EDIÇÃO
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ISSN 2525-3379
2019
AQUACULTURE
BRASIL
InovAÇÕES PREMIADAS: Artigo: Aquicultura, Biotecnologia e a Economia Circular
Coluna: Biofloco em caixa d’água: triste ilusão
Evento “Prêmio Inovação Aquícola 2019” destaca as novas ideias que trazem melhorias em diversas áreas do setor Entrevista: Fabiano Müller Silva - Cedap/ Epagri
Eles fazem a diferença: Wagner Camis
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MAR/ABR 2018
aquaculturebrasil.com
REVISTA
JANEIRO/FEVEREIRO
AQUACULTURE BRASIL
O MAIOR PORTAL DA AQUICULTURA BRASILEIRA! EDITOR-CHEFE: Giovanni Lemos de Mello redacao@aquaculturebrasil.com DIRETORES ASSISTENTES: Alex Augusto Gonçalves Artur Nishioka Rombenso Maurício Gustavo Coelho Emerenciano Roberto Bianchini Derner Rodolfo Luís Petersen DIREÇÃO DE ARTE: Syllas Mariz Jéssica Brol COLABORADORES DESTA EDIÇÃO: Adolfo Jatobá, Alex Augusto Gonçalves, Antonio Glaydson Lima Moreira, Artur de Lima Preto, Carlize Lopes, Delano Dias Schleder, Eduardo da Silva, Erica Lorenna Batista da Silva, Fabiano Müller Silva, Fabrício Flores Nunes, Fernanda Guimarães de Carvalho, Gabriel Deschamps, Giovani Sampaio Gonçalves, Giovanni Lemos de Mello, Jaqueline Inês Alves de Andrade, José Edvaldo da Silva, Luis Alberto Romano, Renato Teixeira Moreira, Robilson Antonio Weber, Suélen Serafini, Tiago Oliveira, Virgínia Fonseca Pedrosa e Wagner Camis. Os artigos assinados e imagens são de responsabilidade dos autores. COLUNISTAS: Alex Augusto Gonçalves André Camargo Artur Nishioka Rombenso Eduardo Gomes Sanches Fábio Rosa Sussel Giovanni Lemos de Mello Marcelo Roberto Shei Maurício Gustavo Coelho Emerenciano Ricardo Vieira Rodrigues Roberto Bianchini Derner Rodolfo Luís Petersen Santiago Benites de Pádua As colunas assinadas e imagens são de responsabilidade dos autores.
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2019 iniciou e junto com o Ano Novo, os primeiros dias do Governo de Jair Messias Bolsonaro. Tenho dito a todos, independente de você ter votado ou não no “Capitão”, agora é torcer para que o trabalho de sua equipe seja o melhor para o nosso País. Falando em melhorias, o Presidente em suas lives no Facebook já anunciou algumas vezes que fez apenas uma indicação para o seu Governo: justamente para o nosso setor! Trata-se do Secretário de Aquicultura e Pesca do MAPA, Jorge Seif Júnior. Imagine a responsabilidade depositada nas mãos de Seif. Por duas ou três vezes, nosso Secretário já participou das lives de Bolsonaro pelo Facebook, ao lado de ministros de pastas tradicionalmente mais importantes. É a comprovação da atenção que o Presidente está prestando para a aquicultura e pesca brasileira. Independentemente de não termos uma estrutura de Ministério como antes, o nosso Secretário nas primeiras semanas de governo tem trabalhado duramente pelo segmento. Quem acompanha de perto o dia-a-dia de Bolsonaro, e que não é da área, por vezes até se pergunta “o que é essa tal de piscicultura que o Presidente fala tanto?”. Excelente para o nosso setor. Mas como apenas falar sobre o tema não resolve para nós, é preciso ter alguém para tocar o barco a diante. O Secretário escolhido pelo Presidente, pelo menos para mim em um primeiro momento, parecia que daria muito mais atenção à pesca industrial do que à aquicultura, natural para um empresário do setor pesqueiro. Ledo engano. Uma grata surpresa ao ver o quanto a aquicultura brasileira está recebendo atenção de Jorge Seif Júnior. Acompanhei todos os outros ministros e secretários que já tivemos nesta pasta. Uma coisa é certa, nem um outro se envolveu de verdade com a produção de organismos aquáticos como ele até aqui. Um domingo desses, lá estava Jorge Seif Jr. literalmente em cima de um tanque-rede marinho, em Ilha Grande (RJ), conhecendo a dura realidade da piscicultura marinha brasileira. Em um vídeo divulgado em seu Instagram (@jorgeseifjunior), ele assumiu o compromisso com o proprietário do empreendimento (o grande Kazuo), de resolver o problema da cessão de Águas Públicas e da insegurança jurídica que cerca os piscicultores marinhos brasileiros. Em tempos de Prêmio Inovação Aquícola, quem sabe em breve Jorge Seif Júnior seja merecidamente agraciado pelas suas conquistas em prol da desburocratização da aquicultura nacional. Como ele mesmo já falou: “Menos Brasília e mais Brasil”. Eu só complemento, “Menos peixe importado, e mais peixe cultivado no Brasil”. Precisamos acordar o gigante aquícola adormecido. Estou confiante no Seif! 2019 será o ano da aquicultura brasileira!!! Ótima leitura a todos. Giovanni Lemos de Mello, Editor-chefe.
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SUMÁRIO AQUACULTURE BRASIL - edição 16 jan/fez 2019
08 FOTO DO LEITOR 10 REMOÇÃO DE FÓSFORO REATIVO DE EFLUENTE AQUÍCOLA POR MACRÓFITAS AQUÁTICAS »» p.10
16 USO DE ÓLEOS ESSENCIAIS COMO ALTERNATIVA PARA ANESTÉSICOS SINTÉTICOS NA AQUICULTURA 22 A IMUNOHISTOQUÍMICA COMO FERRAMENTA DIAGNÓSTICA DE ENFERMIDADE NOS PEIXES 28 PRÊMIO INOVAÇÃO AQUÍCOLA: CONHEÇA OS CASES PARTICIPANTES DA PRIMEIRA EDIÇÃO 32 PAQ-GRO NA ALIMENTAÇÃO DA TILÁPIA-DO-NILO ( OREOCHROMIS NILOTICUS )
»» p.16
36 AQUICULTURA, BIOTECNOLOGIA E A ECONOMIA CIRCULAR: COMO NOVOS CONCEITOS PODEM AJUDAR NA REESTRUTURAÇÃO DAS CADEIAS PRODUTIVAS AQUÍCOLAS? 42 PESCADO SALGADO OU LEVEMENTE SALGADO: UMA PREOCUPAÇÃO NUTRICIONAL? 50 ARTIGOS PARA CURTIR E COMPARTILHAR 51 CHARGES
»» p.22
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»» p.70 »» p.72
52 BIOTECNOLOGIA DE ALGAS 54 EMPREENDEDORISMO AQUÍCOLA 55 NUTRIÇÃO AQUÍCOLA 56 GENÉTICA »» p.28
58 GREEN TECHNOLOGIES 60 SANIDADE 61 PISCICULTURA MARINHA 62 VISÃO AQUÍCOLA 63 RECIRCULATING AQUACULTURE SYSTEMS 64 ATUALIDADES E TENDÊNCIAS NA AQUICULTURA
»» p.32
»» p.36
66 AQUICULTURA DE PRECISÃO 68 TECNOLOGIA DO PESCADO 70 DEFENDEU 72 ENTREVISTA - FABIANO MÜLLER SILVA 79 ELES FAZEM A DIFERENÇA 82 DESPESCOU
»» p.79
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Carpa ornamental - Piscicultura Pomar do Carmo (Mirim, SP) Carlos Conte
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Litopenaeus vannamei (Jaguaribe, CE) Jessyca Alexandre
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Cultivo das microalgas Nannochloropsis oculata, Chlorella vulgaris e Chaetoceros muelleri (Fortaleza, CE) Giancarlo Lavor
Produção de tambacu, pacu e surubim (Granja Del Campo, Paraguai) Rubens Adriano
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Despesca de camarão (Laguna, SC) Clemilson de Andrade Francisco
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Envie suas fotos mostrando a aquicultura no seu dia a dia e participe desta seção.
redacao@aquaculturebrasil.com 9
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© Renato Teixeira Moreira
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Remoção de fósforo reativo de efluente aquícola por macrófitas aquáticas
A
aquicultura visa a produção de organismos aquáticos, de forma que deve contemplar, além do lucro, a preservação ambiental e o desenvolvimento social. Assim como toda atividade produtiva, acarreta impactos ambientais, especialmente pelos efluentes gerados (Valenti, 2000). Portanto, é necessário considerar mecanismos viáveis para minimizar esses impactos, planejando adequadamente a utilização dos recursos naturais e elaborando estratégias eficientes de desenvolvimento sustentável (Assad; Bursztyn, 2000; Henry-Silva, 2005).
Prof. Antonio Glaydson Lima Moreira Prof. Renato Teixeira Moreira*
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará - IFCE Campus Morada Nova Morada Nova, CE *renato.teixeira@ifce.edu.br
O fósforo reativo está relacionado à questão da produtividade primária como sendo um fator limitante para o desenvolvimento vegetal. Pode causar impacto quando descartado em ecossistemas receptores por facilitar a eutrofização e consequentemente aumentar o consumo de oxigênio dissolvido. A resolução CONAMA N° 357/2005 estabelece o limite máximo de 0,03 mg L-1 de fósforo reativo para ambientes lênticos e 0,05 mg L-1 para ambientes intermediários, com tempo de residência de água de 2 – 40 dias (Brasil, 2005). JAN/FEV 2019
Ana Kainara de Oliveira Souza Francisco Wellington Oliveira Martins Gabriel Câmara Paulino João Breno Maia de Lima José Edvaldo da Silva
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As macrófitas aquáticas apresentam grande potencial na descontaminação de ambientes poluídos. Como o efluente da aquicultura é rico em fósforo, portanto não sendo um dos fatores limitantes ao seu crescimento, e estas ainda podem ser utilizadas como alimento para peixes herbívoros. A escolha da macrófita é um fator determinante para se alcançar os níveis de fósforo desejados. Quanto maior a produtividade da planta, maior a sua capacidade de remover poluentes das águas residuárias.
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Quanto maior a produtividade da planta, maior a sua capacidade de remover poluentes das águas residuárias.
A Ludwigia helminthorrhiza (Figura 1 a), uma macrófita pertencente à família Onagraceae, é comumente encontrada em rios, lagos, águas calmas e efluentes de algumas atividades. Ocorre em regiões de clima tropical, principalmente na América Latina e em biomas como Amazônia, Caatinga e Pantanal. Normalmente é encontrada fixa com caules flutuantes ou flutuante livre emersa (Demarchi et al., 2018). Caracterizada como macrófita aquática flutuante (Esteves, 1988), a Lemna sp. (Figura 1 b) é popularmente conhecida como “lentilha d’água”, “erva-de-pato” ou somente “lemna”. Tem sido estudada para várias finalidades, como sua capacidade para acumular metais pesados da água (Pio et al., 2013). A Azolla sp. (Figura 1 c), é uma Pteridófita aquática de pequeno porte, apresenta-se como um recurso verde de grande potencial para campos inundados. A planta tem ampla distribuição geográfica e se desenvolve bem em ambientes poluídos, quando comparado com outras espécies vegetais (Singh, 1995). O presente trabalho teve como objetivo avaliar o desempenho das macrófitas Ludwigia helminthorrhiza, Lemna sp. e Azolla sp., na remoção do fósforo reativo de efluente de aquicultura.
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Figura 1. Macrófitas aquáticas: a) Ludwigia helminthorrhiza; b)Lemna sp.; c) Azolla sp. © Renato Teixeira A.
B.
C.
O experimento foi realizado na UDPA (Unidade Didática de Pesquisa em Aquicultura) e no laboratório de química e qualidade de água do IFCE, campus Morada Nova, entre o período de 24 a 30 de outubro de 2018, totalizando seis dias de experimento. Foram realizados, em um delineamento inteiramente casualizado, quatro tratamentos com três repetições. Excetuando o tratamento 1 (Controle: C1, C2 e C3), cada tratamento recebeu uma macrófita diferente, sendo dispostos da seguinte maneira: tratamento 2 (Azolla sp.: A1, A2 e A3), tratamento 3 (Ludwigia helminthorrhiza: Lu1, Lu2 e Lu3) e o tratamento 4 (Lemna sp.: Le1, Le2 e Le3). Foram transferidos 50 L de efluente aquícola, advindo do cultivo de tambaqui em tanque escavado para caixas d’água de polietileno de 150 L. As plantas foram distribuídas uniformemente, preenchendo todo o espelho d’agua resultando nas seguintes massas úmidas, 250 g de Lemna sp., 425 g de Ludwigia helminthorrhiza e 300 g de Azolla sp., em cada repetição. Diariamente, às 10h30min, foram determinadas as concentrações de fósforo reativo usando a metodologia descrita por Apha (1992). Foi realizado o teste de correlação linear entre os valores medidos de transmitância e concentração de fósforo (mg. L-1). Também foram mensurados os seguintes parâmetros: oxigênio dissolvido, saturação, pH e temperatura. Para a análise da concentração de fósforo na água entre o controle e os três tratamentos, além do teste de correlação de Pearson, foi utilizado o software Bioestat 5.3. Os dados da concentração de fósforo foram submetidos à Análise de Variância (ANOVA), quando o valor de F indicou diferença significativa (p<0,05), as médias foram comparadas pelo teste de Tukey. Os resultados estão apresentados como médias ± desvio padrão em todas as análises. Os parâmetros de qualidade de água como, oxigênio dissolvido, saturação do oxigênio, pH e temperatura, mantiveram-se estáveis durante todo o experimento. O ganho de biomassa ao final do 6º dia no tratamento 2 (Azolla sp.) foi de 104,33 g, no tratamento 3 (Ludwigia helminthorrhiza) foi de 122,3 g e no tratamento 4 (Lemna sp.) foi de 109,10 g. Os valores de fósforo reativo analisados no presente trabalho estão apresentados na Figura 4. Não houve diferença significativa na remoção de fósforo entre os tratamentos comparados ao controle até o dia 1, no entanto, no segundo dia do experimento os tratamentos Azolla sp. e Ludwigia helminthorrhiza diferiram significativamente nos níveis de fósforo reativo comparados ao grupo controle, com significância de 5%. A macrófita que apresentou melhor desempenho na remoção de fósforo reativo foi a Ludwigia helminthorrhiza, seguido
Figura 2. Vegetais em período de quarentena antes da análise experimental. © Renato Teixeira
Figura 3. Amostragens. © Renato Teixeira JAN/FEV 2019
Desenvolvimento
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Azolla sp. © Renato Teixeira
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pela Azolla sp. e, por fim, a Lemna sp. Das espécies utilizadas neste experimento, Ludwigia helminthorrhiza e Azolla sp reduziram as concentrações de fósforo reativo em 39,04% e 19,33%, respectivamente, ao final do sexto dia de experimento, enquanto houve um acréscimo no tratamento controle de 28,36% e de 7,75% no tratamento com a Lemna sp. Um dos fatores que pode ter contribuído para a Ludwigia helminthorrhiza ter apresentado melhor desempenho em relação as outras plantas é o maior comprimento de sua raiz. Em experimento semelhante, Henry-Silva; Camargo (2006) testaram a eficiência de macrófitas aquáticas flutuantes no tratamento de efluentes de um viveiro de criação de O. niloticus, e constataram que a E. crassipes e P. stratiotes foram mais eficientes na remoção de fósforo total (82,0 e 83,3%, respectivamente), que a Salvinia molesta (72,1% de fósforo total). Henry-Silva e Camargo (2008) observaram que as macrófitas aquáticas Eichhornia crassipes e Pistia stratiotes foram eficientes na remoção do fósforo dos efluentes de carcinicultura, e a E. crassipes apresentou um ganho de biomassa. Tanto a Eichhornia crassipes como a Pistia stratiotes possuem raízes longas quando comparadas com a Lemna sp. e a Azolla sp.
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Das espécies utilizadas neste experimento, L. helminthorrhiza e Azolla sp reduziram as concentrações de fósforo reativo em 39,04% e 19,33%, respectivamente, ao final do sexto dia de experimento.
Figura 4. Média e desvio padrão para as concentrações de fósforo reativo (mg.L-1).
0,35
Fósforo reativo (mg/L)
0,30 0,25 0,20 0,15 0,10 0,05 0,00
Dia 0
Dia 1
Dia 2
Dia 3
Dia 4
Dia 5
Dia 5
Período de experimento
Nas condições apresentadas pelo experimento, a macrófita que obteve melhor desempenho na remoção de fósforo reativo do efluente aquícola, foi a Ludwigia helminthorrhiza, seguida pela Azolla sp. e posteriormente a Lemna sp. São necessários mais estudos para determinar o tempo de exposição ideal do efluente a estas macrófitas, afim de se obter um melhor desempenho das mesmas na remoção do fósforo reativo, bem como, observar a eficiência em outros tipos de efluentes gerados pelas atividades aquícolas.
Lemna sp.
L. helminthorrhiza
Agradecimentos e apoio
O presente trabalho contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos
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Conclusão
Azolla sp.
L. helminthorrhiza. © Renato Teixeira
Controle
Š monicore
Uso de óleos essenciais como alternativa para anestésicos sintéticos na aquicultura Eduardo da Silva*, Gabriel Deschamps, Adolfo Jatobá, Delano Dias Schleder, Artur de Lima Preto, Fernanda Guimarães de Carvalho, Jaqueline Inês Alves de Andrade, Carlize Lopes e Robilson Antonio Weber
A
anestesia geral tem sido utilizada em humanos desde a década de 1840. Entretanto, apenas foi introduzida na piscicultura em 1930, quase um século depois (Hoskonen e Pirhonen, 2004), de modo a facilitar os manejos realizados, e desde então, o uso de anestésicos vem sendo preconizado numa escala cada vez maior na aquicultura. Anestesia pode ser definida como a perda geral ou parcial da sensibilidade a estímulos externos, ou seja, a perda da capacidade de resposta a esses estímulos por intermédio de agentes químicos ou físicos (Summerfelt et al., 1990), e é exatamente isso que se busca em um procedimento invasivo ou estressante. A ação de anestesiar pode ser executada de duas maneiras, por via injetável ou por meio da imersão dos peixes em uma solução anestésica, esta última mais difundida e
utilizada, onde o fármaco é absorvido pelas brânquias e transportado via corrente sanguínea até o sistema nervoso central (SNC), promovendo depressão dose-dependente e levando a um estado de anestesia induzida (Ross e Ross, 2008; Summerfelt et al., 1990). Vários produtos químicos sintéticos vêm sendo utilizados com função anestésica na aquicultura, sendo os mais comuns: MS222 (metanosulfonato de tricaína), benzocaína, quinaldina, metomidato, 2-fenoxietanol (Ross e Ross, 1999; Hoskonen e Pirhonen, 2004; Oliveira et al., 2009). Entretanto, alguns produtos podem oferecer riscos ao manipulador e meio ambiente, além de necessitar um período de carência ao consumo do peixe exposto (Summerfelt et al., 1990) e apresentar dificuldade em ser adquirido ou ainda, apresentar alto custo de aquisição (Roubach e Gomes, 2001).
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Laboratório de Aquicultura Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense - IFC, Campus Araquari Araquari, SC *eduardo.silva.pr.em@gmail.com
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Nos últimos anos, pesquisas para avaliar produtos alternativos foram intensificadas (Weber et al., 2009; Hajek, 2011; Silva et al., 2012; Zeppendfeld et al., 2014; Parodi et al., 2014; Boijink et al., 2016; Ribeiro et al., 2016; Barbas et al., 2017) com intuito de buscar uma anestesia (produto/técnica) adequada e que não possuísse inconvenientes. Alguns dos motivos mais relevantes que justifica-se estudar o uso de agentes anestésicos é o apelo relacionado ao bem-estar animal por parte do mercado consumidor, que cada vez mais exige um produto com selo de comprovação dessa natureza (Simões e Gomes, 2009), além das exigências das Comissões de Ética no Uso de Animais, que requerem gradativamente menos situações estressantes e dolorosas aos indivíduos utilizados em experimentos.
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Anestésicos alternativos
Seguindo a linha de produtos naturais, os extrativos vegetais tem papel fundamental no avanço das pesquisas, visto que alguns óleos essenciais (OE’s) já estão bem estabelecidos, como é o caso dos compostos eugenol e o mentol, provindos principalmente do óleo de cravo (Eugenia caryphollata) e da menta (Mentha sp.), respectivamente (Ross e Ross, 1999; Hoskonen e Pirhonen, 2004; Oliveira et al., 2009). Além destes, nos últimos anos a pesquisa tem apesentado outras opções de OE’s como a Lúcia-lima - Aloysia tryphila (Gressler et al., 2012; Teixeira et al., 2017), erva cidreira brasileira - Lippia alba (Cunha et al., 2010; Becker et al., 2012), melaleuca - Melaleuca alternifolia (Correia et al., 2018), alfavaca - Ocimum gratissimum (Silva et al., 2012), jambú - Spilanthes acmella (Barbas et al., 2016; 2017), apresentando resultados bastante satisfatórios, conforme vemos à seguir:
• Cravo da índia
O cravo-da-Índia (Eugenia caryphollata), como popularmente é conhecido, é uma árvore aromática nativa da Indonésia que pertence à família Myrtaceae (Frutuoso et al., 2013). O óleo de cravo é muito utilizado na aquicultura, teve sua atividade anestésica comprovada em diversas espécies como a Amphiprion clarkii, 50 µL L-1 (Correia et al., 2018); Arapaima gigas, 30 mg L-1 (Honczaryk e Inoue, 2009); Solea senegalensis, 30 mg L-1 (Weber et al., 2009); Astyanax altiparanae, 50 mg L-1 (Pereira-Da-Silva et al., 2009); Brycon hilarii, 100 mg L-1 (Fabiani et al., 2013); Centropomus parallelus, 37,5 mg L-1 (Souza et al., 2012); Oncorhynchus mykiss, 25 mg L-1 (Cotter e Rodnick, 2006); Oreochromis niloticus, 80 mg L-1 (Deriggi et al., 2006); Piaractus mesopotamicus, 50 mg L-1 (Gonçalves et al., 2008); Rhamdia quelen, 20 mg L-1 (Cunha e Rosa, 2006). Sabe-se que o Eugenol (principal componente), deprime o SNC, atuando como anestésico e analgésico (Correia et al., 2018).
• Menta
A menta (Mentha sp.) pertence à família Lamiaceae e suas espécies são popularmente conhecidas como menta e hortelã. O óleo essencial de menta também já é uma realidade na anestesia em peixes, visto que há um número considerável de pesquisas comprovando sua eficácia anestésica em diversas espécies: Centropomus parallelus, 150 mg L-1 (Souza et al., 2012), Oreochromis niloticus, 250 mg L-1 (Simões e Gomes, 2009), Piaractus mesopotamicus, 100 mg L-1 (Gonçalves et al., 2008), Salminus brasiliensis 60 mg L-1 (Pádua et al., 2010). Seus componentes ativos, com propriedades anestésicas, são o mentol e o cineol (de Oliveira Hashimoto et al., 2016). Entretanto, para Simões e Gomes (2009) o mentol não deve ser considerado o anestésico de escolha para Oreochromis niloticus por causar uma hiperglicemia, configurando estresse.
• Gênero Aloysia
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É comumente encontrado na América do Sul, Norte e Europa. Pertence à família Verbenaceae e as espécies mais utilizadas para aplicação na aquicultura como anestésicos são a A. triphylla, A. gratissima e A. polystachya (Hoseini et al., 2018). Vários estudos comprovaram o efeito anestésico da Aloysia spp. em várias espécies de peixes: O. niloticus, 80 μL L-1 (A. triphylla; Teixeira et al., 2017); R. quelen, 135 mg L-1 (A. triphylla; Gressler et al., 2012); R. quelen, 100 μL L-1 (A. triphylla; Parodi et al., 2014); P. orbignyanus, 270 mg L-1 (A. gratissima; Benovit et al., 2012); R. quelen, 300 mg L-1 (A. gratissima; Benovit et al., 2015); E. marginatus, 100 μL L-1 (A. polystachya; Fogliarini et al., 2017).
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• Lippia
A Lippia alba é uma planta originária da América do Sul e Central. Tem em seu óleo essencial como principais componentes o linalool, citral e cineole (Toni et al., 2014). Foi utilizada com êxito como anestésico em Argyrosomus regius (Cárdenas et al., 2016), Hippocampus reidi (Cunha et al., 2011), R. quelen (Cunha et al., 2010) e R. quelen (Toni et al., 2014), respectivamente nas doses de 54 mg L-1, 50 μL L-1, 100 μL L-1 e 150 μL L-1. Em doses baixas, a Lippia alba suprime a perda iônica e o estresse oxidativo, embora provavelmente interfira na excreção de amônia, aumente o gasto de energia e diminua a atividade da acetilcolinesterase no cérebro (Azambuja et al., 2011; Becker et al., 2012; Salbego et al., 2017). Entretanto, em doses altas induz ao estresse fisiológico e oxidativo (Salbego et al., 2014; Toni et al., 2014).
• Melaleuca alternifolia
Pertencente à família Myrtaceae, a Melaleuca alternifolia se mostra um bom anestésico para uso em peixes (Hajek, 2011; Correia et al., 2018). Arbórea nativa da Austrália, conhecida por “tea tree” (árvore de chá) é muito utilizada na medicina popular, além de propriedades anestésicas e analgésicas possui características antifúngicas, antibióticas e anti-inflamatórias. Tem como principais componentes o terpinen-4-ol e γ-terpineno (Carson e Riley, 2001; Carson et al., 2006). Foi comprovada sua atividade anestésica em Amphiprion clarkia (Correia et al., 2018); Cyprinus carpio L (Hajek, 2011); Rhamdia quelen (Souza et al., 2018) nas doses de 500 µl L-1, 0,4 mL L-1 e 1000 μL L−1, respectivamente.
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• Gênero Ocimum
O Ocimum é uma planta aromática originária da Ásia e África, utilizada na culinária e no tratamento da ansiedade, tosse e êmese (Lorenzi & Matos, 2002), pertence à família Laminaceae, os OE’s do gênero Ocimum proporcionam anestesia local e possuem atividade depressora do SNC (Pandey et al., 2014), tem como componentes predominantes o eugenol e 1,8-cineole (Barbosa et al., 2007; Boijink et al., 2016; Ribeiro et al., 2016). O Ocimum americanum suprime o aumento nos níveis de cortisol (Hoseini et al., 2018) quando utilizado como anestésico, porém os níveis de glicose foram encontrados mais elevados (Silva et al., 2015). O O. americanum já foi utilizado com êxito em R. quelen com dose de 200 mg L-1 (Silva et al., 2015). O grande protagonista do gênero Ocimum, ainda é o O. gratissimum. Foi utilizado em B. cephalus (Ribeiro et al., 2016), C. macropomum (Boijink et al., 2016), P. orbignyanus (Benovit et al., 2012) e R. quelen (de Lima Silva
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et al., 2012) nas doses de 20, 50, 50 e 30 μL L-1, respectivamente. Entretanto, de Lima Silva et al., (2012) observou aumento do volume corpuscular médio (VCM) e hemoglobina corpuscular média (HCM), além de hiperamonemia e hiperglicemia. Acredita-se que o mecanismo ao qual o OE faz uso para causar anestesia são os receptores GABA α-benzodiazepínicos (de Lima Silva et al., 2012).
• Spilanthes acmella
A Spilanthes acmella pertence à família Asteraceae e é comumente encontrado na América, África e Ásia. A variedade oleracea é conhecida popularmente como Jambú e é uma erva típica da região norte do Brasil. Acredita-se que o composto com potencial anestésico contido na planta seja o spilantol (Nomura et al., 2013). Com 20 mg L−1 é capaz de induzir à anestesia no Colossoma macropomum (Barbas et al., 2016). Segundo Barbas et al. (2016), durante a recuperação causa algumas alterações fisiológicas leves no sangue.
Figura 1. Uso de anestésico em peixes: a) Peixe ainda consciente; b) e c) Peixe sedado apresentando perda de equilíbrio. © Eduardo da Silva
C.
B.
Conclusão
É possível concluir que atualmente os óleos essenciais já são uma realidade implantada no universo dos anestésicos disponíveis para uso na aquicultura, e muitas são as alternativas com eficácia anestésica já comprovadas e seguras. Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos
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A imunohistoquímica como ferramenta diagnóstica de enfermidade nos peixes Luis Alberto Romano* Virgínia Fonseca Pedrosa
C
omo resultado do crescimento da aquicultura semi-intensiva e intensiva, os problemas derivados de enfermidades, naturais ou originárias de cultivo, têm se tornado um dos maiores limitantes ao desenvolvimento sustentável da criação de organismos aquáticos. Nos últimos anos tem havido diversas iniciativas no campo da patologia dos organismos aquáticos, entretanto, o conhecimento destas enfermidades e o tratamento para combatê-las se encontram em níveis muito diferentes em cada País, bem como o desenvolvimento de ferramentas aplicadas ao seu controle. De forma geral, as técnicas empregadas na patologia de organismos
Imunohistoquímica é um ramo da histologia que tem como objetivo a detecção de antígenos em cortes de tecidos processados, através de técnicas de rotina, sendo de grande utilidade como método diagnóstico.
aquáticos têm herdado grande parte do conhecimento e da tecnologia usada na medicina humana e veterinária. Neste contexto, a imunohistoquímica é um ramo da histologia que tem como objetivo a detecção de antígenos em cortes de tecidos processados, através de técnicas de rotina, sendo de grande utilidade como método diagnóstico. As técnicas imunohistoquímicas são eficazes como ferramentas para o reconhecimento e posterior caracterização de anticorpos monoclonais (AcMc). Por meio destas técnicas pode-se visualizar uma reação antígeno/anticorpo específica em uma célula e/ou um tecido, tanto com microscopia óptica como eletrônica.
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Laboratório de Imunologia e Patologia de Organismos Aquáticos Instituto de Oceanografia Universidade Federal do Rio Grande – FURG Rio Grande, RS *dcluis@yahoo.com
A técnica se baseia em aplicar sob o tecido ou amostra em estudo, o anticorpo contra o antígeno que se deseja detectar. Posteriormente, este anticorpo específico é utilizado como antígeno e marcado com um segundo anticorpo inespecífico, o qual será ligado a um sistema molecular que pode ser detectado por uma técnica de coloração. Neste momento, o exame microscópico do corte histológico nos permite determinar a presença ou ausência do antígeno que buscamos e, em caso positivo, podemos ver em que lugar exato do tecido ou de células ele se encontra alojado.
A atividade enzimática depende de algumas variáveis, como a concentração de enzima e substrato, pH, concentração de sais, temperatura e luz. Muitas enzimas possuem porções terminais não proteicas denominadas grupos prostéticos, exemplo destes podemos citar o grupo Fe-protoporfirina da peroxidase e CO2 transferase da biotina. Por fim, cabe mencionar também que muitas enzimas exigem a presença de metais ou certos íons para atuar (Mg e Zn).
Histórico da imunohistoquímica
As aplicações da imunohistoquímica são incontáveis. Qualquer antígeno é demonstrável sempre que se dispõe do anticorpo correspondente, e hoje em dia existe uma lista enorme de anticorpos. Os protocolos de investigação incluem a busca de substâncias das mais variadas e incalculáveis. Dessa forma, pode-se fazer uma breve lista com as aplicações mais frequentes na patologia de peixes.
© Leandro Santos | Projeto Coral Vivo
A técnica de imunohistoquímica surgiu pela primeira vez em um diagnóstico histopatológico por volta dos anos 70, e logo sofreu uma enorme expansão a partir da descoberta e aplicação dos anticorpos monoclonais, os quais agregaram precisão e especificidade à metodologia, sendo sintetizados centenas de anticorpos desde então, muitos dos quais possuem grande utilidade no diagnóstico das enfermidades de organismos aquáticos. Os AcMc são obtidos a partir da produção de hibridomas, cujas células sintetizam um tipo especial e invariável de AcMc. Embora seja possível utilizar anticorpos policlonais, os AcMc fornecem um diagnóstico de maior especificidade. A razão desta especificidade é que o AcMc reconhece somente um epítopo (determinante antigênico) semelhante ao da molécula que foi utilizada para sua produção, o que significa dizer que é gerado um hibridoma para produzir AcMc específicos contra determinados epítopos de vírus, bactérias e parasitos.
A pergunta chave: Para que serve a imunohistoquímica?
Expressão de proteínas normais
O estudo da expressão fenotípica de proteínas normais é de utilidade em certas patologias onde a síntese de tais proteínas é modificada (Figuras 1, 2 e 3).
Figura 1. Germe dentário de peixe-rei com abundante expressão de citoqueratina (seta). Aanti-citoqueratina 40 X
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Como fazer uma análise imunohistoquímica?
Para se realizar uma técnica de imunohistoquímica é necessário: • Um AcMc específico contra o epítopo que desejamos detectar; • Um segundo anticorpo relacionado ao AcMc; • Enzimas; • Substratos; • Cromógenos. As enzimas são catalisadores proteicos eficientes e sensíveis. Somente uma molécula de determinada enzima pode catalisar e, consequentemente, transformar entre 10.000 e 100.00 moléculas de substrato por minuto. As enzimas podem ser classificadas (muito superficialmente) em enzimas hidrolíticas (esterase, protease), fosforilases, enzimas oxidoredutoras (desidrogenases, oxidases, peroxidases, enzimas de transferências, descarboxilases e outras).
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Figura 2. Túbulo renal marcado com anti-vimentina (seta). 40 X
Figura 3. Neurônios marcados com anti-neurofilamento neuronal. 40 X
Diagnóstico de enfermidades virais
O número de vírus isolados em peixes tem aumentado nos últimos anos. Estes patógenos podem ter grande impacto econômico no setor produtivo. Com a imunohistoquímica, é possível fazer um diagnóstico de precisão de algumas destas enfermidades (Figuras 4).
Figura 5. Imunomarcação onde se observa Yersinia ruckeri sorotipo 2 (seta). Anti-YR2 40 X
Figura 6. Imunomarcação onde se observa Photobacterium damselae (seta). Anti-PHD 40 X
Figura 4. Células infectadas pelo vírus da Necrose Hematopoiética Infecciosa (NHI) (seta). Anti- NHI 40 X
Diagnóstico de enfermidades bacterianas
As bactérias representam uma das noxas biológicas que mais frequentemente produzem enfermidades nos peixes, sendo responsáveis por altas mortalidades em peixes silvestres ou cultivados, infectados por estes microrganismos. Embora os métodos clássicos de bacteriologia continuem sendo bastante utilizados, os anticorpos monoclonais são de grande utilidade na hora de estabelecer que bactéria esteja gerando uma determinada enfermidade, como também sua presença com precisão no tecido atingido (Figuras 5 e 6).
Os peixes teleósteos, igualmente a outros vertebrados, são susceptíveis a desenvolver neoplasias. Como outras enfermidades de peixes que já são bem estudadas, já se tem descrito uma grande variedade de neoplasias, tanto benignas como malignas, originadas de uma grande variedade de tecidos. Estas lesões ocorrem tanto em peixes teleósteos marinhos como em dulciaquícolas. A potenciabilidade de alguns produtos industriais para induzir tumores (alguns detergentes, clorometileno, hidrocarbonetos aromáticos e clorados, entre outros), é bem conhecida. Por lado, a cada dia surge um maior interesse no desenvolvimento experimental de neoplasias em peixes. Os modelos experimentais nos dão a possibilidade de conhecer desde novos carcinógenos, fundamentalmente ambientais, até revelar os mecanismos íntimos moleculares da carcinogênese. A imunohistoquímica permite estabelecer a histogênese de uma neoplasia e sua correta classificação (Figuras 7 e 8).
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Diagnóstico de enfermidades neoplásicas
Figura 7. Expressão fenotípica de citoqueratina no setor carcinomatoso de um carcinossarcoma mandibular de truta (seta). Anti- citoqueratina 20 X
Conclusões
Figura 8. Expressão fenotípica de vimentina no setor sarcomatoso de um carcinossarcoma mandibular de truta. Anti- vimentina 20 X
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A técnica de imunohistoquímica representa uma ferramenta de alta especificidade, custo aceitável e resultados rápidos, sendo demonstrada como um ótimo método a ser utilizado no diagnóstico de enfermidades em peixes e organismos aquáticos em geral, o que dentro da aquicultura Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos vem a ser um importante aliado no monitoramento sanitário dos animais.
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Prêmio inovação aquícola: Conheça os cases participantes da primeira edição Giovanni Lemos de Mello Doutor em Aquicultura Editor-chefe giovanni@aquaculturebrasil.com
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A votação online que escolherá os finalistas de ara o seguidor da Aquaculture Brasil, o cada categoria ocorrerá entre os dias 11 a 22 de Prêmio Inovação Aquícola já não é mais uma abril. Após isto, é chegada a hora do momento final! grande novidade. Afinal, desde a 13ª edição, No dia 15 de maio, durante apresentamos informações sobre a AquiShow Brasil 2019 – o esta iniciativa inédita na aquicultura maior evento de piscicultura mundial, e que ganhou grandes de água doce da América proporções nos últimos meses. Latina, os vencedores de Apesar de ser a primeira Apesar de ser cada categoria subirão ao edição, o número de cases a primeira edição, palco para receber o seu inscritos impressionou até merecido troféu e demais mesmo a comissão organizadora. o número de cases honrarias. Além disso, o reconhecimento inscritos impressionou Nas próximas edições da por parte de instituições como Revista Aquaculture Brasil, a Embrapa, o Instituto do Pesca até mesmo a comissão apresentaremos os cases de São Paulo e a Secretaria de premiados para que você Aquicultura e Pesca – SAP/MAPA, organizadora. possa conhecer de perto foram a “cereja do bolo” do o trabalho de quem inova prêmio. de verdade em prol do Na primeira edição, um total crescimento, fortalecimento de 46 projetos se inscreveram e consolidação da aquicultura brasileira. em cinco categorias: 1) Academia, 2) Produção, 3) Nesta edição, listamos a seguir os cases inscritos Beneficiamento, 4) Produto final e 5) Políticas no Prêmio Inovação Aquícola 2019. institucionais.
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ACADEMIA CARCINICULTURA NO OESTE DO PARANÁ Universidade Federal do Paraná Autor: Eduardo Luís Cupertino Ballester
DESENVOLVIMENTO E VALIDAÇÃO DE UMA VACINA BIVALENTE CONTRA DOIS SOROTIPOS DE Streptococcus agalactiae EM TILÁPIAS DO NILO (Oreochromis niloticus) Universidade Estadual de Londrina Autor: Ulisses de Padua Pereira
FISIOLOGIA REPRODUTIVA DO PIRARUCU Arapaima gigas E DESENVOLVIMENTO DE FERRAMENTAS PARA O MANEJO DE REPRODUTORES Embrapa Pesca e Aquicultura Autor: Lucas Simon Torati PRODUÇÃO DE CAMARÃO MARINHO EM ÁGUAS INTERIORES Instituto de Pesca de São Paulo Autor: Fábio Rosa Sussel REMOÇÃO DE FÓSFORO REATIVO DE EFLUENTE AQUÍCOLA POR MACRÓFITAS AQUÁTICAS Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará Autor: Wellington Martins SELEÇÃO DE MICRORGANISMOS ISOLADOS DE TILÁPIA PARA UTILIZAÇÃO COMO PROBIÓTICO EM PEIXES Instituto de Pesca de São Paulo Autora: Danielle de Carla Dias SISTEMA AgroTagAqua Embrapa Autora: Luciana Spinelli Araujo VACINAS AUTÓGENAS PARA TILÁPIA Acquazul/Microvet Autor: Ronaldo Melo
PRODUÇÃO AERAÇÃO SUBAQUÁTICA EM TANQUES-REDE DE GRANDE VOLUME GeneSeas Aquacultura Autor: Cleber Leão AUMENTO DA PRODUTIVIDADE AQUÍCOLA POR MEIO DE INJEÇÃO DE MICROBOLHAS DE AR Bifusion Pesquisa e Desenvolvimento Autor: Shigemi Takayasu CARRETÃO GRANELEIRO Raguife Rações Autor: Felipe Georges Ambar do Amaral CONTROLE MEXILHÃO DOURADO Piscicultura Água Pura Autor: Wagner Camis
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CONTROLE BIOLÓGICO DE ALEVINOS INDESEJADOS DE TILÁPIA POR MEIO DO PEIXAMENTO COM DOURADO EM VIVEIROS DE ENGORDA DE TILÁPIA Projeto Pacu e Copacol Autores: Simão Brun, Nestor Braun, Diogo Yamashiro e Marco A. Rotta DIETA ESPECÍFICA PARA BEIJUPIRÁ Neovia Nutrição e Saúde Animal Autor: Eduardo Urbinati EXPERTS NUTRITION Neovia Nutrição e Saúde Animal Autor: Daniel Fuziki FEED MANAGER Aquafeed Autor: Lucas Piva FERMENTAQUA: UMA REVOLUÇÃO NA INDÚSTRIA DE ALIMENTOS AQUÁTICOS COM LEVEDURAS, BACTÉRIAS, PROBIÓTICOS E ENZIMAS “PRODUZIDOS NA FAZENDA” Zimmermann Aqua Solutions/Instafloc Autor: Sergio Zimmermann FISH KEY ACCOUNT Neovia Nutrição e Saúde Animal Autor: Daniel Fuziki Umezu GESTÃO APLICADA AO CULTIVO DE MOLUSCOS Fazenda Marinha Paraíso das Ostras Autor: Vinicius Marcus Ramos IMPLANTAÇÃO DE ASPERSORES EM SISTEMA BFT GeneSeas Aquacultura Autor: Victor Mello INMYFARM Neovia Nutrição e Saúde Animal Autor: Daniel Fuziki Umezu NOVA TECNOLOGIA DE CULTIVO E MANEJO DA OSTRA Crassostrea gigas (CONHECIDA COMO A OSTRA DO PACÍFICO) Fazenda Marinha Freguesia Autor: Rafael Luiz da Costa OSTRAS DA AMAZÔNIA - NEGÓCIOS SUSTENTÁVEIS Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Estado do Pará – Sebrae/PA Autor: Fabrizio Augusto de Souza Guaglianone PLATAFORMA DE INTELIGÊNCIA PARA A PRODUÇÃO DE PEIXE Aquabit Autor: Ailton Rodrigues SEMPRE À FRENTE Neovia Nutrição e Saúde Animal Autor: Rodrigo Barboza de Alencar SOFTWARE DE GESTÃO DE AQUICULTURA AQUAMANAGER Nova Aqua Atividades de Apoio à Aquicultura Ltda. Autor: João Lorena Campos
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TANQUE REDE COM FLUTUADOR EMBUTIDO GALVANIZADO GeneSeas Aquacultura Autor: Renato Morandi USO DA TECNOLOGIA NA MELHORA NO CONSUMO DE RAÇÃO Piscicultura Água Pura Autor: Wagner Camis
BENEFICIAMENTO DISRUPÇÃO NA INDÚSTRIA DE PESCADO Lago Pesca Autor: Ricardo Carriero MANEJO PRÉ-ABATE HUMANIZADO: TÉCNICAS DE RECEPÇÃO E ESPERA RACIONAIS E INSENSIBILIZAÇÃO PRÉ-ABATE ATRAVÉS DE ELETRONARCOSE Agertek Autora: Sheyla Vargas Baldi
PRODUTO FINAL BISCOITO DE PESCADO: UM “CASE” DE PRODUTO SAUDÁVEL COM ALTO VALOR AGREGADO Instituto de Pesca de São Paulo Autora: Cristiane Rodrigues Pinheiro Neiva PASTEL GOURMET DE TILÁPIA Ilda Pastelaria Autor: Gerson Hiroaki Nihei PROJETO TILAPONA Walmart Brasil Autor: Lourival Francelino Miguel Junior
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CAMPANHA ADOTE UM COPO GeneSeas Aquacultura Autora: Trycia Queiroz DEFINIÇÃO DOS PROCEDIMENTOS PARA REGULARIZAÇÃO DA CARCINICULTURA MARINHA NO ESTADO DE GOIÁS Fazenda Tauá Aquicultura Autor: Luiz Henrique Vilaça de Oliveira DISCOGRAMA DA PISCICULTURA - TAMBAQUI EM VIVEIROS ESCAVADOS RURALTINS - Instituto de Desenvolvimento Rural do Tocantins Autor: Andrey Chama da Costa INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA CRIAÇÃO DO CAMARÃO MARINHO, Litopenaeus vannamei, REALIZADA POR AGRICULTORES FAMILIARES DO SEMIÁRIDO PERNAMBUCANO Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA Autor: Gilvan Pais de Lira Júnior O PAPEL DA INSTITUIÇÃO DE PESQUISA NA EFETIVAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA APLICADA À INCLUSÃO DO PESCADO NA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR Instituto de Pesca de São Paulo Autora: Erika Fabiane Furlan VACINAS AUTÓGENAS PARA TILÁPIA Acquazul/Microvet Autor: Ronaldo Melo REDE NACIONAL DE PESQUISA E MONITORAMENTO AMBIENTAL DA AQUICULTURA EM ÁGUAS DA UNIÃO Rede Nacional de Pesquisa e Monitoramento Ambiental da Aquicultura em Águas da União Autora: Juliana Lopes da Silva SITASS (SIMPÓSIO TÉCNICO DA AQUICULTURA SUPERINTENSIVA SUSTENTÁVEL) Camarão SP Autor: Rodrigo Carvalho de Aragão Baldin
UMA EXPERIÊNCIA DE APROVEITAMENTO INTEGRAL DO PESCADO Grupo Ambar Amaral Autora: Sonia Ambar do Amaral
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SISTEMA DE PRODUÇÃO INTENSIVA DE TILÁPIA UTILIZANDO TANQUES-REDES ARTICULADOS DE GRANDE VOLUME – TRGV FISHER® Fisher Piscicultura Água Vermelha Ltda. Autor: Hélio de Sousa Barbosa
POLÍTICAS INSTITUCIONAIS AÇÕES DA EMBRAPA PARA A IMPLEMENTAÇÃO DO REGIME ADUANEIRO DE DRAWBACK VISANDO O AUMENTO DAS EXPORTAÇÕES DE TILÁPIA Embrapa Pesca e Aquicultura Autor: Manoel Xavier Pedroza Filho Aquisys v.1.3 - SISTEMA INFORMATIZADO DE APOIO ÀS BOAS PRÁTICAS DE MANEJO E GESTÃO AMBIENTAL DA AQUICULTURA Embrapa Meio Ambiente Autora: Maria Conceição Peres Young Pessoa
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PAQ-Gro na alimentação da tilápia-do-Nilo (Oreochromis niloticus) Giovani Sampaio Gonçalves Pesquisador do Instituto de Pesca do Estado de São Paulo gsgoncalves@pesca.sp.gov.br
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A
tilapicultura é a atividade aquícola que têm A Phibro, empresa de importante participação no setor de produção animal busca de forma apresentando crescimento contínuo nos contínua a melhoria de seus produtos, os quais já últimos anos no Brasil, se demonstrando são amplamente utilizados na alimentação da tilápia como uma opção rentável, que dinamiza a economia do Nilo e aquacultura em geral. Nesse propósito, regional, com oferta de alimento seguro, que o Laboratório de Nutrição de Peixes do Instituto de complementa a demanda por Pesca realizou esta pesquisa de proteínas de origem animal forma a avaliar o produto PAQpara a população. A expansão Gro na alimentação da tilápia da criação de tilápia ocorreu do Nilo nas fases iniciais em a partir do modelo de criação laboratório e terminação em em gaiolas (tanques-rede), tanques-rede no reservatório A Phibro, empresa de instaladas principalmente em de Ilha Solteira (SP). grandes reservatórios de importante participação Metodologia usinas hidroelétricas. Contudo, no setor de produção O experimento foi realizado atualmente novos pólos de Laboratório de Nutrição do criação que utilizam modelos de animal busca de forma no Instituto de Pesca APTA/SAA., criação em viveiros escavados município de São José do Rio contínua a melhoria de têm emergido pelo Brasil. Preto e na unidade de pesquisa Dentre as regiões de maior seus produtos. do Instituto de Pesca em parceria produção no estado de São com o Grupo Ambar Amaral Paulo, destaca-se a região em Santa Fé do Sul, reservatório Noroeste Paulista como uma de Ilha Solteira, ambos no das maiores produtoras de tilápia. Em sua produção, estado de São Paulo, Brasil. As unidades de pesquisa a versatilidade em uso de ingredientes e aditivos são de coordenação do pesquisador Dr. Giovani Sampaio Gonçalves, do Instituto de Pesca, de São se faz necessário de modo a obter-se uma maior José do Rio Preto (SP) o qual desenvolveu o projeto eficiência produtiva, menores problemas sanitários e em parceria com a empresa Phibro e Fundepag. consequentemente maior rentabilidade.
Avaliações em laboratório
Foram utilizados 12 tanques de PVC com volume de 310 litros, sendo estes abastecidos individualmente com água em sistema de recirculação com filtro físico, biológico, controle de temperatura (26-28ºC) e oxigenação por meio de compressores radiais. A taxa de recirculação de água em cada tanque foi de 12 vezes ao dia e durante o período experimental foram monitorados os valores de temperatura e oxigênio e semanalmente as variáveis de pH, amônia, nitrito e nitrato. O período do experimental na fase de desempenho foi de 75 dias. Durante a condução experimental foram realizadas limpezas semanais do fundo dos tanques, possibilitando a manutenção e troca parcial da água (20 a 30%), mantendo desta forma dentro dos parâmetros ideais para a espécie em estudo. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado com 2 tratamentos e 6 repetições. Foram utilizados 32 peixes por unidade experimental com peso médio inicial de 18,0g. Todos os peixes passaram por um período de adaptação (15 dias) e 3 classificações (1 na piscicultura onde foram obtidos os peixes e 2 em laboratório já no local de realização do experimento) de forma a obter um lote homogêneo e em boas condições de saúde. Nos primeiros 5 dias de experimento os peixes mortos foram substituídos por peixes de mesmo peso, uma vez que, pode ter efeito do manejo no momento da classificação.
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Avaliações a campo – tanques-rede
Foram utilizados 8 tanques-rede com volume de 18m3 (3x3x3m) os quais faziam parte de uma piscicultura com 200 tanques-rede e produção de 50 toneladas/ mês de tilápia. A unidade de pesquisa e produção está localizada no reservatório da usina hidrelétrica de Ilha Solteira no município de Ilha Solteira - SP - BRA. O período experimental na fase de desempenho em tanque-rede foi de 72 dias, sendo o delineamento experimental inteiramente casualizado com 2 tratamentos e 4 repetições. Foram utilizados em média 2.250 peixes por unidade experimental com peso inicial de 550,0g. Os peixes foram classificados e contados em mesa classificadora e para o peso inicial e final foram realizadas biometrias de 100 peixes por unidade experimental.
Confecção das dietas
• Em laboratório As rações foram formuladas com 40% de PB (3 g/ kg de PAQ-Gro) e 36% de PB (5 g/kg de PAQ-Gro) para peixes de 20 a 50g e 50 a 200g, respectivamente, variando apenas a inclusão do aditivo em contrapartida
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a ração controle (sem aditivo). A alimentação foi realizada à vontade até a saciedade e realizado 8 vezes ao dia, evitando possíveis sobras na água. Para a produção das rações utilizadas no laboratório, foram utilizados alimentos provenientes de fábricas de ração de forma a possibilitar condições semelhantes à de campo, sendo estas moídas (0,5mm) em moinho de martelos e extrusadas (2 e 4mm) em extrusora comercial (Ferraz®E62) com capacidade de 80kg/h, conforme o tamanho do peixe em experimento. • Nos tanques-rede Para o experimento em tanques-rede, foi utilizada uma ração comercial 32% PB (fórmula previamente conhecida) sem adição de nenhum aditivo ou qualquer outro composto que pudesse interferir no desempenho e saúde dos peixes. As rações foram extrusadas em equipamento industrial (Ferraz®E240) com capacidade para 6 toneladas/h. Na fase avaliada em tanque-rede, a inclusão foi de 5 g/kg de PAQGro para peixes acima de 500g e a alimentação (taxa de arraçoamento) foi com base em uma tabela de alimentação utilizada na piscicultura, corrigida com base no crescimento dos peixes, perdas de tratos por motivos de impossibilidade (chuva, ventos etc) e possíveis sobras de ração.
Parâmetros zootécnicos
Ao final do período experimental os peixes foram anestesiados em banho de imersão com óleo de cravo (50 mg/L) e logo depois medidos e pesados individualmente. Com os dados coletados foram avaliados os seguintes parâmetros: sobrevivência; peso final; comprimento final; comprimento padrão; altura; conversão alimentar; consumo de ração.
Resultados
• Parâmetros de qualidade de água Os parâmetros de qualidade de água durante o período experimental com o sistema de recirculação foram mantidos nos níveis aceitáveis para a espécie. Foram observados valores médios de 6,5 a 7,2 para pH; 0,019 a 0,25 (mg/L) para amônia total; 0,022 a 0,30 (mg/L) para nitrito (NO2) e 0,015 a 0,30 (mg/L) para nitrato (NO3). Na avaliação a campo os valores de temperatura compreenderam entre 27 e 30°C e oxigênio 5,2 e 6,8mg/L. • Desempenho zootécnico em laboratório Os resultados dos parâmetros zootécnicos avaliados estão expressos a seguir:
Considerações finais
Figura 1. Desempenho zootécnico da tilápia do Nilo em sistema de recirculação alimentada com dieta controle e PAQ-Gro.
Com base nos resultados obtidos nesta pesquisa, consideramos o produto PAQ-Gro uma ferramenta nutricional importante para o aumento nos resultados de performance da tilápia do Nilo. Em ambos os experimentos foram verificados valores de ganho em biomassa de peixes superior e conversão alimentar menor quando comprado ao tratamento sem a suplementação. Análises de viabilidade econômica, assim como de parâmetros histológicos e imunológicos podem colaborar na melhor interpretação do seu modo de ação e desta forma maximizar o seu potencial uso em rações comerciais para a tilápia do Nilo. Esse conjunto de fatores possibilitarão melhores resultados zootécnicos e econômicos para o produtor.
• Desempenho zootécnico em tanques-rede Resultados dos parâmetros zootécnicos avaliados no cultivo de tilápia do Nilo em tanques-rede alimentadas com dieta controle e PAQ-Gro:
Peso inicial e peso final 1,003
0,950
1,000 0,800
Biomassa: inicial, final e ganho
0,564
0,545
0,600 0,400 0,200 0
Teste com PAQ-Gro
Controle
Peso inicial (g) Peso final (g)
Comprimento total, padrão e altura 45,000 40,000 35,000 30,000 25,000 20,000 15,000 10,000 5,000 0,000
38,900
37,075
Teste com PAQ-Gro
Controle Comprimento total (cm)
Comprimento padrão (cm)
Altura (cm)
Sobrevivência 95 90 85 80 75 70
90,34
Controle
1284,91
1232,33
92,23
817,28
696,21
Teste com PAQ-Gro
Controle Biomassa final (g)
Ganho em biomassa (g)
FCA (Fator de conversão alimentar)
13,710
12,795
2102,19
1928,54
Biomassa inicial (g)
32,625
31,500
2200 2000 1800 1600 1400 1200 1000 800 600 400 200 0
4,5 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0
2,326
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1,200
1,922
Controle
Teste com PAQ-Gro FCA
Teste com PAQ-Gro Sobrevivência (%)
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© Ricardo Wolffenbuttel
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Aquicultura, Biotecnologia e a Economia Circular:
Como novos conceitos podem ajudar na reestruturação das cadeias produtivas aquícolas? Eng° Fabrício Flores Nunes Diretor de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação Tecnológica do Instituto de Pesquisa, Extensão Rural e Organismos Aquáticos – PEROÁ Consultor em Novos Mercados da Aquicultura Florianópolis, SC fabriciofloresnunes@gmail.com
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O
cultivo de organismos aquáticos tem a único produto, na carne (filé, no caso dos peixes capacidade de fornecer diversos serviços e camarões, e no miolo, no caso dos moluscos ambientais de grande importância: a bivalves). manutenção da qualidade de água, retornando para Os resíduos da aquicultura o meio ambiente uma água melhor que a captada O resíduo gerado pela para o projeto, aumento da produção nacional, em muitos piscosidade nas áreas de entorno casos, já é uma problemática (característica identificada local. Onde há produção principalmente na maricultura), aquícola, há geração de resíduos, além de ser uma das principais líquidos, sólidos e “moles”. E na indústrias de proteína animal A indústria aquícola maioria dos casos, não se sabe com o menor impacto quando o que fazer com este montante. falamos sobre emissão de nacional gera O desperdício de resíduos gases de efeito estufa. Nessa são potencialmente questão última, ainda existe atualmente mais de 430 que utilizáveis (biomateriais e uma discussão acadêmica se ativas) de moluscos e crustáceos marinhos mil toneladas de resíduos biomoléculas peixes, moluscos e crustáceos conseguem ou não sequestrar pós-beneficiamento. representa de 20 a 70% de dióxido de carbono (CO2) atmosférico, o que seria outro todo o pescado comercializado. grande serviço da atividade. Esta constatação tem No caso dos organismos despertado grande interesse filtradores como os moluscos quanto ao aproveitamento bivalves, os organismos retém desses subprodutos, passíveis uma quantidade considerável de sólidos suspensos, de diversas aplicações industriais. Uma indústria que transformando estes nutrientes em proteína e, desta utiliza apenas um terço de sua matéria-prima pode forma, removendo do sistema. Porém, apesar de se tornar insustentável. O fato é que todos os anos, fatores positivos de instalação, a aquicultura atual milhares de toneladas de resíduos potencialmente nacional tem focado seu objetivo produtivo em um utilizáveis como fontes de biomateriais são
descartados em aterros e/ou jogados de volta ao mar, desperdiçando matéria-prima e causando impactos ambientais consideráveis. Para se ter uma panorama, a indústria aquícola nacional gera atualmente mais de 430 mil toneladas de resíduos pós-beneficiamento (somando a produção da piscicultura continental, carcinicultura e malacocultura), e muito pouco deste volume tem destino nobre quanto matéria-prima.
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Aproveitamento integral do pescado Cada vez mais a intensificação da produção exigirá a modernização técnica e melhoria dos cultivos para aumentar a eficiência econômica das indústrias relacionadas à aquicultura. O aproveitamento integral dos resíduos gerados por essas indústrias surge como uma alternativa para tornar o setor mais sustentável ao longo da cadeia produtiva, trazendo melhorias sociais, econômicas e ambientais. O destino correto dos resíduos permite que uma receita adicional seja gerada com a inserção de novos produtos no mercado, evitando desperdícios e diminuindo o impacto negativo ao meio ambiente (SEBRAE, 2015). Sabe-se que os organismos aquáticos são reconhecidos como fonte importante de moléculas de interesse. Considerando a diversidade de organismos comerciais, o resíduo já é tido como uma riquíssima fonte de moléculas bioativas com capacidade de atender diferentes segmentos industriais (Bezerra; Freitas-Jr, 2015). Apesar destas descobertas, do potencial e do volume gerado, ainda não temos uma indústria nacional de biomoléculas e se faz necessário investimentos e parcerias que esta nova indústria aconteça (Figura 1). O Aproveitamento Integral do Pescado (AIP) é um tema conhecido e, cada vez mais, uma necessidade. A enorme potencialidade dos oceanos para a biotecnologia permanece em grande parte desconhecida. Mesmo para os organismos conhecidos, existe um conhecimento insuficiente para permitir a sua gestão e utilização inteligente (Brasil, 2010). Atualmente inexiste no país a indústria de biomateriais e biocompostos em funcionamento, apesar de algumas iniciativas privadas do setor no passado e investimentos incipientes atuais. É necessário que se façam maiores investimentos em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação Tecnológica para que o potencial do pescado possa ser aproveitado por completo. Atualmente, as indústrias aquícolas implantadas e/ou em implantação, na grande maioria, não contemplam a utilização de toda a matéria-prima possível do pescado cultivado. Exaurir as possibilidades de comercialização de tudo que é produzido fará parte do pensamento do novo profissional e da indútria de pescado muito em breve. Seja por questões ambientas e/ou econômicas.
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Considerando o aproveitamento integral do pescado, a utilização dos resíduos do beneficiamento na produção de biomateriais a partir de subprodutos com o investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação, a aquicultura se aproxima de temas como a Biotecnologia (pesquisa e aplicação de biomateriais), Ecoeficiência (relação economia/ambiente) e Economia Circular (redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia). Desta forma, a introdução desses temas se faz necessária quando o assunto é sobre biomateriais e ou moléculas bioativas a partir dos resíduos do processamento de organismos aquáticos.
Economia circular como conceito pilar para a ecoeficiência da aquicultura
A Convenção sobre Diversidade Biológica da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1992 definiu Biotecnologia como “qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para utilização específica” (Figura 2). É um conjunto de técnicas de natureza variada que envolve uma base científica comum, de origem biológica, e que requer crescentemente o aporte de conhecimento científico e tecnológico, oriundos de outros campos do conhecimento (Brasil, 2010). É sabido que os oceanos atingiram seu rendimento máximo, que a pesca está estagnada há décadas e que a produção mundial de pescado para consumo humano é cada vez mais dependente da aquicultura. A resposta para os desafios que se colocam frente ao aumento de produtividade, controle de doenças e danos ambientais, aplicando tecnologias avançadas para o cultivo de organismos marinhos, para satisfazer a necessidade crescente do mundo de alimentos, medicamentos e materiais do oceano sem a exploração excessiva e a destruição dos ambientes costeiros está no desenvolvimento dos avanços em Biotecnologia (Brasil, 2010). A Ecoeficiência é definida como a produção de bens e serviços a preços competitivos que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida, ao mesmo tempo em que, progressivamente, são reduzidos os impactos ambientais e o consumo de recursos naturais em todo o ciclo de vida, em consonância com a capacidade estimada do planeta em prover estes recursos e absorver os impactos (WBCSD, 2000). Segundo Glavic e Lukman (2007), a ecoeficiência significa produzir mais com menos, representando uma relação entre a economia e questões ambientais, sendo esta última, predominante na relação.
Figura 1. A cadeia da produção do pescado, a relação com o valor agregado e a necessidade de investimentos em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação Tecnológica (modificado de Bezerra e Freitas-Jr., 2015).
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Figura 2. O processo de descoberta de novas substâncias a partir de materiais biológicos e produtos naturais (modificado de Brasil, 2010).
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Segundo o WBCSD (2000), os três objetivos da ecoeficiência que são:
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a) Redução do consumo de recursos: inclui a minimização da utilização de energia, materiais, água e solo, englobando a reciclabilidade e a durabilidade do produto e fechando o ciclo dos materiais; b) Redução do impacto na natureza: inclui a minimização de emissões gasosas, descargas líquidas, eliminação de desperdícios e dispersão de substâncias tóxicas, assim como o fomento da utilização sustentável dos recursos renováveis; c) Aumentar o valor do produto ou serviço: significa beneficiar os clientes através da funcionalidade, flexibilidade e modularidade dos produtos. A ecoeficiência é muito importante estrategicamente para o setor privado, já que permite que sejam reduzidos gastos com matérias-prima, energia e água, permitindo a prevenção de acidentes ambientais e suas consequentes sanções, além de conquistar mais consumidores (Camara; Lima; Pimenta, 2011). Além das vantagens para o setor privado, a ecoeficiência pode apoiar os governos a conceber uma estratégia nacional para o desenvolvimento sustentável. A economia e a qualidade de vida continuarão a crescer, enquanto a utilização dos recursos naturais e a poluição diminuirão (WBSCD, 2000). A visão da Economia Circular (EC) é ainda mais recente. A EC vem sendo utilizada nas discussões sobre os desafios ambientais e promoção do desenvolvimento sustentável industrial. Ao contrário da reciclagem tradicional, a abordagem política orientada enfatiza a reutilização de produtos, componentes e materiais, remanufatura, remodelação, reparação, cascata de atualização, bem como o potencial de fontes de energia sustentáveis (Korhonen et al. 2018). Os modelos de EC, com um fluxo diferente da tradicional economia linear, mantêm o valor agregado nos produtos o maior tempo possível e minimizam o desperdício (Maio et al., 2017) (Figura 3). Segundo Korhonen, Honkasalo e Seppälä (2018), em uma abordagem crítica sobre os conceitos de negócios em EC a partir da perspectiva do desenvolvimento sustentável e suas três dimensões, econômica- ambiental-social, sugerem como definição: “A economia circular é uma economia construída a partir de sistemas de produção e consumo societários que maximizam o serviço produzido a partir da natureza linear - material de natureza da sociedade e fluxo de
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energia. Isso é feito usando fluxos de materiais cíclicos, fontes de energia renováveis e fluxos de energia. A economia circular bem sucedida contribui para as três dimensões do desenvolvimento sustentável, limitando o fluxo de produção a um nível que a natureza tolera e utilizando os ciclos do ecossistema nos ciclos econômicos, respeitando suas taxas de reprodução natural.” Os fluxos de resíduos produzidos pela sociedade podem servir como parte desses ciclos renováveis conjuntos. Este tipo de atividade é fortemente defendida nas recentes visões de negócios onde os chamados “nutrientes biológicos” das indústrias que utilizam biomassa são lançados de volta à biosfera, onde contribuem para o crescimento da biomassa e para a manutenção da biodiversidade (Korhonen; Honkasalo; Seppälä, 2018). Em uma busca recente sobre o tema “Circular economy” no portal de artigos científicos ScienceDirect. verificamos a presença de 4007 resultados para artigos e revisões. Ao executarmos uma busca avançada somando o tema Aquaculture, encontramos 156 artigos indexados, sendo observado um interesse crescente nos últimos cinco anos sobre o assunto (Figura 4). Apesar disso, os artigos encontrados tratam mais sobre o sistema produtivo em si (ex.: sistemas de recirculação e/ou multitrófico integrado), do que uma visão global da indústria, como precede a visão da Economia Circular propriamente dita. Em uma pesquisa recente, Maio e colaboradores (2017) propõem um novo indicador de valor para avaliar o desempenho em termos de eficiência de recursos e da economia circular. Dos 40 setores e indústrias analisados, a aquicultura e pesca aparecem com o menor valor neste índice de circularidade e eficiência, possivelmente pelo alto valor dos insumos, baixo valor agregado e pequeno volume de resíduos retornados à indústria para reaproveitamento.
Conclusão Com a crescente demanda por alimentos de qualidade, a importância da participação da aquicultura como fornecedora de pescado para consumo humano e o potencial dos resíduos gerados pela indústria de beneficiamento de pescado, a Economia Circular na Aquicultura se apresenta como uma importante ferramenta para a logística da matéria-prima e a biotecnologia para o desenvolvimento de inovações, resultando em práticas comerciais mais rentáveis e seguras.
Figura 3. Diferença entre a economia linear, usando recursos e gerando resíduos (sistema atual da aquicultura) e a economia circular fazendo uso dos resíduos através do aproveitamento destes como fonte de recursos (futuro da aquicultura).
Economia linear
Economia circular
Recursos
Produção
Consumo Resíduos
Figura 4. Levantamento de artigos indexados na plataforma ScienteDirect.com em busca avançada com os temas “Circular economy” e “Aquaculture”, realizado em Março de 2019. Em linha pontilhada, uma estimativa de número de publicações até o final do ano.
Economia circular + Aquicultura Artigos indexados: ScienceDirect.com
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Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos
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Pescado salgado ou levemente salgado: uma preocupação nutricional? Prof. Alex Augusto Gonçalves Erica Lorenna Batista da Silva Centro de Ciências Agrárias (CCA), Departamento de Ciência Animal (DCA) Universidade Federal Rural do Semi Árido (UFERSA) Mossoró, RN, Brasil alaugo@gmail.com
O processo de salga do pescado
A salga de peixe é um dos processos mais antigos de conservação do pescado, que consiste na remoção da água e incorporação de sal no músculo do pescado, e é regido por fatores como difusão, osmose e uma série de processos químicos e bioquímicos (Nunes & Pedro, 2011). A maioria das bactérias, fungos e outros microrganismos potencialmente patogênicos não podem sobreviver em um ambiente altamente salgado, devido à pressão osmótica que o sal cria, e qualquer célula viva em um ambiente com altas concentrações de sal se desidratará por osmose e morrerá ou se tornará inativada. Esta extração de água significa uma diminuição da atividade de água (aw), que resulta em uma diminuição da atividade de bactérias e enzimas. Normalmente, a aw no peixe é próximo de 1 e pode ser reduzido para 0,8 e 0,7 após salga forte e secagem. Apenas algumas bactérias halófilas têm a capacidade de crescer em atividades de água até 0,75. Portanto, essas bactérias às vezes causam deterioração em peixes salgados, e esses produtos necessitam de refrigeração durante seu armazenamento, ou uma boa escolha na embalagem. Peixes pequenos podem ser salgados inteiros, sem evisceração, mas peixes maiores devem ser eviscerados e abertos para permitir que o sal penetre na carne (Sampels, 2015). Existem diferentes tipos de processos de salga: i) Salmouragem: os peixes são colocados numa solução salina durante um período de tempo relativamente curto, como um pré-tratamento para outra eta-
pa de processamento, como por exemplo defumação; ii) Conserva (Pickling): significa que a matéria-prima é armazenada durante mais tempo na salmoura, como por exemplo o arenque em conserva; iii) Cura Kench: peixes brancos são abertos (corte espalmado) e salgados secos, enquanto a salmoura em desenvolvimento produzida é liberada, e os produtos resultantes podem ter uma vida útil muito longa; iv) Cura Gaspé: vem de uma região do Canadá e consiste em salga seca por vários dias com o restante do produto na salmoura produzida (semelhante a salga mista), e uma etapa subsequente de secagem ao sol; v) Salga úmida: os peixes são colocados juntos com sal seco em recipientes estanques como barris ou similares adequados e deixados para maturar na salmoura que vai se formando; vi) Salga mista: combinação da salga seca e posterior salga úmida (Sampels, 2015). Os métodos mais utilizados pela indústria ainda são salga seca e salga úmida (salmoura), no entanto, métodos mais recentes de salga, como a injeção de salmoura ou a combinação desses métodos têm sido usados para produtos de peixe levemente salgados (Aiura et al., 2008; Olivo, 2011; Sampels, 2015) ou ainda a salga à vácuo (Chiralt et al., 2001; Aiura et al., 2008; Nunes & Pedro, 2011), o qual reduz o tempo de salga e aumenta o rendimento do processo. O conteúdo de sal no produto levemente salgado (injetora) final é bem menor, e os produtos não precisam ser reidratados antes do consumo, como o bacalhau fortemente salgado (Aiura et al., 2008).
Funções tecnológicas do sal no pescado
O sal (cloreto de sódio) é amplamente utilizado em várias quantidades durante a preparação e processamento do pescado e seu papel pode ser dividido em três objetivos gerais. Em primeiro lugar, ele atua como um agente preservador, inibindo o crescimento microbiano ou promovendo mudanças indiretas. Em segundo lugar, ele opera como um modificador de sabor, que além do sabor salgado, melhora os atributos sensoriais do pescado salgado. Em terceiro lugar, desempenha funções específicas e essenciais na produção e processamento de vários produtos de pescado. No entanto, deve-se ressaltar que em muitas situações ela cumpre todas as três funções e, em alguns casos, a separação entre elas não é clara (Pedro & Nunes, 2007). Ao adicionar até 6% (p/p) de cloreto de sódio a um tecido muscular, os íons cloreto no sal se ligam aos filamentos de actina e miosina, aumentando as cargas negativas das proteínas e amplificando as forças eletro-repulsivas entre os filamentos. Isso leva ao inchaço muscular e mais água é retida no músculo e a capacidade de retenção de água do músculo é aumentada. Devido a isso, a salga leve pode ser um bom método para diminuir a perda de água durante o armazenamento. É, portanto, comumente usado antes do congelamento com o objetivo de trabalhar contra os efeitos negativos do congelamento (Lauzon et al., 2010).
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Novas tecnologias de processamento
Os procedimentos de salga têm mudado rapidamente na última década, e a salmouragem e injeção estão sendo cada vez mais utilizadas. Estes métodos resultam em alta retenção de água no músculo do peixe, devido a diferentes efeitos nas proteínas e na microestrutura do músculo em comparação com o método antigo (Kench) de salga. Além disso, muitos produtores têm acrescentado fosfatos à salmoura no início do processo de salga, com o objetivo de reduzir o risco de descoloração amarela dos produtos salgados. Os fosfatos têm efeitos quelantes sobre os metais que podem estar presentes no sal e, assim, reduzem a oxidação dos lipídios, razão pela cor amarela/escura dos produtos. As recentes mudanças nos procedimentos de salga e nas condições de cura alteraram as características dos produtos salgados no mercado, aumentaram o rendimento do peso e melhoraram a qualidade comercial.
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O uso do processo de injeção e tambleamento resulta em produtos ligeiramente reidratados, e com melhora na concentração de NaCl (mais homogênea). O aumento do número de pontos de injeção/cm2 de 2 para 5 reduz o teor de sal após a injeção de 11% para aproximadamente 5%. A tecnologia de injeção de salmoura está gradualmente adquirindo popularidade devido ao seu potencial de economia de tempo e aos maiores rendimentos de processamento obtidos quando comparada às técnicas convencionais de cura pelo sal. Se o processo tradicional é comparado com os diferentes processos de produção dos filés levemente salgados, consistindo de 2 dias de processamento (descongelamento, filetagem, injeção de sal e congelamento), fica claro que o processo tradicional não pode competir. O tempo de processamento é reduzido para menos de um décimo e o rendimento total do peso é superior ao processo tradicional. Portanto, o produto moderno é vendido por menos da metade do preço do produto tradicional (Pedro & Nunes, 2007). Outras espécies que tradicionalmente se fazem a salga tradicional (salga seca) também estão sendo utilizadas nos estudos com o uso de injeção de salmoura, obtendo resultados excelentes, principalmente no que se refere ao melhoramento do rendimento do processo, diminuição do tempo de salga, e melhoramento da qualidade do produto final. Estudo conduzido por Ariyarathna (2011) mostra que na Islândia, espécies grandes como bacalhau (Gadus morhua), saithe (Pollachius virens), ling (Molva molva) e tusk (Brosme brosme) são salgados por procedimentos de várias etapas após filetagem ou corte borboleta. Métodos de pré-salga, como injeção de salmoura e/ou salmouragem, são usados antes da salga seca, que envolve empilhamento dos peixes com camadas alternadas de sal por 10-14 dias sob condições refrigeradas (<7°C) para evitar o crescimento de bactérias halofílicas. A pré-salga melhora o rendimento e a qualidade do produto final em comparação com uma única etapa de salga a seco, que era o procedimento original de salga. Normalmente, após a salga, o peixe é embalado e exportado sem secagem. Quando as agulhas atingem a pele, a salmoura flui continuamente para fora das agulhas para o músculo, enquanto são retraídas através do filé de volta à posição inicial. A pressão da injeção e o número de injeções no peixe podem ser ajustados para uma máquina de injeção automática. Normalmente, a concentração de sal aumenta de 0,15% no músculo de bacalhau fresco para 2 a 5% no músculo de peixe injetado com sal. Após este passo, o bacalhau pode ser salgado em salmoura, e/ou curado pelo método Kench.
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Harikedua & DeWitt (2017) comentam que existe Aqui novamente observamos a preocupação uma quantidade crescente de literatura sobre a capacidos pesquisadores com relação à absorção do sal dade das salmouras com baixo teor de sal incorporadas no músculo do pescado durante a salga por salmoupor meio da tecnologia de injeção multi-agulhas para ra ou injeção de salmoura. Para Gudjónsdóttir et al. melhorar a qualidade dos produtos de carne bovina, (2013), a salga por salmoura ou injeção de salmoura suína e de aves. Salmouras com baixo teor de sal são com baixas concentrações de sal (1–6%) é um protipicamente formuladas para ter menos de 5% de NaCl cesso conhecido para melhorar o rendimento e a e usadas em níveis suficientes para impactar a funciocapacidade de retenção de água nos filés de peixe. A nalidade da proteína do músculo inteiro sem alterar o absorção de sal é, no entanto, afetada por vários fasabor/aparência. As salmouras com baixo teor de sal tores, tais como espécie, tipo de músculo, tamanho funcionam reduzindo a perda de água por gotejamento e peso do peixe, composição química do músculo e (exsudado) durante a exibição no varejo, reduzindo a da salmoura, método de salga, estado de rigor, etc. perda de cozimento, melhorando a palatabilidade (perO termo lightly salted fish ainda é desconhecido no cepção da suculência) e prolonBrasil, porém, internacionalgando a vida de prateleira. Até o mente o produto levemente momento, a maioria das pesquisalgado já é comum na mesa sas sobre injeção de peixes tem dos consumidores. Sigurgislase concentrado principalmente dottir et al. (2000) definem o na aplicação de salmouras com Esses produtos produto de peixe levemente alto teor de sal aos produtos salgado com teor de sal entre (levemente salgados) são como bacalhau salgado ou sal2,0 e 3,9% (ou 3,5 e 6,0%, mão defumado a frio. consumidos diretamente na fase aquosa), o teor de água (umidade) entre 65 e 70% e pH entre 5,8 e 6,3. Já o Codex sem a necessidade de serem Novas tecnologias de Alimentarius (CXS 244–2004, dessalgados. Nesse caso, processamento alterados em 2018) definem Além de seus papéis na fio consumidor deve estar os seguintes tipos de produtos siologia humana, nutrição e salgados: i) Muito levemente ciente do conteúdo de sal saúde, o sal desempenha um salgado (very lightly salted fish): papel multifuncional em muitos conteúdo de sal no músculo >1 que o mesmo contém. alimentos, e a melhora da quae ≤ 4 g/100 g (na fase aquosa); lidade sensorial prevalece sobre ii) levemente salgado (lightly as demais funcionalidades. Para salted fish): conteúdo de sal no McCaughey (2007), o sódio é músculo > 4 e ≤ 10 g/100 g essencial para a função fisiológi(fase aquosa); iii) salga média ca normal dos seres humanos e (medium salted fish): conteúdo outros animais. É o cátion mais prevalente no líquido de sal no músculo > 10 e ≤ 20 g/100 g (fase aquosa); extracelular e as diminuições nos níveis de sódio resule iv) salga forte (heavily salted fish): conteúdo de sal no tam em reduções no volume sanguíneo e na pressão músculo > 20 g/100 g (fase aquosa). No Brasil, o RTIQ que podem ser fatais. Assim, tem havido pressão sede peixe salgado e salgado seco (Brasil, 2019) menciona letiva para que os animais consigam manter os níveis que o conteúdo de sal mínimo deve ser de 12 g/100g de sódio, e dois processos permitiram isso. O primei(salga média, segundo o Codex). ro é a conservação do sódio presente no organismo, Os produtos levemente salgados pela injeção de salque é realizado através da reabsorção nos rins e oumoura estão cada vez mais sendo produzidos e comerciatros órgãos. A segunda é a capacidade de identificar o lizados na Europa, e até o momento não existe nenhuma sódio quando ele é encontrado no meio ambiente e incerteza ou preocupação por parte dos consumidores consumir quantidades especialmente grandes, quando sobre o consumo seguro desses produtos curados. E necessário. o interessante é que esses produtos (levemente salgaMuitos estudos epidemiológicos demonstraram que dos) são consumidos diretamente sem a necessidade a alta ingestão de sal está associada ao aumento do risco de serem dessalgados. Nesse caso, o consumidor deve de elevada pressão arterial. No estudo INTERSALT, a estar ciente do conteúdo de sal que o mesmo contém. associação entre a pressão arterial e a ingestão de sal foi
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avaliada em 52 comunidades com diferentes formas de ingestão de sal (INTERSALT Cooperative Group, 1988; Elliott, 1989). Quatro comunidades estudadas tiveram baixa ingestão de sal (≤ 3 g / dia) e as demais apresentaram ingestão de 6-12 g / dia de sal. O estudo mostrou que houve uma relação positiva entre a ingestão de sal e a pressão arterial. Houve também uma relação positiva e altamente significativa entre o aumento da pressão arterial com a idade e a ingestão de sal (WHO, 2006). Com bases nesses estudos, a ingestão adequada do Na+ para adultos é estimada em ~1500 mg. Ruusunen et al. (2003) comentam que devido ao papel do sódio no desenvolvimento da hipertensão em indivíduos sensíveis ao sódio, as autoridades reguladoras e de saúde pública recomendaram uma redução na ingestão de cloreto de sódio. No entanto, algumas opiniões contraditórias sobre o efeito do sódio também foram apresentadas. Segundo a World Heath Organization (WHO, 2006), o consumo diário recomendado de sódio deve ser inferior a 2000 mg de sódio. As quantidades do Na+ podem ser convertidas em NaCl, usando o fator “2,5”; consequentemente a quantidade diária necessária do Na+ é equivalente a 3,75 a 5,00 g de sal de cozinha por dia. Várias agências nacionais e internacionais recomendam ingestões individuais de sódio na dieta de ≤ 100 mmol (6 g de sal) por dia e, em alguns casos, ≤ 65 mmol (4 g de sal) por dia. As consultas com especialistas da OMS e da OMS/FAO recomendaram que a média da população para o consumo de sal seja <5 g / dia. Na maioria dos países europeus, há uma grande variedade de recomendações quantitativas e/ou qualitativas sobre a ingestão de sal. Por exemplo, na Holanda (recomendação é <9 g NaCl/dia), e em Portugal (<5g NaCl/dia). Na Grécia e na Hungria, apenas as recomendações dietéticas gerais estão disponíveis (por exemplo, “evite sal e alimentos ricos em sal”). Na Ásia, foram encontradas recomendações nutricionais para quatro países e variaram de <5 g/dia (Cingapura) para <10 g/ dia (Japão). A Austrália e Nova Zelândia compartilham o valor de <6 g/dia. Na América do Norte, a ingestão no Canadá e EUA é <6 g/dia, e ainda nos EUA existe uma recomendação específica (<4 g/dia) para grupos especiais. Na América do Sul, alguns países desenvolveram conselhos gerais (“reduzir a ingestão de sal”, “moderação na ingestão de sal”) e o Brasil é o único país com uma recomendação nutricional (<5 g/dia de sal). Sarno et al. (2013) também declararam em seu estudo sobre a estimativa de consumo de sódio pela população brasileira, que o consumo de sódio se apresenta acima de 2,3 g/dia na maioria das populações adultas de diversos países (Brown et al., 2009), enquanto o
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limite máximo recomendado pela Organização Mundial da Saúde é de 2 g/dia (WHO, 2006). Atualmente, em especial nos países industrializados, a ingestão excessiva do Na (agravada pelo excesso de Cl), e não a deficiência, desempenha importante papel como causa e no tratamento da hipertensão. Em pessoas com sensibilidade hereditária ao cloreto de sódio, a sua ingestão excessiva causa hipertensão. Como em geral não se sabe quem é “sensível ao sal”, é desejável como medida preventiva, uma ampla diminuição da ingestão de NaCl (< 6g/dia). Segundo a RDC nº 24, de 15 de junho de 2010 (Brasil, 2010), um alimento com quantidade elevada de sódio é aquele que possui em sua composição uma quantidade igual ou superior a 400 mg de sódio por 100g ou 100 ml na forma como está exposto à venda. Além disso, os estabelecimentos que comercializam os produtos que contém tais nutrientes deverão adaptar seus anúncios com os dizeres que facilitem a orientação do consumidor no momento da aquisição de determinado produto. Deve-se ressaltar que a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) ressalta a importância de assegurar a todas e todos o direito humano à alimentação adequada e saudável. E é nesse contexto que vem realizando sua cooperação técnica com as autoridades brasileiras e sociedade civil por meio de desenvolvimento de capacidades, produção e sistematização de evidências e boas práticas em alimentação e nutrição. Conforme os dados da Tabela I, percebe-se claramente grande variabilidade nos teores de sódio em várias espécies, e muitas delas acima do limite de sódio encontrado na IN 21/2017 (134 mg).
O processo tecnológico vs. teor de sódio no pescado
Baseado nas informações científicas, a indústria do pescado e os consumidores tornaram-se mais conscientes da relação entre sódio e hipertensão e, portanto, em muitos países, a demanda por uma variedade de produtos de pescado com baixo teor de sal aumentou. Um exemplo é o peixe levemente salgado. A definição de produtos salgados, segundo Sik Na (2008), foi esclarecida pelo teor de sal no músculo do peixe. A definição de produtos salgados foi esclarecida pelo teor de sal no músculo: Forte (> 20%), Médio (15-20%) e Leve (10-15%). O estudo desenvolvido por Åsli & Mørkøre (2012) foi o primeiro a demonstrar que a injeção de salmoura em combinação do NaCl e NaHCO3 é um meio rápido e simples de produzir filés de baca-
lhau com baixo teor de sal, que possuem bons atributos de qualidade e a vantagem desejável de ser menor em sódio do que o produto comercial normal. Produtos com baixo teor de sódio podem ser obtidos, independente da tecnologia empregada, com a inclusão de novos ingredientes/aditivos, sem comprometer também a segurança do consumidor. Para Åsli & Mørkøre (2012) os países nórdicos são os principais exportadores de bacalhau salgado e, nos últimos anos, os produtos de bacalhau levemente salgados (~ 2% NaCl) tornaram-se populares, especialmente no sul da Europa. Isto está de acordo com uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2006, de uma ingestão dietética máxima de 5 g de cloreto de sódio (NaCl) por dia para adultos, uma vez que uma maior ingestão de sódio (Na+) pode corresponder à hipertensão e doenças cardiovasculares. Apesar da sintonia entre os teores de sal limitados pela legislação (Codex) e dos produtos existentes no mercado, ainda existem discussões sobre a ingestão diária de sódio pelo consumidor. Para Angus (2007) tem havido considerável discussão sobre a ingestão de
sódio por vários anos, uma vez que foi estabelecido que as ingestões são altas em comparação com as necessidades fisiológicas. Os níveis-alvo de sal para conservas de peixe (300 mg de sódio por 100 g ou 0,8 g de sal por 100 g) foram maiores para refletir a variação natural nos níveis de sal em peixes e técnicas de processamento padrão. Essa preocupação torna-se efetiva no momento em que não se permite a comercialização ou registro do produto junto ao órgão competente – de fiscalização. Uma vez que o teor de sódio esteja descrito na rotulagem, certamente o consumidor saberá o que está consumindo e irá optar ou não pela sua compra.
Teor de sódio no pescado vs. segurança alimentar vs. legislação
“A Segurança Alimentar e Nutricional é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais tendo como base práticas promotoras da saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis” (Lei
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Tabela 1. Teores de sódio encontrado nas principais bases de dados internacionais sobre o valor nutricional de alimentos.
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11.346/2006). Práticas nacionais e internacionais que asseguram a qualidade do pescado (resfriado) sugerem a imersão do peixe inteiro em soluções salinas (salmoura) ou água do mar refrigerada (ou com gelo), antes de ser processado em filés. Esses filés frescos também podem ser imersos em soluções contendo vários compostos, como sais, fosfatos ou sulfitos antes do congelamento, a fim de reter a umidade no descongelamento. Além de ter um importante significado tecnológico, estes procedimentos de armazenamento e preservação do pescado pós-captura podem aumentar os níveis de sódio na carne (FAO, 2016), porém, os teores de sódio não alcançam os limites recomendados pela WHO. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) recomenda que quando ofertada uma refeição diária, a quantidade de sódio per capita seja de 400 mg; se ofertada duas refeições o per capita passa 600 mg e para 1400 mg de sódio, quando ofertadas três ou mais refeições (Brasil, 2013). Segundo a Instrução Normativa N° 21, de 31 de maio de 2017, que aprova o Regulamento Técnico que fixa a identidade e as características de qualidade que deve apresentar o peixe congelado, limita no Art. 7° inciso IV o teor de sódio em no máximo 134 mg de Na/100g de tecido muscular. Como já comentado anteriormente sobre a grande variabilidade dos teores de sódio no pescado, preocupa-me que essa limitação (134 mg Na/100g) venha a
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dificultar tanto o fiscal agropecuário federal, como o empresário (importador ou processador) no momento de alguma não conformidade com a IN 21/2017, somente quando esteja se tratando unicamente desse parâmetro (teor de sódio). Podemos afirmar também que, se esse valor for acrescido de 100% (268mg/100g) ou 200% (400mg/100g) ou mais, através de um processo tecnológico (imersão em salmoura como prevenção da perda de líquido no descongelamento), sequer ultrapassará o limite de ingestão diário de sódio (recomendação WHO: < 2000 mgNa/dia), o que não prejudicaria a saúde do consumidor, porém deve ser incluída na Tabela de Informações Nutricionais na rotulagem do produto. Podemos concluir que os teores de sódio e fosfato encontrados nos produtos a base de pescado (i.e., levemente salgados, ou camarão que tenha sido tratado com fosfato/salmoura antes do descasque, ou o pescado que tenha sido congelado em salmoura), mesmo que acima do limite sugerido na IN 21/2017, não traz qualquer prejuízo de saúde, uma vez que os fosfatos não são considerados substâncias tóxicas e que as quantidades utilizadas hoje ainda estão muito abaixo da ingestão diária aceitável, e muitos dos alimentos oferecidos para a população excedem o limite recomendado pela World Heath Organization, e sequer são retirados do mercado ou proibidos de serem comercializados. Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos
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Rapid growth in greenhouse gas emissions from the adoption of industrial-scale aquaculture Autores: Junji Yuan, Jian Xiang, Deyan Liu, Hojeong Kang, Tiehu He, Sunghyun Kim, Yongxin Lin, Chris Freeman e Weixin Ding
O artigo recentemente publicado na revista científica Nature Climate Change (V. 9, p. 318–322, 04/mar/2019), de autoria de Yuan e colaboradores, traz à tona um importante alerta sobre o aumento da emissão de gases do efeito estufa provocado pela aquicultura extensiva. Principais pontos do artigo: Os volumes de produção aquícola já ultrapassaram àqueles da captura mundial, com a China dominando os números globais, principalmente através de substanciais alterações no uso do solo. Mais da metade dos sistemas chineses de aquicultura continental são conversões de antigos tanques de produção de arroz irrigado; Entretanto, as implicações sobre os gases de efeito estufa desta conversão ainda não foram efetivamente quantificados; Os pesquisadores mediram durante um ano as emissões de gás metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e gás carbônico (CO2) nos tanques de arroz e, adicionalmente, em novos viveiros de produção extensiva de caranguejos; A conversão da rizicultura em aquicultura aumentou o potencial de aquecimento global de 8,15 ± 0,43 para 28,0 ± 4,1 mgCO2eq ha−1, devido ao aumento das emissões de CH4;
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Após a compilação de um banco de dados mundial de diferentes sistemas aquícolas de água doce, estimou-se que os 21 principais produtores liberaram 6,04 ± 1,17 TgCH4 e 36,7 ± 6,1 GgN2O em 2014; Calculou-se que 80,3% do total de CH4 foi emitido em sistemas aquícolas extensivos (em viveiros rasos), com emissões muito inferiores em sistemas intensivos com aeração contínua; Os pesquisadores propõem a adoção urgente de “sistemas intensivos com aeração”, visando minimizar o impacto global do aumento significativo das emissões de CH4, originário da conversão de fazendas de rizicultura em viveiros de aquicultura.
Saiba mais no portal https://www.nature.com/
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quando os vizinhos sĂŁo produtores
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contagem de peixes
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Roberto Bianchini Derner Laboratório de Cultivo de Algas Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC Florianópolis, SC roberto.derner@ufsc.br
Pesquisas com microalgas no NPDEAS/ UFPR
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Os fotobiorreatores foram patenteados no Brasil e eguindo com a ideia de apresentar alguns dos laboratórios que se destacam nas atividades nos EUA e podem ser utilizados efluentes de procesrelacionadas ao cultivo de microalgas, nesta Coluna sos agroindustriais, como de biodigestores da suinoapresentamos o Núcleo de Pesquisa e Desenvolvi- cultura, como fonte de nutrientes para o cultivo das mento em Energia Autossustentável (NPDEAS, http:// microalgas. Ao final deste processo, após a separação npdeas.blogspot.com), situado no Centro Politécni- das células microalgais, a água residual apresenta uma co da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba. redução de 95 a 99% da concentração inicial de fosO NPDEAS foi fundado em 2008 e conta com uma fato e nitrogênio, alcançando a classificação CONAMA competente equipe composta por oito professores de Classe III. As pesquisas desenvolvidas a partir das microalgas diferentes departamentos da UFPR, alunos do ensino médio, de graduação e pós-graduação, computando contemplam a produção de biocombustíveis (etanol, mais de 300 egressos. O Núcleo não possui técnicos biogás e biodiesel), produção de ração animal (para ou funcionários, todo o trabalho realizado por alunos pets e peixes), produção de biohidrogênio, aproveitaé supervisionado pelo Gerente de Programas e pro- mento de efluentes e sistemas de: i) automatização do cultivo; fessor do Departamento de Engenharia Elétrica André ii) purificação de biogás; Bellin Mariano. Desta forma, através de um projeto iii) purificação de emissão de geradores; de extensão chamado Ciência para Todos (www.cieniv) purificação de emissões da incineração de resíciaufpr.blogspot.com), coordenado pelo Professor, são viabilizados estágios para alunos de Engenharia Elétrica, duos sólidos urbanos; v) filtração tangencial. Engenharia Mecânica, Engenharia Química e Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia, que integram as equipes de operação dos fotobiorreatores, controle de qualidade e Figura 1. Vista externa do NPDEAS© Roberto Derner separação unitária. O projeto inicial consistiu no desenvolvimento de um prédio autossustentável energeticamente a partir da biomassa obtida em culturas de microalgas. As iniciativas levaram à instalação do Núcleo (Figura 1) que possui 1.400 m2 de área construída e abriga laboratórios, salas de cultivos, gabinetes, sala de aula, sala de reuniões, casa de máquinas e um pátio industrial. Neste processo, foram desenvolvidos e construídos 5 fotobiorreatores tubulares compactos (Figura 2), com 8 m de altura e ocupando uma área de apenas 10 m2 cada um, totalizam 3,5 km de tubos transparentes.
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BIOTECNOLOGIA DE
ALGAS
Figura 2. Fotobiorreator tubular compacto© Roberto Derner
Figura 3. Sistema de geração de eletricidade a partir de Resíduos Sólidos Urbanos.© Roberto Derner
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A inovação faz parte do DNA da equipe interdisciplinar de professores dos diversos departamentos, responsáveis pelas orientações dos trabalhos de mestrado e doutorado desenvolvidos pelo projeto. Além disso, o projeto de extensão criou a Iniciativa Startup Experience para alunos de graduação que trabalham em sistema de coworking e desenvolvem soluções IoT para questões ambientais, de mobilidade urbana, energia e saúde. Uma dessas iniciativas consiste no BIO+, um sistema automatizado para controle de cultivos de microalgas em fotobiorreatores e/ou lagoas baseado no monitoramento da densidade populacional ótima. O sistema está em constante desenvolvimento e em fase de implementação nos fotobiorreatores tubulares compactos, sendo que uma das metas é a viabilização do cultivo de microalgas sem a dependência de uma equipe altamente especializada para acompanhamento dos processos produtivos. Pesquisas sobre a produção e o uso de ração com adição de microalgas apontaram resultados interessantes, promovendo proteção contra danos no DNA de peixes e redução de colesterol total e triglicerídeos em cães. A purificação de biogás com fotobiorreatores tubulares levou a obtenção de biogás com 95% do poder calorífico semelhante ao gás natural. Contudo, a pesquisa mais recente do NPDEAS viabilizou patente e licenciamento da tecnologia para a empresa Luftech. Nesta pesquisa, o Grupo trabalhou no desenvolvimento de um sistema de aproveitamento energético de resíduos sólidos urbanos (Figura 3), no qual o lixo é transformado em eletricidade e as emissões são tratadas pelas microalgas. Essa tecnologia permite resolver em parte a geração de lixo nos grandes centros urbanos através da aplicação das microalgas para biofixação de CO2 e outros gases presentes na emissão da incineração. Além dos fotobiorreatores operacionais na escala de engenharia, o Núcleo possui o sistema de tratamento de resíduos em operação e disponível à visitação da comunidade. O visitante acompanha a transformação do lixo em eletricidade e visualiza todo o processo de fixação biológica promovido pelas microalgas. Vale a pena destacar que o projeto de extensão do núcleo promove visitas frequentes de escolas do ensino médio e fundamental ao NPDEAS, permitindo aos visitantes uma imersão nos processos de pesquisa desenvolvidos na UFPR.
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André Camargo Sócio Fundador da Escama Forte Botucatu, SP andre@escamaforte.com.br
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O “novo” assusta T
udo aquilo que é desconhecido causa para nós uma restrição imediata, praticamente todos os vertebrados assumem uma postura de medo ou receio quando estão frente a algo que ainda não experimentaram. Particularmente em relação à sociedade humana isso também acontece e a frequência com que precisamos lidar com isso é cada vez maior. Os tempos modernos onde a velocidade das interações humanas é cada vez maior é que comanda este processo. Imediatamente alguns poderiam dizer: e o que isso tem a ver com aquicultura? Talvez dentro das atividades agropecuárias a aquicultura seja a que possui o maior desafio de enfrentar sem medo aquilo que está por vir. Agora sim podemos dizer que nascemos e somos uma atividade representativa para o país e a ser para o mundo todo. Isso traz algo novo a todos os tomadores de decisão e guarda muito sucesso àqueles que sempre acreditaram na atividade e mesmo sem saber perfeitamente o caminho sabem exatamente onde querem chegar. O ganho de importância frente ao cenário mundial e as posturas tomadas por nosso país neste momento definem os desafios a serem por nós encarados. A aquicultura brasileira não é mais a coitadinha tratada por muitos no passado como alguém que precisa de ajuda para sobreviver, diferente de sua irmã, pesca, não somos um problema social e para a certeza de todos somos a grande referência para o abastecimento de pescado da sociedade contemporânea para os próximos 20 anos. Não podemos mais temer o engajamento do setor produtivo com a pesquisa pública brasileira, pois o setor quer e precisa se abastecer e bancar a geração de informações úteis ao seu desenvolvimento. Não podemos mais ficar reféns de compradores dos mais longínquos lugares do mundo, pois nós temos cada vez mais aquilo que a sociedade precisa, pescado de
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qualidade. Não podemos mais deixar que o desconhecimento de outros setores da sociedade brasileira impeça o desenvolvimento sustentável desta atividade. Nós somos responsáveis pelo que fazemos e assumimos 100% deste universo. Finalmente a aquicultura brasileira encontra-se neste momento alicerçada pelo setor produtivo e as principais tomadas de decisão relativas a ela são tomadas por seus representantes políticos. Devemos parabenizar aqui os representantes do setor público que durante anos carregaram nossa atividade aos trancos e barrancos sem que a sociedade os referendasse ou valorizasse. Devemos também reorganizar a participação deste tão importante setor público nas relações com a produção, pois na sociedade moderna não existe mais espaço para a ineficiência. Todo o recurso utilizado por um representante público para a sociedade que o paga, deverá ser justificado por viabilidade e não mais por uma chancela. Desta forma devemos todos estar cientes de que o novo está batendo à porta, chegou a hora de nos unificarmos, meu vizinho não é mais meu concorrente e sim meu aliado. Se quisermos realmente assumir este posto que o mundo espera, temos que organizar nossas ações e planejar muito bem aquilo que está por vir em todos os elos da cadeia produtiva. Os cases de sucesso ao longo do mundo na produção aquícola devem ser usados como exemplo, porém somos nós a assumir o manche deste crescimento que deve acontecer de forma muito acentuada a partir de agora. Devemos nos planejar o máximo possível para aquilo que ainda não vivemos, mas jamais precisamos ter medo deste novo momento que vamos enfrentar. Nós estamos prontos e seremos os protagonistas da transição que nos trará saudade do tempo em que quebrávamos pedras. Bem-vindos ao futuro e ao Brasil como um dos maiores produtores de pescado do mundo.
NUTRIÇÃO AQUÍCOLA Artur Nishioka Rombenso CSIRO – Austrália IPEMAR – Brasil artur.rombenso@csiro.au *As opiniões citadas abaixo são exclusivamente pessoais do autor e não necessariamente remetem as opiniões das instituições vinculadas ao mesmo.
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m fevereiro desse ano fui convidado para dar uma palestra no evento F3 (Fish free feeds) em São Francisco, Estados Unidos, organizado pelo Antrophocene Institute, órgão filantrópico que tem como um dos seus objetivos a preservação dos oceanos. O evento F3 tem como intuito incentivar o uso de dietas livres de farinha e óleo de peixe na aquacultura através de inovação, reconhecimento, prestígio e premiação. Esse último evento focou na problemática da substituição do óleo de peixe e contou com a presença de todos os membros da cadeia aquícola (academia, empresas de ração, empresas de ingredientes, investidores, produtores e mídia). Diferente de congressos tradicionais o evento F3 é uma espécie de caça talentos para solucionar o problema em questão, e nesse caso a competição consistiu no desenvolvimento de produtos inovadores com as características específicas: forma líquida ou em pó; não conter ou ser derivado de qualquer animal marinho como peixe, lula e camarão; não conter subproduto aquícola e obrigatoriedade em conter os níveis em porcentagem de lipídios totais de ácido araquidônico – ARA-20:4n-6 de 0,2, de ácido eicosapentaenóico – EPA-20:5n-3 de 8,4, de ácido docosaexaenóico – DHA-22:6n-3 de 4,9, e uma razão de ácidos graxos n-3/n-6 de 12, como óleo de peixe substituto. Nesse contexto, o evento apresentou seções de ideias (Brainstorm sessions), painéis de discussão envolvendo investidores, empresas de biotecnologia, pesquisadores em nutrição, as maiores empresas de ração, além da mídia e, por fim, os participantes da competição apresentaram seus produtos para o público. O ganhador será anunciado nos próximos meses e para mais informações sobre a iniciativa F3 acessar a página (https://f3meeting.com). Fiquei fascinado ao testemunhar como a forte tendência de usar alimentos livres de farinha e óleo de pei-
xe na aquacultura, liderada por protecionistas dos oceanos, está influenciando e de alguma forma guiando as futuras direções das indústrias de alimentos aquícolas. Embora a farinha e o óleo de peixe estejam incluídos nas dietas, a princípio para garantir a viabilidade econômica, as empresas de alimentos aquícolas estão tendo que se adaptar a essa nova abordagem, que também é controversa. Como os diretores de sustentabilidade das principais empresas globais de alimentos aquícolas (Biomar, Cargill, Nutreco, Min Phu, entre outras) destacaram no evento, o significado de sustentabilidade é tão amplo e o setor aquícola ainda não possui sua própria definição. Então, eu gostaria de terminar esta coluna com algumas reflexões. Quais são os benefícios dos alimentos aquícolas livres de farinha e óleo de peixe? Qual é o contexto de sustentabilidade mais adequado na aquacultura e na indústria de alimentos aquícolas? O uso de farinha e óleo de peixe derivados de subprodutos da aquacultura é sustentável? Se a aquacultura parar de usar farinha de peixe e óleo de peixe, o que acontecerá com o excedente desses ingredientes? Existe uma real demanda para esse tipo de alimento aquícola? Em caso afirmativo, as empresas de ração realmente produzirão um alimento mais caro para atender essa demanda? Já existe conhecimento suficiente em termos nutricionais para substituir por completo a farinha e o óleo de peixe na aquacultura durante todo o ciclo de produção? Qual sua opinião a respeito? Espero que o conteúdo dessa coluna tenha sido novo e também tenha despertado o seu interesse nesse assunto bastante atual e de certa forma controverso. Independente da sua preferência ou ponto de vista, um fato empolgante é que estamos vivendo essa tendência. Assim, podemos assistir passivamente o que está por vir ou podemos agir e fazer parte desse processo.
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Iniciativa F3 (Fish free feeds)
Genética Rodolfo Luis Petersen Laboratório de Melhoramento Genético de Organismos Aquáticos - GECEMar Universidade Federal do Paraná - UFPR Pontal do Paraná, PR rodolfopetersen@hotmail.com
Definição da estratégia de melhoramento: Seleção ou cruzamento?
Parte I: Entendendo a transferência de informações genéticas
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ma vez reunidas as populações base, definida a caraterística a melhorar, para qual sistema e região de cultivo, devemos definir qual será a estratégia de melhoramento. E aqui devemos nos adentrar em princípios da genética que não são muito simples de explicar, nem muito fáceis de entender. Como já vimos, o FENÓTIPO está composto pela combinação da composição genética e do efeito do ambiente de cultivo. Decompondo isto, podemos assumir que a VARIABILIDADE FENOTÍPICA é igual a somatória da VARIABILIDADE GENÉTICA e a VARIABILIDADE AMBIENTAL. A variância genética tem duas componentes que afetam simultaneamente o fenótipo: os efeitos aditivos e os efeitos de dominância dos alelos. Quando falamos de ALELOS, nos referimos a alternativas observadas nos genes com relação a informação que ele carrega para a produção de uma determinada proteína. Cada gene possui dois alelos (alternativas informacionais) em um indivíduo, porém numa população, cada gene pode ter vários alelos. Uma caraterística quantitativa como as que costumamos escolher para o melhoramento, por exemplo, crescimento ou resistência a determinada doença, é definida por um número elevado de genes atuando sobre a mesma. A combinação dos efeitos aditivos e de dominância das centenas de genes que podem atuar numa caraterística quantitativa, em conjunto com o ambiente, definem o fenótipo do animal. A variabilidade genética de uma população estará definida pelo número de alelos de cada gene e suas frequências. Em cada geração de reprodução, os gametas carregam um único alelo do par de alelos que cada indivíduo possui, de cada gene. Quando no momento da fertilização os gametas se encontram, e os alelos se juntam novamente para conformar o genótipo do gene de um indivíduo (combinação de
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alelos nos cromossomos homólogos), acontece uma reconfiguração da variabilidade genética da população filial (descendentes). Neste contexto, a variância genética total é a combinação dos efeitos aditivos e os efeitos de dominância dos alelos. O efeito aditivo é a somatória do efeito dos alelos individualmente, que contribuem para a caraterística de interesse. Já o efeito de dominância depende de como os alelos que contribuem para a característica se combinam no genótipo, no momento da fertilização. O valor dos efeitos vai mudando ao longo das gerações. O efeito individual de cada alelo é repassado de geração em geração por efeito da SELEÇÃO. Selecionando os indivíduos estamos selecionando alelos e aumentando sua frequência na população. Já o efeito da combinação de alelos se desmancha em cada geração, pois para cada estação de reprodução existirá a formação de uma nova população de gametas. Os alelos que estavam combinados na geração parental se separam no processo de formação dos óvulos e espermatozoides, mais precisamente na divisão meiótica que acontece na formação das células sexuais. Desta forma, após a cópula, acontecerá uma nova combinação de alelos na geração filial. O efeito dessa nova combinação, onde pode existir uma interação entre alelos dentro de um mesmo gene, é chamada de variância de dominância. A variância genética aditiva é a variância herdável, já que é o efeito dos alelos individuais que são transferidos em função de que, como já foi explicado, a combinação de alelos no genótipo é aleatória no momento da reprodução, e que novas combinações são obtidas em cada estação de reprodução da população trabalhada. Numa determinada população base, ou numa determinada geração de seleção, a variação genética terá as duas componentes, a quantidade de variação em função da ação aditiva dos genes, como também
do seu valor, e os geneticistas quantitativos a consideram depreciável. Conhecer o valor destes efeitos e sua proporção dentro da variabilidade fenotípica é o que vai nos dizer a melhor e mais eficiente estratégia a adotar em um programa de melhoramento. A essa proporção se a denomina HERDABILIDADE. Relacionando o tema com a coluna anterior, quando maior for a variabilidade inicial da população base, maior poderá ser a variação genética aditiva inicial (maior número de alelos atuando sobre o fenótipo de interesse), sendo maior a possibilidade do uso da estratégia de SELEÇÃO nos programas de melhoramento.
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em função dos efeitos da combinação de alelos, ou seja, os efeitos de dominância. Quando a variância aditiva é baixa, as populações não responderão eficientemente à seleção. Se a variância aditiva é baixa, quer dizer que a variância de dominância é alta. Nesse caso, teremos que abdicar da SELEÇÃO e fazer uso do CRUZAMENTO. A exploração da variância genética de dominância é o princípio básico da hibridação de populações, podendo ser intraespecífica ou interespecífica. Temos ainda a variância genética de epistasia, que nada mais é do que o efeito da interação de alelos de diferentes genes na caraterística de interesse. A variância genética de epistasia é de difícil estimativa
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Maurício Gustavo Coelho Emerenciano CSIRO - Austrália Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC mauricioemerenciano@hotmail.com *As opiniões citadas abaixo são exclusivamente pessoais do autor e não necessariamente remetem as opiniões das instituições vinculadas ao mesmo.
Dragão chinês: o que esperar da carcinicultura do maior gigante mundial?
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i hao” aos leitores da Aquaculture Brasil! Hoje o assunto é China, a meca da Aquicultura mundial. A coluna Green Technologies desta edição aborda como tema uma reflexão sobre os desafios e perspectivas da carcinicultura chinesa. Uma indústria que na última década sofreu (e ainda sofre) com o efeito de diversas doenças, e viu suas cifras de produção serem afetadas nas estatísticas globais. Em recente visita ao país para proferir palestra e visitar algumas fazendas e hatcheries (Laboratórios comerciais produtores de pós-larvas) pude dialogar com técnicos, pesquisadores e ver de perto esse cenário. As doenças como a EMS em 2011, EHP e, mais recentemente, uma síndrome relacionada ao crescimento e desuniformidade dos lotes, foram e têm sido grandes obstáculos para impulsionar a indústria e as exportações. Por falar nesta última, a China devido aos problemas acima mencionados, de grande exportador, transformou-se em grande importador do crustáceo. Mas o dragão quer mudar este cenário. Aos poucos, a carcinicultura chinesa vem buscando algumas alternativas, como tecnificar e diversificar sua indústria. Algumas
apostas se concentram em : (I) intensificação dos cultivos e implementação de técnicas, tais como revestimento dos viveiros, uso de diversos biorremediadores e demais insumos; (II) busca por reprodutores livres de doenças e de qualidade superior; e (III) diversificação de espécies. Em relação ao tópico I, acho válido esse caminho desde que o dia a dia das fazendas seja intimamente acompanhado de práticas de biossegurança, incluindo cuidados na captação, tratamento e reuso de água. Infelizmente isso ainda esta longe de ser uma realidade na carcinicultura chinesa. Em relação ao tópico II, a aposta é igualmente válida, mas desde que as fazendas também façam a sua parte (o que não vem acontecendo). Já em relação ao último ponto, a diversificação pode ser uma opção em locais com acesso a água com altas salinidades, visando atender às exigências ambientais de espécies, tais como o Penaeus monodon (camarão tigre) ou o Marsupenaeus japonicus (camarão japonês). Este último pode custar até três vezes mais que o camarão branco Litopenaeus vannamei, espécie cujo preço vem caindo relativamente nos últimos meses, principalmente devido
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Figura 1. Fazendas intensivas no sul da China operando com constantes trocas de água.© Maurício G. C. Emerenciano
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TECHNOLOGIES a enxurrada de camarões vindos da Índia e Equador. No entanto, se os cuidados nos cultivos e a adoção de práticas de biossegurança não forem postos em prática, infelizmente é questão de tempo para que estes nichos sejam afetados. Assim, como a saída não é simples e leva certo tempo, a China vem investindo em parcerias com outros países tais como Indonésia e Vietnã. Aquisição de fazendas e demais tipos de parcerias vêm sido constante-
mente divulgados na mídia e parece ser uma alternativa rápida para não deixar de abastecer aquele país. Ainda em tempo, a elevação nos custos de produção (impulsionado em partes pelos custos com mão de obra) atrelados os desafios acima mencionados fazem do futuro da carcinicultura chinesa ainda incerto. Apostas em ciência e tecnologia parecem ser um caminho já em curso. Sigo ansioso para escutar novas (e boas) histórias do dragão chinês!
Figura 2. Exemplares do camarão japonês (a) e do camarão tigre (b) no mercado de Huochetou, Hainan, China. © Maurício G. C. Emerenciano A.
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Santiago Benites de Pádua Biovet Vaxxinova Vargem Grande Paulista, SP santiago.padua@biovet.com.br
Girodactilíase em larvas e alevinos de tilápias girodactilíase é uma doença parasitária ocasio- a infecção oportunista por bactérias que naturalmente A nada por vermes monogenéticos microscópicos habitam a pele dos animais, na qual, o bastonete Grampertencentes ao gênero Gyrodactylus. No Brasil, a ocor- -negativo Flavobacterium columnare frequentemente
rência de Gyrodactylus cichlidarum tem sido observada entre as principais causas de problemas sanitários durante a larvicultura e alevinagem da tilápia do Nilo, infestando também peixes maiores, no entanto, as principais lesões causadas nos animais são observadas na fase inicial de criação. Este agente é um ectoparasito, responsável por causar infestação a pele dos animais, especialmente nadadeiras e corpo, sendo ocasionalmente observados nas brânquias. Além disso, possui ciclo de vida direto (não necessita de hospedeiros intermediários), sendo vivíparos, conseguindo se reproduzir sobre os próprios animais infestados. As lesões ocasionadas nos peixes são devido à dilaceração do tegumento devido ao mecanismo de fixação utilizado pelo parasito, o qual utiliza ganchos e ancoras para penetrar a pele do animal e causar as injúrias sobre os peixes. A partir destas lesões, também se favorece
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Figura 1. Estruturas de fixação do Gyrodactylus cichlidarum, um monogênea de larvas e alevinos de tilápia do Nilo. Foto cordialmente cedida pela Dra Thais Heloisa Vaz Farias.
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pode ser diagnosticado em situações de casos severos de girodactilíase tegumentar. Entre as estratégias para controle e profilaxia desta enfermidade nas fazendas berçário, a limpeza e desinfecção de ovos deve ser a primeira estratégia utilizada, uma vez que estes parasitos são transmitidos para a prole, principalmente, durante o processo de incubação de ovos na boca das matrizes. Este procedimento deve ser realizado a partir da limpeza dos ovos fecundados em solução salina (2,5%), com posterior reidratação em água e seguinte desinfecção com uso de cloramina-T, ajustando a dose e o tempo de exposição de acordo com o pH da água. Para casos de girodactilíase em larvas ou alevinos, o uso da cloramina-T pode ser comprometido caso os peixes sejam criados em viveiros escavados, ou em ambiente que tenha presença de matéria orgânica em suspensão, uma vez que ocorre perda de sua efetividade. Nestes casos, o uso do organofosforado Triclorfon (Metrifonato) é a terapia de eleição, sendo efetiva contra vermes monogenéticos. Para rotina de incubação de ovos de tilápia nas fazendas-berçário, o uso da prática de desinfecção de ovos deve ser adotado como protocolo padrão. Esta estratégia é a forma de profilaxia mais efetiva contra doenças que possam ser veiculadas pelas matrizes durante o processo de incubação natural de ovos, que incluem também protozoozes como a tricodiníase e quilodonelose, além de eliminar bactérias contaminantes que diminuem a taxa de eclosão dos ovos embrionados durante o processo de incubação artificial. Já o uso de medicamentos antiparasitários, como o organofosforado Triclorfon, deve ser realizado somente a partir da confirmação de casos da doença detectada no plantel. É importante ressaltar que este fármaco possui ação limitada contra protozoários parasitos (p. ex. Trichodina e Chilodonella sp.), além de não ter efeito algum sobre bactérias contaminantes.
Ricardo Vieira Rodrigues Estação Marinha de Aquacultura - EMA Universidade Federal do Rio Grande - FURG Rio Grande, RS vr.ricardo@gmail.com
este ano de 2019 tive a oportunidadae de visitar sário, dependendo da enfermidade. Interessante que para a empresa Martec na Cidade de Quepos, Costa minimizar a proliferação de possíveis patógenos e doenças, Rica. A empresa tem mais de 30 anos operando no setor os tanques de berçário ficam distantes aproximadamente de beneficiamento de pescado e aproximadamente há 10 300 m dos peixes que permancem na engorda final. Como anos iniciou a produção do pargo Lutjanus guttatus. Atual- a empresa possui uma conseção de 150 hectares de área mente a empresa possui uma planta de processamento para utilização para maricultura, isso não é um problema. Foi possível acompanhar a chegada de um lote de peixes de pescado oriundo da pesca e dos próprios peixes produzidos por ela. Para a produção do pargo possui labo- despescados na planta de processamento. O peixe chega ratório de produção de juvenis e engorda dos peixes em no gelo, é rapidamente pesado indidualmente e separado tanques-redes em mar aberto, detendo toda a cadeia de por classes de pesos. Peixes com alguma deformidade são produção desta espécie e é a única empresa que produz separados, mas não representam mais de 2% do total. A forma de comercialização dos peixes é inteira com cabepeixes marinhos em tanques-rede na Costa Rica. O laboratório produz aproximadamente 300.000 juve- ça, apenas eviscerado (um peixe do tamanho do prato, nis por mês durante todo o ano, que são transferidos em para ser uma porção individual – Figura 2) e praticamente caixas de transporte para os tanques-rede em mar. Atual- todo o pargo é comercialzado para os Estados Unidos. A empresa está em expansão na parte de maricultura e a mente possuem 22 tanques (Figura 1) para engorda dos peixes, onde 14 tanques de 15 m de diâmetro são utiliza- ideia é terminar o ano com 28 tanques-rede em mar. Atualdos como berçario e 8 tanques de 25 m de diâmetro são mente conta com mais de 50 funcionários diretamente no seutilizados para engorda final. Nos tanques-rede de berçário tor de maricultura (laboratório + fazenda em mar), de várias os peixes são estocados com 2g de peso e permanecem nacionalidades, inclusive brasileiros. Para mais informações a até aproximadamente 150g e engorda final de 150 até 450 respeito da empresa, vídeos sobre a produção do pargo es– 500g, quando os peixes são então despescados. Todo tão disponíveis no Youtube com imagens do laboratório e da o ciclo de produção tem duração de aproximadamente 1 fazenda marinha. ano. A empresa também possui 3 tanques-redes menores onde mantém um “backup” de reprodutores, caso algum problema ocorra com os reprodutores do laboratório. Toda a ração utilizada é produzida na Costa Rica, sendo utilizadas duas formulações: uma ração comercial produzida por uma empresa multinacional e uma ração Figura 2. produzida por uma empresa local que trabalha com uma Pargos formulação aberta juntamente com a Martec e, consprontos para cotantemente, são testadas mudanças na formulação. Problemas com enfermidades bacterianas e parasitárias mercializar. Ricardo podem ocorrer durante a engorda em mar, assim como em © Rodrigues qualquer outra espécie, e o tratamento pode ser necesFigura 1. Tanques para a engorda do pargo Lutjanus guttatus. © Ricardo Rodrigues
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Produção de Pargo na Costa Rica N
Visão aquícola Giovanni Lemos de Mello Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC Editor-chefe da Revista Aquaculture Brasil Laguna, SC giovanni@aquaculturebrasil.com
Biofloco em caixa d’água: triste ilusão
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m 2019, a cada minuto 4,5 milhões de vídeos são visualizados no YouTube, 18,1 milhões de textos são enviados pelo WhatsApp e 188 milhões de e-mails são enviados (dados da Visual Capitalist). Que velocidade de comunicação e disseminação de informações! E as notícias aquícolas, de carona nessa incrível transformação, chegam cada vez mais rápido aos interessados, como você, caro leitor. Falando nisso, quem nunca viu ou leu a respeito da criação de peixes ou camarões em caixas d´água? Notícias boas e ruins, fake news ou informações técnicas relevantes? Eis a questão. A coluna “Atualidades e tendências da aquicultura”, do grande Fábio Sussel, publicada na 6ª edição de nossa revista impressa (e online em 30/07/17) é, até hoje, um dos maiores sucessos do portal Aquaculture Brasil. Somente nos últimos 12 meses, foram 11.546 visualizações (dados estatísticos do Google Analytics), ficando em segundo lugar neste período entre as páginas mais acessadas da AB. O título da coluna em questão: “Criação de peixes em caixas d’água – nova moda entre os iniciantes”. Apesar de, diariamente, quase 32 pessoas lerem o artigo supracitado nos últimos 12 meses, fico impressionado, e igualmente decepcionado, como também cresce o número de interessados em fazer exatamente o que o Sussel não recomendou! “Dá para produzir em caixas de 1.000 L? Não! Comercialmente falando não. Engana-se quem começa a procurar informações sobre esta técnica de cultivo achando que conseguirá renda com poucas caixas de mil litros” (Sussel, 2017). É preciso destacar a irresponsabilidade das pessoas que divulgam este tipo de informação. Nem em caixa d’água, nem atrás de casa ou do sítio! Aquicultura não é hobby, é negócio, e necessita de escala. Sistemas de recirculação aquícola e de bioflocos (antagônicos no conceito produtivo, mas similares em produtividade, tratamento e reutilização de água, biosseguridade, além do alto custo de produção), simplesmente são inviáveis em pequenos módulos! Por exemplo, com 350 mil reais, você consegue construir cerca de 1.400 m³ de um sistema de bioflocos para camarões marinhos. Vamos supor que você produza 3 kg/m³/ciclo e faça três ciclos por ano. A produção anual será de 12.600 kg de camarões marinhos. Nada mal!... Será???... Preço de venda “pés no chão”, vamos considerar que você comercializou a produção, em média, por R$ 20,00/kg. Temos um faturamento bruto anual de 252 mil reais. Cuidado com os números distantes destes acima que são facilmente produzidos no WhattsApp. Como existem especialistas em bioflocos nas mídias sociais... lá se consegue 5-6 kg/m3/ciclo fácil fácil...
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A produção e faturamento descritos são muito pequenos para um negócio aquícola intensivo, que alia alta produtividade e tecnificação, monitoramento constante (e os custos inerentes a isto), além dos altos riscos. O custo fixo, especialmente relativo à mão de obra, vai falir o projeto hipotético acima. Para qualquer projeto comercial, inclusive o que estamos superficialmente discutindo, precisamos de, no mínimo, três funcionários fixos. Salário médio de R$ 1.500,00/ mês + encargos sociais, o custo com mão de obra chegará perto dos R$ 100 mil anuais! Estou considerando que um destes funcionários terá que trabalhar todas as noites, incluindo as madrugadas dos finais de semana e feriados, onde justamente a maioria dos problemas acontecem. Dividindo R$ 100.000,00/12.600 kg = R$ 7,94 de custo de mão de obra/kg de camarão. Ainda nem falamos dos custos da ração ou energia elétrica, estes sim, talvez os principais itens de despesa de uma carcinicultura superintensiva. Mas nem é preciso “destrinchar” estes valores, o prejuízo do modelo hipotético acima é certo. Um projeto de 1.400 m³ não é viável nem aqui nem na China... e o custo fixo demonstra isso! Lembro há 15-20 anos atrás, quando surgiram boa parte das fazendas de carcinicultura marinha que hoje ainda existem no Brasil. Em Santa Catarina, o tamanho médio das fazendas construídas foi de 14 ha. Com preço médio de R$ 50.000,00/ha para a construção, eram montantes ao redor de R$ 700.000,00 para implantar cada fazenda... isso há 20 anos atrás... Na época, só grandes investidores, empresários, ou produtores rurais que obtinham crédito via BNDES, conseguiam construir estes empreendimentos vultosos... eu como estudante de graduação em Engenharia de Aquicultura e mesmo depois de recém-formado, o máximo que sonhava era em poder assessorar tecnicamente as melhores fazendas da região. Era intangível para nós, simples mortais, sermos proprietários destes projetos imponentes e lucrativos. Era coisa para rico! Hoje em dia, estamos falando em um sistema de produção muito mais complexo, vários passos a frente do descrito no parágrafo anterior. Fazendas que requerem substancial conhecimento técnico, recursos suficientes para investimento e custeio, e alguns aventureiros por aí, através do YouTube e mídias sociais, vendem falsas esperanças para leigos no assunto, de que é possível ter um negócio de produção de camarão marinho, altamente tecnológico e até certo ponto futurístico, por qualquer R$ 100,00 ou R$ 200,00 de investimento... lamentável... Já combinei com o amigo Fábio Sussel, vamos combater estas falácias aquícolas. Artigos como este, significam apenas o início de um trabalho de esclarecimento que necessita ser feito. Vamos à luta, pelo bem da nossa querida aquicultura.
Marcelo Shei Fundador da Altamar Sistemas Aquáticos Santos, SP shei@altamar.com.br
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tualmente é possível encontrar diversas opções de materiais, formatos e tamanhos de tanques para cultivo de organismos aquáticos. Em um RAS a dimensão e o formato definirão diretamente o custo de instalação e operação. O objetivo é otimizar a área produtiva e ter o sistema que demande a menor manutenção possível. O processo produtivo dos moluscos bivalves possui características ímpares na aquicultura. O fato de serem animais sésseis e filtradores, permite que sejam cultivados diretamente no mar sem a necessidade de estruturas complexas para a sua produção. A característica de se alimentarem por filtração, faz com que possam concentrar contaminantes provenientes do ambiente onde são cultivados ou coletados. O consumo de organismos contaminados pode causar doenças, principalmente bacterianas e virais quando são consumidos crus ou com pouco cozimento. A gastroenterite e a hepatite A são exemplos de doenças associadas ao consumo de bivalves. No caso da hepatite A, é estimado que até 70% dos casos dessa doença na Itália sejam associados ao consumo de bivalves. A limitação do risco de doenças pode ser diminuída parcialmente a partir da seleção de áreas de coleta e cultivo com baixos níveis de contaminantes e o uso de sistemas de depuração. A depuração é aplicada em muitas partes do mundo para a remoção de contaminantes microbianos dos moluscos bivalves que estejam levemente ou moderadamente contaminados. Para isso, os animais retira-
Figura 1. Projeto Isométrico de depuradora industrial. © Altamar Sistemas Aquáticos
dos do mar são mantidos em tanques com sistema de fluxo aberto ou em recirculação, contendo ao menos um método de desinfecção da água. Nessas condições, os animais realizam sua atividade de bombeamento e filtração por um período suficiente para expulsar o conteúdo intestinal contaminado, de modo que os vírus e bactérias patogênicas sejam eliminados. Apesar do tema ainda não ser bem estabelecido no Brasil, alguns fatores são comuns em diversos países quanto à configuração das estruturas necessárias para a realização desse processo. Cito aqui as principais: • A água de abastecimento deve passar por método de desinfecção eficaz e dosado (normalmente cloro, UV-C ou ozônio); • Utilização de tanques que permitam a correta limpeza e descontaminação; • Uso de bandejas ou cestos de forma a permitir que os animais recebam boa circulação de água; • Design dos tanques que permitam a separação das fezes, prevenindo a recontaminação dos animais; • O sistema de depuração deve possuir um bom fluxo de água, desinfecção, aeração / oxigenação; • A temperatura deve ser controlada para evitar estresse e desova durante a depuração; • O processo de depuração deve possuir protocolos bastante definidos, com animais da mesma espécie e sem introdução de novos animais no mesmo ciclo. Apesar do cultivo de bivalves ocorrer no mar, técnicas e estruturas aplicadas nos sistemas de recirculação, permitem o estabelecimento de protocolos definidos de depuração e aumentam a segurança no consumo desses animais. Assim como já ocorreu em outros países, a tendência é que as agências reguladoras, a indústria ou diretamente a pedido do mercado consumidor, passem a recomendar ou exigir protocolos de monitoramento da qualidade de água e do nível de contaminantes presentes nos locais de produção. A partir disso, a utilização de processos de depuração passará a ser mais difundida nos centros de coleta e produção. A equipe da Altamar possui experiência no estabelecimento de protocolos e capacidade de fornecimento de estruturas de diversas capacidades para depuração de ostras e outros bivalves.
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Sistemas para depuração de moluscos
Fábio Rosa Sussel Pesquisador Instituto de Pesca de SP - UPD Pirassununga Pirassununga, SP fabio@pesca.sp.gov.br
Pesquisa-se o que interessa ao pesquisador, e não ao setor produtivo R
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egra geral o que se vê são publicações que levaram anos (um baita contrassenso em tempos modernos) de trabalho árduo, redigidos num impecável inglês e publicados em revistas de alto “impacto”. Exceto algumas revistas científicas de notório impacto, reconhecidas publicamente, tipo Nature, eu como pesquisador científico ainda tenho dificuldade para compreender o que realmente significa este tal fator de impacto. Impacto pra quem? Pra qual setor? Qual a contribuição efetiva disso para o bem da humanidade? Pesquisa-se, com financiamento público, o que dá publicação e não o que realmente interessa ao setor produtivo. É explicito que a linguagem utilizada nos artigos é toda voltada para outro pesquisador ler. Até por que, somente o seleto grupo de pesquisadores renomados
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publicam nas tais revistas de alto impacto, as quais são fechadas a grande parte da sociedade. Há exceções? Sim, é fato que há. Poucas, mas tem. Do que adianta ter uma vasta lista de publicações científicas se o setor produtivo desconhece a importância dos achados científicos de determinado pesquisador. No caso da produção de organismos aquáticos, se a Peixe BR ou a ABCC ou a Peixe SP nunca ouviram falar ou desconhecem as efetivas contribuições que um pesquisador renomado no meio acadêmico tem deixado ao setor, algo de errado tem. Ou será que estas entidades não têm condições de julgar quais são as reais demandas do setor produtivo? “-Ah, mas é que eu faço pesquisa de base.” Ou então a clássica frase: “-A sociedade não valoriza, não reconhece a importância da pesquisa científica.” Des-
conhecimento do que efetivamente ele está pesquisando. Afinal, ele pesquisa o que dá publicação e não exatamente para atender às demandas da sociedade. Ao tornar público o que realmente pesquisam, permitirá que a sociedade conclua que em torno de 70% do que foi publicado não serviu para absolutamente nada. As pesquisas deveriam ter como premissa o atendimento de demandas do setor produtivo. A partir disso, o pesquisador é que teria que se virar nos 30” para encontrar o que dá publicação. E não o contrário. Atualmente, pesquisa-se o que dá publicação..... o setor produtivo é que se vire para encontrar alguma utilidade naquilo que foi publicado. Há exceções? Sim, há! Mas... regra geral é procurar um delineamento ou um assunto que simplesmente dê publicação. Por muito tempo o setor produtivo aguardava ansiosamente por soluções tecnológicas vindas da academia. Porém, os tempos são outros. Atualmente, é gritante o descompasso entre academia e setor produtivo. Simplesmente as coisas se inverteram, já que é notório a quantidade de novas tecnologias que partem da iniciativa privada. Quer uma constatação prática? A edição deste ano da AquiShow, em parceria com as revistas Aquaculture Brasil e Seafood Brasil, lançaram o prêmio Inovação Aquicola. De todos os cases inscritos para concorrer, 66% são iniciativas do setor privado. Será que os pesquisadores estão tão ocupados com suas pesquisas que não tiverem tempo para inscrever seu cases ou é a iniciativa privada a grande responsável pelas novas tecnologias junto ao setor produtivo? No caso específico da produção de organismos aquáticos, o setor produtivo tem meia culpa nisso. Atualmente já temos associações e entidades devidamente respaldadas e com autonomia para cobrar maior objetividade e aplicabilidade dos trabalhos científicos. “-Mas Fábio, vc como pesquisador científico está jogano contra seus colegas?” Nããããoooo, muito pelo contrário! Contra fatos não há argumentos! É urgente a necessidade de se reinventar o modo de fazer pesquisa, bem como a postura do pesquisador perante a sociedade. Afinal, o ser estudado, titulado e, portanto, flexível a mudanças é o pesquisador. Pelo contrário, seus cargos não durarão por muito tempo.
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culpas esfarrapadas e proporcionalmente levianas à capacidade intelectual de quem pensa assim. Não é obrigação da sociedade entender a complexidade de uma pesquisa de base e muito menos interpretar e tirar conclusões do linguajar científico utilizado. Quem tem obrigação de COMUNICAR-SE com a sociedade é o pesquisador! Até porque é a sociedade quem banca este profissional. E não só por isto. O ser estudado e que se considera “evoluído” perante o resto da sociedade é o tal do pesquisador. Então é obrigação dele se COMUNICAR com a sociedade. Quer mais um absurdo? Os salários dos pesquisadores/professores são pagos pela sociedade, as pesquisas são financiadas com dinheiro público e os melhores resultados são publicados em revistas fechadas, que cobram cifras consideráveis para permitir acesso aos artigos publicados (Tem ainda os passeios em congressos internacionais com todas as despesas pagas, mas nem vou citar aqui para evitar a indignação do setor produtivo). Ou seja, a sociedade que bancou a realização destas pesquisas simplesmente não tem acesso livre aquilo que financiou. Afinal, pesquisa-se pra quem? Isto configura-se numa clássica situação de aprisionamento de conhecimento! Conhecimento tem que ser disponibilizado e não aprisionado. Mas qualquer cidadão pode ir até uma biblioteca de Universidade e acessar estes artigos! Sim, mas esta biblioteca utilizou recursos públicos para ter direito ao acesso destes artigos. Além do mais, em tempos modernos, o cidadão comum deveria ter o livre direito de acessar isto em qualquer internet. Se por questões científicas este modelo e esta estrutura deve ser mantida, OK. Mas o conhecimento gerado precisa, de alguma forma, ser disponibilizado a sociedade. Ou seja, deveria ser obrigação do pesquisador comunicar-se não somente com seu seleto grupo de colegas por meio de vossos artigos científicos, mas também com o cidadão comum, através de uma linguagem simples e compreensível ao setor produtivo. Ou, melhor ainda, transformando os achados científicos em soluções perante as demandas do setor produtivo. Afinal, é este quem banca os salários e as pesquisas. Porém, a questão é que não há interesse por parte dos pesquisadores que a sociedade saiba e tenha
Eduardo Gomes Sanches Instituto de Pesca / APTA Ubatuba, SP esanches@pesca.sp.gov.br
Aquicultura ornamental
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m novo ano pede novos desafios. Pensando nisto resolvi mudar o foco de minha coluna para uma área da aquicultura ainda pouco divulgada, mas com um enorme potencial de inovação. Esta nova coluna está relacionada profundamente ao meu início na aquicultura. Ainda quando criança mantinha mais de setenta aquários no quarto onde tentava dormir em meio a bombinhas de ar e muita água no chão. Foi onde despertei para a magia de reproduzir peixes e aprender sobre as diferentes espécies e técnicas de cultivo. Até nos dias atuais, desenvolvo a criação de peixes e invertebrados ornamentais no quintal de casa, mantendo a paixão que me trouxe até meu exercício profissional. Nada mais justo do que uma reverência às origens. Nasce a coluna “Aquicultura Ornamental” na Aquaculture Brasil. Por que escrever sobre isto? Você sabia, caro leitor, que o aquarismo é o segundo maior hobby do mundo, movimentando entre 15 a 20 bilhões de dólares por ano? Sabia que o Brasil ocupa a 13º posição entre as nações envolvidas na exportação de peixes ornamentais? Sabia que existem feiras internacionais (Aquarama, Interzoo) somente para este segmento da cadeia produtiva da aquicultura? Que centenas de milhares de pessoas vivem deste segmento produtivo, que gera emprego e renda a pequenas propriedades rurais alijadas do monocultivo das commodities (soja, milho...). A aquicultura ornamental também tem muita história!!! Os egípcios foram os primeiros a colocar peixes em grandes tanques, passando horas a observar o comportamento desses animais. Marco Pólo, no século XIII, relatou que os chineses também tinham esse hábito de criar peixes em tanques de vidro. A observação de peixes em cativeiro passou a ser comum na Europa Ocidental apenas no século XVI, ainda que realizada com técnicas rudimentares. Em 1846, a bióloga marinha britânica Anna Thynne realizou o feito inédito de manter por três anos corais e algas dentro de um aquário. Em 1850, na Inglaterra, Robert Harrington publicou no diário Chemical So-
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ciety, de Londres suas descobertas que explicavam como manter peixes em recipientes com água (!!!) e em 1868, M. Simon, cônsul da França em Ningpo, trouxe da China para Paris alguns peixes-do-paraíso Macropodus opercularis, oferecendo-os a Pierre Corbonnier, que conseguiu a reprodução da espécie em cativeiro. Entretanto, somente no século XX, com o advento da energia elétrica, é que o aquarismo começou realmente a se desenvolver. Mas o que mudou na aquicultura ornamental no século 21? Durante anos um aquário em casa era sinônimo de uma bola de vidro com um peixe dourado dentro, fazendo o possível para sobreviver a contínuas mudanças de água e a uma dieta de migalhas de pão. Atualmente, a realidade é outra, passando o aquário a ser entendido como uma forma de recriar um espaço da natureza dentro de casa, com finalidades educativas, recreativas e de preservação, onde se busca reproduzir, o mais fielmente possível, o habitat de origem da espécie criada. O aquarismo passa a ocupar espaço no cinema, sendo indiscutível o sucesso do filme “Nemo”, ampliando a visibilidade da manutenção de peixes em aquários. Atualmente, os maiores mercados internacionais de peixes ornamentais são o Japão, a Europa (principalmente a Alemanha e a Holanda) e os Estados Unidos. Nos Estados Unidos, uma em cada três residências possui aquário. No Japão, de cada duas residências, uma tem aquário. Com estas referências dá para imaginar o imenso potencial do comércio internacional de peixes ornamentais. Segundo informações do International Trade Centre de 2016, Singapura fatura por ano U$ 44.205 mil em exportação de peixes ornamentais – o pequeno país asiático ocupa a liderança no ranking. Em contrapartida, o Brasil ocupa apenas o 13º lugar, com U$ 6.570 mil em exportações (o que não é nada mal considerando a quase ausência de políticas públicas para este segmento produtivo). Por aqui estima-se que existam cerca de cinco mil lojas
que comercializam aquários, peixes e produtos para o setor de aquicultura ornamental, gerando cerca de 25 mil empregos diretos e até 75 mil indiretos. Portanto meus amigos o que não falta é relevância para escrever sobre este tema. Em paralelo, está mais do que na hora de ampliar a divulgação deste segmento produtivo e trazer aos leitores da Aquaculture Brasil um pouco do que vem sendo feito por esta atividade e despertar o interesse do
segmento público e privado sobre as oportunidades estratégicas que o desenvolvimento da aquicultura ornamental pode proporcionar ao nosso país. Espero aproveitar este espaço para trazer matérias técnicas aliadas a depoimentos e entrevistas visando ampliar o espaço da aquicultura ornamental. Até breve “Aquicultura de precisão”, seja bem vinda “Aquicultura ornamental”. Até a próxima coluna!
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Hello!
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Alex Augusto Gonçalves Chefe do Laboratório de Tecnologia e Qualidade do Pescado - LAPESC Universidade Federal Rural do Semi Árido - UFERSA Mossoró - RN alaugo@gmail.com
Butarga ou Bottarga ou Karasumi: você sabe o que é? A
butarga (em italiano: bottarga; em francês: boutargue; e em japonês: tarako) é um produto característico de vários países do Mediterrâneo (Itália, França, Espanha, Grécia), da região do Magrebe (Marrocos, Argélia e Tunísia). É feita a partir de ovas de peixes (sargo, atum, tainha, etc.) salgada, seca e revestida com cera (parafina ou cera de abelha), a fim de garantir sua maturação, conservação e proteção do contato externo. No Japão, existe uma preparação muito similar chamada karasumi.
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O karasumi é um produto elaborado a partir da salga das ovas de tainha e com o uso de saquê (o que se diferencia da bottarga), além de serem prensadas e posteriormente desidratadas (geralmente à luz do sol).
Com ovas de outros peixes também é possível se fazer a Bottarga, mas os italianos mais exigentes vão dizer que somente as feitas com ovas de tainha são as legítimas Bottargas. A bottarga também é um produto e um ingrediente bastante valorizado na culinária mundial, e que está cada vez mais ganhando mercado ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Gregos, Italianos, franceses e russos são os principais adoradores da iguaria, tendo em vista que cada cultura prepara a bottarga de uma maneira. As ovas de peixe tem um alto valor nutricional (vitaminas C, B1, E, E2, A, K; e proteínas ~22%), e uma das vantagens é que em pequena quantidade você pode consumir uma boa quantidade de proteína e gordura (vitaminas lipossolúveis) de qualidade. Além do valor nutricional, o valor sensorial é indiscutivelmente o mais intrigante, seu sabor é delicioso e saciante. Ovas de peixe são ótimos aperitivos, e é possível comê-las como um complemento a um prato principal. No Brasil, a bottarga e o karasumi são produzidos industrialmente (empresa Caviar Brasil, produto Bottarga Gold) e artesanalmente (Projeto A.MAR, produto bottarga e o karasumi), tomando-se todo cuidado, principalmente no que se refere a sustentabilidade e garantia de preservação da espécie – Tainha (Mugil spp.). A produção da bottarga requer cuidados específicos, para manter a alta qualidade do produto. Basicamente, as ovas da tainha (fêmea) são cuidadosamente retiradas inteiras (sem rompê-la) e passam por um cuidadoso processo de limpeza para remoção de impurezas e resíduos de sangue, e depois são salgadas e desidratadas ou secas ao sol, ou ainda em estufas de desidratação (20-30°C) o que garante mais uniformidade da cura e excelente apresentação final. O resultado é um produto de cor dourado-escuro e sabor vibrante de mar. A fase final consiste na modelagem do produto, e em seguida a embalagem. A bottarga é bem alongada, enquanto que o karasumi é prensado, sendo possível encontrar inteiras, precisando apenas fatiar ou ralar para consumo. Apesar de cada produtor ter uma formulação e processo diferenciado, pode-se recomendar as seguintes etapas do processo de obtenção da bottarga:
© Bottar
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nação por insetos, redes de insetos devem ser colocadas em todo o produto. Após 36-48 horas, as gônadas são invertidas e o processo continua. Blocos de madeira de 250g podem ser usadas para dar forma à bottarga tradicional. Espera-se que a bottarga perda em torno de 10% de umidade. Produto final: As ovas de peixe estão prontas para consumo imediato ou para manter em congelamento por período longo (> 1 ano) cobrindo todo com uma fina camada de cera. As ovas de tainha salgadas possuem os seguintes valores nutricionais: 55,3% de proteína, 33,6% de lipídios e 5,9% de cinzas (minerais). Comentários finais Bottarga vs. Karasumi: tradicionalmente a Bottarga fica exposta a salmoura por um período muito maior que o Karasumi. O Karasumi como passa por um processo de desidratação mais lento e com saquê, que contém 12% de álcool e Saquê Licoroso Mirin (saquê doce) que contém açúcar, acaba se beneficiando desses dois elementos no processo de conservação enquanto se desidrata. Já a Bottarga depende somente da perda de líquidos e do sal. Normalmente o Karasumi recebe o sal diretamente na ova, por apenas 30 minutos e desidrata em temperatura de 30 graus durante 7 dias recebendo o tempero Saquê + Dashi (caldo rico em umami utilizado na culinária japonesa, que normalmente contém: ácido glutâmico, ácido inosínico e ácido de guanosina) + Saquê Licoroso Mirin a cada 2 horas, com pincel, sempre alternando a face da ova. A Bottarga desidrata em temperatura bem mais alta, e por menor tempo. Sensorialmente o Karasumi é mais doce e precisa de refrigeração, pois o resultado final contém muito mais atividade de água que a Bottarga. JAN/FEV 2019
Separação do sexo: depois que o peixe foi capturado, cada espécime deve ser separado por sexo, onde a parte abdominal do peixe deve ser pressionada para extrair o material genético (machos, líquido branco leitoso; fêmeas, líquido amarelo). As fêmeas são geralmente maiores que os machos. Extração de gônadas: a parte do abdome do peixe deve ser cuidadosamente aberta com faca específica, através das barbatanas ventrais (abaixo das brânquias) até o ânus, e as gônadas removidas da cavidade visceral. Limpeza: o sangue e outros resíduos (partes estranhas dos órgãos viscerais) nas ovas devem ser removidos pela imersão em salmoura (10%) fria, por 15 minutos. Em alguns processos a limpeza é feita pela retirada do sangue e as vísceras em água fria sem a imersão em salmoura. Salga: a umidade da superfície das ovas deve ser removida com a ajuda de um pano limpo, e depois colocadas em caixas de poliestireno com uma camada de sal e uma camada de ova. Em seguida, devem ser colocados sequencialmente em caixas, nas quais camadas de sal intercaladas com as gônadas são preparadas por aproximadamente 2-6 horas de acordo com seu peso. O tempo médio de cura, para tamanhos pequenos (entre 200g - 300g) é de 2h30 min, e para tamanhos maiores (>300g) é de aproximadamente 6 horas. Durante este período, as ovas devem ser pressionadas uma vez por cinco minutos e depois imersas em água e cobertos com um pano úmido por 4 - 4,5 horas. Em seguida, as gônadas curadas são retiradas e lavados com água para remoção do excesso de sal. No processo da salga a ova perde cerca de 30% do peso. Secagem: Em seguida, as gônadas devem ser colocadas em superfície limpa, seca e fresco (~ 20°C) para secagem na temperatura ambiente. Para evitar contami-
rga Gold; Projeto A.MAR; wearebottarga.com; thedelivillage.com
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Defendeu! Em algum lugar do Brasil, um acadêmico de graduação ou pós contribui com novas informações para nossa aquicultura. Nome do acadêmico: Suélen Serafini Orientador: Prof. Dr. Dilmar Baretta Co-orientador: Prof. Dr. Aleksandro Schafer da Silva Instituição: Programa de Pós-Graduação em Zootecnia (PPGZOO), Universidade do Estado de Santa Catarina/UDESC
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Título da dissertação: Antiparasitários à base de eprinomectina e seus efeitos tóxicos sobre peixes de água doce
Introdução: Estudos científicos realizados em diversos países demonstram que uma grande variedade de moléculas que são princípios ativos em medicamentos veterinários (exemplo: antiparasitários), podem causar efeitos negativos nos animais aquáticos, como: redução da sua reprodução, prejuízo no desenvolvimento corporal e fisiológico, além de alterações comportamentais, podendo levar à morte. E como estas moléculas nocivas que compõem antiparasitários, por exemplo, podem chegar à água e afetar estes organismos? Estas moléculas podem chegar à água de diversas maneiras, dentre elas: • Uso não recomendado de antiparasitários, pois é comum que produtores aquícolas utilizem medicamentos de outras espécies em peixes. Não havendo uma recomendação técnica, os efeitos podem ser a poluição dos meios de cultivo e do meio ambiente, consequentemente; • Descarte inadequado de sobras do antiparasitário ou embalagens; • Uso de dejetos animais que contenham resíduos farmacológicos do antiparasitário como fertilizantes orgânicos no solo. A carreação de substâncias poluentes aos corpos d’água pode ocorrer por percolação ou lixiviação, favorecidos pelas chuvas; • Uso de dejetos animais que contém resíduos farmacológicos para a fertilização de viveiros aquícolas. • Entrada de animais na água após aplicação de uma formulação antiparasitária pour-on. Um dos grupos de moléculas mais utilizadas na medicina humana e animal, na agricultura e na indústria em escala global é o grupo das lactonas macrocíclicas. Este grupo comporta a família das avermectinas, da qual faz parte a molécula ivermectina, muito conhecida e utilizada por produtores rurais, apesar dos registros negativos desta molécula sobre peixes. A eprino70
mectina é outra molécula que faz parte desta família. A eprinomectina apresenta amplo espectro de ação e é recomendada para uso veterinário, principalmente para o controle e tratamento de parasitos internos (endoparasitos) e externos (ectoparasitos), estando presente em formulações de medicamentos injetáveis e pour-on para animais de grande e médio porte. Uma característica muito importante desta molécula é a sua maior solubilidade em água quando comparada à ivermectina, ou seja, ela se mistura facilmente com água. Sua maior solubilidade em água pode facilitar a entrada da mesma em ambientes aquáticos.
Figura 1. Estrutura química da eprinomectina.
Objetivo:
Os efeitos tóxicos da eprinomectina em organismos aquáticos não são muito conhecidos, por isso o objetivo do estudo foi avaliar os efeitos da eprinomectina no fígado e cérebro de jundiás (Rhamdia quelen), assim como alterações no comportamento natural destes peixes, após 24 e 48 horas de exposição à eprinomectina, assim como após 48 horas de recuperação em água livre de eprinomectina.
Materiais e métodos: Para isso, foram utilizadas concentrações abaixo da dose recomendada para bovinos, isto é, abaixo de 0,36 mg de eprinomectina por kg de peso vivo, indicada em formulações injetáveis; ou 0,5 mg de eprinomectina por kg de peso vivo, indicada em formulações pour-on.
celulares como lipídeos e carboidratos de membrana, ácidos nucleicos (DNA e RNA), entre outros. Ao afetar ácidos nucleicos pode ser reduzida a expressão proteica da célula, a produção e ativação de antioxidantes e outras enzimas, como a SOD, a AK e a PK no fígado e a AChE no cérebro. O mesmo ocorre com uma alteração na membrana da célula por LPO, o que desorganiza a capacidade da célula de controlar a entrada e saída de qualquer substância, como substratos necessários para nutrição e funcionamento corretos das células, ou até mesmo a intercomunicação celular, como ocorre nos neurônios via polarização e despolarização de membranas por potencias elétricos, controlados via membrana pela N+/K+-ATPase. Além disso, podemos criar um link entre produção e consumo de ATP reduzidas em consequência da redução da atividade da AK e PK com a redução da atividade da N+/ K+-ATPase, pois esta enzima necessita de ATP para o controle da polarização e despolarização da membrana e as transmissões de informações no cérebro. Outro link que podemos criar é a alteração da neurotransmissão com a alteração do comportamento dos jundiás.
Considerações finais: Estudos como este geram conhecimentos que favorecerão futuras tomadas de decisões dentro das propriedades quanto aos produtos utilizados e seus destinos, ou mesmo dos resíduos animais, que permitirão a associação entre as produções animais O trabalho foi defendido em: e a conservação e preservação da biodiversidade aquática. 22/02/2019 Agradecimentos:
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Resultados e Discussão: Os resultados do estudo demonstraram efeitos tóxicos sobre os órgãos alvos desse trabalho, além de mudanças comportamentais causadas pela exposição à eprinomectina já em 24 horas. Assim como, a extensão residual destes efeitos no período de recuperação de 48 horas em água livre de eprinomectina. No fígado a eprinomectina causou estresse oxidativo, devido ao aumento dos níveis de espécies reativas ao oxigênio (EROS) e da lipoperoxidação (LPO), bem como, devido à redução da atividade de enzimas do sistema antioxidante, como a superóxido desmutase (SOD) e enzimas do complexo glutationa (GSH). Além disso, os níveis da atividade antioxidante contra o radical peroxil foram reduzidos nos peixes expostos à eprinomectina. No fígado também foi constatado que a eprinomectina afetou enzimas do sistema energético, como a adenilatoquinase (AK) e a piruvatoquinase (PK), responsáveis pela rede de transferência de grupos fosfato e indispensáveis no processo de produção e uso de adenosina trifosfato (ATP), uma importante fonte energética para atividades celulares. No cérebro foi observado que a eprinomectina aumentou os níveis de EROS e reduziu a atividade de enzimas envolvidas na neurotransmissão, como a acetilcolinesterase (AChE) e a bomba de sódio-potássio (N+/K+-ATPase). Quanto ao comportamento, os jundiás apresentaram alterações relacionadas à hiperlocomoção e ao maior tempo de permanência na superfície do tanque. Como estes resultados podem ser explicados de uma forma mais fácil? Bom, com base em pesquisas científicas apoiando os resultados, acreditamos que a eprinomectina inicialmente afeta as mitocôndrias das células, o que ocasiona o aumento na produção de EROS, por desorganizar a atividade respiratória e de transporte de elétrons da organela. As EROS reagem com outros componentes
Figura 2. Exemplar de jundiá (Rhamdia quelen) utilizado no estudo. © Suélen Serafini
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Pesquisador do Centro de Desenvolvimento em Aquicultura e Pesca (Cedap/Epagri), com mais de 30 anos de experiência na área.
AQUACULTURE BRASIL: A primeira pergunta de praxe para situar o leitor, como a aquicultura entrou na vida do Engenheiro Agrônomo Fabiano?
fui transferido para o escritório municipal de Turvo, onde além das atividades inerentes de extensionista municipal, era responsável pelo atendimento regional na área da piscicultura (2005 a 2007). Por necessidade do Centro de Desenvolvimento em Aquicultura e Pesca – Cedap/ Epagri, em setembro de 2007, fui convidado a integrar a equipe de pesquisadores, com atuação na área da piscicultura. Em janeiro de 2009, assumi a Gerência do Cedap onde exerci a função até o dia 18 de março de 2019.
Fabiano Müller Silva: A aquicultura sempre fez parte da minha vida desde a infância, iniciando pelos aquários com cultivos de lebistes. Durante a graduação, 1985 a 1990, já trabalhava como bolsista no laboratório de camarões de água doce do Departamento de Aquicultura da UFSC. Durante o mestrado, 1991 a 1993, empreendi na iniciativa privada com implantação de um laboratório de produção de pós-larvas do camarão MaAQUACULTURE BRASIL: O que é o Cedap, e o que recrobrachium rosenbergii, o gigante da Malásia, em Floriapresenta este órgão para a Epagri e para o desenvolvinópolis. Durante os anos de 1994 a mento da aquicultura catarinense. 2002 fui instrutor de treinamento de Fabiano Müller Silva: Criado em FPR (Formação Profissional Rural) na 25 de março de 2003, em reuCriação de Animais Aquáticos – PisDurante o nião extraordinária do conselho cicultura. Fui também professor da mestrado empreendi de administração, o Centro de disciplina de “Aquicultura”, do curso Desenvolvimento em Aquicultura de Agronomia, da Universidade para na iniciativa privada e Pesca – Cedap, passou a centrao Desenvolvimento do Sul de Santa com implantação de lizar a gestão das ações desenvolCatarina – UNISUL, de 1999 a 2007. vidas na empresa em termos da um laboratório de aquicultura e da pesca. A criação AQUACULTURE BRASIL: Como foi produção de pós-larvas do do Cedap viabilizou a captação de seu início na Epagri? recursos nacionais e internacionais Fabiano Müller Silva: Fui aprovado camarão Macrobrachium para o desenvolvimento do setor, no concurso público de 2002, inirosenbergii em tanto para o trabalho de pesquisa ciando na Epagri como extensionista como também, na difusão de noFlorianópolis. rural no município de Águas Frias, vas tecnologias e no treinamento pertencente a Regional de Chapecó, dos produtores, promovendo a onde permaneci até o ano de 2004. melhoria da renda e da qualidade Pela necessidade de um técnico com de vida dos aquicultores e pescaconhecimento em piscicultura na região de Araranguá, dores artesanais. Sua sede em Florianópolis é responsá-
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Fabiano Müller Silva
Engenheiro Agrônomo de formação, Fabiano voltou-se para uma área um tanto incomum naquela época (1985-1990) para quem cursava agronomia, a aquicultura. Foi através dos aquários em casa e da pesquisa na universidade com o camarão de água doce Macrobrachium rosenbergii que Fabiano tomou gosto pela atividade.
vel pela área da maricultura, abrangendo projetos com mexilhões, ostras, vieiras, macroalgas e peixes marinhos. As pesquisas com peixes de água doce, como tilápia, jundiá e lambari, são realizadas nas unidades localizadas nos municípios de Itajaí e Camboriú. O prestígio conquistado ao longo desses anos de trabalho permitiu manter-se até hoje comprometido com a busca constante por resultados relevantes para o desenvolvimento sustentável da aquicultura de Santa Catarina.
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AQUACULTURE BRASIL: Qual é importância da extensão aquícola no desenvolvimento da aquicultura catarinense?
Fabiano Müller Silva: A extensão aquícola em Santa Catarina foi fortalecida na década de 70, atendendo a demanda de lideranças municipais, comunitárias e de produtores rurais, com a instalação de alguns escritórios da ACARPESC (Associação de Crédito e Assistência Pesqueira de Santa Catarina) para assistência técnica também em piscicultura de água doce em diversas regiões do estado, considerando que essa atividade zootécnica não era abrangida pelo serviço de extensão rural. A partir de 1988/89, a atividade de assistência técnica à piscicultura de água doce passou a ser desenvolvida pelo serviço de extensão rural da Associação de Crédito e Assistência Rural de Santa Catarina – ACARESC, que absorveu os profissionais que atuavam nesta atividade, já adotando uma visão mais sistêmica de assistência técnica e abordagem aos produtores rurais. A introdução dos cursos profissionalizantes na área da aquicultura e pesca a partir de 1989, foi responsável pela difusão das tecnologias de cultivo de organismos aquáticos, que aliado ao fomento da atividade, resulta-
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ram no rápido crescimento da produção. As características topográficas, climáticas e hídricas, aliadas à disponibilidade de produtos e subprodutos agropecuários, propiciam excelentes condições para o desenvolvimento de uma piscicultura diversificada nas águas interiores a baixo custo de produção. Inicialmente as tilápias e carpas foram os peixes cultivados, aproveitando principalmente áreas subutilizadas e subprodutos das propriedades rurais. Posteriormente, com a introdução das carpas chinesas e mais tarde os bagres, viabilizaram-se os policultivos utilizando diversas espécies com hábitos alimentares preferenciais diferenciados, otimizando o uso da produtividade primária e alimentos complementares com redução de custos de produção. Essa prática, após pesquisas na melhoria do seu processo de cultivo, deu origem aos sistemas de produção de piscicultura integrada tanto na Região Oeste como no Modelo Alto Vale do Itajaí de Piscicultura Integrada (MAVIPI), praticado por expressivo número de piscicultores que utilizam racionalmente a produtividade natural dos viveiros incrementada também com fertilização da água (suínos e aves) e complementação alimentar e no final do ciclo, é gradativamente substituída por rações comerciais. A piscicultura catarinense vem utilizando principalmente a mão-de-obra familiar e proporcionado um bom retorno financeiro para o capital investido, incrementando dessa forma a renda no campo e promovendo estímulo à permanência no meio rural com mais uma atividade produtiva que contribui para o crescimento econômico do Estado. AQUACULTURE BRASIL: O estado de SC, um dos pioneiros da aquicultura brasileira, por muito tempo foi o
Fabiano Müller Silva: Santa Catarina sempre se destacou pelo pioneirismo, tanto na piscicultura como na maricultura. Saímos na frente em termos de produção e produtividade na piscicultura nacional. O Estado possui uma área territorial de 95.442,9 km2, representando apenas 1,12% do território nacional. A estrutura fundiária destaca-se pela predominância de pequenas propriedades (66,3% das propriedades possuem área entre 1 e 20ha). Aliado a isso, sabíamos que as características topográficas e climáticas, seriam uma barreira natural para que nos mantivéssemos sempre à frente da produção da piscicultura nacional. Mesmo em clima subtropical, penso que a tilápia ainda será por muito tempo o carro chefe da piscicultura catarinense, pois foi a espécie escolhida pelo mercado. Mas certamente estamos atentos e buscando sempre selecionar e estudar espécies nativas como o jundiá (Rhamdia quelen) e o lambari (Astyanax altiparanae) ou exóticas potenciais e mais adaptadas as condições do Estado. A criação de camarões marinhos teve início em Santa Catarina em 1983, embora o pioneirismo da atividade no Estado tenha sido na década de 70. Inicialmente as fazendas instaladas utilizavam espécies nativas (Penaeus paulensis e P. schmitti). Problemas relacionados à indisponibilidade de pós-larvas e falta de tecnologia limitou o desenvolvimento dos cultivos. A introdução do camarão L. vannamei, em 1998, e os resultados positivos alcançados, culminou com o lançamento pelo Governo do Estado do “Programa Estadual de Cultivo de Camarões Marinhos”, objetivando beneficiar principalmente famílias de pescadores artesanais e pequenos e médios produtores. A carcinicultura no estado chegou ao seu ápice em 2004, com 4.200 toneladas. Mas as condições ambientais menos favoráveis a esta espécie tropical, oportunizaram o aparecimento de doenças que reduziram drasticamente a produção a partir de 2005. A continuidade da carcinicultura no Estado se viabilizará com a implantação de tecnologias de cultivos em condições controladas, tanto sanitária como do ambiente. AQUACULTURE BRASIL: Em um estado com tantas oscilações de temperatura, além de vários meses com temperaturas muito abaixo do ideal para as principais espécies aquícolas regionais/nacionais, porque investe-se tão pouco em tecnologias intensivas, estufas e sistemas fechados em SC? É a questão do perfil do pequeno produtor catarinense?
Fabiano Müller Silva: As tecnologias de cultivo intensivo em estufas e sistemas fechados são processos produtivos que necessitam de uma melhor avaliação de viabilidade técnica e econômica. Os altos investimentos de implantação e os custos de energia e ração na produção, exigem que as espécies a serem cultivadas devam ter um valor agregado alto a fim de que seja possível viabilizar o negócio. A não implantação destes sistemas não tem relação com o perfil do produtor catarinense, pois o mesmo investe grandes recursos em sistemas de produção de frangos e suínos. No meu ver, os sistemas intensivos de produção em ambiente controlado de organismos aquáticos serão o futuro da aquicultura, mas ainda não temos um pacote tecnológico comercial validado para as condições de Santa Catarina, o que deverá ser buscado em médio prazo. AQUACULTURE BRASIL: O melhoramento genético realizado pelo Cedap já vem mostrando resultados no campo? É possível que, em breve, SC tenha uma linhagem de tilápia mais adaptada ao seu clima?
Fabiano Müller Silva: A tilápia da linhagem Gift, desenvolvida na Ásia, foi introduzida no país em 2005 e atualmente é considerada uma das melhores linhagens no Brasil. Apesar de ser uma população já melhorada, a seleção ocorreu em países com clima tropical. Com três gerações de seleção, a Epagri acredita que a linhagem denominada Gift-Epagri, já está mais adaptada ao clima subtropical e possui um potencial de pelo menos 15% superior para ganho de peso em relação ao animal introduzido no estado em 2011. O programa de melhoramento genético da Epagri é um dos únicos núcleos públicos de tilápia Gift no Brasil. Todas as novas gerações de matrizes são avaliadas em seu ganho genético, acompanhando o desempenho zootécnico em Unidades de Referência Técnica – URT, nas propriedades de piscicultores comerciais, onde é feito o levantamento dos parâmetros (peso final, sobrevivência, taxa de crescimento específico, conversão alimentar, produtividade), rendimento de filé e porcentagem de gordura visceral. Através destes acompanhamentos também são realizados os levantamentos de custo de produção e contabilidade da produção (receita bruta, lucro líquido, ponto de equilíbrio, taxa interna de retorno, entre outros). O projeto Gift-Epagri já entregou em torno de 60.000 matrizes para produtores de alevinos de Santa Catarina e outros estados brasileiros. AQUACULTURE BRASIL: Como está o desenvolvimento da produção de jundiás, além de outras espécies de peixes nativos?
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principal produtor aquícola nacional. Hoje, já não ocupa as três primeiras posições, perdendo espaço para outros estados. Por que SC vem ficando para trás? Seria a questão de insistir em espécies tropicais, como a tilápia e o Litopenaeus vannamei, numa região subtropical?
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Fabiano Müller Silva: O jundiá (Rhamdia quelen), é um peixe nativo bastante difundido na região sul do Brasil, atraindo a atenção de produtores e pesquisadores devido a sua boa aceitação pelo mercado consumidor. Conhecimentos científicos foram determinados pela Epagri a fim de viabilizar técnicas de reprodução, larvicultura, alevinagem e sistemas de engorda. Unidades de Referência Técnica - URT’s assessoradas pelo Cedap, constataram que o melhor sistema de cultivo é o monocultivo arraçoado em viveiros escavados, que alcançaram indicadores zootécnicos de conversão alimentar de 1,3:1, sobrevivência de 80% e produtividade de 12 toneladas/hectare. Outro atrativo é o mercado que vem pagando R$ 6,00/kg o que vem gerando um lucro em torno de R$ 2,00/kg. Atualmente estamos avaliando a viabilidade técnica e econômica do cultivo do jundiá em tanques-rede. Outra espécie nativa que vem demandando atenção pelo setor produtivo nos últimos anos é o lambari. Com uma unidade de processamento já instalada no município de Camboriú demandando por produto, associada a necessidade de estarmos avançando em estudos do cultivo de espécies nativas, fomos instigados a iniciar as pesquisas com a espécie: reprodução, larvicultura, alevinagem e engorda em diferentes sistemas de cultivo. Os resultados iniciais são promissores, e arrisco a dizer que em mais um ano de pesquisas, já teremos um pacote tecnológico para o cultivo comercial do lambari para Santa Catarina.
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AQUACULTURE BRASIL: Vocês estão para estrear um RAS para peixes marinhos em SC?
Fabiano Müller Silva: Sim, estreamos um RAS para cultivo de peixes de água doce em nossa unidade de piscicultura de Itajaí, e agora estamos instalando um RAS para atender as pesquisas com organismos aquáticos marinhos. O sistema terá no total 16 tanques de 2000 litros, que poderá trabalhar na versão 4x4 ou todos integrados. Nossa meta é que 8 tanques entrem em funcionamento este ano (2019) e os 16 em 2020. Acredito que este sistema de produção será o futuro para o cultivo dos peixes marinhos, pois fugimos da insegurança das variáveis climáticas dos cultivos em tanques-rede, proporcionando as melhores condições para o desempenho zootécnico da espécie, e a segurança ambiental no caso de espécies exóticas. A proposta nestes primeiros anos é avaliarmos o sistema RAS no desempenho do robalo flecha, garoupa e sardinha. AQUACULTURE BRASIL: Uma mensagem final sobre sua saída recente da gerência do Cedap.
Fabiano Müller Silva: Após estes 10 anos como gerente do Cedap, saio com o sentimento de dever cumprido. Foi uma incansável busca em estruturar o Centro para que a equipe de pesquisadores pudesse desenvolver seus projetos, obtendo resultados de qualidade, gerando tecnologias aplicadas na melhoria dos processos aquícolas, resultando em mais renda ao aquicultor catarinense. Foram 606 publicações voltadas ao setor, que geraram 18 tecnologias aplicadas na melhoria dos processos e práticas aquícolas. Termino minha fala reforçando que a visão da Epagri é que aquicultura de Santa Catarina seja referência nacional na produção legal, competitiva e sustentável apoiada em PD&I, garantindo alimentos saudáveis, seguros e rastreáveis.
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Wagner Camis Editor da “Aquacultura”, a primeira revista brasileira sobre aquicultura! O pioneirismo e a inovação sempre nortearam a brilhante carreira profissional do zootecnista Wagner Camis. Tudo começou com um conselho do irmão mais velho...
“Nasci em São Paulo, mas passei minha infância em Guarulhos, que na época era interior. Casei em 1990 com Ana Lidia (Lica) que conheci na Faculdade de Zootecnia da USP. Sou pai de Ana Clara e André que, infelizmente, não têm nenhuma queda pelo setor aquícola. Menos mal, eles amam comer peixe, principalmente tilápias. Tenho um irmão Engenheiro que falava em 1978 que a criação de peixe seria o negócio do futuro. Dei ouvidos”.
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Primeiro empreendimento “Em 1986 tive meu primeiro pesqueiro (pesque-pague). Fui convidado para ser sócio, pois foi a maneira que o dono da área vislumbrou para conseguir arrumar peixe. Nessa época começou também a minha luta para transportar peixe vivo. Muito aprendizado e conquistas”. Protagonismo no desenvolvimento dos pesque-pagues paulistas “Desde cedo percebi que a pesca deveria ser um atrativo a mais dentro do estabelecimento. Procuramos inovar por meio de estratégias que atraíssem o público. Encaramos o local de pesca como um clube, onde as pessoas poderiam até pescar. Passou a ser um local da família e não só de pescadores, pois no fundo temos uma atividade comercial que precisa dar lucro. Tivemos muitos desafios. Lembro-me que fiz um produtor (em 1994) produzir tilápias, dizendo que seria um bom negócio. Na época só se falava em pacu, 95 % da pesca era desta espécie e não tínhamos tilápias. Resultado, comprei toda sua produção, pois ninguém queria este peixe. Inovamos ao ter trutas e salmões na pesca em uma região totalmente alheia a estas espécies .Fomos o primeiro pesqueiro fora de uma região fria a dispor de espécies como estas. Levamos este trabalho para
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São Carlos e Ribeirão Preto. Era uma estratégia de marketing que dava resultados. Passamos a montar e orientar vários pesqueiros muitos dos quais, ainda existentes”.
Inovações em curso “Incubamos e desenvolvemos, juntamente com a IMMERSUS, um sistema de controle de arraçoamento, onde se usa um algoritmo para o fornecimento e correção diária na quantidade de ração, atrelados a um sistema de imagem que permite visualizar o crescimento do peixe, e com isto você ajusta a sua curva de crescimento com a melhor relação custo/benefício. Sou uma pessoa ávida por novidades. Começamos a vacinar quando a vacina entrou no Brasil, mesmo sendo uma piscicultura de pequeno porte, pois entendíamos o benefício desta tecnologia. Neste sentido, desde 2004 já usávamos bactérias na produção, só que em tanques escavados. Em 2011, por problemas de qualidade de água no nosso reservatório, passei a usar desta tecnologia em tanques-rede em águas públicas. Falavam que estava jogando dinheiro fora. Foi a maneira que consegui recuperar a água de nossa enseada e observar que o uso de biorremediadores ia além. Hoje desenvolvemos uma técnica com este produto que está controlando o mexilhão dourado, que todos sabem, é o câncer do setor produtivo”.
Editor da primeira revista da aquicultura brasileira! “Mais uma vez foi uma estratégia. As pessoas não entendiam o que era uma Associação. Cobravam muito e pagavam pouco por isto. A revista, diga-se, a primeira do setor, saiu da ideia de oferecermos mais aos associados. Como hoje, as dificuldades eram enormes. Artigos e anunciantes se hoje ainda é difícil, imagina isso em 1986. Aguentamos publicar 5 números. A revista tinha como objetivo promover a ABRACOA as nossas expensas, não aguentamos”.
E a ABRACOA? “Meu envolvimento com a ABRACOA – Associação Brasileira dos Criadores de Organismos Aquáticos, se deu por fazer parte do setor e por entender que seria uma maneira de me fazer presente profissionalmente. Ela fez seu papel, hoje existe em nome, mas não de fato. Outras entidades surgiram com mais força e representação”.
Mais inovações pela frente “Tenho uma série de projetos de tecnificação que espero colocar em breve em nossa piscicultura para facilitar o operacional da atividade. Como o bom filho ao lar retorna, estou montando um pesqueiro que espero dar o que falar!! Pequeno, mas cheio de tecnologia e inovações comerciais”.
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Consultor e produtor “O profissional autônomo no nosso setor (agropecuário) não é reconhecido. Usei como estratégia comercial o fato de ser produtor e esperar que os interessados fossem ao meu encontro. Senti que assim havia um maior respeito comercial por parte do interessado. Tal procedimento fez com que sempre produzisse. Hoje possuo uma área de produção em tanques-rede em um reservatório próximo a São Paulo (90 Km), onde engordamos tilápias para atender os pesqueiros da região”.
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Soluções para quem procura resultados consistentes.
Conheça os produtos da Phibro para aquacultura. A formulação exclusiva para tilápias e camarão do PAQ-GroTM auxilia no desempenho e status de saúde dos animais. O BioPlus® PS auxilia no equilíbrio da microbiota intestinal melhorando o ganho de peso e eficácia alimentar.
Distribuidor exclusivo:
Tilápia em bioflocos no Centro-Oeste do Brasil! Essa é a ideia da COOPAQ – Cooperativa de Pesca e Aquicultura de Goiás. Veja os resultados relativos à produção de tilápia (Oreochromis niloticus) do cooperado Tiago Oliveira, da fazenda Coqueiros, localizada em Orizona (GO), operando no sistema BRASYS (Biofloc, RAS e Aquaponic System).
Fazenda
Coqueiros
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Data do povoamento: 08/03/2018 Quantidade de juvenis estocados: 10.200 Volume: 200 m³ Densidade: 51 peixes/m³ Data da despesca: 07/07/2018 Dias de cultivo: 122 dias Peso final : 735 g Biomassa final: 7.170,7 Kg Produtividade: 35,85 Kg/m³ Sobrevivência: 96,5% Total de ração: 9.932 Kg Conversão alimentar: 1,49:1
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