Proteja-medo que eu quero:uma abordagem triangular

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Proteja-me do que eu quero: uma abordagem triangular

ARTIGO nº 1 | 2013 www.apublicada.com

Mirna Marinho Cursando o Oitavo período em Artes Visuais Licenciatura na Universidade Federal de Goiás em Goiânia. E-mail: mirnamarinho123@hotmail.com

Mariana Magri Rodrigues

Mariana Magri Rodrigues cursando o Sétimo período em Artes Visuais Licenciatura na Universidade Federal de Goiás em Goiânia. Formada em Fotografia Básica e Profissionalizante na Canopus Escola de Fotografia em Goiânia. E-mail: marianinha.magri@gmail.com

Resumo

Este trabalho propõe uma reflexão narrativa visual com referenciais na abordagem triangular fundamentada metodologicamente por Ana Mae Barbosa. A obra analisada nesta narrativa de pesquisa será uma proposta contemporânea da artista plástica Jenny Holzer. As tramas sensitivas, perceptivas e dialógicas serão tragas a partir de uma contextualização interpessoal e de relações de vida com a imagem. Uma questão também cultural. Onde se construirá uma formação de sentido pessoal e que ao mesmo tempo tem ligações sócio-culturais.

Palavras-chave

Abordagem triangular, arte contemporânea, arte nas ruas, tempo, percurso.


Figura. 01 PROTEJA-ME DO QUE EU QUERO 1999 Detalhe, instalação Jenny Holzer

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Introdução “A bagagem mais leve, é a velha lição que não se aprende, mas que nos acompanha em toda a parte quando a compreendemos”... (MACÉ,Gérard, Ano.2004, p.8) A obra de arte proposta como material de análise corresponde a artista plástica americana Jenny Holzer. Atuante e representante de uma contextualização ampla e que valoriza a divulgação da arte contemporânea, Jenny possui uma característica muito marcante de produção nas ruas das cidades. Uma arte em movimento, uma arte que gera movimentos e que se torna viva no movimentar das pessoas que passam por ela despercebidas em seus cotidianos. E acabam por conviverem com a obra, muitas vezes sem nem perceberem. Seus trabalhos têm um cunho muito APUBLI[CADA] ∙ ARTIGO ∙ Nº 1 ∙ 2013

dialético com a propaganda e com a tipografia que são grandes representantes do discurso e do diálogo humano. São atuantes nos espaços públicos e em produções da arte conceitual. Jenny, nestes projetos visuais trabalha com mensagens que despertam incômodos e reflexões diante de contextualizações comuns da divulgação midiática e da propaganda, como por exemplo, banners e cartazes.

Uma arte deste cunho é vívida em seu tempo. Uma vez que vivenciamos uma situação pública e social direcionada á produções de consumo e a desejos de produtos, a propaganda e os destaques visuais coletivos nas grandes cidades fazem parte da corriqueira vida moderna. Tempos modernos de Chapplin, são mais modernos ainda pela mídia. E uma manifestação artística que dialogue com os percursos naturais do domínio imagético e do caminho superficial da produção de


desejos humanos está totalmente inserida na realidade por nós vivida. O magnetismo de estímulo da reflexão, diante de uma mensagem traga por ambientes e situações que já são padrões, pode ser um despertar para produção de sentido pessoal e análise de escolhas.

Com seu foco principal no uso das palavras e ideias em quase todas as obras, deflagraremos a perspectiva analítica visual da obra acima.

“Arte-Educação é epistemologia da Arte.” (RIZZI, Maria Chistina de Suza, Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte, cap.5) Diante da necessidade de se pesquisar a arte e principalmente o ensino das artes em uma abordagem mais abrangente e que conduza valor a diversidade e a dialética, utilizamos da abordagem triangular proposta por Ana Mae Barbosa. Os paradigmas desses estudos da arte acabam por se traduzirem em referências de um pensamento reflexivo e que permitam espaço para pesquisa das relações ambientais, filosóficas e históricoculturais formativas do indivíduo. A contextualização e integração com outros conteúdos e com as experiências de vida se tornam performances de análises aceitas e valorizadas como pesquisa e metodologia. A arte-educação passa a fazer parte de processos analíticos e de ciências direcionadas a campos diversos de interrelações no que tange o indivíduo e sua capacidade de produção e construção de conhecimento.

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Este procedimento acaba pela cognição de como nos relacionamos com as obras de arte, tanto de nosso tempo como do tempo que “não mais é nosso”. E esse processo de leitura e de interpretação será feito na obra pela abrangência de um critério de desenvolvimento sequencial de determinadas observâncias. Lembrando sempre que o corpo ideológico e a natureza de produção de conhecimento de cada indivíduo são diferentes por si só. E que uma análise visual de obra de arte, não está fixa no domínio imagético do observador, nem na estética em sim, (pós-modernismo). Ela percorre caminhos do inconsciente, da APUBLI[CADA] ∙ ARTIGO ∙ Nº 1 ∙ 2013

memória e da trajetória de vida. Logo, nosso olhar da maneira como fora operado á esta combinação de valores que levantará uma interpretação do conteúdo, não é estágio final de verdade. É por si, uma construção formativa de ideias e de relacionamento que sistematizou um conteúdo diante do que foi visto. Ele é real, e no tempo que outros olhares direcionam outras ideias fundamentadas e pesquisadas, várias realidades se produzem, se interagem e se disciplinam. E a Arte passa a fazer mais sentido no mundo dos homens que fundamentam seu movimento “do ver” na pesquisação e na reflexão. “...o objeto de interpretação é a obra e não o artista...” (MAE, Ana)

Ler a obra de Arte, fazer Arte e Contextualizar A partir da leitura visual da obra proposta acima, vemos uma construção de elementos sobrepostos na tradicional trazeira de um caminhão. As cores se manifestam em um fundo predominantemente preto do centro para baixo e predominantemente vermelho do centro para cima. Cores muito fortes. O vermelho se contrasta com o branco em forma de linhas e da escrita. Situação que chama muito atenção pela intensidade. Há abaixo uma faixa amarela com preto o que representa claramente uma sinalização de trânsito. Ênfase que se dá a cores presentes nos sinais e recursos visuais do trânsito. Colocam a situação proposta ligada a uma contextualização de percurso e caminho. De estar se percorrendo uma “estrada” e passando por lugares. Palavras que constroem a imagem como, “mantenha, rali e distância”, nos colocam em uma situação real e muito comum com as visualidades tradicionais dos caminhões que trafegam pelo nosso país. E abaixo de toda essa contextualização visual percebemos a intervenção mais prioritária a temática pretendida pela artista.

“Proteja-me do que eu quero”


A obra passa a representar-se como um texto em uma imagem, é uma frase em um pára-choque de um caminhão de carga que quando lemos a visualidade é composta por um todo formando uma imagem. Ela se reverbera em mais uma transitoriedade de caminhos uma vez que há o caminho de percurso: São Paulo/Rio de Janeiro. O que nos daria a interpretação de que sua mensagem não se fundamentou em uma unidade fixa. Ela influiu por uma estrada direcionada entre duas cidades brasileiras, tendo a propriedade de expansão entre espaços urbanos com códigos de culturas locais. Logo, interpretações locais e pessoais. A arte nas ruas isola uma “alma” cognitiva de abrangência de visualidades vizinhas da imagem. Quando qualquer trabalho é levado ao meio aberto das cidades, ele também é entregue á uma competitividade de disputas do olhar, o que faz com que muitas vezes, a obra nem seja percebida como obra e sim como parte daquele contexto cotidiano. Ai se fundamenta a grande importância da “arte fazer parte”, se comunicar no dia a dia, ter responsabilidade de interação com questões que nos são habituais e corriqueiras. As visualidades são muitas e nossa seleção do olhar e do que se ver, se torna confusa na responsabilidade excessiva do ver. Mas, e qual a potencialidade de estar fiel em uma viajem ao pedido de “proteção diante do que eu quero”?

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É bem comum vermos no pára-choque e até mesmo em outros lugares dos caminhões frases de pedido de proteção, frases de uma cultura cristã e também, linguagens que representem algo de importante para aquele viajante. Essa cultura se forma uma vez que esses trabalhadores passam muito tempo longe de suas casas, e que existem perigos em se trabalhar percorrendo estradas. Pedir proteção é uma ação cultural, dentro de um fundamento social de fé e princípios de tradições familiares. A frase logo é colocada dialogando metaforicamente com essa ação que já existe no meio ao qual a arte está sendo divulgada. O que faz com que a manifestação artística seja quase despercebida havendo este caminhão percorrendo as estradas São APUBLI[CADA] ∙ ARTIGO ∙ Nº 1 ∙ 2013

Paulo/Rio. Mas se caso fosse vista, a mensagem se desloca um pouco da cultura tradicional do pedido de proteção, por exemplo, percorrendo o caminho de uma indagação que causa certo desconforto, pela não habitualidade. Do que realmente devemos ser protegidos? De nós mesmos? Ou dos outros?

Nossas ações impensadas e nossos desejos nos oferecem um caminho de entranhas entre nosso emocional e nossa interpretação das coisas. Caminhos que não necessariamente são favoráveis para nós ou para os outros que estão ao nosso redor. Se cada um tivesse sua educação consciente nas escolhas de suas ações e na observância de seus desejos, talvez a fé do motorista de caminhão, não precisasse ser tão dependente do medo da estrada. Indica uma reflexão da própria artista perante o medo do que queremos. Da inquietação de vontade pessoais que tomam nossas decisões e direcionam processos de vivências em nossas vidas. A mensagem é um incômodo á um pensamento um pouco mais reflexivo perante nossos próprios pensamentos. Proteja-me do que eu quero, direciona-nos a pensar a respeito de nossas escolhas pessoais e ao direcionamento que elas podem vir a tomar.

A forma de divulgação da obra é magnífica e o meio de teorização também. A arte conceitual e contemporânea nos dá essa “liberdade” de diálogo com toda a contextualização externa e de caminhar ao lado da diversidade de possibilidades visuais. Ela existe no meio, onde existe todo o resto das visualidades e das comunicações. Alguns percebem sem ver, outros, veem sem perceber.


Bibliografia BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte. São Paulo, 2008.

SONTAG, Susan. Sobre Fotografia: Tradução Rubens Figueiredo. 1ª Edição, São Paulo: Companhia das Letras, 2004. ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna: Tradução Denise Bottmann e Frederico Carotti. 2ª Edição, São Paulo: Companhia das Letras, 1992. Site: http://www.jennyholzer.com/

Site: http://en.wikipedia.org/wiki/Jenny_Holzer

Site: http://www.magnetoscopio.com.br/jenny_holzer.htm

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