Entrevista exclusiva com Nelson Antonio

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BIBLIOTECA IPAM | Maio, 2011

E N T R E V I S TA Nelson José dos Santos António Professor catedrático no ISCTE, onde lecciona Estratégia e Gestão da Qualidade

Biblioteca IPAM: Quais as suas referências (autores) no campo da Gestão da Qualidade? Nélson António: Deming e Ishikawa são as minhas grandes referências.


BIBLIOTECA IPAM | Maio de 2011

BIPAM: Qual o futuro da gestão da qualidade dentro das empresas? Será que a aposta na inovação a tornará mais objectiva e precisa? N.A.: A qualidade deve estar sempre dentro das empresas. No mundo actual em que as fronteiras foram simplificadas (os produtos, o capital e as pessoas circulam com mais liberdade) e as fronteiras entre os diversos sectores de actividade diminuíram (os produtos substitutos podem vir de sectores que aparentemente nada têm a ver com o nosso) as empresas para sobreviver necessitam de produzir com qualidade. A implementação da gestão da qualidade ajuda a inovação. A inovação deve ser vista como pequenas melhorias (dos produtos e dos processos) e a resolução de problemas pelos grupos de qualidade promovem a inovação. A inovação é feita pelas pessoas e a gestão da qualidade dá atenção às pessoas.

BIPAM: Quando é que se deu conta da importância da gestão da qualidade, e como é que procedeu à escolha de enveredar por este campo? N.A.: Quando estudei o modelo japonês de gestão. Sou licenciado em Finanças, tenho a parte escolar de um mestrado em métodos quantitativos para gestão e durante este mestrado tive aulas com um professor alemão, que viria a ser o meu orientador de tese de doutoramento. Embora o mestrado fosse em métodos quantitativos este professor trouxe abordagem psico-sociológica da empresa (a importância das pessoas na empresa). Mais tarde na Alemanha onde me doutorei, descobri o modelo de gestão japonês e toda a informação recolhida até então começou a fazer sentido. Cheguei à qualidade pelo Japão na Alemanha.

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BIBLIOTECA IPAM | Maio de 2011

B I P A M : Sendo docente da área da estratégia e gestão da qualidade, considera que existem cada vez mais obstáculos para a sua implementação? N.A.: A minha investigação dos últimos vinte anos é combinar estratégia com qualidade. Não consigo separar as duas coisas. Sem qualidade as empresas morrerão, é uma questão de tempo e como a estratégia é essencialmente pensar a empresa como um todo e no longo prazo, logo sem qualidade não há estratégia que resista. Combino a estratégia com a qualidade através do movimento, isto é, dar mais importância ao que se passa dentro da empresa e apostar na inovação em vez de defender posições adquiridas. Utilizo também nesta abordagem a escola baseada nos recursos, considerando os recursos humanos como o principal recurso e as teorias da gestão da qualidade podem ajudar-nos bastante. BIPAM: Como interpreta a relação entre a qualidade e produtividade para os próximos tempos, uma vez que estamos perante uma mudança constante da realidade em Portugal? N.A.: Devemos esquecer a palavra produtividade e promover a qualidade. A produtividade é uma consequência da qualidade. Pensar em qualidade, é pensar em como melhor utilizar os nossos recursos, atacar os desperdícios. A produtividade é um rácio entre outputs e inputs. Utilizando melhor os inputs posso com a mesma quantidade produzir mais outputs, ou com menos quantidade produzir os mesmos inputs ou com menos quantidade produzir mais outputs, e deste modo estou a aumentar a produtividade. Precisamos de nos centrar na qualidade e não na produtividade, mas a qualidade provém do sistema e o sistema é da responsabilidade dos gestores…

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BIBLIOTECA IPAM | Maiao de 2011

BIPAM: Dentro dos seus pareceres, e na perspectiva da gestão, quais são os instrumentos mais importantes para se poder medir a qualidade de uma organização? N.A.: Penso que não devemos concentrar a nossa atenção nas medidas. Muitas das variáveis importantes na gestão de empresas não são mensuráveis ou dificilmente mensuráveis. Devemos criar uma filosofia de qualidade em toda a empresa e utilizar poucas medidas. A existência de softwares poderosos cria a ilusão nos gestores que podem medir tudo e não podem e quando os trabalhadores sentem que tudo o que fazem é medido, enganam os números.

BIPAM: Qual a sua opinião relativamente à qualidade do ensino nas instituições do ensino superior público e superior privado? N.A.: minha opinião sobre as instituições do ensino superior quer sejam públicas ou privadas é a seguinte: dão pouca atenção aos aspectos teóricos. E como afirmava Deming a melhor prática é uma boa teoria. Utiliza-se muito os casos e não nos devemos esquecer que as empresas são essencialmente pessoas e não há dois casos idênticos e os alunos pensam que sabem resolver casos mas não sabem porque lhes falta a dimensão teórica. Mas como um velho colega alemão me tem dito várias vezes: põe um aluno a pensar que está a pensar e ele adora-te, põe um aluno a pensar e ele odeia-te”. P.S. Esta opinião refere-se às instituições de ensino superior do ramo da gestão.

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