Monotipia20

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Morganna Batista (@morgannab)

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20.

Vem, explico no caminho! Martins de Castro e Monalisa Marques, Editores www.monotipia.com www.facebook.com/monotipia monotipia.tumblr.com @monotipia


A onda do crowdfunding invade o mundo dos quadrinhos Por Isabella Sander (@isasander)



www.quadrinhosrasos.com


O financiamento coletivo, ou crowdfunding, vem ganhando cada vez mais força aqui no Brasil. Como não poderia deixar de ser, os autores de histórias em quadrinhos também aderiram à proposta, em busca de verba para a realização de seus projetos. A ideia é nova: em 2006, o empresário Michael Sullivan, começou a utilizar esse termo nos Estados Unidos. Em suma, um crowdfunding acontece quando várias pessoas contribuem online com pequenas ou grandes quantias, de forma colaborativa, na viabilização de um negócio. O site mais popular de financiamento coletivo no Brasil, hoje, é o Catarse.me, que trabalha principalmente com projetos culturais. Todas as ideias publicadas lá precisam ter uma meta de arrecadação mínima e um prazo para alcançar esse valor, entre um e 60 dias. É o próprio mentor do trabalho que vai atrás de pessoas que queiram contribuir e, normalmente, oferece recompensas dentro da sua área de atuação para quem apoiar a causa com pelo menos R$ 10. Se o valor proposto para o seu projeto for alcançado ou superado até a data prevista, parabéns: você vai ficar com todo o dinheiro. Caso a campanha seja mal-sucedida, as contribuições voltam para os apoiadores e ninguém perde nem ganha nada. O primeiro projeto de quadrinhos a ser financiado através do Catarse foi o Achados e Perdidos, dos desenhistas Eduardo Damasceno e Luís Felipe Garrocho, em outubro de 2011. Eles tinham uma meta de R$ 25 mil e passaram a marca dos R$ 30 mil, com a ajuda de 573 apoiadores. Trata-se de um álbum em quadrinhos, que vem com um CD musical que deve ser escutado como trilha sonora do livro. “Antes de lançar o projeto, fizemos uma extensa pesquisa de quais projetos haviam dado certo, o que eles tinham em comum, o que os projetos que falharam tinham em comum, tudo para tentar aumentar as chances do nosso livro dar certo”, explica a dupla.

Devido ao apoio à ideia, vindo dos leitores do site deles (www.quadrinhosrasos. com), e ao convite para exporem no Festival Internacional de Quadrinhos de Belo Horizonte daquele ano, os autores decidiram tomar coragem e experimentar o crowdfunding, para já ter a publicação em mãos no festival. “O financiamento colaborativo tem a capacidade de se tornar parte integrante do mercado, assim como uma forma extremamente viável de produção de... bem, qualquer coisa!”, afirmam. E completam: “Sites como o Catarse diminuem as barreiras que separam o produtor do público, e dão aos consumidores a possibilidade deles escolherem ativamente aquilo que querem que exista”. Damasceno e Garrocho estavam ajudando até dias atrás outro desenhista, Ricardo Tokumoto, a lançar o livro de tiras dele através do Catarse. No dia 10 de agosto, o projeto Ryotiras Omnibus, que é uma compilação das tiras que ele publica em seu site (www.ryotiras.com), conseguiu ultrapassar a verba necessária, de R$ 15 mil, faltando ainda 48 dias para terminar a campanha. Antes do crowdfunding, o pagamento das ideias de Tokumoto vinha do seu próprio bolso, o que o limitava a lançar fanzines e uma publicação em conjunto com outro autor. “Bancar uma impressão de um livro sozinho, com o próprio dinheiro, é muito difícil”, comenta. A divulgação do projeto foi realizada através das redes sociais e, claro, do seu próprio site. Outra história de sucesso é a da Revista Café Espacial (www.cafeespacial.com). Com histórias em quadrinhos autorais e artigos voltados para a área cultural, a publicação independente já possui dez edições. Para partir para a 11ª, o grupo de cerca de 20 profissionais que trabalha no periódico pediu o apoio dos leitores e simpatizantes para angariar R$ 5 mil, a fim de cobrir custos de impressão e transporte da gráfica. O resultado foi que 104 pessoas ajudaram a financiar a revista.


O retorno à campanha para levantar fundos no Catarse não foi apenas financeiro, segundo o editor da Café Espacial, Sergio Chaves. “O financiamento coletivo expande nossa divulgação, para que muitos outros leitores conheçam a revista e compartilhem nossa paixão pelas histórias em quadrinhos e artes afins”, aponta. O lançamento da nova edição deve ocorrer no último trimestre deste ano, dando início às comemorações de cinco anos da publicação.

Trata-se de uma paródia do anime Cavaleiros do Zodíaco, que surgiu na internet, ganhou uma primeira edição independente e agora pode partir para a sua segunda tiragem. Sobre a segurança de não gastar o próprio dinheiro, Koff diz: “Sites internacionais como o Kickstarter e o próprio Catarse são um bom meio de medir o interesse das pessoas em seus projetos antes de se fazer um investimento pesado sem ter ideia do retorno que ele vai ter”.

O Beijo Adolescente também teve sua meta alcançada, nove dias antes do prazo final. O projeto é para viabilizar uma segunda temporada da série, tanto como web-serie, como de forma impressa. O quadrinista Rafael Coutinho conseguiu captar R$ 33.690, sendo que o valor mínimo era R$ 32 mil.

Já o pessoal do site de webcomics Petisco resolveu fazer um álbum de coletânea das tirinhas lá postadas. As séries que compõem o coletivo são Nova Hélade (Cadu Simões e Angelo Ron), Nanquim Descartável (Daniel Esteves e colaboradores), Demetrius Dante (Will), Terapia (Rob Gordon, Marina Kurcis e Mario Cau), Calundu e Cacoré (Karlisson), Macacada Urbana (Vencys Lao) e Beladona (Ana Recalde e Denis Mello). A ideia é trazer histórias inéditas de cada série, exceto do Calundu e Cacoré.

A primeira temporada foi contratada pelo site IG, que acabou rompendo com a série após ser vendido. Apesar do azar, Coutinho se mostra otimista quanto às formas de financiamento existentes. “Sinceramente, acho que todo dia aparece um jeito novo. O contato é muito próximo entre os interessados, basta continuar cavando, procurando, propondo. E, claro, com o foco sempre na qualidade do livro ou revista”, explica. Para a divulgação do projeto, o mais caro do ramo de quadrinhos, o autor contratou um serviço de assessoria de comunicação. Parece que deu certo. “De certa forma, depois de um mês de divulgação, você passa a representar muita gente que doou e espera que dê certo”, comenta. E completa: “Acho que essa é a parte mais empolgante também, perceber que o projeto ganha uma vida maior do que a minha própria iniciativa”. Com tantas histórias de sucesso, fica até difícil para quem ainda está na luta para conseguir o dinheiro não ter uma expectativa positiva. Pedro Leite e Rafael Koff, por exemplo, ainda têm um mês para passar a verba de R$ 4 mil para os R$ 5 mil necessários no projeto Tirinhas do Zodíaco.

A meta é chegar a R$ 15 mil e o grupo estava, até o fechamento desta edição, com R$ 2.175. Mas calma: ainda falta mais de um mês para encerrar o prazo. A coletânea, segundo Cadu Simões, servirá para sustentar a produção da equipe, já que a publicação na internet é gratuita. “Sabendo exatamente quantos leitores topariam ter uma versão impressa de sua HQ, o autor imprime apenas o necessário para não ter prejuízo, seja usando sistemas de impressão por demanda, ou fazendo um tipo de pré-venda através de sites de crowdfunding”, esclarece. A divulgação do projeto foi realizada pelas redes sociais e também individualmente, por cada autor.


Pedro Leite e Rafael Koff, autores das tirinhasdozodiaco.blogspot.com


Mรกrio Cau (@mariocau)

www.mariocau.com



Ricardo Coimbra (@coimbraricardo)

vidaeobrademimmesmo.blogspot.com



Rafael Dourado (@sapobrothers)

www.sapobrothers.net


Juliano Rocha (@juliano_tiras)

www.capitaobrasil.com.br

capitaobrasil.com.br por juliano rocha

a presidente em apuros.

uma mensagem secreta da presidente dilma!

B

ela solicita minha ajuda urgente!

chegarei lĂĄ em segundos!

pronto senhora presidente! em que posso lhe ser Ăştil?

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estou em dĂşvida!

qual tom de vermelho vocĂŞ prefere?



Artur Rocha http://katarze.carbonmade.com/


Roger Cruz


Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto ilustrador e quadrinhista. Roger Cruz: Sou auto-didata. Tudo o que aprendi sobre desenho e hqs foi pelo caminho da observação e treino. Tentava reproduzir os desenhos dos gibis que lia, dos artistas que mais gostava. Quando pensei em fazer um curso de desenho, meus pais não puderam pagar e continuei os estudos sozinho. Mais tarde, quando tive condições financeiras para um curso de desenho, percebi que estava aprendendo bastante por conta própria e resolvi continuar o aprendizado dessa maneira. Ainda hoje, quando resolvo experimentar novas técnicas, prefiro descobrir até onde consigo ir com observação e treino antes de buscar um professor. MT: Quais são as suas principais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas? RC: Minhas principais influências são desenhistas de histórias em quadrinhos. Já tive muitas em diferentes períodos. Uma das primeiras foi John Buscema, desenhista do Conan. Depois tive muitas outras. John Byrne, Frank Miller, Moebius, Manara, Enki Bilal, Serpieri, Laerte, José Muñoz, Katsuhiro Otomo, Masamune Shirow, Jaime Hernandez, Bill Watterson, Jim Lee, Simon Bisley e muitos outros. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? RC: Gosto de experimentar materiais diferentes e alguns deles apresentam resultados que sugerem idéias específicas para determinados projetos. Às vezes, um traço com pincel e nanquim é mais interessante para um certo projeto enquanto o traço à lápis é melhor para outro. Faço esboço e traço geralmente com lapiseiras que vão da espessura 0.3 até 2.0. Para arte-finalizar, canetas nanquim descartáveis, pincel, bico de pena, canetas ponta porosa, canetas com ponta de pincel. Faço também pinturas com aquarela e guache. Para alguns trabalhos, uso o PhotoShop tanto para o desenho como para a finalização.



MT: Como é a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs? RC: Atualmente, trabalho apenas com projetos autorais e ilustrações para editoras no Brasil. O processo é o mais simples possível. Como quase todo artista freelancer, trabalho em casa. Não tenho um horário certo para desenhar e não estipulo um prazo para terminar. Só tenho em mente uma meta a ser alçançada diariamente. Por exemplo, uma página finalizada de hq por dia. MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? RC: É justamente nessa etapa onde gasto mais tempo. No trabalho com super-heróis, onde o roteiro não é meu, leio cuidadosamente para não esquecer nenhum detalhe pedido pelo roteirista. Aí esboço rapidamente enquanto penso em quantos quadros o conteúdo será contado. Defino os formatos dos quadros, calculo a quantidade de texto e posição dos balões. Depois é pensar em iluminação, ângulos, postura dos personagens, cenários, etc. Enfim, todos esse processo é parte dessa preocupação com a narrativa e mais importante é que ela seja fluida e de fácil compreensão.

MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? RC: Faço aquarelas e escrevo roteiros para projetos pessoais ou em parceria com amigos. Estou investindo atualmente na auto-publicação e já lancei dois artbooks. Nudes In Fury e Roger Cruz Artbook Volume 1. No próximo ano, lanço GutiGutz, uma hq de ação e humor, o meu primeiro projeto independente de quadrinhos. MT: Por que quadrinhos? RC: Porque foi com quadrinhos que tive meu primeiro contato com desenhistas profissionais que se tornaram referências para mim. As hqs fizeram parte da minha infância. Aprendi a desenhar e a contar histórias com as hqs. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? RC: Não tenho lido quase nada. Apenas trabalhos muito recomendados por amigos. Principalmente hqs alternativas e hqs de humor.

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Jimmy Corrigan somos nós Aline Zouvi (@alineaz) “Emma Bovary, c’est moi” - É a singular frase de Gustave Flaubert, declarando seu amor e sua quase-total identidade com a personagem mais famosa de sua criação. Esta associação, que se faz clara apenas por uma declaração do próprio autor (enquanto sua ficção, antes desta certeza dada por seu criador, parecia pairar livremente), é feita, também, quando lemos a penúltima página de Jimmy Corrigan, em que Chris Ware ressalta algumas semelhanças entre a história do “garoto mais esperto do mundo” e sua própria história, com foco na relação com o pai. Tudo que consigo pensar, apesar de não ser Chris Ware é: Jimmy Corrigan, c’est moi. Se você espera por uma análise formal/ estrutural/ teórica do quadrinho (como muitos acadêmicos já fizeram), sinto em desapontá-lo, mas não consigo escrever racionalmente sobre algo que me afetou tanto, e de modo tão inesperado. As letrinhas miúdas e os vários quadradinhos assustam a princípio, mas antes que perceba o leitor mergulha em sua própria incompreensão e se deixa levar – por um livro cujo personagem principal é a materialização de tudo que não é sedutor. Aquelas cores cruas, personagens sim-

plesmente desenhados em contraste com belos cenários, de uma desenvoltura que prende o leitor por mais de alguns míseros segundos nas páginas com magníficas construções, edifícios, esqueletos urbanos sabiamente entrelaçados... Aquele livro horizontal, que à primeira vista causa estranhamento, descansa confortavelmente no colo enquanto demoramos para virar suas páginas. O mar de palavras, por todos os lados, dentro e fora dos balões, dentro e fora dos requadros, numa ânsia terrível de contribuir para alguma inteligibilidade quando, na verdade, o que há é angústia, frustração e inconsciente (não precisamos de palavras, mas precisamos também, sem dúvida, do excesso delas). A terrível necessidade de preencher cada canto, alcançar o ponto antes do irredutível (os quadros minúsculos, resultados de múltiplas divisões, quase indecifráveis), a ilusão de não haver vazio. O incorporar a criança, enquanto a personagem que de fato é criança aprende, desde cedo, a ser adulta através do sofrimento. O ato, quase sem volta, de perder-se nos próprios pensamentos - ou melhor, perder-se no limite entre o que vivemos e o que pensamos. O barulho mental e a calmaria do lado de fora. Jimmy Corrigan sou eu, Jimmy Corrigan somos nós.

JIMMY CORRIGAN - Quadrinhos na Cia (dezembro de 2009).



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