REVISTA ARTE TRANS BAHIA 8ª ED.

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EDMÉA BARBOSA “Quem quiser ser como eu aprenda a escutar, deixe o seu espírito falar e encarne um personagem com coragem. Quando estou num palco a Bagageryer Spielberg é a senhora absoluta da minha cabeça ela é o ar que respiro. Ela comanda e eu o André, obedeço, a amo de paixão, ela toma conta de mim”. André Luis Sousa “ (Entrevista ao Gstuds.com)

André Luiz é Bagageryer Spielberg Uma das maiores trasformistas do Brasil F

ui recebida por André no dia 18 de agosto de 2016. A entrevista estava marcada para as dez horas, rabisquei alguns pontos que gostaria de perguntar e adentrei o cuidadoso apatamento. Por mais que hajam muitas informações na internet, por maiores que sejam as reportagens e entrevistas de Marcelo, do Portal Marccelus, de Genilson Coutinho do Dois Terços, por mais que muita gente já tivesse me contado um pouco de quem é a personagem vivida por André, quis ver de perto, queria ouvir aquela história sendo contada para mim. Os rabiscos não me serviram de nada, pois a cada palavra que dizia, me perdia, me sentia vazia na imensidão de vida que existe ali, parecia um filme sendo narrado. Uma pessoa de voz firme, porém, em tom baixo. A certeza das palavras ditas, não me restavam dúvidas, estava diante de um dos maiores ícones da história do transformismo baiano. André, virginiano, bonito, leve, sedutor, educado, cauteloso, cuidadoso, só posso cantarolar o que pensei: “Um homem bonito assim, o que quer de mim, o que ele fará comigo?” Vanessa da Mata embalou minha mente, até que fui sendo encantada, encantada de forma envolvente e perigosa, novamente me apaixonaria pelo transformismo baiano.

Ele me contou sobre o início, sorria, dizia “não lembro”, sorria e dizia várias vezes “tenho tudo guardado”... Ao chegar ao fim da entrevista, lá estava eu, boba, envaidecida por ter tido a entrevista que tanto desejava, lá estava eu pedindo a Deus para saber escrever, descrever tudo que havia escutado. Uma aspirante, uma comunicóloga com o áudio de alguém que admiro, de uma estrela, de um ser que é um dos profissionais mais incríveis que o Brasil tem. Aqui estou, com a missão de contar quem é Bagageryer Spielberg. Baga é uma criação de André, porém a apresentadora, atriz, produtora, mestre de cerimonias, além de ter uma impecável dublagem, é mestre em imagem. Após 30 anos de carreira, conseguiu manter a sua imagem como diva por todo o tempo. Inicialmente incentivada por pessoas amigas, construiu sua carreira em um ciclo de perfeição, leveza e muito profissionalismo. Aplausos, em cena Bagageryer Spielberg.


Em 1985 o ator transformista André já era fã de Maria Bethânia. Além da diva, o cantor Ney Matogrosso, também embalava a vida do jovem. O caminho para uma carreira de sucesso, como transformista, começou na Tv Itapoan, em 1985 quando “Tia Arilma” promoveu um concurso para sósia de Ney Matogrosso, no programa “Show da Tarde”. André incentivado pelos amigos candidatou-se e após algumas disputas, conquistou o primeiro lugar. Além do valor em dinheiro, o ganhador tinha a chance de participar do programa de Silvio Santos no SBT, porém, o medo da família, entre outros fatores, impediram o ator de participar. “Fiquei apenas com o prêmio em dinheiro, era muito novo e tive medo”. Não conhecia os palcos do transformismo, não frequentava. O primeiro show de transformismo que viu foi de Dion, dali passou a conhecer outras performances. “Existia uma transformista aqui, Marcela do Nascimento, uma paulista que morava na Bahia e que fazia, Bethânia, eu ia assistir, pois achava ela muito próxima de MB visualmente.” Em 86, aconteceu o concurso de beleza no Rio Grande do Norte, os amigos novamente incentivaram e presentearam André com a viagem. Surgindo então a “MURIEL GANNA BAGAGERYER SPIELBERG, concorrente Miss Suazilândia, a qual foi escolhida como a mais elegante da noite e ainda uma das finalistas com o 4º lugar. “Foi a primeira vez que me vesti de mulher” Ao voltar para Salvador, trazia na bagagem não só a elegância demostrada na passarela, mas também o início de um legado profissional cheio de comprometimento com a arte. Foi convidada por Dion para fazer um show na boate Caverna de Gilson Bezerra, passou a fazer Zezé Mota e a se inserir na cena como convidada das estrelas da época.

1986

1987

Não tinha pauta fixa, dublava e vez ou outra declamava um poema, uma de suas paixões. As casas com shows de transformismo eram a boate Tropical, Caverna, Is’kiss, Holmes, e o Âncora do Marujo em outros formatos, de Fernando. Algum tempo depois as saunas chegam com força total e também abriram espaço de shows. A chegada na cena foi tranquila, o profissionalismo era destaque, apesar de ser uma novata, foi muito bem aceita. Das artistas que se apresentavam era possível identificar nomes como Marina Garlen, Dicca Rios, Lion Schinneider, Alan Leide, Suzana Vermon, os Monges, Pamela Raia, Karine Bergman... O diferencial de Baga era justamente o perfil inspirado em Maria Bethânia, as músicas, a poesia. Enquanto algumas artistas faziam a dublagem, imitações, espetáculos, gritavam palavreados tidos como de baixo calão, faziam brincadeiras pesadas com colegas, Baga dedicava-se em levar a poesia, a literatura e principalmente o profissionalismo de MB. Uma vertente prazerosa do transformismo, afinal o criador de Baga tem um conhecimento detalhado da arte de Bethânia. Era uma nova personagem, com uma grande vantagem, se aproximava de uma estrela da musica popular brasileira, muito querida. “Viajo, vou e volto, mas não vejo ninguém com esse meu perfil” Devido ao linguajar adotado por Baga, uma matéria feita por um jornal local, citou: “Bagageryer pode fazer show na sala de estar de qualquer casa de família”

1988

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EDMÉA BARBOSA

A montagem da dama é um conjunto de detalhes. A maquiagem era feita por amigos, até os anos 2000, depois passou a se maquiar sozinho. Cuida de tudo com muinta antecedência procura produzir seus espetáculos, roteiro e figurinos com folga. Para o camarim, deseja paz e tranquilidade. Sem muita agonia, a figura feminina fica pronta em 50 minutos. Os figurinos são criações próprias: “meu figurino é de uma linda mulher, de longo, sempre de braços cobertos, pois não gosto que apareçam meus músculos, pois quero ter o visual de mulher, parecer mulher, por conta disso minhas peças seguem essa linha”. Já foi vestida por Júlio Cesar Habib, Di Paula, Dion, Ionara Taylor, Jorge Andrade, Fabio Sandi, July de Glamour, entre outros grandes estilistas.

Acredita e defende que a personagem não pode estar vestida igual ao público, então paetê é um dos acessórios que utiliza muito para o diferencial, além da elegância das peças pensadas para cada evento. “Acredito que o Paetê tem muito a ver com o teatro de revista, o glamour” As perucas são na linha de chanel, cabelo curto, pois sente-se bem apresentável com o estilo, apesar de em muitos espetáculos usar lindas perucas longas e cacheadas. O encanto da mulher vivida por André começa ao pisar no local de show. Poucas vezes saiu montado de casa, pois prefere a magia de entrar e sair como rapaz, transformar-se na estrela Bagageryer. “Não sei me comportar como Baga o tempo inteiro, ela dura enquanto dura o espetáculo” Para os pés costuma usar o Scarpin, as joias são acessório com muito brilho, mas tudo baseado em sofisticação. As unhas pintadas em cores que combinem com o figurino.


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s 30 anos de carreira de Baga, foram contados e comemorados neste mês, no último dia 21 de agosto, no teatro Xisto Bahia. A plateia lotada, o camarim quase impraticável, afinal foram mais de cinquenta pessoas convidadas e envolvidas no espetáculo. A vida da personagem Bagageryer começou exatamente em 1986, no concurso Miss Universo Gay Rio Grande do Norte. Porém, só após quase cinco anos sendo convidada por amigas para participação em shows, em 1991, na Boate Is'Kiss, surgiu a primeira programação exclusiva de Spielberg, “ Yes, nós temos Baga”, programa que entrevistava grandes nomes. Aquele período foi marcado por poesia, boa música e muita classe. Foi reconhecida com o primeiro óscar, firmando os primeiros anos de uma grande carreira. A década de 90 foi a década do corre corre para a artista. Ninguém pensava em quanto tempo de show tinha, apenas quem produzia espetáculos queria a Spilberg inserida nele. Mas não era só isso, além de ser convidada, o dom de Baga se destacou também na produção e criação da arte transformista. Fez peças de teatro, “Meia noite se Improvisa” no Teatro Vila Velha e “Show da tarde com Tia Arilma”. Foi jurada fixa no “Arerê Geral na TV Bahia”, fez o programa de Regina Cazé em rede nacional, o Brasil Geral em 1996. “Foi o primeiro momento que família me viu. Foi bom, me viram através da Rede Globo, de uma forma extremamente profissional, como ator, sério, um profissional e assim me mantenho. ” Participou de alguns concursos, em 1990 foi eleita a Miss América, no concurso de Dion. “Ali nasceu meu envolvimento com o miss”.

Existia o Miss Mundo, o Beleza Gay e Miss universo, e de dois em dois anos acontecia o Miss Bahia. Só que as pessoas começaram a deixar de fazer, as vezes faltava público, outras vezes atrasava demais e foi quando começaram a pedir para Bagageryer fazer, devido a organização profissional que exercia em todos os espetáculos. Em 1995 começou a fazer os concursos em boates, na Holmes, na BRW de Dion, na Is´kiss, foi feito também no cinema CineBahia. Apesar de todas as dificuldades, não deixou mais de fazer. Sobre a cobertura da imprensa local para seus eventos, nos contou das pessoas maravilhosas que encontrou, dentre elas o Aldo Tripodi, Dona Nilda Spencer Jacques de Bouvoiur, a Tribuna da Bahia e Correio da Bahia, sempre deram atenção, espaço. O profissionalismo e dedicação tinham um caminho aberto. “Quem estava era Bagageryer, uma pessoa séria como até hoje é, todos os meus eventos são noticiados”. Em 1996 Claudia Pedreira deu uma capa do Correio da Bahia inteira. A chamada dizia: “com vocês Bagageryer Spilberg”. Na reportagem a história de uma personagem que movimentava o cenário cultural e que de alguma forma fazia o público querer entender, conhecer. A importância está em não apenas noticiar, mas em tornar a notícia importante, contar a história e criar expectativa para que esta arte seja vista, acompanhada e adquirida. “Não é só falar de Bagageryer é conhecer a história, é ir ver. Então são essas reportagens que aguçam o interesse para que mais pessoas vejam aquilo que é feito diariamente”


EDMÉA BARBOSA

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sucesso de Baga, os concursos, programas de Tv, os quadros em teatro e boates são de um grande esforço. Uma junção de competência, profissionalismo e grandes amizades. Por incrível que pareça, em 30 anos de carreira, com várias produções artísticas, a produtora nunca participou de editais culturais e nem mesmo consegue pauta gratuita em teatro, nem pagando consegue o TCA, por exemplo. “Eles dizem que o que a gente faz não é cultura, não é arte. Está fora do que eles especificam como teatral. E nem todos conseguem se apresentar no TCA, por exemplo, imagina participar de edital”. No portfólio de produções encontramos: 22 Miss Bahia Gay, em anos consecutivos, 21 Miss Brasil Gay, 12 Melhor Idade, 5 belezas Gay, na categoria 50 anos e mais 6 belezas Gay de 40 anos. Fora as rainhas e musas da melhor idade. Todos com premiação, troféu, faixa e uma mega produção, geralmente em teatro alugado com pauta paga pelo próprio evento e com o “Faz cultura da amizade”, forma carinhosa que classificou as pessoas amigas que se dispõem a ajudar nos eventos. Os eventos da melhor idade surgiram após o convívio de shows contratados por uma das pessoas que frequentava os outros eventos. Uma senhora viu o trabalho de Baga no teatro Villa Velha e ai pensou: “Tenho que trazer esse rapaz para a melhor idade, é muito lindo o que ele faz” ... dali começou a trabalhar com a melhor idade, sempre em espetáculos, começou a fazer a noite de prêmios pois apesar da idade, elas fazem de tudo, cantam, dançam, criam. As vezes acontece de uma adoecer, todos vão visitar, se tem um cuidado com o outro. “É um grupo muito bom de trabalho. Eu não tenho um grupo da melhor idade, apenas ofereço meu trabalho a elas.” A nossa entrevistada costuma premiar, reconhecer o trabalho de outras pessoas e em 30 anos de carreira também foi reconhecida por seu trabalho e dedicação. Dentre os títulos, encontramos: Ídolo da melhor idade, Rainha dos artistas no baile de Di Paula, Miss das Misses 2014, Zumbi dos Palmares por Olivia Santana representando a Câmara dos Vereadores, inclusive foi a primeira vez que teve um show de transformistas na câmara de vereadores, Melhor Apresentador, Melhor profissional, Scarpin de ouro e todos os outros títulos que uma pessoa recebe por seu trabalho artistíco. Além dos títulos, André, sorri ao contar das viagens com sua personagem: “só não conheci o Piauí”.


Por July D Glamour

Por Di Paula

Trage para o TCA- 2001

Algumas premiaçþes e homenagens recebidas


EDMÉA BARBOSA com Lisboa

Ivete

Lysa Bombom

David

Martha Vasconcellos

Fotos: Acervo da artista, Genilson Coutinho e Marcellus


Fotos: Acervo da artista, Genilson Coutinho e Marcellus


EDMÉA BARBOSA “Me inspiro nela, no profissionalismo dela...”

Túneo do tempo 30 anos de história 1985- Ganhou da Tv Itapoan o concurso sósia de Ney Matogrosso, no programa Show da Tarde. 1986- Primeira vez que se vestiu de mulher, foi ao concurso e ficou em quarto lugar, no Rio Grande do Norte. 1987- Show no Miss Brasil Gay, de Lisboa, em Aracaju. Apontado como um dos melhores espetáculos da noite. Ganhou o Scarpin de Ouro boate Caverna 1988- Participou do concurso Miss Mundo de Di Paula, o público esperava para dizer o nome Murel Gana Bagageryer Spielberg 1989- Aracaju, levava um ônibus para o Miss Brasil de Lisboa

1990- Ganhou o concurso de Dion, Miss América 1991- Oscar como melhor apresentador. 1992- Entrevistou Jorge Lafond 1993- A mídia divulgava eventos e chamadas de shows, em especial Jacques de Bouvoiur 1994- Primeiro grande amor, Abreu. Apresentou o Miss Brasil Gay no Cine Bahia. 1995- Projeto Meia noite se Improvisa no Villa Velha. Peça um corte no desejo, teatro Santo Antonio. 1996- Fez o Brasil Legal com Regina Cazé. Capa do Correio da Bahia. 1997- Show Formidable, no Teatro Baiano de Tênis. Performance no expresso 2001 de Tânia Simoes. 1998- Perdeu Lisboa. Oscar de honra ao mérito 1999- Enerlis Star Ganhou o Miss Bahia na Holmes, na gestão de Mey Matos, ainda como New look bar. Troféu melhor show.


2000- Foi em Juiz de Fora e viu a Michelle Xis de São Paulo ganhar o Miss Brasil Gay em Juiz de Fora, nesse mesmo ano ela veio a primeira vez no Brasil Gay no fantoche. 2001- Participou do prêmio Braskem TCA de teatro ao lado de Maria Bethânia. MB entregou o prêmio de melhor atriz a Iami Rebouças e Baga de melhor ator para Franklin Menezes. 2002- Ivete Sangalo Foi madrinha do Miss Brasil Gay. 2003- Rosana Migler Ganhou o Miss Brasil. Troféu melhor ator transformista. Neste mesmo ano perdeu a mãe. 2004- Yecheley Campbell foi coroada a miss Bahia gay 2005- Jean Wyllys ganhou o Big Brother e na casa ele falava do trabalho de Baga. Prometeu levar Grasi Massafera e Allan, no show e levou no Miss. 2006- Homenagem do grupo Fênix Grupo teatral 2007- Lucio Gonçalves de Manaus, veio e trouxe uma candidata que ganhou e Baga foi para Manaus, logo em seguida. 2008- Medalha zumbi dos palmares. Trofeu Luiz Mott. Suzzy de Costa eleita Miss Bahia Gay 2009- Lavinia, Miss Alagoas ganhou o Titulo de Miss Brasil, no Teatro Villa Velha

2010- Pisou no Isba pela primeira vez com o Miss Brasil Gay com a presença ilustre de July de Glamour, primeira vez que Mitta lux trabalhou com Baga 2011- Rosana Migler que ganhou o concurso em 2003, voltou como convidada e fez show no teatro Villa Velha. Troféu melhor apresentador 2012- Bianca Snydder - Miss Bahia 2012 no teatro Vila Velha. No mesmo ano Miss Brasl. 2013- Melissa Kimboow eleita Missa Bahia Gay 2014- Comemorado os vinte anos de Miss Bahia Gay, Marta Vasconcelos, Miss Bahia, Miss Universo, Miss Brasil é a jurada convidada. 2015- Além dos 40 anos de carreira de Maria Bethânia. Kaysha Kutner é eleita Miss Bahia. Troféu Valerie O’Rarah 2016- A Miss Bahia eleita é Ludymilla Striker. Acontece o Oscar em comemoração aos 30 anos de carreira.

2010- Pisou no Isba pela primeira vez com o Miss

“O maior troféu desses anos de carreira é ter conhecido pessoas, gente do bem como eu. A força do trabalho é isso, nunca me decepcionei com as pessoas, pois quando vejo que a energia não é boa, vou me distanciando. A gente recebe aquilo que damos, afeto, carinho, amor. Sou no palco o que sou na vida; honrado, leal e um profissional e muito preocupado com o próximo. Existe um universo de artistas e eu sou uma delas”. Bagageryer Spielberg

Foto: Jorge Gauthier- Me Salte







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