As imagens e a realidade - o bordado como mais uma camada e a possível escrita de si. 1. A produção de imagens e a nossa possibilidade de “informar” a realidade Gosto muito da expressão “escrita de si”, que apliquei ao sentido do exercício de bordar a fotografia. Costumo dizer que um dos objetivos desse fazer manual é um reencontro consigo mesmo, a partir de um instante de memória que leve a um fio de narrativa a ser literalmente costurado pela materialidade do fio e da agulha, e pelo exercício de furar aquele papel fotográfico, criando um percurso simbólico que dialogue com essa realidade já experimentada um dia, mas agora revivida, reatualizada, e principalmente, ressignificada. Ressignificada, sim. Porque nenhuma imagem produzida corresponde de fato à realidade vivida - é sempre um recorte, um ponto de vista e já um enquadre, “informado”, para usar a expressão de Vilem Flusser, do que foi a realidade. Se pensarmos, assim, no lugar que o exercício de bordar uma fotografia ocupa na construção da memória de um indivíduo e nessa escrita de si que defendo, vamos chegar à problematização que Flusser levanta em relação à construção das imagens técnicas e ao processo (nem sempre linear) da abstração da realidade com a interferência das ideologias nesse processo constitutivo da memória. Flusser reflete sobre uma hierarquia que está presente historicamente na nossa relação com as imagens e, por consequência com a abstração e a construção de conceitos, que vão surgir a partir da simbolização da realidade. Segundo ele, pelas mãos o homem natural pôde pela primeira vez transformar o mundo em uma circunstância. A partir da sua experiência direta na