Simbolos culturais e visualidade nas relações humanas

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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL – ULBRA/Canoas/RS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS Carolina Flores Schmidt

Símbolos Culturais e Visualidade nas Relações Humanas

Canoas, junho de 2012.


Carolina Flores Schmidt

Símbolos Culturais e Visualidade nas Relações Humanas

Trabalho de Curso apresentado como prérequisito parcial para a obtenção de título acadêmico de Licenciada pelo Curso em Artes Visuais da Universidade Luterana do Brasil, sob orientação dos professores Dr. Celso Vitelli, Me. José Carlos Broch e Ma. Ana Lúcia Beck.

Canoas, junho de 2012.



Dedicatória Aos meus pais, que sempre apoiaram minhas escolhas e decisões. Dedico-lhes esta conquista com gratidão, por todo seu amor, carinho e estímulo que me ofereceram e me oferecem todos os dias. .


Agradecimentos Agradeço à ajuda de todos os meus orientadores, em especial, à orientadora Ana Lúcia Beck, por acreditar em meu potencial, sempre me indicando novos desafios. A todos os mestres que me ofereceram suporte para meus estudos, influenciando positivamente o rumo de minha evolução profissional. Aos meus colegas, em especial ao Ricardo John, por ter sido o parceiro e amigo de grande parte de minha vivência acadêmica, compartilhando comigo ideias, experiências e conhecimentos. A todos que me acolheram na Escola E. Cônego Paulo de Nadal pelo carinho a mim oferecido, como ex-aluna e como integrante de seu corpo docente. A minha família por me dar força e iluminar minha direção me ajudando a encontrar o caminho do sucesso. Ao meu companheiro Fernando, por sua paciência, compreensão, amor e incentivo. Aos amigos que me incentivaram e acreditam em minha busca, em especial ao Ubirajara por dar atenção a todas as minhas angústias e anseios no desenvolvimento deste trabalho. Aos meus alunos, pois foram os principais colaboradores deste Estágio, ainda que não saibam disso. .


É preciso diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal maneira que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática. (Paulo Freire)


Resumo

O presente trabalho apresenta o projeto educativo denominado “A Visualidade Cultural Humana e suas relações simbólicas coletivas”, aplicado aos alunos do 5º ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Cônego Paulo de Nadal, na cidade de Porto Alegre, durante o segundo semestre do ano de 2011. O tema escolhido para o desenvolvimento do projeto educativo em questão, parte da visualidade dos corpos dos indivíduos na sociedade e os aspectos culturais presentes na representação simbólica de suas estéticas. O objetivo principal é desenvolver o pensamento crítico nas relações pessoais e coletivas, e a percepção sobre as múltiplas estéticas que fazem parte da memória da construção social. O projeto educativo busca, também, cumprir com o papel do compromisso com a função social da escola. Pois, a diversidade é representada nas inquietudes de crianças e jovens dentro de contextos sociopolíticos culturais atuais, e o ambiente escolar deve expressar-se como uma ferramenta norteadora para a inserção social no contexto de um mundo marcado pela globalização e o hibridismo cultural contemporâneo. A metodologia aplicada apontou para o estímulo ao questionamento, colocando o aluno como construtor de seu próprio conhecimento, interpretando, identificando e percebendo as significações visuais e intelectuais da Arte como suporte cultural, valorizando as relações interculturais da sociedade. Os autores utilizados como referência (Ivone Mendes Richter, Luciane R. Nascimento Garcez, Anabela Pereira, entre outros) contribuíram para o melhor entendimento sobre como se dão as relações visuais proporcionadas pela diversidade cultural, fomentando questões essenciais como as relações entre pessoas de culturas diferentes e o reconhecimento da pluralidade social que abrange percepções e valores estéticos próprios, na construção social de um povo e na expressividade do corpo de um indivíduo em suas relações coletivas. Diversos artistas brasileiros também calçaram este Projeto como, Walter Firmo, Rosana Paulino, Lucílio de Albuquerque, Vera Chaves Barcelos e Flávio de Carvalho, que, a partir de suas obras, contribuíram para a percepção de diversas questões que nortearam o tema de estudo. A visualidade dos corpos indígenas nas grandes metrópoles também abasteceu conceitos interculturais muito importantes para o Projeto, especialmente os povos Kaingang e Guarani viventes da urbanidade de Porto Alegre. De tal maneira, o resultado deste trabalho contribui para uma reflexão mais abrangente sobre a importância de promover um ensino que torne os educandos sujeitos observadores, questionadores e atuantes na sociedade, sobretudo de modo a contribuir em uma construção social coletiva integradora, comunicativa, livre de preconceitos e discriminações.

Palavras-chave: Visualidade Cultural. Representação Simbólica. Valores Estéticos.


Sumário

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 09 1. CAPÍTULO 1- Reconhecimento do Espaço de Ensino ........................................................ 17 1.1. Dados Gerais da Escola..................................................................................... 18 1.2. Observações Silenciosas ................................................................................... 20 1.2.1. Primeira Observação Silenciosa ......................................................... 20 1.2.2. Segunda Observação Silenciosa ......................................................... 27 1.2.3. Terceira Observação Silenciosa ......................................................... 31 1.3. Análise das Observações Silenciosas ................................................................ 34 1.4. Análise do questionário respondido pela professora ........................................ 37 1.5. Análise dos questionários respondidos pelos alunos ........................................ 40 2. CAPÍTULO 2- Pesquisa sobre o Tema nas Artes Visuais ................................................... 42 2.1. O Corpo como um Suporte Cultural ............................................................... 43 2.1.1. A Diversidade Social e as Manifestações Culturais ........................... 43 2.1.2. O Corpo: um Signo Social ................................................................. 49 2.1.3. Produtos e Suportes das Significações Sociais .................................. 53 3. CAPÍTULO 3- Projeto e Prática de Ensino em Artes Visuais ............................................. 57 3.1. Dados Gerais do Projeto de Ensino................................................................... 58 3.2. Prática de Ensino ............................................................................................... 61 3.2.1. Primeiro Encontro .............................................................................. 61 3.2.2. Segundo Encontro .............................................................................. 70 3.2.3. Terceiro Encontro ............................................................................... 82 3.2.4. Quarto Encontro ............................................................................... 102 3.2.5. Quinto Encontro ............................................................................... 121 3.2.6. Sexto Encontro ................................................................................. 136


3.2.7. Sétimo Encontro ............................................................................... 154 3.2.8. Oitavo Encontro ............................................................................... 169 CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 180 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 191 APÊNDICES .......................................................................................................................... 200 Apêndice 1 ............................................................................................................. 201 Apêndice 2 ............................................................................................................. 203 Apêndice 3 ............................................................................................................. 206 Apêndice 4 ............................................................................................................. 209


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Introdução Este Trabalho de Curso (TC) é resultado de minha experiência prática como arteeducadora durante meu período de formação como acadêmica do Curso de Licenciatura em Artes Visuais. Através deste Trabalho, apresento a experiência concretizada de minha prática de Estágio docente, aproximando o leitor da pesquisa e reflexão acerca do planejamento, prática e resultados alcançados pelo projeto educativo realizado. Questões sobre as relações coletivas na sociedade sempre fomentaram meus pensamentos e posicionamentos ideológicos. E, refletindo sobre estas, notei que, o corpo de um indivíduo na sociedade, a partir das considerações sobre a forma como este corpo se apresenta visualmente, era tão comunicativo ao ponto de ser protagonista destas relações. Entendendo que a visualidade dos corpos na sociedade poderia promover diversas interpretações, percebi que muitas questões sobre este assunto poderiam tomar forma para as futuras experiências que, um dia, eu teria como docente. Pois, percebendo os corpos na sociedade, o observador questiona-se sobre o lugar daquele sujeito, ou seja, estabelece relações e reflexões culturais a respeito do mesmo. Como acadêmica, pensava eu que uma Prática Educacional baseada na consideração dos sentimentos estéticos da sociedade, poderia promover uma forma de valorizar as manifestações culturais do cotidiano, despertando valores como um canal de compreensão para a inclusão de todas e todos. Pois, sempre acreditei que um projeto educativo que contemplasse a construção de um pensamento crítico e coletivo sobre as relações sociais, poderia contribuir de modo significativo na vivência pessoal dos educandos e também valorizar o desempenho do arte-educador como sujeito promotor das transformações sociais. Estas são apenas algumas considerações iniciais deste TC, que compartilho com o leitor, uma breve aproximação de meus anseios como acadêmica e futura docente de Artes Visuais. Deparando-me, no Estágio 1, com sentimentos apreensivos sobre a minha atuação como docente e carregada de intensões ambiciosas, o meu primeiro contato com a escola na qual eu realizaria minha prática docente se deu no primeiro semestre de 2011. Lá, aproximeime de duas turmas, uma do 5° ano do Ensino Fundamental (Turma 50) e a outra do 1° ano do Ensino Médio (Turma 101), ambas na Escola Estadual Cônego Paulo de Nadal, localizada na zona Sul da cidade de Porto Alegre. O primeiro capítulo deste TC já trata do reconhecimento


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deste espaço de ensino, ou seja, traz informações sobre a escola, observações silenciosas frente à prática pedagógica que lá se realizava, análises sobre estas e sobre os questionários respondidos por alunos e pela professora titular. Através desta aproximação e do reconhecimento inicial das atividades que se realizavam nas disciplinas de Artes, percebi que, para ambos os grupos (EF e EM), a falta de significação no estudo da disciplina, era um aspecto bastante presente. Também, notei que o conteúdo oferecido era baseado em regras de desenhos geométricos e técnicas usadas apenas para serem experimentadas e não para dar materialidade às ideias dos alunos. Tão pouco a linguagem, significação e história da Arte eram discutidas com os alunos. Também senti que o autoquestionamento da realidade circundante do aluno e sua individualidade não eram propostas discutidas em sala de aula. Foi a partir destas observações que me senti desafiada e incentivada a promover junto aos educandos uma proposta educativa questionadora, reflexiva e significativa na disciplina de Artes. Ao mesmo tempo me baseei nas considerações citadas anteriormente, tendo em mente, um Projeto Educativo significativo e expressivo para a vivência pessoal dos educandos, a partir das questões que a visualidade dos corpos humanos promove em suas relações sociais e culturais. Portanto, minha pesquisa acerca do Tema nas Artes Visuais, também desenvolvida nas atividades de Estágio 1, parte da percepção da figura do corpo e suas formas de representação. Pois a partir do reconhecimento da pluralidade cultural da sociedade onde estamos inseridos, nos é permitido entender e interpretar as mais diversas manifestações simbólicas que regem as relações interpessoais no meio social, relações estas que apontam diferentes costumes, hábitos, linguagem, produtos e expressões dos indivíduos. Do mesmo modo, a figura do corpo frente às relações cotidianas traduz maneiras de interpretação e reflexão sobre as relações coletivas, permitindo-nos o entendimento contemporâneo do lugar destes corpos/indivíduos na sociedade. Pensando nos aspectos acima, percebi também que, através das interpretações promovidas pela Visualidade dos Corpos da Sociedade, o projeto educativo poderia vincularse com a função social da escola. Ou seja, os educandos, ao construírem seu entendimento sobre cultura, identificariam as manifestações das mesmas no seu meio, perceberiam a construção individual manifestada em sua identidade, e, por fim, ampliariam suas próprias concepções de Diversidade. Assim, logo no segundo capítulo deste TC apresento a Pesquisa sobre o Tema nas Artes Visuais, ou seja, a Visualidade proporcionada pela Diversidade Cultural e as interpretações sociais sobre estas. Com tal Pesquisa foi possível compreender, a partir das


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ideias de Ivone Mendes Richter, que o olhar para as outras culturas altera a visão do mundo e das coisas abordando as relações entre pessoas de culturas diferentes e reconhecendo, nestas, a pluralidade social que abrange percepções e valores estéticos que possuem raízes inseridas na realidade cultural e artística de determinados grupos de seres humanos. Já a partir das reflexões de Luciane R. Nascimento Garcez, a importância da pluralidade cultural para o questionamento da construção social de um povo é ressaltada, e as ideias da autora fortalecem o posicionamento de que para que se compreenda as diversas expressões artísticas especificas de muitas culturas presentes na sociedade, se deve utilizar diversas “lentes” para ver, analisar, discutir, compreender e valorizar a arte. Também a autora Anabela Pereira contribuiu para a reflexão do corpo como linguagem da representação cultural que estabelece a interpretação, significação e identificação do mesmo e seu lugar na coletividade social. Fotografias do artista Walter Firmo, que remetem a temas sociais brasileiros, tais como festas folclóricas e manifestações culturais de nosso povo, são apresentadas e discutidas neste capítulo buscando ressaltar os valores estéticos presentes nas manifestações sociais culturais. Já obras da artista Rosana Paulino são apresentadas para discutir a questão da ancestralidade da artista, afrodescendente, e as questões da historicidade e contemporaneidade brasileiras, seja na Arte seja nos assuntos relativos aos posicionamentos sociais. Também uma discussão paralela sobre as obras de Rosana Paulino e a pintura “Mãe Preta” de Lucílio de Albuquerque, presentes neste capítulo, visam à interpretação da intencionalidade da Arte frente às reflexões acerca das relações sociais. A contemporaneidade das obras de Vera Chaves Barcelos também está presente no capítulo de Pesquisa e apresenta-se no contexto da linguagem e interpretação da visualidade da representação do corpo em suas relações sociais, ou seja, as relações interculturais. Conjuntamente, o lugar do corpo em nossa sociedade, discutido também no segundo capítulo, remete ao exemplo da migração indígena para áreas urbanas e grandes metrópoles, em que o estranhamento dos comportamentos e linguagens culturais indígenas abastece novos conceitos interculturais frente à complexidade das relações da nossa sociedade. A literatura de Cordel também aponta, no capítulo de Pesquisa, a relação entre a memória e as características das linguagens visuais dos produtos culturais, no caso, as figuras cordelistas e sua historicidade. E a partir do produto cultural e suas significações sociais, a performance “Experiência nº3” de Flávio de Carvalho, trás também neste capítulo, a linguagem provocativa de sua proposição de um traje tropical adaptado para a realidade e


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paisagem brasileiras, cuja ação estimula experiências simbólicas questionadoras na construção de sentidos e significados coletivos. A partir destas questões, o projeto educativo foi pensado e planejado, durante o Estágio 1, para ser aplicado aos estudantes do Ensino Fundamental e Médio, tendo em vista o estímulo à interpretação dos alunos através de questionamentos proporcionados pela Visualidade da Diversidade Cultural, priorizando o desenvolvimento do pensamento crítico nas relações pessoais, coletivas e sobre as múltiplas estéticas que fazem parte da memória da construção social. De tal modo, o Projeto Educativo apontava para a instrução do educando no reconhecimento da existência de diversos e diferentes tipos de culturas que compõem a sociedade brasileira e mundial, promovendo a reflexão sobre os tipos de manifestações estéticas presentes nos produtos das diferentes culturas, orientando a percepção das significações visuais e intelectuais da Arte como suporte cultural e valorizando as relações interculturais da sociedade. Assim, durante as disciplinas de Estágio 2 e Estágio 3, o projeto de ensino planejado foi aplicado no 2° semestre de 2011 aos alunos da turma 50 (5° ano EF) e da turma 101 (1° ano EM). Os planejamentos para ambos partiram do mesmo tema e metodologias, porém algumas atividades práticas foram aplicadas ou adequadas distintamente em um grupo e outro. Com os alunos da Turma 50 foram realizadas diversas atividades que vinculavam as interpretações pessoais do educando à linguagem e conceitos da Arte. A partir da dinâmica “Teia Cultural”, realizamos uma construção visual coletiva feita de linhas de barbante que se cruzavam entre um aluno e outro, dentro de um grande círculo, discutindo questões sobre as relações culturais presentes na sociedade e, desenvolvendo conceitos próprios da representação simbólica da “Teia” construída, e da Arte. Também, através da leitura visual de objetos culturais de uso cotidianos pesquisados pelos alunos, refletimos sobre os aspectos simbólicos, formais e estéticos que estes podem oferecer. Já a partir do estudo da Literatura de Cordel, discutimos as heranças e produtos culturais de um povo como característica expressiva e significativa da Arte. Além disso, através da sensibilização promovida por músicas indígenas Guarani e Kaingang, realizamos trabalhos plásticos que experimentavam as representações gestuais e imagéticas possibilitadas pela Arte. Também, discutimos as relações humanas nos grupos sociais, a partir da observação de objetos de uso cotidiano indígena, buscando compreender a existência de significados relativos para o ser humano ao seu próprio meio circundante. Ainda, a partir da leitura visual das obras de Rosana Paulino e Lucílio de Albuquerque discutimos as questões da historicidade do povo brasileiro afro descendente e os


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reflexos das heranças sociais deste povo na atualidade. Outras atividades se deram neste percurso, e do mesmo modo que as citadas acima procurei sempre instigar os alunos a refletirem de modo intercultural, indicando-lhes como norte a percepção sobre os corpos sociais. A cada aula realizada, com os alunos da Turma 50, eu percebia o amadurecimento dos educandos no aspecto da compreensão estética e simbólica da significação do estudo das Artes como disciplina escolar. Eles compreendiam que a Arte significa mais do que um simples “fazer”, experimentando, conhecendo e discutindo aspectos que nunca haviam sido oportunizados a eles. A curiosidade dos alunos instigou-os a se permitirem expor suas ideias e anseios para a aproximação dos novos conhecimentos que estavam sendo propostos, demonstrando muita curiosidade sobre as atividades que se davam, participando de modo intenso das atividades. Já para os alunos da turma 101 as atividades realizadas partiram principalmente de debates sobre a observação, reflexão e discussão das figuras de pessoas da sociedade e as manifestações estéticas das diferentes culturas, brasileira e mundial. A partir da observação das reproduções das obras “Mulheres de Costas” e “Per (so) nas” de Vera Chaves Barcelos procuramos identificar a apresentação simbólica que um corpo pode oferecer, despertando um olhar sensível sobre as relações sociais. A partir destas, desenvolvemos exercícios de construção de personagens imagéticos sociais a partir de fotografias de diversos artistas (antes, pessoas anônimas para os alunos), munindo-se de conceitos diariamente vivenciados da sociedade. Várias atividades propostas e desenvolvidas com os alunos da turma 101 partiram do mesmo planejamento das realizadas com a turma 50, porém, com abordagens correspondentes à faixa etária dos alunos. A leitura visual de objetos culturais de uso cotidiano, Literatura de Cordel como produto cultural e artístico, as discussões sobre a historicidade brasileira afrodescendente a partir da apreciação das reproduções das obras de Rosana Paulino e Lucílio de Albuquerque e outras propostas práticas plásticas foram algumas destas. Percebi que os alunos do EM ampliaram suas percepções frente às observações de indivíduos da sociedade compreendendo os múltiplos aspectos comunicativos que a representação do corpo pode transmitir. Os diversos debates que se estabeleceram em sala de aula durante a prática de estágio motivaram os alunos a expressarem suas ideias, críticas, posicionamentos ideológicos e sociais relacionando até mesmo a construção indenitária de cada um, percebendo dessa forma, de modo coeso e respeitoso, a pluralidade de formas de atuar na sociedade.


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A prática de estágio no Ensino Médio foi muito boa e rendeu ótimos frutos. Porém, devido a muitas interrupções no seguimento das aulas (feriados, atividades da escola e greve dos professores) percebi que estas afetaram o processo continuado das atividades planejadas, dificultando uma costura ritmada do projeto. Mesmo com a ocorrência destas interrupções, acredito que ambas as práticas (EF e EM) possibilitaram resultados positivos e colaborativos para os alunos e para minha formação como arte-educadora. Neste TC, porém, detenho-me a apresentar a experiência da prática educacional realizada com os alunos do EF, pois acredito que esta prática me possibilitou maiores reflexões pessoais sobre a atuação e papel do arte-educador, contribuindo amplamente em diversos aspectos para minha formação docente em Artes Visuais. Tal experiência é apresentada no terceiro capítulo deste TC, chamado de “Projeto e Prática de Ensino”, que apresenta o Projeto propriamente dito, com a descrição detalhada do planejamento e da realização de cada uma das 15 aulas aplicadas. Análises reflexivas sobre o andamento das atividades em sala de aula também compõem os relatos das aulas realizadas, e foi através destas que pude perceber que o projeto educativo oportunizava aos educandos uma atuação ativa, diferente da prática pedagógica a que era oferecida a eles pela professora titular e também um resultado intensamente almejado por mim. Através destes relatos e reflexões, pude perceber também que o exercício do professorado possibilitava-me vivenciar experiências únicas que promoviam reflexões bastante peculiares de um processo de ensinoaprendizagem. Porém, algumas reflexões mais contundentes e aprofundadas, com relação às contribuições que um Projeto de Ensino pode oferecer e ao desempenho do docente, só as percebi revendo o Projeto como um todo, durante as atividades de Estágio 4, e tais análises (revistas) tomam novos campos de reflexão na Conclusão deste TC. Repensando minha Prática deste Projeto, percebi questões mais amplas sobre a metodologia aplicada, que visava o questionamento do aluno como construtor de seu próprio conhecimento, e estas se encontram discutidas de forma mais aprofundada na Conclusão deste Trabalho. Conjuntamente a reflexão sobre a adequação do posicionamento do professor e os indícios implícitos no comportamento dos alunos, também revistas e discutidas na Conclusão, indicaram-me novas reflexões que contribuíram amplamente em minha formação como arteeducadora. Além de todas as questões apresentadas que compõem este TC, é necessário aqui, comunicar o leitor sobre uma experiência particular que contribuiu em minha formação como arte-educadora e também para este projeto educativo em questão. Durante a aplicação do Projeto Educativo, idealizei e organizei, conjuntamente com meu colega de curso Ricardo


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John, uma ação paralela à prática de Estágio, designada Projeto Arte Postal: Inter-relações nas escolas públicas do RS. O Projeto consistiu-se por estabelecer uma intercomunicação, através da produção plástica, entre alunos das escolas públicas do RS, nas quais estudantes da ULBRA atuavam como estagiários, envolvendo 15 escolas e mais de 400 alunos. A possibilidade encontrada na Arte Postal para o exercício da transterritorialidade imagética foi o aspecto que estabeleceu e definiu a prática de tal projeto, que teve como fonte de inspiração as pinturas aeropostais do artista plástico Eugenio Dittborn. Como resultado, todos os trabalhos foram centralizados e reorganizados em uma instalação coletiva e expostos no Santander Cultural no período em que o artista Eugênio Dittborn expunha suas pinturas Aeropostais, integrando as exposições da 8ª Bienal do Mercosul. A proposta pedagógica do Projeto Arte Postal teve como intuito estabelecer a comunicação visual, a fruição e a discussão da produção plástica nas escolas participantes. Aproximar os alunos do exercício curatorial através da escolha de critérios organizacionais, da análise das imagens recebidas e do diálogo acerca de percepções, foi outro propósito do exercício, tendo como objetivo a construção de um olhar crítico, sensível e respeitoso acerca das produções visuais que nos rodeiam. A prática do Projeto Arte Postal desenvolveu-se em atividades que resultaram na produção de uma composição visual pelas turmas participantes, organizadas coletivamente em sala de aula, com os trabalhos plásticos individuais dos alunos. Estas composições foram desmontadas e trocadas entre as turmas e escolas participantes por via postal, para que as mesmas fossem apreciadas, reorganizadas e remontadas em uma nova composição plástica a partir do olhar da turma destinatária sobre os trabalhos recebidos. O critério da organização espacial, assim como as relações entre as imagens para as montagens e remontagens das composições, foi definido e estabelecido pelos próprios alunos mediante um exercício curatorial. O Projeto Arte Postal, não está em questão neste TC, mas neste aparece e aponta a participação dos alunos, os exercícios e discursos que se estabeleceram a partir das propostas possibilitadas pelo mesmo, incorporando as questões fomentadas do Projeto Educativo em questão. Posso dizer que este Projeto contribuiu amplamente para os alunos da turma 50 de modo a perceberem-se como criadores de discursos visuais, enquanto participativos e atuantes na construção de uma comunicação transterritorial. Muitos outros aspectos podem abranger reflexões e indagações mais aprofundadas sobre o Projeto Arte Postal, mas estas não cabem neste TC. E, desta forma, detenho-me a apresentar ao leitor


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minha atuação como arte-educadora participante do Projeto, mas não como idealizadora e organizadora. Enfim, neste TC estão registrados momentos de minha experiência frente à Prática Educativa em Artes Visuais, observações, inquietações e reflexões que me levaram a ampliar minhas expectativas sobre uma ação educativa integradora. Uma vivência que contribuiu com meu aprendizado para com a importância de promover um ensino que torne os educandos sujeitos observadores, questionadores e atuantes na sociedade, sobretudo de modo a contribuir em uma construção social coletiva integradora, comunicativa, livre de preconceitos e discriminações.


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Capítulo 1 Reconhecimento do Espaço de Ensino


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1.1. Dados Gerais da Escola Escola Estadual Cônego Paulo de Nadal Fundada em 01/03/1963, pelo Cônego Paulo de Nadal, como Escola Assistencial – Cidade de Deus. Em princípio era uma escola particular, mantida pela Secretaria de Ação Social da Arquidiocese de Porto Alegre. Sua primeira diretora foi a Irmã Therezinha de Jesus Garcia, no período de 1963 a 1965. Em 1967, pelo decreto estadual 18500, passou a se chamar Grupo Escolar Ruben Berta, mantido pelo Estado. O nome da 2ª diretora desta escola foi a Profª Suely Luz dos Santos. O período em que esteve na direção foi de 1966 até 1969. A partir de 1969 até 1982, a direção deste estabelecimento escolar foi da Profª Irecê de Azevedo Corrêa. A partir de 18/08/1979, a escola recebeu prédio novo situado à Av. Cavalhada, 4357. Em 1980, foi instalado o curso de 2º Grau. A partir da Portaria 61827, de 11/11/1981 houve a unificação das escolas: Ruben Berta e 2º Grau, localizada na Cidade de Deus, que passou a ser chamada de E.E. de 1º e 2º Graus Cônego Paulo de Nadal. Setores em funcionamento na escola em 1986: a) CAE – Centro de Atendimento ao Educando b)

SSE – Serviço de Supervisão Escolar

c)

SOE – Serviço de Orientação Escolar

d)

Biblioteca

e)

SOR – Serviço de Orientação Religiosa

f)

Almoxarifado

g)

COM – Círculo de Pais e Mestres

h)

Clube de Mães.

Durante o período de março de 1983 até agosto de 1983, ocupou a direção a Profª Rosa Moraes. De agosto de 1983, foi diretora a Profª Helena Mattiello. Em janeiro de 1986 a direção ficou a cargo da Profª Márcia Eneida Intini, tendo como vice-diretoras as professoras Rosa Maria Ferrugem, Tânia Vanni e Verenice Nunes. A partir de dezembro de 1988 a Profª Rosa Maria Olichoski Ferrugem é a diretora, que permanece no cargo até dezembro de 1991. Quando assume a direção a Profª Verenice Ramos Nunes. Em setembro de 1993, a direção passa a ser da Profª Maria do Carmo de


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Souza, que é substituída pela Profª Cleci Sena, em dezembro de 1997, sendo a diretora até dezembro de 2001, quando assume a Profª Sônia Maria Dotto Padoim, e que é substituída pela Profª Katiana Pinto dos Santos em fevereiro de 2008. Atualmente a escola atende 836 alunos, sendo em sua maioria, alunos de baixa renda. A mesma possui um corpo docente que conta com 60 professores distribuídos nos turnos: manhã, tarde e noite. E a estrutura física conta com 16 salas de aula, 1 biblioteca, 1 sala de informática, 1 audiovisual, 1 laboratório, 1 sala de aula para o atendimento de alunos especiais e uma sala de Artes.


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1.2. Observações Silenciosas 1.2.1. Primeira Observação Silenciosa Aulas 1 e 2 Ano: 5° ano do Ensino Fundamental – Turma 50 Data: 23/03/2011 – turno da tarde Duração: 2 períodos de 50 min. São os últimos dois períodos do turno da tarde e os alunos chegam à sala de Artes após o término do recreio. A escola conta com uma sala somente para o ensino de Artes, que dispõem de 8 grandes mesas e os alunos se organizam em pequenos grupos distribuindo-se nas mesas dispostas da sala. São 23 alunos na lista de chamada da turma. Todos chegam agitados, suados e carregando garrafas de água mineral. A professora pediu aos alunos que sentassem nos bancos sem fazer barulho e pergunta aos alunos se eles haviam esquecido o combinado da aula anterior. Sob conversas e barulhos dos móveis da sala, a professora lhes relembra do combinado dizendo-lhes que devem deixar as mochilas sobre as prateleiras laterais da sala e que todo o material que não seja da aula de Artes deve ficar lá. Eles devem deixar somente sobre as mesas o material de Artes e o trabalho da aula anterior, que deve ser entregue. Os alunos vão guardando o seu material e a professora grita com alguns alunos dizendo-lhes que nem o caderno deve ficar sobre as mesas e que as canetas também devem ser guardadas, pois ela já havia avisado que não permitiria o uso de caneta. A professora grita com outro aluno dizendo-lhe que tem que se sentar direito, que não pode por o pé no banco do lado, ela ainda diz, “que não vai ficar repetindo tudo isso a toda aula”. A professora diz aos alunos que o recreio é para descansar, lanchar,... E é interrompida por conversas dos alunos. Ela pede silêncio e os alunos continuam conversando baixo, um deles grita para todos: “Silêncio!” A professora continua lhes dizendo que eles não devem chegar daquela maneira na sala: suados, fedorentos, por que “se matam” correndo no pátio. Assim, os alunos se acalmaram, e a professora explicou-lhes que eu estava ali na sala por que iria fazer estágio na turma deles, e pediu-me para me apresentar. Apresentei-me e expliquei-lhes que eu estudava artes e já estava no final da faculdade, e estaria presente na sala por somente algumas aulas, observando e fazendo


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anotações para elaborar um projeto para desenvolver durante as aulas que darei a eles no próximo semestre. Um aluno perguntou-me o que seria um projeto. Expliquei lhe dizendo que teríamos um tema para desenvolver nossas atividades durante as aulas. Outro aluno perguntou qual seria o tema. Respondi-lhe dizendo que ainda não estava decidido, e teria uma aula que eles responderiam um questionário que me ajudaria a pensar algo que seja de interesse deles e que fosse legal para todos nós. Os alunos mostraram bastante curiosidade. Perguntaram-me a minha idade e para que séries eu dava aula. Respondi-lhes que tenho 29 anos, e que ainda não havia dado aulas em escolas, avisei-os que seriam os meus primeiros alunos do ensino fundamental. Sem mais nenhuma dúvida, encerrei minha apresentação dizendo-lhes para agirem normalmente na sala de aula, como se eu não estivesse ali, para que eu pudesse entender bem como era o ritmo deles e os métodos da professora para poder elaborar nosso projeto da melhor forma possível. A professora segue a aula entregando uma folha branca de ofício A4 para cada aluno e vai recolhendo os trabalhos da aula anterior. Ela avisa a turma que esta seria a última aula que ela aceitaria o trabalho de pontilhismo, que foi executado há 3 aulas atrás. Os trabalhos que ela recolhe nesta aula foram feitos na aula anterior e os alunos terminaram em casa, é um trabalho de linhas, que eles estudaram traçado e forma (diz ela a mim). Em alguns trabalhos entregues, a professora chamou a atenção dos alunos, falando-lhes que era para serem linhas coloridas, e que alguns trabalhos deveriam ser levados para casa novamente para serem acrescidos de cores, pois foram executados somente com o uso de lápis/grafite. A professora escreve no quadro negro “Linhas perpendiculares” e pede para que os alunos copiem a palavra do quadro na folha entregue e que deixem um espaço para eles escreverem o texto que será ditado por ela. Ela inicia: “Quando duas retas se tocam podem ser...” (um aluno repete cada palavra que ela disse durante o ditado e a professora interrompe e grita: “Não é pra repetir!”) Ela continua: “perpendiculares.” (o aluno repete a palavra novamente e ela grita: Chega! Já disse que não é pra repetir!) ela prossegue, “Isso acontece quando elas...” (outros alunos, uns três ou quatro, repetiram a fala da professora, e ela grita novamente perguntando-lhes se eles querem se exibir), a professora continua, “formam um ângulo...” (e é interrompida mais uma vez, por outro grupo de alunos, a mesma fica muito frustrada e grita com os alunos, dizendo-lhes que vai falar com a diretora se o comportamento continuar), os alunos fazem silêncio e ela finalmente conclui: “reto”. No quadro negro a professora desenha:


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90°

Ela grita para os alunos: “Olha pra cá, olha pra cá!” (apontando o desenho no quadro), e lhes diz que são duas linhas, uma horizontal e outra vertical, e explica que quando elas se encontram pode-se dizer que são perpendiculares. Ela reforça que “podem ser”, pois, explica que uma outra forma também é considerada perpendicular ilustrando com mais um exemplo no quadro negro:

Ela tenta explicar o que é um ângulo reto, mas a própria interrompe sua explicação reclamando que alguns alunos estavam bebendo muita água, que não era pra eles ficarem toda hora “mamando” nas garrafas, pede para que guardem as garrafas, pois não queria vê-las sobre as mesas. A professora ainda chama a atenção de um aluno (que estava de cabeça baixa desenhando sem parar, quieto, compenetrado), falando em voz alta para toda a turma ouvir, que não era hora de ele desenhar, que era para prestar a atenção, que ele estava sempre atrasado nas tarefas, e se continuasse assim, sempre estaria atrás do restante da turma na execução dos trabalhos. Logo após, a professora se dirige a outro aluno e diz que esta o ouvindo falando em vários momentos da aula, e diz a este, que troque de lugar. O aluno obedece e os colegas do seu grupo ficam rindo baixinho. Assim, a professora escreve no quadro negro: “Linhas paralelas”. E dita: “Quando duas retas seguirem sempre...” (ouve-se um assovio do lado de fora da sala se repetindo e a professora interrompe o ditado e vai à porta observar, os alunos ficam curiosos) ela continua, “a mesma direção, mantendo...” (continua-se escutando o assovio, os alunos cochicham e o olhar da professora fica direcionado somente na janela da rua) “a mesma distância entre si...” a professora se distrai com o assovio novamente, repete o que foi ditado e continua: “nós a chamamos de linhas paralelas.” Com os olhos na janela, a professora repete novamente o que foi ditado, e os alunos suspiram impacientes. Ela exemplifica lhes dizendo que é como os trilhos de um trem e desenha no quadro negro:


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O assovio do lado de fora é constante deixando a professora muito tensa. Uma aluna aponta o seu colega e diz a professora que é ele quem esta assoviando. A professora o ameaça, dizendo-lhe que é para parar de assoviar, caso contrário, ela o levará a sala da diretora. O aluno se defende dizendo que não é ele neste momento se escuta o assovio no lado de fora da sala e a professora sai da sala e vai á busca do assovio que tanto perturba o andamento da aula. Assim que ela se retira da sala todos os alunos se agitam saindo de seus lugares para espiar pelas janelas da sala em busca de compreender o que está acontecendo. Um dos alunos avista a professora retornando, avisa os colegas, e todos rapidamente retornam aos seus lugares. Sem nenhum resultado de encontrar a pessoa responsável pelos assovios, a professora continua a aula, mas agora os alunos já estão agitados e preocupados. O sinal bate informando que a primeiro período se encerrou. A professora explica que as linhas paralelas também podem se apresentar na diagonal, e desenha no quadro:

O assovio continua constante, os alunos se mostram agitados, e o celular da professora começa a tocar dentro de sua bolsa (ela demora á encontra-lo e desligar). Professora e alunos têm dificuldades no andamento da aula. A professora mais uma vez chama a atenção de um aluno perguntando-lhe se quer chamar a atenção e gritando com o mesmo. A professora escreve no quadro agora “Linhas Convergentes”, mas todos os alunos já estão desconcentrados. Ela dita: “Quando algumas linhas se dirigem todas para um mesmo ponto, chamamos de linhas convergentes”, se escuta o assovio mais uma vez e um aluno levanta-se de seu lugar para espiar na janela. A professora pede para que ele retorne ao seu lugar e fala para a turma que os assovios são parte de uma brincadeira de mau gosto, que esta pessoa está querendo chamar a atenção, atrapalhar as aulas e está conseguindo. Ela pede para os alunos tentarem não prestar atenção. Ela exemplifica as linhas convergentes desenhando:


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Um aluno, preocupado, diz à professora que quem está assoviando, são dois alunos que estão “matando a aula”, o Pedro e o Bruno. A professora diz para o aluno que não quer mais falar disso (a partir deste momento até o final da aula não parou de se escutar os assovios, e ninguém mais falou sobre este assunto). Ela escreve no quadro negro “Linhas Divergentes”. Ela lhes diz que estas linhas são o contrário das linhas convergentes, e dita: “Quando várias linhas saem todas de um mesmo ponto chamamos de divergentes.” E desenha:

Assim, todos terminam de escrever sobre as linhas e copiar os desenhos correspondentes. A professora pede aos alunos que escrevam na folha também, o nome, a turma e a data. Ela diz para eles que virem o verso da mesma folha e comecem a fazer uma margem, que seja da largura de um dedo, que façam fraquinho, de lápis, e sem usar a régua (como ela já havia lhes explicado na aula anterior). A professora pede para que, depois de fazer a margem, os alunos marcarem o meio da folha como uma cruz, para formarem-se quatro quadrados. Ela ilustra no quadro negro como deve ficar:

1

3

2

4


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Ela diz aos alunos para olharem para o quadro, mas ninguém olha. A professora insiste que tem que ficar fraquinho por que se precisar apagar e fazer novamente é mais fácil. Ela ainda diz que, para fazer a margem, eles devem fazer a linha contínua, que não pode levantar o lápis do papel. Ela diz aos alunos: “Cuidado pra não errar!”, e circula entre os alunos para ver como eles estão se saindo. A professora grita com um aluno, dizendo-lhe que é da largura de um dedo, que a margem que ele esta fazendo não está do tamanho de um dedo e por isso ele terá que começar tudo de novo. Para outro aluno ela diz: “Isto é a largura de um dedo de rato? Parece o dedo de um ratinho! Apaga e faz de novo que tá errado!”. Ela se dirige pra outro aluno e grita: “Outro dedo de ratinho! Tá errado! Vai ter que fazer de novo!” o aluno lhe responde: “Tá bom, mas não precisa gritar.”. Observei que os alunos estavam preocupados em fazer a margem corretamente, muitos ficaram frustrados, pois tinham as réguas a sua frente, mas a professora não permitia o seu uso. A professora explica-lhes que em cada retângulo da folha deve ser feito uma composição harmônica (como eles já haviam feito na aula anterior) de linhas correspondente ás anotações feitas e que se devem seguir corretamente os espaços: 1- Linhas perpendiculares, 2- Linhas paralelas, 3- Linhas convergentes e 4- Linhas divergentes. Pede-lhes também que façam as linhas coloridas e que variem suas espessuras. Ela diz gostaria que todos terminassem pelo menos o primeiro quadro, pois faltariam 12 minutos para a aula terminar. Os alunos iniciam a tarefa e a professora diz a eles que este é o momento que eles podem conversar. Diz também que nesta aula ela permitirá o uso de canetinha hidrocor, mas o uso do lápis de cor é obrigatório. Um aluno não faz o seu trabalho sentado no banco como o restante de turma, mas sim em pé, logo que a professora percebeu começou a gritar com o mesmo dizendo-lhe que deve sentar que não pode fazer o trabalho de pé, que tem que se sentar. A professora deixa os alunos executando a tarefa e inicia a chamada. Muitos alunos copiam os desenhos do quadro negro para a folha, e somente repetem a forma, como objetos separados, não como linhas que constroem algo. A professora entrega-me um caderno de estudante (livro didático), uma publicação com diversas explicações sobre temas formais da arte, e me disse que utiliza estes cadernos como conteúdos de suas aulas. Ao folhar o caderno, encontrei a aula correspondente à dada por ela nesta tarde, exatamente como a mesma transmitiu para os alunos, com o mesmo texto, desenhos e exemplificações. Alguns alunos, ao concluírem a composição, mostravam à professora. Ao primeiro aluno que mostra sua composição à professora, ela pergunta-lhe se por acaso ela desenhou no quadro às linhas paralelas “curvas” ou “retas”. O aluno responde que eram retas,


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ela então lhe diz que ele teria de arrumar as linhas de sua composição por que estavam erradas, que teriam que ser bem retas e as linhas que ele havia feito estavam curvas. Outro aluno mostra a composição e ela logo fala que a margem está errada, que ele terá de fazer tudo novamente, inclusive reescrever o texto na nova folha. Alguns alunos mostram a composição das formas (que copiaram no quadro e repetiram diversas vezes) à professora que diz a alguns deles que deveriam engrossar algumas das linhas para não ficarem todas iguais. Outro aluno, por não ter usado cor na composição, a professora rejeitou o trabalho dizendolhe que se não tivesse cor ela nem queria ver. Um aluno mostra a composição feita somente usando canetinha hidrocor, e ela diz “Tudo errado, tá feio e as linhas estão tortas. Vai ter que fazer tudo de novo!”. Um aluno se dirige à mesa da professora com o seu trabalho, quando ela o analisa, percebe que o aluno fez 3 quadros, mas alterou a ordem, trocando a posição, e diz: “Tá errado a ordem, vai ter que fazer tudo novamente, e não esquece de escrever o texto atrás”. O aluno fica frustrado e pergunta se pode colar o texto na outra folha para não ter que escrever novamente, a professora lhe responde que não. O sinal toca, avisando que a aula encerrou. Os alunos ficam contentes e guardam todo o material, a professora diz que todos devem entregar a tarefa pronta na próxima aula.


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1.2.2. Segunda Observação Silenciosa Aulas 3 e 4 Ano: 5° ano do Ensino Fundamental – Turma 50 Data: 30/03/2011 – turno da tarde Duração: 2 períodos de 50 min. Os alunos chegam à sala muito agitados. A professora pede à turma que se acalme. Em meio a barulhos de bancos arrastando, conversas, risadas, eles colocam as mochilas nas prateleiras laterais da sala (como foi orientado pela professora na aula anterior). A professora relembra oralmente à turma tudo o que foi feito na aula anterior sobre as linhas perpendiculares, paralelas, convergentes e divergentes. Havia um desenho no quadro negro (feito por outra professora de outra turma), cuja imagem se tratava de uma natureza morta consistida de: um bule, xícaras, pratos, maçãs... Um desenho com profundidade, perspectiva e a utilização de sombra e luz, que chamou a atenção de alguns alunos. Os mesmos pediram para a professora o aprendizado das técnicas utilizadas para a construção daquela imagem que tanto os encantou. A professora diz aos alunos que eles chegarão naquele nível de construção de imagem, mas que seria um processo. Ela inicia falando que para construir uma imagem como a que estava no quadro negro, eles teriam de compreender como eram feitas as linhas. Nesta aula ela explicaria para eles, mas todos deveriam prestar atenção. Ela começa lhes falando que existem diversos tipos de traços que podem ser feitos em um desenho, como fracos, fortes e médios. E que todas seriam trabalhadas nas aulas, até chegar um nível mais complexo. É solicitado pela professora que os trabalhos feitos na aula anterior e terminados em casa, sejam colocados sobre as mesas, pois ela passaria para recolher todos. Recolhendo os trabalhos, a professora já vai entregando aos alunos uma folha A4 branca para a atividade do dia. Ela pede-lhes que já façam as margens no papel, como já foi explicado e combinado nas aulas anteriores, com o traço fraco (para se precisar apagar para fazer novamente) e com a distância de um dedo da borda da folha. A professora vai observando os alunos fazendo as margens, e percebe que alguns utilizaram a régua para fazer, logo ela já fala à turma que eles não podem usar régua para fazer as margens, que está errado usar a régua e


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que ela nota quando foi feito com a mesma. Ela repete que o uso de régua é errado, diz aos alunos que fica bonito, mas não é a maneira correta de fazer o trabalho, diz a eles que devem fazer à mão. Muitos alunos que usaram a régua ficam descontentes, mas em seguida apagam com a borracha a margem feita e fazem novamente à mão. A professora explica-lhes que utilizando a régua eles não aprendem a fazer linhas. Assim que todos fizeram as margens, a professora solicita que virem a folha do lado oposto e escrevam “Direção do traço” . A professora lhes pede que desenhem logo abaixo um retângulo do tamanho de uma caixinha de fósforos. Os alunos começam a fazer a ilustração conversando com os colegas do seu grupo. A professora grita várias vezes pedindolhes silêncio. Ela pede que logo abaixo da caixinha seja escrito “Linhas circulares – fraco”. A professora desenha no quadro:

Ela vai observando os trabalhos dos alunos, e grita apontando para o desenho de um aluno: “O que é isso? Uma caixinha de fósforos não é deste tamanho! Vai ter que apagar e fazer de novo!”. Olhando outros desenhos ela novamente chama a atenção para o tamanho da caixinha. A professora dobra um papel do tamanho correspondente e indica aos alunos que seja feito naquela medida. Logo, a professora solicita que seja feito outra caixinha e que se escreva abaixo dela “Linhas Verticais”. Os alunos conversam muito e a professora grita várias vezes pedindo-lhes silêncio. A professora relembra os alunos o que é são as linhas verticais e as horizontais. E desenha no quadro negro:


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A professora pede que os alunos desenhem as linhas fracas, pois se não fizerem certo tem como apagar e fazer novamente. Alguns alunos reclamam que as linhas estão ficando tortas e manifestam a vontade de poder usar a régua. A professora logo diz que se ela quisesse que as linhas ficassem bem retas pediria que usassem as réguas, mas não é o caso, que eles devem se concentrar para aprender a fazer as linhas. Logo que os alunos concluem o desenho das linhas, a professora lhes pede que seja feita outra caixinha e que seja escrito abaixo “Linhas horizontais”. E desenha no quadro negro:

Os alunos executam a tarefa em silêncio. Em seguida, a professora lhes pede outra caixinha e a maioria dos alunos reclama que cansaram de fazer caixinhas e perguntam pra professora se faltam ainda muitas caixinhas pra fazer. A professora lhes responde que é a última caixinha, e os alunos, descontentes, a desenham. A professora pede que seja escrito “Linhas inclinadas” e desenha:

O sinal toca informando o término da primeira aula. Um aluno relembra a professora que ele gostaria de fazer o desenho com sombra e luz que esta no quadro negro, que ele não quer fazer este exercício. A professora responde ao aluno que o desenho do quadro é feito somente utilizando-se linhas circulares, que não servia para o estudo desta aula. A professora pede aos alunos que utilizem o lado da folha que tem as margens para fazer um desenho livre em que apareçam as quatro direções de linhas anotadas anteriormente. Ela escreve no quadro “Desenho livre, criativo e bem bonito com as quatro direções das linhas (traço)”.


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É pedido pela professora que eles usem proporção em relação ao papel, que não adiantava fazer uma “formiga” e deixar o resto do papel em branco. Ela reforça dizendo-lhes que devem aproveitar bem o espaço do papel, preenchendo-o bem. Que não adiantava os alunos encherem o papel de nuvens e passarinhos, pois ela não iria aceitar. Com os alunos trabalhando nos seus desenhos a professora inicia a chamada. Todos os 23 alunos estão presentes nesta aula. Durante a chamada todos conversavam bastante e a professora gritava para que os alunos chamados a escutassem. Circulando entre os grupos, percebi que alguns alunos desenhavam o mesmo tema do colega a seu lado. A turma estava dividida em 3 grandes grupos de alunos e uma dupla de meninos. Percebi que em um dos grupos três meninos faziam desenhos de carros, outro grupo de meninas vi corações nos desenhos, e no outro grupo o desenho que repetia-se era o desenho de casas. A dupla de meninos desenhou galinhas. Alguns alunos faziam outros desenhos diversos, mas a maioria tinha outro colega com um desenho espelhado no seu. Conforme os alunos vão desenvolvendo seus desenhos, eles pedem à professora para tirarem suas dúvidas, querendo saber se estão usando as linhas corretamente. A professora lhes diz que não irá corrigir, eles devem olhar atrás da folha (o texto ditado e as ilustrações explicativas), para se orientarem e conferirem se está faltando alguma das linhas aparecer nos desenhos. A professora lembra à turma que eles devem colorir os desenhos com lápis de cor e que não podem usar caneta hidrocor, nem giz de cera, nem nada que tenha tinta. Enquanto os alunos vão fazendo a tarefa, a professora recolhe os trabalhos da aula anterior dos alunos. Um aluno não tem lápis de cor e a professora lhe diz que se ele não trouxer lápis de cor na próxima aula ele terá que fazer um trabalho escrito de pesquisa na biblioteca. A aula se encerra e os alunos não conseguem terminar o trabalho em aula, a professora pede-lhes que terminem em casa. Ela avisa-os que terão trabalhos que deverão que ser entregues em aula e que não poderão ser levados para casa.


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1.2.3. Terceira Observação Silenciosa Aulas 5 e 6 Ano: 5° ano do Ensino Fundamental – Turma 50 Data: 05/04/2011 – turno da tarde Duração: 2 períodos de 50 min. Os alunos entram muito agitados na aula. A professora pede a eles mais calma e que façam menos barulho. Eles colocam o material da aula sobre as mesas e vários deles colorem os desenhos da aula anterior. A professora lhes diz que os desenhos eram pra serem concluídos em casa, e se não estiver pronto está incompleto e é para entregar mesmo assim. Os alunos se mantêm agitados, a professora pede-lhes que parem tudo o que estão fazendo para prestarem a atenção nela. Com muita dificuldade os alunos fazem silêncio. A professora lhes diz que na aula de hoje eu aplicaria o questionário para o meu estágio. E me pede para que a partir deste momento tome conta da turma. Falo aos alunos que entregarei a eles uma folha contendo algumas perguntas para me ajudar a elaborar um projeto de aulas para eles, e que era muito importante que eles escrevessem ali os seus anseios, gostos e conhecimentos dentro da arte como disciplina escolar. Entrego-lhes o questionário e todos vão respondendo com calma e curiosidade. Alguns alunos vão terminando de escrever no questionário e vão me entregando. Destes, que já haviam entregado, começam a fazer brincadeiras, conversar, sair dos lugares, e até mesmo atrapalhar os colegas que ainda estavam respondendo ao questionário. Digo-lhes que podem conversar, mas que seja em voz baixa, que não podem atrapalhar os colegas e que devem permanecer sentados em seus lugares, mas pouco adiantou. Não queria levantar a voz com eles, mas em alguns momentos foi a única maneira de chamar a atenção. A professora interferia tentando fazer com que os alunos me obedecessem. Em meio a pedidos de calma e silêncio os alunos iam entregando o questionário e somando na desorganização que a sala de aula vinha a se tornar. Quando o último aluno entregou o questionário, solicitei silêncio e com dificuldade (por razão do barulho), lhes disse que com os questionários eu iria pensar nas aulas que teríamos e que levaria em conta o tipo de comportamento e organização que eles estavam me apresentando. Informei aos alunos que determinadas práticas desenvolvidas em aulas de arte necessita-se de alunos organizados e disciplinados, e que se eles continuassem demonstrando incapacidade de escutar e respeitar as professoras, só perderiam oportunidades,


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pois as mesmas não teriam confiança suficiente para executar determinadas tarefas. Digo-lhes que a aula continuaria tendo andamento com a professora titular. Os alunos continuam muito agitados e pouco se importam com a presença da professora. Muitas vezes a ela pede-lhes silêncio, mas sem sucesso. Ela pede que entreguem os trabalhos e os alunos não entregam. A professora mostra-se agressiva na insistência para o silêncio na sala e o resultado não é alcançado. Ela pergunta-lhes onde estão os trabalhos e os materiais, avisando que esta seria a última aula que admitiria aluno sem material, e que se na próxima aula algum aluno estiver sem material o mesmo terá que sair da sala. Um aluno ri, e a professora grita dizendo-lhe para calar a boca. Este aluno responde à professora que não trouxe o material e nem o trabalho porque faltou a aula anterior. A professora diz à turma que faltar a aula, não é desculpa nenhuma para não se informar, buscar o que foi ensinado e solicitado com os colegas. Ela completa dizendo-lhes que é atribuição dos alunos trazerem os seus materiais, que consta como regra nas novas normas, já conhecida por eles. Diz a eles também que, além de prejudicar a aula dela, o aluno se prejudica e prejudica também os seus colegas. A professora diz aos alunos que a aula de Artes é para trabalhar e desenvolver-se, não é uma aula para não se fazer nada. Um aluno ergue a mão para falar, mas a professora não lhe dá a palavra, o mesmo permanece com a mão erguida. A professora continua seu discurso ameaçando que irá mandar bilhetes para os pais dos alunos desta turma pedindo-lhes que venham à escola para conversar sobre o comportamento de seus filhos. Ela diz aos alunos que não é possível que em todas as aulas, seja uma grande dificuldade fazer com que eles parem e escutem a professora. Avisa-os que é obrigatório levarem lápis de cor e borracha. Olhando o aluno com a mão erguida, a professora diz à turma que não irá abrir espaço para perguntas. Todos olham para a professora com atenção. A professora entrega uma folha A4 branca para cada aluno e pede para que todos façam margem no papel como nas aulas anteriores. Alguns alunos começam a se agitar novamente, e a professora pede silêncio. Não exitoso o pedido da professora, ela pergunta à turma se eles preferem fazer prova escrita valendo nota. A turma toda se espanta e se agita. A professora avisa a todos que cada turma tem o professor que merece e ela não hesitaria em fazer uma prova. Rapidamente a professora lança o olhar para o aluno Lucas e grita a ele por silêncio. Lucas reclama dizendo que não está fazendo nada, e a professora lhe pede que saia da sala. Lucas hesita, mas a professora insiste, o aluno recolhe seu material, coloca em sua mochila e retira-se da sala batendo a porta com força.


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O gesto de Lucas ao bater a porta faz com que os alunos inicialmente se assustem, mas logo em seguida alguns começam a rir. A professora diz à turma que este tipo de comportamento é adquirido em casa e que se trata de falta de educação. A professora pede silêncio novamente e diz à turma que a partir da próxima aula eles não terão aulas na sala de Artes, pois os mesmos não tinham um bom comportamento para sentarem-se em grupos e faltava também, autonomia para o desenvolvimento da aula neste ambiente. Em aviso da professora, a próxima aula se dará na sala de aula onde eles têm todas as outras disciplinas, utilizando-se a organização espacial feita pelos professores, correspondidas pelo “Espelho de Classe”. A professora escuta algumas conversas em outro grupo, e grita a um aluno por silêncio, o mesmo diz que não esta fazendo nada, e a professora diz para ele também sair da sala. O aluno, sem discutir, pega os materiais e se retira calmamente da sala enquanto todos permanecem em silêncio. Logo que o aluno sai todos, com exceção da professora, começam a rir. A professora olha diretamente ao colega que estava ao lado do aluno que saiu da sala anteriormente e pergunta-lhe de que ele esta achando graça. O aluno lhe responde que não acha graça de nada, porém não consegue controlar as risadas. Imediatamente a professora manda o aluno também se retirar. Assim que sai da sala o terceiro aluno a professora diz à turma que é responsabilidade de todos que exista mau comportamento. Ela pede à turma que digam para os colegas pararem de perturbar a aula, pois assim, todos estavam perdendo a oportunidade de aprender e fazer coisas legais. Ela pede também mudanças, que organizados e com “modos” as aulas poderiam ser ótimas, mas isso dependeria de todos. Os alunos ficam calados e se mostram até mesmo preocupados. A professora completa falando a eles que precisam tomar algumas atitudes individuais, como por exemplo, pedir ao colega silêncio para eles poder aprender com qualidade sem ter que esperar que seja pedido pela professora. A aula termina com a professora pedindo aos alunos que saiam em paz, e que na semana que vem eles tragam o desenho da aula anterior pronto. Pede-lhes que também tragam a folha entregue a eles nesta aula, com a margem pronta. Os alunos vão deixando a sala calmamente.


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1.3. Análise das Observações Silenciosas Lendo os relatórios das observações que fiz da turma 50 do ensino fundamental, percebo que os alunos sempre chegam à sala de aula bastante agitados, situação decorrente da vinda do recreio. Logo que os alunos estão em sala de aula, a professora quer silêncio absoluto e para isso grita muitas vezes com os mesmos. Com isso, notei uma falta de interação entre a professora e os alunos. Existem muitas cobranças feitas pela professora sobre a postura dos alunos e, com gritos, a explicação da mesma para a turma sobre o assunto, soa como inimizade. Um bom tempo de aula é destinado a pedidos de silêncio, organização dos materiais e postura comportamental. Percebi, da parte dos alunos, que os pedidos da professora incomodava-os bastante, e como era repetido em todas as aulas, pouco valor davam aos esforços da mesma. Eu mesma fiquei incomodada nas aulas com tantos gritos da professora e a agitação excessiva dos alunos. Assim, os conteúdos da disciplina não se desenvolviam e permanecer na sala de aula tornava-se cansativo e frustrante. Essa postura da professora de gritar a cada solicitação de silêncio se repetia em vários momentos da aula, e acompanhado de cada apelo uma longa conversa sobre disciplina se dava. A professora desenvolve seu planejamento de aula seguindo um livro didático de Artes para estudantes. Dali, ela dita textos explicativos sobre aspectos formais da Arte, solicitando que os alunos copiem os mesmos em uma folha branca A4 e pede para que, no verso da folha, seja feito a execução da tarefa plástica correspondente ao que foi ditado, tal qual como está no livro. Observando os trabalhos dos alunos de aulas anteriores e os trabalhos que foram feitos nas aulas que observei, eram compostos da mesma forma, com textos explicativos de um lado da folha e do outro lado desenhos correspondentes ao texto. Depois de analisar a situação, percebe-se que: Ainda hoje, como antes, vemos trabalhos iguais, que não guardam qualquer individualidade, ou melhor dizendo, trabalhos que exercitam o contato com a linguagem plástica, mas não exercitam a expressão pessoal e única de sujeitos que têm algo a dizer (MARTINS, 2002, p. 54).

O conteúdo que observei nas aulas, tratava de linhas do desenho, os seus tipos e suas direções. As aulas introdutórias sobre o assunto tratavam de uma série de “nomes” de tipos de linhas e suas direções, acompanhadas de uma explicação sobre as mesmas que pareciam “regras” de como se formavam. Para mim pareciam “regras”, pois, a professora desenhava no quadro negro como estas linhas deveriam ser feitas, e assim, durante a execução


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de algumas tarefas a professora muitas vezes disse aos alunos que seus desenhos estavam errados porque não correspondiam ao desenho do quadro negro. Alguns alunos desenvolviam seu desenho a partir da cópia direta do desenho do quadro negro, para não terem dificuldade de alcançar o acerto apontado pela professora. Pois muitas vezes, quando a professora observava algum erro, mandava o aluno fazer tudo novamente, incluindo reescrever o texto ditado (isso irritava muito os alunos). As determinações da professora pareciam pouco claras aos alunos, que executavam a tarefa procurando desenvolver o “acerto” exigido pela professora. A situação presenciada pode aclarada nas palavras de Martins (2002, p. 54): [...] o sentido da Arte no processo de ensino/aprendizagem parece estar restrito à proposta criativa do professor [...] inventando, copiando, recriando e, à obediência do aluno que executa com melhor ou pior performance a solicitação do mestre [...] o que tenho visto é uma maquiagem do ensinar-aprender Arte e não o seu sentido. [...] Linha não existe para ser sinuosa, reta ou quebrada, mas para expressar tensão, fluência, devaneio, rigor [...] A técnica não existe para ser experimentada apenas, mas para que sustente e dê corpo às idéias que se desvelam pelas linguagens das Artes Visuais, Dança, Teatro, Música e de outras tantas.

Diante as palavras de Martins, acima, posso afirmar que observei nas aulas explicações de como se desenvolvem texturas, hachuras e volumes no desenho, porém, o que foi passado aos alunos, foi a explicação do livro didático da professora, manifestado em uma tarefa plástica de exemplos dos desenhos explicativos do livro. Acredito que a introdução dos tipos de linhas no desenho não foi entendida pelos alunos. “Frequentemente, alunos são submetidos a exercícios inócuos ou, pior ainda, desestruturadores, que mais servem para instaurar ou fortalecer bloqueios do que fazer fluir a criação” (MESERANI apud FUSARI; FERRAZ, 1992, p.36). A professora exige também que, nas folhas aonde os desenhos irão se desenvolver, deve existir margem. E pelas observações que fiz, percebi que a execução desta exigência pelos alunos se dava com dificuldade e frustração, pois a professora não permitia o uso de régua e a maioria dos alunos possuía régua. Nas tentativas dos alunos de fazer a margem na folha, muitas vezes a professora dizia a eles, que estava errada, que a margem se mostrava pequena e vezes torta, o que incomodava e desestimulava a maioria dos alunos. Até mesmo a execução da margem de maneira que não agradava a professora era motivo para que o aluno tivesse de fazer todo o trabalho novamente. Todo momento, durante a aula, a professora alerta os alunos para eles não errarem o trabalho, pede-lhes que desenhe “fraco” no papel, pois se necessário o uso da borracha a folha não ficará “marcada”. E quando os alunos pedem para a professora que olhe seus trabalhos individualmente, ela faz comentários breves (como por exemplo: está certo ou


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errado, bonito ou feio) e se o trabalho não tiver sido feito com o material solicitado (lápis de cor) ela não olha. Se estiver errado na concepção da professora, ela diz ao aluno que deve fazer todo o trabalho novamente, partindo do zero. “Ainda olhamos muito pouco a produção de nossos aprendizes; ainda escutamos muito pouco o que permitimos que eles nos digam. [...] O mais difícil é seguir a viagem do aluno, compartilhando suas dúvidas, nutrindo suas faltas, incentivando o registro de sua reflexão” (MARTINS, 2002, p. 58). Os alunos demonstram vontade em aprender a técnica do desenho, tanto que em uma das aulas, um desenho feito com volumes e perspectivas no quadro negro (trabalho feito por outra professora, com outra turma) chamou a atenção de todos, despertando o anseio de conhecimento. Porém, pouco valor foi dado pela professora a este interesse da turma, propondo um exercício que não parte de nenhum desafio para os estudantes: “Fazer um desenho livre, criativo e bem bonito com as quatro direções das linhas”. Como estava pouco claro para os alunos, onde se utilizava as linhas do desenho, e o que mais “agradaria” a professora, os alunos partiram de estereótipos. Corações, casas, carros, são alguns dos desenhos que se manifestaram. Ainda, alguns alunos “copiavam” o tema de seu colega, repetindo-se as imagens produzidas pela turma. O que percebo é que os alunos têm receio de “errar”, e partem de “receitas básicas” (estereótipos) para conquistar o “acerto” definido pela professora. Essa preocupação faz com que os alunos “aos poucos, vão desaprendendo o seu próprio desenho, perdendo a expressão individual e a confiança nos seus traços, começando a considerá-los “feios” ou “malfeitos”” (VIANNA, 1994, p. 6).


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1.4. Análise do questionário respondido pela professora A professora tem formação em Arquitetura e Urbanismo com especialização em Designer de Objetos e leciona há 20 anos. O principal objetivo da professora em suas aulas é estimular o desenvolvimento da criatividade, mas o que pude analisar nas observações que fiz, é que a mesma não desenvolve como prioridade esse estímulo, definido por ela como sua principal meta. “A criatividade está ligada ao termo criar, isto é, dar existência, estabelecer relações” (CUNHA, R. 1977, p26), o que não pude constatar diante das observações que fiz. O princípio da livre expressão enraizou-se e espalhou-se pelas escolas, acompanhado pelo “imprescindível” conceito de criatividade, curioso fenômeno de consenso pedagógico, presença obrigatória em qualquer planejamento, sem que parecesse necessário definir o que esse termo queria dizer (CUNHA apud ROSA, 2010, p.01).

A professora responde no questionário que possui um plano de aula, e que este é básico. Pude observar que o desenvolvimento deste plano é dado a partir do Livro Didático de Artes para estudantes, ministrando as aulas de maneira idêntica á que o livro sugere. Para essa situação tomo as palavras de Barbosa (2005, p.11) como desabafo aos resultados observados na sala de aula: “os livros didáticos para a arte-educação são apenas modernizações na aparência gráfica de livros didáticos usados no ensino de desenho geométrico nos anos quarenta e cinquenta, sem nenhuma preocupação com o desenvolvimento da autolibertação”. A professora informa que no primeiro trimestre do ano escolar, as turmas do 5° ano trabalham e estudam as linhas do desenho. Este ensino das linhas se dá aos alunos, com um texto escrito ditado pela professora onde contém os “nomes das linhas” e a explicação de como elas se formam. É exemplificado graficamente por ela como as linhas se apresentam em um trabalho plástico, e cobrado que os alunos façam como o exemplo. A professora não apresenta modos de expressão do desenho, mas sim “regras” que a seu ver constroem um desenho. Diante das observações, notei que ela exige o “acerto” das tarefas, situação que a todo o momento preocupa os alunos. São atividades pré-solucionadas que obrigam as crianças a um comportamento imitativo e inibem sua própria expressão criadora; esses trabalhos não estimulam o desenvolvimento emocional, visto que qualquer variação produzida pela criança só pode ser um equívoco; não incentivam as aptidões, porquanto estas se desenvolvem


38 a partir da expressão pessoal, pelo contrário, apenas servem para condicionar a criança, levando-a a aceitar, como arte, os conceitos adultos, uma arte que é incapaz de produzir sozinha e que, portanto, frustra seus próprios impulsos criadores (LOWENFELD; BRITTAIN apud ZANIN, 2004, p.59)

Em relação ao material, é respondido que um pacote de folha A4 é deixado na escola por cada aluno ao início do ano escolar. Durante as aulas a professora entrega uma folha para cada aluno para a execução das tarefas. Ela diz que pede aos alunos que tragam sucatas, revistas, temperas, lápis de cor, retalhos, e este material é de uso individual, cada aluno traz o seu. Observei somente o uso de lápis de cor nas tarefas que se desenvolviam, principalmente por ser uma exigência da professora para os alunos. Ainda, quando o uso de outro material era efetuado por algum aluno (como canetinha hidrocor), a professora o repreendia. Observei que, para os alunos, a escolha do material tornava-se uma obrigação, gerando trabalhos padronizados, o que ás vezes não correspondia com as expectativas dos alunos. Acho que seria necessário “resgatar seu próprio processo expressivo, voltando a brincar com os materiais, não tendo medo de mostrar suas próprias descobertas formais, espaciais e colorísticas” (CUNHA, 2002, p.10), mas infelizmente essa situação não era permitida pela professora. A professora informa que não são apresentados aos alunos trabalhos de artistas e períodos da história da Arte, pois, para ela, os alunos nesta fase de aprendizado são crianças muito pequenas, e não se pode trabalhar com leitura de imagens ou visita a exposições com esta faixa etária. Tendo em vista que desde o nosso nascimento estamos inseridos num mundo repleto de significados - no qual a imagem é o principal veículo de informação, imagina-se que a escola deva proporcionar uma alfabetização visual através do ensino da Arte, explorando-as e construindo conhecimentos na área (LUZ, 2009).

Na visão da professora, isto não é possível. Para o desenvolvimento da criatividade (principal objetivo da professora) e a relação com a leitura de imagens, tomo as palavras de Barbosa que descrevem a carência que a ausência de imagens demonstrou nas aulas observadas: [...] pretende-se não só desenvolver a criatividade através do fazer arte, mas também através de leituras e interpretações das obras de arte. [...] desconstruir para reconstruir, selecionar, reelaborar, partir do conhecido e modificá-lo de acordo com o contexto e a necessidade são processos criadores, desenvolvidos pelo fazer e ver arte e fundamentais para a sobrevivência no mundo cotidiano (BARBOSA apud ROSSI, 2003, p.16).


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Como estudante de Artes Visuais, uma frase, em especial, marcou muito meu conceito sobre a importância da apresentação de imagens na sala de aula e vejo a necessidade de que ela venha à tona nessa análise: “Eles lecionam arte sem oferecer a possibilidade de ver. É como ensinar a ler sem livros na sala de aula” (BARBOSA, 2005, p.12). Para a professora, não deveria ter avaliação. Ela procura avaliar somente o envolvimento, comprometimento e vontade do aluno em executar as tarefas, e enfatiza que jamais avaliará o talento ou o resultado dos trabalhos. Parece que o trabalho pedagógico dela mesma, fica deixado de lado no processo avaliativo. Para Oliveira (2001), o processo da avaliação em arte, não é um ato neutro, tem implicações pedagógicas, sociais e políticas. Porém, a mesma autora, em um segundo momento aproxima-se mais da resposta da professora com a seguinte frase: “o professor poderá identificar os caminhos já percorridos por ele e pelo aluno, bem como pontos críticos e os padrões culturais dos alunos que chegam à escola, tomando decisões satisfatórias e suficientes quanto às metas a serem perseguidas” (OLIVEIRA, 2001, p.133).


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1.5. Análise dos questionários respondidos pelos alunos A atividade, em artes, que a maioria dos alunos respondeu que faz ou gosta de fazer é desenhar. E ao que pude analisar esta é a atividade que mais os alunos fazem na escola. Mesmo desenvolvida repetidamente, percebi vários estereótipos e insegurança no desenvolvimento dos desenhos. Essa situação pode ser explicada diante as observações silenciosas das aulas que presenciei, pois percebi que a professora não permite que os alunos “saiam” da proposta das tarefas gerando, assim, trabalhos “padronizados”. Sem a permissão de desenvolver algo próprio, o estereótipo poderia representar um “porto seguro” para os alunos. “Ao aprender que podia criar, comecei a rejeitar os desenhos sempre iguais” (VIANNA, 1994, p.4). 75% dos alunos que responderam o questionário nunca visitaram uma exposição/mostra de artes. Ainda, na escola não foi proporcionado aos alunos nenhuma aproximação a obras de arte ou a artistas. Dois alunos responderam que conhecem as obras de Leonardo da Vinci e outro aluno citou Picasso. O restante dos alunos informou que não tinha nenhum conhecimento sobre artistas ou obras de arte. A arte ainda é tomada como uma matéria “fácil”, que muitos creem não exigir exercícios e estudos, pois é comum que seu cerne seja considerado unicamente a partir das técnicas e seus materiais. [...] comumente vilipendiada em muitas estruturas educativas, a ponto de ser dita “matéria sem matéria”, [...] Tal colocação, nos faz indagar o que tem sido a matéria da arte para toda essa gente que por ela passa ou que nela se estabelece (ZORDAN, 2010 p. 97).

“Como a matemática, história e as ciências, a arte tem um domínio, uma linguagem e uma história. Se constitui, portanto, num campo de estudos específico e não apenas uma mera atividade” (BARBOSA, 2005, p.6). Todos os alunos responderam que acham que a Arte é importante. Mas um terço da turma não soube responder por que achava que a arte era importante para eles. Já outros alunos apontaram que a arte é importante para o seu futuro, e outros disseram que a arte é importante porque permite que desenvolvam várias coisas e que acham interessantes. Sem estar claro para os alunos onde se identifica a importância da arte para eles, noto que, diante das observações silenciosas, lamentavelmente a professora não desenvolve discursos e reflexões críticas sobre a arte, o que pode estar obstando o pensamento crítico dos alunos. Para Pillar (2006, p.13) o olhar quando estimulado permite


41 [...] uma construção de conhecimentos visuais. O olhar de cada um está impregnado com experiências anteriores, associações, lembranças, fantasias, interpretações, etc. O que se vê não é o dado real, mas aquilo que se consegue captar e interpretar acerca do visto, o que nos é significativo.

Sobre a pergunta onde eles poderiam responder o que gostariam de aprender em artes, as respostas foram baseadas em técnicas. Nenhum dos alunos aponta anseio de conhecer tipos de temáticas, elementos da história da arte ou mesmo o conhecimento sobre artistas e obras de arte. A partir das observações silenciosas vi que os trabalhos desenvolvidos na escola com os alunos partem somente das técnicas, sem análises críticas ou reflexões sobre a poética e a poiética. Os mesmos não têm o conhecimento do enorme campo de descobertas que a Arte permite e que permanecem ocultas para eles. Isto porque, o “olhar artístico não é um olhar passivo que recebe e registra a impressão das coisas. É um olhar construtivo” (CASSIER apud PILLAR, 2006, p. 17), e esta construção é pouco incentivada nas atividades de suas aulas pois [...] O saber se reduz a fórmulas ocas, inúteis. E não só faz-se de conta que já se chegou a todo conhecimento de todas as respostas, como também desestimula o processo de aprendizagem através de indagações e hipóteses. Elimina-se o ser inteligente e sensível das pessoas. (OSTROWER apud PILLAR, 2006, p.16)

Vejo que as produções plásticas dos alunos não são estimuladas a gerar alguma discussão crítica. Seus trabalhos buscam desenvolver meros exercícios técnicos, sem importância pessoal, promovendo deficiências, que poderiam ser grandes estímulos, já que se “começa a ter importância a ideia de que houve uma intenção de produzir uma imagem como linguagem, isto é, para comunicar algo. Esta ideia é ainda bastante tosca, mas já começa a embasar os comentários a respeito da arte” (ROSSI, 2006, p.28). Ainda no caráter de técnica, vinculei as respostas sobre o que eles gostariam de aprender e as técnicas que gostariam experimentar nas aulas de arte. Fotografia e escultura manifestaram numerosos anseios. Sobre a pergunta se existe arte no cotidiano deles, metade da turma respondeu que não, e a outra metade (a maioria) respondeu que existe arte em todos os lugares (sem especificar quais). Alguns disseram que tem arte na televisão, em casa e na escola. “Nada é tão representativo de experiência estética como a imagem, seja algo etéreo, fantástico ou algo materializado numa forma natural ou cultural” (MEIRA, 2006, p.121), mas este contexto não foi expressivo nas respostas, visto que [...] o conhecimento é, fundamentalmente, uma questão de visibilidade, porque as ideias só têm um valor e um sentido para o ser humano, quando podem ser articuladas em imagens compreensíveis para ele, quando lhe possibilitam uma interatividade com o mundo (MEIRA, 2006, p. 123).


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CapĂ­tulo 2 Pesquisa sobre Tema nas Artes Visuais


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2.1. O Corpo como um Suporte Cultural. 2.1.1. A Diversidade Social e as Manifestações Culturais A diversidade cultural é apontada por diferentes costumes, hábitos e manifestações de indivíduos da sociedade. Expressando-se simbolicamente, diversas e diferentes culturas manifestam-se no cotidiano global, explicitando os produtos de seus contextos sociais traduzidos em múltiplas estéticas. Sendo assim, ao refletirmos sobre as culturas que se manifestam em nosso cotidiano, desenvolvemos o pensamento crítico nas relações pessoais e coletivas. Pois a prática intercultural permite-nos por meio da relação entre pessoas de culturas diferentes, o reconhecimento da pluralidade social (já adquirida pela globalização) à qual estamos inseridos. “O termo interculturalidade implica uma inter-relação de reciprocidade entre culturas” (RICHTER, 2004, p.141), a qual permite o diálogo crítico e construtivo em nossas relações coletivas. Percebendo a pluralidade cultural inserida no nosso contexto cotidiano desenvolvemos discursos reflexivos na construção de nossa sociedade. Discursos permeados de reflexos da memória histórica da construção social de um povo, um acervo cultural de toda a humanidade. E através das manifestações estéticas podemos compreender as diversas culturas, suas histórias e valores, pois, “todas as culturas possuem alguma forma de expressão artística internamente válida” (GARCEZ, 2009, p.81). Na percepção destas expressões artísticas presentes em diversas estéticas culturais de nosso cotidiano, vejo a importância de “questionar a crença de que o que uma cultura denomina arte será reconhecido como tal em qualquer outro lugar e devem ter vários tipos de lentes para analisar as múltiplas maneiras de ver, discutir, compreender e valorizar a arte” (GARCEZ, 2009, p.81). Ainda em relação aos discursos estéticos, para Fatuyl (1990, p. 159): A arte tem uma funcionalidade e um propósito. Ela é dialética e comunicativa [...] A arte tem muitas linguagens. Como existem muitas culturas, há muitas formas de arte [...], a arte representa os símbolos de uma cultura, de um povo ou valores de um grupo e a forma de vida social das comunidades.

Muitos artistas utilizam como referencial para suas obras signos que se manifestam em seu cotidiano, lembranças de seu passado e ainda tradições culturais de seus antepassados. Estas múltiplas estéticas possíveis na arte contemporânea evocam a busca dos artistas por sua responsabilidade social, buscando salientar suas culturas de origem e o


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intercâmbio entre culturas. “Quando se fala em percepção estética e valor estético, não se está falando sobre categorias superficiais, mas sobre categorias que possuem raízes profundamente inseridas na realidade cultural e artística de algum grupo de seres humanos” (RICHTER, 2008, p.106). Exemplo desta busca pode-se encontrar nas fotografias de Walter Firmo, que remete a temas sociais brasileiros, com destaque para as festas folclóricas, observando diversas manifestações culturais de nosso povo. Para Duclós (2005), Walter Firmo desvenda uma estética luminosa, dilacerada no cotidiano popular. O artista revela que, em cada cena brasileira, há um elemento fundamental de síntese de transcendência: a alegoria, trabalhada por ele com uma obsessão poética.

Walter Firmo, 2010. (Fonte: http:///blogcasadaphotografia.files.wordpress).


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Walter Firmo, 2008. (Fonte: www.revistabrasileiros.com.br).

Walter Firmo, 2002. (Fonte: www.farolcomunitario.com.br)

Já a artista Rosana Paulino, por exemplo, busca elementos de sua ancestralidade numa concepção de visibilidade das raízes africanas, desenvolvendo um discurso crítico da relação intercultural presente na historicidade brasileira. A relação da obra de Paulino dialoga


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diretamente com as realidades culturais em que vivemos, a artista menciona: “Em minha obra tenho investigado questões ligadas a gênero e etnia, notadamente as que envolvem a situação social da mulher negra no Brasil” (PAULINO, 2011). Na instalação “Wet Nurse” a artista evoca uma escrava condenada a amamentar a filha de sua senhora, tornando-se uma ama de leite, encargo dado às escravas que já tinham filhos. As imagens das negras de Paulino são figuras que não possuem rostos e a artista ressalta fortemente o “interesse” do leite de seus seios, representado por fitas, revelando um discurso sobre a relação social desumana presente no período colonial brasileiro. Tal proposição temática na obra de Paulino possibilita uma abordagem questionadora frente às relações sociais que se estabeceram em nossa história e, os reflexos destas, existentes na atualidade.

Rosana Paulino, Wet Nurse, 2008 (esquerda). Detalhe à direita. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com.br)

Já na obra de Lucílio de Albuquerque, “Mãe Preta” (1912), também observamos esta temática, na imagem de uma mulher negra em uma senzala, dirigindo seu olhar para um bebê negro que está no chão, enquanto amamenta uma criança branca. Segundo Christo (2009) essa tela evoca sentimentos antagônicos no expectador, pois ao mesmo tempo em que há ternura pela ligação afetiva com a mãe que amamenta, há também um mal estar pela substituição da criança negra pela branca. Após a abolição, o negro passou a ser tema em


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obras de arte no Brasil, muitas vezes a imagem era construída de forma romântica. Mas, nesse caso, Lucílio de Albuquerque manteve traços da pobreza em que vivia esse grupo social, pintando a mãe negra em "seu próprio ambiente paupérrimo e sem nenhum otimismo quanto ao futuro".

Lucílio de Albuquerque, 1912. (Fonte: http://www.dezenovevinte.net/obras/obras_maraliz.htm)

Rosana Paulino discute também em sua obra a repercussão da história brasileira do período colonial na atualidade. Repercussão que reproduziu a discriminação e opressão do povo negro-africano, povo que compõe a maior parte da sociedade brasileira hoje. Sobre a obra “Tecido social” a artista aclara seu contexto: Tecido social. O avesso que não se vê, as bordas da cidade e da sociedade. A costura que deveria estar no avesso, invisível, é trazida para a frente, para o primeiro plano, demonstrando a tentativa de se criar uma sociedade feita de retalhos opostos onde, de uma maneira que poderíamos chamar de “Franksteiniana” costuram-se partes antagônicas, díspares, de um mesmo corpo social comum, tentando fazer com que realidades socioculturais extremamente distintas convivam harmonicamente em um mesmo espaço, convivência esta buscada não pelo ato de ouvir e interagir com o outro, mas pela supressão dos direitos e pela cegueira diante do desafio. Dentro desta perspectiva, individualidade e coletividade se chocam de modo que todos perdem. Cultura “erudita” e cultura “popular”, alto e baixo, o tecnológico e o primitivo, exclusão e inclusão, todos os paradoxos de uma grande metrópole costurados, trazendo aquilo que se pretende esconder, que se finge não ver, ao olhar público (PAULINO, 2010).


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Rosana Paulino, Tecido Social, 2010. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com/)

Rosana Paulino. Tecido social, 2010 (detalhe). (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com/)


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O discurso de Rosana Paulino traz à atualidade as questões implícitas na nossa sociedade. Questões que necessitam ser repensadas e discutidas, pois tratam de reconhecer que a opressão e a discriminação se manifestam hoje de outra maneira, diferente do período colonial, desenvolvem-se dos resquícios do preconceito de nossa historicidade. Dentro deste parâmetro, podemos pensar em uma nova postura diante de uma estrutura social que se mantém imutável. Para Richter (2004, p.143), “ao olhar para as outras culturas também o observador altera e renova sua própria visão do mundo e das coisas”. Vejo que tais abordagens pensadas a partir do reconhecimento da diversidade como manifestação cultural do ser humano, exercitam o olhar reflexivo e crítico, consequentemente aproximando o entendimento e a compreensão de que somos indivíduos complexos e que nos munimos das mais diversas e diferentes intenções frente às interações sociais que estabelecemos.

2.1.2. O corpo: um Signo Social A partir da imagem do corpo na Arte e sua representação, podemos discutir as relações e significações, identificando e refletindo sobre as formas de representações do corpo. Traduzindo uma maneira de compreender e interpretar as diversas manifestações culturais presentes, permitimo-nos o entendimento contemporâneo do lugar do corpo na sociedade (PEREIRA, 2008). Assim aparece no fazer artístico de Vera Chaves Barcellos, em que o sabor da experimentação mantém uma contemporaneidade na observação do mundo à sua volta, o lugar do corpo humano é questionado em diversos trabalhos, seja como suporte para a arte ou como para uma reflexão de questões sociais. Em “Per(so)nas”(1981) a artista apresenta o retrato de pernas e pés femininos. Uma parte pela qual se concebe o todo, similar à outra série “Mulheres de Costas” (1992-93), feito de retratos sem rostos para serem reconhecidos. São obras que incitam à reconstituição do corpo do personagem (e, consequentemente, à reconstituição da imagem). . Aqui, as imagens apresentam-se como “charadas” que nos pedem um exercício contínuo de decifração para que pelo fragmento se recomponha a realidade maior que a tudo costura e envolve. [...] O fragmento revela a visão mais primitiva e inconsciente que temos de nossos próprios corpos e do corpo do outro (CATTANI, s/d).


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Vera Chaves Barcellos, Personas, 1981. (Fonte: http://www.fvcb.com)

Vera Chaves Barcelos, Mulheres de Costas, 1992-93. (Fonte: http://www.fvcb.com)

Este olhar sobre o corpo do outro, apontado nas obras acima, possibilita a compreensão da existência das relações interpessoais da vivência humana em nosso cotidiano. Através de tal olhar sobre a leitura do corpo do “outro” sugere-se uma ação interpretativa dos


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aspectos mais subjetivos que envolvem as relações pessoais que se estabelecem na prática intercultural. O olhar sobre as manifestações do corpo humano e suas linguagens passam a [...] ocupar uma dimensão relevante como agente, instrumento e lugar categórico deste espaço, através de uma relação de (i)mediação com o mundo que lhe é necessário e elementar, que revela não só a pertinência sociológica do tema, como a própria natureza do indivíduo enquanto ser social e cultural, assim como permite desvendar a ligação da linguagem da representação com a corporeidade (PEREIRA, 2008, p. 34).

Ocupando nossa realidade circundante, temos também, a cidade como corpo subjetivo que subjetiva os sujeitos e os coletivos; uma imensa máquina produtora de subjetividade e sentido, “onde se cruzam questões econômicas, sociais, culturais” (FONSECA apud STOCK 2006, p.11). Deste modo, percebemos que toda a realidade circundante de nosso meio nos influencia e nos faz refletir. O processo migratório de índios para a cidade, por exemplo, muitas vezes se dá [...] com sérios problemas de inserção desses grupos em uma nova realidade cultural, de entendimento e aceitação desses grupos pela sociedade branca, marcados historicamente como menores, dentro de uma concepção ideológica que foi sendo construída e hoje está sedimentada no imaginário de uma forma discriminatória e excludente (GOMES, 2006, p.3).

Toda a cultura material dos povos indígenas está carregada de princípios e objetivos, de valores estéticos e sociais, diferentes das concepções do branco. A cultura migratória traz novas linguagens visuais à realidade urbana, que desenvolve um estranhamento ao invés de um entendimento. Percebo que este estranhamento possa ser compreendido como a visão do branco sobre a relação do corpo indígena (como unidade orgânica) deslocado da realidade natural do mesmo, ideia concebida pelas experiências culturais do homem urbano/branco. Senti-me como uma estrangeira em minha própria terra natal, diante da viva ancestralidade de meu povo. Estas foram as primeiras sensações despertadas após um trabalho feito com fotografia para a faculdade. Fez lembrar-me, quando pequena, a passear pelo centro de Porto Alegre de mão com a minha avó. Via aqueles índios e pensava que eles estarem ali era algo muito esquisito, pois aprendia na escola que moravam em ocas, viviam pelados e eram felizes (STOCK, 2003, p.10).

O talento dos artistas indígenas está a serviço da manutenção da tradição do povo, da continuidade de sua identidade. No contemporâneo e urbano cenário porto alegrense é comum a presença de índios do povo Kaingang e Guarani. A venda de artesanatos de suas culturas abastece a nova vida dos índios na urbanidade. Erondina Vergueiro, Kaingang do


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Morro do Osso, zona sul de Porto Alegre descreve o percurso que o artesanato de seu povo tomou até a atualidade: Antigamente o artesanato era feito para uso próprio e não para venda. Era usado para levar comida para a família. Carregar o mel em favo e as frutas. E não pra venda. Hoje não. Na cidade fazemos o artesanato como cultura. E serve para o comércio. Porque, hoje, se quisermos comer carne de peixe, o único que tem [sic], porque caça não tem mais [sic]. Aí temos que comprar. E para isso temos que ter dinheiro (POVOS INDIGENAS..., 2008, p. 4).

Foto de Círio Simon, 2010. (Fonte: http://profciriosimon.blogspot.com/2010/05/arte-em-porto-alegre-02.html)

Penso que abordando tais questões sobre o corpo na sociedade, ou seja, carregado de significados, podemos nos aproximar de conceitos de uma ação inclusiva e compreensiva. Frente a um primeiro contato ao que nos é estranho (aqui o corpo), na maioria dos casos, permeia-se a ação de segregar o “diferente”. Mas, permitindo-se conhecer os signos específicos do que a nós causa estranhamento, aproximamos o entendimento de que o corpo social é muito mais complexo e subjetivo, cabendo o estabelecimento de uma postura que abarque estas novas concepções existenciais, podendo assim acrescentar novas concepções em nossas vivências.


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2.1.3. Produtos e Suportes das Significações Sociais Sendo a cultura produtos e suportes de determinados contextos sociais, penso que através da arte possibilitamos relações e interpretações do nosso próprio meio. Para Halbwachs o indivíduo [...] é integrante de um sistema posto sobre determinadas características ou fatos sociais, espaciais e temporais, e composto por grupos de pessoas que compartilham ou assimilam informações, e com isso constituem memórias. Memória essa que é coletiva e fruto das trocas e negociações que os grupos fazem para constituí-la de forma consciente ou não. A memória coletiva fornece dados para a constituição das memórias individuais, que com isso seriam reflexos, ou visões parciais da primeira. Com isso, a memória esta contida na sociedade que a (re)constrói (e não recorda), não estaria localizada no espírito. A sociedade com seus indivíduos, conforme afirma Halbwachs (2004), produziria memórias que pinçam do passado fatos que de alguma forma se relacionam com o presente [...] (apud CHAVES, 2011, p.5).

Desenvolvida no século XIX no nordeste brasileiro, a Literatura de Cordel por herança dos colonizadores portugueses, permanece presente, ainda, nas manifestações culturais nordestinas dos dias de hoje. Uma herança (re) construída que tanto pela sua parte poética, como pela arte da xilogravura, constitui uma das mais interessantes expressões da arte brasileira.

José Francisco Borges,1976. (Fonte: http://www.unicap.br)


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Por meio da reflexão sobre os processos sociais e de desenvolvimento artístico, assim como de considerações sobre aspectos ideológicos da cultura cordelista, percebemos que o sentido de que essas capas xilográficas tiveram foi papel estrutural na composição do ideal estético sertanejo, o que também contribuiu para a formação da persistente imagem popular do sertão, assimilada e disseminada tanto pelo senso comum como por artistas modernistas. Esse ideal estético, presente na arte de ilustrar o cordel, é que dá forma ao corpo que habita o sertão nordestino. Uma memória coletiva formada e firmada em uma linguagem própria aonde se pode dizer que o imaginário visual da xilogravura presente nas capas dos livretos do cordel foi e continua sendo cunhado pela mente de artistas oriundos da comunidade. Não retrata o sertão e seus filhos com a forma e ideologia aceitáveis na arte européia. A xilogravura do cordel jamais teve ambição realista, muito pelo contrário, é um terreno fértil e assumido de invenção, cunhado em aspectos pessoais que se desenvolvem na própria localidade geográfica (MENEZES, 2010). Algumas expressões visuais, que se revelam através da história e estão presentes na atualidade se remetem a hábitos, costumes, soluções e linguagens que se estabeleceram dentro de um contexto específico. A partir da compreensão destes contextos, nos comprometemos com o reconhecimento de determinadas expressões visuais. Segundo Pillar (2006) aprender a ler o mundo precede a leitura da palavra, pois ao compreendemos o contexto do mundo em que vivemos estabelecemos relações dinâmicas vinculadas à linguagem e a realidade. “O nosso olhar não é ingênuo, ele está comprometido com nosso passado, com nossas experiências, com nossa época e lugar, com nossos referenciais” (PILLAR, 2006, p. 16-17). Penso que a partir deste olhar é que damos sentido e um lugar às coisas, e acredito que leitura do corpo do outro é uma das primeiras visões que desperta o nosso interesse. Em uma linguagem provocativa do corpo, o artista Flávio de Carvalho desenvolve a obra intitulada por ele como “Experiência n° 3”, onde propõe um traje tropical adaptado à realidade e à paisagem brasileira, ganhando as ruas de São Paulo em uma “performance caminhante” vestindo a roupa , pensada para a nossa realidade, para ser parte da paisagem (OLIVEIRA, 2011). Ao lado de senhoras comportadas em plena metade dos anos 50, Carvalho encena sua “Experiência n. 3″, de meia arrastão, saia e chapéu, desfilando sua proposta de traje ideal para o homem tropical (MARTÍ, 2010). A obra de Carvalho é mais importante em função de uma atitude do que em função de seu resultado formal. Acredito que possamos enxergá-la como uma provocação para que pensemos sobre os significados da moda e da roupa como forma de enquadrar os


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sujeitos em determinados tipos de atitudes. Carvalho, em depoimento ao "Estado" na época, explicava sua tese: No New Look para o verão a refrigeração do corpo se dá pelo fluxo em velocidade graduável do volume de ar situado entre o corpo e o tecido. Este fluxo de ar leva consigo o vapor de água do suor para a atmosfera no exterior do traje, impedindo que o suor se deposite sobre o tecido. Para que haja um bom fluxo de ar há necessidade de um bom volume de ar entre o corpo e o tecido. […] A saia não pode ser substituída pelo short porque o short impede a circulação de ar entre as coxas (PACCE, 1998).

Flávio de Carvalho, 1956. (Fonte: http://www.escritoriodearte.com)

Flávio de Carvalho, 1956. (Fonte: http://www.carbonoquatorze.com.br)


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Desde 1944, Carvalho fazia reflexões sobre a "estupidez" do terno-e-gravata para o homem tropical, embora só tenha apresentado sua proposta em 56. "O homem se manifesta na vida pelo seu corpo e pelo traje que o cobre", dizia. Portanto, penso que o corpo como suporte das manifestações sociais nos faz refletir de maneira ampla sobre as significações de sua representação e comportamentos, pois, conforme Meira (2006), a imagem, seja da arte ou da cultura, é um testemunho antropológico que produz formas de comunicação que podem ou não, corresponder a experiências simbólicas, trocas intersemióticas entre sujeitos, construção de sentidos e significados coletivos, mas, para que ela traduza valores humanos, precisa contextualizar-se na vida desses sujeitos, tornar-se mediadora entre seu imaginário e o imaginário social, como algo inserido na sua cultura e na sua vida.


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Capítulo 3 Projeto e Prática de Ensino em Artes Visuais


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3.1. Dados Gerais do Projeto de Ensino Título do Projeto: A Visualidade Cultural Humana e suas relações simbólicas coletivas.

Tema do Projeto: O tema escolhido para o desenvolvimento do projeto educativo parte da visualidade dos corpos dos indivíduos na sociedade e os aspectos culturais presentes na representação simbólica de seus produtos e estéticas.

Justificativa: A importância do desenvolvimento do Projeto de Ensino é que este, através das interpretações promovidas pela Visualidade dos Corpos da Sociedade, busca desenvolver o papel do compromisso com a função social da escola. Ou seja, os educandos, ao construírem seu entendimento sobre cultura, identificam as manifestações das mesmas no seu meio, percebem a construção individual manifestada em sua identidade e, por fim, ampliam suas próprias concepções de Diversidade. A diversidade é representada nas inquietudes de crianças e jovens dentro de contextos sociopolíticos culturais atuais. A inserção social é uma função emergente no que se refere à escolarização na construção destas crianças e jovens. A partir das sociabilidades almejadas pelos estudantes, pode se desenvolver o pensamento crítico em suas relações pessoais e coletivas. O ambiente escolar deve expressar-se como uma ferramenta norteadora para a inserção social no contexto de um mundo marcado pela globalização e o hibridismo cultural contemporâneo. As palavras de Richter explicitam a direções que a arte educação se dá diante á escolha do tema: O ensino intercultural da arte tem como objetivo propiciar uma educação inclusiva no seu sentido mais amplo, respeitando as individualidades pessoais e as características culturais de todos os grupos presentes em sala de aula, e que compõem a nossa sociedade [...] de forma a propiciar uma educação mais justa e um tratamento mais igualitário para todos. (2008, p. 105)


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Objetivo Geral: O objetivo principal do Projeto de Ensino busca desenvolver o pensamento crítico nas relações pessoais, coletivas e a percepção das múltiplas estéticas que fazem parte da memória da construção social. Afirmando também, a partir das ideias de Candau (2008), o compromisso de que a dinâmica escolar deve romper com a tendência homogeneizadora e padronizada que impregna em suas práticas. “A escola sempre teve dificuldade em lidar com a pluralidade e a diferença. Tende a silenciá-las e neutralizá-las. Sente-se mais confortável com a homogeneização e padronização” (CANDAU e MOREIRA apud CANDAU, p. 16). Para isso, o desenvolvimento do tema no ensino da arte, permite utilizar-se dos sentimentos estéticos como uma forma de valorizar as manifestações culturais presentes no cotidiano, despertando valores como um canal de compreensão para a inclusão de todas e todos, contexto salientado por Richter (2004, p. 88): Os educadores devem criar ambientes de aprendizagem que promovam a alfabetização cultural de seus alunos nos diferentes códigos culturais, e conduzam à compreensão genérica dos processos culturais básicos e ao reconhecimento do contexto macrocultural em que a escola e a família estão imersas.

Objetivos Específicos: •

Reconhecer as manifestações simbólicas presentes na visualidade dos corpos humanos.

Discutir sobre as relações sociais de sua própria vivência.

Refletir sobre o seu próprio corpo a partir das questões da identidade cultural.

Compreender os valores simbólicos e estéticos dos produtos culturais.

Entender em quais manifestações visuais apresentam-se as questões culturais e simbólicas.

Entender o processo da representatividade nas relações coletivas, munindo-se das questões históricas.

Compreender a existência da representatividade de signos próprios das culturas sociais.

Refletir sobre a questão do lugar do corpo na sociedade.


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Desenvolver aptidões em técnicas artísticas variadas, como a colagem, a gravura e a colagem.

Experimentar materiais plásticos diversos.

Exercitar e desenvolver a leitura de imagem e a percepção crítica sobre obras artísticas e sobre os próprios trabalhos desenvolvidos.

Trabalhar a distribuição espacial.


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3.2. Prática de Ensino 3.2.1. Primeiro Encontro: Aulas 1 e 2 ( 90 minutos - 2 horas/aula) Data: 24/08/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16h às 17h30 min. Tema/Título: Visualidade Social. Reconhecendo a Arte nas manifestações culturais da sociedade.

Conteúdos: - Manifestações estéticas das diferentes culturas da sociedade brasileira e mundial. - Percepção estética e significações da arte como produto cultural.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Observar, refletir, discutir e questionar as imagens que lhes serão apresentadas. - Participação na dinâmica da “Teia Cultural”.

Objetivos: - Reconhecer a existência de diversos e diferentes tipos de culturas que compõem a sociedade brasileira e mundial. - Refletir sobre os tipos de manifestações estéticas presentes nos produtos culturais das diferentes culturas. - Perceber as significações estéticas e intelectuais da arte como suporte cultural.

Metodologia: - Leitura de imagens - Aula expositiva dialogada. - Prática de construção coletiva e reflexiva de “Teia Cultural” (dinâmica).


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Materiais e recursos a serem utilizados: -Computador e projetor (Data Show). - Barbante

Avaliação: -Verificar se os alunos reconheceram a existência de diversos e diferentes tipos de culturas manifestadas nas sociedades, e perceber que manifestações estéticas e intelectuais os produtos culturais possuem. - A contribuição do aluno na construção da “Teia Cultural”.

Planejado: Primeiramente será discutido com a turma que conhecimentos eles possuem sobre o que caracteriza uma cultura e onde ela se manifesta visualmente. Após, serão expostas imagens de diferentes manifestações culturais da sociedade, cujas características se explicitem em linguagens como: danças, vestimentas, folclore, esportes, alimentos, características físicas, entre outras. Durante a leitura destas imagens, o grupo será instigado a perceber que tipos de manifestações estéticas se mostram nas imagens, e também, será proporcionado ao aluno que ele possa fazer uma reflexão pessoal, entendendo as relações possíveis com sua experiência de vida, conhecimentos e conceitos sociais que as mesmas carregam.


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Mulheres japonesas com vestimentas tĂ­picas. (Fonte: http://www.brasilescola.com/japao/gueixa.htm).

Comida tĂ­pica italiana (macarronada). (Fonte: http://priscilamedeiros.wordpress.com/2010/08/08/espaguete-a-italiana/)


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Imagem de homem gaĂşcho. (Fonte: http://www.consciencia.org/o-gaucho-tipos-e-aspectos-do-brasil).

Jovens Emos. (Fonte: http://emostylelook.blogspot.com/2011/03/pra-inspirar.html)


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Depois de serem observadas as diversas imagens, será feita uma roda em que o primeiro aluno (segurando um barbante) falará para a turma em que cultura ele está inserido (ou que cultura conhece ou que cultura ele tem curiosidade em conhecer). Após, o aluno deverá passar a ponta da outra extremidade do barbante para um colega, que deverá fazer o mesmo, assim, ao fim, terá se construído uma “teia de culturas”. Esta “teia cultural” pode representar a sociedade e os sujeitos sociais que se interligam e constroem a cultura coletiva. Com esta representação da “teia” será trabalhada com os alunos a ideia de que a arte não é somente pintura e escultura, mas principalmente, composições visuais intencionais do ser humano, que podem representar algo como, por exemplo, a “teia cultural” ou representar características estéticas formais e intelectuais. Após a construção da “Teia Cultural”, será solicitado aos alunos que tragam para a aula seguinte algum item (objeto) que represente a cultura na qual cada um está inserido. Este item deverá ser um objeto tridimensional.

Realizado: Este encontro realizou-se na sala de Audiovisual da escola. Esperei os alunos com música experimental indiana. A música recepcionando os alunos em sua chegada foi um aspecto interessante. Alguns comentários que se deram: - Nós vamos meditar sora [sic]? - Nossa, que música diferente! Me dá até medo! Estou sentindo um arrepio. - Ai sora [sic]! A aula hoje vai ser toda aqui? A gente não vai desenhar? - Isso é música indiana né?

O estímulo sonoro na recepção dos alunos foi um aspecto no qual percebi uma “quebra” em suas expectativas em relação às aulas de arte. O estranhamento do aluno de que nesta aula não desenvolveríamos desenho chamou-me a atenção, pois, durante as observações silenciosas, percebi que a atividade mais frequente era desenhar. Os alunos esperavam o mesmo tipo de aula que vinham desenvolvendo. Iniciei minha fala explicando que eles teriam algumas aulas diferentes das que eles estavam habituados, que existiam diversas maneiras de enxergarmos e percebemos a arte, e que eu estaria ali para instigá-los a perceber isto. Logo, perguntei-lhes o que seria Diversidade Cultural. Alguns responderam que seria um conjunto de várias culturas diferentes convivendo entre si e todos concordaram. Logo em seguida, parti para os exemplos de corpos culturais através de imagens no data show. Aqui, penso que antes de iniciarmos a observação


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das imagens, eu deveria ter aclarado o que os alunos entendem por “cultura”, pois assim, eu compreenderia que conhecimentos eles possuíam para relacionar as ideias com os contextos visuais das imagens e fortalecer a compreensão dos alunos com o conceito da arte como produção cultural intencional do ser humano. Infelizmente naquele momento não me dei conta disso. Mas mesmo com esta “falha” inicial, logo na primeira imagem exibida, a que se refere às gueixas, da cultura japonesa, deram-se alguns comentários bastante pertinentes com os conceitos que eu visava aproximar-me: - São estátuas! Elas são engraçadas! - Não são estátuas não! São mulheres, lá do Japão! - Se eu as visse aqui na escola eu iria rir, elas são bem engraçadas! - No país delas elas devem ser consideradas bonitas! Nós que aqui as achamos estranhas!

Achei interessante que os próprios alunos, já na primeira imagem exibida, chegaram à conclusão de que a leitura de mundo depende de conceitos culturais estabelecidos nas sociedades em que os indivíduos estão inseridos. Outra imagem, a macarronada, causou bastante empolgação nos alunos. Todos falavam ao mesmo tempo de que se tratava da cultura italiana, que era uma delícia comer macarrão. Esta mesma empolgação ocorreu na imagem da cultura gaúcha. Ficou claro para mim que os alunos possuíam uma proximidade com as culturas italiana e gaúcha em suas vivências de cotidiano, e que estas imagens causaram uma identificação direta e explicita na leitura visual da turma. Outra imagem, bastante comentada que aproximou todos os alunos, mostrava um casal de jovens “Emos”. Os alunos associaram muitas características que definem uma cultura, tais como: lugares onde se veem estes jovens, músicas, tipos de roupas e cabelos, a ideologia de amor e também a ideia massificada de que “Emo chora”. A observação do modo pejorativo de dizer que “Emo chora” foi um aspecto relevante nas observações dos alunos, pois esta visão foi compreendida por eles, como uma maneira de julgar o modo como jovens Emos enxergam o mundo. As mesmas características de definir meios de expressar uma cultura a partir de música, roupas e lugares foram também bem desenvolvidas ao observarmos a imagem referente à cultura Hip Hop. A leitura de diferentes imagens de culturas foi bastante proveitosa, pois os alunos atingiram o objetivo de reconhecer a existência de diversos tipos de culturas, e que estas se manifestam de maneiras diferentes, em estéticas, signos, expressões e sentimentos próprios. Conforme Pereira (2006, p.44), “confrontamos com a nossa atualidade objetos e manifestações artísticas que são oriundos de processos culturais e por isso adquirem intencionalidades em seus contextos”. Com observações bem definidas e alinhadas com a


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proposta, conseguimos olhar um grande número de figuras. A maioria dos alunos contribuiu bastante com a leitura de imagem. Desta forma, a “contextualização poderá levar nossos educandos a reconhecerem a si mesmos [...] como agentes de sua própria cultura” (PEREIRA, 2006, p.45). O grupo é bastante agitado. Todos querem falar ao mesmo tempo. Pedi muitas vezes que levantassem a mão para falar um de cada vez, o que funcionava por pouco tempo. Notei que três alunos não apresentaram um comportamento muito conveniente na permanência da sala de aula: Lucas, Ketlen e Igor. Os mesmos instigavam os colegas a dar risadas, atrapalhando com frequência o interesse destes em participar da aula. Chamei a atenção dos três algumas vezes e consegui inseri-los na proposta com certa dificuldade. Esta foi uma situação que me causou certo aborrecimento, pois, em alguns momentos, eles aparentavam estar engajados na proposta e em outros, o contrário. O aluno Igor, apesar de atrapalhar algumas vezes os colegas, contribuiu muito na leitura das imagens e fez comentários bem coerentes, situação que me deixou confusa em estabelecer uma visão de educadora. Senti-me dividida questionando-me sobre qual aspecto seria mais relevante para uma avaliação de Igor: seu comportamento com o grupo ou a participação coerente com a proposta. Acredito que Igor acrescentou muitos aspectos positivos para o grupo em sua participação na leitura de imagens, mas senti-me, naquele momento, desacolhida em lidar com a avaliação de seu comportamento. Com tal situação percebo que Para captar o cotidiano educacional, os “ritos”, as regularidades, os comportamentos espontâneos, os hábitos, os considerados comportamentos aceitáveis ou não pelo grupo, devem ser registrados. A preocupação não deve ser de um registro estático, mas sim de perceber o movimento, a direção da vida que nesta experiência particular se manifesta (LÜDKE; MEDIANO, 1992, p.16-17).

Desta forma, acredito que as contribuições de Igor na leitura de imagens, colaboraram com a reflexão proposta para a turma. Tal atitude singular direcionou os pensamentos e reflexões de todo o grupo. Percebo nestas reflexões, caminhos para que as mesmas ampliem o ato de avaliação, situação na qual me permiti perceber vivenciando tal experiência. Após a observação das imagens, propus que os alunos se dispusessem em círculo com suas cadeiras para realizarmos a dinâmica da “Teia Cultural”. Alguns alunos ficaram animados e outros tímidos e preocupados. Três alunos não quiseram entrar na roda, Suelen, Karen e Gilberto. O primeiro aluno a iniciar a dinâmica, ao ser questionado a respeito da cultura à qual pertencia, não soube responder. Disse-me apenas que não sabia. Instiguei-o a


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pensar com calma, e pedi que vinculasse a questão de sua origem familiar se esta fosse relevante. Assim, o aluno, animado, respondeu-me que sua família é de origem italiana, cultura que o aluno afirmou apreciar muito. O mesmo aluno citou macarronada, pizza e imigrantes, como parte de sua cultura. A maioria dos alunos ficou desconcertada em responder sobre qual cultura pertencia e muitas vezes se colocavam na situação de que não pertenciam a cultura nenhuma. Deste modo, instiguei-os a pensar que tipos de músicas, roupas, alimentos, pensamentos de vida eles gostavam. Assim, algumas respostas que se repetiram foram: Funk, Hip Hop, cultura Alemã, Pagode, Samba e comida chinesa. Desta forma, a “Teia Cultural” foi criando-se. Esta atividade manifestou-se de maneira essencial para que os alunos percebessem que A reflexão em torno da noção de cultura é essencial para se encontrar a resposta mais satisfatória à questão das diferenças entre os indivíduos. Se refletirmos sobre as nossas vidas, verificamos que a questão da cultura esta presente em todas as decisões que tomamos, e assim o homem é essencialmente um ser de cultura (FOLGADO, 2009, p.274).

Ao final da dinâmica, perguntei-lhes o que havíamos construído com o barbante. As primeiras respostas foram: “um monte de linhas”, “vários desenhos geométricos”, “uma forma estranha”, “teia de aranha”. Então acrescentei à pergunta se estas linhas significavam algo. Todos responderam: “um monte de culturas”. Perguntei para os alunos, se, caso alguma pessoa entrasse na sala naquele momento e enxergasse nossa composição, entenderia o que era aquilo. Eles responderam que não, pois a pessoa não saberia dos conceitos que usamos para construir a mesma. Então conclui a dinâmica explicando-lhes que as manifestações estéticas da arte muitas vezes dependem de serem compreendidas aprofundando um pouco mais nosso conhecimento a respeito de sua construção, e que a arte ou as culturas são produtos intencionais do ser humano, carregadas de significados e conceitos. Portanto, a atividade contextualizou características específicas em que Perceber a intencionalidade na proposição do objeto artístico é levantar todo um contexto cultural (social, político, econômico, ideológico) que propiciou sua realização; é não só aproximar a arte de nossos educandos, mas levantar possibilidades infinitas de refletir a própria atualidade [...] tal discurso contido na arte é apenas uma parte também deste universo cultural, no qual tanto a obra quanto o ato de realizá-la estão inseridos (PEREIRA, 2006, p. 41-42).

Encerrando a aula, pedi-lhes que trouxessem para o próximo encontro um objeto de alguma cultura. Todos ficaram preocupados, porém dei um exemplo que acalmou a todos.


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Exemplifiquei que, se escolhessem a cultura gaúcha, poderiam trazer para a aula, por exemplo, uma cuia de chimarrão. Acredito que todos os objetivos desta aula foram alcançados. O tempo de desenvolvimento do encontro planejado foi suficiente. E ao término da aula, os alunos ajudaram a organizar a sala, colocando as cadeiras nos lugares.


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3.2.2. Segundo Encontro: Aulas 3 e 4 ( 90 minutos - 2 horas/aula) Data: 31/08/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16h às 17h 30 minutos. Tema/Título: Produtos Culturais. Objetos e linguagens: Cordel, uma impressão Cultural.

Conteúdos: - Percepção estética e intelectual de objetos. - Literatura de Cordel. - Desenho esboçado. - Técnica de xilogravura: matriz, impressão e tiragem.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Refletir sobre os objetos apresentados por eles na sala de aula. - Identificar os aspectos formais, estéticos e simbólicos que um objeto apresenta. - Compreender o processo/técnica da xilogravura e a dimensão cultural que a Literatura de Cordel apresenta na região nordestina brasileira. - Desenvolver trabalho prático imprimindo no mínimo 5 imagens. - Compreender e identificar o tipo de nomenclatura que se usa para identificar a tiragem e as provas nos processos de impressões. - Prática de desenho/esboço. - Confecção de matriz de impressão. - Prática de impressão em Xilogravura “alternativa”.

Objetivos: - Compreender que um objeto pode apresentar aspectos formais, estéticos e intelectuais, significativos para uma cultura. - Entender o processo técnico da xilogravura e os aspectos culturais presentes na região nordestina brasileira apresentada na Literatura de Cordel.


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Metodologia: - Leitura visual. - Desenvolvimento de trabalho prático individual.

Materiais e recursos a serem utilizados: Objetos coletados/pesquisados pelos alunos, reproduções de imagens de xilogravura de Literatura de Cordel, folhas de papel, lápis, bandejas de isopor, instrumentos para “marcar” o isopor, tinta tipográfica, têmperas, rolinho de borracha, rolinho de espuma, bandeja de pintura, corda de varal, prendedores e reproduções de imagens artísticas contemporâneas de técnicas de: xilogravura, litografia e serigrafia.

Avaliação: - Verificar se os alunos compreenderam as relações que um objeto possui, tais como, seus aspectos formais, estéticos e simbólicos significativos para uma cultura. - O comprometimento com o desenvolvimento do trabalho prático.

Planejado: Inicialmente serão verificados os itens/objetos trazidos pelos alunos sobre as suas culturas (já solicitado na aula anterior). Será solicitado aos alunos que se disponham em grupos de 5 alunos, e que cada grupo escolha somente um objeto de sua mesa para que seja apresentado à turma. Após isso, o aluno responsável pelo objeto deverá apresentá-lo à turma falando sobre os aspectos culturais do mesmo e explicando à turma porque o escolheu. O restante dos alunos do grupo deverá apresentar os aspectos formais, estéticos e intelectuais do objeto e explicar o que os fez escolher tal objeto de sua mesa. Após a apresentação dos objetos, serão mostradas aos alunos reproduções de obras em xilogravura de Literatura de Cordel e discutidas suas relações com a herança portuguesa do povo nordestino brasileiro. A partir do conhecimento da técnica de xilogravura, cada aluno deverá fazer um desenho/esboço do item cultural que possui relacionando-o com a palavra “Corpo” e em seguida o desenho deverá ser feito em uma matriz de isopor utilizandose instrumentos que “marquem” o isopor, para que o mesmo se torne uma matriz. A partir das matrizes em isopor, os alunos deverão imprimir no mínimo cinco imagens da mesma. Também serão explicadas, as nomenclaturas das tiragens tais como: P.A.


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(prova de artista) e números de cópias. Para isto, imagens contemporâneas desta técnica serão usadas como exemplos. Ao término das impressões, as imagens produzidas pelos alunos serão dispostas em um grande varal (para sua secagem) possibilitando sua exposição para a turma. A partir da exposição dos trabalhos no varal, os alunos serão estimulados a refletir sobre os trabalhos desenvolvidos.

Realizado: Os alunos chegaram à sala de Artes agitados, carregando os objetos solicitados na aula anterior. Quinze alunos estavam presentes nesta aula. Todos queriam me mostrar seus objetos. Pedi-lhes calma e solicitei que se organizassem em grupos de 5 alunos cada. Três alunas já agrupadas em uma mesa (Ketlen, Julie e Carolina) me informaram que não gostariam de formar o grupo, pois gostariam de trabalharem juntas, somente elas, sem agregarem outros colegas. Ao mesmo tempo, na mesa ao lado, duas alunas (Suelen e Vanessa), aparentemente mais tímidas, não sabiam com quais alunos se agruparem, e assim que suas colegas Ketlen, Julie e Carolina falaram que não queriam agregar outros a seu grupo, elas me informaram a mesma vontade. Assim, tive que aceitar a nova distribuição dos grupos, pois acredito que as alunas não se sentiriam à vontade se fosse de outra maneira. Desta forma, a turma dividiu-se em 4 grupos no total. Após os alunos disporem-se em grupos, verifiquei que alguns alunos não estavam com o objeto solicitado. Deste modo, pedi que estes se apresentassem a mim para anotar seus nomes. Anotei os nomes e avisei-os que eu emprestaria alguns objetos para eles nesta aula. Oferecia os objetos a estes alunos e conforme eles se identificavam com o mesmo, o aluno já se apropriava deste. Tive que emprestar cinco objetos para os alunos Vitor, Suelen, Gilberto, Vanessa e Cristian. Os objetos escolhidos foram: flauta peruana, cesto Kaingang, uma escultura de quati feito por indígenas Guarani, uma saia árabe de dança do ventre e um tambor indígena. Dentre os objetos coletados pelos alunos foram-me apresentados: bomba e garrafa térmica para o preparo de chimarrão, um chocalho indígena, uma boina de gaúcho, cinto de gaúcho, óculos colorido, uma joia para piercing, chapéu de Cowboy, boné Hip Hop e um xale espanhol. Pedi-lhes então que estabelecessem um diálogo entre os integrantes do grupo para definirem um objeto para representá-los. Assim, o primeiro grupo escolheu a saia árabe e a representante do grupo foi Eduarda. Pedi que a aluna apresentasse ao grande grupo o objeto e


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lhes dissesse em que cultura o mesmo estava inserido. Eduarda explicou a todos que aquela saia era usada na cultura árabe mais especificamente para dançar. A aluna acrescentou que a música árabe não era um tipo de canção que nossa sociedade brasileira “estava acostumada a apreciar” e que a saia e a música específica seriam próprias para um tipo de dança chamada: Dança do Ventre. Eduarda vestiu a saia e “dançou” um pouco, o grupo simpatizou com a atitude de Eduarda. Perguntei ao grupo de Eduarda por que decidiram pela escolha da saia. O grupo respondeu-me que primeiramente que o critério escolhido foi a beleza, seguida do afastamento que o objeto representava diante aos seus cotidianos. Com as observações da aluna Eduarda, expliquei à turma que iríamos analisar os objetos de duas formas, considerando as características simbólicas e formalistas. Desta maneira, desenhei no quadro negro duas colunas: “Características Simbólicas” e “Características Formais”. Perguntei-lhes em qual coluna deveríamos escrever as explicações de Eduarda. Todos responderam que seria na coluna das Características Simbólicas. Assim nas “Características Simbólicas” escrevemos as palavras: Arábia, dança do ventre e música. E nas Características Formais escrevemos: leveza, cores, brilho e movimento. O segundo grupo escolheu a garrafa térmica para apresentar à turma. O representante do grupo foi o aluno Gilberto. O aluno explicou à turma que a garrafa era usada na cultura Gaúcha para armazenar água quente para o preparo da bebida típica, o chimarrão. Na coluna das “Características Simbólicas” escrevemos: Gaúcho, bebida típica, utilitário e tradição. Já na coluna das “Características Formais” escrevemos: volume, cilíndrico e cor neutra. O terceiro grupo a apresentar escolheu os óculos coloridos. A aluna Nicole explicou a turma que o objeto escolhido representava a banda Restart, acrescentou ainda que a música influencia os jovens, desenvolvendo maneiras de identificação e expressão através de roupas e acessórios. Na coluna das “Características Simbólicas” escrevemos as palavras: música, comportamento, juventude, adorno e expressão. E na coluna das “Características Formais” escrevemos: cores, formas geométricas e estampa. O último grupo a apresentar seu objeto cultural foi representado pela aluna Carolina, que apresentou a turma um boné. Carolina explicou a todos que o boné representava a cultura Hip Hop, cuja origem deu-se nos bairros suburbanos de Nova York. Na coluna das “Características Simbólicas” escrevemos: Hip Hop, vestimenta, subúrbio, jovens, Rap e B.Boy. Já na coluna das “Características Formais” escrevemos: Tecido, circular, cor, bordado e estampa.


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As explanações feitas pelos alunos se mostraram estreitamente ligadas com os objetivos iniciais deste encontro. Verifiquei que de maneira exitosa a turma desenvolveu a leitura destes objetos, compreendendo que objetos de usos do cotidiano também estabelecem discursos de significados próprios. E ainda, que estes objetos vão além de suas características usuais e simbólicas, eles são carregados de formas estéticas, que permeiam nossa leitura de mundo, agregando cores, equilíbrio e formas variadas. Após a explanação das características dos objetos, convidei todos a observarem as imagens dispostas na parede da sala. Antes de a aula iniciar, dispus na parede da sala diversas imagens relacionadas às capas de livretos de literatura de Cordel. Muitos alunos se aproximaram para observar, e outros não demonstraram interesse. Acredito que a primeira etapa da aula possa ter cansado alguns destes alunos que demonstraram desinteresse. Insisti que seria interessante que todos participassem, pois se tratava de um conteúdo importante para que possibilitasse o desenvolvimento do trabalho prático que viria a seguir. Assim, alguns se aproximaram, mas uns 3 alunos permaneceram sentados em suas mesas.

Disposição das imagens de capas de Cordel na sala de aula. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Detalhe da disposição das imagens de capas de Cordel na sala de aula. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Perguntei aos alunos se eles tinham algum conhecimento em relação a aquelas imagens. Responderam-me que não. Então, expliquei que chamávamos aquelas imagens de capas de livretos de Literatura de Cordel. Um aluno exclamou alegremente: “Ah! Como na novela Cordel Encantado! Tem umas imagens assim que aparecem na abertura!” expliqueilhes que o aluno estava certo, que poderiam relacionar com as características das imagens da abertura da novela Cordel Encantado. Perguntei-lhes se eles conseguiriam identificar qual cultura desenvolvia aquelas imagens. De tal modo, um aluno explicou-me que poderia ser a cultura “lá do nordeste”, já que algumas imagens recriavam a figura de cangaceiros e também que tinha algumas palavras que não eram usadas no sul do Brasil, como “rasgar o bucho do cabra”. Parabenizei o aluno por suas observações e acrescentei que os conteúdos dos livretos tratavam da vida cotidiana do povo nordestino em forma de rimas. Então li para a turma o seguinte poema de Zé Da Luz, cuja linguagem e expressão afirmam características dos escritos dos livretos de Cordel:


76 Ai se sêsse!... Se um dia nós se gostasse; Se um dia nós se queresse; Se nós dos se impariásse, Se juntinho nós dois vivesse! Se juntinho nós dois morasse Se juntinho nós dois drumisse; Se juntinho nós dois morresse! Se pro céu nós assubisse? Mas porém, se acontecesse qui São Pêdo não abrisse as portas do céu e fosse, te dizê quarqué toulíce? E se eu me arriminasse e tu cum eu insistisse, prá qui eu me arrezorvesse e a minha faca puxasse, e o buxo do céu furasse?… Tarvez qui nós dois ficasse tarvez qui nós dois caísse e o céu furado arriasse e as virge tôdas fugisse! (Fonte: http://www.infoescola.com/literatura/literatura-de-cordel/)

Os alunos escutaram com curiosidade a leitura do verso, e comentaram que tinha muitas palavras definidas como próprias da localidade nordestina brasileira. Acrescentaram que achavam estranho o uso daquelas palavras, mas que compreendiam que seria um tipo de gíria da região Nordeste. Em seguida expliquei para a turma que Cordel foi um nome definido há muitos anos atrás, e surgiu pelo modo como eram expostos em pequenos armazéns comerciais, pendurados em um cordão como em um varal de roupas. Acrescentei que as construções das imagens das capas eram feitas a partir de uma matriz confeccionada por uma técnica chamada de xilogravura, tal técnica foi herança dos povos colonizadores do Brasil, os portugueses, mais especificamente, missioneiros portugueses que ensinaram a técnica de xilogravura aos índios brasileiros. Expliquei aos alunos que o uso desta técnica continua em uso na Literatura de Cordel e que também é utilizada por diversos outros artistas de todo o mundo. Após a leitura do poema, somente alguns alunos realmente dispuseram sua atenção na explicação. Chamei a atenção de alguns alunos, porém, não alcancei êxito em que todos permanecessem em silêncio e atentos. Assim, expliquei mais de uma vez a mesma informação para que todos os alunos da turma tivessem o mesmo conhecimento. Durante as


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observações e as duas aulas que ministrei, percebi que o comportamento deste grupo é realmente agitado, e isto me fez pensar que a turma não caminha em conjunto devido ao comportamento individualista da maioria dos alunos que não se importam com o interesse de seus colegas para com a aula, desrespeitando a inteiração dos mesmos frente às atividades. O grupo não “se ajuda”, e não existe preocupação em que todos (entre eles) compreendam o conteúdo. Eles mesmos atrapalham a atenção uns dos outros, e se o colega não ouviu a explicação, ou não entendeu, nenhum deles demonstra interesse em colaborar com o colega. Percebo que esta situação incomoda muitos alunos, eles reclamam entre si, porém a situação não se resolve entre eles. Esta situação foi bem significativa durante as observações silenciosas e, para contornar a situação, a professora titular gritava muitas vezes para fazer com que os alunos mudassem essas atitudes. “O professor agressivo, que grita para colocar ordem em classe, com certeza, após um período de convivência com estes alunos, terá em sua classe pessoas parecidas com ele, falando alto e agredindo a todos, inclusive a ele próprio” (TRICOLI, 2002, p.97). Depois dos esclarecimentos sobre a historicidade da Literatura de Cordel, apresentei algumas matrizes xilográficas à turma. Eles se mostraram bastante curiosos, todos queriam tocar nas matrizes. Expliquei-lhes como se fazia e se usava as mesmas, esclarecendolhes como se construía a imagem, entintava, imprimia, e registrava as “nomenclaturas” nas impressões. Mostrei-lhes também algumas imagens de Oswaldo Goeldi, para os alunos compreenderem a utilização da técnica na Arte, desvinculada da ideia de Literatura de Cordel.

Oswaldo Goeldi, 1950 (Fonte: http://catalogodasartes.net/)


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Após, propus à turma que fizessem um desenho/esboço relacionando o objeto cultural com o corpo. Desta forma os alunos iniciaram seus desenhos. Percebi que eles desenhavam de maneira minuciosa e lenta. Expliquei-lhes que o desenho deveria ser somente um registro de suas ideias, que deveria ser feito de maneira rápida e gestual. Falei para os alunos que este exercício do esboço de suas ideias deveria ser feito no tempo em que eu executasse a chamada. Ao fim da chamada, informei-lhes que o esboço deveria estar pronto, muitos alunos reclamaram e ficaram preocupados que não haviam concluído seu esboço. Disse-lhes, que era assim mesmo, pois o esboço é um registro rápido e simplificado das ideias de uma imagem, pois depois iríamos construí-las com maiores informações visuais. Entreguei a cada aluno uma pequena placa de isopor, e expliquei-lhes que desenvolveriam a ideia esboçada naquele suporte, pois os mesmos tornar-se-iam suas matrizes de impressões. Pedi-lhes atenção na construção das imagens, pois onde eles marcassem o traço, este sairia impresso em negativo. Eles iniciaram a construção de suas matrizes demonstrando muita insegurança. Assim, tive que conversar com cada grupo de alunos, para orientá-los em maneiras de “marcarem” a placa de isopor. Vagarosamente os alunos foram tomando confiança em riscar a matriz. No início da tarefa da construção das matrizes, alguns alunos ficaram preocupados com a questão de “errarem” seus desenhos no suporte, e acalmei-os explicando-lhes que estaríamos avaliando e compreendendo uma nova maneira de produzir uma imagem. E que ainda, a matriz nos possibilitaria diversas impressões de uma mesma figura, que seria mais agradável se eles experienciassem a atividade pensando em quais possibilidades o material lhes proporcionaria sem preocupações com erro ou acerto. Desta forma os alunos se animaram e vagarosamente tomaram confiança em desenhar no suporte. Assim que a primeira aluna concluiu a construção de sua matriz, pedi a atenção de todos os alunos para que eles compreendessem como se dava o processo de impressão. Fiz a primeira impressão, e, ao revelar para a turma o resultado, todos se surpreenderam e mostraram-se animados para imprimirem suas imagens. Desta maneira avisei que cada aluno deveria imprimir cinco cópias de suas imagens. Todos os alunos concluíram a atividade de impressão. Foi uma atividade que se desenvolveu de maneira agradável e curiosa da parte de todos. Alguns alunos tiveram um pouco de dificuldade em dosar a quantidade de tinta na matriz, aparentaram certa impaciência, pedindo-me que imprimisse suas imagens. Expliquei-lhes que deveriam estar atentos para


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achar o ponto certo da quantidade de tinta, e aos poucos senti que os alunos investigavam com maior destreza a a巽達o de imprimir.

Matriz de impress達o da aluna Julie. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Matriz de impress達o do aluno Leonardo. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Impressão da aluna Karen. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Impressão da aluna Suhelen. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Ao término das impressões dos alunos, expliquei a eles, que deveriam registrar a lápis em suas impressões o número de suas tiragens e assinar. Metade dos alunos entregarame os trabalhos com os devidos registros. A outra metade não registrou nada. Acredito que um dos objetivos desta aula foi alcançado com êxito, o objetivo referente à análise dos objetos considerando as características formais e simbólicas e a produção das imagens produzidas, pois todos os alunos inseriram a temática proposta de


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relacionar o objeto cultural com o corpo de modo exitoso. Já o objetivo de promover que os alunos compreendessem o processo técnico da xilogravura e os aspectos culturais presentes na região nordestina brasileira apresentada na Literatura de Cordel, fez com que me sentisse muito insegura com relação que a totalidade dos alunos tenha alcançado tal compreensão. Deste modo, ao fim da aula, pedi que os alunos trouxessem um texto sobre o que foi aprendido sobre a Literatura de Cordel e a Arte para ser entregue na próxima aula. Este texto poderá ser uma ferramenta que me permitirá a verificação dos resultados obtidos neste encontro, já que me senti incerta com relação ao alcance de tal objetivo. Um único aspecto planejado para este encontro que não foi possível realizar refere-se à apreciação das imagens produzidas pelos alunos. Tal aspecto não foi possível realizar devido ao tempo de aula ter findado. A apreciação das imagens produzidas será um item que ocorrerá no próximo encontro. Solicitei que os alunos tragam para a próxima aula materiais diversos que se relacionem a pintura e desenho, afirmei que poderia ser qualquer tipo de material gráfico que tiverem disponíveis em suas casas.


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3.2.3. Terceiro Encontro: Aulas 5 e 6 ( 90 minutos - 2 horas/aula) Data: 14/09/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16 horas ás 17:30 horas. Tema/ Título: Cultura indígena. Sensações e aproximações da Arte

Conteúdos: - Cultura Kaingang e Guarani. - Desenho expressivo/gestual. - Sensibilização.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Desenvolver a sensibilização através do desenho expressivo, motivado pela música Kaingang e Guarani. - Compreender as significações dos objetos indígenas Kaingang e Guarani, e a produção da cultura material dos mesmos. - Refletir sobre a vivência indígena em Porto Alegre.

Objetivos: - Compreender a produção material indígena carregada de significados diferentes do homem branco. - Perceber a vivência indígena nas grandes metrópoles, e discutir a realidade atual destes povos. - Reconhecer a expressão gráfica motivada pelo estímulo da imaginação através de música Kaingang e Guarani.


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Metodologia: - Aula expositiva dialogada. -Sensibilização para prática de desenho através de música.

Materiais e recursos a serem utilizados: Folhas A2, tinta guache, pincéis, lápis de cor, hidrocores, lápis 6B e 2B, grafite, cds de músicas Kaingang (Kanhgág ag vi ymã mág ki) e Guarani (Tekoa Kõenju) e aparelho de som.

Avaliação: - Verificar se os alunos compreenderam os diversos significados que a produção material indígena Kaingang possui e as diferentes maneiras de construí-la, assim como, a vivência dos povos indígenas nas grandes metrópoles. - Desenvolver o trabalho prático de maneira expressiva, imaginativa ou gestual. - A experimentação no processo construtivo da imagem plástica.

Planejado: A aula irá iniciar a partir da discussão das imagens produzidas pelos alunos na aula anterior. Algumas imagens de artesanato e vivência indígenas, Kaingang e Guarani, na cidade de Porto Alegre serão expostas aos alunos. A partir da exposição das mesmas será fomentado que os alunos expliquem que conhecimentos e opiniões possuem sobre o assunto. Após, algumas explicações serão dadas sobre os significados dos artesanatos e modos de fazêlos na cultura Kaingang e Guarani.


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Indigenas Kaingang. Kimiye Tommasino, 2000. (Fonte: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/293)

Indígenas Guarani na feira de artesanato Brique da Redenção. (Fonte: http://gasometro.wordpress.com/2010/05/31/indios-no-brique/)


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Indígenas Kaingang na feira de artesanato Brique da Redenção. (Fonte: http://profciriosimon.blogspot.com/2010_05_01_archive.html)

Cestaria Guarani. Fernando Stankuns, 2008. (Fonte: http://www.flickr.com/photos/stankuns/)


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Escultura Guarani. Fernando Stankus, 2008. (Fonte: http://www.flickr.com/photos/stankuns/)

Artesanato Kaingang. (Fonte: http://ilaine-minhacasa.blogspot.com/2010/09)

A partir de canções indígenas Kaingang contidas no cd Kanhgág ag vi ymã mágk, e canções Guarani contidas no cd Tekoa Kõenju, executadas a partir dos mesmos tocados em um aparelho de som, os alunos deverão desenvolver um desenho em folha A2 executando o gesto de maneira expressiva. A sensibilização através da música será o instrumento principal


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para que os alunos liberem a expressão individual e a imaginação diante às sensações que a música proporcionará. A sensibilização através da música se dará instigando os alunos a perceberem a possibilidade de desenvolverem gestos ritmados, permitindo que a linguagem do próprio corpo em movimento influencie na construção da imagem. A música também será utilizada como um agente estimulante para a interferência da imaginação, para que assim os alunos possibilitem um desenho fluido carregado de informações gráficas, gestuais e expressivas. Diversos materiais gráficos serão oferecidos aos alunos para ampliar as possibilidades para experimentação durante o desenvolvimento do trabalho.

Realizado: Os alunos chegaram à sala já me entregando os textos de pesquisa solicitados na aula anterior sobre Literatura de Cordel, pedi-lhes então, que agrupassem todos os textos a serem entregues sobre a mesa do professor, e disse-lhes que no próximo encontro eu os devolveria todos avaliados. Iniciei a aula entregando aos alunos as impressões e matrizes de xilogravura “alternativa” confeccionadas por eles na aula anterior. Solicitei que todos verificassem o registro de tiragem e assinatura, pois na aula anterior foram-me entregues muitos trabalhos sem estes registros. Pedi-lhes que após todos os trabalhos estarem com os devidos registros, cada aluno deveria escolher a impressão que julgava estar com melhor qualidade e que expusessem no cordão de “varal”. Com todos os trabalhos expostos no varal, pedi que os alunos se aproximassem do varal para observarmos as imagens que ali se encontravam. Os alunos estavam agitados e conversando entre si. Com muita dificuldade, poucos alunos aproximaram-se, pedi muitas vezes para que todos acompanhassem os colegas, assim, sentei-me próxima ao varal e aguardei em silêncio, sem insistir, a reação dos alunos. Aos poucos todos se aproximaram de mim, sentando nos bancos em forma de círculo. Com todos os alunos dispostos no círculo e em silêncio, iniciei minha fala. Havia dois alunos presentes nesta aula que não participaram de nenhuma das aulas anteriores, Dienifer e Pedro. Pedi então para os demais alunos que manifestassem na roda os aspectos que abordamos na aula anterior sobre Literatura de Cordel. Perguntei-lhes primeiramente onde a Literatura de Cordel desenvolvia-se no Brasil e qual sua historicidade. Os alunos aparentavam dúvida e nenhum deles respondia. Incentivei-os dizendo-lhes que já


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havíamos conversado sobre este assunto e inclusive eles já haviam me entregado o texto sobre este assunto. Assim, um aluno respondeu-me que era no nordeste brasileiro que encontrávamos Literatura de Cordel. Outro aluno disse-me que se tratava de uma herança do povo português. Corrigi o aluno dizendo-lhe que os portugueses deixaram a herança da técnica da xilogravura, que era um dos modos mais usados na construção das imagens de Cordel, pedi-lhes que relembrassem o modo como construímos as imagens na aula anterior, e como era feita a xilogravura. Os alunos responderam que a matriz era feita de madeira, mas que na sala de aula usamos isopor como modo de nos aproximarmos da técnica. Perguntei para este aluno em que período histórico os portugueses manifestaram esta técnica e quem foram os precursores brasileiros. Eles responderam-me que os indígenas foram os primeiros a experimentar a técnica, e que, o período histórico seria a “Era Medieval”. Olhei para todos e questionei-lhes se todas estas informações estariam corretas. Eles responderam que sim, e eu apontei com a cabeça um sinal de não. Eles surpreenderam-se, então lhes perguntei se Medieval seria o período correto. Eles demonstravam cada vez mais dúvidas, assim, questionei-os sobre como chamávamos o período em que os portugueses vieram para o Brasil e o que eles vieram fazer aqui. Os alunos vagarosamente compreendiam de qual período estávamos falando, lembraram que tinha escravos africanos e indígenas catequizados. Assim expliquei-lhes que chamávamos de período Colonial. Todos sorriram aliviados ao perceber que tinham este conhecimento, porém não se lembravam do nome no momento. Uma aluna perguntou-me se eu seria realmente uma professora de Artes, pois parecia mais uma professora de História. Surpreendeu-me o comentário da aluna, e aproveitei para explicar para a turma que a partir da Arte podemos compreender diversos momentos, comportamentos, políticas, conceitos sociais de determinada época. Fiquei bem satisfeita com relação aos alunos compreenderem que através da Arte podemos estabelecer relações com a História. O foco do conhecimento manifestando pelos alunos com relação à historicidade da Literatura de Cordel foi mais parcial que o esperado por mim. Questionando minhas expectativas, percebo agora que o fato dos alunos terem alcançado uma compreensão mais ampla sobre a possibilidade de relacionar Arte e História foi extremamente considerável dentro dos conhecimentos adquiridos pelos alunos em nossos encontros. Buoro (2002) ressalta a importância do conhecimento sobre a história da arte no exercício constante da leitura da imagem. A autora faz uma análise dos livros de história da arte escritos por Gombrich, Argan e Read, a fim de destacar a condição da arte como linguagem e produtora de conhecimento. Pois


89 [...] uma obra de arte pode servir de tópico gerador para realizar estudos que visem a desenvolver elevados níveis de reflexão e compreensão sobre arte, história, antropologia e sobre a vida individual e social dos educandos (FRANZ, 2003, p.142).

Indiquei para os alunos a visualização dos trabalhos desenvolvidos e pergunteilhes sobre o modo como estavam expostos. Eles completaram que as impressões estavam presas com prendedores em um cordão, e desta forma, eu lhes disse que este era modo como se dava a exposição dos livretos de Cordel, pendurados em um cordão, por isso o nome Literatura de Cordel. Os alunos mostraram-se pouco interessados nas imagens produzidas, então diante a tal situação, resolvi partir para os conteúdos específicos que foram planejados para esta aula. Convidei a todos para observarmos as reproduções fotográficas de imagens do artesanato e vivência indígenas que estavam expostas no quadro negro. Primeiramente questionei-os sobre que conhecimento eles tinham de tais imagens. E os comentários que se deram foram: - São índios! - É a cultura indígena. - Eu já vi estes índios! Eles ficam na lá no Brique. Essa foto é lá, né? - Sora [sic], tem uns que vivem aqui perto da escola! No Morro do Osso!

A última observação era exatamente o ponto onde eu queria chegar. Tal observação seria um estímulo para que os alunos refletissem sobre a proximidade geográfica que a cultura indígena teria em suas vidas no âmbito escolar. Assim, perguntei a todos se eles já haviam percebido a presença indígena, próximo da escola e na feira de artesanato Brique da Redenção, que outra informação além de que eram índios eles teriam? Os alunos olhavam uns para os outros sem saber responder. Expliquei-lhes então que eu havia selecionado duas etnias indígenas diferentes, e que cada grupo de imagens organizadas de cada lado do quadro negro (esquerdo e direito) correspondia a uma delas. Explique-lhes que a imagem de indígenas no Brique correspondia aos Guarani, e que as imagens referentes ao outro lado do quadro seriam correspondentes aos indígenas Kaingang. Falei-lhes que os indígenas que habitavam o Morro do Osso (local próximo a escola) eram representantes Kaingang e que estes também eventualmente participam da feira de artesanato do Brique da Redenção. Pedi-lhes então para observarem que diferenças os artesanatos de cada etnia indígena apresentavam entre si. A primeira observação de todos foi em relação à cor. Explicaram-me que o artesanato Guarani possuía cores vibrantes e que as achavam muito bonitas, diferentes do artesanato Kaingang que não tinha nenhum tipo de pigmento em seus feitos. Perguntei-lhes sobre os materiais que os indígenas utilizavam para a confecção dos artesanatos e se isso influenciava na cor. Eles


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falaram que se tratava de materiais diferentes, mas não sabiam dizer quais seriam. Um aluno “arriscou” dizer “taquara” referindo-se ao material usado na cestaria Guarani. Falei-lhes que a resposta do aluno estaria correta, contudo, questionei-o sobre a naturalidade da cor da taquara. O aluno então me disse que a taquara “só poderia estar pintada, pois a taquara não era tão colorida assim!”. Confirmei a resposta do aluno, e questionei-os então sobre o material da cestaria Kaingang e para isso apresentei à turma tal objeto. Pedi aos alunos que além de observarem a imagem reproduzida, também observassem a cesta e que a tocassem para investigar melhor o objeto. Os alunos então falaram que o material referente seria: madeira, galhos, gravetos ou mato. Disse-lhes que estavam corretos, mas a especificidade do material seria importante para compreendermos uma ação muito positiva que os Kaingang realizavam no Morro do Osso. Esperei que eles manifestassem outras ideias, porém nenhum aluno soube dizer que material seria, então finalizei dizendo-lhes que o material era cipó. Os alunos sorriram e questionavam a si mesmos sem compreender como puderam esquecer tal elemento da natureza. Falei-lhes então, que a ação dos indígenas Kaingang em colher tal elemento natural para a produção de seus artesanatos, era executado usando técnicas milenares de retirada dos cipós de um jeito sustentável, pois tal maneira colaborava com a flora, de tal modo que a coleta do cipó pelos Kaigang (do Morro do Osso, por exemplo), impedia que o crescimento do mesmo sufocasse as árvores, uma ação necessária para a preservação do ecossistema. Portanto a presença indígena na mata se dava de maneira até mesmo colaborativa com a natureza. Falei para os alunos também sobre as conexões dos indígenas Kaingang com a natureza, o meio ambiente e seus artesanatos. Expliquei-lhes que no cotidiano Kaingang as crianças acompanhavam os adultos na coleta dos elementos naturais pela mata, e que durante este percurso, cada vez que um indígena avistava uma teia de aranha pedia que as crianças da tribo tocassem nesta, para que conforme suas crenças, a aranha transmitisse o poder de tecer e trançar, e que este “dom” era utilizado na execução do artesanato, principalmente nas cestarias. Os alunos assustaram-se com a ação de tocar a teia de aranha e perguntaram-me: - Mas isso não é perigoso sora [sic]? - Mas a teia não é venenosa? Como que as crianças podem tocar nelas? - E se a aranha morder?

Expliquei-lhes então que os indígenas viviam em harmonia com a natureza e que conheciam bem as relações possíveis com animais e insetos, podendo então medir com segurança suas ações perante a fauna da região em que habitam. Falei-lhes também que as


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teias que as aranhas constroem não são venenosas, mas que elas (as aranhas) podem ser. Aproveitei o interesse dos alunos perante a vivência indígena com animais e insetos na mata, e questionei-os sobre as esculturas de animais que os indígenas Guarani produziam. Os alunos falaram-me que achavam bonitas e que elas pareciam com pequenos brinquedos. Falei-lhes que na cultura Guarani a representação de animais no artesanato representava um conceito muito profundo com relações as crenças de seu povo, pois para estes indígenas todo o animal seria a encarnação de algum antepassado seu. Deste modo, eles expressam gratidão e amor por todos os seres da fauna. Os alunos acharam engraçado o modo dos indígenas crerem na encarnação de seus antepassados nos corpos de animais, riram achando divertida a ideia de pensar em seus parentes como animais. Pedi que todos os alunos observassem as imagens do artesanato indígena percebendo as texturas, cores e formas. Avisei a todos que a partir daquele momento iríamos executar a tarefa plástica planejada para esta aula. Os alunos ficaram animados já me perguntando como se daria a tarefa. Solicitei que cada aluno pegasse uma folha que estava sobre a mesa do professor. A primeira aluna, ao deparar-se com as folhas de papel tamanho A2 perguntou-me: - É uma folha por grupo? Essa folha é gigante! Não é uma para cada aluno, né?

Respondi-lhe afirmando que cada aluno apropriar-se-ia de uma folha daquelas. A aluna ficou bastante surpresa e o restante dos alunos também, deste modo, todos eles foram rapidamente apanhar suas folhas. Os alunos normalmente trabalham em grupos dispostos em grandes mesas, utilizam normalmente somente a metade destas deixando as outras vagas. Nesta aula, notei que os alunos, ao se juntarem com seus grupos (como de costume), acompanhados de suas folhas “gigantes” e não conseguiam posicionar todos os membros do grupo nas mesas, devido ao tamanho das folhas excederem a “normalidade”. Os grupos queriam permanecer unidos, porém, o tamanho do papel não permitia que os alunos permanecessem posicionados nos mesmos lugares. De tal modo, atrapalhados, os alunos empurravam as folhas umas das outras, tentando fazer com que elas se “encaixassem” nas mesas, situação confesso bastante cômica, pois estes aparentavam tamanha animação em trabalhar com as folhas “gigantes” e ao mesmo tempo não conseguiam nem mesmo posicioná-las na mesa! Assim, intercedi dizendo-lhes ironicamente:


92 - Mas que confusão é essa acontecendo com as folhas? Tantas mesas vagas na sala e vocês aí tentando “encaixar” as folhas na mesa! Será que daria para alguns alunos ocuparem as outras mesas que estão vagas?

Rindo de si mesmos, os alunos rapidamente organizaram-se por todas as mesas da sala. Pela primeira vez observei-os utilizando-se de todas as mesas dispostas na sala. Eles se posicionaram em frente às folhas ansiosos pela tarefa que estava por vir, então expliquei como se daria a ação plástica sobre o papel. Falei-lhes que a conversa que tivemos anteriormente sobre as culturas indígenas Kaingang e Guarani seria a proposta norteadora da atividade conjuntamente com estímulos sonoros das músicas destas (executadas através de um cd no aparelho de som). Alguns alunos demonstraram desgosto com relação às músicas indígenas. Esclareci-lhes então, afirmando-lhes que este estímulo possibilitaria a experimentação de um processo diferenciado das atividades plásticas que eles vinham desenvolvendo até aquele momento. Aclarei-lhes que através da música eles poderiam permitir a imaginação ir além do figurativo, que eles poderiam desenhar o ritmo, sentimento, texturas e formas, da maneira que achassem mais convenientes. Falei-lhes que o meu maior objetivo seria vê-los se permitindo expressar seus gestos, soltando a mão e a imaginação. Assim sendo, partimos para a execução da atividade. Pedi-lhes que expusessem nas mesas todos os materiais gráficos que eles dispunham e conjuntamente também expus na mesa do professor alguns materiais que eles também poderiam utilizar se desejassem. Os materiais que ofereci eram tintas guache coloridas, pincéis, lápis de cor, grafites e hidrocores. Deste modo iniciei a música no aparelho de som e informei-lhes que poderiam iniciar a tarefa. Informei-lhes que primeiramente poderiam ouvir a música para que esta interferisse em seus sentidos para que assim facilitasse a fluidez de suas imaginações. Todos se posicionaram diante as folhas e aflitos falavam-me: - Sora [sic], eu não sei o que fazer! - Ai sora [sic], e agora? Não sei como começar!

Estimulei-os a permitirem que a imaginação tomasse parte do gesto para iniciar o trabalho, que poderiam apropriar-se do ritmo sonoro e executá-los através de linhas ou gestos que achassem pertinentes. A aluna Nataniele falou-me: - Ah, mas se for desta maneira vou fazer um monte de “riscalhada” no papel!

Respondi-lhe que se esta “riscalhada” fosse expressar seu sentimento, então devia permitir-se executar tal ação. Pois,


93 [...] através da experimentação dos sentimentos e das emoções, a arte auxilia no encontro da identidade pessoal no mundo em que se vive. Durante este processo, o indivíduo não apenas entra em contato com o mundo sensorial, mas simultaneamente desenvolve e educa seus sentimentos através da prática dos símbolos artísticos (LARCERDA, 2009, s/ pg).

Logo percebi que a aluna Suhelen não estava sentada como todos os outros, ela estava em pé acariciando o papel, investigando tal espaço. Chamei a atenção de todos para perceberem a maneira como Suhelen estava posicionada. Sugeri-lhes então que se posicionassem de pé, para melhor visualização da superfície e para permitirem-se “soltar” o gesto no suporte. Muitos alunos seguiram a sugestão e iniciaram o trabalho. A maioria dos alunos principiou a atividade realizando desenhos figurativos exaltando a imagem do índio ou de animais. Eles iniciavam o desenho muito pequeno com relação à proporção do tamanho da folha. Os alunos desenhavam a lápis e “apagavam” utilizando a borracha a todo o momento. Deste modo disse-lhes que escolhi trabalhar junto com eles um tamanho de folha diferenciado para que eles tivessem a possibilidade de explorar com mais liberdade seus gestos, falei-lhes que não queria vê-los “domesticando” suas mãos, usando a borracha a todo o momento e exaltando que seus desenhos estavam “errados”. Lembrei-lhes que poderiam usar outros materiais, como tinta e hidrocores. Ao professor cabe o papel de estimular a criança em seu processo criativo, nunca induzindo ou manipulando; a expressão tem que ser livre; a atitude é criação e liberdade, não de dependência. Quando uma criança se diz incapaz de executar um desenho é bem possível que ela tenha sido tolhida em sua criatividade (NUNES; QUEIROZ, 2003, p.83-84).

Sem dar-me conta, percebi que algumas meninas da turma dançavam ao som da música e riscavam o papel em gestos ritmados com a sonoridade indígena. Percebi que as alunas Nataniele, Nicole e Eduarda divertiam-se rabiscando todo o papel, rindo umas das outras. Aproximei-me delas para verificar o andamento do trabalho, elas disseram-me que estavam se divertindo muito, e ao mesmo tempo preocupadas, perguntando-me se estaria certo. Falei-lhes que nesta aula eu não estava avaliando certo ou errado, mas sim a percepção do modo como eles expressam-se, permitindo-lhes também, a experimentação, pois um trabalho de artes é antes um processo no qual se necessita partir do conhecimento dos materiais e de seus próprios gestos. Completei ainda dizendo-lhes que me satisfazia saber que elas estavam divertindo-se, pois a arte também é diversão e prazer. Estas alunas iniciaram o trabalho somente com linhas de grafite, após elas partiram para a experimentação das tintas guaches.


94 [...] se começamos a julgar tudo o que fazemos, não teremos espaço para a experimentação. A prática oscila entre dois pólos. Por um lado, estamos “apenas brincando”, de forma que estamos livres para experimentar e explorar sem medo de um julgamento prematuro. Ao mesmo tempo, estamos completamente comprometidos (NACHMANOVITCH, 1990, p.73-74).

Trabalho da aluna Nicole. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

A aluna Nicole, ao concluir seu trabalho, manifestou-se um pouco frustrada. Ela explicou-me que ao final da realização do trabalho derramou muita tinta no papel, e tal situação desfigurou totalmente a imagem que ela gostaria de ter finalizado. Assim, reafirmei à aluna que a arte é um processo e seu trabalho confirmaria o registro deste.


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Trabalho da aluna Eduarda. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Já na imagem produzida pela aluna Eduarda, preservou-se o registro inicial das linhas de grafite devido à transparência da tinta, permitindo assim observação dos gestos iniciais da aluna. A mesma exaltou com tinta guache algumas linhas curvas desenvolvendo formas orgânicas no centro da composição. A imagem de Eduarda apresentou abastança de linhas gestuais enriquecendo de certa forma o arranjo. Percebi somente após a aula, que Eduarda acresceu estereótipos de corações na composição, situação bem ocorrente nas aulas que observei ministradas pela professora titular. Outros alunos também desenvolveram trabalhos valorizando a ação gestual, e também me manifestaram satisfação em executá-los. A aluna Suhelen contou-me que a sua imagem aparentava apenas ser uma “riscalhada”, porém informou-me que a todo o momento ela permitia-se que seus sentimentos aflorassem em seus gestos, pois focou o pensamento em seu pai, pois este seria de etnia indígena, mas ela não tinha nenhuma informação sobre ele, já que ele e sua mãe seriam divorciados e ninguém de sua família teria a informação de seu paradeiro. Suhelen exaltou-me que sempre teve curiosidade sobre suas origens, mas quando insiste para obter informações com sua família, não é correspondida. Portanto, a aluna explicou-me que sua imagem representava diretamente os estímulos sentimentais das origens que ela desconhece, mas que espera que um dia possa conhecer. Gostei muito da confiança da


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aluna em relatar-me tal situação e senti também, a importância que a aproximação do tema desta aula possa ter manifestado na experiência de vida da relação familiar desta aluna.

Trabalho da aluna Suhelen. (Fonte: SCHMIDT, 2011) Freedman sugere que a escola deva deixar de ser formalista para ser construtora de significados, e dar importância ao contexto social para definir a identidade cultural de cada aluno. Assim, o propósito da educação artística é [...] ampliar o significado dos artefatos e a sua importância na existência (MIR in BARBOSA; COUTINHO (Orgs) 2009, p.93).

Muitos outros alunos desenvolveram trabalhos com cunho figurativo, como por exemplo, a imagem produzida pelo aluno Fábio. Este argumentou que se serviu do imaginário para registrar uma visão sobre que tipos de indígenas ele imaginava que se expressavam as canções executadas na aula.


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Trabalho do aluno Fรกbio. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Detalhe do trabalho do aluno Fรกbio. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Trabalho da aluna Carolina. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Já a imagem produzida pela aluna Carolina representa um cesto utilitário indígena. A aluna desenvolveu as linhas da figura de modo bastante gestual. Carolina iniciou seu trabalho muitas vezes, percebi que ela fez muitas tentativas de desenhar imagens de animais, e logo após um pequeno esboço, dizia que estava “feio” apagava com a borracha e iniciava novamente. A aluna iniciou diversas imagens e apagou-as muitas vezes. Durante o processo do trabalho de Carolina, falei-lhe em tom de brincadeira que eu iria esconder sua borracha para que ela não fosse tão exigente consigo mesma. Em idas e vindas observando a aluna, sugeri-lhe em uma destas que ela utilizasse tinta guache. Carolina em resposta faloume: - Não professora! Se eu usar tinta não terá como apagar! E se eu errar, não terá como arrumar!

Respondi-lhe que achava que ela deveria usar a tinta justamente para avançar em seu processo, pois eu tinha certeza de que ela arrumaria meios de resolver a construção de sua imagem. Neste primeiro momento Carolina negou o uso de tinta, porém mais tarde, a aluna iniciou a experimentação da tinta (sem nem eu mesma perceber) e rapidamente concluiu


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satisfeita sua composição. O trabalho final da aluna apresentou grande riqueza gráfica, pois seus gestos desenvolveram-se de maneira bem fluidas com a tinta, diferentemente do que a aluna vinha desenvolvendo inicialmente com o lápis e a borracha. No mesmo grupo da aluna Carolina, a aluna Ketlen “tentou” diversas vezes desenhar animais. Ela pediu-me que lhe explicasse como desenhar um grande felino, como uma onça ou tigre (que ela admirava muito), pois cavalos e pássaros ela não estava “conseguindo desenhar”. Sugeri-lhe então, que ela pensasse nos desenhos que estes animais possuíam em seu próprio corpo, como os indígenas que possuíam pinturas corporais. Ao mesmo tempo em que terminei a frase, Ketlen afirmou-me animada que uma ideia já teria surgido. Com a segurança da aluna, deixei que ela manifestasse a sua nova “ideia”.

Trabalho da aluna Ketlen. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Fiquei bastante surpresa com a composição de Ketlen, a aluna expressou de modo estilizado o desenho da pelagem de um tigre. A aluna estava bastante orgulhosa do resultado final de seu trabalho. A imagem dela foi um resultado prático para resolver seu anseio de manifestar sua admiração pelos grandes felinos. Acredito que a aluna resolveu muito bem sua proposta no desenvolvimento da imagem.


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A aluna Dienifer vinha desenvolvendo uma imagem extremamente estereotipada, composta de pássaros “M”, “sol sorridente”, casinha e índios de “pauzinho”. Dienifer pediu minha atenção e solicitou-me outra folha. Pedi que a aluna explicasse-me por qual motivo ela solicitava outra folha. A aluna respondeu-me que o desenho que vinha desenvolvendo não expressava sentimento nenhum, deste modo, ela gostaria de reiniciar uma nova imagem. O argumento de Dienifer foi bastante pertinente, assim entreguei-lhe nova folha. Após certo tempo, observei que Dienifer estava trabalhando com muitas tintas e gestos soltos, explanando toda a superfície do papel. Perguntei para a aluna como estava se dando o processo de construção da nova imagem. Dienifer respondeu-me: - Agora sim professora! Eu estou amando experimentar essas tintas! Eu nunca tinha desenhado assim! É bem legal, um jeito muito diferente! Gostei! Estou seguindo o ritmo da música!

Trabalho da aluna Dienifer. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Dienifer sobrepôs diversas camadas de tinta fazendo ainda o uso das misturas das cores. Admirei-me com o resultado da imagem da aluna, pois o primeiro trabalho que ela inicialmente desenvolveu estava repleto de estereótipos. Confesso que fiquei muito curiosa para ver o resultado do segundo trabalho dela, pois


101 [...] o estereótipo é uma espécie de simplificação modeladora de imagens, que faz estas exprimirem uma solução segura, certamente identificável [...] que nos protege da alteridade, do desconhecido, do estranho, do diferente. Toda estereotipia é a estratificação de fórmulas representativas, que fixam e cristalizam os objetos de conhecimento em imagens de domínio comum, produzindo referências visuais facilmente comunicáveis. Na medida em que um estereótipo sempre opera com o “já visto”, com o lugar-comum de uma identidade e com designações de domínio universal, tende-se a pensá-lo como reprodução de alguma coisa dada, como repetição do que já veio pronto (GOMES, s/data, p.3-4).

O trabalho final de Dienifer surpreendeu-me muito, pois eu esperava da aluna uma “solução segura” na construção da imagem. Mas não obstante, Dienifer permitiu-se a experimentação de modo bastante perceptual.


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3.2.4. Quarto Encontro: Aulas 7 e 8 ( 90 minutos - 2 horas/aula) Data: 21/09/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16 horas ás 17:30 horas. Tema/ Título: Arte, comunicação e intensão. A Arte: Veículo de percepção e questionamento social.

Conteúdos: - Leitura das imagens produzidas na aula anterior. - Arte como processo e experimentação. - Instalação. - Exposição Bienal de Artes do Mercosul. - A representação do “corpo” na Arte. - Interculturalidade. - Arte Postal. - Fronteiras físicas e culturais.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Observar, refletir, discutir e questionar os trabalhos produzidos pelos alunos na aula anterior e também as imagens que serão apresentas através do Data Show. - Pensar que tipos de “fronteiras” culturais existem no mundo, considerando aproximações e distanciamentos ideológicos. - Refletir sobre materiais para o desenvolvimento do trabalho plástico, e as possibilidades que o suporte oferecido possibilita.

Objetivos: - Reconhecer que o produto artístico depende da experimentação e de um processo. - Conhecer a proposta da exposição de Artes da Bienal do Mercosul e os trabalhos plásticos dos artistas Eugenio Dittborn e Rosana Paulino e Lucílio de Albuquerque.


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- Compreender o conceito de arte postal e instalação. - Desenvolver relações possíveis com as culturas pesquisadas.

Metodologia: - Leitura de imagem. - Discussão sobre relações culturais.

Materiais e recursos a serem utilizados: - Computador e projetor (Data Show). - Reproduções de obras de Rosana Paulino, Lucílio de Albuquerque e Eugenio Dittborn e Franz Marc.

Avaliação: - Participação na leitura das imagens exibidas.

Planejado: A partir da observação dos trabalhos produzidos pelos alunos na aula anterior, será fomentado o assunto sobre como se dá o processo criativo de uma imagem artística. Através da leitura de tais imagens, dar-se-á ênfase para que os alunos analisem as questões formais destas. Será apresentado aos alunos reproduções de pinturas do artista Franz Marc, para que seja fomentada a discussão sobre os aspectos formais das mesmas e suas relações na Arte.


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Franz Marc, Cavalo na Paisagem, 1910. (Fonte: http://blogdoborjao.blogspot.com/2010/09/arte-de-franz-marc-cavalo-na-paisagem.html).

Franz Marc, A Torre dos Cavalos Azuis, 1913. (Fonte: http://thaisribela.blogspot.com/2010/11/franz-marc.html)


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Depois será mostrada aos alunos uma reprodução da obra de Lucílio de Albuquerque, “Mãe Preta”, imagem a partir da qual se desenvolverá uma leitura de imagem. Partindo dos levantamentos ideológicos dos alunos, em relação à reprodução de “Mãe Preta”, serão apresentadas a eles imagens de instalações e gravuras da artista Rosana Paulino, que trabalha com a mesma temática da obra apresentada de Lucílio. A partir do entendimento da obra de Paulino e da compreensão do contexto de instalação, será explicado aos alunos o que é a exposição de arte Bienal do Mercosul, e a participação da artista Rosana Paulino na 4ª Bienal de Artes do Mercosul.

Lucílio de Albuquerque, 1912. (Fonte: http://www.dezenovevinte.net/obras/obras_maraliz.htm)

Rosana Paulino, “Wet nurse”, 2008. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com).


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Detalhe “Wet nurse”, Rosana Paulino, 2008. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com).

Rosana Paulino, sem título, 1998. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com/)

Logo depois das apresentações das ideias acima, reproduções das obras do artista Eugenio Dittborn, artista homenageado na 8° edição da exposição Bienal do Mercosul, serão expostas aos alunos. Eugenio desenvolve em sua obra a arte postal, conceito que será explanado aos alunos. A partir do conhecimento do trabalho do artista, será realizada uma


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discussão sobre conceitos relacionados à cultura, fronteiras, globalização e interferências sociais.

Eugenio Dittborn, 1991. (Fonte: http://www.iniva.org/dare/themes/space/dittborn.html)

Envelopes das Pinturas Aeropostales de Eugênio Dittborn. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Será solicitado aos alunos que pensem em materiais plásticos e elementos para que possam desenvolver um trabalho plástico que se dará na aula seguinte, sobre o suporte de papel Canson A5, focando o tema “Interculturalidade: o corpo como suporte” no desenvolvimento da atividade. Estes materiais deverão ser levados para a próxima aula.

Realizado: Cheguei à escola uma hora antes do horário das aulas que eu daria aos alunos do 5° ano, com a intenção de organizar os trabalhos dos alunos para expô-los na sala de áudio visual e também aparelhar a mesma para a exibição das imagens no Data Show. Porém um imprevisto mudou meus planos. Ao entrar na sala dos professores, encontrei os alunos da turma 50 agitadíssimos falando com a vice-diretora. Rapidamente, esta me avistou e informou que uma das professoras da turma não pode estar presente em tal data, deste modo os alunos estavam com o período vago, e com isto, eles solicitaram-me que adiantasse a aula programada. Respondi para a vice-diretora que faria o possível, pois eu havia planejado minha chegada com antecedência para a organização de todo o material para esta aula, principalmente para a montagem dos aparelhos para o funcionamento do Data Show. Ela me lembrou que entre os dois períodos haveria o intervalo do recreio, um momento propício para a montagem do equipamento. Concordei com ela e dirigi-me com os alunos até a sala de Artes. Chegando à sala, os alunos estavam bastante agitados e perguntavam-me se eu iria dispensá-los da aula mais cedo também. Respondi-lhes que eu realizaria os dois períodos de aula como o planejado, e rapidamente solicitei que todos nós organizássemos a sala para a visualização de todos os trabalhos produzidos por eles na aula anterior. Sugeri à turma que uníssemos três das grandes mesas disponíveis na sala para que todos sentassem juntos em um só grande grupo. Os alunos concordaram e organizamos as mesas juntos. Antes, logo que organizamos as mesas, questionei os alunos sobre os textos de pesquisa sobre Literatura de Cordel que eles haviam me entregue na aula anterior. Pois os lendo, identifiquei somente dois textos que descreviam o tema, e o restante dos textos entregues, tratavam de cópias fidedignas daqueles. Muitos alunos confessaram-me embaraçados e envergonhados, de que não haviam realizado a tarefa, sendo que por esse motivo, pediram emprestados os trabalhos dos colegas para “copiar” a Pesquisa. De tal modo, expliquei a todos, que a intensão da tarefa era avaliar o entendimento que eles haviam


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alcançado sobre a Literatura de Cordel, porém com os textos “copiados” eu estava impossibilitada de realizar a avaliação. Então pedi a opinião deles sobre que atitude eu deveria tomar. Todos compreenderam o “vacilo” da turma, e me disseram que eu deveria exigir-lhes que realizassem novamente a tarefa. Frente ao posicionamento do grupo, de reconhecerem que prejudicaram a avaliação que se daria, informei-lhes que para mim, o mais importante era que eles haviam reconhecido que não foram justos comigo e nem com eles mesmos. Também, disse-lhes que na aula anterior, nós havíamos conversado novamente sobre a Literatura de Cordel e que nesta, eles tinham-me demostrado que sim, eles tinham compreendido as questões que eu objetivava para suas aprendizagens. Portanto perguntei-lhes se eles concordavam que eu desconsiderasse a tarefa da Pesquisa. Redimidos, todos concordaram. Desta forma, desconsideramos os textos de Pesquisa e seguimos para as atividades programadas para este encontro. Coloquei todos os trabalhos realizados na aula anterior (folhas A2) nas mesas, de modo que fosse possível a visualização por todos os alunos. Logo que dispus os trabalhos nas mesas, alguns alunos pegaram estes e viravam-nos com o lado da imagem produzida para baixo. Deste modo, questionei-os sobre tal atitude. Os alunos falaram-me: - Ah professora tá [sic] muito feio o meu desenho! Fico com vergonha de mostrar. Não quero que os outros vejam! - Ficou muito esquisita a minha pintura! - Eu não gostei e não quero mostrar! - Tá horrível, ninguém vai ver!

Espantei-me com tal situação e expliquei-lhes que não avaliaríamos a beleza ou feiura dos trabalhos produzidos. Pedi-lhes então, que relembrassem a proposta da atividade que resultou nestes trabalhos “horrorosos”. Os alunos responderam-me: - Ah, era pra soltar a mão! - E também acompanhar o ritmo da música! - Eu experimentei usar a tinta, mas aí ficou uma “coisa”!

Diante de tais comentários lhes expliquei que estavam corretíssimos diante à proposta da atividade, pois justamente eu queria vê-los desprenderem-se da ação racional “domesticadora” de suas mãos e que empunhassem as percepções de seus próprios gestos. Também lhes expliquei que para o desenvolvimento da expressão artística, devemos perceber que existem diversas ações experimentais, pois necessitamos estabelecer relações com os materiais e a ação gestual. Logo, disse-lhes que o processo de criação de uma imagem pode passar por vários estágios até sua finalização, ou mesmo o próprio ato da criação, está


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implícito em sua construção. Falei-lhes que, como havíamos conversado no segundo encontro sobre as características simbólicas e formais que um objeto pode apresentar, na Arte também analisaríamos tais aspectos. Portanto sugeri que fizéssemos tais observações. Inicialmente pedi-lhes que identificassem quais imagens tinham aspectos figurativos e quais seriam eles. Os alunos sugeriram diversas imagens e apontaram figuras de índios, casas, colares e cestos. Parabenizei a todos confirmando que estavam corretos, pois identificaram figuras representativas. Contudo questionei-os sobre o nível de realismo de tais imagens. Os alunos responderam-me que era uma representação de uma imagem “reconhecível”, porém estas não seriam muito realistas, já que as mesmas mostraram-se com aspectos de tratamento visuais simplificados. Todos concordaram que seriam imagens com temática realista, porém com relação aos aspectos formais não.

Trabalho do aluno Bruno representando a cestaria indígena e colar. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Trabalho da aluna Julie, representando um indígena em seu cenário de vivência. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Após, pedi-lhes que me indicassem as imagens que não seriam figurativas. Os alunos selecionaram várias composições de cunho gestual. Pedi-lhes então que separassem as imagens que tivessem características formais que consideravam mais “leves” e as mais “pesadas” visualmente. Os alunos elegeram duas imagens, as produzidas pelo aluno Leonardo Alves e Dienifer.

Trabalho do aluno Leonardo Alves. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Trabalho da aluna Dienifer. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Pedi-lhes que me explicassem que aspectos visuais foram relevantes para que eles elegessem a imagem do aluno Leonardo Alves para representar características visuais “leves”. Deste modo os alunos explicaram que a imagem do colega Leonardo foi construída a partir de muitas linhas “finas”, que o branco do papel ainda mostrava-se bastante aparente e que ainda, ele havia escolhido utilizar cores suaves na composição das linhas, portanto tal imagem transmitia um sentimento de leveza por apresentar tais aspectos visuais. Pedi-lhes então que me explicassem por que elegeram o trabalho da aluna Dienifer como representação de uma imagem “pesada”. Os alunos disseram-me que a imagem realizada pela colega foi produzida utilizando-se muitas camadas de tinta e que este excesso transmitia a sensação de que a imagem estaria pesada. Os alunos completaram comentando sobre as misturas das cores, pois a imagem diante a tantas misturas acabou por escurecer o centro da composição, outro aspecto relevante para que eles considerassem a imagem “pesada”. Durante as observações das imagens produzidas pelos alunos, Paulo, Diovani e Vitor riam e atrapalhavam os colegas, chamei várias vezes à atenção destes. Percebi que o aluno Paulo era o mais sedicioso deles, nada obstante, adverti o aluno sobre seu comportamento em sala de aula, e informei-lhe que se não desviasse tal atitude, ele sentaria


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afastado de seus colegas mais chegados. Paulo concordou em colaborar, porém mais tarde a conduta do aluno não se mostrou diligente e solicitei então que ele se afastasse de seus colegas, sentando ao lado de outros alunos, no lado oposto do lugar em que estava na grande mesa. Os alunos continuavam a “esconder” suas imagens na grande mesa virando-as com o lado trabalhado para baixo. Eu já havia previsto que os alunos pudessem ter dificuldade em aceitar tais imagens em seus repertórios experimentais, mas a ideia de que eles teriam vergonha da produção de tais trabalhos foi inesperada para mim. Santana (2010, p.39) explica a situação que se deu: A ânsia de crescer gera uma certa vergonha na criança em relação aos seus desenhos. A criança não quer ser vista como criança, e sim como adulto, merecedor de respeito perante a sociedade. Assim, a criança sente-se envergonhada de seus desenhos ainda infantis, e acaba por reprimi-los, e reprime sua vontade de desenhar e de se expressar livremente.

Então apresentei as reproduções das imagens do artista Franz Marc. A imagem que mais chamou a atenção dos alunos foi a reprodução de “Cavalo na Paisagem”. Diante ao interesse dos alunos por tal imagem perguntei-lhes o que poderiam observar. Os alunos logo responderam: - Um cavalo professora! - É feito com muita tinta! - E o cavalo é vermelho!

Perguntei-lhes então: - Na vida real existe algum cavalo vermelho? Alguém já viu?

Eles responderam-me que não. Completei com outra pergunta: - E na Arte, pode existir um cavalo vermelho?

Eles responderam-me que na Arte era permitido pintar um cavalo vermelho, pois este existia na imaginação do artista, e deste modo era permitido. Com tais observações faleilhes que eles também deveriam permitir a interferência de suas imaginações, pois a arte não é necessariamente representativa ou figurativa, ela também é processo e interferência da fluidez de seu imaginário. Assim todos concordaram e aparentaram compreensão sobre a atividade desenvolvida.


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Em seguida, expliquei-lhes que no segundo momento da nossa aula eu iria lhes esclarecer sobre o trabalho que desenvolveríamos no encontro seguinte, para tanto, iríamos realizar algumas anotações conjuntamente para aclarar a proposta que se daria (aproveitando o quadro negro da sala de artes, já que o momento seguinte do encontro dar-se-ia na sala de áudio visual, sala que não possui quadro). Pedi-lhes que relembrássemos conjuntamente em quais aspectos as culturas se manifestavam. Solicitei que os alunos citassem oralmente palavras-chave para que eu anotasse no quadro negro e eles em seus cadernos, pois tal escrita facilitaria o trabalho que posteriormente seria solicitado. Desta forma todos anotamos:

Manifestações Culturais: Roupas, Comidas/Alimentos, Músicas,

Linguagem, Região, Países, Estados, Tipos físicos, Pinturas Corporais, Artesanato, Enfeites Corporais, História: África, indígena... Religião, Rituais, Danças, Comportamentos e Sentimentos Após realizei a chamada e dispensei todos os alunos para o recreio. Antes, combinei que a segunda aula deste encontro dar-se-ia na sala de áudio visual, e disse-lhes que nos encontraríamos lá. Durante o intervalo do recreio, rapidamente busquei a aparelhagem para exibir as imagens no Data show, para montá-la na sala de áudio visual. O computador (Laptop) fornecido pela escola é precário, demora bastante tempo para que inicie seu funcionamento de forma eficiente. O recreio finalizou e os alunos adentraram na sala como o combinado, contudo, não consegui que o funcionamento do equipamento se desse no tempo previsto. Pedi-lhes que aguardassem por algum momento, para que eu arrumasse o equipamento, conversando em tom baixo com seus colegas.


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Com dificuldade eu não conseguia fazer com que o Laptop transmitisse a imagem para o Data Show, pedi à aluna Suhelen que chamasse a pessoa responsável pelo equipamento na recepção da escola. A aluna, muito prestativa, colaborou com tal situação dirigindo-se ao responsável deste. Durante a ausência de Suhelen, fiz algumas tentativas para o funcionamento da aparelhagem, sem êxito. Com a chegada de Suhelen na sala, dei inicio à explanação do conteúdo planejado Bienal do Mercosul. Primeiramente perguntei aos alunos se eles saberiam do que tratava tal tema. Alguns alunos falaram para o grande grupo que seria uma grande exposição de Artes que ocorria em Porto Alegre. Perguntei-lhes a respeito da frequência de tal exposição, em que períodos ela ocorria. Os alunos não sabiam responder. Assim, disse-lhes para pensarmos no próprio nome da exposição “Bienal do Mercosul”. Questionei-lhes sobre que significado o prefixo “bi” teria. Rapidamente eles responderam-me: “dois”. Então lhes pedi que refletissem sobre “bi” e “enal” e logo um aluno disse: “de dois em dois anos!”. Afirmei que o aluno estava correto, se tratava de uma exposição de Arte realizada de dois em dois anos aqui na cidade de Porto Alegre. Após, perguntei-lhes sobre a palavra “Mercosul”. Vários alunos falaram que seria a reunião de alguns países. Pedi-lhes que me dissessem quais. Assim eles citaram: Argentina, Chile, Brasil, Peru, Paraguai e Uruguai. Deste modo, perguntei-lhes o que “Mercosul” significaria em uma exposição de artes. Todos os alunos me disseram que só poderia significar a reunião de artes produzidas por artistas de tais países. Confirmei as considerações dadas por eles, falando-lhes que estavam plenamente corretos com relação às mesmas. Em seguida, convidei todos os alunos a aproximarem-se do Laptop, pois eu daria inicio à apresentação das imagens no mesmo, já que o tempo para a instalação do equipamento de Data Show estaria comprometendo o andamento de nossa atividade. Alguns alunos não quiseram se aproximar, e permaneceram bastante afastados da exibição das imagens, contudo afirmei minha posição explicando da necessidade da colaboração de todos na sala. Com isso mais alunos aproximaram-se, porém ainda, alguns deles quiseram permanecer na mesma posição. Apresentei primeiramente uma reprodução da imagem “Mãe Preta” de Lucílio de Albuquerque. Permiti que os alunos observassem calmamente tal imagem. Pedi-lhes que me falassem sobre que ideias a imagem lhes transmitia. Deste modo os alunos falaram-me:


116 - É uma mulher amamentando um bebê! - Tem dois bebês, um ela esta amamentando e o outro está no chão! Ah, ela também está sentada no chão! - Ela está olhando o bebê no chão! - Ela está triste!

Pedi-lhes que descrevessem que características físicas a mulher da reprodução teria. Eles falaram-me que esta seria uma mulher negra, possivelmente uma africana. Então acrescentei a pergunta sobre qual dos bebês poderia ser o filho, e os alunos indicaram-me que seria o bebê que estava deitado no chão e que possivelmente ela estaria amamentando um bebê que não seria seu filho legitimo. Assim, questionei todos sobre em qual período histórico tal cena podia ter se passado, no Brasil. Logo eles falaram: “na época em que tinham escravos!”. Perguntei a eles se a mulher negra de tal imagem poderia ser uma escrava. Eles responderam que sim, e que possivelmente ela estava alimentando o filho de seu “dono”. Parabenizei todos os alunos pelas observações e questionei-os sobre como eram chamadas tais escravas que amamentavam os bebês de seus senhores. Nenhum aluno sabia dizer. Então lhes falei que eram chamadas de “amas de leite”. Não ocasionalmente todos sorriram falando-me que já sabiam como eram chamadas, porém não tinham se lembrado da palavra correta no momento da pergunta. Sequencialmente apresentei-lhes a imagem do registro fotográfico da instalação “Wet Nurse” da artista Rosana Paulino. Informei-lhes que a artista residia em São Paulo. Eles comentaram que acharam “diferente” esta arte. Pois tinha elementos que “saiam” das imagens de pessoas negras. Perguntei-lhes o que seriam estes elementos. Eles responderam-me que seriam fitas brancas e garrafas. Então questionei a todos sobre o que estas fitas brancas estariam representando. Animados, os alunos disseram-me que as fitas representariam leite, e que as negras, como na imagem produzida por Lucílio de Albuquerque, seriam amas de leite também. Com tal observação expliquei à turma que muitos materiais poderiam ser utilizados na arte, e que quando estes se distribuíam pelo espaço, poderíamos chamar de instalação. Neste momento a pessoa responsável pelo equipamento visual entrou na sala e solucionou o problema da transmissão da imagem do Laptop para o Data Show. Assim, repassei rapidamente as imagens que comentamos para que os alunos que não se aproximaram do Laptop pudessem observar com maior clareza estas. Mostrei-lhes outras imagens da produção artística da artista Rosana Paulino. A instalação de 1998 da artista chamou a atenção dos alunos pela utilização de cabelos africanos. Li então para os alunos as observações da artista sobre a escolha de tal material:


117 Apropriar-me do que é recusado e malvisto. Cabelos. Cabelo “ruim”, “pixaim”, “duro”. Cabelo que dá nó. Cabelos longe da maciez da seda, longe do brilho dos comerciais de shampoo. Cabelos de negra. Cabelos vistos aqui como elementos classificatórios, que distinguem entre o bom e o ruim, o bonito e o feio. Pensar em minha condição no mundo por intermédio de meu trabalho. Pensar sobre as questões de ser mulher, sobre as questões da minha origem, gravadas na cor da minha pele, na forma dos meus cabelos (Paulino, 2011, s/p.).

Após a leitura a aluna Ketlen exclamou indignada: - Estes comerciais são muito mentirosos! Eles dizem que o cabelo fica todo lindo e maravilhoso, mas é mentira!

Perguntei a Ketlen se ela já havia assistido algum comercial sobre “belos cabelos afro”. A aluna respondeu-me que não. Indaguei todos da turma sobre o porquê a sociedade não expunha os afrodescendentes em comerciais de shampoo. Os alunos não souberam responder. Para tanto, muni-me com outra imagem fotográfica de registro de instalação da artista Rosana Paulino chamada “Tecido Social” e apresentei-a aos alunos.

Rosana Paulino, Tecido Social, 2010. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com)


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Rosana Paulino, Tecido Social (detalhe), 2010. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com)

Rosana Paulino, Tecido Social (detalhe), 2010. (Fonte: http://rosanapaulino.blogspot.com)

Frente a tal imagem, os alunos notaram: a representação de armas, mulheres brancas com sacolas de compras (representando a sociedade de consumo), mulheres negras com uma vassoura na mão, e imagens de mulheres escravas que também aparecem na instalação “Wet nurse” da artista. Após, perguntei-lhes que material Rosana Paulino teria utilizado para apresentar tal imagem e os alunos responderam-me que o material usado seria


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tecido. Acrescentei a pergunta questionando-lhes de que modo a artista uniu as mesmas. Assim os alunos responderam-me que foi costurando. Acrescentei explicando-lhes que a artista expôs a costura para explicitar a ideia de “avesso”, pois ela remete a este trabalho “o avesso que não se vê” (PAULINO, 2010). Desta forma, os alunos compreenderam que as proposições da artista seriam bases para o questionamento dos conceitos sociais com que nos deparamos no cotidiano em que vivemos. Em seguida alguns alunos completaram que a história dos afrodescendentes no Brasil refletia ainda nos dias de hoje, pois os escravos que aqui chegaram trazidos da África foram tratados muito mal pelos colonizadores e que este tratamento perpetua-se até os dias atuais, manifestado na existência do racismo. Percebo que os alunos compreenderam bem os aspectos que a artista explicita artisticamente, formando um diálogo estreito entre as questões sociais e a Arte. Noto neste momento que as reflexões que abordei neste encontro dialogam diretamente com as relações sociais que os alunos vivenciam no cotidiano social, pois A arte, ao contrário do papel que a mídia faz em sua maioria, tem o poder de, através da fruição de uma obra ou experimento do fazer, atuar sobre nossas emoções e transformar nossos conceitos em um sentido crítico, construtivo e não alienador. O arte-educador tem a possibilidade de contextualizar objetos e experimentos e assim, associar a ideia de importância social e cultural à produção de emoções positivas e sentimentos reflexivos (PEREIRA, 2006, p. 66).

Em seguida, falei-lhes que a artista Rosana Paulino participou da 4ª Bienal do Mercosul. E logo lhes apresentei registros fotográficos do trabalho do artista Eugênio Dittborn. Falei-lhes que este artista era de origem chilena e que ele seria o artista homenageado desta edição da Bienal do Mercosul ainda, completei ainda falando-lhes que esta seria a 8ª edição de tal exposição. Expliquei para os alunos que Eugênio trabalhava com Arte Postal e que chamava seus trabalhos de “pinturas aeropostales”, ou seja, pinturas aeropostais. Os alunos observaram as “dobras” aparentes nas pinturas aeropostais do trabalho de Eugênio e compreenderam que estas teriam grandes dimensões. Eles entenderam bem que Eugênio dobra suas pinturas para que estas sejam colocadas dentro do envelope. Em seguida apresentei para os alunos imagens dos envelopes os quais o artista utiliza-se para enviar suas pinturas. Questionei os alunos sobre quais relações poderíamos fazer ente a Arte Postal e o tema que estávamos estudando nas aulas. Eles responderam-me que a principal relação só poderia ser de que Arte Postal “viaja” por vários países, “dialogando” com muitas culturas diferentes. Impressionei-me com tal compreensão dos alunos. Considerei excelente tal observação.


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Finalizando a aula, expliquei para todos que na aula seguinte trabalharíamos também com a proposta de Arte Postal. Aclarei que eles executariam um trabalho prático individual, em uma folha de tamanho A5, portanto para a próxima aula eles deveriam trazer todos os tipos de materiais que achassem convenientes para utilizarem para a tarefa plástica. Expliquei que a temática do trabalho seria manifestar visualmente as relações culturais existentes na sociedade brasileira e mundial. Falei-lhes também, que poderiam adicionar materiais diversos, como tecidos, tintas, papéis, fitas, embalagens e tudo aquilo que acharem que pode agregar significado no resultado plástico da tarefa. Ainda, disse-lhes que para facilitar as escolhas dos materiais e refletir sobre a proposta eles poderiam utilizar a lista “Manifestações Culturais”, que realizamos coletivamente antes do recreio. Com todos já se preparando para sair da sala, o aluno Gilberto em tom de brincadeira perguntou-me: - Posso trazer cabelo? Como aquela artista lá fez?

Os alunos riram e respondi-lhe que poderia trazer os materiais achasse melhor.


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3.2.5. Quinto Encontro: Aulas 9 e 10 ( 90 minutos - 2 horas/aula) Data: 28/09/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16 horas ás 17:30 horas. Tema/ Título: Diversidade Cultural. Dialogando com as Diversas Culturas e a Arte Postal.

Conteúdos: - Interculturalidade. - Arte Postal. - Fronteiras físicas e culturais. - Interferências culturais.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Discutir em grupo que relações as culturas manifestadas na sociedade possuem entre si. - Refletir sobre onde uma cultura manifesta-se visualmente. - Pensar que tipos de “fronteiras” culturais existem no mundo, considerando aproximações e distanciamentos ideológicos. - Desenvolver a tarefa plástica para troca postal com trabalhos de alunos de outra escola. - Compreender que relações são possíveis entre as culturas pesquisadas.

Objetivos: - Compreender o processo da Arte Postal. - Desenvolver relações possíveis com as culturas pesquisadas. - Perceber onde uma cultura manifesta-se visualmente.

Metodologia: - Reflexão e discussão sobre manifestações culturais. - Desenvolvimento de trabalho em Arte Postal.


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Materiais e recursos a serem utilizados: Materiais plásticos trazidos pelos alunos. Folhas A5.

Avaliação: - Comprometimento com a proposta de trabalho plástico. - A experimentação diversificada de materiais. - A organização durante o desenvolvimento do trabalho plástico.

Planejado: Inicialmente os alunos deverão rever as palavras-chave escritas na aula anterior, e repensar as relações que as culturas pesquisadas possam ter. Eles deverão considerar todos os aspectos conceituais já abordados nas aulas anteriores. Desta forma, a partir dos discursos relacionais culturais dos alunos, eles deverão individualmente desenvolver a tarefa plástica. Esta tarefa consiste em expor plasticamente suas ideias relacionais culturais na folha A5. Os alunos deverão pensar no trabalho plástico como um meio de comunicação de seus discursos. Eles deverão refletir sobre a historicidade, atualidade e que relações culturais seriam possíveis até mesmo em seus imaginários de futuro. O trabalho seguirá a proposta de ultrapassar as barreiras fronteiriças que a Arte Postal possibilita, e também como instrumento para pensarmos um mundo mais igualitário, de mais respeito e menos preconceito. Explicitar-se-á aos alunos que esta tarefa fará parte de um projeto envolvendo diversas outras escolas do Rio Grande Sul. Será aclarado também que o projeto consiste em um diálogo através da Arte com outros estudantes utilizando-se a comunicação postal. Pois os outros estudantes, assim como eles, também conheceram a proposta das pinturas aeropostais de Eugenio Dittborn, o artista homenageado da 8ª Bienal do Mercosul, portanto artista norteador da atividade. Os alunos serão comunicados que seus trabalhos serão enviados para alunos de outra escola e que da mesma forma eles também receberão trabalhos postais de outros estudantes participantes do Projeto.

Realizado: Como em todos os encontros realizados até o momento, cheguei mais cedo na escola para realizar a organização da sala de artes e dos meus materiais. Também, neste


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momento prévio, revejo todo o planejamento do encontro, para que a aula não se inicie com a falta de algum item que prejudique o andamento programado. Desta forma, após minha organização, decidi pedir o aparelho de som na recepção da escola. Estávamos no horário do recreio no momento em que eu voltava para a sala de artes com o aparelho sonoro. Durante meu percurso, alguns alunos me acompanhavam já me perguntando o que estava programado para o nosso encontro. Pedi-lhes calma e que aguardassem o início da aula. Chegando à sala, percebi que aproximadamente oito alunos vinham acompanhando-me até a sala de artes, e estes, ao chegarmos à sala, se dirigiam aos seus lugares munidos de mochilas, materiais e anseios. Estranhei tal atitude dos alunos e faleilhes que ainda não estava no horário da aula, que podiam permanecer no pátio e aproveitar o recreio. Os alunos disseram-me que gostariam de já permanecer ali, pois gostavam de ficar na sala de artes, mas somente se eu permitisse. Diante a tal argumento permiti que eles permanecessem ali. Logo que os alunos entraram na sala, já visualizaram o material plástico que eu havia levado para oferecê-los: tintas, pincéis, revistas, linhas, cordões, agulhas de costura, revistas, lápis de cor, grafite, pastel oleoso, papéis coloridos e tecidos. Os alunos prontamente já tomaram a ação de investigar os mesmos. Permiti-os averiguar os materiais, pois a obtenção de [...] resultados plásticos com diferentes materiais também é motivada com a diversificação de meios e suportes em trabalhos com papéis de formatos e texturas variados; com pincéis de tamanhos diferentes; com lápis e canetas finas e grossas; com meios secos como giz, carvão e grafite; com meios aquosos como aquarela, anilina, guache nanquim (LOPES, 1998, p.96).

Logo em seguida, os alunos pegaram revistas para folhar e observar imagens, aguardando o início da aula. O sinal tocou indicando o término do recreio, e consequentemente o início do nosso encontro. Notei que havia um menino que não fazia parte da turma 50 e que permaneceu durante o recreio na sala juntamente com os alguns dos meus alunos. Mesmo com o sinal indicando o término do recreio, o aluno permaneceu na sala. Com tal situação questionei-o sobre quem era. O aluno logo me respondeu que ele pertencia à turma 52 e que sua aula havia terminado mais cedo. Perguntei-lhe então o que fazia ali. O aluno falou-me: - Professora sei que a senhora esta dando aula no lugar da professora Cleusa. Eu tenho aula com ela, mas não gosto. Vi que a senhora esta dando aulas pra turma 50, e sempre tive curiosidade para saber como era sua aula. Alguns dos meus amigos comentaram que as suas aulas são bem legais, posso ficar aqui e assistir também a aula? Prometo que não vou incomodar.


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Achei muito curiosa tal situação, e permiti então a permanência do aluno na aula com a condição de que ele participasse desta como todos os alunos. O aluno concordou e completou dizendo: - Sabe, quase ninguém gosta da professora Cleusa porque ela grita muito. Deste modo ela perde o respeito com os alunos. Na minha turma a maioria dos alunos é repetente. Aí cada vez que ela grita e trata a gente mal, os alunos começam a ter atitudes ruins só para provocar!

Achei que a observação do aluno soou como um desabafo. Achei extremamente válido este diálogo estreito entre professor e aluno que se estabeleceu entre mim e ele. Trata de uma combinação ente ambos sobre comportamento em sala de aula, pois ao mesmo tempo em que a professora cobra e espera determinado comportamento do aluno, o aluno também espera a mesma atitude do professor. Disse-lhe então que era bem complicado tal assunto, e que muitas vezes o professor tem dificuldades com a questão comportamental em sala de aula. Sugeri que ele procurasse conversar com a professora Cleusa e que também pedisse a colaboração dos colegas, pois as aulas só ocorrem de maneira proveitosa com a colaboração e o diálogo de todos os envolvidos, ou seja: professores e alunos. Com todos os alunos presentes na sala, notei que a turma estava bastante agitada, com todos conversando entre si. Então antes de dar início à atividade decidi conversar com eles sobre comportamento. Chamei a atenção de todos com muita dificuldade, não fui atendida. Dirigi meu olhar para o aluno da turma 52, em sinal de que ele também compreendesse as dificuldades que o professor sofre. Insisti para que eles me cedessem atenção. Assim, a maioria observou-me aguardando minha fala. Disse-lhes então que eu tinha a noção que eles desejavam conversar com seus colegas, porém, primeiramente, eles deveriam permitir que eu iniciasse a explicação sobre a atividade. Falei-lhes que eu não queria ter que pedir (muitas vezes em tom de voz alta), a todo o momento para dirigir a palavra a eles. Expliquei-lhes que eles deveriam dar a palavra para o professor em sinal de organização deles mesmos, como estudantes. Pedi-lhes então, que tentássemos fazer com que em nossas aulas todos possam interagir de maneira construtiva. Desta forma solicitei-os que permitissem minha comunicação com o grupo para darmos eficiência ao andamento das aulas, porque eu jamais gostaria de transmiti-lhes antipatia diante do gesto simples de permitirem minha fala, e tal atitude só dependeria da vontade deles. Assim, todos concordaram e pude dizer-lhes que primeiramente eu explicaria a atividade e que após, durante a execução desta, eles poderiam conversar com os colegas.


125 A relação pedagógica se da de forma horizontal, calçada no diálogo. Alguns professores procuraram buscar novas maneiras de se relacionarem com os alunos, interessando-se por eles e por seus problemas. De forma geral, eles não se limitam à exposição da matéria e não exercem a função de meros transmissores dos conteúdos. Propõe o trabalho cooperativo em pequenos e grandes grupos para as discussões, oportunidade em que se juntam aos alunos para uma reflexão comum. Quando necessário, há averiguação do professor, para chamar a atenção do aluno, a fim de resguardar o bom clima da classe, isto é, sem desordens, conversas e desrespeito (VEIGA, 1989, p.141).

Perguntei se eles haviam trazido materiais específicos, como solicitado na aula anterior. Eles citaram: lápis de cor, revistas, tesoura, cola e tintas. Falei-lhes que eu também havia disponibilizado alguns materiais para eles e que estes estavam dispostos em uma das mesas para que para o acesso de todos (situação já averiguada logo no inicio da aula pela maioria dos alunos da turma). Falei-lhes que executaríamos neste encontro o trabalho plástico que faria parte do Projeto Arte-Postal, cuja ideia já havia sido introduzida na aula anterior. Expliquei-lhes que os trabalhos que desenvolveríamos nesta aula seriam enviados por correspondência para outra escola, para serem expostos e discutidos por outros estudantes participantes do Projeto. Do mesmo modo como para o nosso grupo, que também receberia via postal trabalhos realizados por alunos de outra escola participante do Projeto. Expliquei que cada aluno deveria apontar plasticamente o tema “A visualidade Cultural” no trabalho prático. Falei-lhes que tal conceito poderia ser mais bem explanado por eles revendo a listagem que desenvolvemos na aula anterior com o título de “Manifestações Culturais”. Disse-lhes também que o trabalho se desenvolveria no suporte de papel A5 que eu iria lhes proporcionar, e permiti que utilizassem os materiais que achassem convenientes. Deste modo, distribuí as folhas A5 para todos. Inicialmente os alunos chamavamme muitas vezes questionando-me sobre como e o que poderiam implicar nas imagens que produziriam. Assim, disse a estes que se permitissem primeiramente refletir sobre o tema, pois a partir desta ação suas ideias “aflorariam”. Pois “em artes plásticas, as intervenções não devem ser confundidas com o simples ensinar de técnicas ou manuseio de materiais plásticos, mas garantir a pesquisa que permitirá a apropriação da linguagem plástica, de uma maneira específica para cada aluno” (LOPES, 1998, p. 95). Vagarosamente os alunos iniciaram seus trabalhos. O primeiro grupo que iniciou a atividade era composto só de meninas. A aluna Ketlen questionou-me sobre a possibilidade da execução de uma imagem composta de instrumentos musicais, como guitarras e bateria. Perguntei então à aluna onde ela percebia em tal composição o tema visualidade cultural. Ela respondeu-me que com tais instrumentos


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muitas culturas manifestavam-se e citou: Rock, Emo, Reggae e Pop. Considerei a resposta de Ketlen válida, dizendo a ela que poderia dar andamento à construção de tal imagem. A aluna manifestou a representação gráfica dos instrumentos musicais como havia pensado, e inseriu a predominância de linhas diagonais desenvolvendo uma composição do plano de fundo.

Trabalho da aluna Ketlen exaltando os instrumentos musicais como ferramenta de manifestação cultural. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Vi Suhelen e Gilberto, em um momento da aula, trabalhando juntos em uma das mesas vagas da sala de artes, situação incomum, pois normalmente eles participam das atividades em grupos diferentes. Aproximei-me deles e percebi que ambos utilizavam tinta na produção de suas imagens, e ao observar o andamento do trabalho plástico, notei que ambos realizavam figuras referentes a indígenas. Deste modo, exclamei: - Olha só que coincidência! Vocês estão ambos produzindo imagens de indígenas!


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Trabalho do aluno Gilberto representando a cultura indígena. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Trabalho da aluna Suhelen exaltando o indígena. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

E a aluna Suhelen completou: - É, professora! Nós somos um pouquinho indígenas, olha a cor de nossa pele!


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Confirmei a observação de Suhelen e comentei que da parte dela eu já sabia que sua origem familiar seria indígena, pois na aula anterior ela havia me dito. Então perguntei para Gilberto se ele também tinha a descendência indígena em sua família. Os dois alunos começaram a rir e Gilberto disse-me que assim como Suhelen ele tinha ascendência indígena e não poderia ser diferente, pois eles eram primos irmãos. Espantei-me com a revelação dos alunos, e lhes falei que não eu não tinha o conhecimento de tal informação, e que com esta, a partir daquele momento, pude notar certa semelhança física entre eles. Eles ficaram contentes com minha observação e continuaram a prática. Suhelen e Gilberto iniciaram a atividade, afastados um do outro, ou seja, acompanhados de outros colegas, e certamente o desenvolvimento da representação dos indígenas partiu de uma coincidência. Achei muito interessante que Suhelen e Gilberto aproximaram suas origens familiares no trabalho desenvolvido. O aluno pode possuir um enfoque superficial da aprendizagem, compatível com a aprendizagem mecânica, ou um enfoque profundo sobre como se aprende, enfoque este que está intimamente relacionado à aprendizagem significativa. Se o enfoque é superficial, a tendência do aluno é ver a atividade como uma exigência externa a ser cumprida, concentrar a atenção em aspectos literais e não-abstratos da tarefa, não relacionar entre si os aspectos da tarefa, procurar memorizar repetitivamente, evitar envolvimento pessoal com o conteúdo estudado, preocupar-se com o fracasso, e sentir-se desgostoso com o tempo que precisa dedicar ao estudo. Mas, se o enfoque do aluno sobre a aprendizagem é de caráter profundo, pode-se esperar que o aluno tenha um envolvimento pessoal com aquilo que procura aprender, ultrapasse a literalidade do conteúdo a ser assimilado, integre o referido conteúdo nos mais diferentes sentidos, procure relacionar de várias maneiras a tarefa com a estrutura cognitiva preexistente, discuta amplamente o conteúdo da tarefa, e satisfaça-se emocionalmente ao procurar aprender significativamente (NETO, 2001, p.27).

Do mesmo modo, percebo que ambos os alunos aproximaram de maneira ampla sua realidade familiar ao trabalho plástico, exaltando suas raízes. No encontro realizado anteriormente, Suhelen manifestou-me que possuía muita curiosidade sobre a descendência indígena familiar que possuía, mas sua família não correspondia a seus anseios de conhecimento. Percebo que Suhelen e Gilberto buscaram em seus imaginários tais informações, e permitiram que o processo criativo da atividade se manifestasse plasticamente a partir da assimilação de seus sentimentos. O aluno Leonardo A. demonstrou dificuldade na execução da tarefa, o aluno chamou-me várias vezes, dizendo-me que não sabia que tipo de imagem poderia produzir. Incentivei o aluno a refletir sobre os aspectos que discutimos nas aulas anteriores, com relação à visualidade das culturas. Diversas vezes dirigi-me a Leonardo para orientá-lo. Em uma destas, Leonardo perguntou-me se ele poderia misturar corpos de pessoas na construção de


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uma figura humana hibrida, pois na visão do aluno, algumas pessoas eram “misturadas culturalmente”. Concordei com o aluno e o parabenizei por tal ideia. Na prática, Leonardo ficou bastante tempo estudando uma composição a partir de um recorte de “um vestido em tronco feminino”. Aproximei-me do aluno para que ele explicitasse-me suas especulações. Leonardo disse-me que estava “procurando algumas pernas e braços “diferentes” para colocar no corpo com vestido”. Incentivei o aluno a ousar em sua escolha, e exemplifiquei algumas observações folheando uma revista junto a ele. Leonardo afirmou-me que iria encontrar imagens “bem legais” para sua composição. Após certo tempo, observei que Leonardo ainda continuava experimentando o “vestido em tronco feminino” sobrepondo tal sobre as figuras humanas das revistas. O aluno ria das suas “brincadeiras” de sobrepor o “vestido” em figuras masculinas e infantis. O trabalho final do aluno, porém não propositou as “brincadeiras” do mesmo durante seu processo, pois Leonardo montou a figura humana mantendo uma proporção bem coerente com a realidade, situação bem diversa de seu processo de criação. Com o término da colagem, Leonardo mostrou-me como resolveu a construção da figura humana. Indaguei o aluno sobre que aspectos culturais tal figura exibia. Leonardo na tentativa de explicar-me os conceitos culturais disse-me: - É uma mulher sora [sic]! Ela representa umas culturas.

Perguntei a Leonardo a que culturas ele estaria se referindo. Leonardo disse-me que não sabia explicar, mas afirmou que gostou do resultado da colagem. Desta forma, eu disse para o aluno que pensasse então em um ambiente para esta figura, com conceitos que relacionassem melhor a proposta do nosso trabalho. O aluno concordou e partiu para a criação de um segundo plano para sua figura. Ao fim da aula, Leonardo entregou-me a imagem concluída e, animado exclamou-me: - Sora [sic], é uma mulher deitada em uma plantação de cenoura!

Assim, pedi que ele explicasse-me que conceito de cultura que sua imagem representava. Leonardo defendeu sua proposta dizendo-me: “cultura agrícola sora [sic]!”.


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Trabalho do aluno Leonardo A representando a “cultura agrícola”. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

A satisfação do aluno frente ao trabalho concluído fez com que minha aceitação de seu parecer fosse instantânea. O aluno estava bastante satisfeito com o resultado final e fez diversos experimentos durante a ação criativa. Portanto acredito que foi exitoso o percurso produtivo de Leonardo A. A criança constrói para si mesma a realidade da sociedade; o artista constrói novas realidades para a sociedade. É portanto, diferente a maneira como o adulto e a criança se acercam da ideia, pois esse acercamento é fruto das estruturas mentais do sujeito. Na criança a analogia é o seu único modo de pensar o mundo, no adulto é busca da linguagem poética. [...] Para a criança o desenho interessa enquanto processo, é ato de brincar desenhando (MOREIRA, 2005, p.39).

O aluno Lucas optou por inserir um fundo preto utilizando tinta guache logo no começo da produção de seu trabalho. Após a iniciação da tarefa pelo aluno, percebi que todos os meninos que compunham seu grupo realizavam o mesmo tipo de tratamento de imagem, ou seja, realizaram um fundo utilizando tinta preta. Deste modo os trabalhos de Lucas, Paulo, Vitor e Fábio, manifestaram a mesma característica com relação à predominância da cor preta. Para tal situação La Pastina explica que A criança necessita integrar-se ao mundo, à sociedade. Isso "[...] envolve ‘ser semelhante ao coleguinha do lado’ e, portanto, copiar os seus desenhos, desenhar como ele, para dessa maneira ‘assemelhar-se’, passar a fazer parte daquele meio sociocultural" (LA PASTINA apud DUARTE, 2009, p.101).


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Trabalho do aluno Lucas, exaltando a grafia de pixação. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Ainda, os alunos Paulo, Vitor e Fábio escolheram partir da mesma temática na interferência do fundo negro, todos optaram pela representação da cultura indígena. Já Lucas, diferenciou a escolha da produção de sua imagem, escrevendo seu nome com letras de “pixação” alegando manifestar a “cultura do gueto, graffiti e hip hop”.

Trabalho do aluno Paulo representando um indígena. (Fonte: SCHMIDT)


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Trabalho do aluno Vitor representando o espaço de vivência indígena. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Trabalho do aluno Fábio representando o espaço de vivência indígena. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Um dos grupos de meninas partiu para uma experimentação mais diversificada no uso de materiais. Nicole, Vanessa e Eduarda trabalharam com colagem de figuras de revistas, lápis de cor, pastel oleoso, tecido, fitas, lãs e linhas. Após o aluno Lucas perceber a ação de


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suas colegas, que desenhavam costurando a partir do uso de linhas e agulhas, manifestou interesse em trabalhar com tais materiais. Influenciado pelas alunas, Lucas desenvolveu uma “moldura” de linhas de costura em seu trabalho plástico. A mesma situação de “ser semelhante ao coleguinha do lado” referida anteriormente sobre envolvimento dos alunos Lucas, Paulo, Vitor e Diovane, manifestou entre estas três alunas. Comparo tal situação, pois as três meninas explicitaram a palavra “Culturas”. Deste modo percebo que o colega que está ao lado do aluno realmente influencia no processo criativo do mesmo.

Trabalho com materiais diversificados da aluna Nicole. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Trabalho com materiais diversificados da aluna Eduarda. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho com experimentação de “desenho costurado” da aluna Vanessa. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Todos os alunos desenvolveram muito bem a atividade planejada. Percebi que os alunos sentiram muito prazer em executar a tarefa plástica. Ao início da aula todos os alunos estavam bastante agitados e ansiosos para conversar com seus colegas, contudo todos ficaram muito entretidos durante a produção material e o assunto que se dava entre eles era unicamente sobre a execução da atividade.


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3.2.6. Sexto Encontro: Aulas 11 e 12 (90 minutos - 2 horas/aula) Data: 05/10/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16 horas ás 17:30 horas. Tema/ Título: A imagem comunicativa. Contextualizando a produção visual.

Conteúdos: - Leitura das imagens produzidas na aula anterior. - Arte como processo e experimentação. - Instalação. - Artista Eugênio Dittborn. - Interculturalidade. - Arte Postal. - Fronteiras físicas e culturais. - Processo curatorial.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Observar, refletir, discutir e questionar os trabalhos produzidos por eles na aula anterior. - Pensar que tipos de “fronteiras” culturais existem no mundo, considerando aproximações e distanciamentos ideológicos. - Refletir sobre onde uma cultura manifesta-se visualmente. - Desenvolver texto explicativo sobre os critérios adotados para a montagem coletiva do trabalho plástico, para remeter para outra escola participante do Projeto Arte-Postal.

Objetivos: - Compreender o processo da produção de arte postal e instalação. - Desenvolver relações com as imagens produzidas na aula anterior. - Conhecer a prática curatorial.


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- Desenvolver relações possíveis com as culturas pesquisadas. - Perceber onde uma cultura manifesta-se visualmente.

Metodologia: - Leitura de imagem. - Discussão sobre relações culturais e aspectos formais da produção artística. - Reflexão e discussão sobre manifestações culturais. - Desenvolvimento de instalação conceitual.

Materiais e recursos a serem utilizados: Imagens produzidas pelos alunos na aula anterior, máquina fotográfica, folha de papel, caneta esferográfica, envelope e endereço da escola remetente.

Avaliação: - Participação na leitura das imagens exibidas. - Comprometimento com a proposta de trabalho. - A organização durante o desenvolvimento da atividade.

Planejado: Será explicado primeiramente aos alunos o que é um curador e qual o seu papel em uma exposição de Artes. Será relembrado com os alunos o trabalho de Arte Postal desenvolvido pelo artista Eugênio Dittborn visto em uma de nossas aulas anteriores. A partir do trabalho do artista e do conceito de curadoria, os alunos serão questionados sobre o título da 8ª edição da exposição de Artes Bienal do Mercosul: Ensaios da Geopoética. Após, os alunos serão avisados que neste encontro eles irão desenvolver uma grande instalação de Arte Postal com as imagens produzidas na aula anterior, com o intuito de que suas imagens se unifiquem desenvolvendo criando um contexto singular. Para tal os alunos deverão desenvolver contextos e discursos relacionais a partir das imagens produzidas, para a experimentação de uma ação curatorial. Com esta proposta, será realizada a seguinte dinâmica: Os trabalhos desenvolvidos na aula anterior serão distribuídos para os alunos, porém o aluno não receberá a imagem que produziu, mas sim terá em suas mãos o trabalho realizado por um de seus colegas. Após, os alunos irão dispor-se em um círculo para onde


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carregarão as imagens para que todos possam visualizá-las. Desta forma, os alunos deverão interligar os contextos ideológicos ou formalistas das imagens que visualizarão. Após a explanação dos conceitos das imagens, os alunos, conjuntamente com a professora estagiária, realizarão a montagem da exposição no local oferecido pela escola. Com a visualidade da montagem da instalação dos postais, a turma deverá escrever um texto grupal apresentando seus conceitos unificadores para a produção coletiva. Para finalizar a aula, a montagem da instalação será fotografada e o texto com os critérios de montagem será colocado dentro de um envelope endereçado para a escola a qual remeteremos o trabalho final. Também será explicado aos alunos que, após uma semana, a fotografia revelada da exposição e as imagens do trabalho coletivo serão colocadas também dentro do mesmo envelope e remetidas para o destino explicitado neste encontro.

Realizado: Com a chegada dos alunos em sala de aula, expliquei-lhes que neste encontro não usaríamos o quadro negro e nem as mesas para tarefas plásticas, e com isto não havia necessidade de permanecermos na sala de Artes. Com tal explicação, perguntei aos alunos se eles teriam algum interesse em realizarmos nosso encontro em outra área da escola. Falei-lhes que teriam liberdade de escolher em qual local da escola eles gostariam que a aula se realizasse. Todos ficaram muito surpresos e animados, querendo compreender melhor que atividade se desenvolveria. Com tal animação, decidi manter o suspense e somente informeilhes de que seria necessária uma parede e um espaço onde todos pudessem permanecer em círculo para trocarmos informações. Estava um dia ensolarado com temperatura bastante agradável, e, desta forma, vários alunos sugeriram a “área coberta”. A “área coberta” é um espaço localizado no pátio, como um grande saguão aberto com telhado. Outros alunos não concordaram e estabeleceu-se um impasse na turma. Alguns queriam permanecer na sala de artes, outros queriam ficar no pátio (porém em um local onde não havia parede, hipótese que impossibilitaria a atividade, portanto não aceita) e a maioria manifestou a vontade de nos dirigirmos para a “área coberta”. Deste modo, após alguns minutos, até os alunos discutirem entre si uma decisão unânime, nos encaminhamos para a área coberta. Durante o percurso até a área coberta, diversos alunos que haviam demonstrado insatisfação em realizarmos a aula em tal local, manifestaram empolgação com relação à permanência que teríamos durante este encontro em um espaço transacional. Tal situação afirmou-me que


139 A partir das atividades realizadas no pátio, na quadra, na biblioteca, pode-se aprender a existência de um espaço educativo para além da sala de aula, muito pouco explorado pelos adultos da escola, quando não considerado problemático por provocar rupturas no padrão de ordem definido pelo trabalho individual, silencioso e competitivo. O potencial educativo que representa o espaço extraclasse e o padrão de atividade imposto constituem um contra-senso se considerarmos os objetivos declarados da instituição “escola” (ROCHA, 2003, p.82).

Ao chegarmos à área coberta, alguns alunos correram até a sua sala de aula e apanharam cadeiras. Como eu não tinha o conhecimento da localização da sala onde os alunos têm aulas de outras disciplinas, lhes perguntei de onde eles estavam retirando tais cadeiras. Tranquilamente vários alunos falaram-me que seria da sala deles e que não haveria problema. Deste modo, permiti que eles apanhassem as mesmas. Assim que todos estavam organizando o círculo na área coberta, o zelador da escola aproximou-se muito preocupado com a situação das cadeiras estarem fora da sala, questionando os alunos por tal atitude. Acalmei-o explicando que realizaríamos a aula em tal espaço, e que eu estaria responsável por tais móveis. O zelador compreendeu a situação e assim iniciamos nossas atividades. Penso que nos termos defendidos por Hank As crianças e/ou os usuários dos espaços são os verdadeiros protagonistas da sua aprendizagem, na vivência ativa com outras pessoas e objetos, que possibilita descobertas pessoais num espaço onde será realizado um trabalho individualmente ou em pequenos grupos. Os espaços construídos para a criança e com a criança devem ser explorados pela mesma, em uma relação de interação total, de aprendizagem, de troca de saberes entre os pares, de liberdade de ir e vir, de prazer, de individualidades, de partilhas, enfim, de se divertir aprendendo (HANK, 2006, s/pg.)

Com todos os alunos dispostos em círculo, iniciei minha fala questionando-lhes sobre a palavra “curador”. A turma mostrou-se intrigada, e rapidamente um aluno respondeu: - Curador é um cara [sic] que cura doenças!

Todos os alunos começaram a rir. Então lhes perguntei se, um curador não sendo “um cara que cura”, o que seria então? Assim, outro aluno arriscou a resposta: - Curador é aquele que vive na tribo de índio!

Novamente todos começaram a rir e uma aluna replicou o colega: - Esse que vive nas tribos de índios é um curandeiro! Não curador!


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Confirmei a resposta da aluna e chamei a atenção de todos dizendo-lhes que a disciplina que estávamos estudando era Artes, portanto, o curador a qual eu me referia teria ligação com tal circunstância. Desta maneira os alunos falaram-me que não tinham noção nenhuma do que seria um curador para a Arte. Expliquei aos alunos que um curador seria um indivíduo que pensava sobre as manifestações e produtos artísticos, e deste modo, o mesmo era responsável pela organização e realização de exposições de arte, manifestando seus discursos reflexivos com relação às produções artísticas selecionadas por ele. Todos se mostraram interessados, porém não compreenderam claramente, neste primeiro momento, o papel do curador. Assim falei-lhes de maneira mais objetiva, explicando que a partir do pensamento poético, o curador selecionava artistas que dialogassem com seu discurso reflexivo, ou mesmo, realizava exposições selecionando artistas que trabalham com a mesma técnica, como em exposições somente de pintores, ceramistas, desenhistas ou escultores. Para exemplificar, retomei a explicação dada em aulas anteriores sobre a Bienal do Mercosul. Falei-lhes que esta edição de tal exposição teria um curador que deu um título para a mesma, e que este título seria “Ensaios da Geopoética”. Questionei os alunos sobre que entendimento eles teriam sobre o termo “Geopoética”. Todos manifestaram dúvidas. Então, instiguei-os a pensar primeiramente no prefixo “Geo”. O aluno Leonardo F. falou-me: - Geo vem de geografia sora [sic].

Novamente todos os alunos riram de seu colega, Leonardo F. mostrou-se envergonhado. Rapidamente questionei-lhes sobre o motivo por estarem rindo, já que, Leonardo F. respondera corretamente. Os risos continuaram, porém neste momento dirigidos para eles mesmos. Sorri com eles, e lhes pedi que refletíssemos juntos sobre que aspectos compõem a geografia. Deste modo muitos alunos começaram a falar ao mesmo tempo citando-me: lugares, regiões, países, culturas, linguagem, coordenadas geográficas, entre outras. Após a explanação do termo “Geo” solicitei-lhes que pensassem na palavra “Poética”. O aluno Leonardo A. respondeu-me muito confiante que tal palavra se referia à poesia. Confirmei a resposta do aluno e questionei a turma sobre o que seria poesia. Novamente responderam-me todos falando ao mesmo tempo: sentimento, amor, ideia, palavras, imaginação. Parabenizei todos pelos aspectos levantados e sugeri-lhes então que juntássemos os dois termos, “Geo” e “Poética” para compreendermos qual era a proposta do


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curador desta 8ª edição da Bienal do Mercosul. Os alunos manifestaram dúvidas, então, voltei à reflexão inicial deste encontro falando-lhes que se o curador era um indivíduo que escolhia artistas que dialogassem visualmente com seu discurso, e deste modo questionei-lhes sobre como imaginavam tais produtos artísticos escolhidos pelo curador para sua proposta para esta Bienal. Assim, os alunos falaram-me que seriam produtos artísticos que conversariam com o título “Ensaios da Geopoética”, e como havia sido explicitado verbalmente por eles, produtos cujos discursos refletiam relações na Geografia, tais como regiões, países, lugares e os outros termos citados anteriormente. Perguntei-lhes sobre que relações o trabalho do artista Eugênio Dittborn (cujas reproduções foram apresentadas aos alunos em uma aula anterior) teria com o titulo de tal exposição. Os alunos disseram que o trabalho de Eugênio era um produto artístico Postal, que “viajava” por diversas localidades do mundo, dialogando com inúmeras culturas existentes na sociedade mundial. Manifestei minha satisfação com o alcance reflexivo que obtiveram, e, deste modo, falei-lhes que desenvolveríamos uma prática coletiva curatorial, ou seja, estabeleceríamos relações visuais utilizando as imagens produzidas por eles na aula anterior. Distribuí aleatoriamente as imagens entre os alunos. Cada aluno recebeu uma produção visual. Assim que entreguei as primeiras imagens, os alunos falaram-me: - Sora [sic], esta imagem não é a minha! - Ai professora, você não está entregando os trabalhos certos! Este não é meu! - Sora [sic], o meu está com a colega, esse que tu me entregou [sic] não foi eu que fiz!

Expliquei-lhes que justamente as imagens que estavam recebendo seriam as imagens que outro colega havia produzido, pois a minha proposta era que eles observassem o resultado da produção visual de todos da turma, como um conjunto, porque somente desta maneira nos permitiríamos estabelecer relações entre as imagens, não nos preocupando com a singularidade da produção individual. Percebo que minha proposta buscava a interação como a explanação de Stori, que afirma: Desde criança, interagimos com as manifestações culturais de nossa sociedade e vamos aprendendo a gostar e ter prazer e respeito por imagens, músicas, conversas, movimentos, histórias, jogos e informações que fazem parte de nosso cotidiano. Vamos aprendendo a fazer, admirar, gostar, julgar e apreciar as diferentes manifestações culturais de nosso grupo social, dentre elas as chamadas obras de arte; conseqüentemente, vamos nos educando esteticamente no convívio social. É uma troca de sensibilidades (STORI, 2003, p.52).

Após a entrega das imagens, pedi que cada aluno observasse-as de maneira atenta, considerando os aspectos visuais formais e figurativos. Pedi-lhes também que percebessem os


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materiais utilizados para a composição considerando-os também. Informei-lhes que assim que avaliassem as imagens deveriam expô-las para que todos os alunos que estavam dispostos no círculo visualizassem. Com tal situação, pedi-lhes que observassem (no grande círculo) quais outras imagens poderiam relacionar-se com a que portavam e por que. Todos os alunos começaram a falar ao mesmo tempo indicando muitas imagens possíveis. Indiquei primeiramente a aluna Ketlen a expor sua relação. A aluna carregava a imagem produzida por Gilberto e indicou a imagem produzida por Julie relacionando as figuras em função da técnica de colagem misturada com pintura de tinta guache. Pedi que Ketlen e o aluno que portava a imagem de Julie se posicionassem um ao lado do outro para que todos pudessem visualizar as duas figuras. Perguntei ao grupo se alguém teria uma imagem que poderia relacionar com estas, e o aluno Vitor indicou a figura produzida por Suhelen explicando que além dos mesmos materiais citados por Ketlen, a figura possuía uma forte relação figurativa com a imagem produzida por Gilberto, já que ambas retratavam a representação de indígenas. Pedi que Vitor se juntasse aos colegas carregando sua figura ao lado das outras duas nas quais discutíamos as relações, para que os presentes pudessem observá-las no conjunto. Novamente dirigi-me ao grupo questionando sobre outra imagem que poderíamos inserir no contexto discutido. Assim, o aluno Leonardo P. indicou o trabalho produzido por Diovane explicando que o mesmo representava “o local onde o indígena vive”. Este aluno explicou que a relação figurativa seria a melhor relação entre as imagens, mas também levou em consideração que a imagem que portava teria aspectos materiais que se aproximavam das outras imagens que discutíamos, já que do mesmo modo havia colagem presente em sua construção.

Imagem produzida pelo aluno Gilberto. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Imagem produzida pela aluna Julie. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Imagem produzida pela aluna Suhelen. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pelo aluno Diovane. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Após o aluno Leonardo P. apontar a imagem produzida por Diovane, pedi que todos observassem as figuras que relacionamos e perguntei-lhes se mais alguém portava alguma imagem que poderia relacionar-se com o conjunto. O grupo negou a intenção de relacionar outras imagens no conjunto, então pedi que os alunos voltassem aos seus lugares com as imagens e solicitei que outro aluno do círculo apresentasse sua relação. A aluna Suhelen, que portava a imagem produzida por Eduarda, indicou tal relacionando a presença da palavra “Culturas” com as imagens produzidas por Julie (figura discutida anteriormente) e Nicole. Os alunos surpreenderam-se com a observação de Suhelen diante ao arrolamento da palavra escrita nas figuras. Pedi que os alunos que portavam as imagens citadas por Suhelen dispusessem-se lado a lado para que observássemos tais imagens. Após a disposição das três imagens lado a lado, outros dois alunos juntaram a estas imagens produzidas por Vanessa e Carolina, que também possuíam visualmente a escrita “Cultura”.

Trabalho produzido pela aluna Eduarda. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Trabalho produzido pela aluna Nicole. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pela aluna Vanessa. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pela aluna Carolina. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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O aluno Leonardo A. chamou a atenção de todos para a figura da menina no canto inferior esquerdo no trabalho de Vanessa, que estaria representada da mesma forma que a representação da menina oriental no trabalho de Carolina. Considerei bastante interessante a observação de Leonardo A., pois ele estaria relacionando os aspectos figurativos e formais das duas figuras. Logo, parabenizei todos pelas observações, e pedi que estabelecêssemos novas observações das imagens relacionando-as agora com os aspectos formais considerando as cores. A aluna Dienifer logo me pediu atenção para as relações que ela ansiava por considerar. Desta forma dei a palavra à aluna que apresentou à turma o trabalho produzido pelo aluno Vitor. Ela relacionou este com as imagens produzidas pelos alunos Fábio, Lucas e Paulo. A aluna explicou que tais imagens foram produzidas utilizando tinta, e que estas, por serem de cor preta, em sua opinião, se unificavam visualmente.

Trabalho produzido pelo aluno Vitor. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pelo aluno Fábio. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Trabalho produzido pelo aluno Lucas. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pelo aluno Paulo. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Ainda, o aluno Vitor chamou a atenção da turma informando que três destas imagens tratavam da representação do espaço de vivência indígena do mesmo modo que a imagem do aluno Diovane que havíamos observado anteriormente. Após, os alunos ainda relacionaram as imagens produzidas por Ketlen e Lucas F. diante a técnica de desenho como aspecto predominante das imagens. E as imagens produzidas por Leonardo P. e Leonardo A. com a predominância de colagens.


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Trabalho produzido pela aluna Ketlen. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido por Lucas F. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Trabalho produzido pelo aluno Leonardo P. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Trabalho produzido pelo aluno Leonardo A. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Após a dinâmica de relacionar as imagens conceitualmente, informei-lhes que unificaríamos as imagens produzidas em uma composição que abarcasse todas com um conceito visual que seria estabelecido por eles. Os alunos manifestaram que, diante à proposta da atividade de representar visualmente as culturas sociais, seria importante que todas as imagens permanecessem bastante “misturadas” já que na sociedade diversas culturas convivem entre si. Os alunos consideraram que as imagens que contêm características específicas de uma cultura deveriam estar próximas de imagens que não possuíssem características parecidas, ou seja, que representasse uma cultura diferente. Os alunos informaram que desta forma, estariam fortalecendo o conceito de Diversidade Cultural e Multiculturalidade. Também foi estabelecido pelos alunos que seriam considerados os


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materiais utilizados, e assim, não seriam dispostas imagens em que haviam sido utilizados materiais parecidos lado a lado. Pedi-lhes que me apresentassem uma imagem para iniciarmos a montagem. A aluna Vanessa indicou a imagem produzida por Julie para ser a imagem que conduziria nossa montagem. A partir da imagem de Julie, os alunos decidiam qual seria a imagem seguinte e onde a posicionariam. Desta forma, eles entregavam-me o trabalho escolhido e indicavam-me qual posição achavam mais adequada. Desta maneira, eu montava a composição orquestrada por eles na parede da área coberta.

Montagem unificadora dos trabalhos de Arte-Postal. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Em seguida à montagem da composição, solicitei que dividíssemos a turma em dois grupos para que cada grupo desenvolvesse coletivamente uma carta para enviarmos via Postal juntamente com as imagens produzidas e o registro fotográfico da montagem unificadora recém-realizada, para a escola com a qual nos corresponderíamos. Falei-lhes que cada grupo realizaria um tema escrito na carta, ou seja, um grupo escreveria sobre os critérios da montagem da composição unificadora e o outro grupo escreveria sobre o tema Diversidade Cultural ou Multiculturalidade. Com a etapa seguinte deste encontro aclarada, permiti-lhes que explicitassem como gostariam de unir os grupos e quais alunos seriam responsáveis pelos temas específicos. A turma decidiu designar dois grupos: de meninas e o de meninos. As meninas escolheram realizar a carta explicitando a montagem da composição unificadora dos trabalhos e os


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meninos ficaram responsáveis para escrever a carta sobre o tema que vínhamos estudando, ou seja, a visualidade da Diversidade Cultural. As meninas provocaram os meninos dizendo-lhes que preferiam fazer a tarefa só com as meninas porque eles nunca faziam nada, e ainda disseram-lhes que eles só queriam brincar e que nunca realizavam os trabalhos de maneira séria. Questionei os meninos sobre a veracidade da insinuação das meninas. Todos os meninos negaram esta afirmação e manifestaram que iriam fazer uma carta melhor que a do grupo feminino. Então se estabeleceu um desafio frente às provocações dos grupos, o qual impulsionou a ação dos grupos que iniciaram rapidamente a tarefa. Cada grupo isolou-se em um espaço distante do outro na área coberta. Eles levaram consigo suas cadeiras e se dispuseram em pequenos círculos fechados demonstrando que queriam esconder o texto do grupo alheio. Atendi aos chamados dos grupos e percebi que as meninas trabalhavam muito bem juntas, porém os meninos apresentaram certas dificuldades, já que não eram todos que queriam contribuir e discordavam muitas vezes entre si. Tive que permanecer mais tempo próxima dos meninos para instigá-los a desenvolverem a atividade. Os grupos entregaram-me as cartas assim que o sinal tocou informando o término da aula. Informei a todos que eu colocaria no envelope os textos para remeter para a escola correspondente localizada na cidade de Guaíba. Falei-lhes também que provavelmente na aula seguinte receberíamos os trabalhos via Postal desenvolvido por alunos do Ensino Fundamental de outra escola o que possibilitaria nosso estudo perante as manifestações visuais presentes neles. Os alunos mostraram-se bastante ansiosos. Os dois grupos desenvolveram de maneira clara e objetiva seus textos de maneira coerente com as manifestações dadas nas aulas.


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Carta desenvolvida pelo grupo das meninas ressaltando os critĂŠrios de montagem. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Carta desenvolvida pelo grupo dos meninos ressaltando o tema estudado nas aulas. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Acredito que a aula fora da sala de artes foi um aspecto bastante interessante deste encontro. Os alunos demonstraram bastante motivação diante ao ambiente diferenciado, e se mostraram bastantes curiosos diante a atividade que realizamos em tal ambiente. Um espaço é onde estar, acontecer, ser, viver. A sala de aula, posta como um espaço, situa-se como uma alternativa para estar. A alternativa funda-se na distinção para com outras possibilidades. A sala de aula partilha a categoria da espacialidade com outros espaços, mas a forma de sua ocupação cria a sua especificidade. Portanto, não basta a existência possível da sala de aula para que esta se torne sala de aula. Tal como um cenário, ela não basta para que um enredo todo se desenrole. Da sala de aula resta analisar o que lhe é essencial, isto é, o que sem o qual deixa de ser o que é. É precisamente a atividade desenvolvida em seu interior que a distingue de outros espaços. Ao mesmo tempo, a sala de aula pode ser deslocada para lugares os mais diversos possíveis, pois sua atividade essencial extrapola limites físicos (NOVELLI, 1997, p.44).

Percebi que a roda de leitura de imagens foi bastante instrutiva para todos. Os alunos demonstraram interação entre o grupo contribuindo uns com os outros. Todos participaram de modo eficaz e coesivo. Deste modo, contribuíram uns com os outros em seus discursos relacionais, situação que se desenvolveu de maneira plena frente ao o exercício de desenvolver as percepções visuais, pois o “alfabetismo visual implica compartilhar um corpo de informações e experiências, o que possibilita uma compreensão mais potencializada delas” (NOMA, 2006, p.260).


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3.2.7. Sétimo Encontro: Aulas 13 e 14 (90 minutos - 2 horas/aula) Data: 19/10/2011 – quarta-feira Horário: 4° e 5° período. Das 16 horas ás 17:30 horas. Tema/ Título: Leituras visuais, a comunicação das imagens postais. Arte-Postal: Apreciação e significação.

Conteúdos: - Leitura das imagens recebidas por Correio Postal - Instalação. - Arte Postal. - Fronteiras físicas e meios comunicativos da Arte. - Processo curatorial. - Arte como objeto de diálogo.

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Observar, refletir, discutir e questionar as imagens recebidas por Correio Postal. - Refletir sobre as possibilidades da arte como objeto de diálogo. - Relacionar criticamente as imagens apresentadas. - Desenvolver texto explicativo sobre os critérios da remontagem coletiva do trabalho plástico recebido por Correio Postal.

Objetivos: - Compreender o processo da produção da Arte Postal. - Perceber a prática curatorial. - Compreender a Arte como meio de diálogo


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Metodologia: - Leitura de imagem. - Discussão sobre aspectos simbólicos e formais das imagens observadas. - Desenvolvimento de instalação conceitual.

Materiais e recursos a serem utilizados: Imagens produzidas pelos alunos de outra escola (recebidas por Correio Postal), máquina fotográfica, folha de papel, caneta esferográfica, envelope e endereço da exposição final do Projeto Arte-Postal.

Avaliação: - Participação na leitura das imagens exibidas. - Comprometimento com a proposta de trabalho. - A organização durante o desenvolvimento da atividade.

Planejado: Serão apresentadas aos alunos as imagens recebidas por Correio Postal, e explicado a eles que estas são produções plásticas realizadas por alunos que estudam em outra escola. A partir das observações destas, os alunos desenvolverão uma leitura de imagem e deverão exaltar seus conceitos críticos com relação aos aspectos simbólicos e formais das mesmas. Após, os alunos deverão eleger critérios para a montagem, do trabalho hóspede, para a realização da exposição. Com o trabalho montado para a exposição, este será fotografado e os alunos deverão escrever coletivamente um texto esclarecendo os critérios para a montagem desta instalação. Após, será explicitado aos alunos que critérios os autores da instalação manifestaram, através da leitura de texto conceitual que acompanha as imagens e fotografia do registro da primeira montagem da instalação. A partir desta circunstância, desenvolver-se-á uma leitura comparativa. Ao final da aula, a fotografia e o texto por critérios dos alunos remetentes, serão colocados de volta no envelope original e este será colocado dentro de um novo envelope, junto com o texto com os critérios explicitados pelos alunos durante a remontagem. Será


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explicado aos alunos que após alguns dias de exposição do trabalho hóspede, o mesmo será reenviado para o local da exposição final, onde todos os trabalhos participantes do Projeto Arte Postal serão integrados em uma instalação unificadora.

Realizado: Os alunos chegaram à sala de Artes agitados. Pedi que se organizassem em grupos. Com muita dificuldade solicitei-lhes silêncio. Primeiramente lhes mostrei o envelope remetido a eles pelos os alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora Luiza Teixeira Lauffer, localizada na zona norte de Porto Alegre. Disse à turma que tal envelope continha as produções visuais dos alunos desta escola, que estes alunos também eram estudantes do 5° ano assim como eles. As alunas Julie e Ketlen demonstraram ansiedade em visualizar tais imagens. Expliquei que a turma autora das imagens tinha um número de alunos menor que a turma deles, e por essa situação, cada grupo com dois ou três alunos, iria observar uma figura que eu distribuiria. Primeiramente, minha ação de retirar as imagens de dentro do envelope, deu-se de modo a evolver a turma em expectativas para a visualização das figuras. Retirei uma imagem de cada vez do envelope exibindo-as para visualização de todos os presentes. Logo que os alunos visualizaram as primeiras figuras manifestaram apreciação das imagens dizendo-me frases como: - Ah! Que bonitos os trabalhos! - Todos os trabalhos têm esta coisa marrom colada! Que legal! - Porque a gente não usou esse material marrom? - Estes trabalhos ficaram mais bonitos que os nossos. - Eu também achei mais bonito! Ah sora [sic] os nossos ficaram feios perto desses! - Pra mim os nossos são mais bonitos, porque nós usamos muito mais materiais diferentes.

Expliquei aos alunos que cada turma envolvida no projeto tinha trabalhado com uma temática proposta pelos seus professores e desta forma cada aluno manifestou seus estudos na proposta visual do Projeto. Falei-lhes que os trabalhos realizados por eles estavam excelentes e que não deveriam comparar com as imagens produzidas pelos alunos da escola Professora Luiza Teixeira Lauffer, pois foram realizados a partir de propostas diferentes. Disse-lhes que o “material marrom” usado em todas as figuras através de colagem se chamava cortiça, e era um produto que se estende à variadas utilizações como em revestimentos de solos, isolamentos (térmicos e acústicos), em artigos de decoração, nos componentes para


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calçados e para o setor industrial de diversos segmentos. Falei-lhes também que poderiam perceber o material, cortiça, nas rolhas de garrafas de vinho. O aluno Lucas Luz questionou-me sobre qual seria a temática que os alunos utilizaram para as produções de tais figuras. Com o questionamento do aluno, li as informações sobre a proposta do trabalho contida em um pequeno papel que orientava a montagem da composição realizada pelos alunos da escola remetente: “A proposta para este trabalho era de construírem uma paisagem utilizando diversos materiais e cores vibrantes, com formas empregadas pelo Impressionismo”. A leitura da descrição da proposta temática não aclarou as dúvidas de Lucas. Desta maneira expliquei a todos que a temática orientadora dos alunos da escola remetente tratava de um período da História da Arte chamado Impressionismo, que tratava de aspectos específicos da pintura. Disse-lhes que estes aspectos manifestavam uma construção visual própria que caracterizava tais pinturas dentro de um movimento artístico. Expliquei-lhes que esta seria a proposta que estes alunos estavam estudando e que eu não aprofundaria os conceitos, pois o que nos interessava neste encontro era a fruição das imagens recebidas. Os alunos se conformaram com a explicação e, como estabelecido anteriormente, distribuí uma figura para cada grupo solicitando que os grupos primeiramente observassem a figura para em seguida exporem a todos os presentes as características que mais chamaram a atenção em tais imagens. Após a observação e discussão dos grupos, as alunas Eduarda e Vanessa disseram que gostaram muito da imagem que receberam, pois manifestava um esporte que elas gostavam muito, o skate. Informaram que a frase “Lar dos skatistas” escrita na imagem trazia uma ideia de alegria e harmonia, pois o lugar representado na imagem seria um ambiente muito bonito e “cheio de natureza”.


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Imagem apresentada pelas alunas Eduarda e Vanessa. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Os alunos Gilberto e Lucas Fernandes seguidamente apresentaram a figura que possuíam, indicando que tratava da mesma temática do esporte, ou seja, skate. Eles informaram-me que não gostaram da figura, pois em suas opiniões, a imagem estava “mal feita”.

Imagem apresentada pelos alunos Gilberto e Lucas Fernandes. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Um dos grupos, composto de meninas, mostrou duas figuras indicando que ambas tratavam da temática da natureza e que em suas opiniões achavam-nas muito bonitas. Porém após apresentarem para a turma as figuras, as alunas manifestaram maior preferência e apreciação pela figura que representava a praia.

Imagem apresentada pelo grupo de meninas. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Imagem apresentada pelo grupo de meninas representando a praia. (Fonte: SCHMIDT, 2011)


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Todos os alunos começaram a manifestar impaciência em observar as figuras, distraindo-se em conversas com os colegas. Tal situação implicou na desestrutura do desenvolvimento do exercício de modo coletivo. Insisti na continuação da atividade e com muita dificuldade solicitei silêncio. Em meio a conversas e barulhos, o aluno Vitor apontou sua figura ligando-a ao contexto do grupo das meninas, explicando que a mesma tratava da temática de natureza.

Imagem apresentada pelo aluno Vitor. (Fonte: SCHMIDT, 2011)

Apanhei a figura apresentada por Vitor e mantive-me em silêncio. Permaneci somente observando todos os alunos na sala. Com os alunos observando minha postura, perceberam seus comportamentos inconvenientes e com isso, silenciaram. Com a turma reorganizada, solicitei a Vitor que falasse a todos sobre o comentário que fez sobre a imagem. Pacienciosamente o aluno explicou novamente sua observação. Agradeci a Vitor, e percebendo a impaciência de todos os presentes, solicitei a apresentação de somente mais uma figura para em seguida partirmos para a atividade prática que eles deveriam desenvolver. As alunas Vanessa, Suhelen e Karen apresentaram sua figura dizendo que o contexto visual da mesma distanciava-se das demais imagens apresentadas, pois a temática da imagem que possuíam tratava do tema morte. As alunas apontaram a figura de uma pessoa morta deitada em um caixão e algum suposto familiar carregando flores para homenagear o indivíduo falecido.


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Imagem apresentada pelas alunas Vanessa Suhelen e Karen. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Todos ficaram espantados com o tema e acharam até mesmo engraçada a escolha da imagem a ser produzida pelo aluno autor. Logo em seguida a turma estava novamente agitada e barulhenta. Solicitei silêncio a todos e expliquei-lhes que a atividade que deveriam desenvolver seria a agregação de todas as figuras em uma composição unificadora, como na atividade desenvolvida na aula anterior, onde eles elegeram critérios curatoriais para a montagem da composição de suas figuras desenvolvendo um discurso único. Alguns alunos manifestaram contrariedade em realizar tal atividade, informando-me vontade de desenhar. Uma aluna disse-me: - Ah professora! Deixa a gente desenhar! Por mim eu quero é desenhar, não quero ficar fazendo isso aí!

As atividades com desenho livre como neste caso, [...] não recebem o tratamento adequado a uma abordagem estética numa perspectiva de ensino das artes plásticas. Trata-se de observá-las como instrumento a serviço do registro simbólico de eventos ocorridos em sala de aula, [...] sem preocupação de aprofundamento das possibilidades de tratamento artístico da representação gráfica, pictórica ou tectônica – como deve ser no ensino das artes plásticas ou visuais (JAPIASSU, 2001, p.78).


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Com isso, desconsiderei o pedido da aluna explicando que do mesmo modo como eles desenvolveriam esta atividade com os trabalhos da escola remetente, os trabalhos produzidos por eles também seriam uma ferramenta para o desenvolvimento desta atividade para outros alunos. Com a explicação, a maioria dos alunos manifestou pretensão de realizar a atividade, e outros se abstiveram de realizar a tarefa. Com tal situação, disse a todos que a atividade programada para este encontro seria a montagem dos trabalhos dos alunos remetentes e aqueles que não quisessem participar deveriam, ao invés de desenhar, desenvolver um texto sobre o tema norteador de nosso estudo e a Arte-Postal. Seis alunos preferiram escrever o texto e o restante da turma iniciou a atividade. Os alunos que concordaram em realizar a atividade agruparam-se em duas grandes mesas e dispuseram todas as figuras sobre as mesmas. Com a visualização de todas as imagens, eles começaram a discutir seus critérios organizacionais. Depois de conversarem entre si, os alunos chegaram a uma organização espacial das figuras indicando-me as posições das mesmas seguindo referencias relacionais. Com a concordância de todos, fixamos os trabalhos na parede para fotografar a composição unificadora.

Composição unificadora realizada pelos alunos. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Após a fixação das imagens na parede, solicitei que os alunos escrevessem uma breve descrição sobre os critérios que utilizaram para a realização da composição unificadora das figuras.

Descrição da montagem unificadora das figuras realizada pelos alunos. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Em seguida, mostrei-lhes a fotografia da montagem que os alunos da Escola Professora Luiza Teixeira Lauffer definiram sobre as mesmas figuras.

Fotografia da montagem da composição unificadora realizada pelos alunos da escola remetente. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Após lhes li a frase, escrita por tais alunos, para definir os critérios organizacionais da composição: “A escolha desta formação foi devido às necessidades da vida como: diversão e esporte, descanso e curtição com a família e o final da vida a morte”. Seguindo uma leitura comparativa, os alunos encontraram semelhanças nos posicionamentos de algumas figuras. Como por exemplo, a imagem “Lar dos skatistas” próxima da imagem com representações de árvores, a imagem da praia ao lado da figura de “florzinhas” e por último a figura da pessoa morta.

Os alunos informaram que apreciaram a leitura comparativa, pois perceberam as identificações de seus os olhares com os dos alunos autores. Expliquei à turma que a composição realizada por eles seria montada no hall de entrada da escola para a exposição da comunidade escolar. Disse-lhes que após uma semana de exposição, os trabalhos retornariam para o envelope e seriam enviados para o Santander Cultural, onde todos os trabalhos realizados neste projeto se reuniriam em uma grande composição. Disse a todos que a partir do dia 1 de novembro a mostra Projeto Arte Postal estaria aberta ao público para visitação no atelier do Santander Cultural, onde também estava ocorrendo a exposição do artista Eugenio Dittborn na 8ª Bienal do Mercosul. Os alunos manifestaram animação diante à expectativa da unificação de todos os trabalhos realizados pelos alunos do projeto. Disse a todos que já estava agendado o transporte para levá-los para a visitação da mostra e que seria gratuito. Falei-lhes que a escola entregaria para cada aluno uma autorização que deveria ser devolvida antes da data da visita assinada pelos pais. Todos comemoraram animados. Expliquei aos alunos que este seria meu último encontro com eles em sala de aula. E disse-lhes que a professora titular voltaria a dar aulas para a turma. Os alunos lamentaram o término de nossas aulas, dizendo que gostaram e aprenderam muitas coisas diferentes. Disse-


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lhes que esta não seria a última vez em que nos encontraríamos, já que nosso último encontro seria na visita à exposição Bienal do Mercosul e do Projeto Arte-Postal. Com tal aclaração todos comemoraram. Dispensei os alunos que realizaram a atividade prática da montagem da composição unificadora agradecendo sua dedicação e permaneci em sala com os alunos que realizavam os textos sobre Diversidade Cultural e Arte Postal. Dos seis alunos, dois não quiseram escrever o texto. Estes primeiramente disseram-me que não sabiam o que escrever. Questionei-os sobre seus entendimentos sobre os conteúdos das aulas anteriores. Eles falaram que compreenderam que as Culturas se manifestavam através de músicas, comidas, vestimentas, costumes, etc; e que a Arte Postal era uma proposta artística que circulava, via Postal, por diferentes territórios, permitindo uma comunicação visual com os expectadores de outras localidades. Apesar de terem compreendido as linguagens do tema a ser descrito em formato de texto, estes dois alunos disseram-me que estavam “com preguiça” de passar suas ideias para o papel. Falei-lhes que a escolha era deles, mas que, sem a participação deles nas atividades executadas em sala de aula, as notas de suas avaliações seriam inferiores às dos demais alunos que realizaram as tarefas. Ambos os alunos informaram que não se importavam com a avaliação, pois realmente não queriam escrever o texto e pediram-me para sair da sala. Sem nenhuma opção para que os dois alunos participassem da tarefa, permiti que os mesmos se retirassem da sala. Os demais alunos realizaram os textos sobre Multiculturalidade e Arte Postal.

Texto escrito pela aula Julie. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Texto escrito pela aluna Ketlen. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Texto escrito pela aluna Karen. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Texto escrito pela aluna Vanessa. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Os textos entregues manifestaram ideias bastante objetivas sobre o entendimento dos conteúdos Arte Postal e Multiculturalidade. Percebi que, de modo coerente com os conteúdos estudados em sala de aula, os alunos evocaram nos textos relações culturais de situações cotidianas, aproximando o conteúdo trabalhado nas aulas com suas vivências do dia a dia. Em função deste resultado, concordo com Freedman, pois o autor [...] sugere que a escola deva deixar de ser formalista para ser construtora de significados, e dar importância ao contexto social para definir a identidade cultural de cada aluno. Assim, o propósito da educação artística é... ampliar o significado dos artefatos e sua importância na existência humana (FREEDMAN apud MIR, 2009, p. 93).


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Também, Mir (2009) afirma que a perspectiva social da educação artística é a inclusão da concepção de que o ensino é parte da cultura; promovendo o diálogo que relata os objetos e as ideias formadas em sala de aula para a construção da identidade cultural, a ação social e os múltiplos discursos da arte que o aluno vive fora da escola. Esta perspectiva com relação à educação foi uma experiência que encontrei na prática do estágio com esta turma, pois os conteúdos trabalhados nas aulas despertaram nos alunos a compreensão de perceberem-se integrantes de um corpo social carregado de significados culturais composto de características próprias de cada sujeito como agente da sociedade. Os alunos atingiram o entendimento que músicas, aparência física, ideologias, crenças, alimentos, localidades, historicidade, vestimentas, entre outras manifestações, são características simbólicas do ser humano, assim como as reflexões pertinentes á Arte, repletas de intenções e proposições na sua constituição.


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3.2.8. Oitavo Encontro: Aula 15 Data: 03/11/2011 – quinta-feira Horário: Turno da tarde. Tema/ Título: Aproximação de espaços expositivos. Visita a 8ª Bienal do Mercosul, mostra no Santander Cultural. Eugenio Dittborn e Projeto Arte Postal.

Conteúdos: - 8ª Bienal do Mercosul. - Obras do artista Eugenio Dittborn. - Instalação. - Arte Postal e pinturas Aeropostais. - Fronteiras físicas e meios comunicativos da Arte. - Arte como objeto de diálogo. - Mostra unificadora do Projeto Arte-Postal

Lista de atividades a serem executadas pelos alunos: - Observar, refletir, discutir e questionar as obras do artista Eugenio Dittborn e as imagens produzidas para o Projeto Arte Postal. - Refletir sobre as possibilidades da arte como objeto de diálogo.

Objetivos: - Conhecer a proposta expositiva da 8ª Bienal do Mercosul e da mostra Projeto Arte Postal. - Compreender a Arte como meio de diálogo

Metodologia: - Leitura de imagem. - Discussão sobre aspectos simbólicos e formais das imagens observadas.


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Materiais e recursos a serem utilizados: Visita ao Santander Cultural, mostra das pinturas aeropostais do artista chileno Eugenio Dittborn.

Avaliação: Participação na leitura de imagens.

Planejado: Neste encontro, os alunos irão visitar a exposição do artista homenageado pela 8ª Bienal do Mercosul, Eugenio Dittborn. A exposição localiza-se no Santander Cultural no centro da cidade de Porto Alegre. A visita foi agendada com antecedência e a Fundação Bienal do Mercosul disponibiliza um ônibus para o deslocamento dos alunos até a exposição. Durante a visitação da mostra, os alunos serão acompanhados por um mediador da exposição que aproximará relações entre a observação dos alunos e as obras do artista Eugenio Dittborn. Os alunos visitarão também, dentro da exposição do artista homenageado Eugenio Dittborn, a mostra Projeto Arte Postal, da qual estão participando.

Realizado: Com a chegada à escola, encontrei alguns alunos no pátio já ansiosos para a visitação. Combinei com estes uma localização no pátio da escola e horário, para organizarmos a saída da turma para a visitação a exposição do artista Eugenio Dittborn. Vários alunos informaram que me ajudariam a agrupar a turma enquanto eu ocupava-me verificando junto à coordenadora pedagógica as devidas autorizações e procedimentos necessários para a saída da turma da escola. Dirigi-me à área administrativa da escola para orientar-me sobre como se daria a saída dos alunos da mesma. A coordenadora pedagógica entregou-me uma lista com todos os nomes dos alunos e as devidas autorizações daqueles que iriam à visitação da 8ª Bienal do Mercosul. Informou-me também que a professora titular acompanharia o percurso programado para a turma 50 na tarde deste encontro, porém a mesma ainda não estava presente na escola.


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Com a chegada do ônibus, realizei a verificação dos os alunos que iriam visitar a exposição. Todos os alunos estavam presentes e muito ansiosos para partirem. Porém, a professora titular estava atrasada, e tivemos que ter paciência até a chegada dela. Os alunos, impacientes, pediram para esperarem a professora Cleusa dentro do ônibus. Com o consentimento do motorista e da monitora responsáveis pelo ônibus, permiti que os alunos se organizassem dentro do mesmo. A espera pela chegada da professora deu-se por um tempo curto, e logo que ela entrou no ônibus todos os alunos aplaudiram animados o inicio da atividade programada para esta tarde. Durante o percurso, dentro do ônibus, tive a oportunidade de conversar com vários alunos. Algumas meninas, animadíssimas com a saída da escola, informaram-me que estavam vestindo roupas novas e que pintaram as unhas, escolhendo cuidadosamente cores de esmalte para esta tarde um tanto especial para elas. Já um grupo de meninos, disse-me que estavam ansiosos para visualizarem seus trabalhos na mostra Projeto Arte Postal. Estes me disseram também que sentiam um pouco de vergonha em saber que seus trabalhos seriam visualizados por diversas pessoas. Falei a estes alunos que não precisavam sentir-se com vergonha porque não estavam sozinhos nesta situação, já que havia muitos trabalhos na exposição Projeto Arte Postal, contando com 15 escolas envolvidas em um total de mais de 400 alunos participantes. Os alunos demonstraram mais conformidade com a participação das imagens que produziram na mostra, mas não menos ansiosos para a apreciação da unificação de todas as figuras dos alunos participantes do Projeto. A turma aparentava estar bastante feliz com a saída da escola. Empolgados mostravam-me lanches como salgadinhos, chocolate e pirulitos. Reclamaram da merenda dizendo que sentiam falta de comer guloseimas. Com a chegada ao Santander Cultural, fomos recepcionados pela coordenadora pedagógica da Bienal do Mercosul que nos apresentou uma mediadora para nos acompanhar durante a permanência no espaço expositivo. A mediadora explicou-nos que diversas escolas estavam visitando a exposição e solicitou que mantivéssemos o grupo unido durante a permanência na mostra. Primeiramente a mediadora questionou os alunos sobre que conhecimentos eles tinham sobre a exposição que o Santander Cultural abrigava. O aluno Lucas falou-lhe que lá havia obras do artista chileno de nome Eugenio e a aluna Nataniele disse a ela esse artista trabalhava com Arte-Postal. A mediadora confirmou as colocações dos alunos explicou-lhes que o artista chamava suas obras de “pinturas aeropostais”, mostrando aos alunos alguns


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grandes envelopes (na entrada do espaço expositivo), onde o artista abrigava seus trabalhos para o trajeto para as exposições. Alguns

alunos, curiosos, imediatamente aproximaram-se dos

envelopes

investigando-os. Já outros alunos observavam os detalhes do prédio analisando o grande vitral que cobre o teto e as colunas decorativas que abrigam tal exposição. Com esta situação, informei à mediadora que muitos alunos que estavam presentes nunca haviam visitado o espaço Santander Cultural, e desta forma, pedi a ela que permitisse que eles primeiramente observassem a estrutura do prédio para se ambientassem com o lugar. Pois, “o prédio do museu, como patrimônio cultural, sucinta expectativas e estabelece relações com o imaginário de cada visitante” (GANZER, 2005, p.86). Muito compreensiva, a mediadora concordou e pedimos aos alunos que fizessem uma grande roda no espaço central do andar térreo para a mediadora falar-lhes um pouco sobre o ambiente que abrigava a exposição. Os alunos realizaram a roda como solicitado e a mediadora disse-lhes que o prédio em que eles se encontravam seria uma estrutura histórica construída em estilo neoclássico entre os anos 1927 e 1932 que antigamente abrigava a sede do banco Nacional do Comércio Sul Brasileiro, mas que hoje era um espaço destinado à promoção de atividades culturais como exposições de Arte, projeção de filmes cinematográficos e apresentações musicais. Ela disse aos alunos que, por ser um lugar que abrigava um antigo banco financeiro, no subsolo ainda existia um grande cofre e que caso após a visitação da exposição eles manifestassem interesse, ela poderia mostrar-lhes. Os alunos ouviram com atenção a explicação da mediadora e não revelaram nenhuma dúvida. Alguns alunos falaram que se agradaram com a observação do prédio, dizendo que acharam muito “bonito e grande”. Após, a mediadora conduziu o grupo para a observação de uma das obras de Eugenio Dittborn. Os alunos, admirados com a dimensão da obra do artista andavam de um lado ao outro, envoltos à pintura aeropostal, encarando com simpatia os rostos impressos nas pinturas aeropostais do artista. Logo após eles investigarem a obra, a mediadora pediu-lhes que expressassem suas observações, os alunos, manifestando timidez, não encaravam a mesma, fugindo de seus questionamentos. Manifestei-me perguntando-lhes sobre suas opiniões, e alguns alunos responderam-me que gostaram de ver pessoalmente, pois tal instalação tinha figuras muito parecidas com algumas que lhes apresentei em aula, e ali eles tinham a visão de quão grandes eram os tamanhos das figuras. A observação destes alunos fez-me pensar que


173 A visita ao Museu de Arte provoca o gosto pela descoberta das impressões sensoriais, a curiosidade e o prazer. A proximidade com as obras originais proporciona melhor visibilidade às cores, formas e técnicas utilizadas, interferindo também na relação do espectador com as dimensões das pinturas, dos desenhos ou fotografias e, no caso das obras tridimensionais, com o volume e seu entorno (GANZER, 2005, p.86).

Pintura Aeropostal de Eugenio Dittborn, 8ª Bienal do Mercosul, 2011. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

A mediadora perguntou-lhes sobre suas opiniões sobre os rostos apresentados em tal obra de Eugenio Dittborn. Os alunos informaram a mesma que apresentava desenhos de rostos variados e que estavam intercalados entre “bem desenhados” e “riscalhados”. A mediadora informou-lhes que o artista se apropriava de desenhos realizados por outras pessoas e questionou a turma sobre suas opiniões sobre quais pessoas poderiam ter realizado tais desenhos. A aluna Vanessa logo respondeu que os rostos “riscalhados” só poderiam ter sido feitos por crianças pequenas. A mediadora confirmou a resposta da aluna e lhe disse que, além de serem desenhos de crianças pequenas, alguns dos desenhos “riscalhados” também haviam sido produzidos por pessoas adultas portadores de doenças mentais, mais especificamente esquizofrênicos. Os alunos ficaram surpresos com a revelação dada pela


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mediadora e logo perguntaram dos rostos “bem desenhados”. A mediadora disse-lhes que todos os rostos “bem desenhados” correspondiam a retratos falados de pessoas procuradas pela polícia ou de pessoas desaparecidas. Novamente os alunos surpreenderam-se com a informação dada pela mediadora, e observavam com mais atenção aos rostos expostos.

Detalhes da obra de Eugenio Dittborn. À esquerda exemplo dos rostos “riscalhados”. E à direita exemplo dos rostos “bem desenhados” (ambos apontados pelos alunos). (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Logo, todos os alunos manifestaram impaciência perguntando sobre a mostra do Projeto Arte Postal da qual são participantes. A mediadora questionou a turma sobre a preferência da maioria com relação à observação das obras de Eugenio Dittborn ou a observação da mostra Projeto Arte Postal. Por unanimidade, todos escolheram primeiramente visitar a mostra Projeto Arte Postal. Com a chegada de todos na sala que abrigava a referente mostra, os alunos manifestaram muita empolgação. Agitados, procuravam suas produções em meio a mais de 400 figuras que compunham a composição unificadora de todos os alunos participantes do Projeto Arte Postal.


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Chegada dos alunos à mostra Projeto Arte Postal. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Os alunos investigaram toda a mostra. Admiraram a composição unificadora. Criticaram e elogiaram algumas imagens individualmente.

Aluno Lucas Fernandes procurando seu trabalho. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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As alunas Ketlen e Carolina lendo as cartas e visualizando as fotografias das montagens e remontagens realizadas pelas escolas participantes do Projeto. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Todos reunidos para o registro da visita. (Fonte: SCHMIDT, 2011).


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Após a observação da exposição pelos alunos, a mediadora perguntou à turma se alguém gostaria de falar sobre seu trabalho. Os alunos mostraram-se tímidos e nenhum deles quis comentar a produção. Alguns manifestaram para o grupo que acharam “muito legal” o resultado final da mostra. Logo depois, a mediadora sugeriu a observação de outra obra de Eugenio Dittborn. Os alunos concordaram e nos dirigimos à obra.

Obra sugerida pela mediadora para fruição. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Com a observação da obra, os alunos fizeram diversos levantamentos críticos. Falaram para a mediadora que a reprodução desta imagem já havia sido apresentada a eles em sala de aula. Também disseram, que nesta, eles observavam diversas figuras de rostos e que para eles referiam-se às pessoas da sociedade, como no tema que estudamos, ou seja, a Diversidade Cultural. Indicaram os aspectos formais especificando as transparências que um rosto sobrepunha sobre o outro e também as manchas. Sobre as manchas, os alunos sugeriram a comparativa ideia de digitais, como as impressas nos documentos de identidade. A mediadora instigou a reflexão dos alunos sobre a ausência das linhas das “digitais” relacionando com as figuras de rostos elencados pelo artista, ou seja, pessoas que estavam desaparecidas ou excluídas da sociedade. Os alunos chegaram à conclusão de que as pessoas e


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as “digitais” tinham “tudo a ver” já que os rostos não tinham mais participação na sociedade atual e as “digitais lisas” imprimiam essa homogeneidade da exclusão da identidade dos personagens. Logo, os alunos demonstraram novamente impaciência manifestando à mediadora a vontade de observar as outras obras. A mediadora atendeu à solicitação do grupo e os alunos começaram a se dispersar no espaço expositivo. Eu, a professora titular e a mediadora, incitávamos o grupo a permanecer junto, mas os alunos estavam bastante agitados. Eles não demonstravam mais interesse em permanecer “parados” observando as obras. Eles ansiavam por circular no espaço da exposição pouco se importando com a visualização das obras. Com tal situação, a mediadora ofereceu aos alunos a visita ao subsolo onde eles poderiam conhecer o “grande cofre” e o Acervo da Moeda. Todos concordaram e mostraram-se curiosos para conhecer o local. Visitamos rapidamente o Acervo da Moeda e os alunos ficaram bastante impressionados com a porta do antigo cofre central. Após a mediadora ofereceu uma atividade no espaço pedagógico, onde havia materiais para desenho. A turma manifestou interesse e nos dirigimos para tal espaço. No espaço destinado às atividades pedagógicas, a mediadora entregou quatro Postais com imagens de Eugenio Dittborn impressas e solicitou que os alunos escrevessem sobre a experiência da visita, escolhendo professores ou funcionários da escola em que estudavam para que este fosse enviado a estas pessoas. Os alunos escolheram enviar seus Postais para a diretora, para a merendeira, para a professora de Ética e para mim. Após a mediadora entregou folhas e materiais como canetinhas hidrocores e lápis de cor para os alunos realizarem desenhos.


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Os alunos realizando atividades no espaço pedagógico da 8ª Bienal do Mercosul. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Os alunos realizando atividades no espaço pedagógico da 8ª Bienal do Mercosul. (Fonte: SCHMIDT, 2011).

Todos os alunos apreciaram realizar as atividades no espaço pedagógico da 8ª Bienal do Mercosul. Após tais atividades retornamos à escola.


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Conclusão Considerando todos os aspectos observados durante minha prática de Estágio, hoje compreendo que as experiências vivenciadas através deste possibilitaram-me um grande amadurecimento frente à percepção de uma ação educativa coesa. Entendo hoje que os obstáculos que surgem na prática educacional devem ser atentamente observados, pois é através destes que alcançamos a tal amadurecimento. O processo educativo, as contribuições que a aproximação da pessoalidade do aluno produz frente ao objeto de estudo, a linguagem crítica e interpretativa que a visualidade proporciona e a prática da produção visual, são apenas alguns dos elementos que me possibilitaram diversas indagações para uma reflexão mais compreensiva das necessidades e contribuições que um projeto de ensino pode oferecer para os educandos. Frente aos alunos e meus planejamentos para a Prática de Estágio notei inicialmente que os anseios dos educandos, para com a disciplina de Artes, partiam do pressuposto de que a aula se dava apenas somando exercícios de desenho. Já minha proposta educativa objetivava o desenvolvimento de um olhar crítico e interpretativo, uma metodologia muito distinta daquela a que os alunos estavam habituados. Deste modo, percebi que minha prática docente partiria de uma atuação educacional diferenciada para os alunos e meu maior desafio seria integrar os educandos nesta nova proposta. No primeiro encontro, assim que os alunos chegaram à sala de audiovisual e se depararam com a sua recepção na mesma, ambientalizada com música, manifestaram estranhamento e curiosidade. Todos ficaram intrigados sobre como iriam desenhar na sala de áudio visual e com música. Através deste fato, percebi que para eles a expectativa de sua participação na disciplina não partia de algo novo. Os alunos esperavam nada mais do que o ato de desenhar. Iniciei minha prática docente explicando-lhes que a proposta educativa que eu lhes proporia se daria através de um tema norteador, ou seja, a Diversidade Cultural. Noto hoje que minha ansiedade em desvendar as expectativas dos alunos frente a uma nova metodologia e conteúdos apurou-se de modo que comecei muito rapidamente a apresentação do conteúdo temático, sem aclarar para os alunos minhas intenções e planejamentos para o estudo da disciplina. Apresentei-lhes quase imediatamente as imagens das culturas sociais sem antes ouvi-los e explorar com mais calma suas observações e conhecimentos frente ao


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tema. Porém, apesar de não ter explorado as ideias e conhecimentos dos alunos previamente, conforme observávamos as fotografias, os alunos explicitavam-me suas bagagens de informações sobre as muitas culturas que se manifestavam em seus cotidianos, como a aproximação e apreciação da cultura gaúcha e italiana pela parte da maioria deles. Do mesmo jeito, eles também expressavam de maneira crítica os muitos modos como se lê visualmente um indivíduo na sociedade, relacionando aspectos religiosos, musicais, de indumentária, alimentares, tradicionais, físicos, entre outros que sugerem atuações culturais da sociedade. A partir da observação de diversas fotografias de indivíduos da sociedade, e estabelecendo relações com as proximidades e diferenças culturais destes, os alunos compreenderam que uma cultura manifesta-se visualmente a partir de seus signos, características

e

significados

próprios

de

seus

interesses,

conceitos

específicos,

intencionalidades, etc. Tais relações mostraram-me que a temática poderia render bons frutos em minha prática de Estágio. Porém, ao final do primeiro encontro, durante o exercício dinâmico da construção da “Teia Cultural”, percebi que em meus planejamentos eu não havia previsto que os alunos manifestassem dificuldade em expor ao grupo a que cultura pertenciam. A identidade pareceu-me um aspecto que ainda não estava presente ou desenvolvida na vivência deles de modo pessoal. Alguns alunos usavam a referencia de sua família como origem cultural de hábitos, comportamentos, historicidade e interesses, sendo que a maioria dos alunos exemplificou tipos de alimentos, roupas e origem histórica como aspectos relevantes de sua atuação cultural. Outros alunos já buscavam suas próprias referencias, sendo que a maioria manifestou a expressão musical que mais apreciavam, explicando os tipos de roupas ou versos das letras das músicas que seriam significativas para eles. Mesmo inicialmente deparando-me com as incertezas dos alunos perante a sua identidade pessoal e social, consegui engajá-los na dinâmica da “Teia Cultural” instigando-os a pensarem sobre seus interesses, gostos e preferencias para estabelecerem relações com as culturas da sociedade, situação que acredito que se estabeleceu de modo muito satisfatório. A partir da dinâmica da “Teia Cultural” também acredito que, de modo lúdico, os alunos alcançaram a compreensão de que o emaranhado de barbante significava muito mais do que apenas linhas embaraçadas, pois os alunos entenderam que cada linha exposta ali representava um discurso, um conceito que eles haviam construído. Tal prática aproximou os alunos de uma reflexão mais aprofundada sobre o conceito da representação simbólica de um objeto e da Arte.


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No segundo encontro, a atividade que propunha a reflexão sobre as características presentes em objetos do uso cotidiano específicos de uma cultura, estabeleceu-se da parte dos alunos com discursos muito pertinentes quanto aos termos utilizados na Arte, favorecendo uma leitura dinâmica que abrangeu o entendimento dos aspectos simbolistas e formalistas dos objetos em sua tridimensionalidade e totalidade de características alegóricas significativas de cada cultura. Os alunos não apresentaram nenhuma dificuldade em expressar suas observações sobre a linguagem visual dos objetos, situação que ultrapassou minhas expectativas. Termos linguísticos como leveza, brilho e movimento, surpreenderam-me diante a minha expectativa. Os alunos mostraram-se ótimos observadores, e ao explorarem os questionamentos sobre suas visões frente a um objeto, vejo que a possibilidade do alcance de uma percepção mais aguçada se dá através dos estímulos dados aos educandos através de seus próprios questionamentos sobre as representatividades de determinados elementos visuais. Entendo que, através dos questionamentos sobre que aspectos os alunos identificam em suas observações, eles alcançam resultados mais elaborados no entendimento do objeto de estudo. Com isso penso que a aproximação entre o objeto de estudo e a bagagem/pessoalidade do aluno dinamiza a sua integração à proposta educativa, situação que confirmei no terceiro encontro, em que novas concepções de vivência cotidiana estabeleceram-se para os alunos a partir da aproximação de alguns conhecimentos relacionados aos hábitos indígenas. Os objetos confeccionados pelos indígenas Kaingang e Guarani estimulou o olhar dos alunos, já que anteriormente estes não manifestavam significados para eles, e este novo olhar partiu de uma diferente observância investigativa. A curiosidade impulsionava a verificação das informações presentes no objeto.

O estranhamento e a aproximação à

realidade indígena possibilitou um novo olhar sobre determinadas práticas que antes não carregavam significados para os alunos. Nos arredores da escola, percebe-se a presença de indígenas Kaingang, e os alunos os reconhecem, pois a escola localiza-se próximo ao Morro do Osso, local onde se estabelecera uma tribo Kaingang. Os alunos lembraram-se também da presença de indígenas Guarani em locais por onde passam na cidade, como a região central de Porto Alegre e a feira de artesanato Brique da Redenção. Vejo hoje que estimular a percepção do aluno quanto a sua relação de proximidade com o objeto de estudo em sua realidade é um fator significativo. Tal percepção proporciona aos educandos uma atuação autônoma significativa em seu cotidiano, de modo a tornarem-se sujeitos multiplicadores de conhecimentos em seu meio social.


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Igualmente, o tema e músicas indígenas apresentados no terceiro encontro estimulou a aluna Suhelen a expressar seus sentimentos pessoais. O pai da aluna é de etnia indígena e Suhelen explicou-me que a ação plástica que ela desenvolvia neste encontro exprimia sua imaginação quanto ao sentimento de não conhecer seu genitor e também de sua família, que desconhecia o paradeiro dele. O trabalho visual de Suhelen ampliou-se plasticamente no sentido de que, em sua proposta extremamente pessoal, estímulos intensos de sua imaginação individual permeavam sua ação. A prática da aluna na execução da tarefa visual implicou informações visuais subjetivas relativas ao resultado final da imagem, reproduzindo sentimentos e anseios pessoais da aluna. Do mesmo modo, no quinto encontro, surpreendi-me com Suhelen e com o aluno Gilberto, pois, neste encontro, fiquei a par da informação de que eram primos-irmãos, e ambos apropriaram-se da identidade indígena para a execução da tarefa plástica, vinculando suas origens familiares ao estudo. Tal situação me levou a pensar que a pessoalidade do educando manifestada em seu enfoque expressivo, fortalece o aprender significativo na construção do conhecimento, pois os aspectos cognitivos e relacionais, de modo integrado, facilitam a apreensão do significado do estudo. Outra situação que me fortaleceu a ideia de que o ensino deve ser vinculado à pessoalidade e bagagem intelectual do aluno ocorreu também no terceiro encontro. Percebendo que os alunos nunca haviam estudado história da Arte, vários alunos mostraramse surpresos em dialogarmos sobre a historicidade da Literatura de Cordel. Os alunos se admiraram ao compreenderem que é possível aproximar Arte e História e, com tal admiração, uma aluna chegou a questionar-me seriamente sobre minha formação como educadora, pois, diante à reflexão que alcancei com eles, na opinião da aluna, eu demonstrava mais aproximação com o discurso da professora de História. Esta observação soma-se a outras que manifestam estranhamentos da parte dos alunos durante a prática de meu estágio. Apesar do estranhamento de conteúdos considerados pelos alunos pertencentes “somente” à disciplina de História, todos participaram de modo condizente com o aprofundamento teórico sobre a historicidade da Literatura de Cordel. Acredito que o tal aprofundamento teórico/histórico assumiu aspectos muito significativos no sentido de que os alunos manifestavam os seus conhecimentos de modo espontâneo e os “costuravam” com as novas informações que adquiriam. Neste encontro, de modo independente e atuante na proposta, os alunos completavam coletivamente a construção do raciocínio sobre o surgimento e origens da Literatura de Cordel, vinculando seus conhecimentos prévios caracterizados na disciplina de História com a disciplina de Artes.


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A mesma construção de raciocínio se deu através de diálogos coletivos provenientes das conjecturas vindas dos alunos em outros encontros, os mesmos aproximavam o objeto de estudo de sua realidade. Percebi que este diálogo desenvolvia de modo rico uma aproximação mais estreita com o conhecimento que adquiriam. Agreguei esta metodologia em diversas situações, visando inferir os alunos a uma posição atuante na construção de seu conhecimento. A reflexão dos alunos sobre a Bienal do Mercosul, no quarto encontro, ficou bastante aclarada a partir desta prática. A definição do termo Bienal do Mercosul foi revelada pelos alunos através de seus sentidos, ou seja, alcançando de modo coletivo a ideia que tal mostra acolhia uma exposição de Arte na cidade de Porto Alegre cuja ocorrência se dá de 2 em 2 anos e que exibe obras artísticas realizadas por artistas pertencentes aos países do Mercosul. Também as conjecturas dos alunos através da leitura de imagens os levaram a alcançar uma experiência de critica visual, através da visão de algumas das reproduções das obras da artista Rosana Paulino. A reprodução da obra “Tecido Social” promoveu a aproximação dos alunos frente à critica aos questionamentos sociais. Os alunos compreenderam que a obra de Paulino remetia a uma critica social munindo-se da historicidade africano-brasileira. Eles entenderam também que o cotidiano em que vivemos remete a diversos preconceitos, como o racismo e a exclusão social, vistos pelos alunos nas reproduções das obras realizadas pela artista. Percebo que a aproximação do objeto crítico social (neste caso exemplificado pela obra de Paulino) e seus conceitos culturais implícitos, desenvolvem questionamentos e posicionamentos ideológicos na reflexão do educando de modo construtivo e aclarador em suas experiências cotidianas. A partir desta ação, acredito que possa ser semeada a atuação de um sujeito transformador e questionador de comportamentos sociais de sua realidade circundante. Os alunos “costuraram” a historicidade afrodescendente brasileira aos dias atuais desvendando conceitos sociais estabelecidos em suas experiências de vida, e, nestas, percebe-se que se firma um papel fundamental na construção da importância do indivíduo transformador, compromissado com a contextualização da atuação social, crítico e construtivo de seu próprio meio. Também neste encontro as relações que os alunos estabeleceram sobre a Arte Postal e a Diversidade Cultural (possibilitadas através das observações das reproduções das pinturas aeropostais do artista Eugenio Dittborn) manifestaram a própria poética que o grupo estabelecia frente ao aprofundamento do tema. Os alunos desenvolveram seu próprio discurso explicitando que, através da possibilidade postal, muitas culturas poderiam se comunicar e


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dialogar, e que a Arte comunicar-se-ia viajando por diversos países, apresentando visualmente os conceitos implícitos em seus discursos. Percebi, através destas manifestações dadas pelos alunos, que a capacidade deles em estabelecer elementos subjetivos e interpretativos poderia ser mais ampla do que eu imaginava. Também, no sexto encontro, percebi a excelência da metodologia de construção coletiva de raciocínio aplicada ao processo investigativo da construção reflexiva da poética artística, utilizando a prática curatorial para compreensão dos alunos. As indagações direcionadas aos alunos possibilitaram, através de tal metodologia, que eles construíssem análises reflexivas consideravelmente surpreendentes para mim, como as reflexões sobre termos como curadoria, Bienal, geopoética, poética. Através da dinâmica realizada de prática de exercícios reflexivos frente à experimentação do processo curatorial, os alunos estabeleceram diversas e diferentes relações comparativas referentes às muitas linguagens específicas da Arte. Tal prática promoveu o exercício de um olhar mais atento, resultando em uma leitura vinculada a aspectos comparativos relacionais caracterizando a construção, representação e interpretação das imagens observadas. Questões como a existência de diversas culturas e que estas apresentam diferentes modos de manifestação na sociedade, a interculturalidade apresentada na existência humana e técnicas empregadas na construção das imagens, exibiram, durante esta dinâmica, conceitos poéticos bastantes ricos desenvolvidos pelos alunos. Percebo que os educandos compreenderam e utilizaram critérios interpretativos excelentes na construção da composição visual curatorial, que construíram coletivamente, abarcando com coerência as relações conceituais que discutíamos em nossos encontros. Com referencia aos levantamentos acima, posso afirmar que as intenções iniciais do projeto de ensino foram alcançadas. Os alunos desenvolveram um posicionamento interpretativo, crítico e atuante nas aulas, desvencilhando-se do comportamento pacífico de acreditar que as aulas de Artes partissem somente de exercícios de desenho ausentes de significados influentes no seu pensar pessoal. Os “estranhamentos” mais significativos dos alunos frente à metodologia referiram-se às atividades plásticas. O medo de “errar” e a insegurança permeavam todas as ações plásticas que os alunos desenvolviam. Diversas vezes, notei que os alunos mostravamse bastante inseguros ao inicio das atividades práticas, e em muitas destas situações, o maior bloqueio dos educandos era relacionado ao temor de “errar” na construção de sua tarefa plástica. Para contornar esta situação, lembro-me do segundo encontro, em que cada aluno necessitou de uma orientação individual que visava mostrar-lhes que a sua insegurança resultava em um bloqueio para a realização da atividade. Com este entendimento, os alunos


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compreenderem que a experimentação era um fator vitalício para a construção de um resultado plástico almejado. No terceiro encontro, a proposta de utilização de uma dimensão de suporte diferenciada para os educandos (papel A2), possibilitou um estímulo suplementar para os alunos diante à proposta que se daria. Tal proposição apontava uma diferenciação espacial para estimular novas expressões plásticas e visava desestruturar a “mão domesticada” dos alunos, suas preocupações com o “erro”, e estimular o prazer do fazer. Preocupações frente a tarefas plásticas (certo ou errado) que sempre permeavam atividades práticas do grupo, neste encontro não se manifestaram, pois percebi que vários alunos permitiram-se o prazer da experimentação sem preocupações durante a ação plástica. A ação da aluna Carolina foi um exemplo da insegurança dos alunos frente às tarefas práticas visuais. A aluna manifestava um “apego” ao uso da borracha e a falta de “coragem” de utilizar tinta ou qualquer material que “marcasse” definitivamente o papel, resultando em imagens que revelavam tais inseguranças. Porém, ao desafiar a aluna a deixar de utilizar a borracha e investir no uso de tinta guache ou hidrocor, transmiti a ela a confiança de que, com a utilização de tais materiais, alcançaria novos estímulos para resolver a construção de sua figura. No primeiro momento, a aluna não aceitou minha sugestão, mas em seguida enfrentou o desafio. O resultado do trabalho visual da aluna Carolina manifestou uma ótima exploração gráfica do suporte revelando linhas gráficas ricas e gestos ritmados supreendentemente ousados quando comparados à ação que a aluna vinha desenvolvendo anteriormente. Também a aluna Dienifer chamou minha atenção neste encontro devido ao fato de que no início de sua ação plástica ela partia de desenhos estereotipados, e após, percebendo a ação prazerosa dos seus colegas explorando o papel de forma gestual e investigativa com os materiais, Dienifer optou em partir de um novo princípio de construção visual completamente contrário à ação que vinha desenvolvendo. A aluna solicitou-me outro papel e, a partir do novo suporte, iniciou sua ação plástica visando à experimentação dos materiais e priorizando o prazer da ação. Dienifer concluiu a atividade satisfeita em permitir-se realizar tais ações, valorizando mais o processo que se deu do que se importando com o resultado final da construção imagem. Ao concluir o terceiro encontro, senti-me satisfeita por ter observado o fazer gestual, prazeroso e experimentativo dos alunos. Porém já no encontro seguinte, ao sugerir a visualização de todas as imagens frente ao grupo, os alunos demostraram vergonha, e, alguns deles, de modo algum queriam revelar sua imagem. Apesar dos alunos manifestarem vergonha em exporem à turma seus trabalhos experimentativos e gestuais realizados no encontro anterior, todos compreenderam que o resultado final das imagens partia de um


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processo que visava deixar a preocupação do “adestramento” de suas mãos e a insegurança em realizar tarefas plásticas. Percebendo esta situação, noto que a inquietude auxiliou no processo do entendimento da atividade. A reprodução “Cavalo na Paisagem” de Franz Marc acrescentou a este entendimento para os alunos, a partir da compreensão de que o “cavalo vermelho” da reprodução representava o anseio e imaginação do artista possibilitado pela Arte. Deste modo, os educandos entenderam que a Arte também revela as possibilidades de quem realiza a ação de criação. Com tal reflexão, os alunos se identificaram como pertencentes a este mundo de possibilidades e compreenderam que poderiam se permitir partilhar de gestos imaginativos ou espontâneos fluidos de sua própria ação. Após os alunos alcançarem tal compreensão sobre os objetivos do exercício que se deu (desvencilhando-se da vergonha), partimos para a visualização de suas produções visuais. Eles identificaram elementos visuais na leitura das imagens produzidas manifestando linguagem apropriada em suas proposições, pronunciando conceitos coerentes com as características formalistas da construção visual. O diálogo dos alunos indicou riqueza no âmbito da apreensão dos novos conhecimentos. Percebo que as leituras se deram em função do estímulo dado à percepção visual do grupo frente às imagens produzidas, analisando estas coletivamente. Ampliando suas visões, a ação coletiva de analisar os diferentes gestos de construção gráfica possibilitou a apreensão de novas linguagens visuais no repertório interpretativo dos alunos diante de uma imagem. Do mesmo modo, em vista ao “temor do erro”, entendi através dos argumentos do aluno Leonardo, que no quinto encontro me apresentou animado e satisfeito a figura que criou representando a “Cultura Agrícola”, a importância do ato de “fazer” na Arte. Pois, frente ao argumento e ao prazer da construção da figura finalizada por Leonardo, percebi que a avaliação que eu teria daquela situação se daria de um modo um tanto peculiar. Pude acompanhar o processo de Leonardo durante a execução da tarefa plástica e, através deste, percebi que o aluno exercitou de modo intenso a ação do fazer. Leonardo, em seu processo criativo, desenvolveu diversos arranjos coerentes com a proposta da atividade. Porém, em seu resultado final, o aluno desviou-se da proposta, e, ao ser questionado sobre o resultado final, encontrou seus próprios conceitos para justificar a figura que desenvolveu. Neste caso, acredito que Leonardo saiu-se muito bem no processo da criação de sua imagem, mas não tanto no resultado final da figura. Mesmo sem uma finalização alinhada com a proposta, a própria investigação criativa do aluno e seu ato de “fazer” já corresponderam de modo positivo à atividade. Aprendi que o ato de fazer permite que o educando invente e descubra coisas, que se aventure em um mundo desconhecido, não tendo medo de criar. Pensando neste


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contexto, o professor possibilita que os alunos ampliem seu vocabulário visual e que deem asas as suas imaginações. Os alunos, sem a perseguição do “temor do erro”, começam a criar seus conceitos e relações a respeito do que aprendem, criando o seu campo de sentido, como o aluno Leonardo me demonstrou. Com relação ao comportamento dos alunos, a prática de estágio mostrou-me diferentes contextos que anteriormente eu não vislumbrava. No primeiro encontro, fiquei desconcertada ao estabelecer o que seria um bom rendimento ou comportamento adequado para um aluno pela atitude do aluno Igor, que ora mostrava-se agitado, rindo e conversando com os colegas, ora participava ativamente das discussões que se estabeleciam na leitura das imagens. Hoje, percebo que cada educando possui particularidades comportamentais, e o aluno Igor, por ter um comportamento agitado e ao mesmo tempo bastante participativo, ajudou-me a entender que a atitude estática de um educando não acrescenta nada à ação educativa. A contribuição do aluno mostrou-se como um fio condutor no engajamento do objeto de estudo para a turma. Muitas vezes, durante minha prática de Estágio, acredito que confundi desinteresse dos alunos com comportamento negativo. Noto que algumas dificuldades que tive com relação a inserir os alunos nas propostas, seguiram de ocasiões em que meu dialogo em sala de aula possa ter se estendido muito, pois parti de um pressuposto de que as relações conceituais do estudo implicavam (para mim) uma importância maior do que realizar uma atividade prática que fosse mais significativa no entendimento pessoal do aluno. Percebo hoje que minha postura demasiadamente conceitual frente ao conteúdo, em alguns momentos, não se adequou ao ritmo do grupo, resultando no desinteresse pela minha fala por parte dos educandos. No sétimo encontro, apesar da agitação inicial, os alunos se mantiveram alinhados com a proposta planejada para o encontro somente no primeiro momento da aula. O primeiro aspecto frente à fruição das imagens remetidas a eles, produzidas pelos alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora Luiza Teixeira Lauffer, referiram-se à verificação analítica das técnicas empregadas e dos materiais utilizados nas construções das imagens. Após, os alunos manifestaram, através de suas observações, as características figurativas das imagens, identificando sua representatividade e inserindo-as em seus contextos pessoais relativos ao seu meio físico e social circundante. Porém, em seguida, a turma manifestou desinteresse em dar continuidade à observação das figuras e em estabelecer aspectos conceituais e relacionais frente às mesmas. Diante a tal circunstancia, o grupo desestruturouse, e eu, sem perceber naquele momento seus anseios, não levei em consideração a falta de


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disposição dos alunos com a proposta. Alguns alunos me indicaram o desejo de desenhar e explicitaram-me o desinteresse em estabelecer reflexões conceituais. Porém, infelizmente, naquele instante não percebi que a proposta deveria seguir outro rumo, e insisti na pratica educativa planejada que desestimulava os alunos por ser demasiadamente conceitual. Apesar da maioria dos alunos engajarem-se na proposta (noto hoje que esta se deu frente à minha insistência), identifico atualmente que eu deveria ter levado em consideração, e dado maior importância, para o interesse de todo o grupo, pois hoje percebo que, a partir da consideração dos indícios implícitos nos comportamentos dos alunos, se pode promover um aprender motivador. Também no quinto encontro, as confidências do aluno da turma 52 (que me pediu para participar da aula), que se referiram criticamente à postura da professora titular e suas proposições educativas, me fizeram refletir sobre a importância da existência de uma relação estreita entre professor e alunos. O argumento de “praxe” dado pela maioria dos professores/educadores é a de esperar somente do aluno um bom comportamento. Porém, as observações do aluno levaram-me a pensar que, antes de avaliar o comportamento do aluno, devamos perceber a adequação da postura do professor. Penso que, evidentemente, o papel do educador deve indicar uma postura coerente a sua posição, e, a partir desta, é possível que, de modo recíproco, os alunos mantenham um acordo de respeito, integração e horizontalidade nas trocas e permanências em sala de aula. Considerar que o aluno não se motivou com a proposta do professor é um desafio para muitos educadores, porém, o aprendizado deve partir da premissa de que deve ser significativo e prazeroso para o educando de modo que este se sinta estimulado a ponto de, de modo autônomo, buscar informações ou praticas de seu interesse. Acredito que, a partir deste reconhecimento, o educador pode contribuir com muito mais destreza no desenvolvimento cognitivo de seus alunos, e a perceberem-se como sujeitos críticos, inventivos, participativos e comprometidos com seus interesses. As relações conceituais foram amplamente fomentadas aos educandos em minha prática de Estágio, e estes responderam positivamente a este estímulo mostrando um excelente amadurecimento cognitivo através dos estímulos perceptuais visuais, críticos e relacionais. Porém, em diversas situações, os alunos ansiavam por estímulos práticos, ou seja, realizar tarefas/propostas plásticas, experimentar novos materiais e técnicas. Entendo hoje que excedi propostas de exercícios conceituais interpretativos, e percebo atualmente que a faltou a inclusão de mais estímulos plásticos durante a minha prática docente, pois esta falta influiu de modo incômodo para os alunos em algumas


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situações. Essa questão é muito mais ampla do que neste momento posso discutir, porém, neste momento, vejo que este desfecho contribuiu de modo positivo em minha reflexão como educadora, e compreendo que devo estar mais atenta aos desejos e anseios dos alunos, integrando suas conjecturas às minhas propostas educativas. No momento atual, tomo consciência de que as intenções do professor devem ser vistas como agentes colaborativos e facilitadores para o desenvolvimento educativo do aluno, e estas, bem alinhadas com as expectativas dos educandos, os mantêm inclusos na proposta educacional de modo a contribuir amplamente para que os mesmos tornem-se autores de sua própria desenvoltura de aprendizado. Pois, conforme atribuído a F.W. Sanderson, o essencial na aprendizagem é a vontade de aprender.


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200

ApĂŞndices


201

Apêndice 1 Avaliação da Aluna Estagiária realizada pela professora da escola de Estágio


202


203

Apêndice 2 Questionário respondido pela diretora da escola de Estágio


204


205


206

Apêndice 3 Questionário respondido pela professora da escola de Estágio


207


208


209

Apêndice 4 Questionários respondidos pelos dos alunos da escola de Estágio


210


211


212


213


214


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