Bauru: Vida nos bairros

Page 1

Bauru

Viver numa cidade com mais de 300 mil habitantes pode tornar imperceptĂ­vel as variadas faces que a compĂľe:

Vida nos Bairros


Editorial Vidas que constroem a história bauruense Um mundo de cultura e de gente. Essa é a proposta do suplemento Vida nos Bairros, que pretende mostrar ao leitor, bauruense ou não as curiosidades e histórias ricas de nosso povo. Histórias como a dos jovens que, com opções limitadas de lazer, se aglomeram em locais como o shopping e a Praça da Paz. Histórias como a do Instituto Lauro Souza, um centro de tratamento da hanseníase que existe na cidade desde 1933. Conheça as memórias que se escondem por lá. E quem diria que Bauru também poderia ser curiosa? No Geisel, um instituto que ensina Kung Fu é reconhecido internacionalmente pelo nível de seus atletas. A vista geral do mapa da

cidade, prevista pelo Plano Diretor do município, abre este caderno. No decorrer das páginas, partimos do Centro para a periferia, sempre mostrando diferentes bairros, instituições e atividades. Nesse caminho, conhecemos muitas pessoas que, normalmente, não têm voz fora de sua comunidade. Como aquelas ligadas ao projeto 100% Arte, desenvolvido no Jardim Ouro Verde, ou professores de uma escola que reúne crianças carentes para aprender a arte centenária do circo no Parque Vista Alegre . A proposta desse suplemento é abrir espaços para o esporte, lazer, cultura, comércio... enfim, mostrar a vivência dos moradores em cada um de seus bairros.

Expediente Editor

Revisão

Reportagens

Diagramação

Lucas Santana

Daniel Farias

Carolina Seiko Daniel Farias Felipe Godoy Henrique Tobias Janaína Ferraz Karen Menegheti Lucas Santana Victor Santos

2

Vida nos Bairros

Lucas Santana

Orientação

Ângelo Sottovia MTB 12.870 Renata Malta MTB 34.600

novembro de 2011

Índice

45 86 9 3 7

1110 12

Centro

Ainda há quem goste de morar no centro da cidade.

Ouro Verde

Bairro conhecido pela violência desenvolve projetos sociais para envolver moradores.

Jardim Aeroporto

Conheça a dupla jornada da avenida: de dia a boa forma, à noite a boemia

Geisel

Centro de ensino de Kung Fu é reconhecido internacionalmente

Vila Independência

Conheça o bairro com a maior concentração de asiáticos de Bauru

Mary Dota

Moradores se orgulham de seu bairro, que tem estrutura semelhante a de uma verdadeira cidade

Parque Vista Alegre

Casa do Garoto resgata universo do circo em iniciativa pioneira na cidade

Mapeando Bauru

Entenda onde ficam os bairros visitados pela reportagem do Vida nos Bairros

História

Instituto Lauro Souza, antigo abrigo de pessoas com hanseníase, hoje é referência de saúde

Crônica

Conta a história da Vila Falcão, de um tempo que se foi, mas que permanece na memória

Esporte

Times de várzea dão suporte para os bairros de origem.

Lazer

Jovens das periferias de Bauru encontram diversão longe de seus bairros

Curiosidades

Alguns números importantes (e outros nem tanto assim) sobre Bauru


Mapeando

Bauru ´Área Rural

Ficha Técnica Idade: 115 anos Nome: Conhecida pelo lanche de mesmo nome – de receita controversa – o nome da cidade significa em língua tupi, “cesta de frutas” ou “bauruz”, como eram conhecidos os índios que habitavam as magens do Rio Batalha. Economia: Forte comércio e prestação de serviços Cartão-postal: Parque VitóriaRégia, Templo Tenrikyo e Museu Ferroviário

´Área Rural

Localize-se 1 - Centro 2 - Ouro Verde 3 - Jardim Aeroporto 4 - Mary Dota 5 - Parque Vista Alegre 6 - Geisel 7 - Vila Independência 8 - Vila Falcão

Mapas: Plano Diretor/Prefeitura; Informaçãoes cartográficas aproximadas

´Área Urbana

novembro de 2011

Vida nos Bairros

3


Centro

Centro de Bauru ainda tem moradores satisfeitos Apesar da crescente migração do centro para outros pontos da cidade, a praticidade de serviços perto de casa é o que ainda mantém pessoas no bairro Henrique Tobias

O comerciante, José Melhem, por exemplo, morou no centro de Bauru durante praticamente a vida inteira. São cerca de cinquenta anos de satisfação com o bairro. José possui uma lanchonete na mesma quadra onde mora e tem poucas queixas sobre o local. “Adoro morar no centro. É tudo prático, é tudo fácil. Você não precisa de carro”.

Janaína Ferraz

Referência de comércio em Bauru, o centro da cidade tem um histórico de êxodo de residentes para outros bairros. Os imóveis, antes casas, foram, aos poucos, se tornando lanchonetes, restaurantes, escritórios, clínicas, e, sobretudo, lojas. Apesar disso, o centro ainda tem residências de pessoas que não se incomodam com o grande movimento rotineiro da região.

Casas residenciais são cada vez mais raras no centro da cidade

Ele já morou em outro bairro da cidade, mas acabou voltando ao centro por oportunidades melhores. José fala que recusou ofertas de compra de sua casa pela paixão que tem pelo lugar. “É um amor que não dá pra dizer o porquê”. José apenas reclama da falta de segurança à noite e da dificuldade que as pessoas têm para estacionar o carro. Outra residente do centro, Isabela Birali Braga, estuda arquitetura na Unesp e vive em uma república há quatro anos. Além de gostar do local porque há colegas morando perto, ela também fala da praticidade de estar no bairro e não tem nenhuma reclamação. “No centro, é muito mais fácil”, diz a estudante. O centro geralmente é o lugar da cidade aonde os bauruenses vão para cumprir suas obrigações diárias, além de ser oportuno para lazer. Mas seja uma conta para pagar ou um presente para comprar, o destino é sempre longe de casa, exceto para aqueles que fizeram, e continuam a fazer, de suas moradias um complemento dessa correria do dia a dia. •

Ouro Verde

“Somos associados à violência” Fotos: Lucas Santana

Ouro Verde ficou conhecido pelos crimes violentos, mas o bairro mantém projetos sociais e se organiza para criar alternativas para jovens e adultos Lucas Santana

Quem passa pelo Jardim Ouro Verde e região encontra um clima quase bucólico. Essa idéia de aparente tranqüilidade só é abalada quando Adriano Albino, presidente de uma ONG que atua no bairro, diz que a região ficou conhecida por ser associada a crimes violentos ocorridos em Bauru. “Alguns crimes aconteceram em bairros próximos, mas nos jornais sempre sai que foi no Ouro Verde”, explica. O bairro é fruto de um empreendimento residencial falido que resultou em anos de ilegalidade diante da prefeitura e alguns problemas de ocupação que persistem até hoje, como as esquinas com terrenos vazios. A legalidade só veio em 1996, quando a região começou a receber investimentos do município. Distante quase sete quilô-

4

Vida nos Bairros

metros do Centro da cidade, os moradores do Ouro Verde e dos bairros que o cincurdam têm poucas opções de lazer e cultura. O Recinto Mello Moraes, próximo ao bairro, vez ou outra oferece eventos e apresentações musicais gratuitas, dando possibilidade aos moradores de algum entretenimento. Contudo, para Adriano, que guiou a reportagem pelo bairro, o Recinto representa muito pouco para a população. “Quando tem show, podemos ouvir de dentro das nossas casas”, diz. A melhor alternativa fica mesmo por conta dos projetos sociais que atuam no bairro. Sessões de cinema, biblioteca e bateria de percussão são apenas algumas das atividades promovidas pelo Proje-

novembro de 2011

to 100% Arte em parceria com o Centro Comunitário que atua no Ouro Verde. Luiz Augusto, de 24 anos, é um dos coordenadores do Projeto, para ele a importância de desenvolver atividades socioculturais no bairro é muito grande. “Para muitos, é a única área de lazer e o Projeto serve como chamariz para o jovem do bairro”, explica. Luiz entrou no 100% Arte há 4 anos, na bateria de percussão, e hoje, trabalha como multiplicador, ensinando outros jovens. Ele diz ser gratificante poder oferecer uma opção cultural para meninos e meninas do bairro que aderem ao projeto em grande número. Entretanto, diz ainda haver bastante relutância dos adultos em participar das atividades. •

Acima, faixada do Projeto 100% arte, desenvolvido no bairro. Abaixo, academia ao ar livre é uma das poucas opções de lazer do Ouro Verde,. Entretanto a falta de iluminação prejudica o uso por trabalhadores no período noturno.


Fotos: Janaína Ferraz, que colaborou com a diagramação

Jardim Aeroporto

Getúlio dia e noite: da boa forma à boemia A avenida Getúlio Vargas, uma das mais conhecidas e movimentadas da zona sul de Bauru, é o ponto de encontro de jovens, crianças e idosos. Graças a sua vida sem descanso: de dia, os bauruenses aproveitam o espaço de lazer para a prática de exercícios; à noite, os bares e casas noturnas viram o point da galera Janaína Ferraz, com colaboração de Lucas Santana

nascida em Bauru e há doze anos não deixo de vir caminhar um dia sequer. Aqui é melhor que muita academia por aí!”, diz a bauruense. Ao passar das horas, a manhã vai se deixando levar pelo calor intenso do meio-dia. A avenida lota de carros, os comércios lotam de gente e o trânsito mostra porque a Getúlio é a via mais importante de Bauru. E passa carro e passa gente, volta carro e vai gente. Num ritmo que parece acelerado, mas não é (a velocidade máxima permitida é de No silêncio da manhã, a Getú- 50 km/h), o pôr-do-sol vai com o lio acorda com os poucos ruídos fim do dia, junto ao ritmo frenético de passos daqueles que madrugam do horário de almoço. A tarde chega. Voltam-se as para o exercício matinal. Ao lado do Aeroclube de Bauru, ponto tu- caminhadas, os ciclistas, as crianrístico e patrimônio histórico da ci- ças que depois da escola ganham dade, a avenida começa sua rotina alguns minutos de lazer antes de diária bem cedo e, aos poucos, se ir para casa. “Minha mãe me traz enche de pessoas em busca de bem aqui porque é bonito e dá pra andar estar. Local de caminhadas, trânsi- de bicicleta”, diz Isabela, 9 anos. E a Getúlio se enche de novo, to de bicicletas e prática de esportes, a manhã getuliense se inicia no mas agora de pessoas, que fazem daquele espaço de impaciência e melhor estilo de vida saudável. Da Praça Líbano até o acesso pressa um local de lazer e saúde. O à Rodovia Marechal Rondon, a sol se vai.... Avenida Getúlio Vargas percorre vários bairros da cidade. Residência da elite bauruense, de um lado, encontram-se as belíssimas casas-jardins; de outro, os condomínios murados e isolados por sistemas de segurança. Com aproximadamente 5 km de extensão, a Getúlio é símbolo de beleza e saúde e tem cerca de 1,5 km de ciclovia destinada a ciclistas e pedestres. Rosângela de Almeida, praticante assídua das caminhadas na avenida, conta que o espaço, para ela, é o melhor local da cidade. “Adoro a Getúlio. Sou

E o dia vem....

...cai a noitinha Balada, barzinhos, som, pessoas por todos os lados, a noite da Getúlio acaba de começar. Ponto de encontro não só de jovens, mas também dos maduros e boêmios bauruenses, a avenida concentra os bares e as casas noturnas mais badaladas da cidade. “E aí, vamos passear na Gét?” é expressão comum entre os frequentadores da vida noturna na avenida, o novo centro de curtição. “Primeiro os donos de bares e o público preferiam a Duque, depois a Nações e agora o novo point é a Getúlio, a avenida do momento”, diz Eliana Firmino, gerente de um bar. Uma pesquisa realizada em 2009 pela extinta Asa Sul aponta que, há dois anos, a zona sul de Bauru já mantinha mais de mil estabelecimentos. É uma média de cinco funcionários por local, ou seja, cerca de 5 mil pessoas trabalhando na região. Apesar de os dados referirem-se a toda a área, é possível ter a dimensão da visibilidade e da importância econômica atual da Getúlio, sem dúvida a maior representante da zona sul. Antigamente, a avenida era uma estrada que ligava Bauru a Agudos. Aos poucos, porém, ganhou

força comercial, destacando-se os bares que dominam o comércio todas as noites, principalmente aos fins de semana. “Aos domingos, por exemplo, o maior movimento é durante a tarde e início de noite, por causa dos jogos na televisão”, conta Alexandre Cardoso, gerente de uma choperia. A noite chega ao auge. O barulho domina toda a avenida e trânsito volta ao caos. Quem mora por perto diz se incomodar. “Ah, o barulho à noite é terrível. Ou você se acostuma a ele ou você se muda”, afirma Letícia Alcântara, moradora de um dos poucos prédios residenciais da Getúlio. Na madrugada, por volta das 4 da manhã, as veias da grande avenida diminuem a pulsação. Aqueles que durante o dia correram e se exercitaram em busca da boa forma, agora seguem para casa sob efeito do álcool, trocando as pernas e procurando o caminho de volta. A avenida finalmente cessa para um breve descanso, pois o sol já vem surgindo. Novamente a Getúlio acorda com os poucos ruídos de passos daqueles que madrugam para o exercício matinal. E o dia vem.... •

novembro de 2011

Vida nos Bairros

5


Mary Dota

Na alegria e na tristeza Felipe Godoy

Com satisfações e alguns percalços, a relação entre o Mary Dota e seus moradores assemelha-se a um verdadeiro casamento

Felipe Godoy e Victor Santos

Aluguéis nas alturas. Rodeio que atrai multidões. Uma população de cerca de 50 mil pessoas. Um comércio vivo que funciona ativamente em pleno final de semana. Com características típicas de uma cidade de médio porte e considerado um dos maiores núcleos habitacionais da América Latina, o bairro Mary Dota consolidou-se pela fama de ser “uma cidade dentro da cidade”, com os problemas e as qualidades que essa relativa independência pode trazer. “Aqui é demais, não troco por nada”, comenta Sandra Pinheiro, 55 anos. A moradora, que vive no bairro há mais de 20 anos, sorri ao dizer que foi privilegiada por ver o bairro crescer e se tornar o que é hoje. Para Sandra, alguns dos pontos positivos do local são os eventos culturais frequentemente realizados, como shows de cantores sertanejos, festas para crianças e o rodeio, “uma delícia”, relata a moradora. Rafael Santana, membro da Associação Comercial dos Empresários do Mary Dota (ACEMAD), ressalta o forte lado comercial da região. O bairro conta com mais de cem comerciantes vinculados

6

Vida nos Bairros

novembro de 2011

Com uma estrutura típica de um município, Mary Dota possui um comércio que funciona ativamente até o anoitecer à ACEMAD, e para Rafael, o comércio está em ascensão, “houve um grande aumento e estão vindo muitas empresas e agências bancárias pra cá”, anima-se. PROBLEMAS E SOLUÇÕES Por ser um bairro com cara de cidade, o Mary Dota enfrenta obstáculos característicos de um verdadeiro município. Um deles diz respeito à segurança pública, “o fraco do nosso bairro é a polícia”, afirma a moradora Sandra. Por outro lado, o local conta com ótimas iniciativas, como a da ONG Periferia Legal, que visa combater alguns dos problemas sociais. O presidente da ONG, Vanderlei Nogueira, declara que o objetivo do grupo é “fortalecer a + cultura nas comunidades”. O ramo imobiliário também enfrenta dificuldades. A maioria dos moradores faz queixas sobre o valor abusivo dos aluguéis; além disso, são enormes as listas de espera para se conseguir uma locação. Nada que impeça o desenvolvimento do bairro, que continua crescendo alçado por um forte comércio e uma população que se orgulha de viver naquele lugar. •

Quem foi Mary Dota? Mary Nair Matheus Dota nasceu em Bauru no dia 12 de dezembro de 1946. Foi casada com Milton Dota, com quem teve quatro filhos. Mary se dedicou a uma vida de trabalhos sociais e políticos. Faleceu em um acidente de carro na cidade de Catalão (Goiás), em 1989, com apenas 43 anos de idade. Mary Dota foi gerente da COHAB, Companhia de Habitação Popular de Bauru, e militou contra a ditadura militar durante boa parte da vida. Também atuou como psicóloga em escolas.

+

A primeira a chegar O Mary Dota tornou-se oficialmente um núcleo habitacional no dia 09/12/1991. Tem gente que mora lá desde a sua fundação, caso de Nair Pinheiro, 79 anos. “Fui a primeira moradora”, conta. A casa de Nair foi entregue três meses após o falecimento do marido. Viúva, ela mudou-se para o bairro num período difícil. “Quando mudei não tinha nada, nem água, nem luz, não tinha nem rua. Eu via os bois passando”, explica. Após o asfaltamento, inúmeras famílias mudaram-se para lá. “Isso aqui virou uma cidade”, comenta a moradora, que enumera as vantagens de se viver ali. “O ônibus passa na minha porta, tem farmácia, mercado, loja de roupa”, acrescenta.

Mais alegria na periferia

Fundada no ano 2000 por três estudantes universitários, a ONG Periferia Legal surgiu no bairro Beija Flor. Desde então expandiu muito sua área de atuação, com forte presença nos bairros vizinhos como o Jardim Parque Real e o Núcleo Habitacional Mary Dota, a ONG já visitou doze outros bairros bauruenses. O presidente da ONG, Vanderlei Oliveira, revela que a principal missão da organização é “realizar ações sociais nas periferias e, com isso, proporcionar oportunidades para o desenvolvimento das comunidades locais”. Para tanto, criou-se em 2004 o projeto Ação

Legal, que consiste em eventos realizados quinzenalmente, cada qual em um dos bairros que recebe cobertura da ONG. Atuando nas áreas de assistência social, educação, cultura, saúde, meio ambiente, geração de renda e, principalmente, esporte e lazer, a ONG visa levar às comunidades o que não lhes é oferecido pelo poder público. “Nosso trabalho é voltado para a periferia”, explicita Vanderlei, que também relata as principais ações da Periferia Legal, “já tivemos corrida, axé, samba, rock, já trabalhamos nas escolas, mas o nosso foco é mesmo o hip hop”.


História

Perdido no tempo

Instituto Lauro de Souza Lima, hoje desenvolvido centro de pesquisa, carrega um passado cheio de boas histórias Felipe Godoy

Arte de Felipe Godoy, que colaborou com a diagramação

+

Já é quase meio-dia. O sino da igreja há muito deixou de soar. As ruas largas de paralelepípedo estão desertas e o único som que quebra este profundo silêncio do cachorro acostumado à vida pacata do bairro. Essa cena em nada lembra o brilho e a agitação que lhe eram característicos durante a primeira metade do século XX. O Asilo-Colônia Aimorés, fundado em 1933, pode sim ser chamado de bairro, mas um bairro muito peculiar. Construído para servir de abrigo aos portadores de hanseníase, na época conhecida como lepra, o bairro ficava 10 quilômetros distante de Bauru e, por causa desse isolamento, possuía a estrutura de uma pequena cidade. Além da igreja, havia um cassino, um estádio de futebol, fabriquetas e até um cemitério, tudo trabalhando em prol do bom andamento dessa comunidade que chegou a ter mais de dois mil habitantes. + A maior parte dessa estrutura não existe mais, e o que sobrou, pertence ao Instituto Lauro de Souza Lima (ILSL), órgão governamental de pesquisa e tratamento de doenças dermatológicas. Pouco resta para ver, mas ainda há muita história para contar. Jaime Prado, jornalista e funcionário do instituto há 35 anos, luta com todas as forças para manter essa história viva.

Em pouco tempo de conversa é possível notar que Jaime nutre grande paixão por essas memórias, paixão essa que vem desde os tempos de garoto. “Entrei pela primeira vez clandestinamente para assistir a um jogo de futebol, à medida que a bola rolava, parece que fui sendo contaminado pela história daquele local”, lembra. Mas sua memória não é a única fonte de dados daquela época. O jornalista mantém um extenso arquivo de fotos antigas, cerca de sete mil, entre originais e digitalizadas. Jaime conta ainda que os internos chegavam ao Asilo-Colônia Aimorés sem esperanças de voltar à sociedade, afirmando que “na época da fundação, não havia cura nem tratamento decente para a doença”. Ao chegar lá, esses mesmo internos encontravam uma sociedade paralela, com leis e organização próprias, onde os preconceitos ficavam do lado de fora, assim como suas famílias e toda uma vida, que daquele momento em diante, não seria mais a mesma.

Com o fim do isolamento compulsório, os internos tornaramse funcionários do Estado com direito a aposentadoria

Apesar da dor pelo isolamento compulsório, que perdurou no Estado de São Paulo até 1967, a vida era agitada dentro das fronteiras do Asilo-Colônia. Havia uma rádio comunitária, a Rádio Publicidade Aimorés, e o que não faltava eram grandes comemorações: Festas Juninas, Carnaval e shows, com bandas muitas vezes compostas inteiramente por internos. Cleide Ortega, encarregada do Setor de Recursos Didáticos e Pedagógicos do ILSL, conta que os moradores assumiam diversas funções essenciais dentro da comunidade. “Muitos prédios construídos após a fundação foram feitos por eles, que com o fim do isolamento compulsório, passaram a ser funcionários do Estado e ter direito a aposentadoria”, explica. Jaime acrescenta que, devido à preocupação dos moradores com a beleza e a limpeza das ruas e praças, o bairro ficou conhecido como “Cidade Jardim”. Mas nem só de flores resume-se o passado do Asilo-Colônia. Houve uma grande rebelião no dia nove de julho de 1945. “Foi uma revolta, era uma manifestação dos internos e os caras quebraram tudo”, descreve Jaime. Em contraponto com tal passado, recheado de agitação, os quase quarenta ex-internos que por lá ainda moram enfrentam um cotidiano monótono num lugar que aprenderam a chamar de lar. •

Trajetória histórica de uma referência em saúde

No ano de 1933, em uma área cedida pela fazenda Violante, surgia em Bauru o Asilo-Colônia Aimorés. Sua criação foi uma iniciativa conjunta de diversas cidades do noroeste paulista, que naquele período destinavam 10% de sua verba para a construção de uma área dedicada às vítimas da hanseníase. Na mesma década de 30, como forma de evitar a endemia da “lepra”, o isolamento dos doentes tornou-se compulsório. Entre 1949 e 1969, o local passou a se chamar Sanatório Aimorés. Apesar da abolição da internação compulsória, determinada por lei no Brasil em 1954, apenas 13 anos depois ela chegou ao Estado de São Paulo. De acordo com Cleide Ortega, encarregada de recursos didáticos e pedagógicos do Instituto Lauro de Souza Lima (ILSL), quando o Estado percebeu que era mais vantajoso investir em pesquisa e tratamento do que na manutenção de um sanatório, desenvolveu-se a estrutura de um grande centro de saúde. Primeiro chamado de Hospital Aimorés de Bauru, depois Hospital Lauro de Souza Lima e, desde 1989, já como Instituto, o local tornou-se referência não só na área da hanseníase como também na dermatologia em geral. O ILSL promove eventos durante todo o ano, além de quatro cursos, e conta com 347 funcionários.

Victor Santos

novembro de 2011

Vida nos Bairros

7


Geisel

Kung Fu no Geisel Associação Garra de Tigre desenvolve no bairro trabalho de reconhecimento internacional

Daniel Faria

Daniel Faria

Alunos realizam exame de graduação na Academia do Geisel

Arte de origem chinesa, o Kung Fu parece remeter a tradições orientais e a filmes de Bruce Lee. Certo? Não no Núcleo Geisel. Quem conhece o trabalho desenvolvido há mais de 15 anos pela Associação Garra de Tigre de Kung Fu Hung Gar (AGTKF) sabe que, em Bauru, Kung Fu significa formação de caráter e reconhecimento internacional. Com sede na Academia Municipal Francisco Takao Kajino, a AGTKF foi idealizada em 1995 pelo então estudante da Unesp Richard Leutz. Entidade sem fins lucrativos a academia sobrevive de doações, patrocínios e dos valores arrecadados com os exames de graduação. As aulas são gratuitas. “No início, atendiamos apenas os moradores do Geisel e proximidades”, explica Leutz. “À medida que e o trabalho evoluiu, interessados de toda parte de Bauru e de outras cidades foram aparecendo”. Por que a escolha pelo Geisel? “Por residirmos ali”, diz o professor Leutz. “Além disso, sabíamos

que existia uma falta de opção para as crianças da comunidade”. Uma das crianças da comunidade que ingressaram logo nos primeiros anos é João Oliveira, hoje com 22 anos. “O João é hoje nosso principal atleta ”, comenta Leutz. Iniciado no Kung Fu aos 9 anos, João possui 11 títulos paulistas, 10 brasileiros, e é atual campeão pan-americano. O foco do trabalho é formar outros campeões como João? “Não mais”, diz Leutz. “O principal objetivo é a formação do caráter do indivíduo através dos conceitos existentes no Kung Fu, que ensinam a, entre outras coisas, respeitar o próximo, saber lidar com os desafios da vida e ter força de vontade”. A AGTKF já representou Bauru em oito estados brasileiros, além de promover a cidade internacionalmente. Em 2011, Richard Leutz foi o representante brasileiro no tradicional evento de Kung Fu realizado no Templo Shaolin, na China, com mais de 60 mil pessoas e atletas de 59 países. •

Vila Independência

Pedacinho do Japão Templo Tenrikyo erguido há 60 anos preserva a cultura japonesa na Vila Indepedência Carolina Seiko

Passando pelo viaduto Mauá, da avenida Pedro de Toledo, sentido Falcão, é possível avistar o telhado de uma construção que parece perdida em meio às demais casas ao redor. A igreja Tenrikyo, na vila Indepedência. Religião japonesa, a Tenrikyo tem como bases fundamentais para uma vida plena e de alegria, a gratidão, a satisfação e a salvação. Em Bauru encontra-se a sede missionária Dendotyo, que em julho deste ano completou 60 anos. Além de ser ponto de encontro das famílias japonesas, a igreja é local onde a cultura nipônica se mantém viva. Eventos anuais como o Undokai contam com o apoio da Tenrikyo, que também oferece aulas de japonês e atividades para várias faixas etárias. Abaixo da igreja, existem as Casas de Divulgação, moradias dos próprios fiéis, onde as pessoas reúnem-se para prestar seu culto.

A Tenrikyo na época do pós-guerra era como um refúgio para os japoneses. A família de Giro Ishikawa saiu de Avaí e mudou-se para a Vila Independência, em Bauru, no ano de 1945. Hoje, com 93 anos, ele relembra que sua família era budista, e por causa da igreja Tenrikyo de Bauru, sua família começou a seguir a religião. Seu sobrinho, Tadashi Ishikawa trabalha no templo. Ele explica que o Centro representa a vida de uma mulher, chamada Oyassama, que seria a porta-voz de Deus. Em 1930, segundo informações do Clube Cultural Nipo-Brasileiro, residiam 23 famílias de imigrantes japoneses em Bauru. Dessas, dez eram originárias da províncias de Okinawa. Sendo peritos na produção de legumes e hortaliças, as famílias estabeleceram-se às margens do córrego Água do Sobrado, aos arredores da Vila Independên-

cia, para aproveitar a água para irrigação. Esses são os pioneiros, e seus descendentes mantém a região como a maior concentração japonesa de Bauru. •

Templo Dendotyo em dia de cultos reúne até 600 pessoas de 80 igrejas do Brasil todo

Divulgação

8

Vida nos Bairros

novembro de 2011


Parque Vista Alegre

Respeitável circo! Como a Casa do Garoto trabalha para manter vivo esse universo mágico

Fotos: Karen Menegheti

“Malabares é uma coisa dificílima de se aprender; mas quando aprendem, não param mais”, afirma o professor Paulo Sérgio Rodrigues

Karen Menegheti

Acrobacias, saltos, corda bamba, perna de pau, malabarismo: esses são os números que a jovem trupe realiza, entretendo o público e mantendo viva uma tradição. A equipe de educandos da Casa do Garoto conta com 350 jovens, e todos passam pela oficina de circo. Quarenta artistas, os que mais se destacavam, formaram-se e já apresentaram quatro espetáculos. Além da oficina de circo, a entidade localizada no parque Vista Alegre e vinculada à Paróquia Nossa Senhora das Graças oferece outros cursos e atividades no contra-período escolar, para crianças e adolescentes de 7 a 17 anos. A Casa do Garoto foi um antigo internato e abrigava somente jovens do sexo masculino, hoje atende meninos e meninas. A assistente social da Casa, Elizabeth Baio, conta que certa vez foi contratado um espetáculo de circo de uma universidade particular de Bauru e tanto a direção quanto os educandos adoraram. Assim, tiveram a idéia de montar a Oficina de Circo e, após três anos reformulando o projeto e apresentando-o junto ao Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), a Oficina foi aprovada. Projetos como esse costumam

provocar efeitos positivos na vida dos jovens. Elizabeth comenta algumas mudanças de comportamento: “muitas vezes procuramos colocar os mais bagunceiros nessas oficinas porque o resultado é muito satisfatório”. No espetáculo o artista faz de tudo um pouco, o que cria um senso de responsabilidade e de colaboração e melhora a auto-estima, reforça Elizabeth. Quem vai mal na escola regular não pode participar das oficinas nem do espetáculo. Como os jovens adoram a atividade, procuram não “sair da linha”. Assim, as melhorias em questão de disciplina e notas escolares são efetivas. Mas nada disso seria possível se não fosse a paixão do palhaço Rogerito pelo circo. Esse é o nome artístico do professor Paulo Sérgio Rodrigues, que ministra as oficinas. Paulo Sérgio trabalha e vive verdadeiramente no universo do circo desde os oito anos de idade. Além disso, trabalhou seis anos fora do Brasil. O professor procura passar toda essa experiência como exemplo para os jovens: “eu fico muito feliz por isso, porque é uma coisa que eu amo e estou conseguindo resgatar através deles essa cultura”. Assim como Paulo Sérgio começou cedo na vida circense, al-

guns talentos revelados pela oficina parecem apontar para o mesmo caminho: os palhaços Babalu e Bochechinha já seguem profissionalmente com Rogerito em turnês. O circo popular ou tradicional, que de modo geral caiu em quantidade nos últimos anos devido à ascensão de novas formas de entretenimento como a TV e a internet, agora se revitaliza e se consolida em sua forma popular, com iniciativas como essa. Além da revitalização do circo como um todo, Paulo Sérgio também acredita na importância do projeto para a região de Bauru e reconhece o produto de seu trabalho. “Eu me dediquei muito pra que isso desse certo e graças a Deus o sonho foi realizado”, orgulha-se. De fato, ao assistirmos o espetáculo de circo fica evidente a dedicação dos profissionais da Casa do Garoto. Paulo Sérgio, além de ministrar as oficinas, também monta alguns dos equipamentos utilizados. Além disso, existem dificuldades financeiras e de divulgação. Mas a trupe da Casa pretende ampliar seu trabalho para que, no futuro, a oficina seja estendida à comunidade. Afinal, o espetáculo não pode parar. •

Luan Ferreira, de 14 anos, estuda e mora no jardim Araruna e está há dois anos na oficina. Começou por influência do irmão nos malabares. Seu personagem, o palhaço Tampinha, comprova as melhorias do circo na vida de um adolescente: “era extremamente malhumorado e aprendi a lidar e me importar com os outros; também foi me ajudando a perder a vergonha. É uma alegria pra mim ver as crianças alegres, é inexplicável”.

Eu me dediquei muito pra que isso desse certo e graças a Deus o sonho foi realizado

novembro de 2011

Vida nos Bairros

9


Lazer

“ A gente quer comida,, bagunca e o c@r4l#0 ” Lazer dos jovens das periferias bauruenses é encontro semanal nas Nações Unidas Janaína Ferraz

Sexta-feira, 19h. Desliga a TV. O prato já está na mesa com aquele cheiro bom de comida fresquinha. A mãe chama: “Vem que a janta tá pronta!”. Come. Pega o prato e deixa na pia. Toma banho. Abre o armário, procura o que vestir. Cadê “as roupas de sair”? “Manhê, você não passou a minha calça nova?”. “Passei sim senhor! Está no cabide!”. Veste a melhor que tem. Toma outro banho, mas agora de perfume. No cabelo vai metade do pote de gel. Pronto. Beija a mãe e pede a benção. “Ah, esqueci o celular!”. Agora sim. Ao som de Mc Catra no volume máximo que o celular aguenta, o ônibus parte. Do bairro

Mary Dota até o Bauru Shopping são dois ônibus. No mínimo 40 minutos de viagem. E parte. A sexta-feira acaba de começar. Para eles. Há cerca de dez anos, o encontro dos jovens da periferia de Bauru acontece todas as sextas e sábados entre um fast food árabe e a Praça da Paz, na Avenida Nações Unidas, região nobre do município. Não muito diferente de qualquer outra cidade do interior, os adolescentes costumam ter seu ponto de encontro semanal. Antigamente, a turma de bairro se via na pracinha, em frente à paróquia depois da missa, ou ali na calçada do sr. Joaquim. Mas, o que acontece quando a cidade cresce, a pracinha some e o sr. Joaquim muda de endereço? Bauru tem aproximadamente 350 mil habitantes e é pólo econômico do centro oeste paulista. A região central, os condomínios e

Encontro é conhecido também como mano’s day Henrique Tobias

Praça da Paz virou ponto de encontro dos jovens às sextas-feiras

Mas afinal, o que é lazer? “Como é mesmo aquela música dos Paralamas, tia? A gente quer comida, não é? Pois é, a gente não quer só comida, a gente quer comida, bagunça e o c...!”, falou às gargalhadas um dos garotos ao mencionar a música “Comida”, dos Titãs. A falta de lazer nos bairros mais afastados de Bauru parece não ser o principal motivo do encontro dos jovens em outras regiões da cidade. Segundo estudos realizados pela Universidade de Montes Claros (UNIMONTES), em Minas Gerais, os adolescentes em geral não possuem muita informação a

10

Vida nos Bairros

respeito do que seja lazer. Em termos práticos, lazer é tudo aquilo que se dispõe a ser feito para a distração, num tempo ócio. Esse tempo inutilizado é a chave da questão. Os jovens estão cada vez mais ociosos, passando horas em frente à TV e aos computadores. A mesma pesquisa aponta que as atividades que os adolescentes mais gostariam de fazer requerem dinheiro. O resultado mostra que mais de 60% deles afirmam não ter condições financeiras para a diversão que desejam.

novembro de 2011

bairros de classe alta se resumem a 20% da cidade. Os outros 80% de Bauru são compostos de grandes regiões periféricas, com seus próprios centros urbanos e que possuem vida independente. Porém, quando se trata de lazer e cultura, os moradores se veem limitados a um shopping distante, a um teatro monopolizado e a pequenos e carentes centros esportivos. O resultado disso é o êxodo cultural na cidade. Retrato que não agrada a todos. Conhecido pelos moradores da região das Nações como “Mano’s Day” (Dia dos Manos), o encontro dos jovens é visto como vandalismo, bagunça e falta de organização. Carlos José de Martins, gerente do fast food conta que os jovens que frequentam o local costumam ser bastante desordeiros. “Uma parte conversa, fica quietinha no

canto com os amigos. Mas muitos deles ficam consumindo bebida alcoólica, correm no meio da rua e sempre arrumam brigas”, diz o gerente, que afirma diminuir bastante o número de clientes no estabelecimento quando os jovens estão por perto. Max Antonio, 14, é morador do Bairro Nova Esperança e frequenta o local desde os 11. “Eu venho à Praça da Paz zoar com a molecada, ficar com as meninas e beber com os amigos”, conta o garoto, que afirma não deixar de vir à região, ainda que houvesse mais lazer em seu bairro: “Mesmo se tivesse alguma coisa legal para fazer onde eu moro, eu continuaria vindo aqui. É o melhor lugar da cidade. Tem shopping, as melhores meninas, todo mundo que eu conheço vem pra cá”.

DA CAVALARIA AO CAOS

acompanha. Edson Antonio, cabo da cavalaria do 4° batalhão de Bauru, diz que muitas vezes a polícia precisa intervir de forma mais intensa. Brigas generalizadas são comuns entre eles. Segundo o cabo, ao saírem do shopping, muitos dos jovens pixam as ruas, comércios e residências, quebram garrafas de vidro pelo caminho e chegam a consumir drogas. “Uma vez estávamos na Praça da Paz e havia uns indivíduos fumando maconha, e então decidimos revistá-los. Na hora em que o menino tirou o tênis, havia um revólver calibre 22 lá dentro”, conta Edson. O garoto em questão chegou a ser conduzido até a delegacia, mas o conselho tutelar o liberou.•

A faixa etária dos frequentadores do “Mano’s Day” é de 11 a 18 anos. A maioria diz existir um ritual sagrado entre eles: “Primeiro a gente vai ao supermercado, daí como a gente é menor de idade, tem sempre alguém mais velho. É o cara que compra bebida pra galera toda. Mas só bebida, ninguém se envolve com droga não. Depois de compradas as bebidas, damos uns rolês no shopping. Só quando o shopping fecha é que a gente desce tudo junto. E a polícia sempre vai com a gente à cavalo, mas claro que ninguém é bobo de beber na frente deles, né?”, conta uns dos garotos que se identifica como Serginho, 12 anos. A polícia realmente sempre os

Preferência dos jovens (% O que impede o lazer dos jovens 12%

Violência

16%

Falta de tempo

5%

Preguiça

67%

Falta de dinheiro Janaína Ferraz colaborou com a diagramação


Esporte

Times de Várzea têm forte ligação com seus bairros de origem Cometa Ajax e Independência promovem atividades recreativas para os moradores ros dessas atividades, o Cometa Ajax promove mensalmente algum encontro, uma feijoada, por exemplo, a fim de arrecadar fundos através de doações. O Independência também realiza arrecadações mensais desse tipo, informa o auxiliar técnico do time, Ronaldo Henrique de Campos, conhecido entre os moradores pelo apelido Rincon. Diferentemente do Cometa Ajax, porém, a sede do Independência, localizada no bairro de mesmo nome, não tem uma rotina de atividades gratuitas. Isso porque o imóvel está inacabado, diz Rincon. Apesar disso, o local ainda sedia confraternizações esporádicas gratuitamente, como festas de aniversário, casamentos e churrascos. Segundo o auxiliar, os residentes do bairro se unem para sustentar a sede e ajudam até mesmo nas obras. “Quando está de folga, vai lá ajudar”, diz Rincon ao se referir a moradores que trabalham como pedreiros. O presidente do Inde-

pendência, Marcelo Agbirto Noveli, diz que “a Vila Independência é apaixonada pelo time”. Segundo Noveli, os próprios jogadores não têm muito envolvimento com as atividades do bairro porque estão sempre ocupados com os jogos. •

Sede do time Independência tem obras inacabadas. Mesmo assim, serve de apoio para os moradores.

Foto: Carolina Seiko

Apesar do pouco tempo de existência, o Cometa Ajax e o Independência, times de futebol amadores de Bauru, mantêm uma relação solidária com os bairros onde surgiram. Nas sedes dos times, são oferecidas atividades que os moradores podem usufruir gratuitamente. Em retorno, oferecem apoio por meio de doações ou, como no caso do Independência, auxiliando em obras inacabadas. O Cometa Ajax tem sede no bairro Bela Vista. Uma das atividades oferecidas ali é a ginástica para a terceira idade. Segundo o presidente do time, Sidney Queiroz Andrade, também há atenção para os mais jovens. “Em datas especiais, como Dia das Crianças e Natal, a gente está sempre proporcionando algum evento para as crianças da comunidade”, diz. Andrade afirma que os jogadores participam dessas confraternizações com os moradores. “O time é bem enraizado ao bairro”. Para suprir os gastos financei-

Henrique Tobias

Henrique Tobias

Crônica

Vila Falcão Uma história viva

R

elembrando a vida de outrora no poema “Num bairro moderno”, o português Cesário Verde escreveu: “Como é saudável ter o seu conchego, e a sua vida fácil! Eu descia, sem muita pressa, para o meu emprego, aonde agora quase sempre chego com as tonturas duma apoplexia”. Pensei nestes versos quando conversei com Henrique Perazzi de Aquino, autor do blog Mafuá do HPA e pesquisador da história de Bauru, sobre uma das regiões mais célebres da cidade, a Vila Falcão. Veja, há muito a se falar a respeito da Vila Falcão. Pense, por exemplo, em alguns dos principais ícones culturais da cidade. Na divisa do bairro com a Vila Pacífico, encontra-se o Estádio Alfredo de Castilho, campo do Esporte Clube Noroeste, uma das mais tradicionais agremiações esportivas do interior paulista.

Além disso, a inauguração da Instituição Toledo de Ensino (ITE) na década de 1950 provocou o desenvolvimento cultural e comercial não apenas do bairro, mas de toda a cidade. Durante muito tempo, a região foi também sede da Escola de Samba Mocidade Independente, vencedora de muitos desfiles na cidade. É possível citar ainda a igreja de São Benedito, o Cine São Rafael e a Casa Confiança, partes integrantes da história bauruense. Para quem conhece intimamente a Vila Falcão, no entanto, há outros critérios para se analisar o bairro — critérios muito mais íntimos e pessoais. “Entrar naquele lugar e ver ali pessoas quase imortais nas histórias do bairro é algo como você folhear um livro de História e reviver essas pessoas frequentando alguns dos locais inesquecíveis”, compara Aquino. A história da Vila Falcão tem

início do século 20 a partir de um loteamento pertencente a Maria Falcão Machado, praticamente na mesma época do início das obras da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. A região, porém, só foi integrada ao perímetro urbano de Bauru em julho de 1918. Para Aquino, a própria constituição inicial do bairro acentua as particularidades da Vila Falcão. “A Falcão é uma das primeiras vilas destinadas aos trabalhadores da ferrovia em Bauru e pela proximidade dos trilhos, dos barracões da ferrovia e também do centro da cidade, possui uma formação única e indissolúvel”, explica. Todo bairro parece ter uma vida particular. Na Vila Falcão, esse sentimento é ainda mais acentuado. Segundo Aquino, “ali tem quase de tudo e sobra um calor humano, uma proximidade entre vizinhos, amizades, não existente em regiões mais moder-

nas da cidade. O diferencial são as pessoas, os mais velhos e esse algo a mais repassado aos das novas gerações”. Aquino conclui nossa conversa com lembranças bastante pessoais. “Minhas maiores lembranças são do meu avô, morando numa casa não mais existente, na rua Martin Afonso, onde hoje está o Supermercado Confiança. Uma imensa jabuticabeira no quintal, uma reunião familiar aos domingos e quando o almoço estava quase pronto me pediam para ir buscá-lo numa bocha existente algumas quadras abaixo de sua casa”. Como um Cesário Verde bauruense, Aquino sabe que o bairro é feito de história viva, composta de um tempo que já passou, mas que ainda permanece ali, vívida e atuante, em sua memória.

Daniel Farias

Foto: Carolina Seiko

novembro de 2011 Vida Vida Bairros novembro de 2011 nosnos Bairros

11 11


População sobreu Baur 346.650

Algunross

núme

Distância de São Paulo

673,49 Km²

sp

05 Faculdades 06 Escolas Técnicas 04 Universidades

57

agências bancárias existem pela cidade

9.000

bauruenses moram em áreas ilegais em bairros

22

bauru

345 Km

Altitude 526m

1960

ano da inauguração da TV Bauru, primeira emissora latino-amricana a se instalar no interior

R$ 1.635

é a remuneração média do bauruense

20% têm menos de 15 anos

13%

têm mais de 60 anos

Arte: Lucas Santana

Área

de setembro é fundado o Esporte Clube Noroeste

1935

fundação do estádio Alfredo de Castilho ps: Noroeste perdeu o jogo para o Campinas por 1 a 0

Dados fornecidos pelo IBGE, Prefeitura de Bauru e Seade-SP


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.