós atravessamos uma fase onde a política no Brasil é a destruição da educação, a destruição do meio ambiente, deliberadamente e confessadamente por esse governo que foi eleito nas últimas eleições ai .E por fim nós temos que fazer e o seguinte, lutar para que o povo tenha aceso a educação e dentro dessa nova educação que permita acesso ao bambu como elemento para que as crianças já entendam desde a primeira infância desde o ensino básico o bambu realmente como um elemento para a construção de casas, escolas ,principalmente aparelhos públicos como creches restaurantes populares e ai vai .Então o arquiteto ele tem que a começar construindo o que ?Não é a casa de burguês não. Começar a construindo creche restaurante popular, centro de saúde com bambu e por aí vai.

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Figura 39 6Instituto Cerbambu.Bambuzeria br/powerofsmall/entries/projeto-ravena-30-0

Fonte:https://www.changemakers.com/pt-

Você teve que mudar pra Ravena justamente para fazer toda cadeia produtiva?

O que se entende por cadeia produtiva no Brasil é um histórico de relações com matérias e possibilidades muito negativo. Nós não podemos através do bambu, imitar as cadeias produtivas que existem porque elas já começam assim como um equívoco que é a acumulação de bens em vez da distribuição de bens. Então quando eu penso na popularização do uso do bambu eu penso em associações cooperativas e mesmo quando que as pessoas possam trabalhar no desenvolvimento individual.Eu penso na autonomia e não do sistema de um patrão que domina um mercado. Domina a tecnologia e coloca vários empregados ganhando salário mínimo ao seu serviço. Nós temos que mudar o padrão. Nós temos que mudar o padrão de salário mínimo para salário justo. Nós temos que mudar o padrão de patrão empregado para autônomos satisfeitos entendeu? Então tudo isso é uma mudança de conceito. O Brasil precisa muito de uma mudança de conceito e é muito importante que essa mudança de conceito seja feita através da educação através do entender da história política do país entendeu? Porque está tudo relacionado né.Todo o sistema produtivo, comercial e econômico no Brasil tá atrelado a questões políticas e o que nós desejamos não é o desatrelamento, mas um aprofundamento nas relações políticas que gere consciência e uma postura de autonomia e cooperação. Então a natureza da planta bambu sugere isso porque é uma planta que tem um elemental que se traduz 45


em generosidade. Então nós buscamos, realmente mais solidariedade em ser mais proativo no sentido da localidade. A pessoa pode resolver as questões por exemplo dentro da sua localidade. Não a exportação de produtos caminhões atravessando estradas, navios atravessando e poluindo mares com produtos. Essa lógica é a lógica do sistema. Uma lógica que já está comprovada que não deu certo. Nós queremos que as localidades sejam autossuficientes. Em cama de bambu, mesa de bambu, broto de bambu para alimentação. Construtoras que constroem casas de bambu. Aparelhos públicos de bambu. Que a comunidade fiquei feliz e assim cada comunidade plantando seu bambu e ficando feliz nós vamos ter uma sociedade mais equilibrada.

Figura 40 - Cozinha Escola Nestlé-Mercado Central http://rosenbaum.com.br/projetos/cozinhaescolanestle/sobre-o-projeto/

Belo

Horizonte

.Fonte

:

Como que ta hoje as bambuzerias que você ajudou a construir? Queria saber um pouco assim do momento que eles estão passando como que está atualmente?

Muitas bambuzerias elas não deram certo como cooperativas porque não existe cultura de cooperativismo no Brasil. Existe cultura de empreguismo. Então as 46


pessoas não suportam. Não estão preparadas, educadas para suportar os níveis de solidariedade, de compreensão e cooperação que essas associações exigem pra dar certo e funcionar como associação, como cooperativa. Então todo sistema ele atua para que as pessoas desistam de seus projetos e as cooperativas elas sucumbam, mas de tudo as pessoas com conhecimento e com a experiência tornam-se aqueles que tem vontade e entendimento, tornam-se bambuzeiros então as cooperativas acabam se formando, se transformando em grupos de artesão autônomos que acabam por questão de afinidade ne cooperando entre si. Essa é a história da cooperativa no Brasil e de nossa cooperativas com bambu .Vem surgindo ne autônomos aqui ,autônomos ali e processos ne.Geralmente os acadêmicos tem melhor condição de estruturar negócios com mais chances de dar certo .Mas o bambu também se resolve em outros campos em outras dimensões da renda complementar, do artesão que vai desenvolvendo, começa na movelaria ,começa a fazendo coisas erradas e com o próprio bambu vai descobrindo e tudo .Então uma nação ela se desenvolve com vários aspectos com várias formas. E a bambueira pode ser realmente uma alternativa ,uma força para que as populações venham se desenvolvendo .Então apesar do Brasil não ter seu processo de popularização estruturado dentro de uma cadeia produtiva normal ne.Como são outras eu vejo isso como propositivo .Deixa o povo ir descobrindo gradativamente ,aproximando do bambu e fazendo no seu tempo que isso também é positivo, porque essa propulsão que tem pra negócios e geração de renda de trabalho e renda se ela for copiada do sistema ela acaba inviabilizando projetos de verdadeira sustentabilidade então é preciso ter um olhar também sobe a natureza dos processos e o tempo que leva para que uma população vá se apoderando ne de dessas novas tecnologias como o bambu. Na Colômbia, ainda é muito tímido eu to falando um avanço mais grosso né A grosso modo como, por exemplo monocultura de bambu pra fazer esse processo de industrialização pra colocar no mercado em grandes volumes. Isso ai é completamente negativo transformar o o bambu como num eucalipto em uma outra matéria prima . .O bambu não é pra ser siderurgizada .O bambu é pra ser um elemento pra que o homem do campo faça seu usufruto e realente ele venha cumprir o papel de sustentabilidade que é uma lacuna mesmo no pais .Não precisa imitar o

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sistema produtivo ,econômico que ele é muito bruto ,é isso que eu quero dizer. Nós não precisamos fazer isso com bambu.

Figura 41 - Biblioteca Milton Santos Fonte:https://www.cerbambu.org.br/quem-somos

Você tem mais alguma coisa que queria colocar sobre alguma inquietação?

Essas outras informações que o bambu é um material excelente pra construção civil, pra construção de casas, pra movelaria, pra substituição da madeira, do ferro já são informações que já estão disponíveis na internet. Já estão comprovadas. Já existem muitas obras de bambu no Brasil na América Latina, no mundo todo. Novidade nesse processo todo não é o bambu como material. É o bambu como protagonista social. Como elemento de transformação da economia e transformação a economia não é repetir a economia é gerar uma nova economia com participação popular e usufruto popular. 48


Em relação ao custo quando você vai fazer uma obra se você tem um custo assim parecido que seria de outro material convencional ou se o bambu sai mais barato pra construção?

Não sai mais barato. Porque ainda não foi formalizado mercado ne.O mercado da madeira, do ferro, do cimento já existe. Essa cadeia produtiva que é explorativa onde só o patrão ta ganhando então é de fácil aceso, mas é de má distribuição. O bambu ainda não tem isso mas vai se formar. Ainda é muito novo pra ter ainda. Vamos ter que esperar algumas décadas pra isso se estruturar atualmente no Brasil. Por isso é um pouco mais caro. Mas o que é mais caro? Você pagar um pouco mais de moeda corrente do seu país para uma construção ou ver todo seu patrimônio da sua nação ser depredado de maneira irreversível? Qual é mais caro?

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JAIME PEÑA Entrevista na integra

Figura 42 - Jaime Peña Fonte:Fonte:arquitecturamixta.org/pt/equipe/

Como foi seu aprendizado na construção de bambu?

Eu trabalhei quando eu me formei de arquiteto, eu trabalhei por um ano pra um escritório de arquitetura de interiores, mas aquele escritório não trabalhava nada com bioconstrução nem materiais naturais, tudo muito hi tech.Ai eu decidi me encaminhar pra bioconstrução. Fiz uma viagem pela América Latina conhecendo as técnicas locais de cada país, de cada comunidade, de cada povo, que ficava na montanha que tinha adobe, bambu e assim fui melhorando e conhecendo e depois já voltei pra Colômbia. Criei meu escritório de Arquitetura Mixta ne e já iniciei a pegar clientes e projeto traz projeto e a gente foi avançando e madurando essa ideia.

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Figura 43 - Restaurante Humo .México Fonte:http://arquitecturamixta.org/pt/project/restaurante-humo2/

Como você avalia a cadeia de produção de bambu na Colômbia e no Brasil?

A cadeia de produção de bambu na Colômbia em relação ao do Brasil. A Colômbia tem mais avanços, tipo mais pesquisas, tem uma cultura mais local mais forte com a construção de bambu. Acho que a cadeia produtiva de Colômbia está desenvolvendo de uma maneira interessante, mas ainda não consegue fechar todos os processos juntinhos ainda está muito fragamentada.Ainda tem muito pessoal trabalhando, porém cada um pelo seu lado, mas está forte. Acho que no Brasil está no processo. A gente lá no Brasil está desenvolvendo alguns cursos pra conseguir expandir ne esses conhecimentos de bambu no Brasil, mas acho que no Brasil está rolando muito bem. Já criou a Sociedade Brasileira do Bambu. Algumas universidades já estão fazendo pesquisa, faculdades estudando o tema de bambu, palestras. Então acho que está fortalecendo. Ainda não fechou completa a cadeia. Está crescendo, está Bruno Sales que ele trabalha muito bem silvicultura, com muita produção mudas ne.Na construção também está o Lúcio Ventania com seu bambu que é muito forte também. A Irina Biletska está trabalhando com bambu lá na Bahia. A gente está também fazendo projetos de bambu né.Então acho que está crescendo ne.

Quais são os maiores desafios do trabalho com bambu na Colômbia? E no brasil? 51


E quanto os maiores desafios de trabalho em Brasil e na Colômbia eu acho que o trabalho com bambu é um só. Cada país tem suas condições seus avanços. Mas se você tem bambu, tem todas as possibilidades ne.Mesmo que a cadeia não esteja em cada país.Eu não olho tanto de falar de dificuldades sabe. Porque eu acho que é tudo um processo e todo processo precisa trabalho. Precisa se focar se concentrar no que está fazendo. Mesmo se é fácil, difícil. Eu acho que não é problema de dificuldades é problema de processos. Os maiores processos agora são criar projetos, credibilidade com as pessoas. Projetos sustentáveis que tenham continuidade ne.Criar mais escritórios de construção com bambu. Criar mais espaços ne.Tipo o parque de bambu está fazendo um trabalho muito interessante também e tem outros grupos que estão trabalhando muito com bambu no Brasil então acho no Brasil tem uma galera muito forte, agora tem que se ligar. Isso eu acho que é um desafio forte. Ligação de toda essa rede. Criar uma grande rede de apoio entre todos. Para avançar tanto na Colômbia quanto no Brasil como aqui no México onde a gente está trabalhando agora. Isso ne de criar uma grande rede de apoio que vire uma plataforma para todo o pessoal que quer avançar nesse tipo de trabalho com bambu.

Figura 44 - Domus Saramandala- Fonte:http://arquitecturamixta.org/pt/project/domo-saramandala-2/

É fácil encontrar mão de obra qualificada para construção com bambu na Colômbia?

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Então mão de obra qualificada tanto em Colômbia quanto no Brasil tem mão de obra qualificada na Colômbia, mão de obra com experiência maior. Tem muito sim mas em brasil também tem.Ta Elieser Souza, ta o Bruno.Eu já criei uma galera muito interessante ne.Ta Jefersson Cruz .Aqueles que eu já te falei ,ta o Cerbambu com Lucio.Ele tem sua equipe também eu acho que tanto Brasil quanto Colômbia eles tem pessoal que de verdade conhece. Mas ainda tem que se educar ainda tem que expandir. Tem que se criar muitos curso, muita troca de conhecimento ,abrir espaço pra que o pessoal ,as crianças a gente jovem chegue ne e continue esse processo está grande cadeia mas de que tem, tem sim.

O que você acha da norma colombiana de construção com guadua?

E quanto ao Norma de Construção da Colômbia, não é algo muito pessoal que eu possa lhe dizer. É um avanço interessante porque o fato de que se normatize algo se legalize algo, já mostra interesse de melhorar o processo governamental e institucional com esse tema. Eu acho que era uma norma de construção muito fechada e muito limitada na criatividade,sabe?É muito básica ,

muito quadrada , muito

caixinha ,muito engenharia. Nós temos demonstrado que com nossos projetos que definitivamente o bambu pode ir muito além e que seremos capazes de obter muito mais resultados de engenharia estrutural, como o que estou fazendo aqui no México com o engenheiro Esteban Morales da Colômbia .Também estamos fazendo um projeto muito interessante. Estamos demonstrando que o bambu vai muito além de quatro paredes quadradas e que, com a arquitetura orgânica, é possível criar uma boa posição da planta do bambu como material. Então essa na minha opinião é interessante o que foi alcançado, mas acho que é muito limitado e pode dar muito, muito mais.

Qual a opinião que os colombianos tem sobre as construções com guadua?

O colombiano local, como tal, sempre vê a construção com guadua como uma construção secundária econômica e provisória sabe? Se você olha a cultura normal colombiana, mas se você olha a comunidade da bambuzeira colombiana, as pessoas 53


que conhecem a história do bambu que trabalham com ele a opinião muda .Porém tradicionalmente, a tradição colombiana de bambu da guadua, para a gente comum do dia a dia são estruturas provisórias e econômicas.

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CHEPE MOÑOZ Entrevista na integra

Figura 45 - Chepe Moñoz

Como foi seu caminho de aprendizagem na construção com guadua?

Concluindo meus estudos na universidade, o arquiteto Oscar Hidalgo, chega Escola de Arquitetura e apresenta seu doutorado em arquitetura e construção em Bambu-guadua o qual gera um grupo de estudantes dos últimos anos de jovens arquitetos. Começamos a desenvolver pesquisas e projetos em

guadua,

reconhecendo a nossa cultura ancestral de bahareques, nunca presente na época na escola de arquitetura pós-moderna e internacionalista.

Qual é o cenário que encontrará um arquiteto recém-formado para trabalhar com construção de guadua na Colômbia?

Hoje, a arquitetura alternativa sustentável do bambu guadua ganhou um lugar importante na arquitetura colombiana. A propósito, esse é o aspecto arquitetônico colombiano mais reconhecido internacionalmente. Devido ao seu grande potencial para o desenvolvimento de arquiteturas sustentáveis pelos novos arquitetos

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colombianos ou os arquitetos de outras nacionalidades que desejam desenvolver seu trabalho na Colômbia.

Quão importante é o guadua para a cultura da construção colombiana?

No marco das tecno culturas construtivas, o guadua como material de construção na Colômbia é uma parte fundamental da tradição arquitetônica do passado. Juntamente com a madeira, o guadua está presente nas arquiteturas patrimoniais de Bahareque hoje chamadas Paisagem Cultural do Café Colombiano; Declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO em 2011. Deve-se dizer que sua importância não é só no terreno local, mas também é internacional.

O ensino da construção de guadua nas escolas de arquitetura é suficiente para capacitar arquitetos que podem trabalhar com esse material?

O ensino de arquitetura e construção em Guadua é desenvolvido de maneira particular na Universidade Nacional da Colômbia, especialmente na sede da Escola de Arquitetura e Urbanismo de Manizales, por sua tradição histórica neste território cafeteiro da Colômbia. Muitos dos arquitetos que optaram por essa alternativa arquitetônica e construtiva de seus estudos na Escola de Arquitetura El Cable, hoje não apenas transcendem a nível local ou nacionalmente, mas também internacionalmente

O que é bom e o que poderia ser melhorado? O importante é ter conseguido recuperar as arquiteturas e as construções em Guadua como lembrança do passado e reinterpretá-las em um regulamento de construção contemporâneo - Decreto 052/2002 - que permite que essas arquiteturas históricas sejam reinterpretadas de maneira contemporânea em um cenário de renascimento das arquiteturas e técnicas construtivas ancestrais. A academia contemporânea que alguns professores desenvolvem atualmente no âmbito da pedagogia da aprendizagem - não a do ensino - sempre força um processo de desenvolvimento investigativo e inovador, razão pela qual esse tema das 56


arquiteturas e da cultura tecno-construtiva em guadua ou bahareque (estruturas de madeira e guadua), no caso de nossa arquitetura regional está sempre evoluindo, portanto, está sempre melhorando.

O que você acha da cadeia de produção de guadua na Colômbia? Funciona bem?

A cadeia de produção de guadua-bambu na Colômbia é um paradoxo. Embora seja um material presente em massa nas arquiteturas históricas e hoje seja novamente considerado como o material básico das arquiteturas sustentáveis da Colômbia; existindo extensões originais de florestas de guadua, particularmente na região cafeeira, as políticas governamentais não são positivas para incentivar o desenvolvimento de sua indústria agroflorestal e, portanto, seu uso maciço na arquitetura tem muitas dificuldades. Quais são as maiores dificuldades em trabalhar com o guadua na Colômbia? Por um lado, existem restrições governamentais para sua exploração e uso na arquitetura. Por outro lado, o imaginário coletivo não apenas local, mas também global, que considera o bambu - no nosso caso, o guadua, como material temporário, não

durável

e

aplicável

apenas

em

arquiteturas

para

baixos

estratos

socioeconômicos.

É fácil encontrar mão de obra qualificada para construção com o guadua?

Embora a tradição histórica mostre um exemplo paradigmático na região cafeeira - Paisagem Cultural do Café, de uma extensa e massiva arquitetura histórica em bahareque - madeira e guadua; o mito modernista, pós-moderno e ainda contemporâneo das construções em “material” - concreto e tijolo - hoje predomina sobre as novas construções em guadua e, portanto, estamos dificilmente em um processo tecno-cultural de recuperar e melhorar as tecnologias de construção bahareque e guadua .Por esse motivo, apenas está ressurgindo uma nova geração de construtores de guadua na região cafeeira, o que ainda dificulta a existência

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massiva de mão de obra qualificada nessas tecnologias sustentáveis de construção de bahareque e guadua.

É fácil encontrar um engenheiro que faça o cálculo estrutural dos projetos em guadua? Não é fácil. O paradoxo também se manifesta nesse cenário de engenharia de cálculo estrutural para arquiteturas bahareque ou guadua, uma vez que as faculdades de engenharia, como acontece em Manizales, NÃO treinam engenheiros no cálculo estrutural desse tipo de construção e são orientadas apenas ao treinamento de engenheiros estruturais de concreto, alvenaria ou estruturas metálicas, basicamente.

O que você acha da norma colombiana de construção com guadua? "(Os pontos positivos e negativos).

É possível ponderar os pontos positivos do padrão de construção colombiano em Guadua - Decreto 052/2002 - NSR / 10, porque melhora, otimiza e legaliza novamente as arquiteturas e construções em Guadua. Ou seja, reinterpreta essas técnicas históricas de maneira contemporânea. Com a norma, foi possível evoluir da "técnica" das construções de guadua desenvolvida pela tradição, para a "tecnologia" de bahareque e guadua hoje desenvolvida sob as ciências da arquitetura e engenharia representadas nas normas atuais de construção em guadua.

Qual é a opinião que as pessoas na Colômbia têm sobre a construção com o guadua?

Infelizmente, ainda predomina no imaginário coletivo de ser um material temporário e pobre, ou seja, para arquiteturas e construções temporárias e de estratos sociais de baixa renda.

Você acha que existe uma cultura de construção com o guadua consolidado na Colômbia?

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Sim. Existe histórica e massivamente presente em arquiteturas históricas ou patrimoniais, particularmente na região cafeeira hoje reconhecida como Paisagem Cultural do Café e, de fato, seu valor é cada vez mais reconhecido, particularmente pela indústria do turismo. Porém ainda é pouco reconhecida para o desenvolvimento de novas arquiteturas.

THIAGO ÓSCAR

Figura 46 - Thiago Óscar Fonte:Fonte:facebook.com/joararquitetura

Entrevista na integra

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1)Quais as maiores dificuldades de se produzir arquitetura com bambu no Brasil?E porque para você ela ainda não se difundiu no país?

A falta de oferta do material tratado e de mão de obra capacitada. Porque a pesquisa do material precisa cada vez mais ser aprofundada e o tema fazer parte das disciplinas de graduação de cursos relacionados à construção civil. Isso se deve também ao domínio do padrão construtivo por empresas de materiais de construção de grande parte que tornam mais difícil a inserção do Bambu no mercado. Essa realidade pode mudar com o aumento do número de pessoas interessadas na redução dos impactos ambientais pela indústria da construção através do uso deste recurso resiliente e que requer pouco gasto energético para chegar ao canteiro de obras.

Figura 47 - Marc van Lenge e Thiago Óscar Fonte:https://www.facebook.com/tibario/photos/

2)Quais as maiores diferenças que você pode notar na condição para a produção da arquitetura de bambu na Colômbia comparada com o Brasil?

Em primeiro lugar, a cultura ancestral presente na Colômbia com o uso da Guadua para construção das estruturas das moradias. No Brasil, a herança do uso do 60


bambu está mais nas tramas de paredes de pau-a-pique, cestarias e em alguns tipos de fechamentos também. O fato de haver uma norma construtiva para o material na Colômbia também facilita que leigos percebam a capacidade do material. A reboque disso, a produção de peças de Guadua tratadas lá está no patamar de exportação a exemplo do Instituto Pachamama, em Quindío, que envia pedidos para Europa, China e, inclusive, pro Brasil. Enquanto isso, aqui, existe uma dificuldade muito maior em ter acesso a produtores do material tratado, além da falta de informação sobre a qualidade do material de cada fornecedor. Dessa forma, no Brasil, vemos que a consciência ambiental nessa área cresce e muitos bambuzeiros são “obrigados” a crise seus próprios testes de resistência e o resultado na grande maioria dos casos é o hiperdimensionamento da estrutura para garantia da segurança da obra. De qualquer maneira, é uma luta que está crescendo e muitos grandes nomes do Brasil e também internacionais vêm se unindo no país e percebe-se que na persistência o conhecimento evolui e um grande número de pessoas se interessa a cada dia que passa.

Figura 48 - Thiago Òscar no Tibá Rio Fonte:Thiago Òscar

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3)Qual é a visão que as pessoas tem sobre as construções com bambu aqui no Brasil? No senso comum, existe a dúvida sobre a resistência e a durabilidade e, na maioria dos casos, o interesse pelo uso do mesmo é mais para mobiliários ou objetos decorativos. A falta de divulgação e acesso a informação a respeito das mil e uma possibilidades do uso do bambu gera essa percepção, afinal, existe uma escassez de referências sobre sua utilização até mesmo dentro das escolas, escritórios e conferências de engenharia, arquitetura e urbanismo. Graças a uma enorme grande quantidade de pesquisadores, Bambuzeiros e interessados na propagação do uso do material para redução dos impactos ambientais na construção civil, o cenário vem apresentando um melhora notável e surgem cada vez mais obras, escritórios e coletivos dedicados a trabalhar com o material.

4)Alguma outra inquietação que queira colocar:

A mudança desse paradigma será cada vez mais fácil a partir do momento que a consciência na construção civil passar pelo respeito à nossa mãe Terra e aos materiais naturais que ela oferece, nesse caso, o Bambu. Podemos mostrar a cada dia como é melhor trabalhar em união assim como o bambuzal: todos unidos são mais fortes! E um ditado que me motiva e representa muito para mim é:

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“O bambu é mais forte porque não é cheio de “Eus”, mas, sim, cheio de “nós”!”

Figura 49 - Parceiria com equipe Arquitectura Mixta em obra de Galpão em Itacaré, Bahia. Projeto Helena Ruette, Jefferson Cruz e Jaime Peña. Na foto: Mestre de Obras Jefferson Cruz, Bioconstrutor e co-responsável Pedro Aquino e parceiro Thiago Óscar.(texto de Thiago Óscar)

3.0_CONTEXTO DE PRODUÇÃO DA ARQUIETURA EM BAMBU 3.1_A QUESTÃO CULTURAL Os meios de comunicação têm um papel fundamental na formação cultural de determinado povo. Nossa visão de mundo vai sendo construída pelos filmes, jornais ,programas de televisão e mídias sociais que ,na maior parte das vezes estão a serviço de grandes empresas .Porém ,para essas empresas não é interessante ,ou seja não gera lucro, a preservação da nossa cultura construtiva brasileira (indígena ,negra e europeia).Segundo Lúcio Ventania o motivo para esse “esquecimento” dos saberes se deve ao lobby das empresas da construção civil:

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“É mais isso ai foi esquecido porque realmente a indústria madeireira e a indústria do cimento entraram deliberadamente com um lobby muito forte para descredibilizar o bambu como um material e isso ficou na mente do homem do campo. O homem do campo olha pro bambu como se fosse uma praga, um covil de cobras, mas na verdade não é isso.” (LÚCIO VENTANIA ,ENTREVISTA )

Figura 50 - Casas de Guadua e Bahareque Fonte : Fonte : The gift of the Goods

Esse tema é de suma importância para se pensar uma cultura construtiva. Se as pessoas acreditam que um material especifico é frágil, pouco durável ou mesmo o relacionam a distinções de classe, como poderemos popularizar sua utilização? Penso que primeiramente devesse trabalhar no esclarecimento para a população sobre o tema. Nesse ponto que entra a importância dos meios de comunicação informe com qualidade as pessoas bem como nas escolas, universidades se ensine de uma maneira diferente. Para ilustrar essa questão trago um caso que me foi contado pelo professor Gilberto Flores da Universidade Nacional de Colômbia. Gilberto foi contratado para a construção de moradias populares na cidade de Manizales.Após alguns anos ,quando volta para visitar as moradias ,descobre que os bambus haviam sido pintados.Segundo o professor ,ao indagar os moradores o porquê daquele ato os morado lhe disseram que haviam pintado pois associavam o material á classes 64


menos desfavorecidas e não queriam ser identificados nessa categoria. O preconceito ao associar o bambu como um elemento distintivo de classes também é relatado por outros entrevistados como mostrado abaixo: “Por um lado, existem restrições governamentais para sua exploração e uso na arquitetura. Por outro lado, o imaginário coletivo não apenas local, mas também global, que considera o bambu - no nosso caso, o guadua, como material temporário, não durável e aplicável apenas em arquiteturas para baixos estratos socioeconômicos.” (CHEPE MOÑOZ ,ENTREVISTA )

“Embora a tradição histórica mostre um exemplo paradigmático na região cafeeira - Paisagem Cultural do Café, de uma extensa e massiva arquitetura histórica em bahareque - madeira e guadua; o mito modernista, pós-moderno e ainda contemporâneo das construções em “material” - concreto e tijolo hoje predomina sobre as novas construções em guadua e, portanto, estamos dificilmente em um processo tecno-cultural de recuperar e melhorar as tecnologias de construção bahareque e guadua” (CHEPE MOÑOZ ,ENTREVISTA ) “O colombiano local, como tal, sempre vê a construção com guadua como uma construção secundária econômica e provisória sabe? Se você olha a cultura normal colombiana, mas se você olha a comunidade da bambuzeira colombiana, as pessoas que conhecem a história do bambu que trabalham com ele a opinião muda .Porém tradicionalmente, a tradição colombiana de bambu da guadua, para a gente comum do dia a dia são estruturas provisórias e econômicas.” (JAIME PEÑA ,ENTREVISTA AO AUTOR) “No senso comum, existe a dúvida sobre a resistência e a durabilidade e, na maioria dos casos, o interesse pelo uso do mesmo é mais para mobiliários ou objetos decorativos. A falta de divulgação e acesso a informação a respeito das mil e uma possibilidades do uso do bambu gera essa percepção, afinal, existe uma escassez de referências sobre sua utilização até mesmo dentro das escolas, escritórios e conferências de engenharia, arquitetura e urbanismo.” (THIAGO ÓSCAR ,ENTREVISTA AO AUTOR)

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Figura 51 - Conjunto habitacional construído na cidade de Manizales pelo arquiteto Gilberto Flores

Figura 52 - Técnica construtiva Bahareque Fonte : The gift of the Goods

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Figura 53 - Conjunto habitacional construído na cidade de Manizales pelo arquiteto Gilberto Flores

3.2_A QUESTÃO NORMATIVA No Brasil existem algumas normativas para a construção com os materiais convencionais, como concreto armado, alvenaria, madeira entre outros. Ter uma normativa para um material possibilita diversas vantagens como: ter maior credibilidade para se construir ,para regularizar e financiar uma obra, ,além de criar parâmetros de construção como apontado pelos arquitetos Fabiana Carvalho e Guilherme Naoum : “A norma ela traz uma credibilidade muito grande para os escritórios e pros clientes, de que a gente consegue projetar e construir de acordo com a norma, então traz muita segurança “.(FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA AO AUTOR) “Ai você começa entrar em um campo de burocracias organizacional de toda essa cadeia produtiva ne e é necessário pra gente ter segurança do que faz também e respaldo quando faz de forma correta, sabe? Isso dá respaldo. Você cria uma norma para poder seguir e ter o respaldo que você está fazendo aquilo corretamente. Então a gente aqui como não tem essa norma não tem nada a gente vai pesquisando como é feito lá em um lugar ou em outro e utiliza a norma técnica de outro lugar e tenta aplicar. O ideal seria isso essas cadeias produtivas serem mais eficientes. O cara comprar essa peça com um padrão de parede interna pois todas teriam sido colhidas em um tempo próximo de tempo de vida você começa a conseguir padronizar por

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mais que seja em natura por mais que seja bambu, tem as peculiaridades você vai ter um mínimo de padronização acontecendo. Facilita toda essa parte de cálculo. No caso o fato de não ter isso me acarreta ter que comprar 3 ou 4 vezes a mais de peças para fazer uma seleção boa, isso é um fator muito importante eu compro sempre a mais isso já encarece o preço final para o cliente. ” (ENTREVISTA GUILHERME NAOUM , ENTREVISTA AO AUTOR)

Por outro lado o bambuzeiro Lúcio Ventania coloca um outro ponto interessante sobre a questão da normalização: ’’Ao mesmo tempo eu entendo que não deve ter norma nenhuma por enquanto no Brasil que ainda é muito incipiente, ainda é muito novo o processo de relacionamento da população com a planta. Se população começa a relacionar com a planta e já existe norma ela desiste. É necessário que haja o afrouxamento para que a população possa ter sua experiência e se desenvolver com a planta também. Por outro lado, aproxima o bambu dessas relações mais convencionais que tem com todos outros materiais como o concreto com o ferro com tudo.’’ LÚCIO VENTANIA ,ENTREVISTA AO AUTOR) “Isso daí pode abrir algum caminho para facilitar a regulamentação em áreas urbanas e até mesmo rurais e poder ter licenciamento ambiental e o habite-se que os órgão de burocracias exigem, ao mesmo tempo podem intimidar também pessoas da área rural que estão experimentando construções com bambu e realmente tem dificuldade para enfrentar o grande arcabouço burocrático que existe né.” LÚCIO VENTANIA ,ENTREVISTA AO AUTOR)

De fato, as normas e todo sistema de produção da construção civil utilizam uma linguagem distante e muitas vezes inacessível a pessoas que não tiveram acesso ao conhecimento necessário para a sua interpretação. Porém acredito que a criação da norma não irá inviabilizar a experimentação da população com o material. Olhando o contexto colombiano, por exemplo, as autoconstruções em comunidades ou mesmo nas áreas rurais continuaram sendo feitas pela população depois da regulamentação. Pude observar isso na cidade de Manizales tanto na área rural quanto nas zonas periféricas urbanas. Desse modo acredito que possa haver uma norma, que venha dar suporte a profissionais que necessitam dessa regulamentação para que possam desenvolver melhor seu trabalho e ao mesmo tempo que a população possa continuar experimentando a planta nas suas mais diversas possibilidades. Outro ponto interessante colocado pelo arquiteto Jaime Peña sobre a questão da normalização: “E quanto ao Norma de Construção da Colômbia, não é algo muito pessoal que eu possa lhe dizer. É um avanço interessante porque o fato de que se normatize algo se legalize algo, já mostra interesse de melhorar o processo

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governamental e institucional com esse tema. Eu acho que era uma norma de construção muito fechada e muito limitada na criatividade,sabe?É muito básica , muito quadrada , muito caixinha ,muito engenharia. Nós temos demonstrado que com nossos projetos que definitivamente o bambu pode ir muito além e que seremos capazes de obter muito mais resultados de engenharia estrutural, como o que estou fazendo aqui no México com o engenheiro Esteban Morales da Colômbia. Também estamos fazendo um projeto muito interessante. Estamos demonstrando que o bambu vai muito além de quatro paredes quadradas e que, com a arquitetura orgânica, é possível criar uma boa posição da planta do bambu como material. Então essa na minha opinião é interessante o que foi alcançado, mas acho que é muito limitado e pode dar muito, muito mais. “(JAIME PEÑA ,ENTREVISTA AO AUTOR)

Figura 54 - Templo de Yoga _Tulum México .Fonte : arquitetura Mixta

De fato, se olharmos a norma colombiana ela não comtempla as estruturas mais orgânicas e mais complexas como por exemplo o projeto Templo de Yoga em Tulum México produzidas pela Arquitetura Mixta.Desse modo é um ponto interessante pensar em uma norma que comtemple esses tipos de estruturas. Por fim, para a última análise do tema das normativas coloquei a seguinte questão: Como pensar uma norma construtiva tendo em vista que um bambu de uma mesma espécie pode apresentar diferentes propriedades físico-mecânicas em diferentes regiões do país? Essa é uma questão importante visto que o bambu, por ser um material natural, vai apresentar comportamento físico-mecânicos distintos em função do solo, clima, bioma

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inserido,etc.Para responder a essa questão consultei o professor Normando Perazzo ,um dos profissionais ligados à elaboração da norma construtiva no Brasil: “As propriedades do bambu podem ser obtidas em cada obra através de ensaios. Como os outros materiais. Não se faz ensaio de concreto nas obras?” (PROFESSOR NORMANDO PERAZZO , ENTREVISTA AO AUTOR)

Esse ensaio das peças é feito por arquitetos nas obras (por conta do bambu ser um material natural) como relatado na fala de Guilherme Naoum a seguir: “Eu até fiz uns testes. Eu faço uns testes assim. Quando eu faço uma estrutura que é pra peso eu faço o cálculo. Faço o teste e eu pego uma peça padrão assim até mais fina geralmente escolho uma das piores peças e faço o teste nela de esforço. Nessa daqui eu fiz e na última de Botafogo também e aí faço o teste para ver qual é o esforço pra romper a peça e ai eu mesmo que faço o cálculo estrutura então eu já dimensiono assim com certeza do que eu estou fazendo usando a peça mais frágil. ”

(ENTREVISTA GUILHERME NAOUM , ENTREVISTA AO AUTOR)

Desse modo, como relatado por Guilherme Naoum pode se conseguir os valores das cargas admissíveis para o cálculo estrutura e consequentemente o correto dimensionamento das peças.

3.3_LOCAIS DE PRODUÇÃO E A QUESTÃO DO TRANSPORTE “Lá (Colômbia) eu vi além disso, a cadeia produtiva do bambu era bem desenvolvida além de mão de obra para a execução tinha as fazendas certificadas que plantam e vendem. Está tudo ali no diâmetro que você quer na humidade certinha que foi tratado, que não poluiu. Você consegue comprar a quantidade e aqui no Brasil ainda é meio você vai tocar um projeto e você ainda fica preocupado será que eu vou realmente conseguir o bambu? e aí vai vir não sei de onde que ainda são poucos que produzem e aí fica caro, e ai nem sempre o cliente entende o bambu era para ser barato? Mas não. Tem uma cadeia por traz né.?Então eu vi que na Colômbia que tava rolando. A gente visitou vários locais de plantio e locais de tratamento e deu para ver que tem um monte. E tem um monte que a gente não visitou também porque não dava.’’ (FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA AO AUTOR)

Como relato acima por Fabiana Carvalho por não existir uma regulamentação do sistema produtivo (manejo, tratamento, transporte) isso traz insegurança para os 70


profissionais que trabalham nessa área por não saberem se o material comprado irá atender as exigências necessárias para uma boa construção. Além disso, por ter pouca demanda de bambu para a construção civil existem pouco locais de plantio/tratamento que o comercializam. Desse modo, muitas vezes esses locais de venda ficam distantes dos locais onde o material será utilizado. Isso faz com que o preço final do produto fique muito mais caro devido ao custo do transporte. Assim a vantagem do bambu em ser um material de baixo custo de produção acaba sendo perdida. “O interessante desse fornecedor que eu gostei é que é isso como você falou: o transporte traz muito impacto né no ciclo de vida da construção, no ciclo de materiais a energia embutida fica muito grande pelo transporte. Bambu é legal mas vem de longe, mas na prática todo material vem de longe então a coisa se equilibra. A gente consegue ser menos pior, eu acho. Em alguns aspectos. Se eu Fabiana Bambuê comprasse um carregamento do Sul e que, viesse vazio isso é muito ruim. Mas se eu compro de um fornecedor que comprou do Sul com caminhão cheio isso é bem melhor. Energia embutida reduz. Em relação ao custo da produção você acha que para os materiais convencionais tem essa questão, o frete do bambu acaba encarecendo. O bambu tem essa questão do preço.’’ (FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA AO AUTOR) “Ai que entra a questão só do frete, então é bom sempre estar comprando em escala, criar parcerias assim sempre vai ajudar. Quer comprar um frete já fala com outros parceiros que aí também insere já no montante mais peças ai paga o mesmo frete todo mundo escolhe suas peças. Então dá para ir fazendo umas parceiras pra ir diminuindo esse custo.” (ENTREVISTA GUILHERME NAOUM , ENTREVISTA AO AUTOR)

A desvantagem do transporte relatadas anteriormente podem ser minimizadas por meio de parcerias de compras coletivas como relatado acima por Fabiana carvalho.

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Figura 55 - Casa típica colombiana feita com a técnica bahareque

3.4_A QUESTÃO DA MANUFATURA: “Na Colômbia acredito que você possa até falar melhor do que eu que não fui mas acredito que lá você encontra muito mais manufatura a sua disposição. Desde a produção dessa matéria prima quanto das variadas manufaturas de placas de telas de não sei o que sabe, de corte de peça, de rolo, esteira qualquer coisa sabe. A manufatura é muito abundante. Que aqui não é. Então você acaba tendo muito pouco fornecedores ,pouco poder de escolha ,pouca concorrência, a produção fica mais complicada e você tem muita.Você acaba tendo que fazer todo processo ,você não consegue ter uma facilidade como aqui por exemplo a nossa cultura é essa convencional a construção nossa convencional ,tijolo, cimento, concreto armado.Então aqui a cada esquina vai ter uma loja dessa de construção que eu vou lá eu compro tudo que eu quero e eu construo ,se eu quiser uma malha de ferro soldada eu compro do tamanho que eu quero, da grossura que eu quero ,então você tem esse leque de opções assim facilita a sua construção com essa tipo de material.’’ (ENTREVISTA GUILHERME NAOUM , ENTREVISTA AO AUTOR)

A manufatura aqui entra como mais um tema importante a se refletir dentro da cadeia produtiva. Como relatado acima por Gulilherme Naoum a falta de elementos pré fabricados ou manufaturados de bambu, como por exemplo uma treliça de fechamento ou um piso laminado de faz com que ,quem queira produzir esse tipo de arquitetura, tenha que fazer todos os processos produtivos. Isso dificulta muito a produção pois como apontado por Guilherme Naoum você tem que criar uma série de processos, espaços produtivos, técnicas ao invés de se dedicar a uma única atividade e assim poder aprimorar uma única técnica. 72


3.5_A QUESTÃO DA PROFISSIONALIZAÇÃO

Figura 56 - Pedágio, departamento de Risaralda

A questão da profissionalização está ligada a qualificação de mão de obra para trabalhar com o bambu como: arquitetos, engenheiros e bambuzeiros.. A falta de pessoas que saibam trabalhar com o material é um dos principais entraves comentados pelos profissionais da área. Na Colômbia pude conhecer o Sena, correspondente ao nosso Senai aqui no Brasil e (sobre o qual Fabiana Carvalho comenta no trecho da entrevista abaixo) outros centros de pesquisa e investigação da utilização do bambu como o CIBAM (Centro de Investigação do bambu e da Madeira).Instituições similares a essas no país não existem . Existem alguns locais que dão cursos curtos sobre a construção com bambu além de algumas universidades que desenvolvem pesquisas sobre o tema. Porém essa pesquisa/ensino ainda é pequena para se pensar um desenvolvimento maior de uma cultura construtiva com o bambu no país. “Outro ponto que eu senti que lá tem é o curso profissionalizante. Alguns cursos profissionalizantes, no Sena que equivale a nosso Senai isso eu achei fundamental, que cria mão de obra especializada então pra gente arquiteto que projeta é muitas vezes eu sinto que a gente precisa ,está numa obra convencional a gente faz o projeto a gente tem nossa equipe de mão de obra ,já especializada mais na construção convencional ,mas se a gente precisa contratar um cara pra ,sei lá ,pra mexer na elétrica ,mexer na hidráulica a gente consegue contratar , na construção com bambu não .Tem um grupo ali

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formado mas é um grupo que não está tão coeso. Não é uma equipe que a gente consegue enquanto arquiteto manter. Uma equipe sempre, porque não é sempre que tem trabalho. Então você acaba fazendo uma coisa, mas quando surge o projeto você fica meio sem ter mão de obra pra contratar e por não ter um ensino no profissionalizante eu acho que se deixa uma base muito fraca pra profissionalizar realmente a construção e eu vi essa diferença lá. De tipo fulano fechou uma obra e que os encaixes vão ter muitas bocas de peixe e ai você consegue contratar especialistas em boca de peixe. Você viu isso lá? Não sei se você viu? Muito arquitetos e engenheiros falavam isso. Cara genial sabe aqui isso né. A gente fica cassando quem já fez cursos. Quem já aprendeu a técnica, mas não tem um órgão que regulamenta. Então eu acho que a profissionalização é um passo importante pra construção de bambu aqui no Brasil vingar.” (FABIANA CARVALHO ,ENTREVISTA AO AUTOR) “O que se entende por cadeia produtiva no Brasil é um histórico de relações com matérias e possibilidades muito negativo. Nós não podemos através do bambu, imitar as cadeias produtivas que existem porque elas já começam assim como um equívoco que é a acumulação de bens em vez da distribuição de bens. Então quando eu penso na popularização do uso do bambu eu penso em associações cooperativas e mesmo quando que as pessoas possam trabalhar no desenvolvimento individual.Eu penso na autonomia e não do sistema de um patrão que domina um mercado. Domina a tecnologia e coloca vários empregados ganhando salário mínimo ao seu serviço. Nós temos que mudar o padrão. Nós temos que mudar o padrão de salário mínimo para salário justo. Nós temos que mudar o padrão de patrão empregado para autônomos satisfeitos entendeu? Então tudo isso é uma mudança de conceito. O Brasil precisa muito de uma mudança de conceito e é muito importante que essa mudança de conceito seja feita através da educação através do entender da história política do país entendeu? Porque está tudo relacionado né.Todo o sistema produtivo, comercial e econômico no Brasil tá atrelado a questões políticas e o que nós desejamos não é o desatrelamento, mas um aprofundamento nas relações políticas que gere consciência e uma postura de autonomia e cooperação.” (LÚCIO VENTANIA, ENTREVISTA AO AUTOR) “Na Colômbia, ainda é muito tímido eu to falando um avanço mais grosso né A grosso modo como, por exemplo monocultura de bambu pra fazer esse processo de industrialização pra colocar no mercado em grandes volumes. Isso ai é completamente negativo transformar o o bambu como num eucalipto em uma outra matéria prima . .O bambu não é pra ser siderurgizada .O bambu é pra ser um elemento pra que o homem do campo faça seu usufruto e realente ele venha cumprir o papel de sustentabilidade que é uma lacuna mesmo no pais .Não precisa imitar o sistema produtivo ,econômico que ele é muito bruto ,é isso que eu quero dizer. Nós não precisamos fazer isso com bambu.” (LÚCIO VENTANIA, ENTREVISTA AO AUTOR)

Por fim, para finalizar o tema do contexto da produção da arquitetura de bambu coloco duas falas do bambuzeiro Lúcio Ventania sobre o tema e que são importantes para uma análise crítica da questão. Antes de se desenvolver uma cadeia produtiva é necessário pensar qual tipo de relações estarão envolvidas nesse processo de produção. As cadeias produtivas de outros materiais, por muitas vezes, estabelecem relações de exploração entre os trabalhadores e desse modo, como colocado por Lúcio Ventania, não seria interessante que o bambu seguisse pelo 74


mesmo caminho. Na segunda fala o bambuzeiro destaca a importância de não transformar o bambu e mais um material “siderurgizado”. A planta deve servir à população e não virar mais um material que irá entrar em uma cadeia produtiva exploratória como acontece com outros materiais convencionais.

Figura 57 - Pico nevado Santa Isabel Colômbia Fonte: Autor

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CONSIDERAÇÕES FINAIS: uma análise preliminar Nessa investigação, me aproximei de processos mais independentes em torno das técnicas construtivas na produção da arquitetura, sobretudo em relação ao bambu e materiais naturais produzidos manualmente. Cada etapa me acrescentou bastante, seja pela possibilidade de observar, experimentar ou até mesmo pela troca de sabedorias com pessoas diferentes. No intercâmbio na Colômbia, pude aprender diferentes métodos de concepção projetual, estudar a respeito das propriedades físico-químicas do bambu, bem como conhecer arquitetos e bambuzeiros, vivenciando a cultura milenar construtiva colombiana. Após essa vivência, minha pesquisa seguiu em direção ao levantamento de campo entrevistando pessoas que trabalham diretamente com o bambu, que me possibilitaram aproximar desse material e entender as especificidades de sua prática construtiva, bem como as possibilidades de aplicação projetual. As entrevistas foram de grande valia para o trabalho em vários aspectos. A partir da fala de Lúcio Ventania, por exemplo, friso sua análise sobre o a popularização do uso do bambu. Segundo o mesmo, para o uso desse material se tornar cada vez mais popular, as pessoas deveriam buscar mais autonomia e independência em sua utilização no trabalho, isto é, sair de um modelo hierárquico de alienação e exploração para relações horizontais de cooperação, podendo assim, o bambu, vir a ser um excelente material para atender as necessidades humanas. Portanto, essa monografia buscou realizar um compilado dos registros e descobertas durante essa investigação em torno do bambu e alternativas para uma arquitetura mais independente, bem como estabelece uma reaproximação com minhas raízes ancestrais.

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O CERBAMBU RAVENA – Centro de Referência do Bambu e das Tecnologias Sociais. Disponível em <https://www.cerbambu.org.br/quem-somos>, acesso em Novembro de 2019, s.d.

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