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Capítulo Quatro
Rhage, nomeado em homenagem ao irmão favorito de todos da Irmandade da Adaga Negra, me encarou com um julgamento de constrangimento induzido, que apenas um gato poderia dominar a partir de onde o diabinho listrado de marrom e branco estava empoleirado.
Que era em minhas panturrilhas.
Suspirando, virei a cabeça e olhei para o relógio na minha mesa de cabeceira. Eram quase onze horas de uma manhã de sábado... e eu ainda estava na cama.
Rhage estava, provavelmente, com fome de ração de gato fresca, porque qualquer coisa que estivesse na tigela agora não era, obviamente, boa o suficiente para ele.
Eu tinha encontrado o cara quando ele era apenas um gatinho, escondido sob o meu carro no trabalho uma noite durante o inverno. Neve tinha começado a cair, e o coitado estava tremendo e com fome. Eu o trouxe e me arrependi praticamente de imediato.
O gato, até mesmo quando um gatinho, não gostava de seres humanos oitenta por cento do tempo, inclusive eu. Ele parecia apenas me tolerar porque eu dei-lhe comida. Ele passava a maior parte do tempo escondido em algum lugar, me esperando pacientemente andar e ser pega de surpresa por seu ataque repentino de Godzilla.
O gato era o diabo.
Mas eu meio que o amava de qualquer maneira, porque quando ele estava sendo gentil, que eram raros vinte por cento do tempo, ele me deixava abraça-lo, e não havia nada melhor do que chamego de gatinho.
"Pare de olhar para mim desse jeito", eu murmurei, estreitando meus próprios olhos para, possivelmente, o gato mais malvado de todo o mundo. "Eu vou levantar em poucos minutos."
As orelhas do gato baixaram.
Eu inclinei minha cabeça para trás e suspirei novamente. O sono não veio facilmente na noite passada. A aparição inesperada de Brock me jogou de cabeça através de um loop6. Não ajudou que Avery tinha ligado três vezes para se certificar de que eu estava bem, não desistindo até eu atender o telefone. Claro, eu menti novamente, alegando que era apenas uma dor de estômago. Eu duvidei que ela acreditasse em mim, mas Avery não sabia muito sobre Brock, tanto quanto eu sabia. Ela não tinha vivido onde crescemos. Então, a menos que ela tivesse ouvido algo de uma das outras meninas, então ela não sabia os detalhes.
Gemendo, eu coloquei minhas mãos sobre meus olhos. Eu ainda não podia acreditar que parei em frente a ela, em frente a Cam e Grady, e basicamente disse que eu estava com problemas intestinais.
Deus, eu não deveria ter permissão para sair em público.
Até pensar nisso agora fazia as pontas das minhas orelhas arderem. Tão embaraçoso.
Com base na maneira que eu tinha deixado o jantar na noite passada e como eu agi, eu duvidava que eu fosse ouvir sobre Grady novamente. Para ser honesta, eu não tinha certeza de como eu me sentia sobre isso. Se eu realmente me importava ou não. Nós nos demos bem, eu presumo, e ele também não parecia incomodado por... bem, qualquer coisa sobre mim. Ele era bonito e inteligente, mas eu não senti nada.
Nenhuma faísca. Nenhuma respiração cortada. Nenhuma expectativa ou desejo. Nada.
6 Aqui, ela fala de uma sensação, como ficar relembrando uma situação várias e várias vezes seguidas.
Olhando para trás, tinha sido o mesmo com Ben. Ele foi o primeiro cara a estar interessado em mim e realmente querer fazer sexo comigo, e eu apenas estava... tão malditamente solitária. Eu só queria ser desejada, e eu fiquei com ele satisfatoriamente após a data de validade daquele romance apenas porque eu tão desesperadamente queria sentir novamente.
Essa era a consequência em ler romances demais, porque eu queria ter o que os personagens que eu li a respeito tinham. A atração alucinante, que consome completamente como a que eu tive por- eu cortei esses pensamentos, abrindo meus olhos. Eu não iria por esse caminho. De jeito nenhum. Sem chance. Eu estive fazendo tão bem para... na maior parte.
Certo. Eu estava meio que mentindo para mim mesma.
A verdade era que não havia passado uma semana onde eu não pensasse em Brock. Costumava não passar um dia. Às vezes nem mesmo uma hora. Fazer disso uma semana sem saber se ele estava feliz, era uma grande melhoria de vida, então eu não voltaria atrás só porque ele tinha aparecido aleatoriamente no restaurante na noite passada.
Eu vou vê-la novamente em breve.
Um calafrio girou sobre a minha pele. O que diabos ele queria dizer com isso? A menos que ele estivesse planejando ficar pela cidade e fazer uso do centro de treinamento daqui, não havia nenhuma razão para os nossos caminhos cruzarem. Mesmo que ele não tenha mencionado o fato de que eu trabalharia na empresa da família, eu não estaria nem um pouco chocada se o meu pai houvesse falado para ele.
Tirando uma mecha de cabelo do meu rosto, pensei sobre a primeira vez que eu tinha visto Brock. Foi no meio da noite e eu tinha acordado de um pesadelo. Eu não conseguia me lembrar de qualquer que fosse meu sonho, mas eu tive sede, então eu deixei o meu quarto.
Um suor frio pontilhava minha testa enquanto eu segurava no corrimão, calmamente arrastando para baixo da escada. Ouvindo a voz do meu pai, eu parei a poucos degraus do piso inferior. Papai soava estranho para mim, seu tom de voz tenso, como eu às vezes o ouvia falar com meus tios.
"Quando foi a última vez que você comeu, menino?"
"Eu... Eu não sei ", uma voz desconhecida, cheia de hesitação, respondeu. "Anteontem à noite, eu acho."
Curiosa, desci na ponta dos pés até o último degrau e olhei além da parede. Eu vi meu pai de pé no centro da sala, com os braços cruzados sobre o peito. Então eu vi um menino vários anos mais velho que eu, sentado na beira do sofá.
Eu coloquei a mão sobre a minha boca quando vi seu rosto. Havia um corte na testa e um corte horrível sob o lábio, um que parecia inflamado e em carne viva. Um olho estava inchado e preto.
Parecia um dos homens que papai às vezes lutava no trabalho, exceto que papai nunca iria lutar contra uma criança. Nunca.
"Por isso que você tentou me roubar?" Papai perguntou, e meus olhos se arregalaram.
O menino deu de ombros.
"Eu sou um homem paciente. Eu posso ficar aqui a noite toda. Eu também posso chamar a polícia e jogá-lo na prisão. Você gostaria disso? Ou, você pode começar a falar e eu posso começar a alimentá-lo. A escolha é sua”. Pressionando contra a parede, vi o menino encarar o meu pai com rebeldia. Ele era louco! Eu nunca olharia para o meu pai assim. Alguns momentos passaram e ele perguntou, "Por que você não chama a polícia?"
"Eu vi você por aí, vagando do lado de fora da Academia por um tempo. Você não se parecia com esta última vez. Você também nunca tentou me roubar
antes, então eu estou imaginando que algo sobre a sua situação mudou. Que você não é um mau garoto prestes a embarcar em uma vida de crime.
O menino estava em silêncio de novo. "Eu estive em sua posição uma vez", meu pai disse depois de um momento. "Ter que lutar e roubar comida para sobreviver. Eu sei como é tentar sobreviver nas ruas”. Os olhos desconfiados do menino fecharam e ele pareceu estremecer. "Fui embora de casa algumas noites atrás. Não seria possível lidar com ele por mais tempo. Meu pai... "
"Ele fez isso com seu rosto?"
Ele não respondeu, mas meu pai parecia saber o que aquilo significava, porque ele gritou um palavrão que eu nunca pretendia usar. Então ele se ajoelhou na frente do menino, falando muito baixo para eu ouvir. Eu não tinha ideia do que ele estava dizendo, mas, em seguida, meu pai falou mais alto: "Vamos lá. Vamos ver o que temos na cozinha”. Quando meu pai virou, o rapaz com o rosto machucado olhou para cima, olhou diretamente para a escada, e me viu. Eu não entendi como, porque em uma casa muitas vezes cheia de vozes e pessoas e mesmo quando estava silenciosa e quase vazia, ninguém me via.
Mas este rapaz viu.
Eu me arrastei para fora da memória, sacudindo a imagem do menino assustado e perdido que ele tinha sido, porque ele não era mais aquele menino, assim como eu não era aquela menina.
Tanto quanto eu tentava não saber nada a respeito de Brock, era difícil não saber o que estava acontecendo com ele. Eu poderia resistir ao impulso de persegui-lo na internet tanto quanto eu queria, mas sempre que eu visitava minha família, em algum momento, alguém inevitavelmente o trazia para o assunto.
Eu sabia que Brock era dono de uma casa nos arredores da Filadélfia, não muito longe de Plymouth Meeting. De acordo com o meu tio Julio, ele tinha construído para suas especificações, e incluído um ginásio em casa. Eu presumi que sua noiva vivia com ele lá, e tentei não pensar em sua noiva.
Principalmente porque eu meio que a conhecia.
Kristen Morgan.
E ela estava lá na noite em que ele partiu meu coração e tudo mudou.
Puxando uma respiração afiada que não fazia nada para aliviar a queimadura que agora passava pela minha garganta, eu apertei meus lábios enquanto eu olhava o ventilador de teto girar lentamente.
"Eu não vou fazer isso", falei em voz alta, fazendo com que Rhage contorcesse nas minhas pernas. "Eu não me importo que ele esteve aqui ontem à noite. Isso não me afeta mais. Ele não me afeta mais."
Soou como um plano.
Decidindo que já tinha passado da hora de levantar minha bunda da cama, sentei e peguei Rhage. Pouco antes das pontas dos meus dedos tocarem sua pele macia, ele voou das minhas pernas e atravessou meu quarto, correndo como se uma matilha de cães selvagens o estivesse perseguindo.
Eu balancei minha cabeça. "Imbecil."
Me questionando por que o gato se preocupava em dormir ao meu lado, peguei meu celular. Cliquei na tela, e vi que eu tinha uma chamada não atendida da minha amiga Abby. "Meeerda", murmurei, lembrando que eu coloquei o telefone no silencioso depois de terminar de falar com Avery na noite passada.
Passaram semanas desde que eu tinha falado com Abby, e havia quase um ano que eu a tinha visto. Quando eu voltasse para casa para o dia de Ação de Graças, nós teríamos que tomar um café e conversar. Desde que ela e Colton
casaram há alguns anos, eles estiveram no processo de reforma de uma antiga casa de dezenove anos que tinham comprado.
Havia também uma chamada não atendida e uma mensagem de um número local que eu não reconheci. Curiosa, eu apertei o botão da mensagem e esperei.
“Ei, Jillian, é – hum - é Grady. Nós nos conhecemos na noite passada?" Houve um riso estranho. "Bem, é claro que você provavelmente se lembra disso. De qualquer forma, espero que você não fique brava, mas eu consegui o seu número de telefone através de Avery, porque eu queria saber se você gostaria de conferir a exposição de arte que eu te falei. Eu estarei fora da cidade neste fim de semana, mas eu gostaria de mostrá-la quando eu voltar."
Com os olhos arregalados, eu olhei para o meu telefone com descrença enquanto Grady recitou seu número de telefone e, em seguida, voltou a rir quando ele percebeu que eu tinha o número dele devido ao identificador de chamadas. Sua constante risada de si mesmo era... era bonitinha.
Grady queria me ver novamente depois de eu ter insinuado que eu tinha um intestino incontrolável ou algo assim? Sério?
Uma risada chocada explodiu de mim. Eu nem sequer sabia o que pensar disso, e eu senti que eu precisava de um galão de café para processar isso verdadeiramente.
Eu tirei as cobertas de cima das minhas pernas e me levantei da cama acolchoada confortável, sobre o tapete de pelúcia, e caminhei abaixo do corredor estreito, para a cozinha iluminada pelo sol e sala de estar. Os pisos de madeira da parte principal do apartamento estavam frios sob meus pés descalços.
Rhage estava sentado no balcão da cozinha, sua cauda peluda balançando para lá e para cá enquanto me observava arrastar até a cafeteira.
"Há comida na tigela," Eu disse ao gato, colocando o meu telefone no balcão. "Você pode comer a ração seca e não vai te machucar."
Quando me virei, Rhage saltou fora da ilha e empoleirou na sala de estar, o rabo peludo alto no ar. Um segundo depois, ouvi uma das velas das colunas grossas bater no chão e rolar através dela.
"Imbecil", eu murmurei e depois disse mais alto, "Você vai comer a comida da tigela." Outra vela bateu no chão.
Dobrei os braços sobre o peito. "Descarregar um acesso de raiva não vai te levar a lugar nenhum." Houve um momento de silêncio e depois o baque no chão, do castiçal de madeira que unia as velas. Em seguida, o controle remoto caiu no chão, e eu sabia que ele ia passar para as coisas maiores e mais frágeis, como as garrafas azuis de vidro soprado situadas no centro da mesa de café.
"Que diva."
Suspirando, girei e fui para a despensa estreita. Abri a porta e peguei uma pequena lata de comida de gato úmida. O som metálico de remoção da tampa era como tocar um maldito sino de jantar. Patas minúsculas de gato correram para fora dos pisos e Rhage veio escorregando e deslizando pela pequena cozinha. Eu levantei uma sobrancelha quando ele colidiu com a sua tigela de água. Água espirrou para o lado, espalhando por todo o tapete onde as tigelas estavam.
Rhage olhou para mim com olhos amarelos, orelhas arrebitadas, e eu juro, se eu não o conhecesse melhor, o maldito gato estava sorrindo.
Eu era uma tarefa simples.
Sério.
Meu olhar desviou para onde o meu telefone estava. A risada de Grady era... ela era bonitinha. Talvez eu fosse ligar de volta pra ele e aceitar a sua oferta.
Talvez.
Mais tarde naquele dia, depois de ler o que deveria ser cada artigo do Buzzfeed7, eu peguei meu telefone e liguei para Grady.
E eu fiz planos para vê-lo no próximo fim de semana, quando ele estaria de volta à cidade.
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