05 Recensão PSI 2023

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Alves, M. (2002). Chove nas Grades: Temas, Factos e Circunstâncias das prisões portuguesas. Edições Esgotadas.

PSI/FOR ALV*CHO

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Sugestão de leitura mai’ 2023 Psicologia

Sugestão de leitura mai’ 2023 Psicologia

Alves, M. (2002). Chove nas Grades: Temas, Factos e Circunstâncias das prisões portuguesas. Edições Esgotadas.

PSI/FOR ALV*CHO

A cadeia é uma instituição total. Como totalidade, ela é: biológica, jurídico-penal económica, macrossocial, organizacional, psicológica. Só assim se pode entender: totalmente. Não é (só) um SUPER EGO atemorizante e de índole arquétipa. É um todo pequeno que reproduz a globalidade maior que a gerou. Esta, ao socializa-lo e integrálo, vai reproduzindo sistematicamente o eco.

A cadeia deve ser só e apenas para aqueles que de todo a merecem ou porque do crime fizeram opção de vida. Para além destes, a população prisional portuguesa poderá ser imensamente menor, o número de cadeias também e o peso económicofinanceiro do sistema igualmente. Porém, definir este tremendo conceito de merecimento é ciclópica tarefa que passará pela caraterização, balizamento e tipificação, não menos fáceis, dos conceitos de perigosidade e incorrigibilidade. Estaremos então no início e no fundo da questão, talvez insolúvel: na bondade e maldade “inatas” da condição humana, cujos crentes e não crentes dificilmente algum dia se entenderão.

O futuro das prisões não vai nunca poder fugir da sua “genética” e dupla contradição, apenas atenuá-la: prender para proteger e prender para integrar; no fundo: fazer o mal (privando da liberdade) para alcançar o bem (proteger e integrar socialmente). O double bind das prisões faz delas instituições contraditórias no seu ADN a que a teoria penal e a ambição da reinserção social respondem com ganhos civilizacionais cujos suportes construtivos assentam em modelos sociais humanistas crentes na bondade “inata” da condição humana. Porém, nelas se entrecruzam os múltiplos fatores constituintes da “inata” maldade da natureza humana que, em meio concentracionário, total e imposto autoritária e perentoriamente do exterior (administração), a coloca em situação de grande vantagem, nesta tremenda disputa, entre a privação da liberdade face à ambição/utopia que com ela se constrói. Nas prisões entrecruzam-se os múltiplos fatores da “inata” não bondade da condição humana. Isto, não obstante a sua existência, tal como ela é doutrinalmente justificada e do desígnio que preside à sua manutenção tal como a conhecemos estar assente na crença na “inata” bondade da natureza humana. Bondade e maldade “inatas” em quem muitos não acreditam face à complexidade e mistério da condição humana e sobre as quais em muitos casos só a fé e a religião, a par da psicologia e da psicanálise

lançam alguma luz, convicção, desígnio, dogma e indicadores de “gestão”.

Por isso, falar, escrever, investigar, teorizar, governar, politizar e até “palpitar” sobre as prisões, é fazê-lo sobre cada um de nós. É fazê-lo sobre a disputa entre o “melhor” e o “pior” da natureza humana, mas que raramente é direcionada para “nós” próprios, antes para a realidade externa de que nunca queremos fazer parte individualmente.

A organização desta obra e distribuição temática é subjetiva e singular. Perante a sua necessidade, ela tinha forçosamente de ocorrer, não obstante o seu enquadramento técnico e de conteúdos ser muitas vezes múltiplo e simultâneo, porque de tempos históricos diferentes. Por outro lado, os grandes temas que presidem aos capítulos, não têm essa dimensão, quer quantitativa como valorativa, nos conteúdos. Aqueles constituem apenas um esforço para enquadrar estes.

Assim, os textos que compõem esta obra são uma voz pontual, historicamente situada e diversa, mas com fios condutores de uma estrutura de pensamento que, através de temas, factos e circunstâncias, conduziram esse mesmo pensamento em direções diversas mas necessárias na abordagem das prisões: na perspetiva da sua história, da doutrina, do desígnio, das ferramentas e técnicas para ação, da proposta e da crítica dessa mesma ação, do governo e do desgoverno, do terreno, das circunstâncias e das pessoas concretas que povoam este velho, imenso e longo cenário onde a bondade e a maldade inatas ou circunstanciais da condição humana, despejam o sumo das virtudes incomparáveis e o fel torpe da habilidade, da insídia, da maledicência, da vingança e até da calúnia. No fundo, o âmago da natureza humana que neste território telúrico propicia sobremaneira tudo o que de melhor e pior a constitui. Tudo isto porque “a memória é o orçamento da alma” (Agustina Bessa-Luís, 2004).

Divisão de Documentação

(Baseado em excertos do livro)

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