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Construção
CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
por Marisa Almeida, Inês Roque e Pedro Frade, Unidade de Ambiente e Sustentabilidade do CTCV
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1. INTRODUÇÃO
De acordo com o Relatório de Brundtland o desenvolvimento sustentável pode ser definido como o que permite satisfazer as necessidades das gerações atuais sem comprometer a possibilidade das futuras gerações satisfazerem as suas. Já uma construção sustentável consiste na criação e planeamento responsável de um ambiente construído saudável, com base na otimização dos recursos naturais disponíveis e em princípios ecológicos, segundo a definição de Kibert apresentada na Conferência Internacional sobre a Construção Sustentável em 1994. Recorde-se que o sector da construção na Europa é responsável pelo consumo de cerca de metade dos recursos minerais extraídos, por mais de 35% dos resíduos gerados, e cerca de 20-30% do consumo energético (e consequentes gases com efeito de estufa - GEE) e 10-15% do consumo de água. Em Portugal, 62% da energia elétrica é consumida nos edifícios e em termos de RCD (resíduos da construção e demolição), estimou-se uma produção de 7,5 milhões de toneladas (2005).
A sustentabilidade de uma construção depende das diversas dimensões do desenvolvimento sustentável (ambiental, económica e social (Figura 1)) são consideradas ao longo do projeto. Segundo Kibert, uma construção sustentável deve seguir os seguintes princípios: reduzir o consumo de recursos, aumentar a reutilização dos recursos, reciclar materiais em fim de vida e utilizar recursos renováveis, proteger os sistemas naturais, eliminar os materiais tóxicos e fomentar a qualidade em todas as etapas do ciclo de vida. Por forma a caminhar para a sustentabilidade é importante aumentar o ciclo de vida da construção, nomeadamente construindo com durabilidade, assegurando um maior tempo de utilização do edificado e reduzindo os impactes ambientais. O Pacto Ecológico Europeu (European Greal Deal) (COM 2019/640), bem como o Plano Europeu para a Economia circular (COM 2020/98 de 11/03/2020 promovem estratégias para tornar o sector da construção mais circular ao longo do seu ciclo de vida. Referem ainda a abordagem do desempenho de sustentabilidade dos produtos de construção no contexto da revisão do Regulamento de Produtos de Construção, com inclusão de requisitos de teor reciclado; integrar a avaliação do ciclo de vida (abordagem Level(s), metas de redução de carbono; melhorar a durabilidade e adaptabilidade de acordo com princípios de economia circular; rever as metas de valorização de materiais dos resíduos de construção e demolição, entre outras. Uma cidade sustentável define-se como um organismo dinâmico e organizado, onde os seus cidadãos podem satisfazer as suas necessidades e melhorar o seu bem-estar, sem prejuízo (no presente o no futuro) do ambiente natural e das condições de vida de outras pessoas.
A nível mundial encontram-se várias cidades com um desenvolvimento sustentável consolidado estando, algumas delas reconhecidas pela ONU como um modelo de sustentabilidade por apresentarem um baixo impacte ambiental, serem pensadas e construídas de forma a otimizarem os benefícios da energia solar e do aproveitamento das águas das chuvas, valorizarem a produção alimentar local e orgânica e recorrerem a materiais naturais nas construções e valorizarem devidamente os resíduos.
2. CERTIFICAÇÃO DA SUSTENTABILIDADE DOS EDIFÍCIOS
A certificação da construção sustentável surge da necessidade de promover mecanismos que garantam a conformidade da construção com os princípios de desenvolvimento sustentável, sendo um processo efetuado por uma entidade externa, independente e acreditada que, com o auxílio de normas existentes, verifica a conformidade de um produto ou sistema. A nível nacional ainda não é obrigatória esta certificação, no entanto, a nível mundial alguns países já desenvolveram sistemas de certificação. Alguns dos sistemas de certificação da sustentabilidade dos edifícios incluem o LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), LiderA e o BREEAM, entre muitos outros. • LEED: Para esta certificação é atribuída uma pontuação a diversas áreas de avaliação (prioridade regional, processo integrado, localização e transporte, espaço sustentável, eficiência do uso da água, energia e atmosfera, materiais e recursos, qualidade do ar interior e inovação do projeto).
A classificação do projeto tem em conta a pontuação em cada uma das áreas analisadas e pode ser obtida uma classificação consoante o resultado obtido: Certificado (40-49 pontos), Prata (50-59 pontos), Ouro (60-79 pontos) e Platina (80+ pontos).
• LiderA: Neste sistema de certificação são avaliadas as vertentes de integração local, consumo de recursos, cargas ambientais, conforto ambiental, vivência socio-económica e uso sustentável, sendo atribuído um nível de desempenho de A++ a G. Caso o desempenho for de classe C ou superior, é atribuída a certificação correspondente.
• BREEAM: Para esta certificação são analisadas diversas secções ambientais (energia, saúde e bem-estar, inovação,
uso da terra, materiais, gestão, poluição, transporte, desperdício e água), sendo que a cada uma destas secções é atribuído um peso diferente para a obtenção da pontuação global. Se se alcançar 30% da pontuação, existe a passagem da certificação, com 45% obtém-se bom, com 55% muito bom, com 70% excelente e com 85% excecional. • LEVEL(s): É uma nova abordagem promovida pela União europeia para avaliar e comunicar o desempenho de sustentabilidade dos edifícios, ao longo do ciclo de vida dos edifícios de forma harmonizada (face aos mais de 400 esquemas europeus). Utiliza 6 macro objetivos como a emissão de GEE ao longo do ciclo de vida; alterações climáticas; eficiência de recursos e materiais para economia circular; recursos hídricos; saúde e conforto.
3. RÓTULOS E DECLARAÇÕES AMBIENTAIS DE PRODUTO NA CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
Toda a atividade humana produz um conjunto de impactes ambientais ao longo do seu ciclo de vida, não sendo exceção o fabrico de materiais de construção. Na tentativa de minimizar estes impactes, ao longo dos últimos anos tem-se verificado que a Comissão Europeia promove uma Política Integrada de Produtos (PIP), na qual se define uma estratégia para minimizar este impacte ambiental ocasionado pelos produtos ao longo do seu ciclo de vida. Neste âmbito, foram desenvolvidas diversas ações, por parte da Comissão, com o intuito da melhoria contínua do desempenho ambiental dos produtos, nomeadamente o desenvolvimento de declarações ambientais de produto e de critérios ecológicos para a realização de compras. Os rótulos e declarações ambientais podem fornecer informação ambiental sobre um produto ou serviço de uma forma mais genérica ou de uma forma mais específica. Estas ferramentas têm como objetivo incentivar a procura e a oferta de produtos ou serviços com um menor impacte sobre o ambiente, levando a um potencial de melhoria ambiental contínua induzido pelo mercado.
Figura 2. Ciclo de vida de um material de construção.
A análise de ciclo de vida (ACV) é uma metodologia que permite analisar todo o ciclo de vida de um produto ou serviço através da quantificação e avaliação dos potenciais impactes ambientais associados. A ACV divide-se em 4 fases fundamentais: definição do objetivo e âmbito, inventário de ciclo de vida, avaliação dos impactes do ciclo de vida e interpretação do ciclo de vida. A ACV pretende quantificar e comunicar todos os impactes ambientais significativos relacionados com o produto ou sistema, abrangendo uma ampla gama de questões ambientais, como por exemplo qualidade do ar, qualidade de água e o seu uso, alterações climáticas, depleção dos recursos, entre outros. Contudo, a importância dada a estas questões ambientais pode-se alterar ao longo do tempo (aumentar ou diminuir) consoante as preocupações e prioridades dadas pela sociedade e consequentemente consoante o próprio local.
3.1 NORMALIZAÇÃO
O CEN/TC 350 de Sustentabilidade das obras de construção é uma comissão técnica europeia que desenvolve normas no domínio da sustentabilidade dos trabalhos de construção, sob a coordenação do CEN (Comité Europeu de Normalização). Estas normas permitem a avaliação do desempenho integrado dos edifícios ao longo do seu ciclo de vida, possibilitando uma análise do desempenho ambiental, social, do custo de vida dos edifícios, para além dos aspetos quantificáveis do desempenho na saúde e conforto dos edifícios (Fonseca & Almeida, 2020). Algumas normas no âmbito do desempenho ambiental das obras de construção incluem: • EN 15804:2012+A2:2019: Declarações ambientais dos produtos – Regras de base para categorias de produtos de construção • EN 15643-1: Avaliação da sustentabilidade dos edifícios.
Parte 1: Enquadramento geral • EN 15643-2: Avaliação da sustentabilidade dos edifícios.
Parte 2: Enquadramento para a avaliação do desempenho ambiental • EN 15978: Avaliação do desempenho ambiental dos edifícios. Método de cálculo • EN 15942:2011: Declarações ambientais de produto. Formato de comunicação empresa-empresa • CEN/TR 15941: Declarações ambientais de produto. Metodologia para a seleção e uso de dados genéricos • CEN/TR 17005:2016: Categorias e indicadores adicionais de impacto ambiental – informações e possibilidades – avaliação da possibilidade de adicionar categorias de impacto ambiental e indicadores relacionados e métodos de cálculo para a avaliação do desempenho ambiental dos edifícios
3.2 LADRILHOS CERÂMICOS – ISO17889
A norma ISO 17889 define os requisitos para ladrilhos cerâmicos sustentáveis de acordo com critérios ambientais, económicos e sociais e permite aos utilizadores selecionar produtos que mais contribuem para a sustentabilidade nos edifícios, apoiando assim os sistemas de certificação. Inclui critérios relevantes em todo o ciclo de vida do produto, desde a matéria-prima até à gestão do fabrico, utilização e fim de vida. Os critérios ambientais considerados incluem matérias-primas, fabrico, distribuição e instalação, utilização e rotulagem ambiental do produto. Já os critérios económicos e funcionais incluem a qualidade do produto, o nível de desempenho e a aptidão para o uso. Finalmente, os critérios sociais referem-se à saúde e segurança no fabrico, a saúde e segurança durante a instalação e a saúde e segurança durante o uso. A norma ISO 17889-1 menciona vários sistemas de gestão da sustentabilidade para monitorizar, controlar, avaliar e melhorar o desempenho dos ladrilhos cerâmicos no que diz respeito à saúde e segurança e desempenho ambiental.
REFERÊNCIAS
Almeida, M., Santos, M.I.V., Frade, P., Francisco, V. (2012). Estudo de Mercado e Inovação sobre Materiais para Construção Sustentável. Centro Habitat. Disponível em http://www.centrohabitat.net/sites/default/files/projetos-pdf/estudo_mercado_inovacao_sobre_mater iais.pdf Bragança, L., Mateus, R. (2006). Sustentabilidade de soluções construtivas. Congresso sobre Construção Sustentável, 2, Porto, Portugal. Fonseca, C. e Almeida, M. (maio/junho 2020). “NORMALIZAÇÃO no setor da Cerâmica e do Vidro: CEN/TC 350 Sustainability of Construction Works”. Revista TÉCNICA. Nº 3, pág. 37 a 41 Pinheiro, M. D. (2006) Ambiente e Construção Sustentável. Instituto do Ambiente, 1ª Edição. Pires, A. (2017). Modelos de Certificação da Sustentabilidade dos Edifícios: Análise comparativa dos processos de certificação. Tese de Mestrado em Engenharia Civil. Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa. Soares, L. (2021). A inovação com base na Sustentabilidade dos Edifícios e dos Materiais Cerâmicos: Novas formas de Certificação e Valorização do Produto. 4ª Edição das Jornadas Técnicas da Cerâmica, Aveiro, Portugal.