revista arqa #103

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Contrastes Africanos Ano XIII – setembro|outubro 2012 €11,00 (continente) – €16,00 Espanha

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arqa a103 ARQUITETURA E ARTE

Contrastes Africanos

Peter Rich Diébédo Francis Kéré tamassociati Noero Wolff José Forjaz Costa Lopes blaanc + Rootstudio Architecture for Humanity Matteo Ferroni + eLand José Manuel Fernandes Dirk Hebel David Adjaye Ola Uduku Ora Joubert Mark Warren Omar Nagati Paulo Moreira Guimarães 2012

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ISSN: 1647- 077X

set|out 2012 | €11,00


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Os artigos assinados são da inteira responsabilidade dos autores

ARQUITETURA E ARTE

Propriedade:

set|out 2012 |��11,00

Contrastes Africanos

R. Alfredo Guisado, 39 – 1500-030 LISBOA Telefone: 217 703 000 (geral) 217 783 504/05 (diretos) Fax: 217 742 030 futurmagazine@gmail.com

Peter Rich Diébédo Francis Kéré tamassociati Noero Wolff José Forjaz Costa Lopes blaanc + Rootstudio Architecture for Humanity Matteo Ferroni + eLand José Manuel Fernandes Dirk Hebel David Adjaye Ola Uduku Ora Joubert Mark Warren Omar Nagati Paulo Moreira Guimarães 2012

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ISSN: 1647- 077X

Diretor Geral Edmundo Tenreiro etenreiro@revarqa.com

Foto: eLand

Contrastes Africanos

matérias

Ano XIII – setembro|outubro 2012 �11,00 (continente) – �16,00 Espanha

ÍNDICE

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MATTEO FERRONI + ELAND - SISTEMA DE ILUMINAÇÃO

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A R Q U I T E T U R A

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In/Outdoors News

Diretor Luís Santiago Baptista lsbaptista@revarqa.com

Atualidades e agenda

Editorial Luís Santiago Baptista – Contrastes Africanos

Entrevistas Contrastes Africanos: Perspetivas Críticas – José Manuel Fernandes, José Forjaz, Dirk Hebel, Diébédo Francis Kéré, David Adjaye, Ola Uduku, Ora Joubert, Mark Warren, Omar Nagati

Projetos Biografias Peter Rich – Centro de Interpretação Mapungubwe, Limpopo Diébédo Francis Kéré – Parque Nacional, Bamako Tamassociati – Contentor médico co-habitacional, Soba Noero Wolff – Escola feminina St. Cyprians, Oranjezicht, Cape Town José Forjaz – Mosteiro das Irmãs Clarissas, Namaacha Costa Lopes – Universidade Lusíada de Angola, Luanda blaanc + Rootstudio – Protótipo Emerging Ghana, Cape Coast Architecture for Humanity – Football for Hope, África Matteo Ferroni + eLand – Protótipo de sistema de iluminação, Mali

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David Leite Viana – Espaços urbanos africanos [in]formais

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A R T E

Fachadas, Pavimentos e Revestimentos

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E

www.revarqa.com – futurmagazine@gmail.com

Investigações Crítica Gonçalo Furtado – Mensagem aos construtores de Moçambique

Design Carla Carbone – “A cor do design”: O design na esfera social

Artes David Santos – William Kentridge: Consciência e deslumbramento Sandra Vieira Jürgens – Do Apartamento 22 à Big Factory

Itinerâncias Luís Santiago Baptista – Atlas de Parede e Brick is Red

Fotografia Fernando Guerra – FG+SG: Universidade Toroudant, Marrocos

Dossier 1 - Paulo Moreira 2 - Guimarães 2012 Mário Chaves

Angola Info - Boletim Informativo da Ordem dos Arquitetos de Angola (0A) Forum Lusíada Universidade Agostinho Neto Materiais fornecidos pelas marcas

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Paginação e Imagem Raquel Caetano Bruno Marcelino (desenhos) Edição Digital Ricardo Cardoso Comunicação e Marketing Maria Rodrigues (Diretora) mrodrigues@revarqa.com Carmen Figueiredo - cfigueiredo@revarqa.com Publicidade – PORTUGAL Tel. +351 217 783 504 Fax +351 217 742 030 futurmagazine@gmail.com Publicidade – BRASIL Jorge S. Silva Tel. +55 48 3237 - 9201 Cel. +55 48 9967 - 4699 jssilva@matrix.com.br Impressão Peres - Soctip, Indústrias Gráficas SA Estrada Nac. 10 - km 108,3 2135-114 Samora Correia Distribuição Logista Portugal Área Ind. Passil, lt 1-A, Palhavã 2894-002 Alcochete Tiragem 10.000 Exemplares

Livros

Marketing

Redação Paula Melâneo (Coordenação) apmelaneo@gmail.com Baptista-Bastos (Opinião), Bárbara Coutinho (Design), Carla Carbone (Design), David Santos (Artes), Gonçalo Furtado (Crítica), Margarida Ventosa (Geração Z) Mário Chaves (Livros), Nádia R. Bento (Tradução), Sandra Vieira Jürgens (Artes)

Apoio:

Periodicidade Bimestral ISSN: 1647- 077X ICS: 124055 Depósito Legal: 151722/00


In/outdoors

Fachadas, pavimentos e revestimentos

Hospital Privado de Guimar達es Caixilharia Navarra


In/outdoors

Fachadas, pavimentos e revestimentos CIN Avenida Dom Mendo, nº 831 Apartado 1008 – 471-909 Maia Tel. +351 229 405 000 Fax +351 229 485 661 Costumerservice@cin.pt www.cin.pt

NOVÁQUA HD (High Durability) é o mais recente exemplo de inovação da CIN, sendo a primeira tinta a incluir um certificado de garantia de 7 anos que assegura a qualidade dos resultados em exterior. Fruto de anos de investigação, NOVÁQUA HD é capaz de resistir às piores condições atmosféricas, condensações noturnas ou fungos. Esta tinta lisa mate, 100% acrílica para pintura de fachadas, tem uma elevada performance e durabilidade que cumpre os maiores padrões de exigência. Está disponível nas 165 cores do novo Catálogo de Exteriores da CIN e em centenas de outras cores.

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O resultado da paixão da Quick-Step pelo artesanato traduz-se em coleções fantásticas de novos décors. É assim com o conceito para a coleção Exquisa, ao mesmo tempo simples e engenhoso. De uma régua com a dimensão de 40x120cm foram elaboradas 4 opções diferentes de ladrilhos usando as juntas transversais: 1 ladrilho por régua (40x120cm), 2 ladrilhos por régua (40x60cm) ou 3 ladrilhos (40x40cm) por régua. A quarta opção, a versão multi-padrão vai um passo além, dando a cada régua uma variedade de tamanhos diferentes. A subtil junta produz o efeito de ladrilhos separados quando efetivamente não o são. Os designs dos ladrilhos assim como a textura dos mesmos, verdadeiramente fiéis à realidade, proporcionam a esta coleção um “look & feel” realmente especial.

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A variedade é apenas o começo… Com a Tarkett, as possibilidades são infinitas. Na nossa gama de produtos de Madeira encontra mais de 250 variedades de pavimentos. Escolha entre espécies com diferentes cores, formas e acabamentos. Escolha entre os diversos estilos que oferecem aparências exclusivas. Escolha diferentes números de lamelas na régua para criar um design tranquilo ou dinâmico. Escolha o tipo de verniz que vem aplicado de fábrica que, para além da protecção que assegura, torna a superficíe do seu pavimento brilhante ou mate. Escolha entre uma variedade de espessuras que lhe oferecem diferentes possibilidades de instalação. Escolha os rodapés e outros acessórios que adicionam um requintado toque final. Escolha... e seja bem vindo ao inesgotável mundo dos pavimentos Tarkett. www.tarkett.com

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In/outdoors

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Jovem e sofisticada, a coleção cerâmica EMMA, segue as tendências contemporâneas da decoração. Inspirada nas texturas e padrões do papel de parede, é requintada e aveludada ao toque, com textura estriada dada pela incisão de esmaltes e acabamento mate com um pouco de brilho. Pavimentos e revestimentos conjugam-se, ou usam-se de forma independente, dando ritmo e movimento aos espaços, em aplicações horizontais ou verticais. As suas 8 cores neutras, tornam Emma versátil para ambientes minimalistas e clean - Coconut (branco), Cream (beige claro), Cookies (beige), Mocha (castanho acinzentado), Earl Grey (cinza claro) e Black Sesame (antracite). As suas cores tendência - mint (verde agua) e bubble gum (lilás) – são ideais para ambientes modernos e originais.

Marques & Frederico Rua Carvalho Araujo, 40 1900-140 LISBOA Tel: 21 815 04 53 - Fax: 21 815 04 38 sede.info@marquesfrederico.pt www.marquesfrederico.pt

Tendo iniciado a sua actividade em 1985, Marques & Frederico, Lda., é uma empresa especializada na comercialização e assentamento de materiais na área dos revestimentos de pavimentos para uso profissional, colocando diariamente ao serviço dos seus clientes, a experiência e os conhecimentos acumulados ao longo destes anos. A nossa gama de produtos destina-se essencialmente a superfícies de tráfego intenso, nomeadamente escritórios, hospitais, escolas, lojas, hotelaria e grandes superfícies em geral. Tem sido imperativo da nossa empresa ao longo dos anos, a selecção criteriosa dos nossos fornecedores, tendo como objectivo a escolha dos melhores fabricantes mundiais, que assim nos oferecem garantias de qualidade e continuidade no fabrico dos materiais que comercializamos.

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PAV I M E N TOS Q U I C K S T E P . DESCUBRA UM MUNDO O N D E VA I A D O R A R V I V E R . Importador exclusivo

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Quer opte por laminado ou parquet, cada pavimento Quick ▯ Step® é uma inspiração para o seu interior. Solicite a sua brochura grátis em www.quick-step.com.

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In/outdoors

Fachadas, pavimentos e revestimentos Navarra Veiga das Antas, Navarra Apartado 2476 4701 – 971 Braga | Portugal T +351 253 603 520 F +351 253 677 005 geral@navarraaluminio.com www.navarraaluminio.com

O sistema n15 200 é utilizado em revestimentos de edifícios permitindo transparência e aproveitamento de luminosidade natural. Pelas suas características estéticas, vista e eficiência energética o sistema n15 200 pode ser utilizado tanto em construções de substituição, reconstrução ou ainda integrar novos projetos. Permite a integração de painéis fotovoltaicos para produção de energia elétrica. Perfis montantes e travessa com vista de 50mm. Várias profundidades em função da inércia necessária e tipo de obra. Possibilidade de enchimento até 42mm, com rutura térmica com isolador em poliamida 6.6. Ventilação e equilíbrio de pressão por diferença de planos, na direção dos montantes.

Tarkett Estrada de Talaíde Cruzamento de S.Marcos Edifício Tarkett 2735-531 Cacém - Portugal Tlf.: +351 214 276 420 infogeral@tarkett.com www.tarkett.com

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NEWS

atualidades

PAULA MELÂNEO|apmelaneo@gmail.com

13ª Bienal de Arquitetura de Veneza até Novembro Common Ground é o tema da 13ª Mostra Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza comissariada pelo britânico David Chipperfield, que abriu portas a 29 de Agosto. A cerimónia foi marcada pela atribuição do Leão de Ouro a Siza Vieira, prémio carreira, simbolicamente recebido pela comissária do pavilhão português, a arquiteta Inês Lobo. O Japão foi a participação nacional distinguida com o Leão de Ouro com “Architecture. Possible Here? Home-for-all”, comissariada por Toyo Ito, uma exposição de projetos de casas para pessoas afetadas pelo tsunami de 2011. Quanto à exposição comissariada por David Chipperfield, o Leão de Ouro foi atribuído à intervenção de Urban-Think Tank com Justin McGuirk, que apresentam um trabalho sobre a ocupação da Torre de David em Caracas, fotografada por Iwan Baan. O Leão de Prata que reconhece novas praticas emergentes foi para Grafton Architects, que expõem o projeto de um novo campus universitário em Lima, numa conexão com o trabalho de Paulo Mendes da Rocha. As menções especiais distinguiram os pavilhões da Polónia, E.U.A. e Rússia e também a exposição comissariada pelo italiano Cino Zucchi. O Pavilhão Português expõe Lisbon Ground (foto em baixo), definida pela comissária Inês Lobo como um “território de saberes, território comum a um grupo de pensadores onde se incluem pessoas da Arquitetura, do Cinema, da Fotografia, da Literatura…”. São apresentados 3 vídeos de conversas e reflexões de diversos arquitetos e arquitetos paisagistas sobre os temas Lisbon Downtown, Lisbon River e Lisbon Connections. Também 3 intervenções portuguesas estão patentes no Arsenale, a convite de David Chiperfield: uma intervenção de Souto de Moura em diálogo direto com o espaço/percurso que Siza Vieira idealizou, e a terceira realizada pela dupla Aires Mateus (foto em cima). Angola é um dos quatro países estreantes nesta Bienal com “Beyond Entropy”, tendo como curadores Stefano Rabolli Pansera e Paula Nascimento. A Bienal de Arquitetura de Veneza fecha as suas portas a 25 de Novembro. www.labiennale.org • www.lisbonground.pt

Snøhetta projeta extensão para Ordrupgaard O atelier norueguês Snøhetta venceu o concurso de projeto da extensão do museu dinamarquês Ordrupgaard. Em complemento ao espaço de galeria necessário a acolher a coleção francesa do Ordrupgaard, Snøhetta cria uma nova solução integrando paisagem e edifício. A proposta mantém a entrada do edifício existente, obra de Zaha Hadid, adapta os edifícios existentes, adiciona elementos paisagísticos e cria uma nova circulação, na qual o público flui durante a visita aos espaços expositivos. O edifício de Zaha Hadid foi concebido originalmente como um contínuo de espaços entre edifícios, galerias e jardins, e esta é a base para a nova intervenção de Snøhetta. “A solução tem uma suavidade dominante que contrasta com o desafio intrincado proposto no concurso” explicam os autores. A proposta, com o nome de Himmelhagen, foi escolhida por unanimidade do Júri. www.snohetta.com

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ateliermob premiado em Veneza O Prémio “Future Cities, Planning for the 90 per cent” teve 3 projetos vencedores: ateliermob (Portugal), Secretariado de Habitação do Município de S. Paulo (Brasil) e Interazioni Urbane (Itália). O ateliermob submeteu o trabalho “Working with the 99%”, no qual defende “um reposicionamento da prática de arquitetura como resposta urgente ao discurso que transmite a ideia de um país adiado e sem futuro.” É apresentado um caso de estudo que o ateliermob desenvolve atualmente no Bairro da Prodac em Lisboa, fruto de autoconstrução pelos moradores há mais de 40 anos. Em trabalho conjunto com a comunidade local e a autarquia, pretende-se legalizar e detetar situações de risco no bairro, num processo que conta com as respetivas associações de moradores e, para a zona norte, tem também o apoio do programa BIP-ZIP – Bairros e Zonas de Intervenção Prioritária de Lisboa. O Júri compunha-se de Anna Detheridge, Joseph Grima, Richard Ingersoll, Fulvio Irace e Mary Jane Jacob e selecionou 10 propostas finalistas entre as mais de 100 participações provenientes de diversos países. O Prémio finaliza numa exposição em Veneza, onde são

apresentados os 10 trabalhos finalistas, que pode ser visitada até ao dia 1 de Setembro no Magazzino Gardini, Punta della Dogana, enquanto evento paralelo à 13ª Bienal de Arquitetura. www.ateliermob.com


EDITORIAL

temático

Contrastes Africanos

Globalização e especificidade no fenómeno emergente da urbanização de África

LUÍS SANTIAGO BAPTISTA|lsbaptista@revarqa.com

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No final de Julho de 2011, nos últimos dias antes do seu fecho, visitei no Pavilhão Preto do Museu da Cidade em Lisboa a exposição Urban Africa, “uma viagem fotográfica por David Adjaye”. Nas palavras do arquiteto nascido na Tanzânia, filho de pais ganeses e radicado em Inglaterra: “Recolho as imagens e reflito sobre elas mais tarde. Para mim, este é um diário de esboços do ambiente urbano.”1 Apesar da lógica empírica, a experiência da principal sala da exposição, centrada no fenómeno de urbanização do continente africano, construía-se através de mais de 2.000 fotografias de tamanho convencional, tiradas ao longo de uma década em 52 das 53 capitais africanas. Estas fotografias eram classificadas livre mas sequencialmente por regiões (geográficas, climáticas e paisagísticas), por tipologias (cívica, comercial e residencial), por contextos históricos (tradicional, colonial e contemporâneo) por modos de produção (erudito ou vernacular), revelando uma estranha consistência que a amostra extensa permitia. De facto, identidades e diferenças podiam ser estabelecidas tanto num contexto geográfico específico como em relações que emergiam de conexões imprevisíveis entre territórios à partida diferenciados. As características próprias de cada região cruzavam-se com relações que pareciam atravessar a escala do continente. Como referia, “não quero falar de África como o local de uma arquitetura vernacular verdadeira, mas como o lugar de modernidade radical”2. Sem pretensões ou aspirações científicas, Adjaye tinha montado um eficaz dispositivo crítico de interpretação da urbanização africana. Torna-se significativo a este nível que a revista arqa tivesse nessa altura nas bancas um número temático sobre “contrastes sulamericanos”, onde nos concentrávamos no fenómeno de urbanização na América Latina. Nesse preciso momento, soubemos que mais tarde ou mais cedo lançaríamos um número sobre “contrastes africanos”. Interessa-nos continuar a investigar, num outro âmbito geográfico próximo mas diferente, essa ideia vincada de “contraste” entre o formal e o informal, entre o luxo e a sobrevivência, entre o plano e a apropriação, que nos últimos anos tem ganho atenção crescente do mundo disciplinar dito desenvolvido. Diríamos que sob o espectro da crise financeira global há que “aprender com” a realidade mais contrastante da urbanização emergente.

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Em 2006, Richard Burdett propunha o tema Cities: Architecture and Society para a 10 Biennale de Arquitetura de Venezia, baseada num inquérito a 16 grandes metrópoles espalhadas por todo o globo. Ao centrarse na urbanização planetária, Burdett trazia finalmente todo um novo leque de questões urbanas e territoriais, que estiveram relativamente afastadas do foco disciplinar das últimas décadas do século passado. No ensaio introdutório do respetivo catálogo, Burdett e Miguel Kanai apresentavam, de forma simplificada mas eficiente, um panorama do desenvolvimento da condição urbana contemporânea: “A partir deste inquérito parcial e seletivo do estado das cidades mundiais, observamos que a nossa atual era urbana é problemática e cheia de desafios urgentes mas promissores, no sentido que oferecem um potencial para repensar os significados, funções, capacidades e virtudes das diferentes formas de cidade e estratégias urbanas. Apesar de cada cidade enfrentar o seu conjunto de desafios particulares e complexos, existe um consenso crescente em algumas questões gerais a que

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as cidades, virtualmente em qualquer região do mundo, devem responder para se tornarem mais equitativas socialmente e efetivas ecologicamente.”3 No entanto, a grande relevância deste ensaio, apresentado com uma esclarecedora análise cartográfica à escala do planeta, estava na consciência da presença de um fenómeno global de urbanização, ao mesmo tempo que assinalava as diferenças estatísticas entre os vários continentes. Apesar da simplificação inerente a uma análise feita por grandes massas territoriais que são os continentes, não deixavam de se revelar conexões importantes entre o mundo desenvolvido e o mundo em desenvolvimento. Nesse mapeamento percebíamos que os fenómenos de urbanização globais, mais do que uma especificidade geográfica e cultural, se poderiam melhor caracterizar por dados económicos e sociológicos. Com base nessa cartografia temática poderíamos facilmente agrupar, por um lado, a Europa, os Estados Unidos, Japão e Austrália, por outro, a América Latina e África. A Ásia poderia ser um híbrido de ambas as realidades. O contraste entre realidades continentais tornava-se evidente. Se a evolução histórica das grandes cidades revelava a globalização de um fenómeno de urbanização que em meados do século XX, ainda se podia circunscrever praticamente ao mundo dito desenvolvido, em lenta progressão, a grande revolução das últimas décadas derivava exatamente da explosão exponencial de novos centros urbanos na América do Sul, África e Ásia. Por outro lado, nos mapas dos mais variados índices, da relação entre população jovem ou idosa, do grau de literacia, da esperança de vida, do Produto Interno Bruto, do consumo energético e emissões per capita de CO2, a verdade é que se podia dividir o mundo por realidades estruturalmente contrastantes, localizadas nas áreas opostas do espectro. Este simples exercício de mapeamento mostrava que a natureza do fenómeno global de urbanização teria que ser procurado nas variáveis políticas, económicas e sociais que, quer queiramos quer não, se podia confinar, salvo raras exceções, a uma lógica continental. Por outro lado, no mesmo catálogo, Saskia Sassen apresentava um ensaio de enquadramento verdadeiramente revelador. A autora, que antes investigara a ideia de “cidade global”, apresentava uma interpretação das relações estruturais entre os fenómenos de globalização económica, tecnológica e cultural e os processos de urbanização planetária. A originalidade da perspetiva de Sassen residia na sua tentativa de conciliação de realidades normalmente consideradas antinómicas. De facto, o material e o eletrónico, o físico e o virtual, o formal e o informal, o planeado e o apropriado, a estrutura e a infraestrutura não eram ai entendidos separadamente, mas como fatores em interação e complementaridade. No entanto, a grande visão de Sassen, antecipadora do atual ambiente disciplinar, passava pela consciência aguda do papel do informal e da informalidade nesse fenómeno urbanizador global, não meramente estruturante no mundo em desenvolvimento, mas igualmente, embora de modo diferenciado, no mundo dito desenvolvido. Como refere, “em suma, a nova economia informal nas cidades globais faz parte do capitalismo avançado.”4

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No início do novo milénio, Rem Koolhaas propunha, através da plataforma Harvard Project on the City, uma radicalização da perspetiva da urbanização africana. Concentrando-se em Lagos, interrogava-se a


Nesse mapeamento percebíamos que os fenómenos de urbanização globais, mais do que uma especificidade geográfica e cultural, se poderiam melhor caracterizar por dados económicos e sociológicos. Com base nessa cartografia temática poderíamos facilmente agrupar, por um lado, a Europa, os Estados Unidos, Japão e Austrália, por outro, a América Latina e África. A Ásia poderia ser um híbrido de ambas as realidades. O contraste entre realidades continentais tornava-se evidente.

Peter Rich, Centro de Interpretação, Mapungubwe, 2002-10 • tamassociati, Centro Médico-habitacional, Soba, 2009-10 • Mateo Ferroni+eLand, Protótipo de Ilumnação, 2010-12

condição urbana contemporânea através de investigação de potenciais modelos alternativos: “O enigma fundamental de Lagos, considerado tanto como paradigma e patologia extremas da cidade Oeste Africana, é a sua continuada existência e produtividade, apesar da quase total ausência daquelas infraestruturas, sistemas, organizações e facilidades que definem a palavras «cidade» nos termos da metodologia de planeamento ocidental. Lagos, como ícone da urbanidade Oeste Africana, inverte todas as características fundamentais da denominada cidade moderna. Porém, ainda é – por falta de melhor termo – uma cidade; e uma que funciona.”5 Sabemos do interesse continuado de Koolhaas pelo fenómeno da urbanização generalizada, que faz com que esteja a trabalhar no programa de Harvard simultaneamente nas cidades instantâneas do Rio das Pérolas na China e na realidade urbana informal de Lagos na Nigéria, focalizando-se em realidades esquecidas ou distantes da atenção disciplinar. Lagos interessava-lhe essencialmente por essa afirmação construtiva e intencional da informalidade, pela transformação e apropriação radical do plano infraestrutural moderno, pelas condições limite de funcionamento económico, legal e produtivo no espaço urbano, ou mesmo pela criatividade e engenho que se manifestam nas situações mais adversas. Por outro lado, o seu olhar excêntrico, sempre assertivo e irónico, subentendia que para compreender os processos de urbanização global, não basta olhar para o centro mas concentrarmo-nos no que acontece na periferia, ou seja, no lado assumidamente fraco da polaridade. Mas as intenções de Koolhaas e do Harvard Project on the City são mais estratégias do que analíticas, mais desconstrutivas do que críticas: “Este projeto é tanto um estudo de Lagos como um estudo das possibilidades mais radicais da disciplina do planeamento urbano, e uma proposta de novas maneiras de examinar a cidade. (…) Isto não é dizer que Lagos não nos está a acompanhar. Antes, nós é que podemos não estar a acompanhar Lagos. A cidade Africana força a reconceptualização da própria cidade. (…) Passa por examinar a cidade noutro lugar, no mundo em desenvolvimento. Passa por reconsiderar a cidade moderna e sugerir um paradigma para o seu futuro.”6 Mais do que confirmar a tese apresentada, sempre algo delirante, interessa mudar o ponto de vista e expandir o campo disciplinar, problematizando radicalmente as nossas conceções estáveis e pré-concebidas.

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A arquitetura africana contemporânea, após uma produção moderna substancial e original, traça hoje caminhos próprios no nosso mundo globalizado. Das obras emblemáticas que cruzam uma cultura internacional com as realidades africanas até às propostas informais de resposta a condições de emergência, a arquitetura africana tem sabido definir uma identidade aberta e contaminada. O Centro de Interpretação em Mapungubwe na África do Sul de Peter Rich e o Parque Nacional em Bamako no Mali de Diébedo Francis Kéré demonstram que é possível realizar a magnífica síntese entre uma espacialidade contemporânea e práticas construtivas locais. O Centro Médico e Habitacional no Sudão do tamassociati expande as possibilidades dos contentores marítimos aliados à reinvenção não nostálgica das tecnologias tradicionais. A escola feminina em Cape Town na África do Sul de Noero Wolff reestrutura e amplia um conjunto patrimonial preexistente com inesperadas e incisivas intervenções cirúrgicas. Na África de expressão portuguesa, José Forjaz constrói com simplicidade e sensibilidade um mosteiro em meio rural na Namaacha em Moçambique, enquanto em Luanda em Angola o atelier Costa Lopes reabilita a tradição moderna numa tipologia universitária. As Blaanc + Rootstudio constroem o seu modelo habitacional experimental, vencedor de um importante concurso internacional para o Gana. O programa liderado pela Architecture for Humanity em parceria com a FIFA revela uma estratégia original e bem sucedida de construção de uma série de espaços desportivos por todo o continente africano, despoletados como mundial de futebol na África do Sul. O protótipo móvel de sistema de iluminação de Mateo Ferroni + eLand mostra que a luz artificial pode derivar literalmente da iluminação das ideias.  David Adjaye, citação no folheto de sala, 2011. David Adjaye, «As Áfricas de Adjaye: entrevista por Alexandra Prado Coelho»; in Público, http://ipsilon.publico.pt/artes/entrevista.aspx?id=285189 3 Richard Burdett; Miguel Kanai, «City-building in an age of global urban transformation», in Cities, Architecture and Society: 10. Mostra Internazionale di Architettura, La Biennale di Venezia, New York, Rizzoli, 2006, p. 23, tradução livre. 4 Saskia Sassen, «Why cities matter», Op. Cit, p. 43, tradução livre. 5 Harvard Project on the City, «Lagos», in Mutations, Actar / Arc en Rêve Centre d’Architrecture, Barcelona / Bordeaux, 2001, p.652, tradução livre 6 Idem, Ibidem, pp. 652-653, tradução livre. 1 2

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ENTREVISTA

arquitetura

Contrastes Africanos Perspetivas Críticas

LUÍS SANTIAGO BAPTISTA PAULA MELÂNEO

arqa: Tendo em conta a sua investigação da relação da arquitetura portuguesa em África, e no âmbito do fenómeno de urbanização global, qual a especificidade do contexto territorial, urbano e arquitetónico Africano? JMF: A investigação que pude levar a cabo nas últimas décadas sobre a arquitetura e o urbanismo da antiga África Portuguesa, abrangeu espaços bem mais vastos do que os cinco países da atual África lusófona. Mas no essencial - como pude referir no volume sobre a África Subsahariana da obra Património de Origem Portuguesa no Mundo – Arquitectura e Urbanismo (dir. José Mattoso, ed. F. C. Gulbenkian, 2010-2012, ed. em português e inglês, e ed.em site eletrónico www.HPIP.com) – foi possível concluir pelo enorme valor intrínseco, diversidade tipo-morfológica e longa duração (quase 600 anos) desse legado patrimonial, nem sempre de origem (por vezes apenas de influência), mas sempre numa matriz identificável com a nossa cultura de extremo-ocidente-euro-meridional. De facto, em paralelo com várias obras e sítios da Época Moderna (séculos XV a XVIII), classificados pela UNESCO como Património da Humanidade nos últimos 35 anos (Ilha de Goreia no Senegal/1978, entrepostos no rio Gâmbia/2003, Forte da Mina no Gana/1979, ilha de Moçambique/1991, forte de Quíloa /Kilwa na Tanzânia/1981, Gondar na Etiópia/1979, Cidade da Ribeira Grande de Cabo Verde/2009, com previsão da classificação de Mbanza Congo em Angola), atestando esse valor, riqueza de formas/espaços e longevidade - a colonização lusa produziu mais recentemente outros, amplos e maiores valores, de que são exemplos marcantes as quatro ou cinco principais cidades, e o vasto recheio da sua arquitetura moderna, de Luanda a Lobito, de Maputo a

Beira, de Bissau a Huambo, entre muitas outras localidades. Falo, no quadro dos 5 PALOPs – e criadas ao longo da Época Contemporânea, sobretudo nos anos 1860-1975 – de um conjunto de cidades, vilas e povoações, melhor, de um autêntico sistema urbanizador (territorialordenador), urbanístico (com base científica e planeada) e urbano (produtor de vivência e elevado ambiente para vida coletiva) que ficaram, apesar de guerras e abandonos conjunturais, e hoje constituem a base real para o relançamento ou dinamização da vida urbana desses países. O fenómeno pode explicar-se em parte porque, como refere o historiador Rui Ramos, a seguir ao caso da África do Sul, foram Angola e Moçambique que tiveram a força populacional colonizadora mais forte em todo o sul africano. Isto deixou raízes, sistémicas, vernáculas e disseminadas, que perduraram. Ora, no que toca à pergunta feita, ignorar ou menosprezar o significado, valor e papel deste conjunto patrimonial urbano e arquitetónico nos 5 PALOPs (e noutras áreas), nomeadamente a sua enorme utilidade e papel ativo no ressurgimento do fenómeno urbano contemporâneo destes países, substituindo esse papel pela eventual valorização das vastas áreas de “cidade informal” ou “subúrbio informal”, por estas serem de origem especificamente africana - seria erro e absurdo idêntico a querer, nessas mesmas nações, como exemplo, apagar ou ignorar a língua portuguesa oficial, como seu elemento único de cultura unificadora e moderna – em favor de quaisquer línguas africanas locais tradicionais, por muito que custe a um olhar ideologicamente mais nacionalista. De facto, penso que a Cidade Africana atual (e falo do caso das cidades dos 5 PALOPs, que melhor conheço), no século XXI, se constituiu paulatinamente na resultante lógica do processo histórico dos anteriores séculos: resulta certamente da articulação entre as estruturas materiais coloniais (com base nos modelos das urbes modernas e contemporâneas europeias-americanas) e as das culturas tradicionais e modernizadas locais - estas com regras, sistemas e estruturas mais leves e ágeis, e hoje implantadas em muito maior extensão geográfica

Foto: arquivo José Luís Tinoco, por cortesia

Bilhete postal: coleção José Manuel Fernandes arq.

José Manuel Fernandes

Arquiteto, Professor FA-UTL, Autor “Geração Africana” e “Arquitectura e Urbanismo na África Portuguesa”

Aerogare de Pemba (antigo Porto Amélia), Moçambique.

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Edificações modernistas dos anos 1930-40, praça municipal de Beira, Moçambique.


Ignorar ou menosprezar o significado, valor e papel deste conjunto patrimonial urbano e arquitetónico nos 5 PALOPs (e noutras áreas), nomeadamente a sua enorme utilidade e papel ativo no ressurgimento do fenómeno urbano contemporâneo destes países, substituindo esse papel pela eventual valorização das vastas áreas de “cidade informal” ou “subúrbio informal”, por estas serem de origem especificamente africana. José Manuel Fernandes

Foto: José Manuel Fernandes arq, 1996

Praça frente à estação de caminhos de ferro, com edifício de Pancho Guedes e estátua aos heróis da Grande Guerra, Maputo, (antiga Lourenço Marques), Moçambique.

urbana. Mas isto não apaga a base construtiva, infraestrutural, viária, habitacional e equipamental das cidades legadas pela fase anteindependência, agora (e cada vez mais, à medida que o crescimento se afirmar) indiscutível fator de definição funcional, estética, cultural, dos centros principais dessas urbes. E seria pura demagogia populista fazêlo. É da assunção e da interiorização consequente deste “facto mestiço”, pelos intervenientes, autoridades, decisores, atores, agentes, criadores e público em geral, que nascerá necessariamente a cidade de hoje e de amanhã, em Angola como em Moçambique e nas outras nações de língua oficial lusitana.

arqa: Perante os acentuados contrastes económicos, políticos e sociais característicos da África, como pode o arquiteto ter uma intervenção positiva na melhoria e desenvolvimento das cidades? JMF: Os arquitetos trabalhando e intervindo atualmente nestes países – sejam africanos, europeus ou asiáticos – devem compreender, conhecer e dar grande prioridade aos fenómenos históricos e culturais, arquitetónicos e urbanos, associados aos PALOPs, e à África atual em geral – nomeadamente esta ambivalência e necessária complementaridade entre a chamada “cidade de betão” ex-colonial e a “cidade informal” pré e pós colonial; isto para que a sua atuação seja

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PROJETOS

África do Sul

Peter Rich

Centro de Interpretação Mapungubwe, Parque Nacional Mapungubwe, Limpopo

Arquitetura: Peter Rich Architects Estruturas: Henry Fagan & Partners Engenharia de materiais: Matthew Hodge, E.U.A. Empreiteiro geral: Ousnqa Builders Cliente/ Promotor: SANParks com o fundo do Department of Environment and Tourism Consultor de trabalho intensivo: Anne Fitchett Consultor de redução da pobreza: Lineo Lerotholi, Lesotho Construção das abóbadas: James Bellamy, Nova Zelândia Engenharia das abóbadas: Michael Ramage e John Ochsendorf, E.U.A. Data: 2002-10 Texto: Peter Rich Architects Fotografia: Peter Rich Architects

proj. 1

O novo Parque Nacional de Mapungubwe celebra o local de uma antiga civilização mercantil, tecnologicamente avançada do século IX, na fronteira entre o Zimbabué e o Botswana. A natureza e a paisagem rochosa foram a inspiração para o projeto e natureza dos materiais de construção do novo Centro de Interpretação. O edifício, assente na base de um planalto, está visualmente contido por três lápides vazias que evocam os marcadores de percurso, bastante comuns nas culturas Sul-Africanas. Foi usado o sistema de abóbadas Timbrel, uma simples expressão das forças naturais e dos materiais, para construir espaços dramáticos, semelhantes a cavernas. À distância, as abóbadas ondulantes revestidas a pedra, confundem-se com a paisagem. À medida que nos aproximamos, as finas arestas arqueadas ficam expostas e as abóbadas planam e parecem erguer-se da terra. Passagens delicadas criam um percurso rampeado em ziguezague que percorre o complexo, através de espaços de exposição, acompanhando suavemente a subida, até ao ponto mais alto do planalto, proporcionando ao visitante uma multiplicidade de experiências e paisagens. Durante o processo de construção do Centro, formaram-se pessoas locais desempregadas, na manufatura de azulejos de argila estabilizados e na construção das abóbadas. Os pedreiros continuaram a colocar em prática estas competências, utilizando os azulejos que sobraram nas suas casas, em aldeias vizinhas. Assim, o Centro não é emblemático só deste local, África e a sua localização única na origem do mundo, tornando-se parte de uma história que ainda se desenrola, de uma cultura que se desenvolve em simbiose com o seu legado natural. 

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PROJETOS

Mali

Diébédo Francis Kéré

Parque Nacional, Entrada, Restaurante e Centro Desportivo, Bamako

Arquitetura: Kere Architecture, Diébédo Francis Kéré Equipa: Isabelle McKinnon, Claudia Buhmann, Olivier Gondouin, Emanuela Smiglak, Ines Bergdolt Estruturas: Birad Sarl (betão), Samko Turkey (cobertura) Supervisão de obra: AKTC (Manuel Mora Sánchez, Souleymane Diallo, Hamed el Biblawy, Roberto Fabbro) com Kere Architecture Engenharia: AKTC (Sylvain Fovet) Paisagismo: Planning Partners, SA Cliente: AKDN / AKTC Área: 3000 m² (bruta) Custo: 1.700.000 EUR Data: abr. 2009 – dez. 2009 (projeto e fase 1 de planeamento); nov. 2009 – set. 2010 (construção) Texto: Kere Architecture Fotografia: Iwan Baan

proj. 2

Para o quinquagésimo aniversário da independência do Mali, o Parque Nacional de Bamako irá reabrir com novos edifícios como um restaurante exclusivo, um centro desportivo e vários edifícios de acesso. O restaurante está situado no topo de uma formação rochosa e adaptado às diferentes cotas. O edifício está dividido em quatro cubos que correspondem às diferentes funções. A preocupação foi sempre a de integrar no projeto a paisagem espetacular sobre o parque e do lago vizinho. O centro desportivo, seguindo o exemplo do restaurante, vai ao encontro da mesma linguagem arquitetónica. São três pavilhões que se localizam à volta de um pátio em elipse. Os edifícios estão dispostos de forma a fornecer o máximo de sombra ao pátio e também aos espaços de lazer interiores. Neste local, as relações entre os espaços interiores e exteriores também tiveram um papel muito importante no projeto. Os edifícios de acesso interpretam o estilo arquitetónico do restaurante e do centro desportivo. Desta forma, o conjunto dos diferentes complexos cria uma arquitetura única e reconhecível para o parque pela linguagem comum utilizada e pela escolha dos materiais. Todos os edifícios estão cobertos no exterior com a pedra natural da região, cuja utilização reforça a identidade local e poupa nos custos de construção. As paredes de pedra exteriores fornecem um isolamento natural e uma climatização dos espaços internos. As grandes coberturas em consola fazem sombra às fachadas e criam um ambiente interior agradável. Prevê-se um sistema de ar condicionado para divisões mais exclusivas, como a sala de jantar, no restaurante. Nestes casos, a espaço entre a parede massiva e a cobertura foi colmatada com uma tira. 

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PROJETOS

Sudão

tamassociati

Contentor médico co-habitacional, Soba

Arquitetura: tamassociati - Raul Pantaleo, Massimo Lepore, Simone Sfriso, with Pietro Parrino and Gino Strada; Coordenador do Programa: Emergency Technical Office, Pietro Parrino; Estruturas: Francesco Steffinlongo Mecânica/Serviços: Nicola Zoppi Engenheiros de obra: Roberto Crestan, Alessandro Tamai, Claudio Gatti; Construtor: ISNAD Sudan. Localização: Soba, Khartoum (Sudão) Cliente: Emergency ngo (para Centro “Salam” de cirurgia cardíaca) Área: 8.663 m² (total); 1.668 m2 (coberta) Data: 2009-10 Texto: Studio tamassociati Fotografia: Raul Pantaleo

proj. 3

Ao observar o número de contentores abandonados à volta do edifício de Centro de cirurgia cardíaca “Salam”, tivemos esta ideia simples: reutilizá-los para realizar o complexo internacional de co-habitação para os funcionários. O Complexo, localizado ao lado do Hospital, na vizinhança do rio Nilo, está construído à volta de um grande pátio cheio de mangueiras maravilhosas. São 95 contentores de 6,1 metros, para habitação, e 7 contentores de 12,2 metros para a sala de refeições comum e serviços comunitários. Todas as habitações têm 20 m² e são feitas com um contentor e meio; a habitação é composta por quarto, casa de banho e uma pequena varanda do lado do pátio. Dedicou-se um cuidado particular ao isolamento e à poupança de energia. Os contentores foram isolados com um “sistema de camadas”. Foram colocados painéis de isolamento de 5 cm dentro do contentor. A “camada” exterior foi realizada com uma segunda cobertura isolada e um sistema brise-soleil de painéis de bambu. Desta forma, os raios solares nunca chegam a atingir os contentores. Este sistema dá origem a uma enorme poupança de energia. Os painéis solares também fornecem água quente a todo o complexo. O Centro de cirurgia cardíaca “Salam” oferece cuidados de topo para crianças e adultos que sofrem de doenças cardíacas, desenvolvidas ou congénitas. Localizado na capital sudanesa, Khartoum, o Centro Salam é, atualmente, a única instalação especializada e gratuita, num raio de 11.5 milhões de km2 (três vezes o tamanho da Europa), com uma população de 300 milhões de pessoas. O Centro, operacional desde Abril de 2007, é gerido e dirigido pela EMERGENCY, uma Organização Não-Governamental (ONG) italiana, dedicada a dar assistência médica e cirúrgica às vítimas da guerra e da pobreza. 

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Implantação

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PROJETOS

África do Sul

Noero Wolff

Escola feminina St Cyprians, Oranjezicht, Cape Town

Arquitetura: Noero Wolff Architects Equipa: Jo Noero, Evandro Schwalbach, Korinne Stegman, Mias De Vries, Kylie Richards Estruturas: De Villiers and Hulme Medições: Riverside Consulting Engenharia mecânica e eletricidade: Clinkscales Maughn-Brown Paisagismo: Byron Douglas Studio Empreiteiro: GVK Syizama Texto: Professor Jo Noero Fotografia: Evandro Schwalbach, Mias de Vries, Dave Soutwood, Uno Pereira

A Escola de St Cyprians é uma escola anglicana bem estabelecida na Cidade do Cabo. Tanto a localização da escola como os edifícios originais, projetados pelo atelier de Herbert Baker, Kendall and Morris, são muito especiais. O desenvolvimento da escola nos últimos 100 anos ocorreu de um modo inconsistente, originando um rico mosaico de diferentes histórias e estilos de construção. O mais importante, neste período, foi a escola resistir à tentação de reorganizar os espaços de uma forma racional e utilitária moderna. Isto deu origem a espaços semelhantes àqueles que encontramos numa cidade, onde os encontros fortuitos acontecem. Os caminhos dos alunos entrecruzam-se todos os dias a caminho das aulas, construindo uma rede não hierárquica de espaços e rotas de movimento, que permitem que os caminhos das meninas mais novas e mais velhas se cruzem e entrecruzem. Foi começada, no início de 2000, uma campanha para repensar a escola, culminando na construção de novos edifícios e espaços dentro do recinto da escola. O mais importante é que a informação que os arquitetos receberam foi de que, ainda que respeitassem e gostassem dos edifícios mais antigos, não criassem uma imitação pastiche, mas marcassem uma nova linguagem de edifícios que, resultando numa rutura com o passado, ainda assim o respeitasse. Três ideias chave formaram a base da estratégia do projeto, tendo todas impacto na forma de pensar o Património, assim como nos modos de usar a História como fonte de ideias para fazer arquitetura contemporânea.

proj. 4

1. Conservação progressiva versus conservação Patológica No seu livro seminal A Arquitetura da Cidade, Aldo Rossi distingue duas atitudes diferentes em relação a edifícios históricos. A primeira resposta, que designou como Conservação Patológica - com isto quis referir-se a uma abordagem que procurou fazer regressar o edifício a um estado que se aproximaria da sua condição original - esta atitude, incluiria congelar a utilização dada aos espaços e deixá-los como se pretendia originalmente. Considero que esta abordagem é antagónica em relação à ideia que a arquitetura é parte de uma tradição viva, na qual os edifícios mais antigos são continuamente ajustados, para se adequar a novas utilizações ao longo do tempo em resposta a novas necessidades que a sociedade possa fazer surgir. A Conservação Progressiva diz respeito a lidar com a arquitetura como uma tradição viva, em que se dá nova forma aos edifícios ajustando-os a novas utilizações ao longo do tempo. Esta necessidade significa que a estrutura edificada está continuamente a ser ajustada e que novos usos e espaços são adicionados à estrutura existente. Esta foi a abordagem em St Cyprians.

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2. Espaço Arcaico Partindo da sua pesquisa sobre a estrutura e natureza da cidade tradicional, Rossi também propôs que as obras arquitetónicas que possuem a maior capacidade de adaptação a novos e diferentes usos, ao longo do tempo, são aquelas que têm maior precisão geométrica. Por exemplo, o Coliseu de Roma suportou, sem esforço, uma variedade enorme de utilizações ao longo de dois mil anos de existência sem ter alterado a ordem básica da estrutura e do espaço do edifício. Denominei esses espaços de Espaço Arcaico. A minha interpretação destes espaços é que são marcados por um forte sentido de geometria platónica, dando-se especial expressão em relação à planta. Devido ao facto da escola exigir, em certos casos, que se projetem conjuntos de espaços cujas futuras utilizações são indeterminadas, construímos a partir de geometrias muito específicas. Isto revela-se no Centro de Vida em que se propõe a utilização para diferentes fins, muitos dos quais ainda não foram determinados - num certo sentido, pediram-nos para projetar um espaço para o qual ainda não se designou, nem se designaria nenhum fim específico. A forma da planta é gerada pela utilização de geometria platónica e compreende um círculo, dentro de qual se coloca um quadrado e depois um hexágono. No centro, o espaço é, mais uma vez, resolvido com um quadrado e uma esfera. Em corte, o edifício tem proporções de um quadrado no que concerne à altura e à largura. Esta estratégia produziu um espaço com uma forte ordem espacial e geométrica. tendo já provado a sua versatilidade ao ser usado para fins muitos diferentes entre si, incluindo hóquei em patins, um concurso nacional de debates estudantis e um centro de avaliação. 3. Terceiro Espaço Em muitas escolas os espaços são projetados considerando apenas funções utilitárias, resultando em dois tipos de consequências. Em primeiro lugar, os espaços deixam de lado o empenho criativo das crianças, em termos de uso, devido à sua singularidade. Em segundo lugar, os espaços não permitem usos múltiplos ou diversos. Para lidar com esta questão criámos um conjunto de espaços que denominámos Terceiro Espaço. De certa forma, o Espaço Arcaico e o Terceiro Espaço são semelhantes pelo facto de ambos procurarem dar lugar a diferentes usos. A diferença é que o Terceiro Espaço tem como característica estar inserido numa rede espacial maior, enquanto que o novo espaço fica adjacente a outro espaço maior. Por seu lado, o Espaço Arcaico mantém-se dentro do seu próprio conjunto de espaços. A ideia do Terceiro Espaço é melhor ilustrada pelos espaços circulares conectados do Centro de Conhecimento, no velho Ginásio. Estas construções de madeira em larga escala, situadas ao longo de uma rua interior que percorre a zona adjacente à nova biblioteca, foram feitas sem nenhum propósito específico em mente. Os espaços foram dados aos estudantes para que fizessem deles o que quisessem. Consequentemente, surgiu uma enorme variedade de utilizações incluindo teatro de improviso, reuniões grandes e pequenas, leituras silenciosas, fazer os trabalhos de casa e ensinar, entre outros usos. O que fica claro é que os usos que os estudantes atribuíram aos espaços vão muito além do que os arquitetos poderiam ter imaginado. A forma como estes espaços se disponibilizam para uma multiplicidade de usos, escolhidas ou imaginadas pelos utilizadores, leva-nos ao conceito de Terceiro Espaço


Foto: Evandro Schwalbach

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José Forjaz

Mosteiro das Irmãs Clarissas, Namaacha

O projeto situa-se num vasto terreno, com um declive acentuado, na Vila da Namaacha, na encosta dos montes Libombos, junto à fronteira com a Suazilândia e com vistas espetaculares para o quadrante Norte. O projeto, além da residência das Irmãs e seus locais de trabalho, inclui uma capela que deverá servir também a comunidade local cristã mas que não pôde ser incluída na primeira fase da construção. O clima, mais ameno que o de Maputo devido à altitude do lugar, proporcionou uma solução em pátio que, permitindo ventilações cruzadas em todos os espaços interiores, cria condições para um pequeno claustro abrigado, que funciona como poço de luz e de aquecimento natural, no tempo frio. O edifício reflete no seu tratamento a necessidade de isolamento e clausura que impõe a ordem das Clarissas e a necessidade de proteção numa zona urbana menos segura. A imagem é, portanto, a de uma presença quase ascética e interiorizada, com uma volumetria elementar marcada apenas pela modesta indicação de um ponto de entrada, com uma cruz em ferro, a reposicionar quando estiver construída a capela. Na composição dos espaços deu-se atenção prioritária à correta orientação de todos os espaços interiores para Norte e Sul e definiu-se um sistema de fachadas que incorporam os elementos de ventilação, proteção solar e asseguramento da segurança e privacidade necessárias. Os espaços comuns e de trabalho situam-se em rés-do-chão e as celas e abluções no primeiro andar, á volta do claustro ajardinado e com vistas controladas sobra a paisagem longínqua. A capela, a construir em segunda fase, tem acesso interior pela irmãs e direto do exterior para a comunidade. A sua iluminação natural é muito controlada e coordenada com a ventilação por forma a assegurar uma interioridade e um recolhimento em forte contraste com a amplidão da paisagem envolvente. A presença do edifício na paisagem só estará plenamente conseguida quando estiver acompanhada pelas árvores e vegetação concebidas no plano paisagístico.

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CASA EXISTENTE

N

RU A

EDIFICIOS DA FRONTEIRA

Implantação

Foto: José Forjaz • Arquitectos

proj. 5

A tecnologia construtiva adotada foi a mais corrente em Moçambique com uma estrutura em betão armado e enchimentos em blocos de areia cimento. Para as coberturas adotámos um sistema de abobadas em abobadilhas de areia cimento montadas em vigotas pré esforçadas, evitando cofragens contínuas. Todas as superfícies interiores e exteriores são rebocadas com argamassas bastardas e pintadas em cores claras, incluindo a cobertura. Privilegiaram-se as tecnologias correntes com um máximo de integração de mão-de-obra local. O edifício aproveita as águas pluviais, que são armazenadas numa grande cisterna que aproveita o declive do terreno, e inclui um sistema de aquecimento de águas por painéis solares. 

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Arquitetura: José Forjaz - Arquitectos Equipa: José Forjaz, Daniel Louro, Vitor Tomás, Antônio Sousa, João Silva, Pedro Louro, Pedro Tomás (arquitetos); Maria Antónia Quadros e Elsa Canotilho (secretárias) Estruturas: Jorge Silva, Engº Civil Eletrotecnia: GPC Hidráulica: Walter Pericão Gomes Pinto Medições: José Forjaz - Arquitectos e Medorça Construtor: Soares da Costa (Moç) Direção da Obra: Arqº Daniel Louro Áreas: 623 m² (interior); 136 m² (exterior coberta); 46 m² (descoberta exterior); 110 m² (ajardinada interior) Custo: € 530.000,00 (€850/m²) (total construção, incluindo 17% de IVA) Texto: José Forjaz • Arquitectos Fotografia: José Forjaz • Arquitectos, Filipe Branquinho

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Moçambique

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PROJETOS


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PROJETOS

Angola

Costa Lopes

Edifícios no Pólo Universitário, Universidade Lusíada de Angola, Luanda

Arquitetura: Costa Lopes Arquitectos Especialidades: Progest Estudos e Projectos Data: 2003 Texto: Costa Lopes Arquitectos Fotografia: Costa Lopes Arquitectos

proj. 6

O desenvolvimento do projeto de dois edifícios para a Universidade Lusíada de Angola, em Luanda, ao responder a solicitações específicas e concretas do seu funcionamento quotidiano enquanto Instituição e espaço de ensino, pretendeu simultaneamente contribuir para a construção da estrutura urbana envolvente e para a definição da apropriação dos espaços exteriores do recinto do Pólo Universitário. Em termos de relação com o contexto urbano próximo, pretendeu-se contribuir para a qualificação da Calçada de Katadi, quer em termos da sua definição enquanto espaço-canal, como Rua, quer em termos da sua vivência ao proporcionar a ligação visual directa entre o nível mais público do edifício e a rua. Em termos de definição do recinto do Pólo Universitário, a posição relativa dos dois edifícios corporiza o cunhal interior Noroeste/Sudoeste, definindo simultaneamente o quarteirão e a grande plataforma exterior, de uso coletivo, do recinto. Em termos tipológicos, o sistema de circulações construído por galerias longitudinais articuladas por núcleos de comunicação vertical, define uma organização “em pente”, na qual se hierarquizaram ao longo de 5 pisos os diversos serviços e espaços em termos de intensidade e frequência de utilização. Os espaços de maior intensidade de utilização, com maior movimento e ruído, ou os que recebem público em geral, localizam-se no piso mais baixo e o mais próximo possível das entradas. Subindo para os pisos mais altos e penetrando no interior do edifício, a intensidade de utilização reduz-se. O sistema de distribuição, enquanto sistema espacial que consubstancia um percurso com graus de recolhimento sucessivos desde o grande espaço central do recinto, conclui-se no piso mais alto com uma vista sobre a fortaleza de São Miguel. O sistema material e metodológico-construtivo é determinado por duas ações contrastantes fundamentais: opacidade para o exterior e abertura para o interior. Estas acções corporizam-se enquanto “muro” ao longo da Calçado de Katadi e enquanto pórtico que se oferece ao recinto exterior da Universidade, construído como “esqueleto” que revela simultaneamente a natureza estrutural e funcional do edifício. 

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PROJETOS

Gana

Blaanc + Rootstudio Protótipo Emerging Ghana, Cape Coast

Arquitetura: blaanc + João Caeiro (Rootstudio) - Portugal / Brasil / México Cliente: Open Source House / Enviu - (Holanda) Construtor: Dominic Mark-Aaba Fiscalização: Stichting Bouwen (Foundation to Build) – Holanda Área: 160 m² Custo: 21.679,84€ Datas: 2010-12 Texto: blaanc Fotografia: blaanc

proj. 7

O atelier português blaanc borderless architecture em parceria com o arqº João Caeiro (Rootstudio), ganhou o concurso internacional de arquitetura Open Source House, cujo objetivo era projetar uma habitação sustentável, flexível e de baixo custo, que servisse de modelo para países em desenvolvimento. O projeto pretende, acima de tudo, ser facilmente reconhecível no contexto do Gana, e por isso aposta numa configuração espacial que seja familiar àqueles que nele vão habitar. Deste modo o pátio – frequentemente utilizado nos climas tropicais e mais concretamente pela arquitetura dos Ashanti (grupo étnico do Gana) - surge assim como o coração da casa, como o elemento unificador e ordenador do espaço. Ali se passam muitas das atividades diárias de cada família, como cozinhar, lavar ou brincar. O projeto baseia-se em 3 princípios fundamentais: inserção no contexto local, quer em termos de configuração arquitetónica, quer em termos do uso dos materiais da região; sistema modular, que facilita a montagem, o transporte e a reutilização e eficiência energética, através do uso de ventilação natural, aproveitamento solar, aproveitamento de águas, tratamento de resíduos e materiais sustentáveis. A casa pode ser construída por etapas, prevendo-se que possa crescer ao longo do tempo, ajustando-se às necessidades e às possibilidades de cada família. Esta flexibilidade é conseguida essencialmente através da utilização de módulos que se repetem e da união entre os materiais se fazer com “conexões secas”. De facto, existe uma simbiose entre os painéis leves e modulares de bambu e madeira e as paredes pesadas de terra, sendo aplicados segundo quatro variantes. Estes elementos criam também uma relação agradável entre o interior e o exterior, proporcionando espaços de qualidade. Por sua vez, ao separar a estrutura dos revestimentos através do uso de “conexões secas”, facilita-se a possibilidade de se substituir, reparar ou aumentar a casa, tornando-a flexível. [Emerging Ghana foi publicado na fase de projeto na arqa 98/99 de nov/dez 2011] 

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PROJETOS

África

Architecture for Humanity Football for Hope, vários locais em África

Bolseiros de projeto: Isaac Mugumbule, Michael Heublein, Killian Doherty (theflyingpadre), Tommy Calhoun, Axel Stelter, Luvuyo Mfungula, George Kinuthia, Unathi Mkonto, Mark Warren Equipa: Kate Stohr (Afh - Co-fundadora), Madleen Noreisch (FIFA – CSR), Jan Luebbering (sfw), Katrin Elsemann (sfw – Gestão de Projeto em África), Erwin Nijsingh (Greenfields), Corina Eggenberger (FIFA - CSR Gestão de Programa) Christine Lara (sfw), Jhono Bennett (membro da equipa da Namíbia), Jan Coetzee (Sfw - Gestão de Projeto), Kevin Gannon (Afh - Gestão de Programa Regional), Gretchen Mokry (AfH - Gestão de Programa) Ifeoma Ebo (Coordenador de Programa) Ana Pardal (Yingli), Richard Ellis (Isolamento Eco), Shadrock Roberts (shadrock), Brandon Dreyer (SFW Gestão da Construção), Kay Strasser (AfH - Web Site), Delphine Luboz, Ana Reis Tipo: Estádios/Equipamentos desportivos, Clínicas de saúde, Centros comunitários Organização patrocinadora: FIFA Parceiros do projeto: streetfootballworld, Architecture for Humanity Beneficiários: Comunidades locais em África Data: 13 de abril de 2008 (início) Texto: Architecture for Humanity Fotografia: Architecture for Humanity

proj. 8

O Movimento Football for Hope (FFH) é o elemento chave da aliança estratégica entre a FIFA e o mundo do futebol de rua. Foi criado para aumentar o diálogo e a colaboração entre organizações localmente ativas para o desenvolvimento social e associações de futebol, clubes e jogadores empenhados, ligas profissionais assim como patrocinadores envolvidos. O Movimento FFH tem por objetivo utilizar o papel do futebol na sociedade, contribuindo para a realização dos Objetivos para o Desenvolvimento Millennium das Nações Unidas. Pretende estabelecer um selo de qualidade para programas de desenvolvimento de sustentabilidade social e humana que trabalham com o futebol como ferramenta central em áreas como a Promoção da Saúde, Estímulo à Paz, Anti-Discriminação & Integração Social, Direitos dos Menores & Educação e o Ambiente, contribuindo assim para melhores práticas neste campo. O mundo do futebol de rua, como chave do Movimento, apoia o desenvolvimento de Centros de FFH, em parceria com os nossos membros da rede de futebol de rua. Cada Centro de FFH consiste na realização de um campo de futebol para jovens e um espaço de reunião para albergar programas sociais e económicos comunitários. Os programas deverão ser centrados nas crianças e jovens, e usar o futebol como instrumento para promover a participação e o diálogo. O âmbito e o orçamento de cada centro depende da programação proposta pelo parceiro da rede local. Um centro típico consiste num campo de futebol para jovens com 20m x 40m, um pavilhão ou pequena estrutura comunitária, e acesso a serviços como água, eletricidade e instalações sanitárias. O tamanho de cada centro irá variar entre 100 e 200m2. O mundo do futebol de rua iniciou parcerias estratégicas de desenvolvimento para apoiar membros do mundo do futebol ao longo do processo de projeto e construção. Foram selecionados 4 parceiros para desenvolver centros piloto um pouco por toda a África de modo a inaugurarem em conjunto com a Taça Mundial de 2010. 

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Projeto: Killian Doherty Localização: Kimisagara, Kigali, Ruanda Cliente: Espérance Custo: $276.000 USD Área: 200 m² Data: 2009 (início)

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PROJETOS

Mali

Matteo Ferroni + eLand

Protótipo de sistema de iluminação, diversas áreas rurais

Pesquisa, conceito e projeto: Matteo Ferroni com eLand Desenvolvimento da tecnologia: Nadlec Lighting Divulgação no Mali: ADM Custo: 380� para 4 lâmpadas com painel solar Data: 2010-2012 Texto: Matteo Ferroni Fotografia: eLand

Foroba Yelen é o nome dado pelas mulheres de uma aldeia do Mali ao protótipo de sistema de iluminação realizado pelo arquiteto e artista audiovisual Matteo Feroni, que acompanha um estudo antropológico conduzido durante mais de dois anos com a eLand. O projeto tem em consideração a luz como um fenómeno cultural, ao invés de um desafio tecnológico e assenta no modo como a comunidade segue o ciclo lunar e partilha interesses comuns. Em vez de um objeto público, o resultado é um instrumento público confiado a grupos de mulheres que têm, definitivamente, uma forma diferente de partilhar a tecnologia e a energia. Um design aberto e a auto-produção foram os principais aspetos de realização do protótipo. Dado que o Mali ainda não sofreu uma revolução industrial, não existem fábricas e a produção tem de ser organizada pelos próprios utilizadores. Por isso a lâmpada não tem produtor e não tem desenhos. É um processo aberto, reproduzível pelos próprios aldeãos, que implica um mecânico de bicicletas, um soldador e um eletricista. Um aspeto relevante foi o desenvolvimento de uma fonte de luz apropriada em termos de claridade, temperatura, performance e durabilidade. Este objetivo foi atingido graças a uma parceria com a fábrica de iluminação italiana Nadlec. Num país em que 55% da população não tem acesso a fontes energéticas, tem que se considerar esta luminária portátil como uma ferramenta no sentido antropológico, entrando no campo de cadeias operativas e práticas espirituais: uma ferramenta coletiva partilhada pelas mulheres para o trabalho, educação e rituais. Este projeto recebeu uma Menção Honrosa em City to City Barcelona nos Prémios FAD 2012. www.eland.org 

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Esquemas de utilização

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DESIGN

ensaio

“A cor do design” O design na esfera social

CARLA CARBONE|carlacarbone@yahoo.com

Victor Papanek dizia-nos, no seu célebre livro Design for the Real World, que existem profissões piores que a profissão de designer industrial, mas ainda assim são poucas. Este ato de persuadir as pessoas a comprar coisas de que não necessitam, com o dinheiro que não possuem, e com o objetivo de impressionar, muitas vezes, pessoas, que nem querem saber, é capaz, para o autor, de ser a menos abonatória das ações humanas. Papanek descreve a quantidade de eletrodomésticos e aparelhos que, por serem concebidos para serem consumidos vorazmente pelas pessoas, acabam por se tornar nocivos e verdadeiramente perigosos. O exemplo mais evidente que o autor nos apresenta é o do próprio carro que, todos os anos contribui para uma mortalidade nas estradas, sem precedentes, em todo o mundo. Outro dos exemplos constitui o lixo que se vai empilhando, inundando, com os seus materiais, o ambiente, e contribuindo para a poluição do ar que se respira. Em suma, para Papanek, os designers são perigosos. Sim, de certa maneira ainda continuam a ser. O design publicitário é o seu maior veículo. Papanek revela-nos o desejo de que o design, assim como o conhecemos hoje, deixe de existir. Um design massificado, que o autor nomeia como sendo o responsável, o propulsor de brinquedos para adultos: “toys for adults”, brinquedos estes que mais não são do que um simples redesign, vezes sem conta, que se autorregenera até à exaustão, apenas para fins lucrativos. Parafraseando o autor, o design deve tornar-se inovador, criativo, transdisciplinar, e atento nas verdadeiras necessidades do homem. Esta disciplina deve tornar-se mais orientada para a pesquisa, e evitar contribuir para uma povoação indiscriminada na terra de objetos e estruturas obsoletas. Esta reflexão sobre a povoação ou infestação, na terra, de objetos que mais não são do que um acrescento (conceptual) pobre sobre o que já existe, mas que, no entanto, a nível ambiental causam um impacto estrondoso, remete-nos para um assunto caro ao design , e cada vez mais importante: desenhar num âmbito social, design social. Este design assume, muitas vezes, contornos anónimos. Não se desenha para si mesmo, mas para os outros. Para os outros com verdadeiras necessidades. Não raras vezes se revelam exemplos de objetos desenhados por mãos anónimas que se multiplicam em determinadas sociedades, de rara beleza. Não há, portanto, no seus autores um desejo de projeção ou reconhecimento individual. Não são designers de autor, pessoas singulares mas antes uma sociedade uma tradição deixada através de gerações anteriores. O aperfeiçoamento realiza-se pela continuidade da atividade. Nascem de necessidades genuínas, quer elas rasem o lúdico, o prático, o simbólico ou até o estético. É esta, muitas vezes a beleza dos artefactos africanos. Podemos dar exemplos como os brinquedos feitos a partir de latas de refrigerantes, que são feitas em Moçambique, muito conhecidas e apreciadas, aliás, por um público exigente e culto. As malgas e cestos coloridos, tecidos pelas mãos de muitos sul-africanos, entre outros exemplos, provam-nos que a qualidade dos artefactos não se mede pelo grau de popularidade que o autor das mesmas manifesta numa determinada sociedade. Papanek considera o conceito do patenteamento e do copyright como algo que também retarda a eficácia do design como disciplina que resolve, de forma eficaz e imediata, as verdadeiras necessidades do homem. As patentes chegam a demorar anos a serem atribuídas, ficando os objetos obsoletos com o

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tempo. Por não ter sido possível a sua realização a tempo de responder a uma qualquer necessidade, por vezes médica. O autor dá o exemplo do brinquedo que proporciona exercício terapêutico para crianças com deficiências. Considera injusto o atraso do lançamento de um instrumento terapêutico apenas por precisar de atravessar todo um tortuoso e longo caminho de patenteamento. Diz-nos: “Penso que as ideias são muitas e baratas, e está errado fazer dinheiro com as necessidades dos outros. Fico feliz por ter conseguido mudar a opinião de muitos dos meus alunos”. Na realidade, refere, muitos dos exemplos de trabalhos realizados com os seus alunos surgem assumidos em muitas das suas publicações como trabalhos anónimos. Este pensar no coletivo, desenhar para as reais necessidades de um grupo, pode-se ver traduzido nas peças Q Drum. Muitas pessoas em todo o mundo, especialmente na África Rural, calcorreiam muitos quilómetros para encontrar uma fonte de água minimamente bebível. Esta busca de água potável coloca as populações vulneráveis a diversas doenças, entre elas a disenteria, a cólera. Outra dos fenómenos observados, nestas pessoas, é o mal que os carregados bidões e garrafões de água causam nas suas colunas. Muitas delas carregam os garrafões sobre as suas cabeças, garrafões pesados que causam lesões irreparáveis no pescoço e na espinha. O Q Drum foi desenhado sobretudo a pensar nestas populações, de forma a agilizar o transporte de água limpa. Em primeiro lugar, segundo Pieter Hendrikse, a água, seja qual for a quantidade, é sempre pesada para transportar. “Rodar a água, e não arrastar ou carregar” num contentor cilíndrico (parecido, na forma, com um donut) parece ter sido a única solução possível. Para além disso o contentor Q Drum deveria estar protegido de quedas, roturas e pancadas, de maneira a não romper, e poder sobreviver a longas caminhadas em busca da preciosa água. O objeto funciona porque possui uma forma simples, com um orifício no meio, o cilindro, apenas com uma corda atada ao centro, permite que o utilizador empurre sem dificuldades o contentor. Não existem nem anilhas, nem pegas que são coisas que facilmente se quebram. A corda é facilmente substituível, e pode ser encontrada uma nova, em qualquer lugar. Para evitar ruturas ou quebras do material de que é composto o Q Drum, foi utilizado para a sua construção um polímero nosso conhecido, o polietileno formado por um processo de moldagem rotacional. Este material também pode ser usado dada a sua compatibilidade com alimentos e líquidos. Não poderia, por isso, e como é óbvio, ser usado um polímero qualquer. No que à durabilidade diz respeito, este material já foi testado grandemente nas zonas rurais do sul de África. Com a capacidade de conter setenta e cinco litros de água, este contentor sobreviveu com saúde a oito anos de uso neste país. Facilitou a vida das pessoas que o usaram e permitiu que a um trabalho de recolha de água, trabalho doloroso, fosse adicionado algum prazer. Algum divertimento e jovialidade lúdica. Para além de ser possível transportar mais água, esse ato permitiu conseguir a água com bastante menos esforço. Este instrumento libertou a mulher de levar pesados carregamentos, e sendo que pode ser facilmente transportado, até por crianças, permitiu à mulher fazer outras atividades importantes, inclusivamente estar mais atenta aos seus filhos. Já sem falar na diminuição de lesões causadas pelos fardos transportados.


Design for the other 90%

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ARTES

ensaio

William Kentridge Consciência e deslumbramento

DAVID SANTOS|davidsantos71@gmail.com

Nas palavras de William Kentridge: “coisas que se desenham sabendo o que são têm tendência a ser muito previsíveis… e fazer arte é tentar encontrar estratégias que impeçam essa previsibilidade, tentar surpreender”1. Como subtil manifestação do imprevisto, dir-se-ia que as linhas a azul e vermelho que atravessam a animação dos seus desenhos a carvão parecem representar não tanto uma simples presença de cor no domínio sombrio do preto e branco, mas uma fortíssima metáfora da divisão racial e dos mecanismos repressivos da política do apartheid que ainda hoje identificam a memória coletiva da África do Sul. É porém na experiência formal da prática do desenho e na mobilidade transformadora da sua perceção animada que o artista encontra o modus operandi para a densidade psicológica da narrativa, recorrendo a um labor oficinal que remete para a ancestralidade da disciplina do desenho e para o deslumbramento que a matriz do cinema lhe permite criar ao colocar em jogo uma incessante circularidade e fantasmagoria, ditada, em última instância, pela inscrição primordial do desenho. Não por acaso, William Kentridge assumiu desde cedo que realiza apenas “desenhos para projetar”. Isto é, primeiro vem o desenho e só depois o efeito mágico da sua animação, bem como a leitura social ou política que neles se pode identificar. Os filmes que resultam dessa estratégia exploram no essencial uma técnica muito peculiar – ligada à origem do cinema e à imaginativa montagem de Georges Méliès – que consegue criar extraordinárias sequências de animação através de um único desenho. No seu processo criativo, Kentridge utiliza apenas uma folha de papel e elabora a carvão o desenho que será apagado e rasurado, para posteriormente desenvolver imagens contínuas, fruto dessas mesmas modificações. O caráter mágico das imagens assim desenhadas, que a apresentação cinemática reforça ao potenciar a sua contínua metamorfose, traduz-se ainda no transparecer do recurso estilístico que é a rasura, projetada como reiniciação constante. O fluxo do tempo é sublinhado deste modo pelo fluxo do desenho, da inscrição sempre refeita, retomada em cada plano, promovendo uma poética singular em torno do desenho animado. Tudo se conjuga num triângulo mágico: a surpresa epistemológica do cinema, a ousadia formal de Méliès e a vibração contrastante do desenho. Tal como as personagens que aparecem e desaparecem através de explosões simuladas por embrionários “efeitos especiais”, como no famoso e fundador “Viagem à Lua” – reinterpretado pelo próprio Kentridge, em Seven fragments for Georges Méliès (2003) – os desenhos e o pó de carvão que os constrói e destrói resultam dessa espécie de aparição e desaparição constante que nos recorda que tudo é finito no fluxo temporal eterno. Por outro lado, acelerações e desacelerações pantomineiras convertem estes desenhos em matéria lúdica que, no entanto, nos afasta ao mesmo tempo da simplificação narrativa muitas vezes associada ao desenho cinemático, projetandonos a todos como testemunhas inesperadas de uma realidade social e política que se assume como verdadeira protagonista destes filmes. Neste aspecto, William Kentridge reconhece que a sua história pessoal

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como sul-africano branco de ascendência judia foi decisiva para o universo temático do seu trabalho – incluindo a opressão violenta, a luta de classes e as hierarquias sociais e políticas. Kentridge realiza as suas experiências com “máquinas que dizem o que devemos olhar”2 e como o mecanismo da visão, apesar de falacioso ou ilusório, é uma metáfora para “a vontade que temos, gostemos ou não, de dar sentido ao mundo”3. Daí resultam lúdicas distorções da realidade e observações sobre os sistemas hierárquicos que envolvem o quotidiano do artista e o convertem ao mesmo tempo em testemunha responsável pela sua significação política. Ao evocar de modo criativo a história trágica e complexa da sua terra natal, seja em filmes de animação, teatro, escultura, desenho ou gravura, Kentridge “desenha”, isto é, projeta, uma catarse consciencializadora sobre a reconciliação interracial, entendida como inevitabilidade perante a interdependência crescente da nossa condição global. De algum modo, o artista sugere a possibilidade – ainda que decetiva e determinada por uma estreita ligação à poética da criatividade artística – de um sentido político das imagens, na leitura dos seus significados mais recônditos, engendrados entre a desarticulação pós-moderna da ressaca humanista e o peso do inconsciente coletivo. Sem falsas esperanças, mas empenhado no aprofundamento de um sentimento de transformação de cada um consigo mesmo, Kentridge elabora a sua arte em sintonia com a ideia de que a expressão ou a comunicação da arte é uma das vias para o diálogo social e a desconstrução do preconceito. O resultado dessa “ambição” que representa a continuidade deste projeto traduz-se afinal pela sensibilização específica e o valor formativo da própria cultura, apesar da sua dimensão contemporânea se basear, cada vez mais, num pluralismo inoperante, tendencialmente arbitrário e indiferenciador. De modo subtil, a um tempo sensível e complexo, Kentridge desconstrói as ilusões que as teses do racismo haviam criado para convencer a própria comunidade branca do seu país, de ascendência europeia, sobre os valores segregacionistas que instituiram o apartheid. Os seus filmes evoluem muitas vezes neste sentido, a partir do conflito psicológico entre “Felix Teitlebaum” (um artista) e “Soho Eckstein” (um homem de negócios), duas personagens anti-herói que se parecem fisicamente com o artista e podem ser interpretados como alter-egos. Por exemplo, em Felix in exile (1994), o isolamento dos brancos é revelado como o outro lado da bárbarie. A insistência em ignorar os compatriotas negros é uma espécie de linchamento promovida sobre si próprios. A situação de indiferença ao sofrimento alheio convertese num tormento cada vez maior, porque reprimido até ao limite da deflagração. Já Stereoscope (1998), um dos filmes mais conhecidos e emblemáticos da pesquisa do autor, remete de outra forma para o isolamento psicológico de um patrão branco desorientado perante a revolta e as reivindicações dos trabalhadores negros oprimidos pelo quotidiano fabril. Tudo se evapora e desmorona, após a violência persecutória simbolizada por um gato preto que se transforma em bomba derradeira, restando apenas uma espécie de auto-anulação de “Soho Ekstein” (o empresário), que se “transforma”, como num sonho,


em “Felix Teitlebaum” (o artista), figura cabisbaixa, ensimesmada e triste, que inunda com lágrimas azuis que brotam de todo o corpo uma pequena divisão, espécie de solitária que confirma a sua desistência. Recorde-se que o Estereoscópio é um dispositivo para exibir imagens tridimensionais, apresentando cada olho um ponto de vista ligeiramente diferente da mesma cena e que, na tentativa de conciliar a diferença, conduz o olhar a percecionar a ilusão de volume. Mas em Stereoscope, o artista emprega uma manobra inversa. Uma tela dividida desmembra a realidade tridimensional em realidades complementares, mas não

sincronizadas – uma divisão sugestiva de “Soho Ekstein”, dividido e inerte perante a dúvida. Se, na cidade de Joanesburgo, as revoltas dos trabalhadores levam ao caos cívico e político, a expressão dessa conflitualidade é transformada aqui numa inquietação individual, enquanto conflito interno insanável, inviabilizando desse modo qualquer vontade ou ação. Logo, a violência social tem nos trabalhos de Kentridge um reflexo sobre o inconsciente do indivíduo, limitando-o no estertor maior do conflito interior, dividido que está entre o cumprimento das regras

William Kentridge, Felix in Exile, 1994 (detalhe), carvão sobre papel, 120x160

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ARTES

diálogo

Do Apartamento 22 à Big Factory Dinâmicas artísticas entre Rabat e Joanesburgo

SANDRA VIEIRA JÜRGENS|sandravieirajurgens@gmail.com

É inegável que o continente africano é um território de contrastes, geográficos, sociais, económicos, políticos. Existe uma África rica, uma África pobre, uma África rural, uma África marcada pela existência de algumas megacidades, uma África “branca” (cultura árabe) e uma África “negra”, subsariana. Tal como existe uma produção artística tradicional que contrasta com uma prática artística contemporânea experimental. Simultaneamente, longe de existir uma única cultura africana neste vasto continente, nele, como no interior dos próprios países que o compõem, convivem diferentes realidades e culturas. Acresce a esta heterogeneidade, a diversidade das culturas africanas da diáspora, dos Estados Unidos, do Brasil e da Europa. Não podemos esquecer que as sociedades europeias, para nos centrarmos apenas neste território, são multiétnicas, formadas por comunidades de imigrantes vindos da África, mas também da Ásia e das Caraíbas que se instalaram em cidades como Londres e Paris no período do pós-guerra, ajudando a formar, no que diz respeito ao meio artístico, uma comunidade com diferentes backgrounds culturais. Em Londres, figuras como o artista filipino David Medalla ou o paquistanês Rasheed Araeen contribuíram muito para a transformação da prática artística que ocorre nos anos 60 e 70, deslocando a atenção das pesquisas formais para pesquisas no âmbito de uma prática social e política mais ampla. E o mesmo aconteceu em Nova Iorque, onde artistas afro-americanos exerceram um ativismo orientado tanto para a crítica à intervenção imperialista militar na guerra do Vietname como para corrigir a deficiente visibilidade das suas linhas de intervenção artísticas nas instituições oficiais. Se estamos habituados a situar e a observar a realidade africana como fora de nós, distante e diferente, interessa-nos estabelecer uma proximidade entre elas, indo ao encontro das marcas de cosmopolitismo existentes na cena artística do continente africano, o que nos permitirá verificar que em termos das áreas mais ativas da produção artística estamos mais próximos do que pensamos. Como sabemos, existe um conjunto de artistas e agentes africanos inseridos no mercado global que, possivelmente, foi aquele que mais de adaptou aos modelos, protocolos e standards ocidentais. Foram sobretudo os artistas e curadores africanos que estudaram e residiram fora, nos Estados Unidos ou na Europa, aqueles que beneficiaram do reconhecimento por via de um percurso determinado de filiação ao circuito profissional e ao sistema da arte internacional. E, por vezes, chegados a esse palco, a sua participação faz-se em representação não de uma universalidade ou de um internacionalismo mas sim pela afirmação de alguma diferença, biográfica, identitária. Mais do que em outros casos, os artistas africanos são sempre representativos de algo. Ora, se no processo de uniformização da cultura à escala global, esse será um aspeto que não contraria mas reforça a diferença, pelo legado do multiculturalismo, em que a simples presença do artista não vale por si mas por questões biográficas diferenciadas, foi através das muitas bienais internacionais, que se deu prosseguimento à visibilidade das práticas artísticas africanas e à criação de plataformas de visibilidade, para a apresentação e desenvolvimento de projetos nos próprios países africanos. Se muitos artistas estiveram dependentes destes fóruns, uma vez que as condições de produção e a inexistência de galerias impossibilitavam que os

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artistas africanos produzissem para o seu local de origem, verificamos que um dos aspetos mais interessantes foi a crescente experiência internacional e cosmopolita da cena artística africana, o surgimento de espaços normalmente designados de independentes. Criados em diferentes cidades africanas e por iniciativa de artistas com experiência internacional são hoje um contributo para a formação de uma cena artística mais aberta ao exterior, nas várias regiões africanas. Não existindo curadores profissionais foram os artistas que por autoiniciativa impulsionaram plataformas, residências, espaços de produção e discussão onde se experimentaram novas dinâmicas de trabalho no âmbito da arte contemporânea e sobretudo um outro tipo de aproximação à prática artística, menos convencional, por vezes inserida em processos sociais e comunitários. É claro que as condições de apoio à produção e exibição em África estão longe de serem as mais favoráveis, e a existência de publicações, bibliotecas, e de oportunidades profissionais, implicam sempre um grande empenho pessoal e a própria comunidade artística. Mas foi sobretudo a partir dessas experiências, que partilhando modelos e estratégias semelhantes a outros projetos internacionais, surgidos nos anos 70 nos Estados Unidos ou em Londres na década de 90, se foram constituindo estruturas que vão cada vez mais colmatando, por exemplo, a inexistência de museus nas cidades africanas ou funcionando como plataformas alternativas à atividade destas instituições, que por norma não estão ainda a acolher projetos mais experimentais, não enquadrados nas disciplinas da pintura e da escultura nem nos temas e abordagens estéticas de maior tradição. Na África Central, nos Camarões, o Doual’art é um desses espaços, que se situa numa cidade sem museus, em Douala. Criado por Marilyn Douala Bell, em 1991, esta organização sem fins lucrativos foi um dos primeiros espaços independentes fundados em África. Sendo simultaneamente um centro de arte contemporânea e um laboratório de criação experimental orientado para novas práticas urbanas, desenvolve fundamentalmente projetos site-specific que envolvem os artistas e a comunidade circundante. Organiza a Trienal de Arte Pública (SUD - Salon Urbain de Douala), cuja segunda edição teve lugar em dezembro de 2010. Dedicada ao tema da água, decorreu em diversas áreas da cidade, com intervenções artísticas selecionadas por um coletivo curatorial que integra Didier Schaub, o diretor artístico da Doual’art. Para termos uma ideia dos projetos desenvolvidos no seu âmbito, refirase “New Walk Ways in New Bell – Faces of Water in Douala” de Kamiel Verschuren. Em colaboração com Lucas Grandin, o artista desenvolveu um projeto de cobertura do sistema de esgotos que em New Bell, como em outros bairros de Douala, estão a céu aberto. Muito bem recebido pela população, consistiu num alerta para a limpeza das ruas com o fim de manter controlados os circuitos de esgotos e de água potável, deste modo minimizando um problema que afeta a saúde pública dos habitantes. Um dos principais problemas é que na estação das chuvas, a subida das águas, por entupimento do sistema de esgotos, provoca inundações das ruas e das casas, infiltrando-se igualmente nos cursos de água potável. Na Nigéria, no oeste africano, existe o Centro de Arte Contemporânea (CCA - Centre for Contemporary Art), situado na cidade de Lagos, que apesar de ter um meio artístico pequeno é o segundo maior africano, depois da África


Foto: Lard Buurman, cortesia Doual’art

SUD - Salon Urbain de Douala 2010

do Sul. O CCA é uma organização independente sem fins lucrativos formada em dezembro de 2007, com a finalidade de servir de plataforma de apoio ao desenvolvimento e profissionalização da produção artística e curatorial e à apresentação e discussão da arte e cultura contemporâneas, não apenas na Nigéria mas na região do oeste africano. Com a intenção de colmatar as lacunas das instituições culturais existentes, o CCA, dirigido por Bisi Silva, desenvolve um programa orientado para uma maior diversidade de práticas, ideias e abordagens das artes visuais contemporâneas, dando maior prioridade a novos meios de comunicação e práticas de arte experimental visuais como a fotografia, a animação, o cinema e o vídeo, performance e instalações, que têm maior deficit de atenção no panorama artístico da Nigéria. Sobretudo a fotografia, que era vista apenas como uma arte praticada por artistas amadores.

A África do Sul, sendo o país africano com mais estruturas e com o índice de maior desenvolvimento do meio artístico conta com o Big Factory, criado em 1991, pelo artista David Koloane e o apoio do mecenas Robert Loder. Durante 21 anos ofereceu espaços de ateliers – inicialmente dirigidos a artistas que tinham reduzido acesso a redes e a recursos de profissionalização – e apoio logístico, com o desenvolvimento de programas expositivos voltados para a defesa da democratização e inclusão da diversidade de propostas artísticas no espaço de visibilidade sul-africano. Em Angola, a internacionalização, fomentada pela Fundação Sindika Dokolo, detentora de uma coleção de arte e organizadora de eventos como a Trienal de Luanda, é hoje crescente e acompanhada pela presença da galeria SOSO Arte Contemporânea Africana no Brasil, onde a par do seu espaço de Luanda detém uma filial em São Paulo.

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DOSSIERÊ2012 ARTEÊEÊARQUITE TURA BREVE EDITORIAL Numa parceria entre a revista arqa e a çrea de Arte e Arquitetura de Guimar‹es 2012 Capital Europeia da Cultura, os dois œltimos e este nœmero da revista integraram um Dossier relativo ˆquela ‡rea de programaç‹o. Estes Dossiers tiveram minha responsabilidade editorial enquanto programadora, e receberam contributos dos comiss‡rios de alguns dos projetos em curso. Dado o espaço editorial contemplado neste Dossier, a escolha destes projetos n‹o p™de, por raz›es —bvias, ser abrangente. Foi feita tendo em conta uma representatividade dos quatro Ciclos do Programa, ÒSobre AudiênciasÓ, ÒModos de Produç‹oÓ, ÒEscalas e Territ—riosÓ e ÒNovas Linguagens e Espaço PœblicoÓ, que permitisse a presença de alguns projetos j‡ realizados ou em agenda, e revelar projetos futuros. ������������������������������������������������������������������������������� arqa, ser‡ inteiramente dedicado ˆ Programaç‹o que dirigi e cuja concretizaç‹o, em tempos t‹o dif’ceis para a produç‹o cultural, tem cumprido em larga medida os seus pressupostos e fundamentos. Aos comiss‡rios e artistas agradeço os contributos tanto de conteœdos cr’ticos, informativos e visuais, como das cruciais trocas de ideias e di‡logos. Ë arqa ������������������������������������������������������������������ Gabriela Vaz-Pinheiro, Setembro 2012

ARC HI GRAM

SOB O SIGNO DOS The Archigram Archives, Ron Herron, “Walking City”, 1964.

Texto de Pedro Jordão

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SOB O SIGNO DOS ARCHIGRAM

Projeto com Curadoria de Pedro Jord‹o, com Dennis Crompton

EXPOSI‚ÌO No centro deste programa, um convite irrecus‡vel: ÒArchigram Ð Experimental Architecture 1961-1974Ó, exposiç‹o concebida pelos pr—prios The Archigram Archives que traça uma extensa retrospetiva daquele que foi um dos mais marcantes coletivos da hist—ria da arquitetura contempor‰nea, questionando e desconcertando a cidade, a relaç‹o entre arquitetura e tecnologia e entre tecnologia e corpo, e fazendo-o de modo radical, incluindo na forma, permanecendo atŽ hoje inconfund’vel o universo visual dos Archigram. Tendo sido sempre um territ—rio que valorizava claramente mais a pergunta do que a resposta, e rasgando caminhos verdadeiramente multidisciplinares, n‹o surpreende ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������� ideias que as formas traduzem. Ve’culo ideal para a discuss‹o sobre as novas realidades urbanas e sobre a arquitetura na sua dimens‹o mais experimental, discutindo metodologias, afetando perceç›es e comportando sempre uma ideia ������������������������������������������������������������������ desenhos e maquetes originais, material multimŽdia ou exemplares das cŽlebres publicaç›es com que os Archigram provocaram o tecido ���������� ��� ������� �� �� �� ������ ��� �������� ����� ���� ����������� ������������������������������������������������������������������ arquitetura j‡ conheceu sobre os seus pr—prios fundamentos e limites. E da’ ser um percurso sobre possibilidades e n‹o sobre a construç‹o de um novo futuro. Da’ apontar-se a uma arquitetura e a processos n—madas, adapt‡veis, epis—dicos e tantas vezes refundadores. Passados mais de quarenta anos desde a separaç‹o do grupo, os Archigram continuam a lembrar-nos da funç‹o incendi‡ria da arquitetura. ƒ o que aqui se celebra.

CONFERæNCIA INTERNACIONAL ����������������������������������������������������������������� dos Archigram inevitavelmente desperta sobre alguns dos temas nucleares da pr—pria arquitetura e cuja discuss‹o ser‡ provavelmente inesgot‡vel, o Laborat—rio de Curadoria, na F‡brica ASA receber‡ em Novembro uma conferência internacional (com programaç‹o a divulgar em breve) que contar‡ com a participaç‹o de elementos dos Archigram e se organizar‡ ˆ volta de dois m—dulos: Òcidade e utopiaÓ e Òespaço e corpoÓ. A entrada ser‡ livre.

The Archigram Archives, Ron Herron, “The Oasis”, 1968.

WORKSHOP Ð AAVS Em associaç‹o com a AAVS, Architectural Association Visiting School e contando com a colaboraç‹o da Universidade do Minho, Escola de Arquitetura / Instituto do Design, o programa inclui ainda o workshop ÒReinventing Modes of ProductionÓ, dirigido pelos arquitetos portugueses e investigadores da AA Emanuel de ����������������������������������������������������������������� ������������������������������������������������������������� e em sintonia com os pressupostos que descrevem o Ciclo em ������������������������������������������������������������������ que atravŽs destes s‹o operadas na maneira como a arquitetura e as disciplinas criativas se relacionam e se posicionam na arte 1 e no sistema culturalÓ , num momento em que os modos de ������������������������������������������������������������� computacional, fabricaç‹o digital e processos de construç‹o que ��������������������������������������������������������������� com a mesma facilidade como que se produzem os tradicionais componentes padronizados. Abordando o contexto imediato de Guimar‹es, a AAVS Guimar‹es far‡ a sua abordagem cr’tica ao tema atravŽs da conceç‹o, fabricaç‹o e montagem de uma sŽrie de intervenç›es arquitet—nicas ˆ escala 1:1 em espaços pœblicos do munic’pio de Guimar‹es, ligando as potencialidades do design e fabricaç‹o computacional com materiais locais e tŽcnicas de construç‹o tradicionais. Ter‡ ainda lugar um Simp—sio internacional de um ���� ������ ������ ��������������� ��� ���������� �� ���� ������ exposiç‹o urbana com a duraç‹o de um mês. Decorrendo de 27 de Outubro a 4 de Novembro no Instituto do Design, o workshop ������������������������������������������������������������������ ���������������������������������������������������������������

The Archigram Archives, Peter Cook, “Milanogram”, 1968.

(Archigram, Experimental Architecture 1961-1974, exposiç‹o patente de 6 de Outubro a 16 de Dezembro de 2012 na Sala de Exposiç›es do Pal‡cio Vila Flor. V‡rias atividades em outros locais. Para mais informaç›es sobre a Exposiç‹o e Conferência consultar a programaç‹o no site Guimar‹es 2012 ou atravŽs do email art.architecture@guimaraes2012.pt. Para informaç›es sobre a AAVS consultar: www.aaschool.ac.uk/study/visiting ou pelo emal visitingschool@aaschool.ac.uk) 1 Do texto descritivo do Programa de Arte e Arquitetura, Ciclo Modos de Produç‹o, Programadora Gabriela Vaz-Pinheiro.

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Boletim da Ordem dos Arquitectos de Angola, Conselho Nacional - Ano I - Nº 1 - setembro|outubro 2012

Eventos Realizados

6º Fórum Urbano Mundial

Realizou-se de 01 a 07 de setembro na cidade de Nápoles, República da Itália, o 6º Fórum Urbano Mundial sob o lema “O FUTURO URBANO”, sob os auspícios da UN-HABITAT. O 6º Fórum Urbano Mundial foi concebido como uma plataforma onde vários segmentos da sociedade discutiram, aprenderam, praticaram, concordaram e discordaram sobre diferentes formas de construir e sustentar um futuro urbano mais próspero para as nossas cidades. Foram identificadas iniciativas e compromissos que podem ser efetivamente implementados para criar cidades que são mais democráticas, justas, sustentáveis e humanas.

António Pereira Gameiro*

Nota de abertura

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Caros Arquitetos e Urbanistas, Saúdo-vos desta tribuna que acabamos de inaugurar. Assim, este é mais um veículo para informar o que aconteceu, acontece e acontecerá, nas quais seremos atores, autores e coautores. A Ordem dos Arquitetos de Angola, continuará a colocar o assento tónico naquilo que é a dignificação do Arquiteto e no melhoramento da sua qualificação, de forma a dar resposta com maior competência aos problemas que se deparam no exercício da profissão. Assim, deveremos estar atentos a toda a problemática que irá envolver a nossa ação na solução dos problemas que se irão apresentar. *Presidente da Ordem

Opinião Vernacular – O futuro da arquitetura Uma das primeiras preocupações do ser humano é de ter um abrigo. Dos mais simples como as grutas, foram tomando formas mais complexas. O clima e os materiais existentes nas várias regiões do mundo, somados às exigências dos povos e a sua cultura culminaram nas diversas tipologias habitacionais vernaculares, que constituem hoje uma fonte riquíssima de pesquisa da qual a arquitetura, a construção e até mesmo a arte, têm muito a ganhar. A revolução científico industrial trouxe consigo uma gama de manterias de construção antes não existente que, em maior ou menor escala, deixam um impacto ambiental na sua produção e aplicação na

Projecto Nova Vida, rua 50 edifício 106, 3º andar, apto 3.2 Luanda - Angola Telf. +244 923 609 573 +244 921 548 455 pranchetalda@hotmail.com

construção, exigindo também um nível mais elevado de energia para manter um grau também elevado de conforto. A arquitetura vernacular moderna poderá ser uma solução estilizada para uma construção sadia. Porque não construir mais em adobe ou taipa? Não quer dizer que temos de viver como antigamente, mas sim armarmo-nos da tecnologia para explorarmos os métodos tradicionais e empíricos de construção, combiná-los com métodos científicos e obtermos assim edifícios “verdes” e confortáveis, nos quais se possa fazer uma utilização racional e sustentável de bens preciosos como a água e energia elétrica. Amélia Malaquias Gay, Arquiteta


setembro|outubro 2012

arqa 145


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