D ÁR O7 MINDELACT 2O22 www.mindelact.org M i n d e l a c t , 2 8 a n o s d e h i s t ó r i a q u e r e v o l u c i o n o u o t e a t r o e m C a b o V e r d e . N e s t e m o m e n t o , s ó t e m o s s a u d a d e s d o f u t u r o !
Criatura Fotografia de @Queila Fernandes
PALCO 2 CRIATURA Bruna Longo O público entra. Instala-se. Olhares curiosos. As luzes morrem. No palco, há uma atriz –– “criadora e criatura”. Por Airton Ramos
O público entra. Instala-se. Olhares curiosos. As luzes morrem. No palco, há uma atriz –– “criadora e criatura”. A viagem-proposta da peça é uma «fricção entre o romance Frankestein, Ou O Prometeu Moderno e a vida de sua autora Mary Wollstonecraft Godwin (Shelley).»[1] E o espetáculo irrompe com um grito – que nos inquieta e dilacera. Uma narrativa-peça (des)construída – quão puzzle – sobretudo –sobre ELA e ELE!
Mary Wollstonecraft Shelley nasceu em Somers Town, em Londres, no dia 30 de agosto de 1797. A sua vida é marcada pela sombra da morte. A mãe de Mary morre 10 dias depois do seu nascimento. Em 1814 aos 17 anos, conhece o poeta Percy Bysshe Shelley. Casam-se após a primeira esposa de Percy ser encontrada morta em circunstâncias misteriosas.
Em 1818 o segundo e o terceiro filhos morrem. Em 1822, seu marido morre afogado durante uma tempestade na Baía de La Spezia. Morre aos 53 anos após viver os últimos 10 anos com um tumor cerebral. E somos conduzidos –sempre e poderosamente –pelo trágico e magnífico universo Mary-Shelleyano. E a dor dela é arremessada em nossa direção: “Órfão é o nome para quem perde os pais? Mas que nome se dá a quem perde os filhos?” Eis “Frankenstein” –despertando – para a vida e para nós. Toca-nos. Ri (connosco). Excitação –Música. Raiva. Medo. Rejeição. Descoberta. Dor. Espanto. Buzinas. Sirenes…
E retorna Shelley – confessando – “sempre convivi com a morte e a vida”. E ao leme de tudo está Bruna Longo. Uma atriz que inundou o palco. O bárbaro trabalho físico e emocional.
O figurino metamorfoseando entre Shelley e Frankenstein (ou vice-versa). O ambiente. O(s) corpo(s). O riso. As lágrimas. Tudo se via e foi tangível. O teatro é isto – vibração e entrega!
Os adereços – eloquente plasticidade! –(cabeças, bebés, correntes, pá, lâmpadas, baús… – a presentificação do passado)!
E quem será maior – “criadora” ou “criatura”? Poder-se-á vencer a morte?
Imponente – sem dúvida – a obra-prima de Bruna Frankenstein Longo Shelley – e a equipa!
O teatro, a obra, a “criadora” e a “criatura” estão vivos e mais presentes do que nunca!
PALCO 1
A dramaturgia de Paulo Campos dos Reis e Vinícius Piedade, mais do que o pomposo conceito de “desconstrução”, no sentido de Jaques Derrida, é algo que me parece bem mais interessante: mediação. Não se trata de diluir a precisão conceitual, de produzir “deslocamentos” semânticos, “fragmentar” ou produzir roturas na matéria prima textual de onde se parte, mas de se apropriar do material textual e comunicá-lo como nosso, a partir das nossas próprias preocupações existenciais.
NINGUÉM
Teatro do Bolhão
Por Airton Ramos
ator em cena – António Capelo – uma cara tão familiar (entre nós) pelas telenovelas. Um monólogo? Um diálogo com o público? E será que o auditório responde? Sorrisos. Risos. Silêncios. Presença. Cumplicidade. Numa metalinguagem, Capelo guia-nos – em NINGUÉM – por uma reflexão sobre esta nobre ARTE do «hipócrita», o ATOR! Por que razão sou ator? O que represento? Finjo ou sinto – verdadeiramente – as emoções de tantas personagens? Qual o papel/função do teatro? A vida é teatro? Ou será o teatro, vida? Se há um ESPETADOR e um ATOR – há TEATRO!
Um
De Gil Vicente a Zeca Afonso, das canções, textos e punhos contra a DITADURA, o RACISMO e o CONFORMISMO… estão o TEATRO e o ATOR!
E o CEGO é personagem. Somos nós cegos ou apenas não queremos ver?
E a canção ecoa: “Eu me manifesto, Tu te manifestas, ele se manifesta, nós nos manifestamos… porque eles não se manifestam!”
E nas paredes de um campo de concentração, o mais cruel e lindo texto: “eu estive aqui e NINGUÉM saberá!”
No TEATRO, o NINGUÉM torna-se ALGUÉM!
A dor é representada. Sentida. (Re)vivida. Partilhada.
Por que faço teatro? E a ingratidão para com os atores (que tanto nos deram)?
E no deserto do Atacama, a chuva faz brotar enigmáticas flores, as mulheres vão em busca dos seus entes queridos… que se tornam vivos ou se mumificam em lembranças… no (maior) cenário da vida – a NATUREZA!
NINGUÉM é um espetáculo como poucos! Um ator-múltiplo – de voz e presença pujantes! Cenas, histórias e memórias entrecruzam-se e somam-se – mesmo que pareçam não ter relação alguma!
E Capelo prendo-nos a ele (ATOR) e ao texto –dito, sussurrado, cantado… ELE domina as pausas, os olhares, a respiração, os espaços, o palco!…
A peça de teatro é efémera! A marca que deixa (em nós) é eterna!
Embeleza-te! Viva! Respira! Ama! Sê humilde! Porque quando a cortina se fechar, terás sido ALGUÉM ou NINGUÉM?
O TEATRO é sobretudo inquietação. E ninguém fica(rá) indiferente a NINGUÉM (de CAPELO e o TEATRO DO BOLHÃO)! VIVA o TEATRO!
NEMO és e ANTÓNIO também – bravo ATOR!