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O (quase) Envolvimento Militar do Brasil na Guerra do Vietnã
Um dos acontecimentos mais expressivos das décadas de 60 e 70 do século XX foi a Guerra do Vietnã na sua chamada “fase americana” (1964-1973). Os Estados Unidos enviaram tropas para a região na sua luta contra o comunismo, porém sua máquina de guerra “atolou” contra o grupo de guerrilheiros comunistas locais denominado “Vietcong”. A repercussão da guerra foi mundial – tanto que quase envolveu o Brasil, um país muito longe do Sudeste Asiático. O Brasil e o Começo da Guerra do Vietnã Entre 2 e 4 de agosto de 1964, foram registrados ataques a destróieres norteamericanos em “águas internacionais” por barcos-patrulha vietnamitas no golfo de Tonquin, litoral do Vietnã do Norte. Apesar das dúvidas e da falta de informações, esses “ataques” eram tudo o que o presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johnson, mais desejava: no dia 5 de agosto, ele conseguiu poderes para conduzir a intervenção no Vietnã, dentro da premissa de que os Estados Unidos estariam ajudando um país ameaçado pelo comunismo. Começavam os bombardeios ao Vietnã do Norte – a “fase americana” da Guerra do Vietnã. As reações ao incidente de Tonquin no Brasil foram totalmente favoráveis às ações dos Estados Unidos, em particular, na imprensa. A Folha de São Paulo começou com um destaque cauteloso, no dia 4 de agosto de 1964, uma vez que as notícias ainda não eram conclusivas. No dia 5, não restavam mais dúvidas: barcos norte-americanos foram atacados por lanchas de guerra norte-vietnamitas, o que fizera com que os norteamericanos bombardeassem o Vietnã do Norte e anunciassem que medidas de contenção ao comunismo seriam tomadas no Vietnã do Sul, conforme afirmara o jornal. A China era a “grande culpada de tudo”, pois havia levado os norte-vietnamitas a lutarem por uma expansão em que eles não teriam vez, versava o editorial da Folha de São Paulo do dia 7 de agosto de 1964, junto com manchetes que informavam que tropas chinesas estavam de prontidão, caso os norte-americanos invadissem o Vietnã do Norte – fato este que, efetivamente, não ocorreu. Destacando que a reação norte-americana foi inevitável, o editorial considerava duas alternativas: 1º – a “neutralização” da região, deixando abandonada para a “dominação chinesa”; 2º – uma grande ofensiva que neutralizasse as ações comunistas, podendo-se usar, inclusive, bombas atômicas.
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Os chineses (e até mesmo os soviéticos) não estimularam seus vizinhos vietnamitas à guerra efetivamente, mas este tipo de notícia acusatória ao mundo comunista era bem típico do momento. Os expurgos feitos pelos militares nos meses seguintes ao golpe de 1964, em março, monopolizaram o espaço na imprensa brasileira, que estava a favor dos militares na queda de João Goulart, embora temerosa com os caminhos seguidos pelo governo militar, que parecia não querer abandonar tão cedo o poder. Porém, nos momentos iniciais do golpe, a pregação anticomunista e o fim da “bagunça” administrativa do governo Goulart eram retratados com grande euforia. Com o anticomunismo ainda em evidência, a cobertura do Incidente de Tonquin não poderia escapar dessa lógica. Regime Militar e a Guerra do Vietnã No dia 6, a posição do governo brasileiro ganhava primeira página na Folha de São Paulo: o Brasil era solidário aos Estados Unidos e contrário à agressão nortevietnamita. Como era uma intervenção para auxiliar um país que estava sendo atacado pelo comunismo – o mesmo motivo que os militares haviam alegado para justificar sua ascensão ao poder em 1964 –, a posição do governo brasileiro de apoiar os Estados Unidos foi bastante lógica. Desde as primeiras notícias do agravamento da crise no Sudeste Asiático, o governo militar brasileiro mostrava-se muito preocupado com a situação, desejando um rápido desfecho, de preferência com os resultados favoráveis aos norte-americanos. O risco não era apenas de um eventual exemplo a grupos de oposição, que ainda poderiam exercer alguma reação dentro do Brasil naquele momento, mas também a pressão dos seus próprios aliados, os Estados Unidos, que queriam a presença de tropas brasileiras no conflito vietnamita. O presidente Castelo Branco era informado sobre a maioria das operações que eram efetuadas no Vietnã pelo próprio Johnson, por meio do embaixador Lincoln Gordon. Numa carta de Johnson para Castelo Branco (datada de 25/07/65), o então Presidente dos Estados Unidos deixou clara a sua intenção:
Fui informado de que o governo brasileiro já providenciou o envio de café e medicamentos para o Vietnã, através da Cruz Vermelha Brasileira, e tenho certeza de que esses artigos são muito necessários àquele país. Em vista das atuais circunstâncias, porém, parece que se fará necessária ajuda adicional, e estou muito interessado em conhecer seu ponto de vista em relação a que tipo de assistência adicional o governo brasileiro talvez pudesse fornecer.
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O governo norte-americano condicionou um empréstimo ao Brasil, no valor de 150 milhões de dólares, à presença de tropas brasileiras no Vietnã. A “Diretriz particular e íntima para o ministro Juraci Magalhães”, ministro do Exterior na época, comentando o pedido norte-americano, afirmou:
O caso do Vietnã está repercutindo em cheio sobre o Governo do Brasil. O embaixador Gordon, em sua última conferência comigo, antes do Natal, me transmitiu o pedido do presidente Johnson para o nosso país colaborar no esforço norte-americano. (...) Sugeriu então que enviássemos meios de guerra (tropas terrestres, navios ou aviões), médicos ou mesmo enfermeiros.
Castelo Branco nunca cogitou a idéia de mandar tropas ao Vietnã, sendo esta política justificada pela lógica dos preceitos da Escola Superior de Guerra. Por esses conceitos, o Brasil deveria defender uma área específica, surgindo daí a teoria dos Círculos Concêntricos ou cones, ou seja, áreas estratégicas delimitadas que o Brasil deveria intervir em casos de emergência. O Brasil teria de se preocupar com o “círculo concêntrico” do Atlântico Sul, intervindo (quer por alianças, quer por pressão militar) nos instáveis vizinhos Paraguai, Bolívia, Venezuela, Uruguai e na sempre rival Argentina; o “cone” da margem do Atlântico, preocupando-se com o litoral africano, que assistia a inúmeras lutas de caráter anticolonial (muitas delas defendendo a revolução socialista); e o “cone” norte, barrando a influência da Revolução Cubana (o que explicaria a presença de tropas brasileiras na República Dominicana, em 1965). O papel dos Estados Unidos seria o de auxiliar todos os lugares do mundo onde existisse ameaça comunista, como estavam fazendo no Sudeste Asiático. Dentro dessa lógica, a presença brasileira no Vietnã do Sul seria desnecessária, já que o país já estava cumprindo o seu papel dentro do continente americano. O governo de Castelo Branco deu apoio ao governo de Lyndon Johnson e ao governo do Vietnã do Sul exportando café e enviando ajuda médica através da Cruz Vermelha do Brasil. Apesar do auxílio brasileiro limitar-se apenas ao envio de café e de medicamentos, os sul-vietnamitas colocaram o nome do país num monumento, com nomes de todos os países que ajudavam o Vietnã do Sul. Não seria a última vez que o governo dos Estados Unidos iria propor que o Brasil se envolvesse diretamente no Vietnã: Henry Kissinger, assessor para assuntos de Segurança Nacional, numa carta escrita em nome do presidente Richard Nixon (19691974) e endereçada ao presidente Médici, datada de 16 de julho de 1973, solicitava que o Brasil substituísse o Canadá na comissão de quatro países que tentariam monitorar o
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tratado de paz celebrado pelas conversações de Paris, assinado em 27 de janeiro do mesmo ano (tratado que deixou a situação igual ao instável acordo de Genebra de 1954), pois “o governo é ideologicamente sólido e o país tem experiência internacional”. O governo Médici recusou a oferta – o Vietnã era um problema “espinhoso” demais para o regime militar brasileiro participar. Box – Origens da Guerra do Vietnã O Incidente de Tonquin foi a desculpa para a entrada definitiva dos Estados Unidos no conflito vietnamita, ou, melhor ainda, para institucionalizar a sua intervenção. O Vietnã faz parte da península da Indochina, no Sudeste Asiático. Dominados pelos franceses no final do século XIX, junto com os vizinhos Laos e Camboja, a região da Indochina foi transformada em colônia francesa, mas a resistência contra o invasor e colonizador nunca cessou. Com o início da Segunda Guerra Mundial e da capitulação francesa perante a Alemanha nazista, os japoneses, aliados dos nazistas, penetraram na Indochina. Em 1941, foi fundado o Viet Nam Doc-Lap Dong Minh, a Liga de Independência do Vietnã, conhecida pelo nome reduzido de Vietminh, formada por nacionalistas, incluindo o comunista Ho Chi Minh. Inicialmente lutaram contra os japoneses, com auxílio norte-americano, vencendo-os, tomando o país (Vietnã) e proclamando a independência, em 1945. A independência duraria menos de um mês. Com o fracasso das negociações entre o Vietminh e o governo francês, a França bombardearia o porto de Haiphong, em 1946, iniciando as batalhas do que foi chamado de Primeira Guerra da Indochina (1946-1954). Essa guerra, apesar de ser uma luta colonial – a França queria retomar sua antiga colônia –, acabou entrando num quadro mais complexo no imediato pós-guerra: para os Estados Unidos, esta era uma luta global entre o “mundo livre” democrático e a opressão comunista. Os norte-americanos começariam a financiar o esforço de guerra francês. As forças francesas na Indochina foram derrotadas na batalha de Dien Bien Phu, em 1954 (batalha esta que começara em novembro de 1953), o que levaria as partes em guerra à mesa de negociações em Genebra, negociações estas, iniciadas em 8 de maio e encerradas em 21 de julho de 1954, que dividiram a península da Indochina em quatro países: Vietnã do Norte (sob a liderança do Vietminh), Vietnã do Sul (que seria apoiado pelos Estados Unidos), Laos e Camboja. A divisão do Vietnã, na altura do paralelo 17, seria temporária, sendo que o destino dessa divisão seria decidido numa futura eleição, que indicaria os rumos da reunificação dos dois Vietnãs.
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Os Estados Unidos fizeram todos os esforços possíveis para que o Vietnã do Sul fosse um regime estável, pró-ocidental e que pudesse se defender caso o Vietnã do Norte resolvesse iniciar uma luta para a reunificação. Mas o governo que assumiu o Vietnã do Sul em 1954, de Ngo Dinh Diem (inicialmente como primeiro-ministro do imperador Bao Dai, depois como presidente), apresentava duas características básicas: corrupção e incompetência. No final da década de 50, os ataques guerrilheiros para unificar o país foram sendo retomados no Vietnã do Sul. Em dezembro 1960, foi criada a Frente de Libertação Nacional (FLN), organização nacionalista (como no Vietminh, nem todos eram comunistas) que visava a reunificação do país e era apoiada pelo Vietnã do Norte. Os guerrilheiros da FLN acabariam conhecidos como Vietcong. O governo Dwight Eisenhower (1953-1960) logo estaria mandando 200 conselheiros militares por volta de 1960 – a situação do Vietnã do Sul agravara-se. O número de conselheiros militares iria aumentar durante o governo de John Kennedy (1961-1963). A impopularidade do regime de Diem confirmou-se na crise do governo com os budistas. Depois de alguns confrontos violentos entre as forças de Diem e seitas budistas, no dia 11 de junho de 1963, aconteceu um fato marcante: um monge budista ateou-se fogo. A fotografia deste incidente, tirada por Malcowm Browe, seria uma das mais famosas do século XX, colocando o Vietnã nas primeiras páginas dos jornais do mundo inteiro. Ainda em 1963, Diem não resistiu às pressões, sendo deposto e morto. Um mês depois do assassinato de Diem, Kennedy também encontraria a morte ao ser assassinado em Dallas (22/11/1963), sendo substituído pelo vice-presidente Lyndon Johnson, que aplicaria uma política mais radical na questão vietnamita. Logo, Johnson ordenou que aviões, secretamente, recolhessem informações sobre o Vietnã do Norte. A situação do Vietnã do Sul era a pior possível, já que poderia ser dominado pelo Vietcong em questão de meses. O Incidente de Tonquin fez com que os Estados Unidos entrassem definitivamente na guerra. Os norte-americanos iriam se retirar definitivamente do Vietnã em 1973 e a guerra, tendo como resultado a reunificação do país pelos comunistas, acabaria apenas em 30 de abril de 1975.
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Sobre o autor: Orivaldo Leme Biagi é Mestre e Doutor em História pela UNICAMP, leciona na FAAT (Faculdades Atibaia) e autor de O Imaginário e as Guerras da Imprensa – Estudo das Coberturas Realizadas pela Imprensa Brasileira da Guerra da Coréia (1950-1953) e da Guerra do Vietnã na sua chamada “Fase Americana” (1964-1973). Rio de Janeiro: Papel Virtual, 2004. Bibliografia ARNETT, Peter. Ao Vivo no Campo de Batalha – do Vietnã a Bagdá, 35 Anos em Zonas de Combate de Todo o Mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. FERRO, Marc. História das Colonizações – das Conquistas às Independências, Séculos XIII a XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. VIANA FILHO, Luís. O Governo Castelo Branco. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975, 2ª ed.
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Imagens
Vietnã, 1968. Série Última Hora – Política.
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Soldado vietnamita conduzindo menino, 1963. Série Última Hora – Política.
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Ernesto Geisel, Charles d’Gaulle e Castelo Branco, 1964. Série Última Hora – Número 1.
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Gordon Lincoln, embaixador dos Estados Unidos no Brasil, dirigindo-se aos rotarianos. [s.d.]. ICO UH 0338 DAESP.
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D E S F AZ E N D O P R E C O N C E I TO S S O B R E A H I S TÓ R I A D O B R AS I L :
TR AB ALH O ,
M I GR AÇ ÃO E LU TAS S I N D I C AI S
A N TO N I O L U I GI N E GR O
“Quem agüenta esses baianos”?, desabafou um operário e militante da Pirelli, firma metalúrgica de Santo André. No ABC paulista – onde se construiu, nos anos 1950, nossa indústria automobilística –, esse ativista e seus companheiros, várias vezes, recorreram à origem rural de grande parte de seus colegas para explicar as dificuldades de relacionamento entre os sindicatos e suas bases. Segundo o que se costumava dizer, quando não havia luta e esclarecimento, é porque nos faltavam os imigrantes (aquela ilusória italianada anarquista e rebelde). É um equívoco a associação entre origem rural e apatia, concluindo-se, em seguida, que o povo brasileiro não presta, assim nos faltando os imigrantes, que seriam conscientes e radicais. Neste artigo, vamos duvidar dessa visão e buscar uma outra, mais complexa e alternativa. Se consultarmos os arquivos das polícias, encontraremos importantes elementos para formular essa outra visão, bem distinta da praxe, na qual os trabalhadores saem carregando a carga e a culpa. Para isso, vamos examinar alguns episódios referentes às greves dos anos 1950 e 1960. Por causa da abertura de milhares de empregos a uma mão-de-obra sem experiência industrial, nelas sobressai um novo operariado (vindo de várias regiões do país), no qual também figuravam os mais febris trabalhadores do parque automobilístico do ABC, e que, assim, surpreendiam os descrentes na “queima de etapas” de JK. Exatamente por isto os que chegavam podiam inquietar também os grupos operários mais antigos, na medida em que disputavam não só um lugar no mercado de trabalho, mas também formavam suas comunidades (em novos bairros em construção). Da parte dos que já residiam na área, os estranhamentos eram marcados pelo orgulho étnico e profissional dos descendentes dos imigrantes, os quais, em geral, assentavam na qualificação do ofício o pré-requisito para a dignidade operária e a ação política.
Estabelecidos há tempos em usinas têxteis, gráficas, químicas, moveleiras e metalúrgicas, eram uma base expressiva do sindicalismo. A partir de 1955, bem junto dessas usinas, surge – acelerada e grandiosa – uma indústria automobilística. A partir de cima – ou mesmo por quem estava ao lado – os migrantes foram vistos como “atrasados”. A depreciação do linguajar, o desfavorecimento instrucional e o preconceito contra suas práticas curativas e religiosidade (taxadas de crendices) os acantonava sob o rótulo de “baianos”. Pertencer a tal grupo podia ser um qualificativo degradante. Mas baiano não era, na verdade, apenas o natural da Bahia. Era o subalterno, várias vezes não-branco. Era, também, aquele cujo labor torna calejada a mão, aquele que tem a infelicidade de suar trabalhando. O sindicalista Philadelpho Braz foi uma vez atacado, numa fábrica, com o xingamento de “tijolo mal queimado”, por ser filho de pai baiano e mãe ítalo-brasileira. Os migrantes, mesmo assim, abriam brechas que expunham o valor de suas origens, conferindo, em acréscimo, um sentimento de honradez à sua faina sofrida. De fato, quanto mais examinamos o seu modo de vida, mais inadequadas nos parecerão as noções de progresso e atraso. Habituados ao trabalho duro, às exigências da atividade agropastoril, a levar e trazer recados, versados numa gama de serviços vários, a fábrica automobilística, por ser mais inovadora, lhes reservava tarefas para as quais dispunham de preparação. Nas entrevistas, contam-se histórias em que suas mãos dão “jeitos” e criam “macetes”, inventando formas de agir, produzir e união. Vendo a história por esse ângulo, enxergaremos aspectos notáveis, mas às vezes menosprezados. Por exemplo, prestar favores é uma prática bancada por quem está em cima, aproveitando-se das agruras de quem está embaixo. A contrariedade dos industriais com o projeto de lei do 13o salário refletia, como veremos a seguir, o seu apego a um indisputável arbítrio patronal, que não prestava contas ao domínio das lei trabalhistas, revestindo os direitos dos operários com o ar de concessão generosa do patrão. No final de 1960, um comunicado da polícia política paulista registra que, em diversas fábricas, ante “a conquista do abono de Natal, ainda que não esteja regulamentado por lei (embora conste na Constituição)”, o Partido Comunista Brasileiro decidira regular “as lutas nesse sentido”. Logo, para o início de 1961, não se programavam greves gerais nem demonstrações de rua. Antes, se aguardavam “greves
brancas”, feitas nas fábricas, para evitar choque com a polícia. Mesmo assim, uma greve fabril exigia propósitos e energia. Isto porque seu rival – uma aliança entre policiais, empresários, diplomatas, políticos e militares – não dispensava a espionagem e a coerção. Uma dessas greves aconteceu na temível Laminação Nacional de Metais (LNM), que se valia de vigilantes armados, sendo por isso quase impossível de parar. Junto, emerge outro personagem amedrontador, o elo da repressão interna com a repressão externa: o Dops. Mas, dessa vez, quase surraram o agente em serviço, haja vista sua fracassada tentativa de capturar um trabalhador, levando-o ao escritório da firma. Ao agente foi de encontro um cordão de operários, os quais marchavam para a forra. Nada grave ocorreu, graças à intervenção de um líder, chamado de “comunista”. Das greves gerais dos metalúrgicos cariocas em 1955 e 1957, os operários da Fábrica Nacional de Motores não participaram. Porém, em de março de 1961, eles finalmente suspenderam o serviço, reivindicando cumprimento de promessas e repartição dos lucros. Apesar do isolamento (a fábrica tinha vila operária e ficava longe das demais), a distância que separava o sindicato desta base parecia finalmente percorrida: numa reunião, os trabalhadores evocaram a criação de uma delegacia sindical. Exultante, o jornal Novos Rumos noticia o aparecimento de novos líderes, “muitos deles oriundos da lavoura”. Ao som de um silvo, os trabalhadores da General Motors de São Caetano fizeram uma pequena parada em 24 de outubro. Estavam atentos a uma mesa-redonda entre patrões e empregados. A empresa solicitou policiamento, mas a greve eclodiu na seqüência. Duas passeatas, segundo um relatório da polícia, mostraram a que viera a paralisação. No dia seguinte, o Tribunal Regional do Trabalho propôs que os patrões dessem 20% de reajuste e garantissem o pagamento das 48 horas semanais. Em assembléia, a greve foi mantida por aclamação, medida reforçada pelos piquetes do dia 27. No sábado, 80 funcionários dos escritórios retornaram. Este número depois subiu para 650, apresentando-se ainda 40 operários. No dia 31, mil e cem funcionários iam aos escritórios e 400 operários, à produção, mas só uma minoria reapareceu em 1o de novembro. Contra a pressão patronal, o movimento resistia. Podemos nos inteirar também de outras ações. Em ato na Praça Primeiro de Maio, os oradores elogiaram a iniciativa, caso de Luiz Tenório de Lima, o Tenorinho,
que concitou os operários a apoiarem o projeto do 13o. O deputado Luciano Lepera criticou aqueles que, nas eleições, votavam com “sentimentalismo”. Para ele, isso acontecia porque determinado deputado ou senador viviam de prestar favores. No seu entender, o povo devia “acabar com esse sentimentalismo, votando em operário” (conforme anotou, preocupado, um policial). Resultado dessas e outras atitudes, O Estado de São Paulo noticiou: “acordos evitaram as greves”. Surge o chamado de greve geral, para 13 de dezembro de 1961. Um panfleto reclama: “nas gavetas da Câmara Federal, desde 1959, dorme um projeto de lei”: o da consagração do abono de Natal em 13o salário. Em 7 de dezembro, o general Edmundo de Macedo Soares fez uma visita ao sindicato a que pertencia a firma que ele representava, a Mercedes-Benz. Ele ficou sabendo que a Willys-Overland e a Simca se dispunham a atender, integralmente, a paga do abono. Scania-Vabis e Vemag entrariam com pagamentos parciais ao passo que Volkswagen e Ford queriam conceder valores reduzidos. Como se vê, a fama de bom pagador nem sempre é um ato voluntário. Na véspera da greve, circulam rumores sobre alvoroços na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp): os patrões haviam resolvido se manifestar contra o crédito natalino. Certas falas, pronunciadas em assembléia, exortaram à sublevação contra o presidente Jango: “para defendermos nossos interesses, iremos até o ato de completa rebeldia”, registrou o investigador do Dops. Outros disseram que não mais confiavam no Governo Federal ou no Congresso. Suas esperanças estavam, por conseguinte, depositadas no então governador de São Paulo, Carvalho Pinto, e no Exército. O governador não decepcionou, e o Exército não precisou intervir, pois ainda não era a hora. A Secretaria de Segurança de São Paulo armou um plano considerado o maior até então. Os delegados incumbidos do comando agiriam com o máximo de energia visando a dissolver os piquetes e a efetuar a prisões. Assim, se puseram à frente de aproximadamente 12 mil homens, algumas dezenas de novas viaturas e cerca de cem radiopatrulhas. Mas por que tanto empenho em confrontar os piquetes? Desde a Greve dos 300 mil, as lutas dos trabalhadores se valiam dos piquetes para expressar os laços de unidade vigentes em suas rodinhas, comitês e ajuntamentos, assim como em outras formas de associação – estendidas pelos bairros e os mais variados clubes não-sindicais. Em certas ocasiões, os piquetes atemorizavam os
observadores e eram chamados de esquadrões voadores; em outras, evoluíam como incontido carnaval. Desfilavam carros de som, se ornavam com estandartes – dos sindicatos e da pátria brasileira –, eram comandados por “chefes” e prestigiados por “amigos”. Estes últimos podiam ser militares de linha nacionalista e lideranças trabalhistas que iam à frente, como um abre-alas para mitigar as animosidades dos pelotões de choque e das guardas e chefias das firmas. A prestação de amizade servia, em segundo lugar, para garantir que o piquete não era coisa de arruaceiros, reforçando sua auto-imagem de clareza de objetivos. Durante a Greve dos 400 Mil, em 1957, os generais Gentil Falcão e Porfírio da Paz foram taxados de “clowns” pela polícia. Gentil Falcão “representava o papel de ‘quebragalho’ dos grevistas frente ao policiamento”, reclamou o Dops. Quando praças e oficiais investiam contra os piqueteiros, o general se identificava, forçava-os à “posição desagradável” de bater continência e arrancava “sorrisos maliciosos” dos trabalhadores. Essas e outras escaramuças – pau contra cassetete, pedras contra jatos d’água, multidão contra cavalaria, chacotas contra ordens, piquete contra pelotão – davam às greves a nada sisuda cara de um movimento de massas. Maltas de gente nada branca, na posse de suas questões próprias, além de seus recursos corporais – a força e a raça –, exibiam sua valentia e disposição, provocando medo e ojeriza em seus oponentes, mas angariando apoio nas chamadas “ordens baixas”. Aos gritos de “Fecha!”, se tornavam senhores das vias e punham a polícia para correr. No dia 17 de outubro de 1957, um piquete sai de Santo André para São Caetano, passando por várias fábricas. Engrossando-se com adesões, ecoa espectro amedrontador, fechando as firmas. Com autocontrole – sem “agir com depredações” (segundo um policial) –, foi observado um choque na Lidgerwood, onde marretaram um guarda (quando este atacou). Nota de insucesso, na LNM, a multidão tenta se impor, mas é impedida por piquetes da Força Pública. À tarde, um segundo piquete parte da Vila Prudente. O investigador no seu encalço presumiu que era integrado por nortistas, talvez por causa do grande alarido com que fechavam as usinas que o policial ouviu e notou. Nas ruas e nos ajuntamentos a liberdade, conquistada mediante conflito, e com peculiares interjeições. Greves como as que vemos aqui revelam um outro aspecto notável: os novos personagens em cena. Também evidenciavam mundos do trabalho erguidos a partir de
baixo, com suas forças e iniciativas e, ainda mais, a partir de dentro da fábrica, tomando as ruas e mostrando seu poder. Hábil em circular mensagens e idéias entre as rodinhas ajuntadas nas praças dos “marmiteiros” e as fileiras dos “peões” dispostos nas linhas de montagem, a astúcia e autodefesa dos operários os faziam independentes o bastante para deixá-los alheios – ou para exporem sua vontade – defronte a pretensos senhores e representantes, inclusive diante dos “companheiros”. Encontramos assim pessoas de carne e osso, como Anésio de Oliveira, natural de Itapira (SP). Nascido em fazenda de café, aí viveu até 1939. Vinte anos depois figurava entre os primeiros associados do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema. Lembrou-se Anésio: “Nesse tempo, eu trabalhava na Mercedes. E eu fiz parte da fundação desse sindicato. Nesse tempo aí eu acho que o Lula ainda estava lá em Pernambuco, acho que cortando cana. Ô, se ele escutar!” Em paralelo, assimilando gente de outros lugares, a baianada implicava que seu membro fosse um empregado braçal, geralmente não-qualificado. Paulo Fontes apurou que, na Nitro Química, os novatos logo aprendiam o “serviço dos baianos” e também eram logo apresentados à “baianada” que conferia vida e força ao ativismo sindical, na base e no topo, caso de Artur Pinto de Oliveira, natural de Caem (Jacobina) e do dirigente Adelço de Almeida. Nos inteiramos também de detalhes da trajetória de um movimento sindical capaz de abrigar experiências que integravam a política dos partidos e do parlamento com a política do cotidiano, combinando queixas e protestos populares com a ação institucional. Ao mesmo tempo em que o operariado brasileiro se notabilizava por dar vida a uma extraordinária máquina de trabalho – o que mudou a cara do país –, havia expressivas experiências de independência e maturidade e de ampliação da cidadania, nos fazendo ver que os trabalhadores lutavam por seus direitos. Em ambos os casos, os trabalhadores de origem migrante ganharam notoriedade pelo protagonismo histórico. Se suas iniciativas nas fábricas eram combatidas por industriais e pela polícia, era porque – em poucas palavras – elas importavam.
BIBLIOGRAFIA
ABRAMO, Laís. O Resgate da Dignidade. Greve Metalúrgica e Subjetividade Operária. Campinas: Editora da Unicamp, 2000. BATALHA, Cláudio; FORTES, Alexandre; SILVA, Fernando Teixeira da (org.). Culturas de Classe. Identidade e Diversidade na Formação do Operariado. Campinas: Editora da Unicamp, 2004. FORTES, Alexandre (et al.). Na Luta por Direitos. Estudos Recentes em História Social do Trabalho. Campinas: Editora da Unicamp, 1999. NEGRO, Antonio Luigi. Linhas de Montagem. O Industrialismo NacionalDesenvolvimentista e a Sindicalização dos Trabalhadores. São Paulo: Boitempo, 2004. RAMALHO, José Ricardo. Estado-Patrão e Luta Operária. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
DADOS
DO AUTOR
Professor do Departamento de História da Universidade Federal da Bahia e autor de Linhas de Montagem. O Industrialismo Nacional-Desenvolvimentista e a Sindicalização dos Trabalhadores. São Paulo: Boitempo, 2004.
Representações sociais da liberdade e do controle de si.1 Denise Bernuzzi de Sant'Anna•
Quando James Dean declarou à imprensa que estava cansado dos atores que não corriam riscos e dos jovens avessos às “coisas verdadeiramente excitantes”, a maior parte de suas fãs ainda desconhecia a liberdade corporal sugerida nos filmes de Hollywood.2 Naqueles anos, proclamados como “dourados”, audácia, irreverência e liberdade de escolher o próprio destino costumavam ser exibidos nas revistas dedicadas às “fofocas” do cinema como valores tanto atraentes quanto perigosos. Muitos jovens das classes médias em ascensão queriam imitar seus ídolos, mas estavam apenas iniciando uma trajetória de liberação e rebeldia que, nas décadas seguintes, se tornaria um fenômeno de massa. Desde o pós-guerra, diversos países influenciados pelo “american way of life” foram o palco para o sucesso de revistas dedicadas a fortalecer a fama de atores estrangeiros e o novo “it” revelado por seus hábitos julgados modernos. Ben Cooper, Antony Perkins, James Dean, entre outros, apareciam em publicações dirigidas ao grande público em fotografias coloridas, a partir das quais era possível deduzir que moravam sozinhos e em apartamentos bem diferentes das residências de seus pais. Para esses jovens, praticidade e conforto não eram mais exceções e sim qualidades inseparáveis da vida considerada moderna. No Rio de Janeiro e em São Paulo, revistas como Cinelândia, Querida e Capricho estimulavam o gosto por informações sobre a intimidade dos “famosos” e, ao mesmo tempo, valorizavam padrões de comportamento adaptados às necessidades da sociedade de consumo emergente. As mulheres eram convidadas a conhecer o novo charme da “roupa pronta” – comprada em lojas –, enquanto aos homens eram oferecidos novos “gadgets” para embelezarem seus automóveis e lambretas. A moda masculina dos cabelos longos ainda não existia, mas os esportes e as roupas de ambos os sexos sugeriam um novo modo de pensar: era preciso respeitar os próprios desejos e não se esquecer de cuidar do corpo. Muitos rapazes daquela época mostravam-se ansiosos pela busca de prazeres pessoais mas, certamente, não pareciam apressados em 1 Parte deste trabalho baseia-se no doutorado defendido em 1994, sobre a história do embelezamento da mulher brasileira no decorrer do século XX. SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. La recherche de la beauté. Université Paris VII: 1994, 658 p. 2 Sobre esta declaração de James Dean, ver, Cinelândia, n.° 72, novembro de 1955, p. 54.
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constituir família. De fato, os contemporâneos de James Dean pouco hesitavam em tornar charmosa uma descontração que, para a geração de Clark Gable, seria sinônimo de desleixo. As mulheres famosas também começavam a exibir nas telas um sex-appeal antes pouco autorizado, capaz de eclipsar o glamour das conhecidas vamps dos anos 1930 e 1940. As novas roupas esportivas, práticas e confortáveis, sugeriam um charme tão picante quanto ingênuo. Um semblante de “baby” modificaria a publicidade, associando-a a slogans até então pouco usuais: “sinta esse prazer”, “mais liberdade” e muito bem-estar. No Brasil, em 1957, por exemplo, Celeneh Costa, a “estrela brotinho”, exibia, na revista carioca Cinelândia, seu corpo vestido em jeans e, de cabelos soltos, mostrava estar mais interessada em sua carreira do que em “arrumar um marido”.3 Talvez seja verdade que muitos “brotinhos” daquela época continuassem a esperar um marido; mas não pareciam esperá-lo da mesma maneira que suas mães o haviam feito, pois a conquista da independência financeira começava a ser menos um sonho do que um direito de inúmeras jovens. No entanto, se a proclamada “era dos brotos” correspondia à valorização de atitudes arrojadas e imprevisíveis, por outro lado, também dava lugar a questionamentos, outrora raros, sobre as antigas obrigações familiares e os tradicionais deveres morais que, em grande medida, contrariavam a expansão da descontração corporal doravante difundida pela imprensa como se fosse uma qualidade essencial dos novos tempos. Não por acaso, a palavra “liberdade” começa a ser utilizada com facilidade: para as mulheres, liberdade de calçar sapatos sem salto, de encurtar as saias e os cabelos; para os homens, outras liberdades deixam de ser sinônimos de perdição e viram assunto da moda. Além disso, atitudes outrora consideradas suspeitas do ponto de vista moral, para algumas atrizes, tornam-se aliadas na conquista do sucesso. Já na década de 1960, segundo uma reportagem com a atriz Kim Novak, ser livre significava defender a idéia de que a vida de solteira era melhor do que a de casada. Sem a preocupação de esconder sua atração por gestos que indicavam claramente uma nova paixão pela liberdade individual, Novak declarou que: “em certas ocasiões, eu me jogo no mar, mesmo estando de vestido, seguindo uma inspiração repentina”.4 Para além da necessidade crescente de mostrar o corpo seminu, parecer um pouco “biruta” começava a ser considerado menos um defeito do caráter do que uma demonstração de charme e coragem. Escapar das regras ou condutas previsíveis podia, assim, contribuir para a conquista da admiração pública. 3 Cinelândia, n.° 104, março de 1957, p. 72. 4 Querida, n.° 215, maio de 1963, pp. 84-85.
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Na verdade, o marketing em desenvolvimento naqueles anos apostava numa revalorização da idéia de independência: diversas atrizes norte-americanas e algumas estrelas brasileiras – incluindo as misses – tendiam, cada vez mais, a ser mostradas pela imprensa como mulheres que gostavam de descobrir “o verdadeiro gosto da liberdade” e não temiam “aquilo que os outros pensariam a seu respeito”. Sabe-se que uma parte desta ousadia era uma espécie de “irrealidade cotidiana”, restrita a poucas jovens residentes nas grandes cidades e, sobretudo, uma maneira de adquirir fama, típica das celebridades daqueles anos. Mas também se sabe o quanto ela era sedutora. Difícil resistir à moda estabelecida pelo cinema e pela publicidade, a partir da qual inúmeras jovens, em sua alegria contagiante e em seu frescor saudável e desconcertante, pareciam não mais temer a autoridade masculina nem a vida distante da influência familiar. De todo o modo, mesmo se o gosto por atitudes consideradas livres não ocorresse sem o abandono de antigos pudores, ele também dependia do aprendizado, nem sempre imediato, de uma espontaneidade antes intolerável. Terezinha Morango, miss Cinelândia de 1956, foi representada por esta revista como sendo uma moça “espontânea”, alguém que não possuía “esta malícia feminina, tão comum, que leva certas jovens a declarar o contrário do que pensam”.5 Por conseguinte, as estratégias e produtos utilizados para mostrar charme e liberdade tendiam a evitar tudo aquilo que pudesse ser considerado sinônimo de artificialidade. Nesses anos em que a imagem do Brasil nas revistas era a de um país em desenvolvimento rápido e de modernização acelerada dos costumes, liberdade rimava com espontaneidade e descontração, exigindo, portanto, uma nova vigilância da mulher em relação a seus gestos e sua postura. Não por acaso, a quantidade de conselhos de beleza, a partir de meados dos anos 1950, tornou-se maior, exigindo de toda mulher o aprendizado de gestos não apenas graciosos mas, também, rápidos, firmes e seguros. Em várias revistas, manter “a linha” deixava de ser um conselho esporádico para se tornar uma norma ilustrada didaticamente, ensinada a partir da recomendação da ginástica, do uso de roupas leves e de cosméticos capazes não apenas de esconder as imperfeições do rosto mas, sobretudo, de tratá-las. Em suma, a aparência descontraída e livre exigia um persistente trabalho. Nos Estados Unidos, Sandra Dee, de 16 anos, servia como exemplo em diversas reportagens publicadas no Brasil: glamour, segundo a jovem atriz, era “juventude, frescor natural”, e ainda, “estar de bem com a vida”.6 Os novos cosméticos acompanharam e estimularam esta tendência: surgiram produtos de beleza para serem utilizados durante o dia e 5 Cinelândia, n.° 100, janeiro de 1957. 6 Cinelândia, n.° 131, março de 1959, p. 52.
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em todas as ocasiões. Sem dúvida, a aparência natural exigia um novo cuidado de si. A liberdade de “cuidar do próprio corpo” vinha acompanhada da necessidade de estar não apenas mais atenta às próprias necessidades, mas também mais responsável diante das decisões tomadas para “soltar-se”. Novos ritmos musicais, presença crescente da mulher nas escolas e no trabalho fora de casa, explosão do mercado jovem, desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, da urbanização e da indústria da beleza, as razões para tais transformações são numerosas. A imprensa feminina não escapou a essas tendências e contribuiu a seu modo para a banalização dos novos ideais de juventude e liberdade em expansão, principalmente junto aos setores médios das grandes cidades. A publicidade também usou e abusou da imagem de inúmeros produtos para exibir a positividade conquistada pela idéia de liberdade individual. Na mídia de modo geral, a trajetória de cada indivíduo, famoso ou não, deveria, doravante, contar com provas escancaradas de suas ousadias com o corpo e os sentimentos. A liberdade de “fazer o que se deseja” tornava-se um passaporte importante para garantir sucesso e charme. A atriz Joan Collins, por exemplo, foi uma entre as muitas a assumir uma imagem “rebelde”, de “mulher livre”, inclusive para fumar e usar roupas descontraídas. Para esses modelos de beleza, ser diferente ou um pouco excêntrico deixava de parecer um traço negativo do caráter. Várias revistas femininas insistiam, enfim, que a biografia de cada um podia e devia, doravante, ser construída segundo as escolhas individuais, não mais a partir das determinações familiares. Não demoraria muito, portanto, para que os contos e conselhos publicados na imprensa feminina, autorizassem os namoros e casos de amor independentes do consentimento familiar. Principalmente a partir de meados dos anos 1960, a busca da liberdade aprofundou suas ambições em direção à intimidade comportamental de cada um e passou a se dirigir a todas as idades: “ser livre”, afirmavam várias reportagens da época, significava não apenas usar roupas extravagantes, transgredir parâmetros da moda e regras de etiqueta mas, sobretudo, criar novas normas tanto para a ação social como também para a relação de cada um consigo mesmo. Não por acaso, as revistas que surgiram nessa década abrigaram conselhos dirigidos à mulher bastante favoráveis a “libertá-la” de atitudes desde então consideradas antiquadas e sem charme, valorizando o prazer de se escutar e de se conhecer. Nos contos e nas novelas impressas, as heroínas também adquiriram um novo perfil, solidário aos significados inusitados atribuídos à idéia de “ser livre”, doravante mais sensível aos próprios anseios. Alguns contos, por exemplo, colocavam as heroínas numa posição
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favorável a devaneios individuais, disponíveis para conquistarem um “espaço pessoal” de liberdade e prazer, longe da influência ou do poder dos pais, maridos e irmãos mais velhos. Viajar sozinha ou com amigas, garantir para si mesma um tempo longe do marido ou dos pais, tornavam-se expectativas “naturais” de várias heroínas dos contos e novelas das revistas daqueles anos. E, não por acaso, a traição feminina começaria a ser pensada como sendo algo que “vem e volta”, uma experiência que não necessariamente carregasse uma decisão definitiva. Interessante observar que, justamente nessa época, várias reportagens abordando o tema da traição feminina começaram a utilizar o termo “infidelidade”, como se a noção de infidelidade pudesse exprimir um peso menor do que a idéia de traição. Tal mudança de palavras sugere transformações profundas na cultura e na maneira de conceber a sexualidade. É também com o advento dos anos 1960 que a moda teve a possibilidade de rejuvenescer mais do que nunca as mulheres, criando um estilo “angel face” e colocando na ordem do dia um perfil de feminilidade estreitamente relacionado à adolescência. No passado recente, os mais novos imitavam os mais velhos. Doravante, esta equação seria, em grande medida, invertida. Os mais velhos, para não serem considerados “quadrados” ou “coroas”, passam a ser assiduamente estimulados a aderir à moda não apenas unissex mas, também, juvenil. No entanto, juventude e velhice não permaneceram com os mesmos significados. A partir do final da década de 1960, sobretudo, as “gatinhas” (e não mais os “brotos”, cuja palavra indicava ainda a importância da imagem da “mulher-flor”) ganharam em descontração corporal mas, também, em complicação emocional. Especialmente depois dos anos 1970, várias dessas novas tendências rapidamente apontadas ganharam força e sentidos diversificados. Os conselhos dirigidos à mulher nas revistas femininas, por exemplo, foram amplamente influenciados por uma dimensão psicanalítica e por sua massificação. Para cuidar da aparência e da essência humana, termos como “traumas”, “repressão”, “frustração”, e toda uma linguagem que, até então, costumava se manter restrita a alguns especialistas fora da imprensa, tornaram-se habituais nas revistas. Uma espécie de “psicologização” dos discursos dirigidos aos jovens atingiu a imprensa e, não por acaso, surgiram conselheiros de beleza autorizados, segundo eles mesmos, a tratar da psicologia humana. Desde então, ser livre tornou-se o outro lado da moeda da necessidade, cada vez mais imperativa, de ser “autêntico”. Nada de usar laquê, cinturita, soutien de bojo. Surgiram novos cremes para o cabelo e uma verdadeira massificação do ideal da “boa forma”, que substituiu, cada vez mais, o sonho da manutenção da “linha”, com muita ginástica e/ou cirurgia plástica. A manutenção da forma indicaria um aprofundamento do investimento da indústria da beleza no corpo de cada um: no lugar de
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atingir apenas uma linha externa, supostamente definida por medidas padronizadas, tratavase, sobretudo, de procurar um “novo corpo”, formado e informado a partir dos progressos industriais em matéria de rejuvenescimento e beleza. Além disso, novas exigências para emagrecer foram criadas com um rigor e uma variedade de técnicas e produtos que dificilmente teriam padrões comparáveis no passado. Metrecal, por exemplo – assim como muitos outros “remédios-alimentos” para emagrecer divulgados pela imprensa – já não servia apenas para a perda de peso: ele associava esta tarefa àquela de nutrir e fornecer prazer. Na verdade, desde a massificação desses produtos, saídos da indústria que, em seguida, criaria doces e salgados “diet” e “light”, talvez, pela primeira vez na história, o regime passou a se associar ao prazer de comer. A chegada dos adoçantes no mercado brasileiro também confirmou o quanto o regime havia se vinculado a valores de distinção social, sucesso profissional e refinamento. Tratava-se, agora, de buscar um padrão internacional de beleza corporal que colocaria num plano secundário os gostos e padrões regionais, com suas especificidades e razões de viver. As misses brasileiras dos anos 1960, por exemplo, já indicavam esta mudança: tipos “universais”, muito semelhantes com as misses de outros países, todas elas mais longilíneas do que as misses das décadas anteriores e, em geral, devotadas ao uso dos novos cosméticos e regimes em moda. A seguir, as mulheres famosas e consideradas belas, ao aparecerem nas revistas, começaram a expor os “segredos de suas dietas”, assunto que, até um passado recente, ganhava pouquíssimo destaque na imprensa. Segundo uma infinidade de reportagens posteriores aos anos 1970, liberdade começava a ser sinônimo de uma maneira privilegiada de ser leve e, por sua vez, ser leve era um meio seguro de ser moderna. Em plena época de transformação acelerada dos hábitos alimentares e do sucesso de novas lanchonetes e alimentos especializados no emagrecimento, as escolhas de cada um diante da comida começaram, mais do que nunca, a revelar os níveis de liberdade, descontração e modernidade individuais. Ao mesmo tempo, tudo aquilo que era considerado excesso de gordura corporal tornava-se sinônimo de lentidão, atraso e, até mesmo, doença. A liberdade feminina de usar mini-saia, biquíni e calça comprida foi, então, acompanhada pelas exigências de eliminar “gordurinhas”, ampliar a depilação das pernas, o bronzeamento destas e da barriga, além do combate à flacidez. É justamente nessa época de liberação do corpo feminino nas praias e piscinas que a celulite se transforma num dos maiores problemas estéticos da mulher. Em épocas passadas, as reportagens a seu respeito eram praticamente inexistentes, porém, a partir dos anos 1970, elas se multiplicaram e se especializaram. A palavra celulite se tornou conhecida e passou a ser compreendida como um
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grande obstáculo à liberdade de expor o corpo e de viver descontraidamente. Evidentemente, não é a primeira vez na história que a gordura, por exemplo, passa a ser alvo de repressão e de críticas. No entanto, no decorrer dos anos 1970, ela foi insistentemente apontada como sendo uma das principais causas de problemas tanto estéticos quanto psicológicos de toda mulher. Ser considerada gorda deixava, cada vez mais, de sugerir saúde para indicar doença e improdutividade. Gordura tornava-se menos formosura do que promessa de solidão, pobreza e tristeza. A maior parte das evocações à liberdade feminina ilustrada pela publicidade fazia referência a corpos longilíneos, magros, lépidos e jovens. Gordura tendia a ser vista não apenas como excesso mas, também, como sinônimo de paralisia e inutilidade, devendo, portanto, ser rapidamente transmutada em músculos, fibras, “pedaços de corpo” capazes de sugerir muito mais o trabalho do que o ócio, a velocidade do que a lentidão. Desde então, o antigo “it” da “gordinha” e das “roliças” tende a ser esquecido em favor da aerodinamicidade das imagens corporais capazes de sugerir uma produtiva mescla entre corpos humanos e bólidos de corrida. Mas, mesmo na década de 1970, alguns movimentos de resistência ao impulso dos corpos rumo à aceleração incessante de seus movimentos já havia ocorrido dentro e fora do espaço midiático. A vontade de libertar o corpo foi uma bandeira de luta tanto da indústria da beleza e da moda quanto de setores alternativos, contrários à toda produção industrial, ou ainda, dos movimentos que lutavam em prol dos direitos sociais das minorias. Além disso, vários setores da mídia recodificaram rapidamente os anseios por liberdade de expressão em forma de imagens-clichê, ou de slogans da moda. Assim, por exemplo, segundo a publicidade de milhares de produtos destinados à beleza e à juventude, a liberdade implicava a inexistência absoluta de doenças, tristezas e indisposições. Nesse caso, liberdade rimava com alegria sem contrários, juventude eterna e uma espécie de saúde inabalável, comparável a um superávit de energia infinita. Nas novas revistas dos anos 1970, tais como a Pop e a Nova, liberdade começava a significar satisfação sexual e, sobretudo, bem-estar individual junto à descoberta da natureza. No caso da Pop, dedicada principalmente aos adolescentes, liberdade e natureza formariam os dois lados da mesma moeda. Sob a influência da contracultura, a liberdade era representada preferencialmente durante o verão, em praias e outros espaços considerados “naturais”. Sensíveis à invenção de uma consciência ecológica outrora rara, as reportagens e anúncios dessa revista enfatizavam a necessidade de conjugar a vida jovem com o usufruto de paisagens liberadas de toda “poluição” e distantes das coações vividas na rotina das grandes cidades. Liberdade era, sobretudo, um sentimento de integridade da natureza e do corpo
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avesso à poluição de ambos. Contudo, a Pop era, também, uma das pioneiras no processo de transformação desses ideais em mercadorias de fácil acesso, em clichês publicitários de sucesso. Um estilo de vida que exibia descontração, prazer, liberdade e bem-estar (físico e mental) junto à natureza encontrava, nas páginas ilustradas desta revista, um espaço propício para atrair milhares de jovens da classe média e aproximá-los do mercado especializado na venda de novos acessórios e roupas para as atividades esportivas em expansão e para o turismo de massa. De qualquer modo, dentro e fora da mídia, o meio ambiente deixava de ser considerado uma fonte inesgotável de vida à disposição do homem. Ficava a impressão de que, agora, mais do que nunca, a Terra “apresentava as contas”,7 e o pagamento não era algo simples de ser resolvido. A intensificação da consciência ecológica durante esses anos provocou a descoberta de novos artifícios presentes em praias, rios, florestas e, em particular, dentro dos corpos. Por conseguinte, conquistar a liberdade, torna-se, para diversos setores sociais, algo próximo à aquisição de um modo de vida natural, contrário a diversos hábitos e consumos considerados, doravante, sinônimos de artificialismos. Um novo mercado de produtos naturais seria portanto incrementado, incluindo cosméticos, roupas e produtos alimentares. Se há séculos a natureza havia deixado de determinar completamente o homem, agora seria o homem que, cada vez mais rapidamente, designaria a natureza, reinventando-a em favor da criação de um corpo rejuvenescido e saudável. A liberdade para fazê-lo seria, doravante, medida principalmente pelo poderio econômico de cada um, e não tanto por sua capacidade de romper barreiras de cunho moral e religioso. Entretanto, a partir dos anos 1980, a idéia de “liberdade” associou-se ao sucesso midiático de imagens fortemente expressivas acerca da possibilidade de obter prazer pessoal em todos os momentos da vida. Prazer este influenciado pela expansão da industrialização da voga do natural. Tão sedutor quanto exasperador, exigia, em geral, a conquista de um controle sobre si cada vez mais profundo e assíduo. Ou seja, em plena década de estímulo à democratização do direito de intervir no próprio corpo e de conduzir, livremente, a própria sexualidade, assistiu-se à aceleração da privatização da vida pública e à construção de uma subjetividade mergulhada nos dilemas da indeterminação e de uma espécie de “estresse” de decidir individualmente sobre assuntos que, no passado, eram administrados de modo coletivo. Ao mesmo tempo, quanto mais se vendia e se consumia a idéia de que cada um era totalmente livre para ser proprietário de si mesmo, maior se tornava a incerteza sobre o 7 A respeito dessa consciência ecológica, ver DELEAGE, Jean-Paul. Histoire de l'écologie. Une science de l'homme et de la nature. Paris: La Découverte, 1991, p. 246.
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controle do corpo. O fundamental, desde então, afirmavam vários anúncios publicitários, era conjugar liberdade com eficácia: ser eficaz no controle de si, ser eficaz no governo das próprias coisas. A “gestão de si mesmo”, tal como a gestão de uma empresa, se torna uma prova e um testemunho da capacidade individual de vencer sempre a concorrência e todas as contrariedades em qualquer esfera da vida cotidiana. Não por acaso, as revistas femininas começaram a estimular, de modo imperativo, a aquisição de saberes propícios a fazer de toda mulher uma “vencedora”, seja no esporte, seja no amor ou no trabalho. Vencer sempre implicava, contudo, a necessidade de fabricar um corpo capaz de ser ao mesmo tempo livre e seguro. Liberdade traria, como coação maior, a necessidade dupla de uma segurança autoprotetora constante e de uma satisfação absoluta de todas as necessidades. Esta espécie de tendência à individualização extrema, acompanhada por várias transformações da idéia de liberdade, não poderia deixar de aguçar o medo de viver livremente: medo do descarte, da obsolescência, medo de sucumbir completamente e a todo momento, pois a busca por satisfação e segurança completas colocava em risco as incertezas mais comuns, transformando obstáculos rotineiros em inimigos que pareciam não ter nada mais a ensinar e que, portanto, deviam ser rapidamente abatidos. Nessa época, conforme afirmou Illich, “o fenômeno humano não se defini mais por aquilo que somos, pelo que fazemos”, nem mesmo pelo que sonhamos, pois ele se tornou sinônimo daquilo que “nos falta e, portanto, do que temos necessidade”. Para Illich, a humanidade se transformou num “pacote de necessidades”,8 dentro do qual cada um é tão livre quanto incerto para produzir a sua própria imagem de marca. Mesmo se considerarmos que a busca da liberdade física esteja dentro de tal pacote, sua historicidade, aqui rapidamente tratada, indica a permanência de um curioso paradoxo: a recorrente valorização de uma aparência considerada livre, desde o pós-guerra, é paralela à emergência, em cada momento, de novas coações, receios e intolerâncias outrora impensáveis. Ganha-se tanto em liberdade quanto em novos riscos e preocupações. A conquista de maior espaço para a expressão corporal inclui o direito ao prazer físico e, ao mesmo tempo, uma intolerância aguda em relação a qualquer ameaça de desprazer e de perturbação corporal. A publicidade de inúmeros produtos não cessa de fornecer exemplos lapidares a este respeito: por seu intermédio, proliferam os estímulos para a aquisição de mais e mais liberdade para escolher qual tratamento de saúde seguir, em que religião acreditar, qual 8 ILLICH, Ivan. La perte des sens. Paris: Fayard, 2004.
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roupa usar em determinada circunstância, como agir no trabalho e no lazer, qual imagem produzir para si a cada momento, etc. No entanto, tais demandas estão atreladas à necessidade de cada um se informar cada vez mais rápido e melhor sobre a própria escolha feita. Por conseguinte, como não é surpresa para ninguém, a busca da livre escolha na atual sociedade de consumo implica o aumento crescente de responsabilidades individuais, o que, de certa forma, indica o quanto este tema, aparentemente banal e natural nas últimas décadas, possui uma rica história, cuja duração e a intensidade revelam a infinitude dos horizontes de pesquisa sempre que a historicidade do corpo e de suas liberdades torna-se o foco principal dos interesses de cada pesquisador.
Bibliografia:
AMIEL, Vincent. Des images des mondes superposés. In: Esprit, n.° 10, Paris, Seuil, outubro de 1991. BECK, Ulrich. La société du risque. Paris: Aubier, 2001. DELEAGE, Jean-Paul. Histoire de l'écologie. Une science de l'homme et de la nature. Paris: La Découverte, 1991. FARGE, Arlette; DAUPHIN, Cécile. Séduction et sociétés. Paris: Seuil, 2001. ILLICH, Ivan. La perte des sens. Paris: Fayard, 2004. MONGIN, Olivier. La peur du vide. Paris: Seuil, 1991. PARRY, Jonathan. The end of the body. In: FEHER, M. (ed). Fragments for a history of the human body. New York: Zone, 1989. ROWE, William; SCHELLING, Vivian. Memory and Modernity: popular culture in Latin America. Londres: Verso, 1991. SANT´ANNA, Denise Bernuzzi de. Corpos de Passagem. São Paulo: Estação Liberdade, 2001. _____. La recherche de la beauté. Université Paris VII: 1994, 658 p.
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VIGARELLO, Georges. Le sain et le malsain. Paris: Seuil, 1993.
Sobre a autora: Professora de Hist贸ria da PUC-SP
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