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Beira do Rio

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Abril e Maio, 2020

Pesquisa

De onde vem o seu perfume? A complexa relação entre ilhéus e empresas de biocosméticos   Gabriel Mansur

O

Mercado do Ver-o-Peso, em Belém (PA), é conhecido por sua variedade, principalmente pela oferta de produtos amazônicos, como peixes, frutas, medicamentos e artesanato. Outra característica marcante do mercado é a venda de banhos de cheiro e perfumes produzidos com ervas da região. Esses produtos são plantados, colhidos e tratados nas ilhas estuarinas – onde acontece o encontro das águas do rio e do mar, como a Ilha de Cotijuba, na Região Metropolitana de Belém. O uso das ervas para o comércio

internacional remonta aos tempos da colonização portuguesa da cidade, que completou 404 anos em janeiro passado. Orientado pela professora Leila Mourão, João Marcelo Barbosa Dergan, historiador e coordenador de Acervo e Pesquisa do Centro de Memória da Amazônia da UFPA, defendeu a tese Ilhas estuarinas amazônicas: histórias, memórias e apropriação de saberes sobre a flora (1990-2017), no Programa de Pós-Graduação em História (PPGHist/IFCH). João Marcelo procurou compreender a relação dos ilhéus (moradores das ilhas estuarinas) e da flora das

ilhas, dando atenção especial ao cultivo das sementes e raízes aromáticas (Ucuuba, Pracaxi e Priprioca), com as empresas que fazem parte do ramo dos biocosméticos. Além da sua área continental, o município de Belém é composto por 43 ilhas. No século XVIII, houve a concessão de sesmarias pela metrópole portuguesa para incentivar a produção agrícola na região. As autorizações eram para a plantação de insumos como arroz, cacau, entre outros. Em busca de informações e de fontes, João Marcelo Barbosa Dergan releu os documentos referentes

às primeiras concessões e encontrou “cartas de doações e o tipo de plantio que a metrópole portuguesa e o governo brasileiro consideravam necessários para serem implementados nessas áreas”, conta. Os moradores das áreas estuarinas eram obrigados a plantar o que mandavam os novos donos das terras, em troca, continuariam vivendo no local, por meio de arrendamentos. Mas, de maneira informal, os ilhéus cultivavam, para uso próprio, ervas e sementes que, muitas vezes, se diferenciavam do estabelecido pelas normas oficiais.

Diversidade de aromas sempre surpreendeu pesquisadores Durante o século XIX, houve um crescente interesse pelo uso de produtos como perfumes e outros cosméticos, além da busca pela categorização da natureza. Com isso, muitos pesquisadores europeus que passaram pelas ilhas estuarinas se deslumbraram com a diversidade de verde e seus cheiros. As sementes e as raízes já eram utilizadas para a fabricação de sabão; e

as frutas, para a fabricação de licores. Com o conhecimento dos ilhéus, os pesquisadores puderam categorizar melhor a flora. Em sua pesquisa, o historiador João Marcelo Dergan entrevistou diversos moradores de Cotijuba, pois um dos elementos que compõem a sua tese é a história oral, em cruzamento com a história social do trabalho e a história ambiental.

“Para entender o que estava acontecendo no presente, precisei voltar no tempo do passado. O que me norteou foram as memórias significativas dos ilhéus com a cidade, com as ilhas e com o trabalho com as sementes e raízes aromáticas”, explica o pesquisador. Seu Leandro é um dos entrevistados citados na tese e conta que seu pai vendia sementes e raízes no mercado de

A semente de Pracaxi nas mãos de Rosiléa, moradora de Cotijuba e associada do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB).

Icoaraci, quando o distrito ainda se chamava Vila Pinheiro. No mesmo local, funcionava a fábrica Conceição, que exportava as sementes da ilha para a Itália. Entrevistada por João Marcelo Dergan, Dona Flávia conta que a coleta e o cuidado com as sementes e raízes foram aprendidos com a sua mãe, Dona Antônia. Portanto se percebe que a relação dos ilhéus com a terra é um conhecimento


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