B O L E T I M M E N S A L DA A U TO R I DA D E N AC I O N A L D E P ROT E C Ç ÃO C I V I L / N .º 7 0 / J A N E I RO 2 014 / I S S N 16 4 6 – 9 5 4 2
A Importância da Àgua nas Crises Humanitárias e Catástrofes
70 Janeiro de 2014
©Tiago Petinga
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EDITORIAL
Necessidade de políticas públicas articuladas que atuem nas causas Nas várias reportagens jornalísticas que retrospetivamente assinalaram o que de mais importante marcou o ano de 2013, ocupam lugar de destaque os fenómenos naturais extremos que se fizeram sentir um pouco por todo o planeta, com evidência para o tufão Hayan, cuja violência surpreendeu a própria comunidade científica perante ventos a ultrapassarem os 300 km/h. A Organização Meteorológica Mundial afirma que o ano de 2013 fica marcado para além deste tipo de fenómenos, por um aumento recorde do nível do mar, sendo um dos mais quentes da história desde que há registo sistemático deste tipo de informação. No plano internacional, às situações de catástrofe causadoras de impactos profundos no tecido social e económico dos países afetados, soma-se a preocupação com as crises humanitárias associadas a conflitos armados que insistem em permanecer e para os quais não se adivinha solução fácil, com o conflito sírio a suscitar a maior das atenções dos governos e instituições comunitárias, também pela proximidade com a Europa e a deslocação em massa de populações à procura de abrigo. As preocupações com a segurança e a dificuldade de entendimento político, não facilitam a entrada naquele território das equipas médicas e de socorro, cuja missão se prende essencialmente com o aliviar do sofrimento de vítimas civis. Atentos ao mundo, não podemos deixar de dedicar um olhar especial ao nosso país. Este foi um ano particularmente intenso e trabalhoso, com os incêndios florestais a ocuparem muita da nossa atenção e exigindo um esforço particular em termos de recursos empenhados. É com enorme inquietação que olhamos para este fenómeno, para o número de ignições absolutamente tremendo, face nomeadamente a outros países com níveis de risco de incêndio semelhantes. Sem prejuízo da melhoria sempre possível da capacidade de resposta de todo o sistema, a necessidade de políticas públicas articuladas que atuem nas causas é fundamental. Fechámos o ano, com o mau tempo a marcar a quadra natalícia, tendo o nosso Comando Nacional registado cerca de 5000 ocorrências, entre os dias 24 e 25 de dezembro. Mais uma vez, bombeiros e serviços de proteção civil deram resposta aos muitos pedidos de ajuda, devido sobretudo a inundações e quedas de árvore, com mais de 7500 operacionais mobilizados e em prontidão ao longo de todo o território.
Manuel Mateus Couto Presidente da ANPC
Nesta edição, damos destaque a um tema fundamental para quem lida com a problemática das catástrofes. A importância da água, quer para as populações afetadas, quer para as equipas que prestam socorro nos teatros de operações. Um tema demasiado complexo, que certamente será objeto de outras reflexões e contributos em edições futuras, chamando a essa reflexão, autoridades diversas que a nível nacional se ocupam com o abastecimento e manutenção das redes de água, recurso absolutamente vital ao normal funcionamento das sociedades.
Manuel Mateus Couto
Projecto co-financiado por:
P U B LI C AÇ ÃO M E N S A L Edição e propriedade – Autoridade Nacional de Protecção Civil Diretor – Manuel Mateus Couto Redação e paginação – Núcleo de Sensibilização, Comunicação e Protocolo Fotos: Arquivo da Autoridade Nacional de Protecção Civil, exceto quando assinalado. Impressão – SIG – Sociedade Industrial Gráfica Tiragem – 2000 exemplares ISSN – 1646–9542 Os artigos assinados traduzem a opinião dos seus autores. Os artigos publicados poderão ser transcritos com identificação da fonte. Autoridade Nacional de Protecção Civil Pessoa Coletiva n.º 600 082 490 Av. do Forte em Carnaxide / 2794–112 Carnaxide Telefone: 214 247 100 Fax: 214 247 180 nscp@prociv.pt www.prociv.pt
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PROCIV
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BREVES
Parlamento Europeu aprova Mecanismo de Proteção Civil da UE
O Parlamento Europeu aprovou no dia 20 de dezembro o Mecanismo de Proteção Civil da União para 2014-2020, que visa reforçar a cooperação entre os Estados-Membros no domínio da prevenção, preparação e resposta a catástrofes naturais, como os incêndios florestais, terramotos ou tufões, ou de origem humana, como os derrames de petróleo. O mecanismo facilita também a resposta a catástrofes fora da União Europeia. O montante financeiro é de 368,428 milhões de euros para os próximos sete anos. O Mecanismo de Proteção Civil da UE prevê a criação de uma reserva de equipas e de equipamento especializados dos Estados-Membros que estarão disponíveis para uma ação imediata. A criação da Capacidade Europeia de Resposta de Emergência, sob a forma de uma reserva comum voluntária, deverá contribuir para uma resposta mais fiável. A revisão transforma o atual sistema, caracterizado por intervenções ad-hoc, num sistema de gestão de catástrofes previamente planeado. Coloca também mais ênfase na prevenção das catástrofes e na gestão dos riscos. Desde a sua criação em 2001, o Mecanismo foi ativado no âmbito de catástrofes ocorridas em vários países, como os incêndios florestais em Portugal e o tufão Haiyan nas Filipinas.
XI reunião da Comissão Mista Luso-Espanhola Decorreu de 17 a 18 de dezembro, na sede da Autoridade Nacional de Proteção Civil, em Carnaxide, a XI reunião da Comissão Mista Luso-Espanhola. O encontro realizou-se no âmbito do protocolo bilateral entre Portugal e Espanha em matéria de proteção civil e contou com a presença de uma delegação composta por cinco elementos, incluindo o Diretor Geral de Proteção Civil e Emergências, D. Juan Cruz. Entre os temas da agenda salienta-se a análise das intervenções de assistência mútua de incêndios florestais em 2013, para além do debriefing sobre o exercício CURIEX, bem como a análise da Declaração do Porto e que resultada da anterior Cimeira Luso-Espanhola e consolidando compromissos assumidos na área da proteção civil, nomeadamente revisão do Protocolo Adicional sobre Ajuda Mútua em caso de incêndios florestais nas zonas fronteiriças, implementação do Sistema de Informação para a Colaboração Luso-Espanhola (SICLE), formação técnica dos elementos dos serviços de proteção civil de ambos os países e a cooperação entre países no âmbito de um exercício internacional para 2015, a realizar no nosso país. Portugal e Espanha mantêm um protocolo sobre cooperação técnica e assistência mútua em matéria de proteção civil desde 1992, na sequência do qual têm sido realizadas, com sucesso, muitas missões articuladas entre ambos os países. Novo Secretário de Estado da Administração Interna toma posse
Reunião Plenária do Conselho Nacional de Bombeiros A Autoridade Nacional de Proteção Civil acolheu dia 13 de dezembro a reunião Plenária do Conselho Nacional de Bombeiros, órgão consultivo em matéria de bombeiros, criado pela Lei Orgânica da ANPC. Foram analisados os projetos de alteração de diversos diplomas: O “Regulamento da formação para os trabalhadores dos Serviços Municipais”, o “Regulamento dos cursos de formação, de ingresso e de acesso do bombeiro” e o “Regulamento das carreiras de oficial bombeiro e de bombeiro voluntário”.
João Almeida é o novo Secretário de Estado da Administração Interna. A tomada de posse decorreu dia 30 de dezembro, no Palácio de Belém. Jurista, 37 anos, João Almeida, indigitado como novo Secretário de Estado da Administração Interna, vinha desenpenhando funções como deputado eleito pelo CDS-PP desde 2002, sendo atualmente vice-presidente do grupo parlamentar do CDS-PP e porta-voz do partido.
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Apelo ao voluntariado Óbidos lança campanha
- Corpo de Bombeiros de
O Corpo de Bombeiros de Óbidos lançou, no passado dia 7 de dezembro, uma Campanha de apelo ao Voluntariado. A campanha que tem como slogan “Vem fazer parte da nossa equipa” teve como principais desafios captar novos voluntários, ir ao encontro de pessoas disponíveis, solidárias, desinteressadas na recompensa e com elevado espírito de missão. Manter a continuidade do trabalho do Corpo de Bombeiros, demonstrar que podem ter um papel ativo na criação de uma dinâmica participativa e responsável na sociedade. Juntar um grupo de jovens capazes de integrar a próxima recruta a ser desenvolvida no nosso Corpo de Bombeiros e mostrar que é possível qualquer um de nós ser Voluntário são os objetivos centrais da ininiciativa. A campanha prende-se com a colocação de diversos cartazes e a entrega de postais em vários locais do concelho. Uma grande dinamização nas redes socias associadas ao Corpo de Bombeiros será também a forma de mobilizar elementos que deverão integrar a próxima recruta, com inicio a 3 janeiro de 2014. Segundo o responsáveis da iniciativa, trata-se um projeto feito com atitude e determinação e contam, desta forma, contagiar e trazer ao Corpo de Bombeiros pessoas muito positivas.
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I Ciclo de Conferências de Segurança e Proteção Civil - Aveiro
O PACOPAR (Painel Consultivo Comunitário do Programa Atuação Responsável) e o ISCIA (Instituto Superior de Ciências da Informação e Administração) realizaram no dia 30 de novembro, no âmbito do I Ciclo de Conferências de Segurança e Proteção Civil, o seminário “Segurança em Estabelecimentos Abrangidos pela Diretiva Seveso”. O evento, que decorreu no auditório do ISCIA, em Aveiro, teve a participação de vários especialistas e contou com comunicações da Agência Portuguesa do Ambiente, APEQ , Petrogal e PACOPAR. A Autoridade Nacional de Proteção Civil esteve representada por um elemento do Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro, com a apresentação do tema “Planeamento de Emergência Externo no âmbito da Diretiva Seveso: prevenção de acidentes industriais graves”. A Diretiva Seveso é uma norma europeia que assume grande importância para os produtores e para a segurança das populações e do meio ambiente. Num distrito como Aveiro, que concentra um número significativo de indústrias abrangidas pela Diretiva, e tendo em consideração que Portugal está em fase de desenvolvimento do diploma legal para fazer a transposição da norma europeia, a discussão do tema reveste-se de importância acrescida. A Diretiva Seveso exige aos Estados Membros que identifiquem as instalações industriais de risco e tomem medidas apropriadas para prevenir acidentes graves que envolvam substâncias perigosas, de modo a limitar os impactos negativos nas pessoas e no ambiente.
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Bombeiros do Sul e Sueste participam no “Trauma Challenge 2013”
O Corpo de Bombeiros Voluntários do Sul Sueste (Barreiro) participou com três equipas constituídas por seis Tripulantes de Ambulância de Socorro (TAS) no Trauma Challenge 2013, organizado pela ANSD – Associação Nacional de Salvamento e Desencarceramento, no dia 7 de dezembro, em Leiria, em parceria com o Corpo de Bombeiros locais. A participação neste evento, que contou no total com a participação de 20 equipas oriundas de vários Corpos de Bombeiros, enquadrou-se na política de formação contínua e diferenciada do Corpo de Bombeiros do Sul e Sueste no domínio da emergência pré-hospitalar. Simulacros nas SEVESO de Setúbal
Proteção Civil testa intervenção na linha ferroviária com simulacro em Tunes - Silves A estação de Tunes, no concelho de Silves, acolheu no passado dia 7 de dezembro o exercício distrital «Tunes 2013», visando testar o Plano Prévio de Intervenção (PPI) para a Linha Ferroviária do Algarve, elaborado pelo Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de Faro da Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC). Este exercício, do tipo «LIVEX» («live exercise»), contou com meios no terreno, sendo promovido pelaComissão Distrital de Proteção Civil (CDPC) de Faro e planeado e conduzido pelo CDOS de Faro, em parceria com a REFER – Rede Ferroviária Nacional, a CP – Comboios de Portugal e a CP CARGA – Logística e Transportes Ferroviários de Mercadorias. A iniciativa pretendeu exercitar os procedimentos de coordenação ao nível estratégico, bem como o conceito de operação, ao nível tático e de manobra, para atingir um elevado nível de eficiência na intervenção e sustentação das operações de proteção e socorro, decorrentes de acidentes que ocorram naquela infraestrutura. O exercício «Tunes 2013» contou com a participação de mais de uma centena de operacionais, oriundos dos diversos agentes de proteção civil e entidades cooperantes da região algarvia, os quais serão acionados como se de uma situação real se tratasse.
No âmbito do disposto no Decreto-Lei 254/2007 de 12 de julho, várias unidades SEVESO do distrito de Setúbal testaram durante os meses de novembro e dezembro os seus procedimentos de emergência internos, envolvendo, em alguns casos, os agentes de proteção civil. Estes exercícios serviram como uma oportunidade de aprendizagem quer para quem participa quer para quem observa. São pois fundamentais para o sucesso das operações em situação real para além de uma obrigatoriedade.
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TT EE MM AA
Em Busca do Tesouro Líquido:
Os Deslocados e o Direito à Água
© R. Santos
A Organização das Nações Unidas declararam que o acesso à água potável e ao saneamento é um direito humano que se aplica em tempos de paz e em caso de emergência. Em situações de catástrofe, as pessoas muitas vezes são obrigadas a deixar as suas casas em busca de locais mais seguros, em que o saneamento e as condições de higiene podem não ser as mais adequadas. Em outros casos, podemos estar perante um cenário de destruição de infraestruturas sociais, incluindo os sistemas de abastecimento público, de saneamento e de saúde. As populações afetadas muitas vezes sofrem de desnutrição, stress, fadiga e outras doenças, incluindo lesões traumáticas, que juntamente com condições de vida insalubres, incrementam a vulnerabilidade a doenças secundárias. Este artigo abre também a discussão sobre importância de em Portugal melhorarmos as valências atuais em matérias de purificação, em particular nas áreas do abastecimento de água potável, saneamento e higiene, especialmente em situações de emergência com alojamento de comunidades de desalojados. Tipicamente são poucas as emergências de grande dimensão que permitem o deslocamento de vítimas somente por um curto espaço de tempo. As decisões tomadas no início da situação de emergência têm por isso implicações a longo prazo, pois resultam muitas vezes em anos de deslocamento de populações.
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Sobrevivência a longo Prazo em acções Humanitárias Nos primeiros dias e semanas de uma emergência, medidas imediatas para proteger a vida humana, e a saúde pública em geral, devem por isso ser contempladas. Tais prioridades são críticas para satisfazer as necessidades de sobrevivência, devendo atender-se em primeiro lugar os grupos vulneráveis, indivíduos com maior risco de doença ou lesão, havendo naturalmente uma correlação entre pobreza e a vulnerabilidade. As doenças relacionadas à água, saneamento e higiene A potenciação das doenças relacionadas com a água e higiene pública é controlável e evitável. A propagação dessas doenças depende das condições ambientais e de hábitos comportamentais no seio das famílias e na comunidade a que pertencem. As doenças diarreicas, infecções respiratórias agudas, sarampo, malária e desnutrição, são as causas mais comuns de morte em situações de emergência. Vale a pena notar que, embora a desnutrição não seja uma doença relacionada com as condições de higiene e saneamento, ela está ligada à diarreia, numa espiral viciosa. Todas estas causas de morte são evitáveis. A maioria das potenciais medidas preventivas estão relacionadas com as condições locais, como a existência de um abrigo apropriado, planeamento local das instalações, presença de água potável, bom saneamento, controle de vetores, proteção individual (mosquiteiros tratados com
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T ET ME AMA
inseticida), higiene pessoal e promoção da saúde pública. É importante ,por exemplo compreender a relação entre a doença e fatores de risco ambientais, pois as intervenções devem visar os fatores de risco corretamente. As diferentes tipologias de doenças relacionadas com água e saneamento básico são: - Doenças transmitidas pela água - ocorrem quando um agente causador da doença entra no corpo através da água; - Doenças à base de água - incluem doenças que se espalham através de um vetor da doença que vive na água; - Doenças transmitidas por alimentos – que resultam quando os agentes causadores de doenças entram no corpo através dos alimentos ; - Doenças Vector- quando se tratam de doenças que progridem por meio de insetos ou roedores vectores. Especial enfase deve ser dado às doenças diarreicas, pois estas são um importante fator de risco em situações de ©José ,Fernandes pós-desastre, incluindo a gastroenterite viral cólera, febre tifóide , poliomielite e algumas formas de hepatite, que podem facilmente espalhar-se em condições insalubres, típicas de situações de pós-emergências. Fatores relacionados à propagação da doença fecal-oral incluem a presença de consumo de água contaminada com material fecal, o que pode ocorrer na fonte, durante o transporte ou na família, devido à falta de água ou de práticas de higiene alimentar, como por exemplo, o manuseio de alimentos por mãos não lavadas . Estima-se que existam 4 bilhões de casos de diarreia a cada ano, causando 1,8 milhão de mortes, principalmente entre crianças e menores de cinco anos de idade, sendo estas são causadas por água contaminada, falta de saneamento e falta de higiene. Um estudo de 2005 realizado em Kakuma, um campo de deslocados no Quênia, constatou que havia 11 casos de cólera entre os domicílios que tinham acesso a 110 litros/dia. Enquanto isso , houve 32 casos de cólera entre os domicílios que tinham acesso a 44 litros/dia . A cólera afetou 163 pessoas , entre famílias com acesso a apenas 37 litros de água por dia, sendo encontradas tendências semelhantes em relação a diarréia. Com base nessas evidências científicas, a Organização Mundial de Saúde (OMS) promoveu uma política em que as unidades locais de potabilização de água (ULPA) são consideradas como um meio prioritário para fornecer água potável para 884 milhões de pessoas que globalmente não têm acesso a mananciais de água microbiologicamente seguros. Volumes e Quantidade de Água Um dos principais objetivos dos programas de abastecimento é fornecer água suficiente para atender às necessidades de beber, cozinhar e higiene pessoal. Neste ponto, as necessidades de higiene pessoal incluem tomar banho e lavar as mãos. Necessidades de higiene doméstica estão
relacionadas com a manutenção e limpeza do meio doméstico, incluindo a limpeza de recipientes de armazenamento de água, panelas e utensílios. Como anteriormente destacou-se, fornecer água suficiente para atender às necessidades de higiene é muito importante porque a doença diarreica é uma das principais causas de morte em caso de situações pós-desastre. Em termos de quantidade de água são estas as premissas a ter em conta, quando estamos perante uma situação pós-resposta com presença de deslocados: - Serem captados pelo menos 15 a 20 litros de água por pessoa por dia; - O caudal em cada ponto de abastecimento de água deverá ser, pelo menos, de 0.125 l/s; - Deverá haver pelo menos um local de abastecimento de água por cada 250 pessoas; - A distância de qualquer abrigo ao local de abastecimento de água mais próximo não exceder os 500 metros. Monitorização da Qualidade Durante uma situação de crise humanitária, deve prestarse atenção não só à quantidade de água disponível, mas também à qualidade da mesma. Até que se alcancem níveis mínimos de qualidade e quantidade, há que concentrar as atenções em facilitar um acesso equitativo a um volume suficiente de água de qualidade mediana, em vez de fornecer uma quantidade insuficiente de água que cumpra todas as normas mínimas de qualidade. Se existirem sérias dúvidas sobre a qualidade microbiológica da água, esta deverá ser tratada com um desinfectante residual, como primeira medida para melhorar a sua qualidade. Na vertente da qualidade, a água a fornecer deverá ter as seguintes características mínimas: A água bruta na captação não possuir mais de 10 coliformes fecais por 100 mililitros de água; - Os controlos sanitários indicarem um baixo risco de contaminação fecal; - Se possível, a água ser tratada com um desinfectante residual em concentrações suficientes (no caso do uso de
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cloro, a concentração do residual deverá ser de 0.2 a 0.3 mg/l). - A turvação não exceder os 5 NTU - A conductividade não ser superior a 2.000 μs/ cm - A água não ter um sabor ou cheiro desagradável.
Abastecimento a Deslocados - principios 1. Adequação e equidade da água distribuída: oferta suficiente para as necessidades básicas de cada um e cada pessoa em todo o campo , inclusive em unidades escolares e de saúde. 2. Aceitabilidade e segurança da água fornecida : potável e palatável em termos de aparência, gosto e odor. A qualidade da água é monitorizada regularmente e existem planos de segurança em vigor 3. Os custos sociais (carga) sobre os utilizadores : Instalações não muito longe da habitações, com desenhos tempo mínimo de espera , seguros e fáceis de usar. 4. Segurança física dos utilizadores: instalações localizadas em um ambiente físico seguro, a água tempo de distribuição e duração prevista de acordo com a conveniência dos utilizadores e hábitos culturais. 5. Confiabilidade da oferta : É preciso que haja a manutenção contínua do sistema de abastecimento de água. 6. Preocupações ambientais: a exploração sustentável de fontes de água, águas residuais, melhoria da drenagem para a água da chuva. 7. Eficiência de alimentação: Evitar o desperdício de água e outras perdas do sistema 8. Participação das partes interessadas: Refugiados e outros setores envolvidos no na gestão da água e operação deverão cultivar um bom relacionamento com a comunidade local de acolhimento. Fontes Disponíveis e Acessibilidade Como mencionado anteriormente, a fase crónica de uma situação pós-desastre pode durar vários anos. Portanto, é importante que as decisões tomadas no início da emergência sobre o abastecimento de água considerem a probabilidade que a população afetada pelo desastre ter um abastecimento de água confiável para vários anos. Existem diferentes tipos de fontes de água que as pessoas usam para o seu abastecimento: água da chuva, geralmente pura, não é uma fonte suficiente para fornecer para uma grande população deslocada, sendo raramente considerada durante ocorrências complexas; água de superfície de lagos, lagoas e rios, acessível, facilmente captada, confiável e abundante, podendo ser microbiologicamente insegura, exigindo tratamento; águas subterrâneas de poços, nascentes ou furos, que tende a ser de qualidade microbiológica superior, contudo difícil de extrair. No essencial uma avaliação imediata no local das fontes
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locais de água em relação às necessidades é fundamental, devendo para isso ser envolvida a administração local da área em causa pois o afluxo de deslocados pode potencialmente gerar tensão a nível dos recursos hídricos ordinariamente utilizados pelas populações locais. Uma vez localizadas, todas as fontes disponíveis devem ser protegidas da contaminação, possuindo esta questão máxima prioridade. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) recomenda, que todas as famílias tenham acesso a um ponto de água que esteja a menos de 200 metros de distância. Muitos campos de deslocados não cumprem esta norma. Os campos no Uganda, por exemplo, têm particularmente pobre acesso a água e apenas 43 % da população servida tem acesso a torneiras de água queestão a menos de 200 metros. Além disso, existem mais de 450 pessoas por ponto de água , muito superior ao padrão estabelecido pelo ACNUR de 200 pessoas.
Unidades Locais de potabilização de água A existência de água potável também é uma prioridade imediata na maioria das ações de Proteção Civil. No passado, quando o abastecimento normal de água era interrompido ou comprometido devido a desastres naturais, ou emergências tecnológicas, a resposta padrão seria sensibilizar as populações afetadas para ferver, ou desinfetar com lixivia a água existente, de modo a garantir sua integridade microbiológica. As unidades locais de potabilização de água são estações de tratamento de água portáteis , móveis e auto-suficientes , destinadas ao tratamento de água potável a partir de água não tratada, com origem em rios , lagos ou águas subterrâneas. O objetivo desses sistemas, com pequenas quantidades de dispositivos, é o abastecimento de água potável livre de componentes tóxicos ou biológicamente activos. Recentemente, o recurso às ULPA tem sido recomendado para o uso em emergências, resultado dos avanços cientificos verificados em contexto de investigação e desenvolvimento (I&D). Assim, o padrão tipo de utilização de ULPA´s em cenários de intervenção de resposta a desastres, segue as seguintes linhas: - Depois de eventos de inundações ou catástrofes naturais que levem ao deslocamento de populações de grande vulto;
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- Em alguns configurações complexas de emergência, quando a resposta não pode progredir para o pós-desastre; - Em resposta a surtos causados por ausência de água tratada. O uso de ULPA´s pode ser especialmente eficaz durante a fase inicial de uma situação de emergência, quando as equipas de socorro não podem servir a população afetada com soluções de longo prazo. No entanto, as diferenças entre o contextos de emergência e de reabilitação, podem afetar a eficácia das ULPA e levantar questões sobre se a generalização das mesmas e qual deverá ser o prazo limite de uso de uma ULPA num cenário de pós-desastre e reabilitação.
Campo de Deslocados Organização e tipologia de linha de produção e distribuição de água em anel (a azul)
©José Fernandes
Em áreas acessíveis e mais densamente povoadas, unidades de potabilização maiores, que utilizam soluções como a osmose inversa complementadas com sistemas de desinfecção por UV podem ser utilizadas, sendo nestas comum a implemantação de unidades sobre chassis móveis. Com uma capacidade de água inferior, áreas remotas ou de baixa densidade populacional, o uso de comprimidos de purificação de água ou SODIS (tratamento de água em garrafas PET por radiação solar) é possível. Os montanhistas , campistas e viajantes usam, em áreas remotas, soluções de tratamento de água micro- portáteis para atender às suas próprias necessidades. A Estação Purificadora de Água da ANPC A ANPC possui uma Estação Purificadora de Água (EPA), de origem alemã, Modelo Karcher - WTC 500 RO capaz de abastecer diariamente uma população de 200 pessoas. O referido equipamento foi adquirido pelo ex-SNPC em 2002, tendo sido usado, em situação real, pela última vez em 2005, na Missão Portuguesa à Indonésia organizada em resposta ao sismo e tsunami de Sumatra de 26 de dezembro de 2004, tendo nessa ocasião abastecido os elementos afetos à missão, bem como servido de apoio ao hospital de
Karcher - WTC 500 RO campanha então montado na região de Banda Aceh, ilha de Sumatra. A EPA desde então permaneceu acondicionada na Unidade de Reserva Logística da ANPC em Sintra, não tendo sido utilizada entretanto em ambiente operacional. A WTC 500-RO é capaz de tratar água salgada ou doce para produzir até 15 mil litros de água potável por dia. O seu elemento central é composto por dois filtros de membrana que atuam no princípio físico da osmose inversa. Os poros das membranas são tão pequenos que apenas as moléculas de água podem passar através delas. Deste modo, as bactérias, os vírus, metais pesados e pesticidas são objeto de retenção em segurança. Do ponto de vista hipotético, a exigência de tratamento que a EPA é capaz de atingir é de tal ordem, que em termos simples podemos afirmar que um afluente doméstico, vulgo esgoto, poderá servir como ponto de partida para se obter água potável. Obviamente que tal capacidade de tratamento acarreta equipamentos e reagentes de manipulação complexos, devendo a sua capacidade operativa ser tecnicamente supervisionada. A ANPC prevê dotar a Força Especial de Bombeiros desta valência, tendo sido para tal dados os primeiros passos nos últimos meses. Com a supervisão técnica do Núcleo de Riscos e Alerta da Direção Nacional de Planeamento de Emergência, foi iniciado um programa de reabilitação do equipamento de purificação, com orientação e formação a duas equipas de operadores da FEB, tendo como principal objetivo a criação de um módulo específico para esta valência de modo a, se necessário, projetá-lo em poucas horas para missões de Proteção Civil. Para esse desidrato, contribuiu o último exercício conduzido em novembro nas margens da albufeira de Rio da Mula, localizada dentro do perímetro do Parque Natural Sintra-Cascais. Um cenário idílico para um futuro promissor! Luis Sá Núcleo de Riscos e Alerta. Direção Nacional de Planeamento de Emergência - ANPC
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Ativado Plano de Operações Nacional da Serra da Estrela
© R. Santos
A Serra da Estrela, pelas suas características próprias, é um dos pontos turísticos de maior relevo de Portugal Continental, atraindo todos os anos, principalmente durante o inverno, milhares de visitantes para a prática do esqui, passeios pedestres, montanhismo, escalada, e outras ligadas ao usufruto da natureza. Este afluxo de turistas origina, com frequência, situações problemáticas no âmbito da proteção e socorro, exigindo dos Agentes de Proteção Civil que intervêm naquela região um intenso empenhamento, com elevado grau de coordenação e cooperação. O risco inerente a esta zona montanhosa, associado a outros fatores (tempestades repentinas de neve, formação de gelo com consequente intransitabilidade das vias de circulação, elevado fluxo de pessoas e viaturas, falta de locais de inversão de marcha, engarrafamentos, e reduzida dimensão das vias de circulação), têm contribuído para um elevado grau de vulnerabilidade daqueles locais. Algumas zonas da Serra, devido às características morfológicas do terreno, tornam a intervenção em caso de emergência, particularmente complexa, são os casos do Cântaro Magro e Covão Cimeiro, Covão do Ferro, Encosta S/SW da Serra e também do Maciço Central da Serra da Estrela. Atendendo a estas características, foi implementado no seio da Força Especial de Bombeiros (FEB) da ANPC, o Grupo de Resgate em Montanha, com o objetivo de contribuir para a minimização de perda de vidas, atenuar os danos e assegurar a criação de condições favoráveis ao empenho rápido, eficiente, coordenado e conjunto de todos meios e recursos disponíveis. Este Grupo organiza-se de forma modular e sazonal, dispondo de uma estrutura própria e específica, competindo-lhe a execução de missões de proteção e socorro no âmbito do salvamento em Montanha com ou sem ambiente de neve.
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Atualmente este grupo é constituído por um Chefe de Grupo, dois Chefes de Brigada, dois Chefes de Equipa e dezasseis Bombeiros, tendo adstrito os seguintes meios: 2 Veículos de Operações Especificas, 2 Veículos de Transporte de Pessoal Tático, 2 quadriciclos (Moto4), 1 Veículo de Comando e ainda um Veículo com Equipamento Técnico de Apoio com equipamento de salvamento e desencarceramento portátil de elevada autonomia, facilmente transportável para os locais de acesso mais difícil. Em qualquer momento e face à complexidade da missão a desenvolver, este Grupo pode ser reforçado com meios
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humanos e materiais provenientes dos Grupos Territoriais da Guarda e de Castelo Branco. O maciço central da Serra da Estrela concede uma paisagem única aos milhares de turistas que, nesta época do ano, são atraídos pelas características próprias deste espaço natural. Este afluxo de visitantes leva a ANPC a planear e operacionalizar, anualmente, um dispositivo conjunto específico para assegurar uma resposta eficaz e eficiente no âmbito da proteção e socorro, que atua sob a orientação de um Plano de Operações Nacional da Serra da Estrela (PONSE). Integram este dispositivo os Corpos de Bombeiros dos distritos de Castelo Branco (Covilhã) e Guarda (Loriga, São Romão, Gouveia, Seia e Manteigas), o Grupo de Resgate em Montanha da Força Especial de Bombeiros da ANPC, e ainda o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da GNR.
©José Fernandes
A ativação do PONSE , dia 19 de dezembro, pressupõe a unidade de comando e controlo de toda a prevenção e resposta, o incremento do nível de preparação das entidades acima referidas para os diferentes cenários de risco previamente considerados, e a sua pronta mobilização em caso de necessidade.
Recorda-se que, em caso de emergência, devem os cidadãos contactar o 112 – Número Nacional de Emergência.
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Número 70, janeiro de 2014
AGENDA
1 de janei ro, Aten as, Grécia PR E SIDÊNCI A GR EGA DO CONSELHO DA U NI ÃO EU ROPEI A - 1 .º SEM E ST R E DE 2 01 4 De janei ro a ju n ho de 2014, a Grécia assu me pela qu i nta vez a presidência do Con sel ho d a Un ião Eu ropeia, sucedendo à I rland a e Lit u ân ia, no prog ram a conju nto do t r io de presidências. No seg u ndo semest re de 2014, caberá à Itá l ia oc upa r o ca rgo. É no âmbito do Con sel ho d a Un ião Europeia que os m i n ist ros de cad a Estado Membro se reú nem pa ra adota rem leg islação e asseg u ra rem a coorden ação d as pol ít icas d a Un ião Eu ropeia.
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21 a 22 de janei ro, Aten as, Grécia SEM INÁR IO “ENH A NCING THE EU ROPEA N DISASTER R E SPONSE CAPACIT Y: JOIN T/MU LTI-NATIONAL MODU LE S” No âmbito d as P residências do Consel ho d a Un ião Eu ropeia, é comu m o país que detém a P residência promover sem i n á r ios que resu ltem em propostas que serão depois debat id as em sede do Gr upo de Traba l ho PROCI V, com v ista à adoção de conclu sões pelo Con sel ho sobre as m atér ias con siderad as pr ior itá r ias pela P residência v igente. É nesse qu ad ro que a f ut u ra presidência g rega i rá organ iza r ent re 21 e 22 de Janei ro, em Aten as, u m sem i n á r io ded icado a u m a d as su as pr ior id ades “En h anci ng t he Eu ropean Disaster Respon se Capacit y: Joi nt/Mu lt i-Nat ion a l Modu les”, estando Por t uga l representado pela A N PC.
27 a 28 janei ro, Br u xelas, Bélg ica R EU NI ÃO COM ITÉ DE PROTEÇÃO CI V IL Os pr i ncipais tem as em destaque nesta reu n ião i ncid i rão no prog ram a de ação de 2014 e nu m a pr i mei ra proposta de reg ras de i mplementação do novo Com ité, que sucederá ao ex istente, a pa r t i r de 1 de janei ro de 2014, aqu ando d a ent rad a em v igor do novo Mecan ismo d a Un ião. Os com ités de com itolog ia apoiam a Com issão no exercício d as su as competências de exec ução, em it i ndo pa receres sobre os projetos de med id as de exec ução antes d a adoção d as mesm as. São compostos por representantes de todos os Estados-Membros e presid idos por u m f u ncion á r io d a Com issão Eu ropeia e con st it uem u m espaço pa ra o debate sobre as med id as de exec ução e f u ncion am como can a l de comu n icação ent re a Com issão e as autor id ades n acion ais. O Com ité de P roteção Civ i l é representado a n ível n acion a l pela A N PC, reu n i ndo em Br u xelas nu m a base qu ad r i mest ra l.