Hematologia Área de Excelência
Leucemias
História
Hematologia 2010
Da Sociedade Portuguesa de Hematologia A Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) é uma associação sem fins lucrativos, constituída por médicos e outros profissionais ligados à saúde empenhados na prática e/ou investigação no campo da Hematologia. Esta é a designação actual da Sociedade, devidamente oficializada e registada como uma associação científica. Contudo nem sempre assim foi. Conta-nos a história o Prof. António Parreira, actualmente o director do Departamento de Hematologia do Instituto Português de Oncologia, de Lisboa, que recua até aos seus tempos de interno de Medicina Interna. Decorria o ano de 1974/75, trabalhava eu no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, como interno de Medicina e tive o privilégio de ter como chefe o Prof. Armando Ducla Soares, Professor de Medicina da Faculdade de Medicina de Lisboa com grande interesse pela clínica hematológica e que foi de facto um dos pioneiros da hematologia clínica em Portugal , refere António Parreira, sublinhando que o seu próprio interesse pela Hematologia lhe foi, desde muito cedo, incutido pelo seu Pai, Prof. Francisco Parreira, hematologista de vocação, que se dedicou à Hematologia desde os anos 60 (trabalhando com Ricardo Trincão no inicio da sua carreira) e principalmente depois da sua estadia em Itália, onde obteve, em 1968 o título de Professor de Hematologia na Universidade de Roma. É bem conhecida, talvez dos hematologistas mais velhos, a consistente colaboração entre o Prof. Ducla Soares e o Prof. Francisco Parreira, um na vertente da clínica, outro na área laboratorial e de investigação. Juntos, publicaram muitos trabalhos científicos, em particular em modelos experimentais de estudo das trombocitopenias e de outras alterações da hemostase e organizaram muitas reuniões científicas em áreas diversas da Hematologia , recorda o especialista. Foi por influência destes profissionais e de outros entusiastas pela patologia do sangue que existiam à data no país que em 1975 foi criada a especialidade de hematologia como carreira hospitalar. Recordo bem o papel do Dr. Valadas Preto, ilustre clínico dos Hospitais Civis de Lisboa, do Prof. Freitas Tavares da Universidade de Coimbra, do Prof. Pina Cabral e do Dr. Benvindo Justiça, no Porto, que contribuíram para que o Ministério da Saúde e a Ordem dos Médicos viessem a oficializar a especialidade de Hematologia Clínica . Foi assim que um conjunto de especialistas de Lisboa, Coimbra e Porto deram corpo à iniciativa do Prof. Ducla Soares em criar a Sociedade Portuguesa de Hematologia, talvez no ano de 1976. Começou por ser uma sociedade aberta a todos os médicos com interesse em hematologia, independentemente da sua especialização, tendo como objectivo principal o de proporcionar encontros e debate de ideias e opiniões sobre temas científicos da especialidade. A SPH não teve inicialmente existência formal e foi desenvolvendo as suas actividades durante vários anos, sem que tivesse sido oficializada através de registo público. Tenho ainda em arquivo, as fichas de inscrições de muitos sócios, escritas à mão pelo meu pai salienta António Parreira. Segundo o director, eram reuniões organizadas de uma forma muito informal, com discussões de casos clínicos dos diversos Serviços e debate sobre temas quentes da especialidade recém-criada. Esta actividade inicial que se prolongou pela década de 80, foi progressivamente diminuindo por um conjunto variado de razões, entre as quais o decorrer das carreiras profissionais de uns e outros, tendo-se esbatido o interesse inicial pelas reuniões da SPH. Tal aconteceu entre 1990 e 1994, anos em já o Prof. Ducla Soares
não estava entre nós e o meu pai, Prof. Francisco Parreira, aposentado e doente. Deixou assim de haver, transitoriamente, qualquer actividade regular da SPH. Recordo, com saudade, as recomendações insistentes que ele me faz antes da sua morte em 1994, para não deixar a SPH inactiva, o que certamente contribuiu para que eu me tivesse envolvido, depois dessa data, na recuperação e reactivação da SPH como sociedade científica, recorda. Assim foi necessário refazer os estatutos da sociedade e formalizar a existência da SPH através de escritura notarial, o que foi concretizado em 1994/1995, com a colaboração de vários especialistas de Hematologia. Assim, conta o Professor, entre os anos 97/98 e 2008 acabei por representar a Sociedade Portuguesa de Hematologia na figura do seu Presidente, tendo sido sucessivamente reeleito para esse desempenho até há 2 anos. Tive durante todo esse período a sorte e o privilégio de contar com a ajuda de muitos hematologistas de todos os Serviços de Hematologia do País, não querendo deixar de destacar o do meu amigo e colega Dr. João Raposo, como secretário-geral, cujo indefectível entusiasmo, generosidade e espírito de organização, certamente contribuíram em muito para o sucesso da SPH em anos mais recentes . Desde então, foi possível concretizar a Reunião Anual da Sociedade, com o apoio logístico da Verantura na pessoa da Cidália Semedo. A lógica de organização das Reuniões baseou-se no modelo de outras sociedades congéneres, ao querer ser cientificamente aberta, conter um programa de matriz comum de ano para ano, e incluir uma componente educacional, um espaço de apresentação de temas (comunicações orais e posters) ou grandes revisões e ainda, Mesas Redondas, temáticas, ideais para o confronto de opiniões diversas sobre um mesmo tema. Tem sido também muito bem sucedido a espaço reservado à enfermagem, contribuindo para a interacção entre médicos clínicos e enfermeiros. Preocupou-nos ainda organizar a Reunião anual numa data fixa, em período do ano não coincidente com outras reuniões da especialidade, contribuindo desse modo para fidelizar os nossos associados e/ou entusiastas e participantes. A opção por Novembro baseou-se nas datas de outras reuniões a que os hematologistas nacionais assistem, como sejam as reuniões anuais das sociedades europeia, americana e espanhola , explica António Parreira, acrescentando ainda que, neste modelo tivemos a preocupação de contar, para cada edição da reunião, com um conselho científico cujas funções são as de elaborar o programa e seleccionar os intervenientes, assim como proceder à revisão dos trabalhos enviados ou propostos para apresentação na reunião, como forma de garantir a qualidade científica e pedagógica da mesma . Também nos últimos anos, a direcção da SPH se preocupou em manter laços constantes com a Sociedade europeia (EHA) da qual passou a ser sociedade afiliada. Desta forma foi possível assumir o papel de provider no que diz respeito à atribuição de acreditação para efeitos de educação médica contínua (CME) para cada uma das sessões que integram o programa, de acordo com as normas internacionalmente definidas pela EHA. Com base neste sistema, a SPH pretende aproximar-se, no que diz respeito à formação e actualização de especialistas, da utilização sistemática de unidades de CME, prática já obrigatória em diversos países europeus para a manutenção da titularidade de especialista, ainda que sistema pouco conhecido na prática médica portuguesa. Em 2008 toma posse como presidente da SPH a Prof.ª Leticia Ribeiro, do Centro Hospitalar de Coimbra. A história da SPH continua a fazer-se, de forma consolidada e em velocidade cruzeiro
A Hematologia
História
Hematologia 2010
Por Benvindo Justiça - Ex-Director de Serviço de Hematologia Clínica do HGSA Homenagem ao Professor Doutor Ducla Soares
Será extremamente difícil escrever uma história consensual da Hematologia em Portugal dos últimos 60 anos. Dez hematologistas, dos que se lembram do passado ainda recente, escreveriam 10 histórias diferentes, com razões óbvias de que a sua seria a mais correcta. Tudo é complexo, tudo teve causas pessoais e circunstâncias locais que levaram a determinada evolução. Vou contar a minha versão. Terminado o Curso de Medicina (1959) era obrigatória então a Tese de Licenciatura. Após leituras e estudos anteriores escolho o tema Anemias Hemolíticas Adquiridas Importância das Enzimas para o seu diagnóstico , Claro que esta decisão levou a entrar, a ver e a aprender o que se fazia neste campo e a concluir que praticamente pouco estava a ser feito para estes doentes. Estávamos no ano de inauguração do Hospital de S. João, no Porto. Foi necessário aprender o princípio da prática laboratorial desta área. Outras tentativas, em áreas circunvizinhas, serviram para me familiarizar com a hematologia laboratorial, que estava nos seus primórdios, incalculáveis para os hematologistas de hoje. Mas fiquei então introduzido na prática laboratorial. Foi posto à venda, entretanto, um livro de estudo da Hematologia, editado pela Gulbenkian, cujos Autores eram Ducla Soares e Francisco Parreira. Foi um livro vindo na altura própria e que ainda hoje me levam aqueles dois Professores Catedráticos a serem considerados os pais da minha Hematologia de então. Pessoas de muito prestígio nesta área, organizaram entretanto em Lisboa o Congresso Mundial De Hematologia a que não assisti por estar em Serviço Militar e já tinham organizado no Hospital de Santa Maria o seu núcleo laboratorial de investigação com reuniões aos Sábados, 1 a 2 vezes por mês, a que fui sempre que pude. A discussão era nesse tempo principalmente sobre hemoglobinopatias, que eu não tinha visto no Norte. De formação excelente, cada um na sua área, foram todavia sempre duas pessoas distintas com um objectivo comum. Já tinham um embrião de uma equipa hematológica, com imunologia à mistura. Mas um sem o outro não conseguiam ter feito progredir a Hematologia. Passei, entretanto, a Médico do Internato Geral do Hospital de Santo António e também a responsável da Consulta e do Internamento dos doentes Hematológicos (8 camas, 2 consultas por semana) pois esta área estava abandonada há vários anos, havendo uma rotina primária dos anos 50. Cada doente obrigava a estudo e a descer ao Laboratório: a resposta, do Director de então, sempre muito amável, era: não fazemos o que nos pede mas o Laboratório está à sua disposição para montar esses métodos. Ao internato de Medicina comecei a juntar horas no Laboratório, pois alguém teria que estudar o doente: hemofílico, défice congénito de protrombina, anemia hemolítica, hemoglobinopatia, doente que sangra sem se saber a causa, gamopatias monoclonais, etc. Em breve os estudos da Hemostase e das Anemias Hemolíticas eram quase só da minha exclusiva responsabilidade, tendo-me sido postas à disposição uma Técnica Superior e uma Técnica Especialista de Análises Clínicas. Entretanto o lógico foi seguir o Internato de Análises Clínicas, continuando com o apoio no Internamento de Hematologia e na Consulta, que ia aumentando e que se tornou, a breve prazo, independente da Medicina Interna. Claramente que a maior parte dos doentes hematológicos necessitavam (e necessitam) de sangue, área que estava em péssimas condições de profissionais, de espaço, de equipamento, de organização. Ajudei. Estimulei. Criou-se o embrião de uma equipa, destruiu-se a organização antiga.
Começaram a surgir as solicitações de muitos Hospitais para lhes contar como tinha resolvido os vários problemas graves da Hematologia: como fazer o diagnóstico rápido; como tratar; como ter sangue sempre que necessário. Chegamos, assim, a poder expor a nossa problemática da Hematologia dos anos 70/80: a) Se um Profissional souber clínica, laboratório e hemoterapia e puder ter tudo à sua disposição, pode ter possibilidades de tratar rapidamente o doente; b) Se o Profissional é só Clínico, que tem que mandar chamar o Analista (que pode ou não estar dentro daquele problema), que comunica os resultados ao Clínico que então chama o Hemoterapeuta (que nada conhece do caso e pode dizer simplesmente não tenho sangue ) então não há solução ou a solução será extremamente difícil. Chegamos assim à diferença inicial entre a preparação dos Hematologistas do Porto que tinham começado pelo Laboratório e passaram também a fazer Clínica ou ao contrário (como no meu caso) são vários com o mesmo percurso e dos Hematologistas de Lisboa também são vários com o mesmo percurso que nunca se adaptaram a fazer o essencial nas duas áreas : ou dedicavam-se à Clínica ou ao Laboratório. Estávamos em posições diferentes. Uns, inicialmente dedicados à Oncologia ou à Medicina Interna, começaram por esta e só depois iniciaram a prática hematológica, sem bases laboratoriais, como regra. O laboratório era sempre com outros. Estágios em Londres, Espanha, Paris, Estados Unidos, idas a Congressos, reuniões científicas, etc., quase sempre deram razão à tese do Norte. Em 1975 outro Serviço passa a ser dirigido por um Hematologista com Especialidade em Inglaterra: implanta exactamente o que vínhamos a tentar fazer desde há anos. Em finais dos anos 70 um grupo extraordinário, de Lisboa, faz estágio de longa duração num dos melhores serviços de Hematologia de Londres. Encontrei-os vários dias, pelas 8 da manhã, a fazer o seu trabalho de Laboratório e de investigação antes de irem para as Consultas e para o trabalho Clínico. Entretanto, em 1976, tinha sido criada a Comissão Executiva para a Criação do Serviço Nacional de Sangue. e de que faziam parte todas as individualidades e profissionais ligadas ao Sector e os Directores de Serviços dos Hospitais Centrais. Reunião todas as semanas durante 4 anos, com discussões intensas e com um relatório final cheio de pormenores que desapareceu e nunca mais foi discutido, quer para aprovação, quer para reprovação. Na prática foi criada, contra a opinião desta Comissão, a Especialidade de Imunohemoterapia e a Especialidade de Hematologia Clínica (com a sua componente laboratorial). Estava criada oficialmente a teoria sempre defendida pelo grupo de Lisboa, em que a Hematologia Clínica nada tinha a ver com a Imunohemoterapia (ex-Hemoterapia). Foi criado o fosso e a colaboração ou total ausência de colaboração de acordo com os actores em causa. Agora esta falta de colaboração passou a ser legal, por Decreto. Todos os que tinham então acabado de ser Especialistas ficaram colocados em Lisboa, com este simples desdobramento de lugares para Hematologia Clínica e para Imunohemoterapia. O Sul e Interior do País continuaram desprotegidos durante anos. A maior parte dos Hematologistas continuaram a não se interessar e a não desenvolver a área Laboratorial da Hematologia. A nossa teoria era a de que num pequeno Hospital um Hematologista seria suficiente, num maior teria que haver quadros para as várias valências, mas pertencendo a um quadro comum para que a colaboração e o conhecimento mútuo resultassem. Assim aconteceu no HGSA e no CHC. Quase todos os outros ficaram completamente partidos e agora, em 2010, a Hematologia Clínica praticamente não existe na maior parte dos Hospitais não Centrais e a Imunohemoterapia hospitalar realiza tarefas extremamente discutíveis, que nenhuma outra especialidade quer fazer ou, os mais capazes, fazem Hematologia. Alguns Hematologistas estão agregados a Serviços de Medicina Interna, tal como nos anos 50! Não houve progressos na organização da Hematologia. A Hematologia Laboratorial começa entretanto a automatizar-se, a desenvolver novos conceitos e saberes que são a base central do conhecimento hematológico. As áreas laboratoriais da Hemostase, do estudo das doenças do glóbulo branco e, nos anos 90, da genética molecular nada têm a ver com a prática laboratorial dos anos 70 e 80. O advento do transplante de medula óssea e mais tarde de células histaminais ou dos tratamentos com anticorpos monoclonais e outros novos medicamentos foram outros avanços menos relacionados com o Laboratório mas que exigiram treino específico e intenso em novas áreas. Toda esta evolução hoje verificada foi simplesmente a junção de uma massa crítica enorme resultante da união da clínica com técnicas especializadas, laboratoriais ou de outra natureza. Ao longo dos anos tivemos bolseiros em Inglaterra, França, Bélgica, Espanha, Estados Unidos, etc. para aprendizagem no diagnóstico e tratamento de todas as doenças do sangue, bolseiros estes que teriam
que cumprir os objectivos de Serviço: integração em todas as tarefas, inclusão sempre da clínica com o laboratório (excepto em casos especiais), responsabilidade total pelo progresso constante na área em que se prepararam. Mas passados esses cinquenta anos, consideramos como praticamente quase perdido todo o esforço de união entre a clínica e o laboratório na hematologia, sempre muito defendido pela Ordem dos Médicos, na qual também ocupei o grau de Presidente do Colégio da Especialidade de Hematologia Clínica. Hoje já o problema não se pode ver desse modo e há uns grupos que evoluíram de um modo e outros de outro, sem que tal evolução, 50 anos após, tenha causado discrepâncias na evolução dos Serviços, principalmente após a introdução, nos anos 90, da intensa tecnologia laboratorial. A Hematologia perdeu. Há excepções, há Serviços e sectores de Hematologia com funcionamento adequado, mas não há dúvidas de que a maior parte dos exames laboratoriais dos doentes hematológicos de hoje são da responsabilidade única e indiscutível da Patologia Clínica. Mesmo a nível privado são os Patologistas que têm o monopólio de todos os contratos com as inúmeras Entidades. Grande número de doentes perdeu, a evolução da Hematologia em Portugal ainda não se pode, em minha opinião, considerar estabilizada. Continua a haver Patologias só interpretáveis pelo Hematologista e por quem conhece a doença e o doente, haverá desnecessariamente exames que se repetem indefinidamente até que um Hematologista os interprete ou veja o que falta para que se faça o diagnóstico. Esta é a minha prática corrente actual. Nos anos 60 era habitual dizer que o Internista tinha o Estetoscópio e que o Hematologista tinha o Espreitoscópio! (Microscópio). Hoje tudo se modificou e cada um tem que ter e saber manejar uma panóplia enorme de aparelhos e de técnicas auxiliares que o levam ao diagnóstico e ao tratamento. Pode não fazer directamente o exame, mas tem que saber tudo acerca dele e que trabalhar em equipa, cada vez mais multidisciplinar. Será esta prática que realmente prevalece entre nós?
O desenvolvimento da Hemoterapia e dos Serviços de Transfusão Sanguínea deve-se, entre nós, a médicos como José Gentil, nos anos 20, Armando Luzes e Almerindo Lessa, a partir de 1940. Almerindo Lessa contribuiu para a organização dos Serviços de Transfusões em Portugal, fomentando a dádiva do sangue e os estudos serológicos de grupos sanguíneos. Publicou diversos trabalhos de importante difusão no País. A criação mais recente de Serviços hospitalares autónomos em três Centros Universitários do País (Lisboa, Porto e Coimbra) traduziu-se na definição, a partir dos anos 70, de programas de preparação pós-graduada em Hematologia Clínica, os quais seguiram genericamente as linhas existentes em vários Países europeus. Foi nestes Centros que se formou a actual geração de Hematologistas portugueses, alguns dos quais efectuaram estágios em Serviços estrangeiros de renome internacional, transpondo para Portugal os modernos métodos de diagnóstico e tratamento das hemopatias e contribuindo para a criação de Unidades hospitalares e de investigação competitivas no domínio da especialidade. Razões conjunturais de diversa ordem, essencialmente relacionadas com vicissitudes da carreira hospitalar, fizeram com que em Portugal e logo a partir da criação da especialidade de Hematologia Clínica em 1975, se tenha criado separadamente a especialidade de Imunohemoterapia, enquanto carreira hospitalar de conteúdo programático próprio. Perdeu-se assim a oportunidade de reunir numa só especialidade médica, todos os profissionais que se dedicam à patologia do sangue e da medula óssea, orientação divergente da verificada em vários Países europeus nos quais a Hematologia moderna tem sido alvo de maior desenvolvimento e pujança.
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FICHA TÉCNICA
Propriedade:
Presidente: Prof. Doutor José Eduardo Guimarães Vice-presidente: Dra. Aida Botelho de Sousa Secretária: Dra. Emília Cortesão Secretária-adjunta: Dra. Cristina Gonçalves Tesoureira: Dra. Maria José Silva Secretariado: Veranatura - Conference Organizers Rua Augusto Macedo, Nº 12-D - Esc. 2 1600-503 Lisboa Tel. + 351 217 120 778 / 79 Fax. + 351 217 120 204 E-mail: geral@sph.org.pt Produção: Manuel José Guedes da Silva, Lda. Rua S. Francisco Xavier, 31-4º 2745-766 Massamá Tel: +351 21 466 99 05/6 Fax: +351 21 467 57 99 E-mail: redaccao@mjgs.pt Textos: Célia Figueiredo Fotos: Célia Figueiredo, SXC.hu Paginação: Filipe Leonardo Revisão: Bruno Guedes da Silva Impressão e acabamento: G.C. - Gráfica de Coimbra, Lda. Deposito Legal: 351001/12 Tiragem: 600 exemplares ISBN: 978-989-8602-03-9 Novembro 2012
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ÍNDICE Nota de redacção
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Editorial
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Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro Entrevista - Dr. Manuel Cunha Texto Livre - Dr. Manuel Cunha
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Centro Hospitalar do Porto - Hospital de Santo António Entrevista - Dr. Jorge Coutinho Texto Livre - Dra. Margarida Lima
16 21
Centro Hospitalar de São João Entrevista - Prof. Doutor José Eduardo Guimarães Texto Livre - Prof. Doutor José Eduardo Guimarães
38 43
Instituto Português de Oncologia - Porto Entrevista - Dr. Mário Mariz Texto Livre - Dra. Isabel Oliveira
46 51
Centro Hospitalar Lisboa Norte - Hospital de Santa Maria Entrevista - Dr. José Alves do Carmo Texto Livre - Dra. Graça Esteves Texto Livre - Dra. Maria João Costa Texto Livre - Dra. Lurdes Guerra
56 63 67 69
Centro Hospitalar de Lisboa Central - Hospital dos Capuchos Entrevista - Dra. Aida Botelho de Sousa Texto Livre - Dra. Isabel Costa e Dra. Patricia Ribeiro
72 77
Instituto Português de Oncologia - Lisboa Entrevista - Profª. Maria Gomes da Silva Texto Livre - Dra. Isabel Martins, Dra. Albertina Nunes e Profª. Dra. Gomes da Silva
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NOTA DE REDACÇÃO Iniciámos este projecto com a edição Hematologia 2010 com o objectivo de contar um pouco da história desta área e dos serviços de hematologia do país. No ano passado decidiu-se dar especial relevo às Áreas de Excelência, desta especialidade médica, de cada um dos serviços de hematologia, em Portugal. Este ano as Leucemias foram eleitas como área de excelência a abordar em mais uma edição a ser distribuída durante a Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia. Seguimos basicamente a mesma metodologia utilizada na edição anterior, sendo o conteúdo composto por uma entrevista e um texto livre. Para a rubrica "entrevista" abordámos com todos os directores de serviço, sensivelmente, os mesmos temas, com perguntas similares. Por outro lado, para o texto livre sobre Leucemias foi dada total liberdade para a forma - científico, de opinião, ensaio clínico, etc. - e tamanho. Todos os responsáveis responderam de forma positiva à nossa solicitação. Muito gostaríamos que o resultado seja do agrado de todos… e a todos aproveitamos para agradecer a prestimosa colaboração e disponibilidade. Bem Hajam O Editor
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EDITORIAL A publicação sobre áreas de excelência de Hematologia Clínica, este ano dedicada às leucemias, pode ser considerada uma boa ideia. Foi feito um levantamento do que se faz no país neste ramo de patologia, através da consulta (por entrevista) dos responsáveis dos principais Serviços nacionais envolvidos no seu diagnóstico e tratamento. A entrevista foi ainda complementada por artigos a cargo de pessoas desses mesmos Serviços, onde é exposta a realidade da prática médica actual. As leucemias crónicas têm, como o seu nome indica, um curso arrastado e são geralmente seguidas em regime ambulatório. Nalguns casos, como na leucemia linfocítica crónica em estadios iniciais, nem sequer se faz qualquer tratamento protelando-se o mesmo para fases mais avançadas da doença. O caso da leucemia mielóide crónica é, por outro lado, paradigmático de uma doença que anteriormente evoluia fatalmente para leucemia aguda - excepto nos doentes que eram submetidos a transplante alogénico de células progenitoras hematopoiéticas - e que hoje é bem controlada por um fármaco (Imatinib) específico para a alteração molecular que está na origem da doença. As leucemias agudas são uma situação bem diferente: a necessidade de tratamento imediato, uma margem terapêutica estreita e a complexidade que decorre da quimioterapia intensiva com ocorrência quase inevitável de aplasia terapêutica e das suas consequências, nomeadamente ao nível de complicações infecciosas, comportam um grau de exigência que leva a que só meia dúzia de Serviços no país tenham os recursos físicos e humanos para os tratar. Por outro lado, o diagnóstico laboratorial, nomeadamente no que respeita a testes conduncentes à estratificação prognóstica dos doentes, tem-se tornado gradualmente mais sofisticado o que implica "expertises" técnicas que nem sempre estão à mão em hospitais mais pequenos. De qualquer modo, a Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) é um fórum que congrega não só médicos mas todos aqueles que têm uma ligação à Hematologia; e dentro dos médicos há aqueles que se dedicam priveligiadamente à patologia hemato-oncológica e outros com diferentes áreas de interesse (glóbulo rubro, hemostase, etc). Há membros da SPH que trabalham em grandes hospitais e outros que exercem a sua actividade em hospitais distritais ou em laboratórios ou instituições que podem não ter sequer ligação à prática clínica. Todos constituem a comunidade hematológica portuguesa e, enquanto presidente da SPH, é a eles que me dirijo convidando-os a participar na reunião anual a realizar no Porto em 9 e 10 de Novembro. José Eduardo Guimarães Presidente da S.P.H.
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Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro
Serviço de Hematologia
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ENTREVISTA
“Temos que deixar de aplicar a palavra “leucemia” perante quadros que nunca chegam a ter critérios de tratamento” A maior dificuldade no tratamento das leucemias continua a ser na articulação com os cuidados de saúde primários. Até porque o tratamento de suporte é tão importante para a qualidade de vida dos doentes quanto as outras terapêuticas. Dr. Manuel Cunha
Qual o número de doentes com Leucemia neste serviço? Perante estes dados há ideia de que haja aumento na incidência das Leucemias? Simplificando e fazendo uma divisão em leucemias agudas e leucemias crónicas: neste serviço não fazemos tratamento, com intuito curativo, das leucemias agudas, ou seja, se nos chega um doente que pela idade ou características da leucemia não tem indicação para tratamento curativo, o doente é acompanhado por nós mas com tratamento de suporte. Para tratamento curativo transferimo-lo para o IPO do Porto. Perante este cenário temos vários doentes a fazer tratamento de suporte. E esta crise também serve para mostrar, àqueles que se tinham esquecido, que o tratamento de suporte é tão importante para a qualidade de vida dos doentes como os outros tratamentos. Depois temos as leucemias crónicas - linfóides e mielóides crónicas. A leucemia mielóide crónica (LMC) é uma entidade muito específica, e está muito na moda porque tem grandes avanços na área do tratamento. Para além disso, foi sempre a "menina bonita" dos investigadores e dos clínicos, e uma espécie de modelo de como se aprendia a evolução dos tumores, e como se tratava e se curava os doentes. Foram, aliás, que eu me recorde, os primeiros doentes a serem transplantados e a testar, por exemplo, a reinfusão de linfócitos nas recaídas pós transplante. Foi também associado à LMC que surgiram os primeiro fármacos dirigidos especificamente a uma proteína dimérica - o imatinib - e, posteriormente, o dasatinib e o nilotinib. Neste serviço temos um número grande de doentes. Não porque a incidência desta doença se esteja a modificar, mas porque a sobrevida tem vindo a aumentar e os
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ENTREVISTA doentes ficam para sempre ligados à consulta. Temos cerca de 50 a 60 doentes com LMC. Destes, um pequeno grupo - três doentes - são doentes transplantados de outros hospitais, mas que actualmente fazem acompanhamento aqui; outro pequeníssimo grupo - três doentes - ainda do tempo do interferon, havendo ainda uma doente a fazer essa terapêutica e os outros dois doentes que já interromperam o interferon há pelos menos cinco anos, até agora sem necessidade de retomar tratamento. Depois o grosso dos doentes - cerca de 35 - está a fazer imatinib, no essencial com resposta e toxicidade semelhantes às descritas na literatura. Desses doentes houve quatro que por toxicidade elevada e outros quatro por ausência de resposta passaram para a 2ª linha de tratamento - dasatinib. Temos também um doente adicional transplantado que não respondeu ao imatinib mas com dador não familiar. Há finalmente um grupo de doentes a fazer hidroxiureia por não terem perspectivas de beneficiar do tratamento com imatinib. O transplante é feito onde? É feito no IPO Porto. Estes são os dados da LMC, naturalmente a leucemia que neste momento tem mais sucesso de acompanhamento. Por outro lado, é a doença que tem mais custos associados e que tem obrigado a uma reflexão importante, nomeadamente nos mecanismos que se usam de avaliação de resposta. Aqui, como penso que noutros hospitais, temos tido algumas discrepâncias nas técnicas utilizadas, embora isso até já esteja estabelecido em algumas recomendações internacionais. Houve um período em que se faziam demasiados exames de controlo da doença por PCR que, muitas vezes, não levavam a mudanças nas decisões terapêuticas, tinham custos elevados e criavam angústia desnecessária nos médicos e doentes. Ou seja, tinham uma utilidade prática relativamente pequena. Por isso, temos reduzido cada vez mais essas práticas e optado pela citogenética convencional, onde temos uma boa relação de qualidade/resposta. Aliás, atrevo-me a dizer que somos um dos hospitais do país que tem a resposta mais rápida. Assim, estamos a dar mais importância ao cariótipo e ao FISH feito em medula óssea, às vezes até ao FISH em sangue periférico, principalmente em doentes que não podem recorrer ao alotransplate de medula óssea e, portanto, menos beneficiariam da informação adicional do PCR. Isso quer dizer que o follow-up é todo feito aqui no vosso laboratório? Não, continuamos a fazer PCR e BCR-ABL fora do hospital mas com uma frequência menor e em doentes mais seleccionados, nomeadamente nos que têm opção de alotransplate de medula. Perante o cenário do serviço e do que conhece a nível nacional e internacional acha que a incidência das leucemias está a aumentar? Eu acho que não. Tenho algumas dúvidas na LMC… É natural que haja a percepção que há mais doentes porque eles vivem mais tempo, logo há mais doentes nas consultas, mas não porque a incidência esteja a aumentar. Porque a incidência das
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ENTREVISTA leucemias depende também da variável idade. Ou seja, à medida que envelhece a população a incidência aumenta, mas é um aumento que é previsível com o envelhecimento da população. Há por outro lado, a obsessão do diagnóstico precoce, principalmente no caso da leucemia linfática crónica. Neste tipo de doença raramente é benéfico para o doente, é inclusive prejudicial a maior parte das vezes, e é preciso ter coragem para o dizer. Em mais de 200 doentes com leucemia linfática crónica acompanhados neste serviço, cerca de 2/3 nunca fizeram tratamento e são seguidos há muitos anos com a angústia, e o consumo de recursos que levantam dúvidas sobre a vantagem da identificação precoce destes casos principalmente em população idosa e assintomática Portanto, voltando à pergunta inicial: aqui no serviço temos seguramente cada vez mais doentes com leucemias crónicas acompanhados nas consultas, cada vez mais doentes, principalmente na leucemia linfática crónica, diagnosticados com critérios urgentes de serem revistos e modificados. Temos que deixar de aplicar a palavra "leucemia" perante quadros que nunca chegam a ter critérios de tratamento, há também que encontrar outras formas de classificação e arrefecer a obsessão do diagnóstico precoce. Até porque estamos perante um país paradoxal que não paga transporte de doentes, mas os empurra para se deslocarem em nome de um diagnóstico puramente analítico sem vantagens adicionais. Provavelmente esta é uma das regiões onde isso mais se sente. Em relação às leucemias agudas primárias não tenho percepção porque como vão para outros hospitais não temos registo desses doentes. Nas agudas secundárias é possível que à medida que o sucesso dos tratamentos oncológicos é cada vez maior e a sobrevida mais elevada, surjam mielodisplasias secundárias aos tratamentos e, consequentemente, as leucemias secundárias a essas displasias. Depois se as leucemias agudas estão a aumentar por questões que têm a ver com hábitos alimentares ou poluição, não sei responder. Falando de tratamento, que principais dificuldades existem? A maior dificuldade no tratamento continua a ser na articulação com os cuidados de saúde primários. Enquanto não se perceber isso não vamos a lado nenhum, principalmente em hospitais como este que servem populações idosas e que lidam com leucemias crónicas, que muitas vezes estão longe de ser o principal problema de saúde destes doentes. Esta falta de articulação leva a que tenhamos situações caricatas, por exemplo, usarmos fármacos a preços excessivos completamente desligados do acompanhamento dos outros problemas de saúde e a ter sucesso terapêutico em doentes cuja expectativa de vida é amputada por outros problemas de saúde que não são devidamente acompanhados. É preciso um trabalho de equipa, principalmente, com duas áreas indispensáveis - a medicina interna e os cuidados primários - de maneira a que os investimentos que se fazem no tratamento dos doentes (dos problemas hematológicos) tenham correspondência no resto.
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ENTREVISTA Se me pergunta se tem havido restrições ao acesso a fármacos para o correcto tratamento dos doentes, ou para o correcto diagnóstico aqui no centro hospitalar? Não. Se tem havido recomendações no sentido de haver uma reflexão? Sim. Essas recomendações são, no meu entender, mais que legítimas. Não temos tido dificuldade no acesso de fármacos e fazemos parte de um grupo de hospitais que é relativamente comedido em termos de investigação e tratamento. Começamos a ter alguma dificuldade no transporte dos doentes. Isso sim é um problema nesta região, quer pelo tipo quer pelo isolamento da população que servimos. Logo, se os cuidados de saúde primários funcionarem mal somos empurrados para fazer mais consultas do que as implicadas pela doença hematológica propriamente dita. Que desenvolvimentos são ainda necessários na área das leucemias - investigação e tratamento, por exemplo - aqui no serviço ou no geral? Nas leucemias linfáticas crónicas falta uma análise ou um conjunto de parâmetros que me diga: este doente tem uma LLC indolente e tem uma altíssima probabilidade de nunca sair disso. Ou tem uma altíssima probabilidade de evoluir. Quero dizer com isto que, algum exame transmitisse uma margem de certeza maior quer num sentido quer noutro. Isso seria importante para o doente e para o sistema. É de facto uma doença que tem muitas opções terapêuticas, mas em comparação com a LMC evoluiu menos em termos de sucesso de intervenção. O grande passo na LMC é o preço dos tratamentos. Não é possível que a Indústria Farmacêutica continue a cobrar estes valores por estes tratamentos. É preciso um controlo de custos que neste momento é inquestionável, tendo em conta que há doentes que têm de fazer terapêutica com imatinib para sempre, e a taxa de sobrevida esta próxima dos 20 anos, sendo evidente que não há economia que aguente esta situação nos próximos 10 anos se não houver uma mudança significativa dos custos dos fármacos. Na LMC julgo que, muito mais importante que estarmos preocupados com os 20/30 por cento que não conseguem ter os resultados máximos, é preciso preocuparmo-nos como é que sustentamos um grupo grande de doentes que continuam muito bem, mas vão colocar dificuldade muito sérias no financiamento dos seus tratamentos. É por aí que tem de se resolver. Temos que todos reflectir sobre isso e é inevitável uma diminuição significativa do preço dos fármacos.
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REFLEXÕES SOBRE LLC-B Por Manuel Cunha, Director do Serviço de Hematologia A Leucemia Linfocítica Crónica (LLC) de células B engloba provavelmente um conjunto de entidades distintas. Cresce a evidência de que uma percentagem significativa destes doentes apresenta estabilidade clínica por muitos anos, não implicando em muitos deles, uma diminuição da esperança de vida. Estes "doentes" nunca chegam a ter os "critérios de doença ativa", habitualmente utilizados para iniciar tratamento. Não se conhecem ainda outros parâmetros clínicos e/ou analíticos que permitam selecionar os doentes que beneficiariam de "tratamento precoce" antes ainda de preencherem os tais "critérios de doença ativa". Com o passar de anos acumulam-se nas consultas de hematologia estes "doentes", inicialmente avaliados cada 3 meses, depois de 6 em 6 meses, em alguns casos anualmente. Não é fácil identificar quais as vantagens de serem precocemente classificados como "doentes". Quais as vantagens em identificar uma linfocitose, que, em tantos casos, assim ficará para sempre. Principalmente quando no outro " prato da balança" está a angústia de um diagnóstico com uma conotação tão negativa para a população em geral. Um diagnóstico que "obriga" com frequência a deslocações com custos significativos para o "doente". Um diagnóstico que com frequência "descentra" a atenção do doente nos outros problemas da sua saúde. Que o afasta dos cuidados primários de saúde. Que lhe cria um anátema de não poder fazer tratamento de outras doenças: "eu até lhe receitava, mas se calhar faz-lhe mal ao sangue". Adicionalmente nós hematologistas não temos "treino" nem muitas vezes motivação para lidar com estas situações. Para encontrar o ponto correto que ajude a enquadrar o "doente" e a família… (consultas de escassos minutos, tantas vezes lidados com "enfado" pela sua monotonia). Nos últimos anos tem havido uma tendência, que é importante aprofundar e provavelmente padronizar, no sentido de simplificar o "bilan" inicial de avaliação destes quadros. Terão de se imunofenotipar todas as linfocitoses com valores absolutos acima de 5000/mm3, mesmo se detetadas como alteração isolada do hemograma em doentes assintomáticos e com exame físico "negativo"? Mesmo em doentes idosos? Ou poder-se-á diferir o estudo só para quando houver clínica associada? Faz sentido usar a imagiologia nestes casos? Faz sentido que andem numa consulta de hematologia regularmente? Finalmente não será urgente reclassificar estes casos e reservar a designação de LLC para casos mais avançados? A LLC-B é apenas um exemplo, talvez um dos mais fáceis de abordar, do encarniçamento diagnóstico em hematologia, que por sua vez é apenas uma "ponta do iceberg" do encarniçamento diagnóstico em Medicina. Um problema que tem múltiplas facetas, por exemplo o excessivo aprofundar de dados analíticos e imagiológicos na avaliação de um doente com uma determinada patologia, mesmo quando se reconhece que esses dados têm pouco ou nenhuma importância real nas decisões terapêuticas.
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TEXTO LIVRE Todos estes fatores contribuem para uma hipertrofia da área dos exames complementares de diagnóstico, mas também da área clínica, sem vantagem evidentes para a saúde das populações. Aliás provavelmente com desvantagens reais para alguns doentes. Uma análise cuidadosa mostra aliás que por detrás destas patologias e do " empolar" destas situações há interesses que estão longe de ser os interesses reais dos doentes. Tudo isto ao mesmo tempo que a cobertura dos reais problemas de saúde das populações está longe de alcançar os seus objetivos. Estamos num período de restrições orçamentais significativas que nos obrigam a uma reflexão profunda sobre o nosso trabalho e a um recentrar dos problemas, tendo como referencia o doente e não "as doenças", e uma articulação real e eficaz com os cuidados primários de saúde. Saibamos aprovar esta crise para sob a batuta dos médicos, reformular definições e critérios, reforçando a articulação com os cuidados primários, recentrando as atenções no doente como um todo e não numa acumulação de doenças. Assim seremos mais úteis aos "doentes" e ao País.
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Centro Hospitalar do Porto Hospital de Santo António
Serviço de Hematologia Clínica
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ENTREVISTA
“Há muitos anos que não há evoluções significativas em terapêuticas” Na área das leucemias, os avanços verificaram-se sobretudo ao nível do diagnóstico. No entanto, isso não se tem reflectido em protocolos diferentes de tratamento que melhorem o prognóstico dos doentes.
Dr. Jorge Coutinho
Que tipo de leucemias são tratadas neste serviço de hematologia? Como são admitidos? Neste serviço tratamos todos os tipos de leucemia. Os doentes chegam-nos porque dão entrada na urgência do hospital, ou são referenciados para a consulta. Tratamos doentes com leucemias crónicas ou agudas. Desde quando tratam as leucemias? Desde a criação do Serviço? Desde sempre que tratamos as leucemias. Contudo, há cerca de 10 anos atrás achámos que era inadmissível, com as condições que tínhamos de internamento, submeter os doentes a quimioterapia de indução das leucemias agudas. E portanto, nessa altura, deixamos de tratar leucemias agudas durante algum tempo. Desde há oito anos que recomeçamos a tratar os doentes com leucemias agudas, uma vez que passamos a dispor de isolamento, com enfermagem dedicada e com camas próprias. Actualmente, contamos com um total de oito camas. O facto de as diferentes valências do serviço não funcionarem no mesmo local físico dificulta o trabalho? É certo que o serviço está disposto de uma forma dispersa, porque o serviço é relativamente grande na área laboratorial e tem a peculiaridade de ter incluído a área da imunohemoterapia. Sempre foi assim. É uma realidade histórica e que existe desde que o serviço foi criado. Dada a dimensão do nosso hospital achamos que esta integração é uma mais-valia e não uma penalização. Aliás, na nossa opinião não entendemos porque há serviços de imunohemoterapia e hematologia autónomos, porque tudo faz parte da hematologia e a integração permite uma complementaridade saudável.
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ENTREVISTA O facto de termos a área laboratorial fora do edifício onde estão os doentes, não constitui para nós um problema. É tudo uma questão de agilizar o trabalho e tudo funciona. Não deixamos de fazer bem por não funcionar tudo no mesmo espaço. É uma falsa questão. É certo que é mais fácil manter a equipa coesa se tudo estiver a funcionar no mesmo espaço, mas quando não é possível temos de ultrapassar a questão da melhor maneira. Quantos doentes são admitidos, por ano, no serviço? Os números indicam aumento na prevalência e incidência desta doença? São muitos doentes. Mas tendo em conta os números que dispomos não nos parece que as leucemias sejam uma patologia cuja prevalência/incidência esteja a aumentar. Temos ideia de que os números são semelhantes a anos anteriores. Por ano diagnosticamos, em média, 16 doentes com leucemia aguda de novo. Das leucemias crónicas a mais prevalente é a linfática crónica, uma realidade que se estende a todos os serviços. Os tratamentos que têm para oferecer são os que estão disponíveis no mercado nacional? Sim, são os protocolos clássicos que toda a gente utiliza, a não ser que haja ensaios clínicos. A maioria dos hospitais portugueses onde se tratam leucemias, seguem os protocolos que seguem as recomendações internacionais. A existência desses protocolos permite alguma cooperação entre serviços? Devia permitir, mas não acontece. Somos (os hematologistas) muito refractários à ideia de juntar casuísticas e fazer coisas conjuntas, por isso é muito difícil. Apesar disso, já esteve mais difícil pois parece que agora há uma tentativa de fazer trabalho conjunto com as áreas dos grupos de interesse. Mas ainda é muito cedo para saber em que é que isso vai redundar. Esperamos que seja possível dentro de algum tempo avançar para a cooperação entre serviços, fazer protocolos iguais, juntar casuísticas, etc. Até porque a hematologia é pequena e permite maior ligação entre serviços… É verdade. Mas não é a isso que se deve esta dificuldade de harmonizar as coisas, aliás, não sei a que se deve. Penso que há alguma mania em considerar que "nós" é que estamos a fazer bem, e isso só revela défice de desenvolvimento. Quanto mais os serviços se desenvolverem e se sentirem seguros, mais aptos estão a partilhar. E estamos bastante atrasados em termos de organização e de auto-confiança. Como se define a área das leucemias em termos de evolução terapêutica? Há muitos anos que não há evoluções significativas em terapêuticas. Há poucos doentes a serem curados com a quimioterapia, muito poucos. Logo, na minha opinião, muitos dos recursos alocados às leucemias agudas, principalmente em idosos, deviam ser canalizados para outras áreas. O que tem havido de evolução nesta área é ao nível do diagnóstico. Há uma melhor
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ENTREVISTA estratificação do risco, embora isso não se tem vindo a reflectir em protocolos diferentes de tratamento que anulem o mau risco. Conhecemos melhor a biologia de algumas leucemias agudas, já temos marcadores moleculares para algumas delas, mas a estratégia global não se tem mudado significativamente nos últimos 10 anos. Se um doente é jovem, a alotransplantação continua a ser o objectivo. Pessoalmente acho que não é compensador estar a investir em induções em indivíduos com mais de 60 anos, embora as façamos até aos 65 mas os resultados são muito maus. Como define a actividade do laboratório nesta área? O serviço tem uma forte actividade laboratorial, porque consideramos que faz parte da identidade da hematologia ser uma especialidade médica com laboratório próprio. Por sinal não há muitos serviços com esta característica, mas é uma mais-valia e permite uma maior integração na actividade. Sem isso, na prática, somos iguais a qualquer Internista que trata doenças hematológicas. Somos relativamente autónomos nisso. A única área em que fazemos outsourcing (de alguns exames) é na citogenética. Na citometria recebemos muitos pedidos de estudo de outros hospitais. A monitorização e o folow-up dos doentes/tratamento como é feito? Bom, temos o hospital de dia e o internamento. No ano passado fizemos mais de 5 mil sessões e este ano, até Maio, já realizámos cerca de 2 mil. Temos um hospital de dia muito funcional e ágil com uma equipa de enfermagem dedicada e competente. Dispomos de 12 camas e 12 cadeirões, o que para a dimensão do nosso hospital é mito bom, permitindo-nos fazer muitos tratamentos em ambulatório. Nos doentes com bom estado físico, a fazer o nadir da quimioterapia a partir da indução (o primeiro ciclo de indução é sempre feito no internamento até recuperar) tentamos que seja feita em ambulatório. E muitos dos doentes conseguem fazer as consolidações todas sem serem internados. Por isso, o ambulatório e a consulta são de facto as nossas valências mais fortes.
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LEUCEMIAS DE LINFÓCITOS GRANDES GRANULARES Por Margarida Lima, Responsável pelo Laboratório de Citometria do Serviço de Hematologia Clínica Os linfócitos grandes granulares (LGL, large granular lymphocytes) constituem até cerca de 15 por cento dos linfócitos do sangue periférico normal e incluem as células natural-killer (CNK) e alguns linfócitos T (LT). Enquanto todas as CNK são LGL, apenas uma fracção dos LT, mais precisamente as células T citotóxicas (CTL, cytototoxic T cells) têm estas características morfológicas. As doenças linfoproliferativas (DLP) de LGL compreendem um largo espectro de proliferações de CTL e CNK, desde as de natureza policlonal e carácter inequivocamente reactivo a quadros de expansão monoclonal destas células, passando por situações intermédias em que são encontradas proliferações oligoclonais que podem levantar dificuldades de interpretação e de diagnóstico. Quando existe uma expansão de LGL monoclonais aplica-se a designação de leucemia de LGL (LLGL). Assume-se hoje em dia que as DLP de LGL surgem no contexto de uma estimulação antigénica crónica, resultando as LLGL da emergência de clones dominantes. Durante os últimos anos, no Laboratório de Citometria do Serviço de Hematologia Clínica do Hospital de Santo António (HSA), Centro Hospitalar do Porto (CHP), temos dedicado especial atenção ao diagnóstico e classificação de várias DLP de LT e de CNK, nomeadamente de LGL, quer no que diz respeito à caracterização destas células, quer no que respeita às manifestações clínicas associadas. Em colaboração com outros grupos, caracterizamos o fenótipo dos LT normais e activados, em situações de activação aguda e crónica, assim como das LGL-T e das CNK do sangue periférico normal; estudamos também os perfis fenotípicos aberrantes mais frequentemente observados nas LLGL. Para além disso, investigamos o perfil funcional destas células, esclarecemos a etiopatogenia de alguns subtipos de LLGL e avaliamos o papel de alguns factores imunogenéticos na génese destas doenças. No entanto, embora a nossa compreensão sobre a fisiopatologia e a história natural das DLP de LGL tenha aumentado imenso nos últimos anos, existem ainda muitas questões polémicas e muitos aspectos por esclarecer. Filiação celular Tal como os LGL-T normais, as LLGL-T são classificadas de acordo com a expressão das cadeias alfa/beta (α/β) ou gama/delta (γ/δ) do receptor da célula T (TCR) e dos co-receptores CD4 e CD8. No que respeita às LLGL-NK, foram descritos vários subtipos com imunofenótipos distintos, nomeadamente quanto à intensidade de expressão de CD56, mas não existem propostas de classificação. Na classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2008, as LLGL-T constam como entidade, embora as características descritas correspondam ao tipo de LLGL-T mais frequente, isto é, aquele que tem origem nos LT α/β CD8+. No entanto, sabe-se hoje que as LLGL-T podem ter origem em outras populações de LT, nomeadamente nos LT α/β CD4 e nos LT γ/δ (geralmente CD4- CD8-/+fraco) e que estas correspondem a entidades distintas do ponto de vista laboratorial e clínico.
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TEXTO LIVRE As LLGL-NK não constam de forma individualizada na classificação da OMS, integrando as chamadas "linfocitoses crónicas de CNK", um grupo heterogéneo de expansões de CNK que inclui expansões de natureza policlonal, oligoclonal e monoclonal destas células. Apesar disso, sabemos que as LLGL-NK existem e que a sua forma mais frequente apresenta expressão muito fraca ou ausente de CD56 (CD56-/+fraco), tendo esta entidade sido caracterizada pelo nosso grupo. Morfologia Morfologicamente, os LGL têm um citoplasma abundante e claro com grânulos azurófilos, que correspondem a grânulos citotóxicos (Figura 1). Estes grânulos contêm proteínas envolvidas nas funções de citotoxicidade, como granzimas e perforina.
Figura 1. Linfócito grande granular (esfregaço de sangue normal, coloração de Leishman)
As características morfológicas dos LGL monoclonais de doentes com LLGL são semelhantes às dos LGL normais, com alguma heterogeneidade no que respeita ao tamanho das células e do citoplasma, assim como ao número e tamanho dos grânulos (Figura 2).
Figura 2. Linfócitos grandes granulares monoclonais (esfregaços de sangue de doentes com LLGL, coloração de Leishman)
Imunofenótipo Os LGL neoplásicos (i.e. monoclonais) representam a contrapartida patológica das CTL e das CNK activadas e partilham com estas muitas características incluindo o aspecto morfológico e o perfil imunofenotípico.
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TEXTO LIVRE Linfócitos grandes granulares T Tal como os restantes LT, os LGL-T normais expressam o complexo CD3/TCR na membrana (α/β ou γ/δ). No sangue periférico normal a maioria das LGL-T são LGL-T α/β de tipo CD8 (expressão forte de CD8, resultante da presença de heterodímeros αβ desta molécula), embora também seja relativamente frequente encontrar LGL-T α/β CD4 e, mais raramente, pequenas populações de LGL-T α/β sem expressão de CD4 nem de CD8, ou com expressão fraca deste último co-receptor. Já os LGL-T γ/δ são geralmente CD4-CD8-/+fraco (expressão fraca de CD8 resultante da presença de homodímeros α/α desta molécula). Tal como acontece em geral nos LT que sofreram estimulação antigénica prévia, os LGL-T apresentam uma expressão forte e homogénea do complexo CD11a/CD18 (molécula de adesão pan-leucocitária) e de CD2, enquanto a expressão de CD7 é fraca e heterogénea, podendo este receptor deixar de ser expresso na superfície de parte das células, um fenómeno que é mais frequente nos LGL-T α/β CD4 do que nos LGL-T α/β CD8 e nos LGL-T γ/δ. Também é frequente que os LGL-T apresentem uma expressão diminuída de CD5, sendo esta diminuição mais acentuada nos LGL-T α/β CD8 e nos LGL-T γ/δ do que nos LGL-T α/β CD4. Uma das principais características fenotípicas que distingue os LGL-T dos restantes LT é a ausência de expressão na membrana dos receptores de co-estimulação (CD26, CD27 e CD28), a que se associa um perfil variável de expressão de moléculas associadas a funções de adesão e/ou citotoxicidade, como o CD11b, o CD11c, o CD16, o CD56 e o CD57. A expressão de CD57 é muito frequente, sendo considerada um marcador de diferenciação terminal e de senescência. Já a expressão de CD56 (NCAM, neural cell adhesion molecule) e mais variável. A expressão dos receptores para o complemento, CD11b/CD18 (CR3) e de CD11c/CD18 (CR4) é também variável, sendo geralmente observada apenas numa pequena fracção das LGL de tipo T α/β CD4 (no caso do CD11b) e de tipo T α/β CD8 e T γ/δ (no caso do CD11c). Leucemias de linfócitos grandes granulares T Embora mantenham muitas características fenotípicas comuns aos LGL-T normais, entre as quais a ausência de expressão de CD26, CD27 e CD28, e a expressão dos marcadores de células citotóxicas acima descritos, as LGL-T monoclonais de doentes com LLGL-T apresentam com frequência aberrações fenotípicas, quando comparadas com as LGL-T correspondentes do sangue periférico normal. Entre estas salientamos uma expressão diminuída de CD2 e uma diminuição mais acentuada do que é habitual na intensidade de expressão de CD5 e de CD7, podendo mesmo haver ausência de expressão destas moléculas na membrana. Mais raramente, pode existir diminuição da intensidade de expressão de CD3 e de CD4 ou CD8, conforme o caso. Tal como nos LGL-T normais, nas LLGL-T raramente se observa expressão de CD16, com excepção para as LLGL-T γ/δ onde a expressão de CD16 ocorre com alguma frequência. Nas LLGL-T α/β CD8 a expressão de CD11c é geralmente mais forte e mais homogénea do que a observada nos LGL-T α/β CD8 normais, ocorrendo o inverso com a expressão de CD57 (Figura 3) e o mesmo acontece nas LLGL-T CD4 (Figura 4). Pelo contrário, nas LLGL-T α/β CD4 não se observa expressão de CD11c, sendo relativamente frequente a expressão de CD11b, geralmente fraca e heterogénea (Figura 5). De forma idêntica ao que acontece nos LGL-T α/β CD4 normais, os LGL-T α/β CD4 monoclonais podem apresentar co-expressão de CD8
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TEXTO LIVRE (dímeros CD8 αα na membrana), geralmente numa fracção variável de células e com intensidade fraca e heterogénea. É também frequente que as células das LLGL-T α/β CD4 co-expressem CD56 e CD57, geralmente com predomínio de expressão de CD56, ao contrário do que acontece nos LGL-T αβ CD4 normais em que predomina a expressão de CD57. A expressão das isoformas do antigénio pan-leucocitário CD45, CD45RA e CD45RO, é variável, sendo o padrão CD45RA+/CD45RO- mais frequentemente encontrado nas LLGL-T α/β CD8 e nas LLGL T γ/δ, enquanto nas LLGL-T α/β CD4 é relativamente frequente a co-expressão destas moléculas. Em qualquer dos casos, é muito frequente a expressão de algumas moléculas relacionadas com a activação dos LT, como por exemplo de HLA-DR, mas não de outras, como por exemplo o CD25 (receptor da IL2 com afinidade intermédia).
β CD8 (vermelho: LGL- T α/β β CD8 Figura 3. Perfil imunofenotípico característico de uma LLGL-T α/β β CD8 normais; cinzento: restantes leucócitos do sangue periférico). anormais; verde: LT α/β
β CD4 (vermelho: LGL- T α/β β Figura 4. Perfil imunofenotípico característico de uma LLGL-T α/β β CD4 normais; cinzento: restantes leucócitos do sangue periférico). CD4 anormais; verde: LT α/β
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Figura 5. Perfil imunofenotípico característico de uma LLGL-T gama/delta (vermelho: LGL-T γ/δδ β CD4 e CD8 normais; cinzento: restantes leucócitos do sangue periférico). anormais; verde: LT α/β
O estudo do repertório de famílias de regiões variáveis das cadeias α e β ou γ e δ do TCR pode ser útil para documentar o carácter monoclonal ou oligoclonal das expansões de LGL, sobretudo quando permite detectar a família ou famílias expandidas, respectivamente (Figura 6).
β13.1 nos LGL-T CD4 monoclonais de um doente com LLGL-T Figura 6. Expressão da família TCR-Vβ αβ CD4 (cor de rosa: LGL-T α/β CD4 monoclonais; azul: restantes LT α/β CD4).
Linfócitos grandes granulares NK No sangue periférico normal distinguem-se habitualmente duas populações de CNK, com base na intensidade de expressão de CD56: uma maioritária, que se caracteriza pela expressão de CD56 com intensidade mais fraca (CD56+, cerca de 90 por cento das CNK circulantes) e outra minoritária, com expressão mais forte desta molécula de adesão (CD56++, cerca de 10 por cento das CNK circulantes). Estas populações de CNK correspondem provavelmente a estádios distintos da diferenciação das CNK, diferindo em numerosos aspectos, quer do ponto de vista fenotípico quer do ponto de vista funcional. As CNK CD56+ são células citotóxicas, enquanto as CNK CD56++ são fundamentalmente células reguladoras, capazes de produzir grandes quantidades de citocinas.
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TEXTO LIVRE Uma das diferenças fenotípicas mais relevantes consiste na expressão diferencial de CD16, o receptor para o fragmento Fc da IgG (FcγRIII), envolvido na citotoxicidade mediada por anticorpos (ADCC, antibody dependent cell cytotoxicity): enquanto a maioria das CNK CD56+ expressa CD16, apenas uma pequena fracção das CNK CD56++ expressa esta molécula. Além disso, estas duas populações de CNK diferem na expressão de numerosas moléculas, incluindo moléculas envolvidas na adesão das CNK às células-alvo, na activação das CNK, na citotoxicidade mediada pelas CNK e na migração das CNK para os diferentes órgão e tecidos (Figura 7).
Figura 7. Dot plots ilustrativos do perfil fenotípico das principais populações de CNK do sangue periférico normal (CD56+CD16+, ponto vermelhos; CD56++CD16-/+, pontos azuis).
Leucemias de linfócitos grandes granulares NK Tal como as LLGL-T, as LLGL-NK evidenciam frequentemente um fenótipo anormal, distinto do encontrado nas CNK normais. Uma das características fenotípicas mais frequentemente encontradas é diminuição acentuada da expressão de CD56 na membrana das CNK monoclonais (Figura 8).
Figura 8. Dot plots ilustrativos da diminuição de expressão de CD56 nas CNK monoclonais de um doente com LLGL-NK CD56-/+fraco.
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TEXTO LIVRE Outras alterações fenotípicas frequentes são a expressão forte e homogénea de CD11c, com expressão fraca e heterogénea de CD57 em parte das CNK, a diminuição ou ausência de expressão de CD11b com expressão de CD38 e a expressão forte e homogénea de CD94, entre outras (Figura 9).
Figura 9. Perfil imunofenotípico característico de uma LLGL-NK CD56-/+fraco (vermelho: LGL-NK anormais; cinzento: restantes leucócitos do sangue periférico).
Genética molecular Estudo da clonalidade dos linfócitos T O rearranjo dos genes que codificam para as cadeias alfa, beta, gama e delta do TCR pode ser estudado por técnicas de genética molecular, por Southern blotting (método tradicional, actualmente em desuso) ou por técnicas de reacção em cadeia da polimerase do ADN (PCR, polimerase chain reaction) usando primers específicos, seguida de análise do tamanho dos fragmentos por técnicas de alta resolução (GeneScan) (Figura 10). A análise por GeneScan permite a identificação (com base no tamanho, avaliado em pares de bases) e quantificação (com base na intensidade de fluorescência) de fragmentos obtidos por PCR cujo tamanho difere apenas em 1 par de bases. No tecido linfóide normal a distribuição do tamanho dos fragmentos amplificados é de tipo gaussiano (Figura 10, painel A). Nos infiltrados linfóides reactivos é frequente observar 3 ou mais picos co-dominantes, correspondentes a expansões oligoclonais de LT (Figura 10, painel B). Nas neoplasias de células T observa-se geralmente um pico dominante que indica a presença de LT monoclonais, com background policlonal (Figura 10, painel C) ou sem ele (Figura 10, painel D), conforme a representação de LT tumorais e de LT normais residuais na amostra.
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Figura 10. Análise do tamanho dos produtos de amplificação por PCR do gene TCRG por GeneScan. A) Tecido linfóide normal: padrão policlonal; B) tecido linfóide reactivo: padrão oligoclonal; C) neoplasia de células T: pico monoclonal em background policlonal; D) neoplasia de células T: pico monoclonal.
Estudo da clonalidade das células NK Os testes de inactivação do cromossoma X, nomeadamente o teste de HUMARA, (Human Androgen Receptor Assay) são úteis para avaliar a clonalidade das CNK, mas exigem sorting das CNK pressupostamente clonais e a sua utilização é restrita aos indivíduos do sexo feminino, o que são factores limitativos. Citogenética Apenas uma minoria dos doentes com LLGL tem apresenta alterações cromossómicas e estas não são recorrentes, pelo que o estudo citogenético não é útil para o diagnóstico destas DLP. No entanto, quando a doença evolui para formas mais agressivas podem surgir alterações cromossómicas complexas. Etiopatogenia e fisiopatologia Nos últimos anos ocorreram numerosos progressos na compreensão dos mecanismos subjacentes à génese das DLP de LGL, que são hoje entendidas como tendo origem na resposta dos CTL e das CNK a antigénios, com interferência na transmissão de sinais intracelulares e perturbação dos mecanismos que conduzem à morte celular por apoptose, o que confere a estas células vantagem e determina a sua acumulação e/ou proliferação. No entanto, as bases moleculares e os mecanismos fisiopatológicos subjacentes ainda não estão bem esclarecidos. Doenças linfoproliferativas de LGL e infecções víricas Embora os antigénios que estão na base das proliferações de LGL sejam na maioria dos casos desconhecidos, em alguns casos há evidência de infecção vírica crónica.
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TEXTO LIVRE Nos países asiáticos estão descritas expansões crónicas de CNK causadas pelo vírus Epstein-Barr (EBV). Algumas das LLGL-NK que tivemos oportunidade de estudar associavam-se à infecção pelo ou pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Já no que respeita às LLGL-T α/β CD4, demonstramos que alguns casos podem ter relação com infecção prévia por citomegalovirus (CMV). Bases genéticas e moleculares das leucemias de LGL Vários genes e moléculas têm sido relatados como sendo anormalmente expressos nas LLGL. No entanto, não foram estabelecidas correlações com os diferentes subtipos de leucemias, nem com as manifestações clínicas associadas. Moléculas envolvidas na apoptose: A desregulação da apoptose parece ser o mecanismo mais importante envolvido na patogenia das LLGL. Ao contrário das LGL normais, as LGL monoclonais escapam à apoptose mediada pela interacção entre o Fas e o seu ligando, FasL. Tal pode ser parcialmente explicado pelo facto destas células terem níveis elevados de FLIP (FLICE-inhibitory protein). Para além disso, os LGL monoclonais têm uma desregulação dos sinais apoptóticos mediados esfingolípidos. Vias de transdução de sinal, factores de transcrição e sobrevivência das LGL: A IL-15 e o PDGF (platelet-derived growth factor) parecem actuar com factores promotores da sobrevivência das LGL monoclonais, ao mesmo tempo que desregulação das vias de transdução e de transcrição de sinais intracelulares, como um aumento de activação das vias SFK/PI3K/AKT e RAS/ERK/MAPK e da STAT3 evitam a apoptose e prolongam a sobrevida destas células. Moléculas citotóxicas: Nas LLGL há um aumento de expressão de genes que codificam para proteases envolvidas nas funções citotóxicas, ao mesmo tempo que existe diminuição de expressão de genes que codificam para inibidores dessas proteases. Moléculas co-estimuladoras e moléculas inibidoras dos LT: O equilíbrio entre a expressão de moléculas co-estimuladoras (CD28 e CD279/ICOS) e inibidoras (CD152/CTLA-4 e CD278/PD-1) é determinante para a regulação da resposta imune mediada pelos LT, mas estes aspectos foram ainda pouco explorados nas LLGL. Receptores das quimiocinas (RQC): Os RQC estão envolvidos no homing dos linfócitos (e de outras células) para os órgãos linfóides e na sua para a migração para os tecidos inflamados. Os LGL-T expressam os RQC envolvidos na resposta imune tipo Th1, como o CCR5 (CD195) e o CXCR3 (CD193), e receptores para quimiocinas inflamatórias, como o CXCR1 (CD181) e o CXCR2 (CD182). Pelo contrário, é uma constante a ausência de expressão de receptores envolvidos no homing para os órgãos linfóides secundários, como o CCR7 (CD197) e a Selectina L (CD62L), e para o tecido linfóide associado à pele e às mucosas. Daí estas células não terem apetência natural para infiltrar os gânglios linfáticos. Receptores killer (KR, killer receptors): Nas LGL-T é frequente detectar a expressão de KR da família das Igs (KIR, killer immunoglobulin-like receptors) (ex. CD158) e do tipo das lectinas (KLR, killer lectin type receptors) (ex. CD94, CD161) e,
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TEXTO LIVRE no caso das CNK, também de receptores de citotoxicidade natural (NCR, natural cytotoxicity receptors) (ex. CD335, CD336 e CD337). Nas LLGL há frequentemente evidência de um desequilíbrio na expressão destes receptores, o que pode estar na base de uma resposta citotóxica patológica e de manifestações associadas à doença. Citocinas: As LGL produzem citocinas de tipo Th1 (IFN-γ, TNF-α e em menor quantidade IL-2) (Figura 11), assim como de quimiocinas pro-inflamatórias, como o CCL5 (RANTES), o CCL4 (MIP-1beta) e a IL-18.
Figura 11. Produção de citocinas pelos LGL CD4 monoclonais de doentes com LLGL-T αβ CD4, após estimulação in vitro com PMA e Ionomicina.
Determinantes imunogenéticos: As doenças imunológicas têm em geral fenótipos complexos influenciados por múltiplos factores genéticos e ambientais. Assim, é razoável supor que estudos de imunogenética possam dar uma contribuição importante para a contribuição da fisiopatologia da LGLL. Foram descritos vários factores imunogenéticos predisponentes das doenças autoimunes e de quadros de falência medular, com contribuições variáveis de genes do Complexo Maior de Histocompatibilidade (MHC) e de múltiplos genes não-MHC. Para além disso, vários estudos demonstraram a importância da interacção entre os KIR e os seus ligandos HLA em diversas condições patológicas. Apesar disso, a contribuição destes factores para a biologia e para as manifestações clínicas das LGL não é clara. Foram descritas algumas associações entre as LLGL e determinados haplótipos HLA-A, -B e -C, ao mesmo tempo que a genotipagem dos KIR e dos respectivos ligandos HLA (KIR-L) revelou incompatibilidades KIR/KIR-L. Foi também observada a associação entre determinados polimorfismos dos genes que codificam para o TNF-α (tumor necrosis factor-alpha), a IL-10 (interleucina 10), e o CTLA-4. Fisiopatologia da citopenias É importante compreender os mecanismos responsáveis pelas citopenias associadas às LLGL, porque as infecções relacionadas com a neutropenia e a anemia sintomática constituem os problemas clínicos mais relevantes nestes doentes. O grau de infiltração medular raramente explica as citopenias associadas às LLGL, que podem ter causas múltiplas incluindo destruição periférica dos neutrófilos
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TEXTO LIVRE mediada por auto-anticorpos, efeito supressor da hematopoiese mediado por citocinas pro-inflamatórias produzidas pelos LGL e/ou actividade citotóxica directa das LGL sobre os neutrófilos, eritrócitos e/ou plaquetas (Quadro 1). Quadro 1. Mecanismo potencialmente envolvidos na génese das citopenias associadas às LLGL
Manifestações clínicas As LLGL são, tal como as DLP de LGL em geral, observadas em todas as faixas etárias, embora sejam mais prevalentes nos idosos. Em geral, manifestam-se habitualmente por linfocitose moderada associada a citopenias de tipo e gravidade variáveis e podem ser encontradas em associação com outras doenças, nomeadamente a doenças auto-imunes, síndromes de falência medular, doenças inflamatórias ou infecciosas crónicas e neoplasias. No entanto, em muitos casos não há evidência de patologias associadas, sendo frequente a sua apresentação na forma de linfocitose isolada ou associada a citopenias. Deve suspeitar-se do diagnóstico em todos os doentes com citopenias persistentes de causa não esclarecida, com aumento da representação de LGL no sangue periférico, por critérios morfológicos ou imunofenotípicos. Para a confirmação é necessário demonstrar o carácter monoclonal da proliferação de LGL, por critérios imunofenotípicos e/ou moleculares. As DLP de LGL-T α/β CD8 manifestam-se frequentemente por citopenias e podem associar-se a outras patologias. Em cerca de 80 por cento dos casos é detectada neutropenia, ocorrendo anemia em cerca de 50 por cento e trombocitopenia em 20 por cento dos casos. Cerca de metade dos doentes têm esplenomegalia e 25 por cento têm hepatomegalia. A contagem de linfócitos pode ser normal, aumentada ou até mesmo diminuída, sendo raro observar linfocitose acentuada. Em muitos doentes é observada disfunção das células B, que se pode traduzir de diversas formas: hipo ou hipergamaglobulinemia, gamapatia monoclonal, auto-anticorpos,
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TEXTO LIVRE imunocomplexos circulantes, etc. As infecções recorrentes relacionadas com a neutropenia crónica e os sintomas relacionados com a anemia são os principais problemas clínicos e determinam a necessidade de intervenção terapêutica em mais de 50 por cento dos doentes. Entre as doenças associadas salientam-se as patologias auto-imunes, como a artrite reumatóide, síndromes de falência medular, quadros infecciosos e inflamatórios crónicos. As LLGL de LT γ/δ e de CNK têm uma apresentação clínica relativamente similar às LLGL de LT α/β CD8. Pelo contrário, nas LLGL de LT α/β CD4+ os doentes não apresentam citopenias nem fenómenos auto-imunes; nestes casos é frequente a associação com outras neoplasias, hematológicas ou não hematológicas. Nas LLGL-NK é também relativamente frequente a associação com outras neoplasias, provavelmente em consequência da actividade citotóxica anti-tumoral deficiente das CNK leucémicas. A maioria das LLGL tem um curso clínico crónico e bom prognóstico, sendo a sobrevida média dos doentes superior a 10 anos. Quer a linfocitose quer as citopenias podem flutuar ao longo do tempo e, ocasionalmente, pode observar-se remissão espontânea da doença. No entanto, em casos raros pode ocorrer transformação em doença mais agressiva, provavelmente em resultado de evolução clonal, com aquisição de alterações citogenéticas e modificação da expressão génica. Nestes casos, a linfocitose pode progredir rapidamente e ocorrer infiltração de órgãos (Figura 12).
Figura 12. Evolução dos parâmetros hematológicos de um doente com LLGL-NK associada a episódios de trombocitopenia autoimune que sofreu transformação da doença alguns anos após o diagnóstico, com progressão da linfocitose e infiltração pulmonar, que condicionaram a morte. Para além dos episódios de trombocitopenia grave e de infecções de repetição associadas à neutropenia, o doente teve duas neoplasias não hematológicas (carcinoma da próstata e carcinoma da bexiga).
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TEXTO LIVRE Tratamento Têm sido preconizadas várias abordagens terapêuticas para as LLGL. As indicações para o tratamento incluem a neutropenia severa com infecções de repetição, a anemia sintomática com necessidade de transfusão e, mais raramente a trombocitopenia grave. Excepcionalmente, a necessidade de tratamento advém de sinais de progressão da doença com aumento progressivo da linfocitose, evidência de infiltração de órgãos e/ou sintomas B. Os fármacos imunosupressores administrados por via oral, como a ciclosporina A (5-10 mg/kg/dia), o metotrexato (5-10 mg/m2/semana) e a ciclofosfamida em baixa dose (50-100 mg/dia), são os tratamentos mais frequentemente usados e geralmente são eficazes no controlo das citopenias associadas às LLGL-T, embora menos eficazes nas citopenias associadas às LLGL-NK. Na nossa experiência, a ciclosporina A é muito eficaz no controlo da neutropenia associada às LLGL-T, devendo a dose ser ajustada de forma a obter o efeito desejado com o mínimo de efeitos colaterais. Os factores de crescimento, em particular o G-CSF (granulocyte-colony stimulating factor), são úteis na abordagem inicial do doente infectado com neutropenia severa e, em alguns casos, o tratamento com G-CSF em baixa dose (300 g, subcutâneo, 2 a 3 vezes por semana) é suficiente para manter a contagem de neutrófilos normal. A esplenectomia pode ser considerada nos doentes refractários ao tratamento que apresentam esplenomegalia acentuada e citopenias severas, mas não é observada resposta em todos os casos e há relatos de agravamento da linfocitose pós-esplenectomia. Os análogos das purinas (fludarabina, pentostatina, cladribina, etc.), são alternativas potenciais para os raros casos de LLGL que necessitam de terapêutica mais agressiva, tendo sido publicados casos com resposta, mas o número de doentes tratados com estes fármacos é muito pequeno. As LGLL que progridem têm um comportamento clínico agressivo, com aumento progressivo da linfocitose e evidência de infiltração de órgãos ou tecidos, são geralmente refractárias ao tratamento. Os esquemas de quimioterapia convencional (CVP, CHOP) são ineficazes e praticamente não existe experiência com os esquemas alternativos testados nos linfomas de células T periféricas (ex. gemcitabina, doxorrubicina lipossómica, etc.) e nas leucemias agressivas de células NK (ex. esquemas com L-asparaginase). O anticorpo monoclonal, anti-CD52 (Campath-1H) foi usado em casos esporádicos com resultados variáveis; outros anticorpos monoclonais (anti-CD122, anti-CD2, etc.) e outros fármacos (ex. inibidores da farnesil-transferase) poderão vir a ser considerados no futuro em casos muito seleccionados, se os ensaios clínicos vierem a comprovar o seu efeito terapêutico neste tipo de DLP.
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TEXTO LIVRE Agradecimentos: A todos os colegas que contribuíram para a experiência do Serviço de Hematologia Clínica do CHP no diagnóstico, tratamento e seguimento de doenças linfoproliferativas / neoplasias de linfócitos T e de células NK, enviando amostras para estudo no Laboratório de Citometria e/ou referenciando os seus doentes.
Figura 13. Profissionais e estagiários do Laboratório de Citometria do Serviço de Hematologia Clínica do Hospital de Santo António, Centro Hospitalar do Porto, 2011.
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Centro Hospitalar de São João
Serviço de Hematologia Clínica
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ENTREVISTA
“Precisávamos de ter uma investigação mais pujante” O excesso de trabalho clínico não permite maior investimento na investigação. Por outro lado, os incentivos são escassos, principalmente do ponto de vista hospitalar. Devia haver, na opinião de José Eduardo Guimarães, um esforço global.
Prof. Doutor José Eduardo Guimarães
Começamos pelos dados estatísticos… Qual o número total de doentes com Leucemia neste serviço, bem como o número de novos doentes, número de doentes a serem seguidos e o número de doentes internados, por ano? Em termos de leucemias agudas temos cerca de 60-70 novos doentes por ano, das quais 10/12 são leucemias linfoblásticas. Há maior prevalência de doentes acima dos 60 anos, embora também haja doentes mais jovens. No caso das leucemias crónicas temos, por ano, cerca de 30-40 novos casos, com maior prevalência de leucemia linfóide crónica. Muitos casos de leucemia linfóide crónica não são tratados nas fases iniciais, sendo os doentes apenas sujeitos a vigilância. Em regra, os doentes são seguidos em ambulatório. As leucemias agudas são internadas sempre que se justifica, nomeadamente para fazerem quimioterapia intensiva. Em certas circunstâncias podem ser seguidas também em regime ambulatório. Perante esses dados há ideia de que haja aumento na incidência das Leucemias? Não, são dados semelhantes aos dos outros centros nacionais e mesmo a nível internacional. Não tenho ideia de que tenha havido qualquer aumento. Dos vários tipos de leucemias, qual a mais prevalente? Qual a mais frequente neste serviço? As mais prevalentes, em termos globais, são as crónicas. Mas no nosso Serviço, teremos provavelmente mais leucemias agudas, por o Hospital de São João ser um centro de referência para esta patologia. Dentro das leucemias agudas - só tratamos adultos - há uma proporção de 5/1 da leucemia mielóide aguda para a leucemia linfoblástica.
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ENTREVISTA Os tratamentos disponíveis neste serviço estão ao nível do resto do país e Europa? Sim, são semelhantes. Em qualquer dos tipos de leucemia seguimos os protocolos estabelecidos pela EORTC, do qual somos membros activos (do Leukemia Group). Neste momento estamos a seguir um protocolo para as leucemias linfoblásticas, também da EORTC e do grupo cooperativo holandês HOVON. Que evolução têm tido as terapêuticas nesta área? Não tem havido uma evolução decisiva. Desde o grande salto que se deu no tratamento da leucemia promielocítica nos anos 80 pode-se dizer que não houve nenhuma evolução fulgurante no tratamento das leucemias agudas. Tem havido melhoria nos cuidados de suporte e uma melhor identificação dos grupos de risco. Por outro lado, o transplante tem melhorado as taxas de sobrevivência nos doentes jovens (inferiores a 50/60 anos). Para os doentes mais idosos não tem havido uma evolução significativa nesta área. Acha que isso se deve aos facto de a doença ser pouco prevalente? Não, porque ela é mais frequente nos idosos, mas mesmo nos idosos é preciso fazer alguma clivagem ou distinção entre doentes com mais ou menos de 70 anos. Isto porque, os doentes acima dos 70 anos raramente têm condições para fazer quimioterapia intensiva devido ao estado geral e às comorbilidades. Até essa idade faz-se muitas vezes transplante autólogo e há muito quem faça transplante alogénico de intensidade reduzida. Nesse grupo entre os 60 e os 70 não houve uma melhoria espectacular mas, apesar de tudo, a situação não é muito má. Acima dos 70, principalmente nos grupos com citogenética de mau prognóstico não tem havido qualquer evolução. Como é feita a monitorização/follow-up dos doentes em tratamento? Normalmente os doentes com leucemia mielóide aguda não têm manutenção, excepto os com leucemia promielocítica que são um caso à parte. Faz-se terapêutica de indução e depois, se obtida remissão completa, ciclos de consolidação e/ou transplante, alogénico ou autólogo. Finda a terapêutica, os doentes são seguidos com intervalos aproximadamente mensais, que se vão alargando com o tempo e a confiança no estado do doente. O especialista analisa clinicamente o doente e solicita os exames laboratoriais necessários (hemograma e mielograma) para uma correcta avaliação. Os doentes com leucemia linfoblástica têm de fazer manutenção, se não forem referenciados para transplante, e isso implica uma vigilância apertada durante 2 anos. Que principais dificuldades existem no tratamento destes doentes (se as há)? Temos as dificuldades que todos os outros serviços têm… gostava de curar todos os doentes, mas não é possível, pois nem sempre a terapêutica é curativa. Os doentes com leucemias agudas são tratados em internamento. Ponto final. Os doentes com leucemias crónicas são internados muito pouco frequentemente: os doentes com leucemia mielóide crónica só muito raramente - se evoluírem para
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ENTREVISTA fase blástica - e os com leucemia linfóide crónica são doentes muitas vezes imunodeprimidos, ou em fases terminais da doença e, por isso, se tiverem intercorrências, poderão ter de ser tratados em internamento. Como é feita a ligação com o laboratório? O laboratório é do nosso Serviço, portanto a ligação é fácil e directa. Portanto, tudo é feito no vosso laboratório? Praticamente tudo. Morfologia, citoquímica, citogenética, citogenética molecular (FISH) e biologia molecular é tudo feito aqui. Há algumas provas de biologia molecular, menos frequentes, em que achámos que não valia a pena investir por não ser rentável executá-las e essas são feitas fora. Mas a generalidade das provas são feitas internamente. Na sua opinião o que tem de ser desenvolvido nesta área para colmatar falhas que existam? Neste momento o que é triste é que não se tenha avançado mais no tratamento da leucemia mielóide aguda e que a taxa de sobrevivência seja apenas de cerca de 50 por cento em indivíduos jovens e de 20 por cento nos doentes com mais de 60 anos. Mas obviamente é uma área em que está em curso muita investigação e muita pesquisa e esperamos que se consigam terapêuticas mais dirigidas e específicas. A leucemia promielocítica, por exemplo, foi um desses casos de sucesso de investigação. Hoje curamos 80 por cento dos doentes com esta forma de doença. Esperamos, portanto, que possa surgir um tratamento que mude a face desta doença. Nós seguimos tudo o que há disponível em termos terapêuticos, como acontece em qualquer país desenvolvido. Temos uma equipa magnífica, quer na área médica quer de enfermagem, mas precisávamos de ter uma investigação mais pujante. E isso não é conseguido porquê? Por um lado porque as pessoas estão muito sobrecarregadas com a rotina clínica, por outro porque no período de dois anos perdemos quatro especialistas que não foram substituídos. Temos neste momento um excelente grupo de internos e seria óptimo que todos, ou parte deles, pudessem ficar no Serviço, até porque é previsível que alguns médicos se reformem nos anos mais próximos. O excesso de trabalho clínico deixa as pessoas com pouco tempo disponível. No entanto, é preciso notar que falta alguma cultura de investigação: que as pessoas gostem, façam e sejam premiadas por isso. Em Portugal isso não acontece muito. Por vezes sucede que o prémio de fazer investigação é uma carreira académica, mas do ponto de vista hospitalar os incentivos são escassos. Devia haver um esforço global para que houvesse mais investigação na saúde porque esta é necessária também para um correcto tratamento e follow-up dos doentes.
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LEUCEMIAS AGUDAS Por José Eduardo Guimarães, Director do Serviço de Hematologia Clínica As leucemias agudas continuam a ser a patologia que coloca mais desafios e que comporta maior exigência de entre todas as doenças hemato-oncológicas. As leucemias crónicas, como o seu nome indica, têm um curso arrastado e podem ser controladas em ambulatório durante longos períodos de tempo. Já no que se refere às leucemias agudas, a premência de tratamento imediato, a complexidade do mesmo, a estreita margem terapêutica disponível, a ocorrência quase inevitável de complicações - multi-orgânicas, mas com predomínio de intercorrências infecciosas - resultantes da quimioterapia intensiva e da aplasia induzida por esta transformam-na sempre numa situação grave, que deve ter diagnóstico pronto e tratamento urgente em unidade especializada dotada de todos os recursos humanos e físicos para o efeito. No Serviço de Hematologia Clínica do Hospital São João estes doentes são, em regra geral, tratados em quartos de isolamento (16) com ar filtrado sob pressão positiva numa das duas unidades do Serviço com essa missão. O diagnóstico (citologia, citoquímica, citogenética, FISH, biologia molecular) é feito maioritariamente no nosso Laboratório, pois apenas a citometria de fluxo é realizada no Serviço de Patologia Clinica. Na última revisão que fizemos sobre leucemia mielóide aguda (LMA), entre Janeiro de 2005 e Dezembro de 2010, foram admitidos no Hospital São João 308 doentes com LMA, dos quais 163 com idade superior a 60 anos. Desses 308 doentes, 60 tinham leucemia aguda promielocítica (LAP), tendo 44 idade igual ou inferior a 60 anos. Dos doentes com LMA não M3 (248), 147 tinham idade superior a 60 anos e 101 idade igual ou inferior a 60 anos. Deste últimos, 94 iniciaram tratamento de indução com quimioterapia intensiva. Relativamente à estratificação prognóstica por citogenética, 50.6 por cento dos doentes tinham cariótipo normal e 49.4 por cento com alterações, sendo 8.9 por cento leucemias CBF ("core binding factor"). A esmagadora maioria destes 94 doentes foram tratados com o protocolo AML-12 da EORTC (apenas dois doentes jovens foram tratados com o protocolo pediátrico ELAM02), tendo sido randomizados para o estudo 34 doentes. O protocolo AML-12 compreende uma indução com três fármacos (Daunorubicina, Etoposídeo e Citarabina) e uma consolidação com Dauno e ARA-C. Posteriormente, os doentes foram estratificados para alotransplante (38) - se tinham dador familiar - ou autotransplante (20)/2ª consolidação (19) sendo estes randomizados para receber (ou não) IL2. Houve 4.3 por cento de mortes na indução e 87.2 por cento atingiram remissão completa (RC). Aos quatro anos a sobrevivência global é de 41.9 por cento e a sobrevivência livre de doença de 38.2 por cento; as medianas da sobrevivência global e da sobrevivência livre de doença são respectivamente 34.3 e de 24.3 meses.
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TEXTO LIVRE Relativamente aos 147 doentes com mais de 60 anos, havia um predomínio do sexo feminino (61.9%), a mediana de idades era de 71 anos e 24.5 por cento dos doentes tinham leucemia secundária a SMD ou SMP; 47.5 por cento dos doentes tinham cariótipo normal e 43.8 por cento com alterações. Só 53 doentes foram elegíveis para quimioterapia intensiva (protocolo AML-17 da EORTC); os restantes só fizeram tratamento de suporte ou faleceram antes de iniciar terapêutica. O protolocolo AML-17 (foram randomizados 12 doentes) consiste em indução MICE +/- Mylotarg e de 2 ciclos de consolidação mini-ICE +/- Mylotarg (os doentes não randomizados fizeram o ramo não investigacional, sem Mylotarg). Dos 51 doentes tratados intensivamente, 32 (62.7%) entraram em RC, com 8 (15.7%) mortes na indução e 11 (21.6%) refractários. Aos 4 anos, a sobrevivência livre de doença é de 29.7 por cento e a sobrevivência global de 19.8 por cento. As medianas de sobrevivência foram respectivamente de 14.8 e 9.5 meses. No que respeita à LAP, 53 dos 60 doentes iniciaram terapêutica com os protocolos ATRA/IDA (EORTC) e posteriormente AIDA 2000 (GINEMA), ambos com indução ATRA+IDA, 3 consolidações e manutenção (os doentes de alto risco AIDA também fizeram profilaxia do SNC). Faleceram 6 doentes (11.3%) na indução e 47 (88.7%) obtiveram RC tendo recaído posteriormente 6 (12.8%). Aos 3 anos, a sobrevivência livre de doença é de 79.1 por cento e a sobrevivência global de 71.1 por cento. A mediana das sobrevivências não foi ainda atingida. Como referi inicialmente, o tratamento das leucemias agudas continua a ser frustrante em muitas áreas, nomeadamente nos doentes idosos em que muito pouco se evoluiu nos últimos 20 ou 30 anos. Contudo, os avanços conseguidos na LAP - onde hoje em dia curamos cerca de ¾ dos doentes - e das leucemias CBF - com sobrevivências de longo prazo idênticas àquela - deixam no ar a esperança de que tratamentos mais específicos e mais dirigidos possam vir a ser descobertos, de modo a curar um número cada vez maior de doentes com esta patologia. Serviço de Hematologia Clínica do Hospital São João Médicos Enfermeiras-Chefe Laboratório Joaquim Andrade (responsável do Ambulatório) Graça Duarte (UDN) Paula Gomes (responsável Fernando Príncipe (responsável da UDN) Matilde Amaral (UHO) do Laboratório e Citogenética) Alice Costa Maria Luís Amorim (Biologia Maria José Silva Molecular) Fernanda Trigo (responsável da UHO) Maria José Soares (FISH) Fátima Ferreira Aida Barbosa Manuela Brochado (responsável do Hospital de Cláudia Santos Dia) Joana Martins Ana Carneiro Mariana Lopes Jorge Pires Lucília Marques Rita Duarte Manuel Sobrinho Simões José Eduardo Guimarães (director do Serviço)
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Instituto Português de Oncologia Porto
Serviço de Onco-Hematologia
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ENTREVISTA
“A maior dificuldade que encontramos é a resistência das células aos fármacos que temos disponíveis” Poder conseguir oferecer aos doentes com leucemia aquilo que existe para oferecer é uma mais-valia. O problema, para Mário Mariz, é quando não existe muito para oferecer. Dr. Mário Mariz
Começamos pelos dados estatísticos… Qual o número total de doentes com Leucemia neste serviço, bem como o número de novos doentes, número de doentes a serem seguidos e o número de doentes internados, por ano? Em 2011 o Serviço admitiu 46 novos doentes com o diagnóstico de leucemia aguda e 49 doentes com o diagnóstico de leucemia crónica. As leucemias agudas foram predominantemente da linhagem mielóide e as leucemias crónicas da linhagem linfóide. A proveniência dos doentes com leucemia é variável: no caso das leucemias agudas a maioria dos doentes é referenciada através da urgência de outros hospitais, onde recorre por sintomas agudos, e no caso das leucemias crónicas é maioritariamente referenciada pelo médico assistente do doente, habitualmente dos Centros de Saúde. Os doentes com leucemia aguda são, regra geral, admitidos de urgência na unidade de internamento e os doentes com leucemia crónica são admitidos na unidade de ambulatório após marcação de consulta. O tratamento das leucemias agudas é realizado com recurso ao internamento uma vez que os doentes necessitam de grande suporte médico como seja o recurso a múltiplas transfusões de sangue, a antibióticos e a medidas de isolamento. O tratamento das leucemias crónicas, quando necessário - nem todos os doentes com leucemia crónica têm necessidade em realizar tratamento - pode ser feito no ambulatório, com recurso ao Hospital de Dia. E não existe tratamento curativo? Existe. Regra geral, as leucemias agudas são potencialmente curáveis e as leucemias crónicas, nomeadamente as de linhagem linfóide são incuráveis. Isto não
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ENTREVISTA significa que o prognóstico da leucemia crónica é necessariamente pior que o da leucemia aguda. Uma percentagem significativa dos doentes com leucemia crónica pode nunca ter necessidade de fazer qualquer tratamento específico. E como é o prognóstico? O prognóstico dos doentes com leucemia depende de vários factores: da idade do doente, do estado geral do doente, nomeadamente da existência ou não de outras doenças concomitantes à leucemia, e de determinadas características de cada leucemia que podem ser determinados no laboratório, por exemplo, através da determinação do cariótipo das células da leucemia, entre outros aspectos. Nas leucemias agudas o prognóstico pode variar entre uma esperança de vida de apenas alguns meses para os doentes com pior prognóstico e a cura para os doentes com características favoráveis. Nas leucemias crónicas o prognóstico não é tão estremado, os doentes de pior prognóstico têm uma esperança de vida de dois a três anos e os doentes com características favoráveis a esperança de vida é superior a 10 anos. Há a ideia de que haja aumento na incidência das leucemias? Eu acredito que não há. Há algumas doenças hematológicas onde se tem notado um aumento na incidência, por exemplo nos linfomas, onde as estatísticas demonstram um aumento de novos casos. No caso das leucemias não temos notícia que haja aumento, e como na nossa experiência clínica temos poucos casos, também não podemos dizer isso. Assim sendo, e dos vários tipos de leucemias, qual a mais prevalente? E qual a mais frequente neste serviço? Na população adulta a forma de leucemia mais frequente é a leucemia linfocítica crónica. Nos últimos anos tivemos um aumento no número de novos casos de leucemia linfocítica crónica, no entanto, isto não reflete um aumento na incidência, apenas uma alteração na referenciação de outros hospitais - Viana do Castelo e Vila da Feira. Em relação aos tratamentos disponíveis neste serviço estão ao nível do resto do país e Europa? Sim. Considero que estamos ao nível dos restantes serviços e da Europa. Por enquanto não há qualquer restrição. Os doentes têm disponíveis os medicamentos que estão aprovados e que mostraram benefício no tratamento destas doenças. Que evolução têm tido as terapêuticas nesta área? Na leucemia aguda as terapêuticas que dispomos são as de há muitos anos e não têm surgido novidades. Ou seja, há uma percentagem significativa de doentes (40 a 50 por cento) que podem ficar curados mas com estratégias que já têm bastantes anos de utilização. Nas leucemias crónicas é um pouco ao contrário. Não tínhamos quase nada e nos últimos anos têm surgido alguns medicamentos que têm mostrado alguma
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ENTREVISTA utilidade. Provavelmente, investiu-se porque não havia nada. Hoje temos três ou quatro opções válidas e temos também a promessa de outras moléculas que estão a ser estudadas. Inclusive, estamos a assinar contractos para integrar ensaios clínicos para a utilização de uma nova molécula na leucemia linfocítica crónica. É mais uma investigação. Que principais dificuldades existe no tratamento destes doentes? A maior dificuldade que encontramos é a resistência das células aos fármacos que temos disponíveis. Essa é a principal. Isto é, a ineficácia terapêutica em alguns doentes é dos principais problemas que temos no dia-a-dia. E o facto de alguns doentes terem indicação para transplante e depois ter de aguardar pelo dador, é complicado? Sim. Na leucemia linfocítica crónica o transplante ainda é considerado um pouco experimental, ainda não é consensual entre a comunidade médica. Nós tentamos fazer em alguns casos, sobretudo nos doentes cuja doença tem muito mau prognóstico, mas não é uma prática consensual, há ainda dúvidas em relação ao seu papel. O mesmo não se passa nas leucemias agudas, cujo papel está bem definido. Nestes os dois grandes problemas são, por um lado, o doente não ter um dador compatível, por outro, a doença ser resistente à quimioterapia. A situação ideal é fazer o transplante quando o doente tem a doença controlada, nos casos em que não é possível controlar a doença, o transplante torna-se inviável, ou muito pouco rentável. Como é feita a monitorização/follow-up dos doentes em tratamento? A monitorização dos doentes com leucemia é realizada periodicamente com uma consulta onde se procura avaliar a existência de sintomas da doença como o aparecimento de cansaço, emagrecimento ou sudorese nocturna, entre outros, e de sinais como o aumento dos gânglios ou do baço, por exemplo. Procedemos ainda à realização regular de análises ao sangue, com especial relevância para o hemograma onde são monitorizados vários parâmetros que nos permitem identificar a existência de anemia, alteração no número das plaquetas ou dos leucócitos. Nas formas agudas das leucemias a monitorização passa também pela realização periódica de análises à medula óssea através do mielograma onde se pesquisa a existência de células da leucemia, os blastos, quer por técnicas morfológicas com a utilização do microscópio, quer por outras técnicas, nomeadamente a citometria ou a genética molecular através das quais são monitorizados determinados marcadores que nos permitem uma detecção mais precoce de uma recidiva. Como é feita a ligação com o laboratório? É uma ligação fácil. A parte da morfologia, o mielograma propriamente dito, são os hematologistas do serviço que controlam, embora ele seja processado no laboratório de patologia clínica. O relatório é da nossa responsabilidade. Os outros
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ENTREVISTA laboratórios, nomeadamente os de citometria de fluxo e de genética, são autónomos em relação ao Serviço, mas há uma colaboração muito estreita, sem qualquer problema. Para finalizar, na sua opinião o que tem de ser desenvolvido nesta área para colmatar as falhas que existem? Aqui no serviço estamos relativamente bem, uma vez que podemos e conseguimos oferecer aquilo que existe para oferecer. O problema é que às vezes não existe muito para oferecer, essa é a grande dificuldade. Gostávamos de ver outras opções terapêuticas para aqueles doentes que mostraram resistência aos medicamentos já existentes. Mas nesse aspecto o serviço, de forma isolada, não poderá fazer muito, a não ser colaborar em ensaios clínicos na procura de novas moléculas. E é o que temos feito sempre que é possível. Temos estado envolvidos em ensaios clínicos que permitem a muitos doentes utilizar moléculas novas antes de elas terem sido aprovadas, o que acaba por ser uma vantagem, especialmente nos casos em que essas novas moléculas venham a mostrar benefício. Infelizmente, por vezes, não é fácil encontrar doentes disponíveis para colaborar nestes ensaios clínicos, existe ainda algum receio em participar porque esta experiência ainda não está suficientemente divulgada na nossa sociedade.
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EXPERIÊNCIA DO SERVIÇO DE ONCO-HEMATOLOGIA DO IPO-PORTO NO TRATAMENTO DA LEUCEMIA MIELÓIDE AGUDA Por Isabel Oliveira, Assistente Hospitalar A leucemia mieloide aguda (LMA) é um grupo heterogéneo de doenças malignas das células progenitoras hematopoiéticas caracterizado pela aquisição somática de alterações genéticas e epigenéticas, que perturbam os seus mecanismos normais de auto-regeneração, proliferação e diferenciação. Apesar da grande maioria das LMA não ter uma etiologia definida, a incidência das LMA secundárias, caracterizadas pelas associações a displasia ou relações com quimioterapia ou radioterapia prévias, tem vindo a aumentar representando 10 a 30 por cento dos casos diagnosticados de novo. Nos adultos, a LMA é um dos tipos de leucemia mais comum, estando a mediana de idade ao diagnóstico situada na 7ª década de vida. Os "jovens", com idades até aos 60 anos, têm um melhor prognóstico do que os idosos no entanto, a grande maioria dos doentes com LMA falece da sua doença apesar dos avanços nos tratamentos e cuidados de suporte. O esquema de tratamento de indução de todos os subtipos de LMA, com a excepção da leucemia promielocítica aguda, foi desenvolvido há cerca de 40 anos como uma combinação de citarabina (Ara-c) com uma antraciclina, conhecida como esquema "3+7". Esta terapêutica continua a ser o estado da arte no tratamento da LMA na actualidade e em todo o mundo. No Serviço de Onco-hematologia do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil, E.P.E. têm sido tratados doentes com LMA desde 1995 até há actualidade. A propósito da última edição da reunião anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia, o Serviço de Onco-hematologia, com a colaboração dos seus internos de especialidade, realizou uma revisão casuística dos doentes com LMA não promielocítica, dos tratamentos e das respostas à terapêutica instituída. A revisão efectuada consistiu numa análise retrospectiva dos dados contidos no processo clínico dos doentes admitidos no Serviço Onco-hematologia, entre Janeiro de 1995 e Dezembro de 2010. Os dados recolhidos foram analisados e divididos em grupos, de acordo com o tipo de tratamento e as características da LMA. Na análise efectuada, as curvas de sobrevivência foram obtidas pelo método Kaplan-Meier e as diferenças foram avaliadas pelo teste log-rank considerando significativas diferenças com p <0,05. Os doentes com diagnóstico inaugural de LMA não promielocítica têm sido tratados com esquema de indução "3+7" contendo Ara-C e Idarrubicina. Neste grupo foram revistos os registos clínicos referentes a 141 doentes, dos quais 74 (52,5%) eram do sexo feminino. A idade mediana do grupo foi de 46 anos (intervalo 15 a 67), incluindo 43 (30,5%) doentes com uma idade ao diagnóstico superior a 55 anos e 20 (14,1%) com mais de 60 anos. Após a indução, 101 doentes (71,6%) atingiram remissão completa, cinco (3,5%) remissão completa sem recuperação
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TEXTO LIVRE hematológica e 35 (24,8%) apresentaram doença resistente. De referir que 98 dos 101 doentes que atingiram CR fizeram consolidação com Ara-C e que 15 doentes realizaram, após consolidação com Ara-C, transplante alogénico de medula óssea (AloTMO) em primeira remissão
Fig.1 - Sobrevivência global
Fig.2 - Sobrevivência livre de doença
A sobrevivência global para a totalidade dos doentes foi de 28,2 meses (intervalo 0,6-141,6) (Fig.1), associada a uma probabilidade de sobrevivência aos cinco e 10 anos de 42,9 por cento e 33,8 por cento, respectivamente. A sobrevivência livre de doença (DFS) apresentou um valor mediano de 41,7 meses (intervalo 0,6-140,7) (Fig.2), com uma probabilidade de permanecer livre de doença aos 5 e 10 anos de 46,8 e 41,5 por cento, respectivamente. O grupo de doentes com idade ao diagnóstico inferior a 55 anos, quando comparado com o grupo com idade superior 55 anos, apresenta uma sobrevivência global superior (51,3 vs 15,5 meses, p=0.034). A estratificação dos doentes por grupo de risco citogenético (SWOG), assim como a comparação dos grupos que realizaram ou não AloTMO, não revelou diferenças de sobrevivência estatisticamente significativas. Para este grupo de doentes com diagnóstico inaugural de LMA não promielocítica tratados no Serviço de Onco-hematologia, com esquema de indução "3+7" contendo Ara-C e Idarrubicina as taxas de remissão completa são semelhantes às encontradas em estudos já publicados. Nos doentes com LMA secundária, o tratamento de 1ª linha oferecido não é consensual, sendo a combinação de citarabina com uma antraciclina e a ciclosporina uma das opções a considerar e que o Serviço de Onco-hematologia tem vindo a utilizar para o tratamento desses doentes, através da utilização do esquema SWOG 9126. O esquema SWOG 9126 consiste na combinação de citarabina 3g/m² ev dias 1-5, de ciclosporina 6mg/kg ev + 4mg/Kg ev dia 6, de ciclosporina 16mg/kg ev dias 6-8 e de daunorrubicina 45mg/m² ev dias 6-8. Para a avaliação dos dados referentes aos doentes com diagnóstico de LMA secundária tratados com esquema SWOG 9126 em 1ª linha, o período considerado foi de Janeiro de 1998 a Dezembro de 2010. Neste período foram identificados 46 doentes com o diagnóstico de LMA secundária, dos quais 52,2 por cento eram do sexo
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TEXTO LIVRE masculino. A idade mediana foi de 56 anos (intervalo 24 a 76). De acordo com a classificação proposta pela OMS em 2008, 26 doentes (56,5%) apresentavam LMA com displasia multi-linhagem, 16 doentes (34,8%) apresentavam LMA relacionada com o tratamento e quatro doentes (8,7%) LMA não especificada. Em relação à classificação de risco citogenético SWOG, 24 doentes (52,2%) incluíram-se no grupo intermédio, 15 doentes (32,6%) no grupo desfavorável e dois doentes (4,3%) no grupo favorável. Após o tratamento efectuado 31 doentes (67,4%) atingiram critérios de remissão completa. O alotransplante foi realizado em 11 doentes dos quais nove foram de dador relacionado e dois foram de dador não relacionado. A mediana da sobrevivência global foi de 12,1 meses (intervalo 0,5 a 81,2) (Fig.3) e a mediana da sobrevivência livre de doença foi de 24,9 meses (intervalo 3,2 a 81,2) (Fig.4). A probabilidade de sobrevivência aos três anos foi de 20 por cento. A análise da sobrevivência global de acordo com a classificação de risco SWOG não mostrou diferenças estatisticamente significativas.
Fig. 3 - Sobrevivência global
Fig.4 - Sobrevivência livre de doença
Nesta série a utilização do esquema SWOG 9126 como tratamento de indução nas LMA secundárias permitiu atingir taxas de remissão completa sobreponíveis às descritas na literatura. Apesar da maioria dos doentes atingir RC após a terapêutica de indução, a elevada taxa de recidiva condiciona o mau prognóstico destes doentes. No serviço de Onco-hematologia, o esquema SWOG 9126 tem sido também utilizado como tratamento dos doentes com LMA em primeira recidiva. Neste terceiro grupo de doentes o período de avaliação dos dados analisados foi o mesmo que o do grupo anterior. Nos 13 anos analisados foram identificados 27 doentes tratados na primeira recidiva com o protocolo SWOG 9126. A idade mediana foi de 48 anos (intervalo 15 a 66), sendo que 17 doentes (63%) eram do sexo feminino. Quanto à classificação de risco SWOG, a maioria dos doentes (59,3%) estava no grupo
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TEXTO LIVRE intermédio, cinco doentes (18,5%) no grupo favorável e três doentes (11,1%) no grupo desfavorável. Após o tratamento de 2ªlinha com SWOG 9126, 15 doentes (55,6%) atingiram remissão completa. No total dos doentes analisados, a mediana da sobrevivência global foi de 39,4 meses (intervalo 9,5 a 124,2) (Fig.5). A mediana da sobrevivência livre de doença foi de 38,8 meses (intervalo 9,3 a 68,9) (Fig.6).
Fig. 5 - Sobrevivência global
Fig.6 - Sobrevivência livre de doença
Tal como nos outros grupos, os resultados do tratamento dos doentes em 1ª recidiva com o esquema SWOG 9126 conduziu a taxas de resposta sobreponíveis ao descrito na literatura.
Agradecimentos: Os dados referidos foram apresentados na SPH de 2011 sob a forma poster PO 13, PO 14 e PO 16. As figuras apresentadas foram gentilmente cedidas pelo Dr. Luís C. Leite e pela Dra. Marta Nunes.
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Centro Hospitalar Lisboa Norte Hospital Santa Maria
Serviço de Hematologia e Transplantação de Medula
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ENTREVISTA
“Uma visão da prática vigente no nosso Serviço sobre estas patologias” José Alves do Carmo destaca, para esta área de excelência, a existência de protocolos de actuação bem estabelecidos, mas sempre adaptados aos avanços que se vão constatando.
Dr. José Alves do Carmo
A leucemia aguda constitui um exemplo paradigmático nas vertentes do diagnóstico clínico, caracterização, decisão terapêutica e monitorização para qualquer Serviço de Hematologia. É por esta ordem de razões um dos modelos escolhidos para definir o grau de complexidade da Instituição Hospitalar e também como termo comparativo com os seus pares (peer e benchmark). A existência de protocolos de actuação bem estabelecidos, mas nunca definitivos, dada a necessidade de observância permanente, relativamente aos avanços que se vão constatando e que quando consistentes obrigam à sua adaptação e nalguns casos a sua mudança, é fundamental na resposta adequada aos doentes portadores de leucemia. A referenciação electiva desta patologia aos Serviços de Hematologia, com capacidade específica de actuação nesta área, parece insinuar, uma maior incidência de leucemia, no entanto esta é meramente uma análise empírica e carece para sua comprovação de um levantamento a nível do país, no âmbito das atribuições de organismos com essas competências, como o Registo Oncológico Nacional. O Serviço de Hematologia e Transplantação de Medula do Centro Hospitalar Lisboa Norte - Hospital de Santa Maria, disponibiliza uma estrutura de internamento, com uma Unidade de Transplantação de progenitores hematopoiéticos (UTMO) com 8 quartos individuais equipados com pressão positiva, fluxo laminar vertical e filtros HEPA, duas Unidades Intermédias (UTIDH) com 4 camas para homens e 4 camas para mulheres e uma área de enfermaria, actualmente com 20 camas e dois quartos individuais, onde não são admitidas macas. Conta com a colaboração do laboratório central de Hematologia dotado de uma área específica para a morfologia, citometria de fluxo e técnicas de FISH e do Instituto de Medicina
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ENTREVISTA Molecular (IMM - Genomed) integrado no campus hospitalar, para as técnicas de cariótipo e de caracterização a nível da biologia molecular. A articulação eficaz destas estruturas permite um diagnóstico célere e uma programação precoce, baseada em factores preditivos, dos doentes com indicação para transplantação de progenitores hematopoiéticos (TPH), com referenciação atempada ao CEDACE, para caracterização da tipagem HLA e identificação de eventuais dadores familiares ou não relacionados. As leucemias crónicas, linfocítica e mielóide, constituem dois modelos de patologia, onde a eficácia do regime de ambulatório, a nível da estrutura do Hospital de Dia que quando necessário se articula com o sector de internamento, se mostra ágil e bem adaptado. Como será constatável nas rubricas que se seguem sobre leucemia aguda, mielóide e linfoblástica e crónica, linfocítica e mielóide, que dão uma visão da prática vigente no nosso Serviço sobre estas patologias, utilizamos, tal como noutros Serviços nacionais, com dimensão idêntica, protocolos de diagnóstico e terapêutica, que nos colocam num patamar que consideramos ser de boa prática, tendo como referencial aquilo que se faz a nível europeu. Os avanços que se têm verificado na área da leucemia, merecem-nos as breves considerações que se seguem, sobre alguns conhecimentos actuais e perspectivas futuras, assim como sobre as indicações para ALO-TPH. O Serviço de Hematologia realizou em 2011, 87 transplantes, 42 alogénicos e 45 autólogos. Dos transplantes alogénicos 32 foram em doentes com leucemia e 21 a partir de dador não familiar idêntico. O projecto da caracterização do genoma humano, tendo em conta o incremento das tecnologias de sequenciação, com a inerente retracção de custos, permite a definição integral do genoma da LMA, com identificação de genes mutados, como por exemplo, o IDH1 e DNTM3A, sendo espectável que esta técnica, passe a fazer parte integrante do armamentário de diagnóstico. A definição genética e molecular, baseada no cariótipo e na expressão de genes mutados, assim como na sua desregulação, poderá suplantar a classificação morfológica e influenciar a terapêutica na perspectiva farmacodinâmica, com o aparecimento de agentes terapêuticos dirigidos para alvos predeterminados. Há, contudo, uma heterogeneidade muito marcada na LMA e é necessário, por isso identificar biomarcadores que possam permitir tratamentos mais específicos. Sob o ponto de vista clínico é fundamental na altura do diagnóstico, fazer o estudo citogenético, técnicas de FISH se o aspirado medular for um "dry tap" e caracterização celular por biologia molecular. Doentes com perdas a nível dos cromossomas 5 e 7 ou cariótipo complexo, assim como com t(6;9), inv(3) e t(3;3) têm mau prognóstico. O estudo molecular (FLT3-ITD, CEBPA, NPM1 e nos casos de leucemia CBF também CKIT) é obrigatório, mesmo em doentes de grupos etários mais avançados. Oito por cento dos casos são de LMA-M3 associado a t(15;17) com expressão PML/RARα. A terapêutica nesta patologia é personalizada com ATRA associado
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ENTREVISTA a QT. A transtretinoina fixa-se à proteína de fusão, altera a sua configuração e induz diferenciação celular, como melhor controlo da CIVD. As translocações que também envolvem RARα, t( 11; 17) e t(5; 17), dão azo a leucemias que podem mimetizar a LPA, mas com resposta errática ao ATRA. Na actualidade o ALO-TPH, continua a ser o tratamento mais efectivo da LMA, devendo a identificação do HLA do receptor e a pesquisa de dador iniciar-se na altura do diagnóstico, em todos os casos em que a estratificação do risco assim o recomende. O transplante precoce parece ser mais eficaz sempre que haja um bom "status performance", podendo o índice de comorbilidades específico para TPH (HCT-CI) apoiar a decisão de transplantar. De acordo com várias recomendações, a técnica do transplante não deve ser condicionada pela idade cronológica, embora se reconheça que acima dos 60 anos, a qualidade de vida possa sofrer com a intervenção. Doentes portadores de cariótipo complexo e de outras alterações já mencionadas, com FLT3 mutado e com cariótipo normal (45 por cento dos casos) e FLT3, NPM1 e CEBPA não mutados, deverão ser considerados como candidatos a transplantação. A adição de um inibidor de FLT3, midostaurin, pode ter um efeito positivo, quando associado ao esquema de indução. Também outros inibidores como o sorafenib e o AC220 estão em investigação. Encontra-se em fase de ensaio clínico o valasertib em associação com ara-c subcutânea, inibidor selectivo das cinases do ciclo celular, em doentes com idade > 65 anos e sem indicação para terapêutica de indução remissão. Já no grupo das LMA de prognóstico intermédio as indicações são mais controversas. No caso da leucemia linfoblástica aguda, um quarto dos doentes têm transcritos BCRABL, expressão da t (9;22). Na LLA Ph+, a possibilidade de RC é inferior a 10 por cento e a sobrevivência média de 8 meses. Embora a utilização de TKI de 1ª e 2ª geração, com a aparente vantagem do dasatinib conseguir ultrapassar a barreira hemato-encefálica, tenha melhorado o índice de resposta, continua a não ser aceitável prescindir do transplante alogénico sempre que possível, na estratégia terapêutica destes doentes. A tendência actual, consiste em escolher terapêuticas com toxicidade aceitável pré-transplante (QT mínima) e utilizar TKI no pós-transplante com monitorização por RQPCR dos transcritos. Dois estudos do GIMEMA em doentes mais velhos com imatinib 800mg e prednisolona 40mg/m2, assim como em doentes jovens, com dasatinib e corticóides, mostraram 100 por cento de RC hematológica e a toxicidade verificada foi muito limitada. O grupo EWALL usou dasatinib com VCR e dexametasona, num grupo com mediana de idade de 69 anos e em 90 por cento obteve RC e a mediana de sobrevivência global foi de 27 meses. Muitas das recaídas estavam relacionadas com a mutação T315I. O transplante RIC pode ter um papel importante nos doentes de idade mais avançada, após ponderação do HCT-CI. Também o tratamento com Acmo, dirigidos a Ags específicos, que são vários na LLA (CD19, CD20, CD22, CD33 e CD52), tem vindo a mostrar interesse investigacional crescente. O rituximab associado
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ENTREVISTA a QT integra vários protocolos de tratamento da LLA-B de células maduras/ Linfoma de Burkitt mas também surge nos casos de LLA-B de célula percursoras. O blinatumomab (anti CD19 e CD3) e o epratuzumab (anti CD22) são outros ac. utilizados. Contudo o seu emprego carece de melhor esclarecimento relativamente a doses, altura de utilização e estádio da doença. São considerados também, factores citiogenéticos de mau prognostico a t(4;11), a t(1;19), cariótipo complexo (>a 5 anomailas) e ainda alterações dos cromossomas 7 e 8, assim como a hipodiploidia. Nestes casos e naqueles em que há persistência de DRM o ALO-TPH deve ser ponderado. Na última década verificou-se um interesse crescente no estudo do micro ambiente no contexto da LLC. Têm assim surgido terapêuticas que actuam nas interacções entre as células desta doença linfoproliferativa e o meio ambiente, é o caso dos antagonistas CX CR4 e pequenas moléculas antagonistas do receptor B, BCR - associadas a cinases, tirosina cinase de Bruton, (BTK) e outras. As anomalias da via p53 (cromossoma 17p), estão associadas a quimioresistência. Considera-se, por isso, que nos casos associados a delecção 17p, a terapêutica deve ser diferenciada, com alemtuzumab e eventual consolidação com ALO-TPH RIC. A bendamustina é um alquilante que tem mostrado resultados positivos, embora seja administrada por via intravenosa. A associação de Rituximab à Fludarabina e Ciclofosfamida (FCR) é considerada na actualidade das mais efectivas no tratamento da LLC, no entanto nalguns casos pode surgir refractariedade aos regimes com fludarabina. Nestas situações têm sido tentados tratamentos alternativos com anti-CD52, ofatumumab, lenalidomida, alta dose de metilprednisolona e flavopiridol (inibidor CDK). As delecções 17p e 11q e status mutacional IGVH, estão considerados como alterações citogenéticas de prognóstico mais reservado. São actualmente, critérios de consenso para indicação para transplante alogénico na LLC de acordo com a EBMT: 1 - Ausência de resposta após 12 meses de tratamento com análogos das purinas 2 - Recaída aos 24 meses, após terapêutica combinada com análogos das purinas 3 - Del. 17p13 ou p53 del/mutação a requerer terapêutica Relativamente à LMC, são esperados novos e eficazes inibidores BCR-ABL com maior potencial para erradicar a DMR pelo menos nalguns grupos de doentes. Há já referências relativamente ao bozutinib. O ponatinib, inibidor de 3ª geração, é um pan BCR-ABL, com actividade significativa contra os mutantes imatinib resistentes (mutação 315I). Quanto à possibilidade de interromper a terapêutica com TKI, o estudo STIM é o mais informativo, recrutou 100 doentes, tratados com imatinib durante 3 anos e com 2 anos de BCR-ABL indetectável. O inibidor foi descontinuado e com follow-up médio de 12 meses, 69 doentes recaíram. A probabilidade de persistência de remissão molecular aos 12 meses foi de 41 por cento. O índice de Sokal mostrou uma correlação nítida com a recaída. Todos os que recaíram tiveram novamente resposta com a reintrodução do inibidor. Uma resposta rápida e de boa qualidade é preditiva de um melhor controlo da doença a
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ENTREVISTA longo termo e, nestes casos, a decisão de parar a terapêutica em casos seleccionados, será mais razoável, mediante a monitorização cuidadosa e no âmbito de ensaios clínicos bem delineados. Qualquer nova terapêutica com TKI deverá ter em linha de conta a sua eventual maior toxicidade versus o seu benefício potencial. A tolerância das TKI existentes é boa e permite a terapêutica de manutenção, no entanto é necessário considerar os casos em que se verifica alteração da QOL e em que a compliance é baixa. Nestas situações deve adaptar-se a estratégia terapêutica. Nalguns doentes tratados com Dasatinib, verificou-se proliferação clonal T (CTL), estando estes casos aparentemente associados a melhor prognóstico. Este efeito é perfeitamente demonstrado nos casos de recaída da LMC após ALO-TPH, com a administração de DLI. Assim a utilização de vacinas que aumentem a acção CTL, e também de IFN, poderão ser úteis no controle da DMR. O ALO-TPH mieloablativo deve ser ponderado nos doentes com menos de 55 anos, com incapacidade de manter resposta ou com falência aos TKI, e acima dos 55 anos o ALO-TPH RIC. O dador deve ser procurado de imediato quando há evidência de falência ou é requerida terapêutica de 2ª linha. Nos doentes em fase acelerada ou blástica a pesquisa de dador familiar ou não relacionado deve iniciar-se desde a altura em que são efectuados estes diagnósticos.
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LEUCEMIA MIELÓIDE AGUDA Por Graça Esteves, Assistente Hospitalar Graduada A Leucemia Mielóide Aguda (LMA) é um grupo heterogéneo de doenças resultante da proliferação clonal incontrolada de uma célula progenitora hematopoiética e incapaz de se diferenciar, que conduz a uma deficiente hematopoiese traduzindo-se pelo aparecimento de citopénias e pela acumulação de células não funcionais designadas por mieloblastos. Múltiplos mecanismos moleculares (genéticos e epigenéticos) estão envolvidos. Se não for tratada, os doentes morrem de infecção ou hemorragia dentro de algumas semanas. É uma doença aguda necessitando de rápido diagnóstico para imediato início de tratamento, o que requer grande investimento em equipas multidisciplinares especializadas e experientes. Historicamente, o diagnóstico e a resposta à terapêutica basearam-se na morfologia e características citoquímicas das células leucémicas, as quais permanecem válidas para o diagnóstico inicial e instituição da terapêutica de indução. A caracterização dos blastos leucémicos quanto à linhagem envolvida deverá ser continuada com a imunofenotipagem destes no sangue periférico e/ou medula óssea. O estudo citogenético por cariótipo contribui significativamente para a definição do prognóstico, devendo este ser completado posteriormente, em amostra previamente colhida, por FISH ou por técnicas de biologia molecular. No mundo ocidental a incidência global da LMA é de 4-5 casos/ano por 100 mil habitantes, aumentando a incidência com a idade. Nos Estados Unidos a mediana de idade à data do diagnóstico é de 65 anos. Actualmente, 60-75 por cento dos doentes com LMA têm mais de 60 anos. A idade e as alterações citogenéticas constituem os dois principais factores prognósticos para a sobrevivência, de tal modo que a classificação de 2008 da Organização Mundial de Saúde individualiza as LMA com alterações genéticas recorrentes, que constituem como que um subgrupo clínico/biológico. Os avanços na compreensão da biologia celular e molecular da LMA não alteraram substancialmente o prognóstico nas duas últimas décadas, principalmente nos doentes idosos, que constituem a maioria dos doentes com LMA. O tratamento da LMA visa dois objectivos: a erradicação da doença e obtenção de resposta completa (terapêutica de indução) e a manutenção/continuação da resposta evitando a recaída (terapêutica pós-indução) que poderá ter a mesma ou superior intensidade à terapêutica de indução. A eficácia da terapêutica de indução mede-se pela taxa de doentes que obtêm resposta completa (RC) e pela sobrevivência livre de doença (SLD). Nas duas últimas décadas os regimes de indução mais utilizados têm-se baseado na associação de uma antraciclina x 3 dias + citosina-arabinosido (ARA-C) x 7-10 dias ± 3ª droga. Com eles as taxas de RC variam entre 70-80 por cento nos doentes com menos de 60 anos e sem mielodisplasia ou LMA secundária e de ± 50 por cento nos doentes mais idosos. Cerca 40 por cento dos doentes mais jovens estão vivos aos 5 anos, mas este valor poderá ser superior nos que têm citogenética favorável
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TEXTO LIVRE (± 70 por cento) ou reduzir-se para 5 por cento nos que têm citogenética de alto risco. A heterogeneidade da LMA recomenda que a terapêutica pós-indução atenda aos factores de risco e às morbilidades e fragilidades de cada doente. O número óptimo de ciclos de terapêutica pós-remissão é controverso, administrando-se por regra 2-3 ciclos, tendo como princípios orientadores a maximização da eficácia segundo os grupos de risco e a minimização da toxicidade. O grupo CALGB demonstrou que a administração de ARA-C em alta dose era benéfica como terapêutica de consolidação, principalmente nos doentes com citogenética favorável. A transplantação alogénica de progenitores hematopoiéticos de dador familiar ou não, HLA-DR idêntico, é a terapêutica mais eficaz na erradicação da leucemia, sendo proposta como terapêutica de consolidação da primeira remissão nos doentes com prognóstico desfavorável, o que não se aplica aos casos de bom prognóstico. A terapêutica de indução da LMA não promielocítica do Serviço de Hematologia do Hospital de Santa Maria para doentes < 60 anos compreende um ciclo de indução associando uma antraciclina (idarrubicina) à citosina-arabinosido (ARA-C), regime IDAC 3+7 (figura 1).
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TEXTO LIVRE Os doentes com resposta completa recebem como consolidação um ciclo idêntico ao da indução, sendo a restante terapêutica pós-indução definida caso a caso segundo a idade e os factores de risco. Nos casos de doença refractária ou LMA secundária à terapêutica o regime FLAG ± idarrubicina é a terapêutica administrada. No período de 1 de Agosto de 2011 a 31 de Julho de 2012 foram internados no Serviço de Hematologia do nosso hospital 62 doentes (32 homens e 30 mulheres), mediana de idade de 67 anos (18-89 anos). Predominaram as LMA relacionadas com mielodisplasia (23 por cento), componente monocitóide (32 por cento) e leucemia promielocítica 13 por cento. A LMA secundária à terapêutica ocorreu em 6,4 por cento dos doentes. Cerca de 25 por cento dos doentes não foi considerado elegível para terapêutica com intenção curativa. As terapêuticas utilizando agentes hipometilantes (azacitidina e decitabina) têm demonstrado eficácia no controlo da doença em doentes não elegíveis para o regime 3+7 e com baixa infiltração da medula óssea (<20 por cento). Alguns doentes receberam como terapêutica de indução a azacitidina. Os doentes com leucemia promielocítica aguda (LPA), que no decurso do último ano representaram 13 por cento dos doentes com LMA de novo no nosso serviço, foram tratados com protocolo AlDA (ac. all-trans-retinóico e idarrubicina). Dos oito doentes com LPA, dois tiveram morte precoce e em três doentes o ac. all-trans-retinóico foi suspenso por síndrome de diferenciação. Todos os seis doentes tratados estão vivos. Tem havido uma melhoria progressiva nas últimas décadas da sobrevivência dos doentes com LMA. No entanto, esta melhoria deve-se não à introdução de novos agentes mais eficazes, mas ao aperfeiçoamento das medidas de suporte quer ao diagnóstico quer no tratamento das complicações induzidas pela quimioterapia: factores de crescimento hematopoiéticos, suporte transfusional, anti-bacterianos, antifúngicos. São estas medidas de suporte, a idade avançada da maioria dos doentes e os internamentos longos que encarecem o tratamento destes doentes e não a terapêutica curativa.
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LEUCEMIA LINFOBLÁSTICA AGUDA Por Maria João Costa, Assistente Hospitalar Graduada A leucemia linfoblástica aguda (LLA) é rara na idade adulta, constituindo apenas cerca de 20 por cento do total dos casos de leucemia aguda. No nosso serviço temos cerca de 8 a 10 novos casos por ano. Ao contrário do que acontece na criança, o seu prognóstico é reservado, com taxas de sobrevivência média de 25 a 38 por cento aos cinco anos após diagnóstico. Constituem factores de mau prognóstico no adulto: - ldade >35 anos; - Citogenética: LLA Philadelphia positiva (Ph+) (t(9:22)+ e/ou BCR-ABL+), t(1:19), t(4:11), cariotipo complexo (>5 anomalias); - Comorbilidade (Insuficiência hepática, renal, pulmonar, cardíaca. Hipertensão arterial e diabetes mellitus); - Não obtenção de remissão 4 semanas após iniciar o tratamento; - Persistência de doença residual mínima (aquela que só é detectada por técnicas de imunofenotipagem, citogenética ou por biologia molecular). A abordagem terapêutica é diferente na criança e no adulto, já que não só as características biológicas da própria doença como também a tolerância às doses e aos fármacos utilizados difere de acordo com o grupo etário (em geral é menor no adulto). Independentemente do grupo etário e em contraste com a leucemia mieloblástica, a duração do tratamento de poliquimioterapia é, muito prolongada, já que a cura depende de um controlo rigoroso da doença residual mínima. A fase de manutenção sob quimioterapia ambulatória prolonga-se por três anos, em todos os grupos etários. O tratamento desta doença deve ser tanto quanto possível adaptado às características do doente, da doença e das comorbilidades existentes. Os protocolos clássicos do século XX apresentavam uma associação de fármacos semelhantes aos utilizados na criança, mas utilizando doses bastante inferiores, ajustadas à fraca tolerância do adulto. Estes protocolos, pela sua baixa taxa de sucesso encontram-se actualmente em desuso, aplicando-se apenas para doentes que pela idade avançada ou pela existência de comorbilidades não sejam elegíveis para regimes mais intensivos. Na década de 2000 surgem dados na literatura que favorecem a utilização de protocolos de origem americana, nomeadamente o HiperC-VAD, recomendado pelo M.D.Anderson. Nele recorrem-se a fármacos mais bem tolerados na idade adulta, pelo que é possível aumentar as doses utilizadas. Com este protocolo obtêm-se taxas de remissão >95 por cento com sobrevivência média aos cinco anos superiores aos esquemas clássicos. Assenta no pressuposto que para controlo da doença residual mínima é necessário recorrer não só a doses elevadas de citotóxicos (dose intensity) como à sua utilização repetida e atempada (dose density). É este o protocolo adoptado por nós para tratamento de doentes com LLA e idades compreendidas entre os 18 e os 65 anos. Nos casos de LLA CD20+, associa-se também rituximab e nos casos com t(9:22)/BCR-ABL+ associa-se um
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TEXTO LIVRE inibidor da tirosina cinase (imatinib, dasatinib). Trata-se de um protocolo com uma fase de indução/consolidação de alta dose com cerca de seis meses de duração, a que se seguem três anos de tratamento oral ambulatório (manutenção). A sua toxicidade major é a mielossupressão profunda e prolongada com grande risco infeccioso, facto que justifica a utilização profilática de antibióticos. A toxicidade neurológica embora rara, pode ser fatal e os doentes devem ser cuidadosamente monitorizados. Estes efeitos secundários impedem a sua execução em doentes com idades avançadas ou com comorbilidades importantes. A radioterapia do SNC é reservada aos casos em que se demonstra invasão do SNC. A sua utilização tem frequentemente associados efeitos secundários irreversíveis (leucoencefalopatia). O alotransplante de progenitores de células hematopoiéticas é recomendado: em segunda remissão, refractariedade primária e em primeira remissão nos casos de LLA de alto risco: LLA Ph+, t (1.19), t(4:11) ou com cariótipo complexo (>5 anomalias). A sua utilidade em primeira remissão nos restantes casos (risco standard) é controversa e é alvo de estudos multicêntricos internacionais. Deve ser considerado caso a caso.
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TEXTO LIVRE LEUCEMIA MIELÓIDE CRÓNICA Por Lurdes Guerra, Assistente Hospitalar Graduada A Leucemia Mieloide Crónica (LMC), constitui cerca de 15 por cento de todas as leucemias, com uma incidência cerca 1-1,5 novos casos/ano por 100 mil habitantes, sendo expectável, aproximadamente, 150 novos doentes/ano em Portugal. Caracteriza-se pela presença da t(9;22) que leva à formação do gene de fusão BCR-ABL1 cuja expressão e actividade tirosinacinase nos progenitores hematopoiéticos é determinante para a emergência, manutenção, progressão da doença assim como resposta aos inibidores tirosinacinase (ITCs). Desde a aprovação em 2001, lmatinib (IM), um inibidor selectivo da tirosinacinase BCR-ABL1, constitui a opção terapêutica de 1ª linha para doentes com LMC - em todas as fases da doença, estando associado, em FC, a níveis de resposta citogenética completa (RCC) de 80 por cento, sobrevivência global (SG) 93 por cento (excluindo as causa de morte não relacionadas com LMC) como revelou uma análise do estudo IRIS aos oito anos, sendo claro que a profundidade da resposta ao lM é altamente preditiva do risco progressão. Apesar destes resultados cerca de 1/3 dos doentes desenvolvem resistência ou intolerância ao lM necessitando de alteração da estratégia terapêutica. Os mecanismos de resistência ao IM são múltiplos, podendo ser dependentes ou independentes do BCR-ABL1. O mais comum e mais estudado é aquisição de mutações do gene BCR-ABL1, levando a alteração dos pontos de contacto com IM, tendo já sido identificadas mais de 100 mutações diferentes que conferem distintos graus de resistência aos ITCs, e em cerca de 50/80 por cento dos doentes que desenvolvem resistência ao IM são identificadas mutações. A mutação T315l confere resistência a todos os lTCs disponíveis e aprovados. Recentemente, desde 2006, lTCs de 2ª geração - Dasatinib e Nilotinib - foram aprovados para terapêutica de 2ª linha, em doentes resistentes ou intolerantes ao IM, e ultimamente para doentes de novo, e a sua introdução na terapêutica da LMC tem-se revelado muito eficaz, com indução de respostas duradouras. No CHLN-HSM, são diagnosticados cerca de 10 novos casos de LMC/ano, aproximadamente 95 por cento em fase crónica (FC), sendo actualmente seguidos e sob terapêutica com ITCs- 120 doentes, 108 (90 por cento) em FC. Os resultados obtidos são em tudo sobreponíveis aos publicados na literatura, RHC-100 por cento, RCM (RCP+RCC) - 91 por cento, RMM - 55 por cento. Por resistência ou intolerância ao IM 20 doentes estão sob terapêutica com lTCs 2ª geração. No início de 2001, antes da aprovação de IM, participámos num estudo internacional, multicêntrico - Expanded Access Program (EAP) que avaliou a resposta ao lM em doentes com LMC, FC, FA e FB, resistentes ou intolerantes ao alfa interferão em cerca 7000 doentes, tendo sido introduzidos 62 doentes do HSM, cujos resultados foram semelhantes aos publicados na literatura.
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TEXTO LIVRE A partir da aprovação do IM, em 2001, no Serviço de Hematologia do HSM, o protocolo terapêutico dos doentes com LMC, e sua monitorização, segue as orientações da European LeukemaNet (ELN) cuja actualização em 2009 recomenda como algoritmo terapêutico: Fase crónica - 1ª linha- IM 400 mg 2ª Iinha-Dasatinib-100 mg - Nilotinib- 400mg 2xdia - ALO TPH- em doentes que progrediram para FA, FB ou com mutações resistentes aos lTCs, ex T315I Fase acelerada - ALO TPH precedido de IM 600 mg, Dasatinib ou Nilotinib Fase blástica - ALO TPH precedido de IM 800mg ou Dasatinib Estas recomendações estão baseadas na avaliação e definição das respostas à terapêutica cujos critérios e tempos estão definidos: - Monitorização hematológica - 15/15 dias até resposta hematológica completa (RHC) - Monitorização citogenética (cariótipo) - aos 3 e 6 meses, depois 6/6 meses até RCC - Monitorização molecular (RT-PCR) - de 3/3 meses até resposta molecular major (RMM), depois de 6/6 meses - Análise mutacional - em caso de falência, progressão para FA ou FB A monitorização é fundamental, pois permite identificar precocemente doentes que não respondem adequadamente de modo a alterar a sua estratégia terapêutica, já que a resposta à 2ª linha de tratamento depende não só da resposta ao IM, mas também do tempo decorrido entre a identificação da resistência e a alteração terapêutica. As opções terapêuticas disponíveis para os doentes que desenvolvem resistência ao IM consistem em lTCs 2ª geração (Dasatinib,Nilotinib) ou ALO TPH. Os resultados de um estudo que avaliou a resposta ao Dasatinib 100mg/dia, em doentes resistentes ou intolerantes ao IM, com seis anos de seguimento, revelaram RCC - 50 por cento, RMM - 42 por cento e SG - 71 por cento. Com Nilotinib, em doentes com as mesmas características, observou-se RCC - 46 por cento e SG - 87 por cento aos dois anos de terapêutica. Ambos os fármacos são bem tolerados, sendo a maioria dos efeitos adversos ligeiros ou moderados, mais frequentes nos primeiros meses de tratamento e facilmente manejáveis com modificação de dose, no entanto têm um perfil de toxicidade distinto, sendo mais frequente derrame pleural associado à terapêutica com Dasatinib e elevação dos níveis de glicose e lípase sérica mais frequentemente observado nos doentes sob terapêutica com Nilotinib, sendo também conhecida sensibilidade distintas em relação a mutações do gene BCR-ABL1. Assim a escolha do ITC 2ª geração deve ter em conta não só o tipo de mutação mas também a existência de comorbilidades, perfil de toxicidade do ITC, factores que podem minimizar potenciais efeitos adversos, melhorar a aderência à terapêutica e maximizar as respostas.
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TEXTO LIVRE Dado os excelentes resultados obtidos com lTCs, ALO TPH não é hoje considerada como 1ª linha de terapêutica em doentes com LMC-FC, estando recomendada em doentes que desenvolvem resistência aos ITCs, FA ou FB e na presença de mutações resistentes aos ITCs com por exemplo T315l. Nos últimos anos foram transplantados seis doentes com estas indicações. Com os bons resultados obtidos com ITCs 2ª G quando usados em 1ª linha, respostas mais profundas e mais rápidas, uma questão importante é saber como vão estes dados alterar a estratégia terapêutica em doentes de novo. Temos por um lado excelentes resultados com IM com oito anos de follow-up que confirmam a sua durabilidade e a boa tolerância, por outro cerca de 1/3 dos doentes não atingem respostas adequadas com IM, e obtenção de resultados muito encorajadores com lTCs 2ª geração quando usados como terapêutica inicial. Os resultados de estudos randomizados que comparam lM com Dasatinib ou Nilotinib em 1ª linha suportam os benefícios de respostas mais precoces e mais profundas associadas a baixo risco de progressão. A RCC ou RMM aos 12 meses de terapêutica com lM tem sido considerada como factor prognóstico importante, mas estudos publicados recentemente revelam que a percentagem de transcritos BCR-ABL1 <10 por cento aos três meses é preditiva de SG, SLP e da probabilidade de RCC, RMM e RMC, permitindo classificar os doentes em alto ou baixo risco, tendo os de alto risco uma probabilidade de RCC inferior (47/91 por cento), mostrando-se o nível de transcritos BCR-ABL1 aos três meses informativo permitindo identificar precocemente doentes que poderão beneficiar de alteração terapêutica. Um dos grandes desafios no tratamento dos doentes com LMC com lTCs é saber se se pode suspender a terapêutica sem o risco de recaída? A terapêutica prolongada com lTCs leva a uma redução gradual da doença residual na maioria dos doentes, tornando-se indetectável nalguns. O estudo STIM (STop lMatinib) revelou resultados promissores, e em doentes seleccionados, com pelo menos três anos de terapêutica com IM e RMC estável durante dois anos, após suspensão da terapêutica, 41 por cento mantiveram RMC, tendo as recaídas (69 por cento) ocorrido nos primeiros 7 meses, sendo estas devidas à persistência de stem cells leucémicas resistentes aos lTCs. Estudos semelhantes foram desenvolvidos em doentes tratados com ITCs 2ª geração, usados em 1ª linha, com resultados superiores. Com o desenvolvimento de novos ITCs, por exemplo Bosutinib e Ponatinib - este eficaz em mutações resistentes aos outros lTCs como a T315I - são de esperar melhorias na qualidade vida dos doentes, na SG, SLE, pretendendo-se uma SG sobreponível à população geral, tendo como objectivo último a cura da doença.
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Centro Hospitalar Lisboa Central Hospital dos Capuchos
Serviço de Hematologia Clínica
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ENTREVISTA
“Não há restrição à entrada de novos medicamentos” Em qualquer situação os médicos podem propor à Comissão de Farmácia e Terapêutica a entrada de novos medicamentos, com a certeza que todos os casos são analisados. Habitualmente não há qualquer restrição.
Dra. Aida Botelho de Sousa
Qual o número de doentes com Leucemia neste serviço? Fazendo a divisão entre as leucemias agudas e crónicas, no que respeita às leucemias agudas, o hospital recebe por ano cerca de 65 novos doentes com leucemia mielóide aguda e cerca de 18/20 novos doentes com leucemia linfoblástica aguda. A via de admissão é, habitualmente, ao contrário das leucemias crónicas, através da urgência deste serviço, mas também por referenciação de outros hospitais do continente e ilhas. Poderá existir um ou outro caso que seja admitido/internado através da consulta, uma vez que existem casos que se manifestam de um modo sub-reptício e a doença é apenas detectada em análises de rotina numa outra consulta e/ou outro hospital. O tratamento destes doentes - seja de leucemia mieloblástica ou linfoblástica aguda - inclui quimioterapia intensiva obrigando, geralmente, a internamento prolongado. Isto não quer dizer que todos os doentes que recebemos tenham indicação para quimioterapia intensiva logo, os casos com contra-indicação (grupo etário e/ou comorbilidades) são tratados em ambulatório se estiverem em condições disso ou são internados e tratados em serviços de apoio seja neste hospital ou no seu hospital de origem, sob a nossa orientação. Relativamente às leucemias crónicas, temos a linfática e a mielóide crónica, duas doenças tão opostas quanto é possível ser. Raras vezes os doentes precisam de internamento, mas quando são internados ocupam camas dos serviços de medicina deste hospital, sob a nossa responsabilidade, uma vez que não temos camas suficientes para estes internamentos. Não é um processo saudável para a vida prática diária de uma equipa reduzida como é a nossa, e com uma taxa de ocupação na ordem dos 120 a 130 por cento.
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ENTREVISTA Relativamente aos números das leucemias mielóides crónicas recebemos cerca de 10 novos doentes por ano, números que globalmente têm vindo a aumentar, sendo que neste momento acompanhamos cerca de 120 doentes. Porém, isto não significa que a incidência tenha aumentado, mas tão simplesmente que se trata de uma doença verdadeiramente crónica, a sobrevida dos doentes aumenta e ficam ligados à consulta para sempre. No caso das leucemias linfáticas crónicas, a situação é um pouco diferente. Trata-se de uma população de doentes um pouco mais velha e temos anualmente cerca de 50 novos doentes. Nesta doença, cerca de 2/3 dos doentes quando recebem o diagnóstico não têm indicação para tratamento: é frequente a doença ser detectada precocemente, na investigação de uma ligeira alteração num hemograma de rotina, anos antes dos primeiros sintomas. Portanto, seguindo as recomendações internacionais, estes doentes ficam em vigilância relativamente alargada na mão do hematologista ou, nalguns casos, na mão do médico de família que nos referenciou esse doente. Com isto temos cerca de 300 doentes a serem acompanhados na nossa consulta. A via de admissão destes doentes é também por referenciação. Estes números indicam algum aumento da incidência aqui neste serviço? Temos vindo nos últimos anos a verificar um ligeiro aumento de novos casos de leucemias agudas. A razão principal prende-se com questões de referenciação ou de reorganização dos hospitais da região sul (por exemplo, Hospital Garcia de Orta). Por outro lado a maior longevidade das pessoas tem como corolário um maior número de casos de doenças como a leucemia mieloblástica aguda, cuja incidência aumenta a partir dos 60 anos. Lamentavelmente, os doentes mais velhos apresentam com frequência subtipos de leucemia de prognóstico muito desfavorável, ou têm comorbilidades que não lhes permitem suportar regimes de quimioterapia intensiva; nestes casos não dispomos de estratégias curativas. No pólo oposto temos um subtipo particular de leucemia mieloblástica aguda, curável na grande maioria dos casos - a leucemia promielocítica, para a qual existe um tratamento específico e muito eficaz. Os tratamentos que tem disponíveis são os mesmos que noutros serviços e também a nível europeu? Sim, quer nas leucemias crónicas, quer nas agudas os medicamento disponíveis na Europa estão disponíveis nos serviços de hematologia portugueses. Não há restrição à entrada de novos medicamentos e os médicos podem em todas as situações propor a entrada de novos medicamentos à Comissão de Farmácia e Terapêutica, que analisa caso a caso para tomar a melhor decisão. Mas penso que não há qualquer restrição particular em termos de terapêutica, embora haja que tomar em conta o preço dos medicamentos, pois alguns medicamentos da área oncológica têm custos escandalosos.
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ENTREVISTA Perante os medicamentos disponíveis que principais dificuldades existem no tratamento destes doentes? Eventualmente, o facto de não haver uma terapêutica curativa? Na leucemia mielóide crónica (LMC) a terapêutica tem de ser mantida para o resto da vida para que a doença se mantenha invisível. Não pode ser considerada curativa porque se o doente suspender a medicação a doença reaparece. Embora a doença tenha tratamento curativo através do transplante alogénico, este está hoje restrito a casos particulares devido à mortalidade associada ao procedimento, muito elevada quando comparada com o tratamento médico. A toxicidade do tratamento médico é mínima, manejável em ambulatório e raramente é preciso internar os doentes. Já nas leucemias linfáticas crónicas tendemos a cada vez mais usar terapêuticas muito imunossupressoras em doentes já de si muito imunodeprimidos, por isso a taxa de complicações infecciosas tem vindo a aumentar. Quanto às leucemias agudas, o tratamento de intenção curativa compõe-se de sucessivos ciclos de quimioterapia intensiva, implicando cada um várias semanas de internamento, durante as quais existe um risco elevado de complicações hemorrágicas e infecciosas - bacterianas, virais ou fúngicas. Por esta razão a terapêutica das leucemias agudas deve ser realizada em serviços experientes na prevenção destas complicações, na sua detecção precoce e no seu tratamento. Cada vez mais, as leucemias agudas devem ser encaradas, não como uma só doença mas como várias doenças, de prognóstico muito diferente e para as quais precisamos de tratamentos individualizados. Com efeito a resposta ao tratamento é determinada pelas anomalias genéticas encontradas no diagnóstico: nos subtipos de prognóstico favorável a probabilidade de cura ultrapassa os 70 por cento, enquanto nos de prognóstico desfavorável menos de 10 por cento dos doentes sobreviverão 5 anos. Para este último grupo, onde se encontra a maioria dos doentes mais velhos, é enorme a necessidade de novos medicamentos mais eficazes. Algumas das moléculas que se encontram em fase de ensaio, e cuja acção tem como alvos as mutações desfavoráveis acima referidas ou vias de sinalização celular alteradas em tipos específicos de leucemias, parecem ter resultados preliminares animadores. O serviço está neste momento envolvido em algum ensaio clínico? Estamos habitualmente envolvidos em dois tipos diferentes de ensaios: estudos da iniciativa do investigador e estudos multicêntricos sponsorizados pela indústria farmacêutica. Do primeiro tipo, estão em curso estudos prospectivos do próprio serviço, de índole clinico-laboratorial, em leucemia aguda e mielodisplasia; e estudos de colaboração com outros serviços, de que darei como exemplo o transplante de progenitores hematopoiéticos em doentes com enfarte do miocárdio. Do segundo, participamos neste momento em ensaios de fase 2 ou de fase 3 em LMC (inibidor de 2ª geração em primeira linha), mielofibrose (inibidor de JAK2), linfoma (biosimilar antiCD20) ou profilaxia de infecção fúngica invasiva em leucemia aguda.
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ENTREVISTA Como é feita a ligação entre o serviço e o laboratório? Ainda bem que levanta esta questão porque esse é um aspecto que para o nosso serviço é crítico. Sendo a hematologia clínica uma especialidade clinico-laboratorial, entendemos que um laboratório especializado, inserido no serviço e dele fazendo parte integrante, é uma peça chave para o bom funcionamento de um centro que, como o nosso, se dedica em particular ao diagnóstico e tratamento das neoplasias hematológicas. A proximidade física entre o espaço do laboratório e o resto do serviço por um lado, e o facto de serem hematologistas clínicos os responsáveis pelas secções de citometria, citogenética e biologia molecular por outro, permitem optimizar o uso das técnicas: diagnóstico mais rápido, interacção entre as várias secções quanto à indicação de cada pedido, discussão com o clínico. Esta organização "de proximidade" induz melhor gestão de recursos e facilita a rapidez de resposta do laboratório, quer na rotina interna do serviço, quer nos resultados fornecidos a outras instituições que nos procuram. Torna também menos difícil, apesar do reduzido pessoal, a justaposição de trabalho de rotina, ensino e investigação. Perante este cenário que falhas ainda existem e que gostaria de ver colmatadas? Para além da actual contenção de custos que condiciona fortemente quaisquer novos projectos, existem duas limitações principais. A primeira advém do número de camas disponível no serviço: para o número de doentes que actualmente nos são referenciados e o número de candidatos a transplantação, necessitamos aumentar em mais 1/3 as camas disponíveis, quer na Enfermaria quer na Unidade de Transplante. A própria organização espacial da Enfermaria necessita uma reformulação que permita optimizar a prevenção de infecções, nomeadamente fúngicas. A segunda consiste na exiguidade da equipa médica, numericamente muito insuficiente para o trabalho que desenvolvemos. O empenhamento e a "carolice" colmatam aparentemente esta falha no trabalho de rotina, mas são uma péssima solução no longo prazo. É imprescindível e urgente que a tutela invista na formação de mais hematologistas.
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TEXTO LIVRE
UM SERVIÇO COM VALÊNCIAS PRÓPRIAS Por Isabel Costa, Chefe de Serviço e Patrícia Ribeiro, Assistente Hospitalar O serviço de Hematologia Clínica do Hospital Santo António dos Capuchos é, desde a sua origem em 1975, uma unidade clínico-laboratorial com valências próprias que funcionam de modo integrado no mesmo espaço físico, com patologistas clínicos e hematologistas clínicos que ao longo dos anos foram montando e aperfeiçoando técnicas laboratoriais indispensáveis ao estudo e tratamento de patologia hematológica maligna. É isto que o torna ímpar, lhe dá "encanto" e o torna estimulante para quem nele trabalha e para quem nele ensina e aprende. Como tem uma consulta externa onde são observados cerca de 15 500 doentes por ano com um total de 1800 consultas de primeira vez (números referentes ao ano 2011) para além de toda a patologia hematológica benigna vê e trata centenas de doentes com leucemias crónicas e sindromas mieloproliferativos crónicos. No caso das leucemias mieloides crónicas (cerca de 100-120 doentes em tratamento), onde o prognóstico e a história natural da doença se modificou radicalmente com a introdução dos inibidores da tirosina-cinase, as técnicas de citogenética, FISH e biologia molecular permitem o diagnóstico e, sobretudo, a monitorização do tratamento e a avaliação da resposta molecular (segundo as recomendações da “Leukemia Net"). Também nas leucemias linfáticas crónicas (cerca de 50 novos doentes por ano), a imunofenotipagem do sangue periférico permite o diagnóstico, tendo deixado de ser necessário efectuar mielograma e estabelece o prognóstico juntamente com a citogenética e o FISH. A técnica de detecção da mutação V617F do JAK2 (cerca de 400 exames por ano) permite distinguir os sindromas mieloproliferativos crónicos em JAK2 positivos e negativos e reconhecer diferenças de comportamento clínico para além das potencialidades do uso de novos medicamentos inibidores do JAK2. Todas estas técnicas estão montadas no nosso serviço e respondem ainda a todas as solicitações analíticas dos colegas dos hospitais distritais que connosco colaboram. Sabemos que existiríamos do mesmo modo sem elas, mas não conseguiríamos os mesmos resultados e, seguramente, o serviço não teria o mesmo "encanto".
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Instituto Português de Oncologia Lisboa
Serviço de Hematologia Clínica
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ENTREVISTA
“Temos implementada a metedologia de funcionamento por consultas multidisciplinares” O grande objectivo na área das leucemias é perceber melhor sobre a biologia e o tratamento destas doenças. Para isso teria de haver maior envolvimento em mais projectos prospectivos e colaborativos de investigação.
Profª. Maria Gomes da Silva
Começamos pelos dados estatísticos… Qual o número total de doentes com Leucemia neste serviço, bem como o número de novos doentes, número de doentes a serem seguidos e o número de doentes internados, por ano? Bom, enquanto para si a Leucemia é uma doença, para mim representa pelo menos quatro doenças diferentes. Ou seja, existem leucemias de evolução mais arrastada - as crónicas - e as leucemias agudas. Dentro das crónicas temos as de linhagem mielóide, a chamada Leucemia Mielóide Crónica (LMC), relativamente raras, e as de linhagem linfóide, a Leucemia Linfocítica Crónica (LLC), que tem uma evolução semelhante aos linfomas indolentes. Por outro lado, dentro das leucemias agudas também as há das duas linhagens referidas, cuja evolução clínica tem algumas diferenças mas, basicamente, tem uma evolução aguda que exige uma intervenção terapêutica de urgência. Relativamente ao foco de actividade aqui no serviço estamos a receber entre 40 e 50 novas leucemias agudas por ano. Estas consomem recursos médicos importantes, sobretudo no internamento, porque requerem urgência no diagnóstico, na caracterização laboratorial que tem de ser detalhada e exigem internamento à altura do diagnóstico para iniciar o tratamento, o qual acarreta habitualmente complicações infecciosas. O tratamento das agudas linfoblásticas e mieloblásticas é diferente, mas ambas representam um consumo elevado de recursos materiais e humanos em internamento e terapêutica de suporte. Não que os fármacos utilizados para tratar estas duas doenças sejam particularmente diferentes do que eram há 10 anos, salvo algumas excepções. Estes doentes correspondem a cerca de 5 por cento de todos os novos doentes vistos aqui no serviço de hematologia.
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ENTREVISTA Por outro lado, temos a leucemia linfática crónica - considerada dentro do grupo dos linfomas - que é uma doença com um comportamento diferente e que por isso abordamos quer do ponto de vista do diagnóstico quer terapêutico habitualmente em ambulatório. Os doentes só são internados quando têm complicações e não para o diagnóstico ou terapêutica. Recebemos cerca de 30/40 novos casos por ano, uma incidência relativamente estável. São doentes de um grupo etário mais avançado, com uma terapêutica que nos últimos anos ganhou com a adição à quimioterapia de anticorpos monoclonais, permitindo maior tempo sem doença e maior taxa de sobrevivência, e onde se continuam a registar importantes progressos no conhecimento. É uma doença por enquanto sem terapêutica curativa. Relativamente à leucemia mielóide crónica, é uma doença relativamente rara, mas temos um grupo de profissionais muito interessado em investigar - quer do ponto de vista do diagnóstico e monitorização moleculares quer terapêutico. Por isso, tem vindo a aumentar o número de doentes que recebemos. Em 2011 recebemos 14 novos casos, e no ano anterior tínhamos recebido números semelhantes. Penso que a tendência vai continuar. Reparou que não lhe estou a dizer qual a percentagem de doentes internados com leucemia, pois estes doentes são internados por motivos diferentes - diagnóstico e tratamento nos casos agudos, complicações da doença ou tratamento nos crónicos - e hoje posso ter metade da enfermaria ocupada com leucemias e amanhã com linfomas e por complicações… Perante esses dados há ideia de que haja aumento na incidência das Leucemias? Devemos ser muito cuidadosos quando falamos do aumento da incidência, porque o facto de numa determinada altura recebermos mais doentes não significa que a incidência esteja a aumentar. Por variados motivos, podemos estar a receber referenciação de um maior número de doentes. Feita esta ressalva e quando olho para o registo epidemiológico oncológico da zona sul não fico com a noção de que haja um aumento da incidência nem de leucemias agudas nem de leucemias crónicas. Penso, de qualquer forma, que este tipo de afirmações deve ser muito bem suportada em números nacionais e internacionais e ter muita confiança no método como os dados são registados, porque as leucemias não são registadas como os outros tumores, cujo diagnóstico depende de um exame anatomo-patológico e são, por isso, mais fáceis de identificar e registar. Basta pensar que os critérios de diagnóstico da leucemia linfática crónica são fenotípicos, os da leucemia mielóide crónica são genéticos… Portanto o primeiro problema para interpretar os números de incidência no país é a qualidade do registo. Seja como for, não tenho a impressão que haja um aumento na incidência. Dos vários tipos de leucemias qual a mais prevalente a nível nacional e aqui no serviço? Sabemos que a leucemia linfática crónica é a mais prevalente no mundo ocidental. A prevalência nos diferentes serviços será diferente se estes receberem referenciações específicas.
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ENTREVISTA Os tratamentos disponíveis neste serviço estão ao nível do resto do país e Europa? Que evolução têm tido as terapêuticas nesta área? Felizmente posso dizer com um bom grau de confiança que os tratamentos que fazemos aqui são aqueles que são feitos noutros países da Europa. Relativamente ao tratamento das leucemias agudas, infelizmente não se têm registado progressos marcados na área da terapêutica dirigida a alvos específicos. Há muitos estudos em curso, embora alguns deles com resultados pouco promissores. Há, no entanto, progressos muito significativos nos últimos 15/20 anos na leucemia promielocítica aguda e na leucemia linfoblástica aguda. Nas leucemias agudas há sobretudo progressos na caracterização citogenética e molecular que nos permitem estratificar melhor os doentes para as diferentes opções terapêuticas. Infelizmente, continuamos sem conseguir curar a maioria dos doentes que nos surgem. Nestas doenças, há um progresso lento, constante e há, sobretudo, um maior conhecimento sobre a sua biologia. Relativamente à leucemia linfática crónica há progressos muito simpáticos. Estão em estudo, a utilização de anticorpos monoclonais e medicamentos - inibidores da sinalização através do receptor das células linfóides B - que são potencialmente atraentes e que parecem ser eficazes. No entanto, por enquanto, não há cura, mas o diagnóstico e a estratificação desta doença têm melhorado. Sobretudo, com a identificação de casos que têm menos probabilidade de responder a quimioterapias mais convencionais - como os doentes que têm alterações citogenéticas do cromossoma 17, quer perdas de parte do cromossoma quer mutações - e a possibilidade de identificar estes doentes permite-nos, apesar de tudo, tratá-los de uma forma mais adequada. E depois a leucemia mielóide crónica, que é a "menina dos nossos olhos". Uma doença na qual tem havido um investimento enorme do ponto de vista da caracterização diagnóstica, da monitorização molecular, do desenvolvimento de novos inibidores da tirosina cinase, do estudo dos mecanismos de resistência a esses inibidores e de novos medicamentos que procuram ultrapassar os mecanismos de resistências. Nesta os progressos são notáveis na última década. Contudo, ainda nos falta dar um salto sob o ponto de vista da eficácia terapêutica e conseguir verdadeiras curas. Como é feita a monitorização/follow-up dos doentes em tratamento aqui no IPO? A maior parte destas doenças é diagnosticada através de um exame da medula óssea, de um mielograma, permite uma caracterização morfológica e citoquímica das células, fenotípica (por citometria de fluxo), e uma caracterização das alterações citogenéticas mais comuns, utilizando não só técnicas de citogenética convencional mas também técnicas de hibridização fluorescente (FISH) para identificação das anomalias que nos podem levar a tomar decisões terapêuticas diferentes do tratamento mais habitual. Para o diagnóstico da leucemia linfática crónica basta em geral um exame de sangue periférico que inclua a sua caracterização fenotípica.
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ENTREVISTA De forma geral, nas doenças em que existem alterações moleculares e fenotípicas temos um fluxograma para a realização de exames diagnósticos e, quando existem tratamentos eficazes, de monitorização da evolução da quantidade dessas alterações, sobretudo moleculares, por técnicas de PCR, ao longo do protocolo terapêutico. Os resultados obtidos podem levar-nos a mudar a intensidade do tratamento. Neste momento fazemos tudo isso aqui no IPO, para todos os nossos doentes mas também para os doentes de outras instituições que nos solicitem, mediante acordo entre os hospitais. A secção de biologia molecular de hemato-oncologia do nosso laboratório tem um interesse particular na monitorização de doença residual mínima em leucemias linfoblásticas agudas. Também, mas não só, pelo facto de aqui existir (IPO de Lisboa) um grande centro pediátrico, com forte envolvimento no tratamento desta doença, por excelência um tumor pediátrico, procuramos responder às necessidades deles. Para além disso, temos relações bem estabelecidas com o IPO do Porto, e planeamos e estamos disponíveis para outras colaborações. E falo da área da caracterização e diagnóstico laboratorial, porque temos um laboratório que está, basicamente, integrado no nosso serviço. E como é feita a ligação com o laboratório? A ligação é muito próxima. O laboratório está certificado pela ISO 9000 e, por isso, temos uma forma estabelecida de levantar as questões. Para além disso, estabelece normas de decisão diagnóstica (fluxogramas de diagnóstico de acordo com o tipo de doença e manifestações clínicas) que são discutidas em reunião com os clínicos hematologistas, pediatras e especialistas da unidade de transplante. Todas as decisões difíceis são discutidas, o que permite tentar optimizar os recursos que temos, tantas vezes limitados. Estes têm implicações na prática e, por isso, são discutidas as opções de diagnóstico de forma a estratificar o que é ou não prioritário. Por outro lado, todos os nossos internos hematologistas, ou outros profissionais que solicitem, passam por um período de estágio no laboratório. Temos também implementada a metodologia de funcionamento por consultas multidisciplinares. Temos uma consulta de linfomas, outra de mielomas, e ainda outra de doenças mielóides crónicas e de leucemias agudas, com uma periodicidade adequada à incidência das patologias, onde discutimos com profissionais de várias especialidades - hematologistas, profissionais do laboratório, radiologistas, radioterapeutas, médicos da medicina nuclear e anatomo-patologistas - todos os novos casos que chegam. Exige esforço, mas a ideia é boa e facilita o registo dos casos, uma vez que nestas reuniões temos suporte administrativo e é-nos possível transmitir esta informação ao Centro de Epidemiologia de uma forma mais completa, não só em termos de diagnóstico como de estadiamento. Uniformiza um pouco as estratégias terapêuticas.
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ENTREVISTA Perante este cenário traçado, e na sua opinião, o que tem de ser desenvolvido nesta área para colmatar as falhas que existem? É certo existem dificuldades. Podemos escaloná-las em duas diferentes áreas: por um lado, há muita coisa que não sabemos ainda sobre a biologia e o tratamento das leucemias. E, portanto, uma das dificuldades que existe é que não curamos estes doentes, nem todos nem a maior parte. Todos gostaríamos de investir o nosso tempo e dinheiro (se o tivéssemos) em perceber mais sobre a biologia e a terapêutica. Portanto, uma das dificuldades é o nosso envolvimento em mais projectos prospectivos e colaborativos de investigação, translacional e clínica, quer a nível nacional quer internacional. Existem depois outras dificuldades, mais comezinhas, mais banais. Os recursos humanos do serviço correm o risco de se tornar insuficientes a curto prazo. As consultas multidisciplinares (que falei atrás) requerem disponibilidade de tempo, para além de alguma alteração do espaço físico, e recursos não médicos - enfermagem e suporte administrativo. Do ponto de vista dos recursos de internamento, considero que temos uma capacidade que está no limite para a população que servimos. Há alturas em que acho que está mesmo aquém do limite... Fazemos no serviço de Hema-oncologia um investimento grande na formação de pessoas, quer em ensino pré-graduado quer pós-graduado, e formar exige tempo da nossa parte, por isso, creio que temos que crescer em número de pessoas, em formação qualificada, em investimento e envolvimento em projectos de investigação, clínica e básica, e temos que crescer, penso eu, em infra-estrutura física e organização.
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LEUCEMIAS AGUDAS DO ADULTO: UMA REVISÃO SOBRE A ESTRATIFICAÇÃO PROGNÓSTICA E OS RESULTADOS TERAPÊUTICOS Por Isabel Bogalho Martins1, Albertina Nunes2 e Maria Gomes da Silva3 1 Interna de Hematologia Clínica 2 Consultora de Hematologia Clínica 3 Directora do Serviço de Hematologia Clínica Leucemia Aguda A Leucemia, designação introduzida por Virchow em 1847 para descrever uma entidade caracterizada pela alteração do aspecto do sangue - "sangue branco", decorrente de um desequilíbrio entre a série eritrocitária e leucocitária - inclui hoje um conjunto de patologias biologicamente distintas, com terapêutica e prognósticos diversos [1]. Biologicamente, a Leucemia aguda resulta da expansão clonal de células que adquiriram alterações maturativas e proliferativas que lhes garantem uma vantagem para a sobrevivência no microambiente em que se integram [2,3]. O actual modelo de leucemogenese apoia a hipótese de existência de células estaminais leucémicas caracteristicamente quiescentes (para alguns autores entre 0.1 e 1% dos blastos), capazes de renovação ilimitada, decorrente da desregulação de sinais de proliferação, apoptose e diferenciação. Além de características intrínsecas, a sua sobrevivência dependerá também da interacção com o microambiente medular, que as protege do efeito da terapêutica, e da sua capacidade de evolução genética em resposta a pressões selectivas. Leucemia Mielóide Aguda (LMA) A incidência de LMA é 3.6/100 000 casos por ano, sendo a mediana de idade ao diagnóstico de 66 anos e a sobrevivência relativa aos cinco anos de 23.4 por cento [4]. De facto, e com excepção da leucemia promielocítica aguda (LPA), a LMA é ainda uma patologia de prognóstico desfavorável [5,6,7]. Os seus factores prognósticos relacionam-se com o doente - idade e performance status (PS) - e com a patologia - contagem leucocitária, alterações citogenéticas e moleculares, antecedentes de mielodisplasia ou neoplasias mieloproliferativas e exposição a agentes citotóxicos e/ou radioterapia [8, 9]. A idade não deverá por si só determinar o intuito terapêutico, devendo considerar-se os múltiplos factores que lhe são inerentes, incluindo o PS e comorbilidades [10,11]. - Terapêutica de Indução em LMA A actual base terapêutica em LMA [12] decorre de esquemas de quimioterapia (QT) conjunta de citarabina com antraciclinas, inicialmente propostos na década de 70 [13,14]. Em 2009, o grupo ECOG publicou os resultados de um estudo comparando a administração de daunorrubicina a 45 mg/m2/dia versus 90 mg/m2/dia, em associação com 100 mg/m2/dia de citarabima (17 a 60 anos), com obtenção de maiores percentagens de remissão completa (RC) (70.6% versus 57.3%; P <0.001) e de sobrevivência global (SG) (mediana de 23.7 versus 15.7 meses, P=0.003) no grupo tratado com daunorrubicina em dose elevada [15-17]. Em doentes com mais de 60 anos a dose óptima de daunorrubicina é discutível.
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TEXTO LIVRE Também em 2009, Löwenberg et al. publicaram os resultados de um estudo que compara a eficácia e toxicidade da associação de citarabina 200 mg/m2/dia com daunorrubicina 45 mg/m2/dia versus 90 mg/m2/dia (indução), seguida de citarabina 1 g/m2 a cada 12 horas de dia 1 a dia 6, em doentes com idade superior a 60 anos. Neste estudo, a percentagem de RC foi de 64 por cento no grupo que recebeu daunorrubicina em dose elevada versus 54 por cento no grupo de terapêutica em dose convencional (P=0.002). Após a indução, a percentagem de remissão completa foi de 52 por cento versus 35 por cento (P <0.001), respectivamente. Não foi demonstrada diferença significativa de toxicidade hematológica, mortalidade ao trigésimo dia (11 e 12 por cento, respectivamente), nem de incidência de eventos adversos de qualquer ordem (P=0.08). Apesar de não ter havido diferença significativa na sobrevivência sem eventos (SLE) e global (SG), pareceu existir vantagem na administração de dose elevada de daunorrubicina no grupo etário entre 60 e 65 anos, no qual se registaram maiores percentagens de RC, de SLE e de SG [18]. As actuais linhas de orientação europeias não recomendam a utilização QT de indução com citarabina em alta dose fora do contexto de ensaio clínico, uma vez que não está demonstrada maior eficácia e poderá comportar maior toxicidade [19]. Na tabela 1 encontra-se representado o protocolo de QT de indução utilizado em LMA não promielocítica no Serviço de Hematologia do IPOFG Lisboa. Tabela 1 - Esquema de Indução para LMA não promielocítica (segundo idade, PS e morbilidades associadas)
A análise retrospectiva dos casos de LMA de novo diagnosticados e tratados no Serviço de Hematologia do IPOFG Lisboa entre 2005 e o primeiro semestre de 2011 demonstrou percentagens de RC após a indução (regime clássico) de 63,3 por cento (grupo etário com idade inferior a 65 anos) e de 69,6 por cento (grupo etário com idade > a 65 anos), sendo a mediana de duração de resposta até recaída de 17 meses no primeiro grupo e de 11 meses no segundo. Neste estudo obtivemos medianas de SG de 31 versus 17 meses, e de sobrevivência livre de recaída (SLR) de 37 versus 11 meses [figuras 1 e 2].
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Figura 1- Sobrevivência Global (por Idade)
Figura 2 - Sobrevivência Livre de Recaída (por idade)
- Considerações sobre Terapêutica de Indução em LMA no Idoso (idade superior a 60-65 anos) A idade não deve por si só limitar a escolha terapêutica. Caso o doente reúna condições para administração de quimioterapia clássica, o principal objectivo será a obtenção de remissão completa, associada a maior sobrevivência, qualidade de vida e resposta a eventual transplante alogénico (alo-TPH) com condicionamento de intensidade reduzida (RIC) [20, 21]. Actualmente, considera-se que a associação de citarabina 100 mg/m2/dia com daunorrubicina 60 mg/m2/dia ou idarrubicina 12 mg/m2 constitui um dos regimes mais eficazes neste grupo etário. Porquanto a cura da LMA seja desejável, é certo que uma fracção significativa destes doentes não apresenta condições clínicas para início de QT convencional, tendo o clínico de optar por regimes paliativos (ex. hidroxiureia, citarabina em dose baixa) ou terapêutica exclusivamente de suporte [22]. Numa tentativa de reduzir toxicidade terapêutica neste grupo etário, têm vindo a ser desenvolvidos protocolos que incorporam agentes farmacológicos distintos dos convencionalmente utilizados, constituindo exemplo a 5-azacitidina, a clofarabina e a decitabina. Em 2010 foram publicados os resultados de um estudo de fase III comparando a utilização de azacitidina (75 mg/m2/dia durante 7 dias, em ciclos de 28 dias, durante pelo menos 6 meses) com citarabina em dose baixa ou QT convencional, tendo a utilização deste agente hipometilante em doentes idosos com baixa percentagem de blastos (20 a 30 por cento) demonstrado vantagem para a sobrevivência e diminuição do tempo de internamento [23,24]. A clofarabina em monoterapia foi estudada em dois ensaios clínicos [25,26], ambos publicados em 2010, com obtenção de 38 por cento e 32 por cento de RC em doentes com factores de mau prognóstico (ex. idade > 70 anos; PS ECOG > 2; antecedentes de patologia hematológica, cariotipo intermédio ou desfavorável). Também a decitabina tem sido utilizada como terapêutica de indução no idoso, com taxas de RC de 24 por cento e 47 por cento [27,28]. Recentemente foram publicados os resultados de um estudo comparativo entre decitabina versus terapêutica de suporte ou citarabina em dose baixa, em que o grupo tratado com decitabina
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TEXTO LIVRE apresentou maior percentagem de respostas (RC e RCp) mas não prolongamento da sobrevivência [29]. Também em 2012 foram publicados os resultados de um estudo utilizando decitabina em monoterapia em doentes com mais de 60 anos, em que se obtiveram 26 por cento de respostas (RC e RP), não influenciadas pela presença de alterações citogenéticas adversas e/ou de síndrome mielodisplásica prévia. A mediana de SG foi de 5.5 meses e a sobrevivência a um ano de 28 por cento [30]. - Terapêutica Pós-Remissão e Transplantação em LMA Nos grupos etários com idade inferior a 60-65 anos, as actuais linhas de orientação recomendam um plano terapêutico adaptado ao grupo de risco, variando entre a citarabina em alta dose e o alo-TPH em primeira RC. Para os grupos de prognóstico favorável e intermédio é discutível a realização de transplante autólogo (auto-TPH), não tendo este procedimento mostrado benefício acrescido em relação à terapêutica de consolidação convencional, salvo em condições particulares (ex. LMA com citogenética normal e MLL partial tandem duplication). No idoso, a terapêutica de consolidação é variável, dependendo das condicionantes referidas a propósito da terapêutica de indução. Neste grupo etário, são utilizados vários regimes terapêuticos, alguns dos quais favorecendo a utilização de esquemas de manutenção em baixa dose versus de maior intensidade. De uma forma ou de outra, a utilização de consolidação com citarabina em alta dose em doentes com idade > 60 anos deve ser acautelada pelo risco de toxicidade, nomeadamente em doentes com PS elevado, morbilidades associadas e/ou alterações citogenéticas ou moleculares de mau prognóstico, em que se prevê maior quimiorresistência e maior razão risco/benefício. Na tabela 2 encontra-se representado o esquema de terapêutica pós-remissão em LMA não promielocítica utilizado no Serviço de Hematologia do IPOFG Lisboa. Tabela 2 - Esquema de Terapêutica pós-remissão em LMA não promielocítica
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TEXTO LIVRE - Novos agentes terapêuticos, marcadores de risco e métodos de diagnóstico em LMA O processo de leucemogenese em LMA consiste num modelo cooperativo, decorrente de dois grupos de mutações complementares - activação de vias de transdução de sinal (ex. mutações dos genes RAS, FLT3, ou KIT), conferindo propriedades proliferativas e vantagem de sobrevivência ao clone leucémico; alteração da diferenciação e das propriedades de auto-renovação celular (ex. translocações AML1-ETO, CBFβ-SMMHC, PML-RARα, NUP98-HOXA9, MOZ-TIF2 e rearranjos do gene MLL), essencial às stem cell leucémicas [31]. A génese leucémica decorre da capacidade de sobrevivência dos blastos leucémicos e da presença de stem cell leucémicas, cuja variabilidade genética, capacidade de quiescência/auto-renovação ilimitada e interacção com o microambiente desencadeiam o aparecimento e recidiva/refractoriedade desta patologia. A acrescer a estes aspectos, são também conhecidos mecanismos de resistência farmacológica (ex. sobrexpressão de MDR1) [32], que por si condicionam a reposta terapêutica. Assim, perspectivar a cura da LMA implica não só a obtenção de RC como também a extinção das células estaminais leucémicas, a eliminação e/ou superação dos mecanismos de resistência e a modelação das interacções leucémia-microambiente medular. Neste sentido, têm vindo a decorrer múltiplos ensaios de agentes específicos para algumas das alterações genéticas referidas, tais como inibidores do FLT3 (ex. midostaurina, sorafenib, quizartinib, lestaurinib), das vias Src/Abl (ex. Dasatinib em LMA com mutações do gene KIT) e do NF-kB, entre outros. Estão também em estudo fármacos modeladores da regulação epigenética, tais como a 5-azacitidina, a decitabina e os inibidores da histona desacetilase (HDACi), assim como fármacos que interferem com a interacção do clone leucémico com o microambiente medular (ex. plerixaford, que interfere com a interaçcção SDF-1/CXCR4, sendo utilizado com o objectivo de aumentar o número de blastos periféricos, facilitando a sua exposição à QT). Conquanto os novos conceitos terapêuticos sejam animadores, a recomendação da sua utilização na prática clínica corrente não é ainda uma realidade [33-42]. Quanto à definição de grupos de risco, está em estudo a utilização de novos marcadores moleculares (ex. IDH1 e 2, TET2, DNMT3A, WT1 e RUNX1) e de novas formas de aplicação de marcadores já utilizados (ex. ratio FLT3-ITD) [43, 44]. Também no que concerne aos métodos de diagnóstico e monitorização de resposta, importa destacar o avanço nas áreas da imunofenotipagem e da biologia molecular, bem como o desenvolvimento e aperfeiçoamento de métodos de sequenciação genómica, que poderão vir a adquirir grande utilidade em LMA (ex. diagnóstico e classificação; reconhecimento de padrões génicos associados a maior risco de recidiva; optimização terapêutica baseada em perfis génicos específicos; previsão de eficácia farmacológica - farmacogenómica; estudo de susceptibilidade para o desenvolvimento de neoplasias) [45-47]. Leucemia Linfoblástica Aguda A leucémia linfoblástica aguda (LLA) constitui uma das neoplasias malignas mais frequentes em idade pediátrica, sendo anualmente diagnosticados cerca de 3250 novos casos de LA em crianças e adolescentes com idade inferior a 20 anos, 74 por cento dos quais correspondentes a LLA. Segundo dados do SEER, a taxa de incidência de LLA
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TEXTO LIVRE ajustada à idade é de 1.6/100 000 por ano, correspondendo a maior percentagem de casos a doentes em idade pediátrica, adolescentes e adultos jovens [4]. - Terapêutica em LLA A história da Hematologia (e da Oncologia Médica) é indissociável dos avanços diagnósticos e terapêuticos em LLA, tendo esta patologia estado na base de estudos biológicos, farmacológicos e clínicos que viriam a contribuir de forma contundente para o seu desenvolvimento [48]. A actual terapêutica em LLA incorpora esquemas de QT combinada, administrada de forma intensiva e intermitente, em fases distintas (ex. indução, consolidação, manutenção), com vista à obtenção de respostas precoces, frequentes e duradouras. Não obstante o aumento das taxas de remissão completa após indução verificado nos anos 70, a qualidade de remissão era ainda fruste para cerca de 50 por cento dos doentes com LLA, facto que viria a experimentar um revés no final dessa década com a aplicação de protocolos estratificados por grupos de risco (1981 Henze G et al., protocolo BFM 76-79), estratégia amplamente utilizada na actualidade [49-71]. De entre os factores de risco de maior importância prognóstica contam-se: a idade; a contagem leucocitária; as características imunofenotípicas (LLA B: fenótipo pro-B CD10 -, nomeadamente quando associado a t(4;11)/abn q23; LLA pré-B com expressão de cadeias μ citoplasmáticas associada a rearranjos do gene MLL; expressão de CD20, positivo em quase 50 por cento das LLA B; LLA T: subtipos pro, pre e maduro [CD1a -, CD3 -/CD3 +], de pior prognóstico comparativamente ao fenótipo cortical/tímico [CD1a+]; LLA-T CD56+ e possivelmente CD13+), citogenéticas (ex. t(9;22); t(4;11) (q21;q23), rearranjos do gene MLL (11q23); t(8;14), delecção do cromossoma 7; hipodiploidia baixa/quase triploidia; cariótipo complexo; LLAs com +21, +8, del (6q) e t(1;19) isoladas poderão constituir um grupo de risco intermédio/alto) e moleculares (ex. impacto prognóstico desfavorável da sobrexpressão dos genes HOX11L2 e ERG em LLA T e das mutações do gene IKZF1 - associado a resistência aos inibidores da tirosina cinase em LLA Ph+ e a mau prognóstico em LLA B; impacto prognóstico favorável da sobrexpressão do gene TLX1, da subexpressão combinada dos genes ERG e BAALC, e das mutações dos genes NOTCH1 e FBXW7); a expressão de proteínas relacionadas com resistência farmacológica, de que constitui exemplo a glicoproteína-P, expressada pelo gene MDR1 - multidrug resistance protein 1 [72]. Acrescendo aos factores enumerados, alguns dos protocolos actualmente em estudo incluem a avaliação quantitativa (por imunofenotipagem ou biologia molecular) de doença residual mínima (DRM) como forma de estratificação de risco, propondo-se que a persistência de DRM após a indução ou consolidação precoce (entre as 4 e as 22 semanas) poderá traduzir resistência farmacológica intrínseca e associar-se a maior risco de recidiva. Neste sentido, e considerando a importância prognóstica da obtenção precoce de remissão imunofenotípica/ molecular (DRM indetectável), alguns dos protocolos actualmente em estudo incluem a avaliação medular de DRM em dia 14/15 do início terapêutico (E. Renate Panzer-Grümayer et al., 2000; Giuseppe Basso el al., 2009), com vista à subsequente reestratificação de risco, optimização da intensidade terapêutica e reavaliação
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TEXTO LIVRE da indicação para alo-TPH. Dados da literatura referem que o tempo até obtenção de DRM indetectável aumenta com a idade e com o subtipo de LLA (mais tardio em LLA T), devendo considerar-se estes aspectos na avaliação de resposta terapêutica [73-81]. - Terapêutica de LLA no adolescente e adulto Sendo a LLA uma das neoplasias malignas mais frequentes em idade pediátrica, também a maioria dos protocolos terapêuticos foram elaborados e estudados neste grupo etário. Como já referido, a idade constitui um factor de prognóstico relevante nesta patologia, sendo que nos grupos etários de maior idade aumenta a frequência de factores de mau prognóstico (ex. o cromossoma Ph, os rearranjos do gene MLL, a hiperdiploidia) e diminui a tolerância à toxicidade dos regimes terapêuticos de maior intensidade. Actualmente, parece consensual o benefício da aplicação de protocolos pediátricos em adolescentes e adultos jovens. De acordo com a literatura, os resultados terapêuticos em LLA do adulto são historicamente inferiores aos pediátricos (SLE aos 5 anos de 80 por cento versus 30-40 por cento). Não obstante, os resultados obtidos dos estudos pediátricos evidenciaram a existência de um subgrupo etário de doentes - adolescentes e adultos jovens - que poderia beneficiar da aplicação de esquemas de QT intensiva, sem compromisso acrescido de toxicidade. Ainda que a definição de adolescente e adulto jovem difira de país para país (ex. OMS dos 10-19 anos; NCI/LAF dos 15 aos 40 anos; NICE [Ingraterra] e Canadá dos 15 aos 29 anos), facto condiciona a comparação entre os vários estudos, é notável a melhoria dos resultados obtidos neste grupo, verificando-se um aumento de cerca de 30 por cento a 40 por cento da SLE e da SG [82-84]. No idoso, a terapêutica deverá ser ajustada ao grau de fragilidade desta população, de forma a obter maior relação benefício/toxicidade. Actualmente, estão em curso estudos que procuram não só avaliar a aplicação deste tipo de medidas terapêuticas de menor intensidade (ex. indução com Imatinib, com ou sem corticosteroides, em LLA Ph+, para a qual estão descritas percentagens de remissão completa entre 90 e 100 por cento), como também optimizar a utilização de fármacos cuja relevância terapêutica foi demonstrada em grupos etários mais jovens (ex. asparaginase, metotrexato em dose intermédia/alta) [85-87]. - Casuística do Serviço de Hematologia do IPOFG Lisboa referente aos casos de LLA diagnosticada em Adolescentes e Adultos Jovens tratados de acordo com Protocolo Pediátrico Os resultados obtidos mediante análise retrospectiva de 14 adolescentes e adultos jovens (mediana de idade = 18 anos; mínimo = 15 anos; máximo = 32 anos), com diagnóstico de novo de LLA (alto risco: n=6; muito alto risco: n=8), tratados no Serviço de Hematologia do IPOFG Lisboa segundo protocolo pediátrico (adaptado de DFCI), entre Agosto de 2007 e Maio de 2012, mostram: RC em 92.9 por cento; SG de 92.9 por cento (mediana de tempo de seguimento =11.5 meses); SLE de 85.7 por cento [figuras 3]. Em três dos doentes foi realizado alo-TPH (LLA B e LLA T hiperleucocitárias; LLA T com rearranjos do gene MLL), apresentando-se todos eles em RC à data da última avaliação (tempo médio de seguimento=12.3 meses; tempo mínimo=2 meses; tempo máximo=19 meses).
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Figura 3 - Sobrevivência Global e Livre de Evento
- Transplantação em LLA no adulto Actualmente em LLA consideram-se duas metodologias de orientação para realização de transplante em primeira RC - transplante em todos os doentes adultos elegíveis para o procedimento versus transplante em doentes de alto risco [88]. Apesar da importância do efeito imunológico enxerto versus leucemia na eliminação da doença, a este procedimento acresce um potencial de toxicidade que poderá afectar de forma considerável a qualidade de vida dos doentes. Neste sentido, a decisão de transplantação de acordo com o grupo de risco constitui um princípio que vem ganhando adeptos, sobretudo após estratificação com base na avaliação de DRM. Na Europa, a maioria dos grupos de estudo define a indicação para realização de transplantação alogénica em primeira remissão de acordo factores de prognóstico de alto risco, associados a uma probabilidade de sobrevivência inferior a 40 por cento com QT convencional. Entre eles incluem-se: alterações citogenéticas de mau prognóstico; fenótipo adverso; formas de apresentação hiperleucocitária. De forma global, o limiar de idade para este procedimento varia entre 50 e 55 anos de idade. Além dos factores referidos, a avaliação de DRM constitui uma determinação importante para a decisão terapêutica, sendo que alguns grupos recomendam a realização de transplante em doentes de risco standard (RS) nos quais persiste doença residual após QT (ex. após a indução ou consolidação), e de QT convencional nos doentes de RS com DRM negativa. Por outro lado, existem grupos que sugerem a não realização de alo-TPH em primeira RC em doentes de alto risco que não apresentem características de muito mau prognóstico e que obtenham resposta molecular completa. Segundo os dados de registo do EBMT (European Group for Blood and Marrow Transplantation) e do CIBMTR (Center for International Blood and Marrow Transplant Research) referentes à transplantação alogénica em primeira remissão em LLA no adulto, estima-se que a percentagem de sobrevivência global após
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TEXTO LIVRE alo-TPH de dador relacionado seja de cerca de 50 por cento, sendo de 40-45 por cento em caso de dador não relacionado (com aparente menor incidência cumulativa de recidiva mas maior NRM - nonrelapse mortality, que varia entre 30 e 40 por cento). Em caso de transplante em segunda remissão ou de doença avançada, as percentagens de sobrevivência após transplante alogénico relacionado estimam-se em cerca de 30 e 15 por cento, respectivamente. Nos grupos com idade superior a 50 anos e nos doentes com morbilidades, a utilização de regimes de condicionamento de intensidade reduzida (RIC) tem vindo a adquirir relevância crescente, constituindo uma opção terapêutica válida em doentes com idade > 45 anos em remissão completa, que sejam candidatos a transplante mas não elegíveis para regime de condicionamento mieloablativo [89,90]. Quanto à realização de transplante autólogo, alguns estudos sugerem ausência de benefício comparativamente à administração de QT convencional, evidenciando uma elevada percentagem de recidiva. Porém, e ainda que não recomendado actualmente, este procedimento poderá vir a constituir uma opção de interesse em doentes em remissão molecular completa, incluindo doentes de alto risco [91, 92]. - Leucemia Linfoblástica Ph+ Como referido anteriormente, a incidência de LLA Ph+ aumenta com a idade, correspondendo a 1/4 das LLA do adulto. A presença desta alteração cromossómica associa-se a mau prognóstico. Nos estudos anteriores à utilização de inibidores da tirosina cinase (ITC), a mediana de sobrevivência nesta população era de cerca de oito meses. A introdução de ITC, quer associados a QT convencional, quer a QT de intensidade reduzida, veio proporcionar a obtenção de percentagens de remissão completa superiores a 90 por cento, com perfil de toxicidade globalmente favorável, perspectivando-se assim uma melhoria dos resultados neste grupo de mau prognóstico. A escolha do ITC utilizado em primeira linha varia de protocolo para protocolo, devendo considerar-se a relação risco/benefício/custo e os resultados de estudos terapêuticos comparativos a longo prazo. Apesar dos benefícios da utilização de ITC, persiste porém a indicação para realização de alo-TPH em primeira remissão. Neste sentido, a introdução de ITC, ao proporcionar maiores percentagens de RC, veio aumentar a frequência deste procedimento, estando descritas percentagens de SG aos 3 anos entre 59 e 72 por cento, decorrentes da combinação destas duas estratégias terapêuticas. A realização de transplante mieloablativo comporta riscos, nomeadamente nos grupos etários de maior idade. A utilização de RIC em primeira RC parece apresentar percentagens aceitáveis de mortalidade relacionada com transplante (TRM) (20-30 por cento) em doentes inelegíveis para transplante mieloablativo, com aparente melhoria de sobrevivência livre de doença comparativamente à utilização exclusiva de QT e ITC. A utilização de ITC após transplante constitui um tema debate, existindo estudos que evidenciam uma melhoria dos resultados a longo prazo com a utilização de ITC, nomeadamente se persistir DRM detectável. As estratégias de utilização de ITC
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TEXTO LIVRE neste contexto são variáveis, sendo nalguns casos iniciado após transplante, independentemente do estado de remissão molecular, e noutros de acordo com o status de DRM, não existindo até à data dados comparativos concludentes. Também a duração terapeutica é variável, podendo ir até dois anos ou ser suspensa em caso de DRM seriadamente negativa. Tal como já referido, a avaliação de DRM veio trazer algumas alterações aos esquemas terapêuticos em LLA. Ao contrário da Leucémia Mielóide Crónica (LMC), em LLA não existe consenso em relação à resposta molecular óptima, havendo resultados contraditórios. De acordo com os dados da literatura, é expectável que com os regimes de indução com ITC se obtenham percentagens de RC de 90-100 por cento. Assim, em doentes candidatos a transplante alogénico em primeira remissão, mais relevante do que determinar a DRM em fases iniciais da terapêutica, seria proceder ao controlo regular da DRM após transplante, de forma a uma mais precoce actuação terapêutica. Nos casos não elegíveis para transplante ou na ausência de dador, a monitorização de DRM em fases precoces parece constituir uma opção razoável, pois proporcionaria um melhor controlo da evolução molecular da doença e, dessa forma, a possibilidade de alteração terapêutica previamente a recidiva hematológica. Também ao contrário da LMC, não está determinada a periodicidade de monitorização de DRM, variando esta de centro para centro [72, 85, 90]. - Novas abordagens Terapêuticas em LLA Actualmente estão em estudo alguns fármacos que poderão vir a ter utilidade não só como terapêutica de primeira linha mas também como terapêutica de resgate em LLA refractária ou em recidiva. Entre eles incluem-se: a nelarabina (LLA T), a clofarabina, a forodesina, o blinatumumab (BiTE - Bi-specific T-cell engager, cuja actividade decorre da acção combinada anti-CD3 e anti-CD19, tendo demonstrado eficácia quando utilizado em contexto de recidiva molecular), o rituximab (anti-CD20), o epratuzumab (anti-CD22), o inotuzumab (anti-CD22 conjugado com caliqueamicina, que recentemente demonstrou resultados promissores em LLA refractária ou em recidiva), o alemtuzumab (anti-CD52), o ponatinib, inibidores do FLT3 (ex. LLA pro-B FLT3+), inibibores de mTOR (sugerido sinergismo entre o temsirolimus e o metotrexato), inibidores da γ-secretase (LLA T - bloqueio da via de sinalização do NOTCH1), agentes hipometilantes e inibidores da desacetilação das histonas (nomeadamente em LLA com rearranjos do gene MLL), entre outros [93-98]. Conclusão A terapêutica e seguimento em LA apresenta algumas particularidades, pois que num mesmo doente esta patologia pode assumir formas de comportamento diversas, variáveis ao longo do tempo, constituindo um desafio no dia-a-dia do Hematologista. Para o sucesso terapêutico e eficácia a longo prazo, impõem-se três premissas: rapidez e acuidade diagnóstica; prontidão terapêutica e celeridade na obtenção de RC; redução de toxicidade e terapêutica de suporte eficaz. Apesar dos avanços verificados nos últimos 50 anos, os resultados terapêuticos em LA estão ainda longe do desejável. Se numa percentagem de doentes a cura constitui
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TEXTO LIVRE uma realidade, para muitos outros as taxas de remissão são ainda baixas, nomeadamente nos grupos etários de maior idade. Espera-se que os avanços no entendimento do comportamento biológico em LA venham a contribuir para a descoberta de novos alvos e agentes farmacológicos, que utilizados em monoterapia ou, à semelhança histórica dos actuais protocolos, em terapêutica combinada, possam optimizar os resultados terapêuticos nesta área.
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“A publicação sobre áreas de excelência de Hematologia Clínica, este ano dedicada às leucemias, pode ser considerada uma boa ideia. Foi feito um levantamento do que se faz no país neste ramo de patologia, através da consulta (por entrevista) dos responsáveis dos principais Serviços nacionais envolvidos no seu diagnóstico e tratamento.”
“…a Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) é um fórum que congrega não só médicos mas todos aqueles que têm uma ligação à Hematologia;”