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Capítulo Três

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Brock e Jillian

Brock e Jillian

A surpresa me deixou imóvel enquanto eu encarava Brock, quieta, porque eu realmente não conseguia acreditar no que estava vendo. Não tinha como ele estar na minha frente. Até onde eu sabia, ele nunca vinha a Martinsburg. Nunca. Porque eu estava aqui. Ele tinha o mundo todo. Eu só tinha esse canto na West Virginia.

Essas eram regras não faladas.

Talvez eu tinha caído e batido minha cabeça no banheiro.

Parecia improvável.

Porque era Brock, e ele estava tão perto que eu podia sentir cheiro do perfume de sempre, a mistura fresca de folhas e vento do inverno.

O que nesse mundo ele estava fazendo nesse restaurante sem eu tê-lo visto? Mas, de novo, eu nunca fui tão observadora assim, ainda mais agora. Mas isso não explicava como Cam, que era o maior fã do Brock, não tinha sentido sua presença.

Cam iria ficar tão desapontado consigo mesmo.

“Merda,” ele disse. Meus lábios se afastaram, mas eu estava sem palavras. Brock parecia o mesmo desde a última vez que eu o vi, a vários anos atrás, mas ele estava mais... refinado, mais... bem, tudo. Ele ainda era um tanto mais alto que eu, mas ele estava com os ombros mais largos. O botão cinza estava sendo forçado no meio do seu peito. As mangas estavam arregaçadas, revelando aqueles poderosos antebraços tatuados. Havia uma nova tatuagem nele. Uma nova cor. Sua cintura afinava naquelas calças que foram feitas para ele e, pelo que eu sabia, para suas coxas definidas.

Eu olhei de volta para seu rosto. Ele não tinha mais o cabelo espetado do menino com vinte e poucos anos. Agora seu cabelo castanho escuro estava domado, cortado para que fosse penteado para trás da sua testa, e havia uns dois ou três dias válidos de barba em seu maxilar e bochecha. Ele estava mais velho.

Bem, duh. Ele teria trinta e quatro agora.

Fracas e finas linhas existiam em sua pele cor de areia, bem no canto dos seus olhos. Seu rosto ainda era todo anguloso. Bochechas altas e uma boca cheia e sensual. A cicatriz em seu lábio inferior havia praticamente sumido agora, depois de todos esses anos. A outra em baixo do seu olho esquerdo ainda aparecia, aquela que seu pai havia lhe dado na noite em que fugiu, mandando ele em direção de colisão com a minha vida.

Aqueles olhos, da cor de chocolate quente, eram exatamente como eu me lembrava, com cílios grossos e afiados, e exatamente agora ele estava fazendo comigo a mesma coisa que eu estava com ele. Observando tudo.

Seu olhar começou na ponta das minhas botas, subindo pelo jeans escuro até a blusa fina de gola rolê. Durante os anos, meu corpo tinha se igualado. Eu nunca seria considerada magra. Meu corpo era nem normal, e eu não tinha o desejo, nem a força de vontade, de passar duas horas tentando moldar ele em algo que parecesse o das mulheres nas revistas. Eu gostava da minha comida gordurosa e eu também gostava de ficar jogada num canto e de ler no meu tempo livre.

Mas eu lembrava, meio que pesarosamente, o tipo de mulher que Brock costumada ser atraído quando éramos mais novos. Mulheres com abdômen definido e pernas torneadas. O tipo de mulher que homens poderiam envolver suas mãos pela cintura delas. Alguém que passava horas malhando junto dele e ainda estaria sexy e maravilhosa quando eles estivessem suados e com as caras vermelhas. Era por essas que ele era atraído. Ainda era, considerando quem é sua noiva.

Então eu parei de pensar em mim em comparação com essas mulheres aleatórias que ele tinha ficado – com a mulher que eu sabia que ele estava noivo, porque sim, eu sabia isso sobre ele. Não que isso importasse agora, porque ele estava encarando meu rosto, e me veio à tona que ele não havia me visto pelos últimos seis anos, sem meu rosto estar inchado ou maltratado. Além do que minha família deve ter dito a ele, essa era a primeira vez que ele estava me vendo, já que eu não era fã de fotos. Nunca tinha sido, mas odiava elas mais agora. Qualquer momento que ele havia me visto, deveria ter sido apenas um vislumbre a distância.

Seus olhos se arregalaram um pouco enquanto seu olhar passava pelo meu lado esquerdo até o direito do meu rosto. O jeito que ele me olhava, uma mistura de surpresa e emoção que eu não queria ver, algo que deixou o sangue em minhas veias amargo, me tirando do meu estupor.

“O que está fazendo aqui?” Perguntei do nada.

O olhar de Brock voou para o meu. “Exatamente agora? Bem, eu na verdade estava esperando por você.” “Do lado de fora do banheiro das mulheres?”

“Yeah.”

“Isso... é muito mais que estranho,” disse, olhando para o fim do corredor. Avery e qualquer um poderia se perguntar onde eu estava. “Mas o que eu quis dizer é o que você está fazendo em Martinsburg?” “Jantando,” ele respondeu, seu olhar nunca desviando do meu. Ele segurou meu olhar com uma intensidade que eu achei muito inquietante. “Você... você está linda, Jillian.” Perdi o fôlego por causa do que pareceu sinceridade no seu tom de voz, mas quando eu percebi isso, comparado com o que ele conhecia, eu estava bem melhor. “Então, você aleatoriamente está jantando em Martinsburg no mesmo restaurante que eu?”

Brock piscou, obviamente chocado com meu tom condicente. Eu não podia culpa-lo por causa disso. Anos atrás, eu só sabia sorrir e concordar com tudo que ele dizia, tanto que meu nome do meio poderia ter sido “Capacho pessoal do Brock. Bem-vindo.” E pensando nisso, de repente eu voltei para aquela noite no bar, quando eu estava na frente dele usando o vestido que eu achava que me deixava mais velha, tão esperançosa, tão apaixonada e tão incrivelmente ingênua.

Um lado de seus lábios se curvou, e era aquele meio sorriso, aquele que Brock usava para conseguir o que queria. “Você está insinuando que eu, de alguma maneira, descobri sobre seu jantar e vim aqui de propósito apenas para te ver?” Ele pausou, seus olhos brilhando na luz fraca dos banheiros. “Como se eu fosse um tipo de stalker4?” Bem, isso soava ridículo, mas não era impossível. Minha mãe sabia que eu tinha esse encontro hoje à noite. Eu tinha contado a ela onde eu iria. Mas eu duvidava que ela tinha contado a Brock.

Melhor que ela não tivesse contado a Brock.

“Ou talvez não um stalker, mas alguém que está desesperado para ver alguém que vem o evitando por anos?”, ele sugeriu suavemente. “Seis anos em Dezembro.”

Eu pisquei uma, então de novo. “O quê?” Aquele meio sorriso ficou maior enquanto ele me olhava. “Ou alguém que apenas estava jantando com um amigo que também vive na mesma cidade que você?” Minhas bochechas começaram a esquentar.

“Se eu estivesse perseguindo você, estaria fazendo um péssimo trabalho já que esperei você sair do banheiro,” ele continuou, obviamente

4 Perseguidor.

surpreso pela minha observação. “Pelo que conheço sobre stalkers, e acredite em mim, já tive alguns, eles tendem a ser um pouco mais discretos.” Raiva corria por mim. Seria que isso divertiu ele – ou eu o diverti? Claro que sim. Eu sempre divertia Brock. “Tenho certeza que a maioria dos stalkers que você teve no passado teriam entrado direto no banheiro masculino em vez de esperar por você do lado de fora, e você não teria tido nenhum problema com isso.”

“Porra.” Brock inclinou sua cabeça para trás e riu. Fiquei sem ar. Por Deus, eu tinha me esquecido de como era sua risada. Profunda e contagiante, ele ria sem se importar. Ele ria para qualquer um e para todos enquanto eu pensava que eram apenas para mim. Um sorriso surgiu em seus lábios. “Você não é mais a Jillybean5 que eu me lembro.” Ouvir Brock usando meu apelido fazia coisas estranhas comigo. Me fazia voltar no tempo, para anos atrás, quando sentávamos lado a lado naquele velho balanço no quintal dos meus pais. Me lembrava de como Brock iria me ouvir falar e falar sobre os lugares no mundo que eu queria visitar. Me fazia pensar em como as coisas costumavam ser, e nada seria daquele jeito de novo.

“Não,” eu disse a ele, levantando meu queixo. “Eu não sou mais ela.” Ele abaixou sua cabeça, entrando no meu espaço de repente, sua boca quase alinhada com a minha. “Sei disso.” Suspirei.

“Acho que gosto dessa Jillian,” ele disse como se estivesse contando um segredo.

Eu o encarei, sem conseguir processar o que isso queria dizer.

Brock balançou sua cabeça de um lado para o outro. “Quem é o cara que estava na mesa com você?”

5 Mistura de Jillian com Jellybean (jujuba)

Me afastando, eu quase caí para trás. “Eu... eu nem acredito que você está me perguntando isso.” Ele franziu o cenho. “Por que? É uma pergunta válida.” Meus olhos arregalaram. “Ela não é nem um pouco válida.” Se endireitando, ele se apoiou contra a parede como se tivesse todo o tempo do mundo, como se não estivéssemos do lado de fora do banheiro. “Ele é seu namorado?”

De novo sem palavras, tudo que eu conseguia fazer era encara-lo enquanto parte mim queria apontar que não era da sua conta e a outra parte queria exigir saber o porquê de ele estar me perguntando isso.

Eu não fiz nenhuma dessas coisas.

“Com licença,” eu disse, dando a volta. “Eu tenho que voltar para minha mesa.”

“Sério?” Ele desapoiou da parede, colocando sua grande mão em volta do meu braço, me parando. “Nós não nos vemos há anos e você vai simplesmente ir embora? Sem um abraço? Sem perguntar como estive? Nada?” “Acho que é isso aí.” Puxei meu braço e, depois de alguns segundos, ele me soltou.

Ele me estudou por um momento e seu sorriso provocante se transformou em uma linha. “Acho que não posso te culpar.” Cada musculo em meu corpo ficou tenso. Isso estava errado. Eu não conseguia evitar pensar nisso, porque Brock e eu... costumávamos ser inseparáveis apesar da diferença de idade. Sempre foi nós – eu perseguindo ele, indo junto e chamando sua atenção, e sempre foi ele me deixando perseguir ele, incluindo eu em tudo que ele fazia e focando em mim como se eu fosse a última pessoa no mundo.

Até aquela noite.

Até que percebi que sempre foi eu querendo ele e ele querendo qualquer um além de mim.

“Não.” Sussurrei, me odiando um pouco pelo que eu estava dizendo. “Você não pode pôr a culpa em mim.” Um músculo flexionou em seu maxilar e ele concordou. Com o coração palpitando, eu me virei e voltei correndo para a mesa sem olhar para trás. Eu não fazia ideia de quanto tempo tinha ficado longe, mas acho que, pelo modo que todos estavam me encarando quando me sentei, tinha sido tempo demais.

Avery tentou sorrir para mim.

“Está tudo bem?” Grady perguntou, tocando meu braço.

Eu comecei a responder, mas antes que conseguisse, eu apenas ouvi uma parte do que Cam disse. “Puta merda.” Uma sombra pairou sobre a mesa, uma sombra que se originou de trás de mim. Os olhos de Avery se arregalaram e sua boca formou um ‘O’ perfeito. Os pequenos cabelos na parte de trás do meu pescoço arrepiaram.

Não, ele não fez isso.

Ele não me seguiu de volta a minha mesa.

Cam estava se levantando da cadeira, um olhar de perfeita admiração em seu lindo rosto. “Puta merda, cara. Faz muito tempo que não te vejo.” Yep.

Ele tinha me seguido de volta à minha mesa.

Olhando para minha direita, eu assisti Brock apertar a mão de Cam e depois eles trocaram um desses abraços masculinos. Tudo que conseguia fazer era ficar sentada aqui enquanto Brock e Cam conversavam. Eu não fazia ideia do que estavam dizendo, e isso provavelmente não tinha nada a ver com minha

audição. Eu estava me concentrando em não me levantar, em não pegar a minha cadeira e jogar no Brock.

Então ele estava direto a minha direita, olhando para Grady. Ele segurou o olhar do cara como ele costumava olhar para seus oponentes durante as pesagens e antes das lutas, sorrindo levemente.

Limpando sua garganta, Grady tirou sua mão do meu braço.

Minha mão caiu da mesa diretamente em meu colo.

Os olhos de Brock estavam gélidos e sem emoção enquanto esticava seu braço sobre meu prato. Ele falou, mas soou abafado já que ele estava falando direto em meu ouvido surdo.

“Grady Thornton,” eu ouvi da minha esquerda, e percebi que Brock havia se apresentado. A mão de Grady foi engolida pela muito maior de Brock. “Você conhece Cam?”

“Nos encontramos algumas vezes.” Brock colocou sua mão nas costas da minha cadeira, um gesto estranhamente íntimo e possessivo. “Eu conheci ele e sua linda esposa por causa de Jillian.” Eu olhei fixamente para frente, contando baixo.

“Mesmo?” A voz de Grady estava cheia de curiosidade. “Como vocês se conhecem?”

“Ele trabalha– bem, trabalhava, para meu pai,” eu respondi antes de Brock pudesse.

“Ah vamos lá, essa não é toda a história.” Brock riu e eu arregalei meus olhos. “Nós, na verdade, crescemos juntos. Não existe praticamente nada que eu não saiba sobre Jilly.” Mas que porra era isso?

“E como você conhece todos aqui?” Brock perguntou, e como ele havia se movido mais para perto, eu conseguia ouvi-lo mesmo que parecesse que ele estava no fim de um túnel.

O olhar de Grady passou entre Brock e eu. “Eu sou amigo do Cam. Trabalhamos juntos.” “Interessante,” Brock disse, ainda sorrindo. “Você está ensinando futebol agora, certo?” Quando Cam concordou, Brock voltou para Grady. “Você também é técnico?”

“Não.” Grady se sentou um pouco mais ereto. “Eu ensino química em Shepherd.” O sorriso no rosto de Brock ficou um pouco maior, e eu queria me esconder embaixo da mesa. “Um professor? Wow. E como você conhece Jillian?” Ai meu Deus, isso era um interrogatório.

Grady pegou sua garrafa e sorriu para mim. “Acabamos de nos conhecer, mas acredito que vamos ser... vamos ser bons amigos.” “Bons amigos?” Brock riu, e minhas mãos se fecharam em punho. “Parece certo. De qualquer forma,” ele disse, começando a soar negativo. “Eu não quero me intrometer mais no jantar de vocês. Só quis passar e dar um oi. Falo com você depois,” Brock disse para o Cam antes de se focar em mim de um jeito que fazia você sentir como se não existisse mais ninguém no mundo além de você.

Ele tocou a ponta do meu nariz.

Eu pisquei.

Brock sorriu. “Vejo você de novo logo.” Então ele saiu, chamando atenção de quase todas as mesas enquanto ia para a frente do restaurante.

“Isso foi inesperado,” Cam disse rindo. “Você não sabia que Brock estava na cidade?”

Balancei minha cabeça. Meu pai deveria saber que Brock estaria aqui, e ele não tinha me avisado. Mas, novamente, meu pai não sabia realmente o que havia acontecido entre eu e Brock. Tudo que ele sabia, tudo que minha família sabia, era que Brock e eu acabamos nos afastando.

Mas eu nunca poderia contar aos meus pais, e eu esperava que Brock nunca fizesse isso, porque se meu pai soubesse onde eu estava e o como eu... como eu me machuquei, ele assassinaria Brock. Não importava que meu pai tratasse ele como um filho ou que ele tivesse investido centenas de milhares de dólares e tempo em Brock.

Brock seria um cara morto.

“Você não faz ideia de quem era a mão que você cumprimentou, né?” Cam riu de novo enquanto balançava sua cabeça e se sentava de novo na sua cadeira. “Esse era Brock ‘The Beast’ Mitchell. Deus, ele foi o quê, Jillian? Campeão dos pesos pesados duas vezes? Então uma vez dos médios. Merda.” Parecia que Cam estava prestes a desmaiar. “Não acredito que ele não luta mais. Assistir ele no ringue era como ver um Titã dando um soco...” Eu movi minha cadeira, desconfortável por diversos motivos enquanto Cam atualizava Grady em toda a supremacia que Brock era. Alguém deve ter dito algo para mim, mas eu não os ouvi até que olhei para Avery.

De repente, eu não conseguia mais fazer isso.

Eu não queria fazer isso.

Não com Brock sentado no mesmo lugar que eu, não depois de todos esses anos, e tudo que eu conseguia pensar era sobre aquela noite.

“Desculpe-me. Não estou me sentindo bem.” Vendo o olhar assustado de Grady e o de Avery preocupado, eu corri e peguei minha bolsa. “Eu tenho um estomago sensível – um bem chato.”

Ai meu Deus, eu disse isso mesmo em voz alta?

Eu disse.

Não tinha como retirar isso, nunca mais.

Minhas bochechas coraram, eu coloquei um pouco de dinheiro sobre a mesa, mais que o suficiente para cobrir o que eu havia pedido e me levantei, dizendo adeus antes que quase corresse para fora do restaurante. Não foi até estar sentada em meu carro, com o motor ligado e com minhas mãos agarradas ao volante, que eu percebi o que Brock havia dito antes de ir embora.

Ele iria me ver de novo.

Logo.

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