razão
#2 12 2007
emoção prazer
devaneio
CAROL DA RIVA
Entre, fique à vontade
LALO DE ALMEIDA
Venha viajar com a gente
CAROL DA RIVA
Deixe-se envolver, você é parte deste universo
expediente Eurobike magazine é uma publicação do Grupo Eurobike de concessionárias BMW, Land Rover, Porsche e Volvo. Av. Wladimir Meirelles Ferreira, 1600 14021-630 - Ribeirão Preto - SP Tel.: (16) 3965-7000 www.eurobike.com.br Editorial: Heloisa C. M. Vasconcellos, Eduardo Rocha Direção de arte: Eduardo Rocha Coordenação e Produção gráfica: Heloisa C. M. Vasconcellos Administração: Patricia Miller Comercial: Guilherme Araujo Produção: R&M Editora Tiragem desta edição: 5 mil exemplares Impressão: Gráfica Bandeirantes Distribuição: Eurobike Proibida a reprodução, total ou parcial, de textos e fotografias sem autorização da Eurobike. As matérias assinadas não expressam, necessariamente, a opinião da revista.
colaboradores
Carol da Riva, Daniel Piza, Edu Petta, Edu Simões, Lalo de Almeida, Percy Faro e Victor Rebouças
Foto da capa: Lalo de Almeida
www.rmeditora.com.br 6 . Eurobike magazine
carta do editor
Caro leitor, É com imensa satisfação que fazemos chegar até você o segundo número da Eurobike magazine. E mais novidades para os amantes das marcas Land Rover, Porsche e Volvo: inauguramos um novo ponto de vendas e assistência técnica em Ribeirão Preto, e estamos ampliando nossas instalações de Porto Alegre em 1.000 m² para abrigar, a partir de fevereiro, os serviços de funilaria e pintura, além do nosso novo show room da Porsche. Todos esses espaços – belas e modernas instalações – são construídos com um único objetivo: fazer com que você se sinta muito bem. Como se pode observar, o mercado de luxo está aquecido e cada vez mais competitivo, com planos de financiamento que estão ampliando a gama de potenciais consumidores dos produtos que a Eurobike representa. A diferença está cada vez mais no relacionamento e na qualidade dos serviços prestados. Por isso vamos continuar investindo para crescer com o mercado, sem jamais perder de vista o que nos faz ser escolhidos por você: o respeito mútuo. Sabemos que este segmento só poderá se desenvolver plenamente à medida que o país também continue crescendo, porém de maneira sustentável, com mais harmonia e menos desigualdade. Um grande abraço, Henry Visconde Diretor Presidente magazine@eurobike.com.br
Eurobike magazine . 7
#2 12 2007 12. razão 14. Robert Wong.
O caçador de missões
18. O Grupo Eurobike
8 . Eurobike magazine
28. emoção 30. O Range Rover sob a ótica de um bem-te-vi
44. Perfil Range Rover 46. Entrevista com Luiz Tambor, diretor da Land Rover Brasil
48. prazer 50. Design a serviço da felicidade
60. devaneio 62. Serra da Canastra
Eurobike magazine . 9
ARQUIVO EUROBIKE
12 . Eurobike magazine
raz達o
Reinventar, construir com a alma, encontrar sua miss達o. A raz達o do ser!
Eurobike magazine . 13
raz達o
14 . Eurobike magazine
O caçador de missões Robert Wong, o “headhunter” que orienta executivos frustrados POR DANIEL PIZA | FOTOS EDU SIMÕES
Robert Wong tem 58 anos e é um dos mais
é a “realização plena de seu potencial como
renomados “headhunters” e um dos mais
ser humano”. Em seus cálculos, apenas
bem pagos palestrantes do Brasil. Está acos-
2% das pessoas chegaram ao topo dessa
Daí a crise que afeta tantos profissionais na
tumado a trabalhar com altos executivos das
pirâmide.
faixa dos 40 anos, diz Wong, para quem
maiores empresas nacionais e mundiais,
cação porque “não ouvem sua voz interior”.
essa faixa pode ir na verdade dos 32 aos
com pessoas que não raro ganham mais
Para ele, os quatro primeiros níveis dizem
47 anos. Nessa idade, “se você acha que é
ou bem mais que R$ 1 milhão por ano. Tem
respeito a objetivos profissionais, às garantias
crise, já vira crise”, porque a maturidade o
no fichário de sua empresa de consultoria,
de sobrevivência, segurança, sociabilidade
obriga a refletir sobre sua carreira e o sujeito
enfim, um rol de carreiras bem-sucedidas.
e status. Neles, o indivíduo está voltado para
se descobre perdido, desorientado. Então há
No entanto, há um fato que segue inco-
si mesmo. No nível mais alto, porém, atin-
três tipos de reação ao alerta interior: ou ele
modando Robert Wong: a grande maioria
giu liberdade e independência, e já não pre-
zomba dessa voz, ou tenta falar mais alto do
dos executivos não está satisfeita com sua
cisa pensar naquelas garantias. Wong, que
que ela, ou então ela o chama, em geral na
profissão. Mesmo médicos e advogados
gosta de etimologia, lembra que a palavra
forma de um acidente ou doença. O princi-
não parecem ter encontrado sua verdadeira
“missão” vem de “mitere”, “envio”, e cita Bill
pal motivo, segundo Wong, é o medo. “Mais
vocação e, apesar dos ótimos salários,
Gates como exemplo de um executivo atual
de 90% dos nossos medos são imaginários,
sofrem por isso. “Eles estão presos em seus
que “está na missão dele”, especialmente
irreais”, acrescenta. “É preciso superá-los
empregos”, diz Wong.
depois da criação de sua fundação de apoio
para usar nossos talentos”. Em seu conceito,
à educação e filantropia. Os demais, segundo
o maior pecado é esse: não usar as habili-
Wong, um caça-talentos que ficou famoso
Wong, não estão subindo na carreira, estão
dades que se tem.
por teses como a de que “o sucesso está
apenas “preparando sua próxima frustração”
no equilíbrio”, título de um de seus livros, fala
e, portanto, “ficam se comparando o tempo
Nem sempre a etimologia usada por Wong
no estilo “PowerPoint” que é típico do setor,
todo”, enredados em egocentrismo, medo
corresponde à das gramáticas. Ele diz que
com frases de efeito, fábulas pedagógicas
e inércia.
“orientar-se” tem a ver com a procura do
e diagramas coloridos. Com pulseira arte-
Oriente, desde os tempos de Marco Polo, e
sanal despontando sob a manga do terno,
Ele usa um termo chinês, “chi”, que significa
especula que a expressão “buscar o norte”
movimenta o laptop de última geração
“energia” ou “alma”, para mostrar como isso
se deve à América do Norte, aos Estados
e, depois de reclamar algumas vezes do
acontece não apenas com indivíduos, mas
Unidos, quando passaram a ser referência
Windows Vista, exibe um portfolio de arqui-
também com as empresas. “Há empresas
mundial de sucesso. Wong, que nasceu na
vos com as lições que aprendeu e formulou
que têm alma, que voam, que você logo vê
China, da qual seu pai, um general naciona-
ao longo de 28 anos de carreira. A principal
que têm energia, como o Google ou, no Bra-
lista, precisou sair por perseguição comunis-
delas se apresenta na forma de uma pirâmide
sil, o Bradesco”, diz. São empresas que não
ta, e cuja família se dividiu entre Estados Uni-
em cinco níveis, que, de baixo para cima,
ficam na “zona de conforto”, acomodadas
dos e Brasil, diz ser mais que um “trilíngüe”,
são os seguintes: emprego, profissão, car-
em seu próprio sucesso, e estão em cons-
é um “tricultural”. Como tal é capaz de equili-
reira, vocação e missão. Este último, traduz,
tante reinvenção. Assim está a maioria dos
brar as virtudes de cada cultura. Em seu
diretores de empresas: confortáveis em sua
mapa-mundi os orientais se destacam pela
situação financeira e social, mas na verdade
inteligência operacional, resultado de uma
frustrados, distantes de seu próprio “âma-
cultura de perseverança, disciplina, trabalho
go”. Recorrendo à etimologia mais uma vez,
duro; os americanos e europeus ocidentais
Wong diz que eles não descobriram sua vo-
possuem habilidade lógica, raciocínio rápido;
“Mais de 90% dos nossos medos são imaginários, irreais”
Eurobike magazine . 15
raz達o
16 . Eurobike magazine
e os latino-americanos se destacam pelo
não é tão ousado e criativo assim. “O brasil-
E por isso Wong pode dar à empresa a ga-
emocional, pela compaixão, pelo apego às
eiro não gosta de mudar”, afirma. “Veja que
rantia de que, se aquele executivo contrata-
artes e aos esportes. Wong receitou para ele
ele só sai de casa quando casa”. Uma das
do por meio de sua consultoria não atender
mesmo a fusão dessas virtudes – e, claro,
razões, segundo ele, pode ser a ausência
às expectativas no prazo de um ano, ele
a receita para os outros.
de quatro estações no clima nacional. Outra
o substituirá sem custos. “Os bons executi-
talvez seja a ausência no passado de uma
vos têm autoconhecimento”.
Mas e o Brasil, mr. Wong? O que sua ex-
guerra ou revolução que “unisse o povo” (sic).
Wong conta com orgulho a ocasião em que,
periência no contato com os executivos
Uma terceira seguramente é a qualidade da
aos 18 anos, estudante da Poli (Escola Poli-
brasileiros mostra? Ele acha que o problema
educação. “Temos no Brasil essa mania de
técnica da Universidade de São Paulo), de-
central do brasileiro é a “baixa auto-estima”;
querer sempre tirar vantagem”. Para ele,
cidiu dar aulas em uma escola de idiomas
que o brasileiro, apesar de sua cultura sen-
o Brasil é mais um país do que uma nação,
para melhorar o orçamento. E, quando o
timental e de seus momentos de torcedor,
pois lhe falta “uma causa”. Como assim?
apresentaram aos alunos como professor
é educado sob muitos “nãos”: “não vale
“A China tem uma causa, a de ser uma
de inglês, ele corrigiu: “I don’t teach English.
a pena”, “não tem jeito”, “homem não chora”.
potência econômica. Os Estados Unidos têm
I teach people”. Sua carreira como palestrante
Wong lembra que oito dos dez mandamentos
uma causa, a de vender o ‘american way of
e “headhunter”, capaz de embalar conceitos
bíblicos contêm “não” e afirma que no Brasil
life’ para o mundo”.
em fórmulas fáceis de decorar, começava
até o “sim” é dito de forma negativa: “pois
ali. Outro de seus trunfos é a ascendência
não”. Vê essa “síndrome da negatividade”
Mas qual seria a causa do Brasil? “Talvez
chinesa, que lhe permite fazer críticas à men-
inclusive em expressões como “não posso
seja a de querer que este seja o melhor lu-
talidade ocidental: “O Ocidente só trabalha
esquecer”, usada em lugar de “preciso lem-
gar do mundo para morar”, responde, refe-
com dualidades. As pessoas julgam o tempo
brar”. Outro problema, diz, é a sensação de
rindo-se ao modo caloroso e informal como
todo. É sempre ‘ganhou ou perdeu’, e o em-
que lucro é pecado, o que torna a ambição
o brasileiro se comporta. Diante da pergunta
prego e o casamento parecem ser dois mun-
algo a ser disfarçado.
sobre se o problema não seria justamente
dos que se opõem”. Por isso sua receita de
essa confusão entre a simpatia do cotidiano
equilíbrio agrada aos ouvidos empresariais.
Nessa capa de “mitos, dogmas, medos
e o desrespeito ao outro, traduzido na lei do
“Tudo deve ser moderado, nada exagerado”
e mentiras”, que não permite que o profis-
“levar vantagem”, ele volta a apontar a im-
poderia ser seu lema.
sional descubra seu potencial, Wong tam-
portância da educação. E não existe tam-
“É preciso combinar intelecto, instinto e in-
bém cita a esperança. “Esperança já implica
bém uma confusão entre ter auto-estima e
tuição”, costuma dizer em suas palestras,
a idéia de esperar, de não fazer”, explica.
se julgar “o melhor do planeta” em tantas
E o brasileiro teria por isso uma dificuldade
coisas? Wong acha que, além da educação,
operacional, em oposição aos asiáticos.
o antídoto é reagir contra o “brain drain”, a
“Não se vive o presente. Há muito desperdí-
perda de talentos para o exterior, e começar
cio de energia”, diz, acrescentando mais
a valorizar qualidades concretas e práticas
uma de suas fórmulas verbais: “Meditar, por
do brasileiro, não discursos.
exemplo, não é ficar parado, pensando na vida. Meditar é estar no meio da ação, é es-
Ele ilustra a necessidade de pragmatismo e
tar concentrado no que se está fazendo”.
auto-estima com as perguntas que faz a si
O brasileiro é bom em propaganda, música,
mesmo quando entrevista um candidato a
futebol – mas mesmo nessas áreas poderia ir
emprego. São três: 1) Eu compraria um car-
mais longe, obtendo mais sucesso econômi-
ro usado dele? 2) Eu o apresentaria a meus
co com entretenimento e turismo.
amigos e familiares? 3) Se eu estivesse com
Ao contrário da auto-imagem que o Bra-
ele num elevador e ele pifasse por duas ou
sil cultua, o que Wong vê é que o brasileiro
três horas, como seria passar esse tempo ao seu lado? Segundo Wong, as respostas
“Meditar, por exemplo, não é ficar parado, pensando na vida. Meditar é estar no meio da ação, é estar concentrado no que se está fazendo”
a essas perguntas definem não apenas a competência de uma pessoa, mas também se ela é confiável, se ela sabe trabalhar em
“Se mente e corpo trabalharem integradas em prol desse projeto”, diz em um dos artigos que publica em jornais de economia, “o universo só conspirará a seu favor”. que o incluíram entre os 100 mais requisitados do setor (além de ser um dos 200 “headhunters” mais importantes do mundo escolhidos pela revista The Economist). Ou então ele ataca de siglas, como “I.D.A.S.”, explicando que intenção, decisão e ação são importantes, mas que sustentação também é. “Se mente e corpo trabalharem integradas em prol desse projeto”, diz em um dos artigos que publica em jornais de economia, “o universo só conspirará a seu favor”. Que ele conspirou a favor de Robert Wong não há a menor dúvida.
equipe, se ela não é egoísta ou carreirista.
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razão
DNA de luxo O grupo Eurobike, representante das marcas BMW, Land Rover, Volvo e Porsche, virou sinônimo de obras de arte em quatro rodas e prevê expansão pelo Brasil POR KATHIA NATALIE
Showroom da Eurobike São Paulo Bens e serviços de luxo não são para todos. A frase permeia o trabalho do professor Silvio Passarelli, coordenador do programa de MBA em Gestão do Luxo da Faap, em São Paulo. E antes que o leitor interrompa a leitura com medo de um texto preconceituoso, vale o contraponto do autor: “Enganam-se, no entanto, os que imaginam que o correto seria ‘luxo para os ricos’”. Ele chegou a
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essa conclusão após ouvir, durante uma reunião social, uma crítica à compra de uma obra de arte por R$ 70 mil. Um dos presentes afirmava: “Que estúpido! Com este dinheiro pode-se comprar um apartamento na Praia Grande!”. “É por estas e por outras, muitas outras, que, pelo menos para mim, o luxo não é para todos”, conclui o professor, que faz coro com os que acreditam no “novo luxo”,
conceito segundo o qual é melhor adquirir emoções e não somente produtos. Mais ainda: luxo mesmo é viver experiências únicas e inesquecíveis, como aquelas que só alguém que está a bordo de um BMW ou um Porsche pode sentir. Tanto é assim que “não se compra um carro desses somente para ostentar status. É preciso ser apaixonado por
direção, gostar de beleza, qualidade e exclusividade. Para certas coisas não é possível medir valor”, diz Henry Visconde, diretor presidente da Eurobike. Fincada num mercado altamente competitivo – o de luxo –, a Eurobike não só conseguiu se estabelecer como se consolidar no Brasil.
A mudança ocorreu pelas mãos de Visconde, que comprou a marca da família Biagi. Antes, Visconde era empresário do setor farmacêutico. “Sempre gostei de carro. Aí surgiu a oportunidade de trabalhar nesta área. Pesou também o desafio de começar do zero e poder empreender o negócio”, diz Visconde. Em apenas seis anos, o grupo Eurobike – hoje
mais competitivo do país. A loja, localizada na região nobre do Parque Villa Lobos (Av. Gastão Vidigal, 1357), é a primeira no Estado dentro dos padrões da BMW alemã. Revende somente modelos BMW e tem um objetivo muito especial de ser: por meio dela, o grupo pretende elevar suas vendas de BMWs em 12% no Estado de São Paulo, um aumento de dois pontos percentuais. A expectativa de retorno do investimento na nova unidade é de cinco anos. Uma atração à parte é o estoque de peças e acessórios para veículos
FOTOS ARQUIVO EUROBIKE
Grande parte desse sucesso se deve à sua filosofia, que considera os veículos um atalho certeiro em direção ao prazer. “O modelos premium têm essa característica. Há quem se
partir de 2000, com nova gestão, que passou a atuar em outras regiões do Brasil.
dê o carro de presente após conquistar algo difícil, como símbolo de ‘eu mereço’”, diz Visconde, ele mesmo um aficionado pelos carros que comercializa. Muito conhecida em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, onde nasceu há 15 anos, a marca paulista Eurobike virou sinônimo por lá de modelos com “sangue azul”, com a revenda de BMWs e Land Rovers. Mas foi somente a
com 150 funcionários – já é uma unidade que reúne concessionárias em Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Porto Alegre e, desde setembro deste ano, na capital paulistana. Há sete meses, o grupo começou seu plano de expansão. O pontapé inicial foi a abertura, em 4 de setembro, de nova concessionária na principal cidade do Brasil: São Paulo, o mercado
e motoristas, verdadeiros mimos que fizeram da nova unidade ponto de encontro dos amantes do luxo aliado ao conforto. Embora a nova concessionária seja a mais nova jóia do grupo, o grande sonho da Eurobike é montar uma rede de revenda de carros premium em uma avenida imaginária que vá de Ribeirão Preto até Goiás. “Queremos crescer onde se possa fazer um geren-
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razão
Oficina da Eurobike São Paulo ciamento mais próximo. Esse é o nosso foco. Buscamos negócios na região”, diz Visconde. A exceção, por enquanto, é a concessionária de Porto Alegre. “Está longe de nosso eixo, mas a oportunidade era muito boa. E não descartamos buscar mais marcas para representar por lá, porque hoje somos líderes no segmento premium na região Sul”, lembra Visconde. Se o futuro é promissor, o presente se mostra ainda mais emocionante para o grupo. Que o digam os números: só em 20 . Eurobike magazine
BMWs a Eurobike abocanha 13% do mercado brasileiro. Também tem 10% dos Land Rovers, com crescimento previsto de 3% a 4%. “De Porsches, estamos na faixa de 12%, o que é ótimo”, conta Visconde. Para Visconde, um dos entraves ao crescimento do consumo dos premium pelos brasileiros não é nem o valor do produto em si, mas sua manutenção, especialmente por causa da violência. “A gente poderia vender 30% a mais se existisse uma política de segurança me-
lhor no país”, explica. A confirmação das previsões depende do fortalecimento da economia. Estamos falando de um segmento ainda pequeno no Brasil, em torno de 10 mil carros/ano, um pequeno volume, apesar do crescimento. “Há expectativa de aumento do consumo de produtos AAA, mas com limite”, diz Visconde, que utiliza a seguinte comparação para explicar a cautela na comemoração dos números: “Enquanto nos Estados Unidos se vendem 270 mil BMWs por ano, por aqui
Cabine de pintura e Lounge para clientes da Eurobike S達o Paulo
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são 2 mil. Claro, quando se faz a estatística pura, vemos que há muito mercado. Se tiver 1% da população consumindo carro de luxo, estamos falando de mais de um milhão de pessoas, o que é muita gente”, conta o diretor presidente do grupo. Mesmo com algumas pedras no meio do caminho, o grupo Eurobike comemora a aquisição do direito de representar a marca Audi em todo o interior de São Paulo. “Apesar de ter outro nome – Audi One –, possui a mesma estrutura, tanto dos controladores quanto de gestão, e é da mesma família”, diz Visconde, que tem o objetivo principal de consolidar o nome Eurobike no mercado premium. “Outra novidade é que acabamos de pegar uma bandeira Toyota em Ribeirão Preto. Começamos a operar em outubro”, lembra Visconde. Com esse negóEurobike Ribeirão Preto
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Eurobike Ribeir達o Preto
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cio, a vantagem, segundo o diretor presidente do grupo, é o fornecimento de qualidade e volume de produtos ao mesmo tempo. Com a Audi, o grupo espera elevar seu faturamento de R$ 170 milhões para R$ 300 milhões. Empresa low profile Segundo Visconde, a Eurobike veio para ficar. Tanto que, desde este ano, investe também no conceito de sustentabilidade. As concessionárias de São Paulo e de Ribeirão Preto são exemplos. Na matriz, até a água da chuva é reaproveitada para diversos usos, entre eles a irrigação do jardim. A água que serve para lavar o carro também é reutilizada até 30 vezes. A arquitetura das lojas valoriza vidros e outros truques que possam aumentar a claridade interna, e assim diminuir gastos com energia. Mesmo começando a ser referência em sustentabilidade, é no atendimento aos clientes que reside a verdadeira vocação da empresa. Eurobike Porto Alegre
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Eurobike Porto Alegre
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Eurobike São José do Rio Preto A relação com os vendedores tem política comercial de remuneração diferente. No lugar de fixo e comissão sobre vendas, há o modelo de pagamento de parte da margem resultante do negócio fechado. Na prática funciona assim: quanto maior o lucro do grupo com a venda, maior a comissão do vendedor. “Essa forma de agir força a gente a ser uma empresa bem transparente, 26 . Eurobike magazine
já que a outra parte interessada nas vendas terá acesso ao custo do veículo. Afinal, se o vendedor ganha sobre a margem, precisa saber o quanto aquele produto custa para a empresa”, diz o diretor. Segundo Visconde, a margem de lucro sobre veículos premium no Brasil é extremamente reduzida. A atenção ao vendedor vai além da conclusão do negócio. O treinamento é intenso, não só
para ajudá-lo na venda, mas para a fidelização de clientes por meio de uma posterior atenção personalizada. “Valorizamos o relacionamento pós-venda. O contato com os consumidores depois de 20 ou 30 dias, sempre amigável e sem forçar qualquer barreira, é essencial para sabermos sobre a satisfação com o produto, dúvidas, etc.”, diz Visconde. A relação com os clientes, sempre low profile, é a base do modo de ser da Eurobike.
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Ver a vida de outro jeito. Deixar que o vento dê a direção – quem precisa saber onde vamos parar?
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Sob a ótica de um bem-te-vi O fotógrafo Lalo de Almeida, com centenas de horas de vôo, autor de Nas asas do Correio Aéreo, experimenta a emoção de clicar o Range Rover Vogue a bordo da cesta de um balão POR HELOISA VASCONCELLOS | FOTOS LALO DE ALMEIDA
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Ao sabor do vento, o balão segue sua própria rota, sobrevoando belas fazendas em Orlândia. “Quem quiser que me siga”, parece brincar. Uma estradinha, um atalho, muita poeira, o carro some de vista. Um vôo rasante. De repente, o carro surpreende o fotógrafo bem de frente. Pura emoção!
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Range Rover Vogue, a certeza de Ir além POR PERCY FARO
LALO DE ALMEIDA
Em cada detalhe interno ou externo é possível perceber a dose extra de elegância e sofisticação que ele reúne para proporcionar o máximo em conforto e prazer em dirigir. Dono de estilo requintado, o Range Rover Vogue se impõe entre os concorrentes e faz diferença por onde passa. Muitos atributos que lhe garantiram forte personalidade, adquirida ao longo de vários anos de constante evolução, se espalham ainda por lugares que nem sempre os olhos enxergam. Estas são algumas das razões que explicam por que o modelo transmite ao usuário o real significado da filosofia mundial da Land Rover – “Ir além” (Go beyond, em inglês). É uma postura que a marca inglesa, às vésperas de comemorar 60 anos de idade, adota em suas ações, estratégias, produtos e no relacionamento com os clientes. Go beyond para a Land Rover significa superar limites, expectativas, buscar sempre o melhor. “Mas é ao volante do Range Rover Vogue que o motorista consegue ter a exata noção do que realmente é ir além”, afirma o analista de marketing da montadora, Gabriel Patini. Sob o capô, nas rodas, no câmbio e no chassi, por exemplo, se escondem conceitos de alta tecnologia desenvolvidos com o objetivo de levar ao mais exigente dos consumidores tudo aquilo que deseja e o que de melhor a moderna engenharia automotiva é capaz de disponibilizar no mercado automotivo internacional. E quando o questionamento se refere especificamente à segurança, desempenho e performance, o Range Vogue, de fato, vai além! Em sua categoria de utilitário esportivo ele justifica plenamente o título de “o mais completo do mundo” que carrega. Incorpora recursos ainda hoje desconhecidos por muita gente. A Venture Cam Land Rover, por exem-plo, é uma câmera de vídeo sem fios que transmite imagens em tempo real e em cores para o monitor situado no painel. Tem como principal missão facilitar as manobras de es44 . Eurobike magazine
tacionamento, especialmente em vagas com espaço reduzido. O equipamento tem raio de alcance de até 30 metros do veículo. Outra solução de avançada tecnologia são os faróis bi-xenon (lâmpadas claras de alta luminosidade), os quais reposicionam o faixo de luz de acordo com a direção e a velocidade do carro. O sistema trabalha a partir dos movimentos do volante e desta forma acompanha a trajetória do carro. Outro item de conveniência está nos espelhos retrovisores, que escurecem automaticamente todas as vezes que é detectada uma luz intensa vinda de outro veículo, o que amplia significativamente as condições de conforto e segurança do motorista. As marcantes linhas contemporâneas do
estilo externo do Range Rover Vogue que, dizem os experts em design, chegam a conferir movimento ao carro mesmo quando ele está estacionado, não se resumem apenas ao fator estético. O projeto da nova grade frontal que se caracteriza pela esportividade, por exemplo, levou em consideração também o desempenho, já que garante adequada ventilação ao motor. Externamente as rodas complementam a harmonia do visual singular do modelo. A versão HSE calça rodas de liga leve aro 20`` e pneus 275/40, e a versão SE, aro 19`` e pneus 255/50. O consumidor pode ainda levar o seu estilo para o carro, de acordo com o uso que faz do veículo, graças a uma série de acessórios desenvolvidos exclusivamente para o Range Vogue. “Para o off-road estão disponíveis, en-
CommandShift oferece a opção de troca de marchas seqüencial (sem o uso de pedal de embreagem, movimenta-se a alavanca do câmbio para cima para aumentar as marchas e para baixo para reduzi-las). Outra característica da nova transmissão é o fato de adaptar-se automaticamente ao modo de condução do motorista, maximizando o desempenho do veículo e reduzindo o consumo de combustível.
ARQUIVO LAND ROVER
No mundo do automóvel a identificação de um legítimo puro-sangue acontece por meio
ARQUIVO LAND ROVER
do DNA que está debaixo do capô. O Range Rover Vogue não foge à regra. A versão que incorpora um motor a diesel bi-turbo V8 possui a respeitável “cavalaria” de 272 cv de potência máxima a 4.000 rpm e torque de 640 Nm a 2.000 rpm. Trabalhando com duas turbinas no lugar de apenas uma, apresenta melhor queima de combustível, o que se traduz em economia e mais potência. “Não é por outra razão que o Range Rover Vogue é capaz de rodar até 800 quilômetros com um tanque de combustível, ou seja, algo como ir de São Paulo a Florianópolis, por exemplo, sem precisar reabastecer”, lembra Patini. A tração 4 x 4 é permanente, controlada eletronicamente. É um sistema que pode direcionar a potência do propulsor para as rodas de acordo com a necessidade em diferentes situações. O Range Rover Vogue é capaz de continuar se movimentando mesmo quando há tração em apenas uma roda. Já a transmissão automática de seis velocidades
tre outros, equipamentos como quebra-mato e snorkel; para o on-road é disponibilizado o kit Storm, que deixa a aparência externa ainda mais esportiva. Acessórios especiais garantem também uma perfeita viagem de longa distância e o transporte de cargas com total segurança a partir de soluções como barras de bagageiro e ganchos de reboque”, explica Gabriel Patini. Surpresas agradáveis igualmente acontecem a todo momento no interior do Range Rover Vogue. A sofisticação começa pelo acabamento em couro preto, bege ou marfim, dependendo da cor externa esco-lhida; prossegue com as várias posições de ajustes dos bancos e um sistema de entretenimento de última geração na parte traseira, que inclui rádio, CD, MP3, DVD player para 6 discos e TV, e telefone celular com conexão sem fio.
Oito airbags distribuídos pelo interior, sensores de impactos laterais em todas as portas, freios a disco com ABS e controle dinâmico de estabilidade, que garante extrema segurança em acelerações e curvas, são outros fatores que, aliados ao HDC (controle de descida), revelam a alta tecnologia empregada no modelo da marca inglesa. A partir do simples toque de um botão, o sistema HDC mantém constante a velocidade (inicialmente programada em apenas 8 km/h, mas que pode ser alterada se o usuário desejar) do veículo em declives e aclives acentuados. Quem pratica o off-road sabe da importância de evitar o travamento das rodas, a perda de aderência e do controle do carro pelo uso excessivo dos freios. O HDC permite que o motorista fique permanentemente concentrado apenas na direção.
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Em outras palavras, robusto, requintado e imponente. Como o autêntico cavalo purosangue inglês fez fama mundial, com o Range Vogue a Land Rover encarou e venceu o desafio de ir além!
Motor TD V8, comandos do HDC (controle de descida), rodas aro 20” com freios Brembo. Painel: Luxo e alta tecnologia
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Range Rover Vogue, para quem quer o melhor ARQUIVO LAND ROVER
POR PERCY FARO
As declarações do Diretor de Vendas e Marketing da Land Rover Brasil, Luiz Tambor, em entrevista à Eurobike magazine, explicam por que a marca inglesa é hoje líder em vendas de automóveis de luxo no Brasil. Eurobike magazine: Qual é o posicionamento do Range Rover Vogue no mercado? Luiz Tambor: O Range Rover Vogue é o SUV mais luxuoso do mundo, um produto incomparável. E agora, além do motor Supercharged de 400 cv, ele também está disponível com o novíssimo Turbo Diesel V8. Aliás, a Land Rover é a única marca no país a oferecer veículos de luxo a diesel. O Range Rover Vogue mescla a sofisticação de um sedã premium com a força e a robustez de um off-road. Seu acabamento interno é primoroso: revestimento em couro sensível ao toque, madeiras nobres, tapetes em lã natural e detalhes em aço inox. Uma sala de estar que conta com um completo sistema de entretenimento: sistema de som Harman Kardon Logic 7, 14 alto-falantes, MP3, TV digital, DVD player para 6 discos com telas
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“O Range Vogue é um veículo para os que querem somente o melhor”, “a Land Rover cresce no mercado brasileiro graças a ações estratégicas como as da Eurobike, um dos grupos que mais investe na marca”, “o sucesso de nossos veículos no Brasil é resultado de uma completa reestruturação da linha de produtos da marca nos últimos anos”.
LCD para os ocupantes do banco traseiro e uma tela de 7 polegadas no painel dianteiro, que auxilia a visão traseira, recebendo imagens de uma câmera exclusiva. Esta tela também serve à navegação por satélite e monitoramento do 4 x 4 em tempo real. O sistema de telefonia Bluetooth® é acionado por comando de voz, que ainda armazena dados e faz ligações. O Range Rover Vogue esbanja muita segurança, desempenho e tecnologia. Um veículo para os que querem somente o melhor. Eurobike magazine: Como a Land Rover vê a Eurobike na condição de concessionária, a atuação da empresa e sua importância para a marca no relacionamento com o consumidor? Luiz Tambor: A Eurobike é um dos grupos que mais investem na marca Land Rover no Brasil. Suas três concessionárias estão localizadas em alguns dos principais pontos de venda do país. Ela é a única representante da marca em mercados importantes, como o Rio Grande do Sul, e em duas das principais cidades do interior paulista, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto. Seu alto nível de atendimento e serviços já se tornou referência para as demais concessionárias da marca. Eurobike magazine: Qual é a posição da Land Rover neste momento no mercado brasileiro?
Luiz Tambor: A Land Rover é atualmente a marca líder em vendas no segmento de automóveis de luxo no Brasil. Projetamos fechar 2007 com mais de 3 mil unidades comercializadas, o que representa crescimento de mais de 50% em relação ao ano passado. Também planejamos manter esta liderança em 2008, e, para tanto, iremos continuar a crescer. Eurobike magazine: As metas iniciais da Land Rover Brasil já foram alcançadas. Quais as perspectivas futuras e como o consumidor brasileiro vê os produtos da marca? Luiz Tambor: O sucesso da marca é o resultado de uma completa reestruturação de sua linha de produtos nos últimos anos, suportada por um esforço de construção da Land Rover agora posicionada e consolidada no segmento Premium Off-Road. Este trabalho torna-se mais fácil, uma vez que poucas marcas têm uma herança com valores tão fortes e claros como a Land Rover nos 60 anos de vida que fizeram dela uma referência em veículos 4 x 4. Dessa forma, nossos clientes hoje vêem na Land Rover mais que um automóvel; vêem um estilo de vida, com o puro espírito de aventura, que é o principal valor da marca. Além destes, luxo, conforto e tecnologia também são valorizados por nossos clientes.
KITTY PARANAGUĂ
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prazer
Alguns traços em harmonia têm o poder de provocar felicidade. Ter olhos para sentir e coração para ouvir, isso é prazer
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prazer
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Design: fenômeno único de manifestação infinita POR VICTOR REBOUÇAS
Em A Arquitetura da Felicidade o filósofo suíço Alain de Botton sustenta, entre outras coisas, o conceito de que em um projeto de arquitetura ou de decoração se busca, aspectos semelhantes aos que se procura em uma amizade, e que a natureza do fenômeno está associada à nossa necessidade de mostrar ao mundo a forma como queremos ser percebidos. A partir desta sugestão feita por De Botton, surgiu a idéia de envolver alguns profissionais e tentar de alguma forma capturar, em suas sensações, a natureza deste fenômeno criativo, desta fagulha que provoca o surgimento de algo supostamente real, e que, entre tantas artes, produz desde uma maravilhosa dobradiça, um poema inesquecível, ou até um ambiente inteiro, acolhedor e generoso. A idéia exposta e defendida no livro de Alain de Botton em tese não chega a ser original, afinal, lá atrás no tempo, o homem primitivo dava seu primeiro passo rumo ao que
se pode considerar hoje um dos mercados mais importantes da economia mundial, e lançava-se a esculpir toscamente a pedra para criar uma grande variedade de objetos e instrumentos, sempre com o objetivo de defender-se e sobreviver, além de poder existir com mais qualidade de vida. Daí a provável relação da arte com a felicidade, pois que, para poder estar feliz, é fundamental estar vivo! E mesmo sem saber ao certo o que isso significava, o homem das cavernas agia nesta direção por puro instinto, a transformar o seu meio e ir além, como se soubesse instintivamente que um dia, em um futuro ainda longínquo, deixaria a caverna e caminharia rumo a habitar um maravilhoso e amplo apartamento na Avenue Champs Élysées, no coração de Paris. Voilá, quer mais felicidade que isso? E o livro tem mesmo os seus encantos, além de um valor histórico de real importância, porque Alain de Botton faz sua apresentação de forma única e exclusiva ao desfilar ao longo de uma linha do tempo séculos de
estilos, tendências arquitetônicas, com suas razões e significados, trazendo para a nossa consciência as relações existentes em cada uma e entre elas. Um pedaço da história da humanidade sob o olhar crítico e perspicaz de um jovem determinado a deixar a sua marca. Vale conferir. Neste passeio que faz a narrativa, nesta perspectiva sobre a arquitetura e suas diferentes escolas, nós, observadores de plantão, podemos perceber que de fato há algo em comum entre elas, algo atemporal que as une, como se pudéssemos assumir a existência de uma força divina que, apesar de estar inserida em contextos tão distintos, atua com determinada objetividade e provoca o homem na busca pela realização plena de seus interesses, em cada espaço, em cada peça, e em cada detalhe criado, projetado e produzido. Se quisermos estabelecer alguma aproximação com o fenômeno vamos perceber que em seu núcleo vibra uma intensa energia transformadora, capaz de dar forma física ou conceitual ao impulso
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prazer criativo, e assim, em uma sucessão contínua, sem limites, há séculos são produzidos milhões e milhões de objetos que consumimos definitiva e ininterruptamente. É interessante imaginar que provavelmente a mesma satisfação, ou se pudermos ser mais diretos, a mesma felicidade alcançada por um artista da Idade Média ao realizar sua façanha criativa, pode-se vivenciar hoje, séculos depois, quando folheamos um livro ou nos deparamos frontalmente com a peça criada e exposta em um dos milhares de museus espalhados pelo mundo, ou mesmo tocando em sua réplica. O fenômeno é contínuo e infinito, pois a arte, uma vez expressa, estará definitivamente viva e ativa. Ao decidir rondar este tema, com tanta subjetividade envolvida, não nos interessa uma discussão sobre as habilidades puramente técnicas do fenômeno criativo, mas sim aquela em que o criador é obrigado a incluir todo o seu conhecimento, as sensações novas, as preexistentes, e também a sua capacidade de conectar-se ao inconsciente coletivo para capturar, sabe-se lá onde, a inspiração que executa e produz a maravilha. Até porque nada pode ser concebido sem que se leve em consi-deração tudo o que já foi pensado, rea-lizado e até mesmo sonhado. E, sendo assim, o ato de criação, apesar de solitário, carrega em si, em seu mais íntimo instante, a história do conhecimento da humanidade inteirinha. Tudo ao mesmo tempo, vibrando concomitantemente. Um projeto de paisagismo, apenas como exemplo, carrega em sua concepção todos os jardins que já foram feitos pelo homem, da mesma forma que não se pode conceber um poema sem estar conectado a tudo o que já foi escrito, pensado e falado. Pois tais vibrações permeiam o inconsciente, que inspira e conspira, para todas as direções, genuinamente. Talvez por esta razão o Velho Guerreiro afirmava que “Nada se cria,
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tudo se copia”, em uma clara alusão a este fato óbvio e evidente, pois somos os únicos herdeiros de nossa própria história. Os profissionais convidados para este singelo ensaio foram objetivos e sinceros em suas posições, uns direta, outros indiretamente; uns naquele tradicional cara a cara, outros pela própria história e importância, o que facilitou imensamente o acesso a um vasto material reflexivo e permitiu que esta matéria pudesse acontecer de certa forma até surpreendente. Características diversas, visões complementares, meios opostos na exploração dos materiais, estilos distintos, mas curiosamente um mesmo objetivo, tal qual cursos d’água diferentes que acabam, após seus percursos particulares, encontrando-se na imensidão do mar. Podemos afirmar que todos, sem exceção, são construtores de felicidade. O comemorado designer Sergio Rodrigues é responsável direto pela identificação do nosso país no concorrido cenário mundial do design mobiliário. Profissional que exerce grande diferencial criativo com suas peças, tem dedicado grande parte de seus 80 anos de vida, recentemente festejados, à renovação da produção mobiliária brasileira. Além disso, atua fortemente através de um desenho personalíssimo e da sensível escolha de madeiras nativas, uma de suas marcas notáveis. Isay Weinfeld, sempre atual, é arquiteto, professor, designer de interiores, cenógrafo, cineasta, produtor cultural, enfim, um ser antenado na produção de espaços genuínos e generosos. Um crítico voraz das interferências da modernidade no contexto urbano, detentor de uma marca expressiva de projetos instalados no Brasil e no exterior, enfim, um verdadeiro ativista na arte de provocar ambientes. Pedro Useche, uma das boas revelações dos anos 1990, este harmonioso e dedicado arquiteto pela Universidade
Central da Venezuela, é músico autodidata e multiinstrumentista, exímio designer, pesquisador dos limites funcionais dos materiais e que vai se tornando, com o passar dos anos, autor indiscutível de um dos maiores pa-trimônios mobiliários executados em nosso país. Todos excepcionais artistas, embora Useche renegue este título, provocadores da felicidade, segundo De Botton, e que representam, de certa forma, gerações distintas, unidos pelo mesmo interesse de produzir ambientes cada vez mais aconchegantes, seja pelos detalhes da obra, seja pela ousadia, seja lá pela busca contínua que exercitam em suas pranchetas. E a primeira nota harmônica deste batepapo vem exatamente do exigente Pedro Useche que, em um momento da nossa conversa, falou com intensidade sobre a presença da música em seu processo criativo, como se fosse essência pura a determinar os rumos de seus traços na busca pela excelência da relação entre o objeto desejado e o material escolhido para a sua produção. Pedro sugere algo como a aproximação bem-vinda com uma “energia divina”, quando pode perceber em sua produção o sonhado equilíbrio formal e estético, o que o faz vivenciar uma felicidade imensa e a satisfação suficiente para servir-lhe de incentivo a novas buscas em outras viagens. Estas são confissões diretas sobre a presença do fenômeno no instante em que ocorre, exatamente como pretendíamos antes de iniciar este processo. Quem pode imaginar, observando, por exemplo, uma simples cadeira, quantas interferências externas, por vezes distantes daquela natureza, existem em sua constituição formal? São inúmeras! Seja a música inspiradora, a visão de experiências anteriores sobre conforto, a paisagem ou o ambiente onde ela está sendo concebida, as milhares de outras cadeiras já inventadas, tantas outras inspiradas e ainda não realizadas, o material escolhido, ufa!, isto sem enumer-
Na conversa com Isay Weinfeld, sobre enquadrar de forma mais tangível o conceito de design, surgiu um vôo mais ousado e muito bem-vindo para este momento de matéria, pois afirmou o arquiteto se tratar de fenômeno único a se manifestar de forma distinta em vários setores das artes e da produção cultural. Weinfeld chegou mesmo a concretizar a idéia de que, caso tivesse seguido outro caminho, entre tantos que trilhou, teria chegado ao mesmo lugar, ao mesmo
tempo, pois tudo acaba sendo, segundo a sua visão, resultado de um mesmo processo e de uma mesma inquietude na busca da satisfação pessoal. Fez alusões múltiplas sobre sua certeza de que teria atingido o mesmo patamar alcançado na arquitetura, citando a poesia, a escrita e o cinema, deixando de maneira objetiva uma garantia de que teria de fato tocado o ponto mágico que vem merecendo pelo exercício de sua profissão. Para ele não existe diferença entre desenhar a fachada de um edifício ou uma armação de óculos, e chega ao ponto de assumir que dever-se-ia pagar o mesmo valor pela criação de ambos. Afinal, é o valor da criação! Isso reforça a idéia de que o fenômeno criativo é de fato único, apenas a procurar seu veio específico para a manifestação.
As razões que levam um artista, ou profissional, a perseguir seu impulso e atingir a conexão com a ação realizadora podem nascer de diversas maneiras e terem distintas origens. Passa por aqui a necessidade de atender a uma expectativa do cliente, no caso de um projeto arquitetônico, tanto quanto coexiste a necessidade de investigar materiais e suas resistências, até a necessidade de manifestar uma indignação, uma repulsa, ou mesmo uma posição sociopolítica. Sobre este aspecto do processo criativo, Isay Weinfeld faz uma observação, se não inesperada, totalmente desejável, ao afirmar ser o cliente, em seus instintos, sonhos e necessidades, o verdadeiro merecedor de toda a atenção, tomando para si um papel
O Brasil refletido nos materiais e no potente design de Sergio Rodrigues KITTY PARANAGUÁ
armos a mescla de sentimentos e emoções presentes no criador, a determinar seu movimento! E isso tudo misturado é o que pode provocar a sensação de felicidade prometida na visão de Alain de Botton e que estamos perseguindo.
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prazer
Se exigimos conforto, existirá conforto! Se pretendemos atitudes criativas com posicionamento político, elas estarão ao nosso lado! E se por diversão quisermos a irreverência como conceito, prontamente ela estará aos nossos pés! A arte sempre executa o pensamento e o desejo coletivo! É natural! Quem, em sã consciência, diante daquela Espanha em plena guerra civil, após o bombardeio da cidade de Guernica, em 1937, com centenas de mortos e feridos, não desejou manifestar sua indignação e sua repulsa aos atos de barbárie contra o patrimônio humano e ambiental? Pois este desejo se manifestou na explosão criativa de Pablo Picasso, em seus maduros 56 anos de vida, e este movimento do pensamento coletivo provavelmente foi o que inspirou seus instintos artísticos a produzir uma de suas mais importantes obras, que leva o nome da cidade atingida. Entre faces e membros destronados de seus equilíbrios e de suas dignidades, em súplicas expressas de forma contundente, diante de outros seres irracionais, armas, luzes, enfim, ali estava o grito que jazia contido na garganta de toda uma civilização. E, mais uma vez, éramos nós ali a provocar e a inspirar o artista naquela criação. Somos, de fato e de direito, cúmplices de tudo o que nos representa, pela simples razão de que naturalmente fazemos parte desta engrenagem, sem a qual nada aconteceria. Há momentos na definição de um projeto que podem estar ligados a mais de um fator 54 . Eurobike magazine
(www.mcescher.com), uma expressa falta de lógica e prumo, e haverá de existir quem também perceba a possibilidade de estar diante de uma imensa crítica social quanto ao caminhar de uma sociedade cada vez mais dependente do progresso, representado ali pelos degraus que, em muitos casos, chegam mesmo a desafiar as leis da física, em uma provável chamada à consciência. Não chega a importar agora as razões reais que pudessem justificar a manifestação do artis-
FÁBIO HEIZENREDER
secundário, como mero executor do projeto. Entretanto, é definitivo em assumir não fazer e nunca ter feito qualquer concessão que pudesse desmerecer sua visão sobre a realidade a ser projetada. Esta afirmação vem de certa forma nos prestigiar, ou seja, o consumidor que cada um de nós representa e que poderia estar se sentindo à margem dos processos, vítima de uma conspiração alheia; ao contrário, também temos parte nesta história. Somos co-autores de tudo o que é concebido!
reativo, sendo, desse modo, mais interessante a contemplação da obra executada, exatamente pelo fato de que haverá quem imagine uma determinada razão, e quem imagine outra bem distinta para justificar o mesmo fato. Apenas a título de curiosidade, capturamos do grande acervo artístico uma litogravura superfamosa chamada “Relativity”, de Maurits Cornelis Escher, artista gráfico holandês que viveu no século passado. Ele dispõe em um cenário interessante, ex-
As ripinhas unidas, jamais serão vencidas! Ousadias de Pedro Useche
terior e interior, uma sucessão de escadas e degraus totalmente fora de lógica, sem respeito a plano nenhum. Pessoas caminham sobre eles apenas fazendo-se valer de sua visão libertária sobre o destino da humanidade, por vezes completamente improvável. Há quem veja nessa obra, facilmente localizável no site oficial do artista
ta, a não ser o fato de que, além destas duas interpretações, uma dezena de outras seria possível, bastando para tanto que houvesse outros críticos. E mais uma vez nos deparamos com a presença do inconsciente coletivo a manifestarse, ditando rumos, tendências e caminhos na produção dos símbolos que compõem a nossa vida. É atribuída a Sergio Rodrigues,
um dos maiores designers brasileiros, a frase “Ninguém cria sozinho. Nenhum móvel que fiz poderia ser executado por mim”, em uma clara alusão ao fato de que o processo complexo da criação necessita, por natureza, da participação ativa de outros atores, direta ou indiretamente, objetiva ou subjetivamente, o que contempla a idéia da presença coletiva no projeto realizado.
Mas tudo pode ser diferente quando verificamos, em outro exemplo dado pelo próprio Isay, a busca pela forma que parte de uma necessidade independente do pedido formal
ROMULO FIALDINI
Isay Weinfeld, durante a reflexão sobre as
a vontade que o meu cliente tem de viver em um espaço que ele quer, e que eu vejo!”. Assim ficou bem colocada a questão, pois se trata de um processo criativo na busca de uma identidade determinada, sob a influência de uma contratação.
trário, queria algo que tivesse a ver com o espaço projetado, sob os mesmos critérios e sob a mesma filosofia. Tempos depois ficou sabendo que uma jornalista americana, de passagem por São Paulo, teria citado o tal cinzeiro em uma pequena matéria escrita por ela, com o objetivo de reforçar que naquele lugar até os pequenos objetos eram objetos de arte. Isso serviu, segundo Weinfeld, para reforçar ao cliente, que já entendia do assunto arte, que quando se investe na criação de alguma coisa não importa o tamanho, em algum lugar do mundo alguém vai perceber, vai se emocionar e vai oferecer seu tempo a falar, a pensar ou mesmo a escrever sobre o objeto. E, apesar de ser difícil imaginar alguém emocionado com um cinzeiro, é para cada uma dessas pessoas que ele se dedica em suas criações, sem exceção. Há ainda um aspecto bastante interessante que também pertence ao processo criativo, mas que abre mão das qualidades funcionais do objeto projetado para exibir outro atributo. O de ser belo! E não precisamos olhar muito “Adepto Foodencontrar pilota o fogão. distante de de Slow nós para um bom exDe preferência a lenha, coma cozimento emplo. Em certos casos, beleza agrega lento.” mais valor ao objeto que sua própria funcionalidade. Observamos, desejamos, compramos e não usamos! Mas é tão bonito! Um garfo, por exemplo, que fosse estilizado para ter apenas três dentes, poderia gerar forte interesse pelo seu design ou mesmo pela Toninho Mariutti ousadia. Mas você imagina quantos grãos de arroz poderíamos equilibrar sobre ele?
Elegância e obediência! Na visão de Isay, um bar que vai onde você estiver!
duas perguntas a que deveria responder, situou muito bem a função social que deve ser exercida pelo profissional contratado, e citou a questão do respeito que deve existir pela pessoa e pela família que vai viver no espaço que se vai projetar: “Minha postura é de educação e de respeito a quem eu vou servir”; “Devo ser o arquiteto-servidor, e fazer exatamente o que o cliente quer, porém da minha forma”. E completou: “Devo respeitar
de um cliente. Isay contou um caso interessante no qual teve de assumir uma responsabilidade não contratada, ao se ver provocado a desenhar um cinzeiro cuja função seria estar em um ambiente de degustação de charutos em um dos bares executivos mais badalados da sociedade paulistana. A razão disso é que não queria ver no ambiente criado e decorado por ele um cinzeiro qualquer escolhido em uma loja da cidade. Ao con-
Nossos entrevistados com certeza concordariam com o fato de que a função principal do que se está projetando deva ser inegociável! E diriam: “Uma poltrona que convida você a sentar-se gentilmente e lhe chama para acomodar-se cumpre sua principal função, e é para isso que serve o design...”. Por conta desta questão, lembrei de uma viagem à Espanha, no começo dos anos 1990, onde descobri em uma farmácia em Madri um expositor de balcão com estranhas e interessantes escovas de dentes. Seu design compunha um corpo principal, no qual estavam as cerdas naturais, em forma oval, como se fosse uma gota de água repuxada. O material era uma resina translúcida, em um tom de opaco violeta. Foram imediatos
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M.C. Escher’s “Relativity” © 2007 The M.C. Escher Company-Holland. All rights reserved.
prazer
M.C.Escher propõe seus personagens em planos conflitantes, talvez uma crítica à sociedade e seus desejos de ascensão a paixão e o desejo de possuí-la! Mas havia o preço a fazer imensa resistência! Algo em torno de 45 dólares!!! Quando consegui desgrudar meus olhos daquela maravilhosa escova, li no cartazete do expositor que se tratava de uma peça exclusiva de um dos mais festejados designers de nossa época, um francês chamado Philippe Starck. Era o que bastava para tornar aquele preço abusivo em algo absolutamente aceitável.
Nas escovas de dente de Philippe Starck, o design que motiva a função principal do objeto
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Na contramão desta experiência podemos encontrar pelas mais significativas feiras internacionais de design peças belíssimas, objetos premiados de todas as naturezas, mas que abrem mão de suas principais funções, como garantir o conforto, o prazer, a segurança, enfim, o seu propósito funcional. Inspiram a nossa atenção sem, entretanto, nos convidar para uma convivência mais
íntima. Isay Weinfeld se adianta e é taxativo ao repugnar este padrão! E afirma: “Nossa produção tem a obrigação de atender principalmente aos interesses de quem vai usar o produto, ou viver no ambiente do projeto criado. E nisso discordo totalmente do que prega Oscar Niemeyer, quando afirma exatamente o contrário”. E a conversa sobre este evento chamado design poderia ter seguido ainda muito longe, quer por sua amplitude, quer por sua definição tão abrangente. Mas, para a minha surpresa, culminou com uma verdadeira pérola de Pedro Useche, que afirmou ter encontrado em anos de pesquisa apenas um exemplo de design verdadeiramente brasileiro. Algo com a cara do Brasil e que em qualquer parte do mundo nos repre-sentaria com extrema qualidade. E quase de imediato lançou as sandálias havaianas como nossa candidata única. Foi um choque! Mas, diante desta inesperada informação, ficou muito mais fácil entender por que Alain de Botton garante, em seu livro A Arquitetura da Felicidade, ser o design o portal através do qual se pode acessar o prazer de viver! Quer experimentar esta sensação? Primeiro feche os olhos e pense nas suas sandálias havaianas! Isso, vamos lá, imagine-as em seus pés, ok? Pronto! Agora basta se lembrar dos lugares que você freqüenta e com quem está quando isso ocorre! Existe felicidade maior que essa?
CAROL DA RIVA
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devaneio
Longa é a noite Eterna do tempo Breve é a curta Existência da vida Viver não é preciso Viver é delírio É devaneio É fora da estrada do tempo
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devaneio
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Viagem às nascentes do Velho Chico A cachoeira Casca d’Anta, a beleza do cerrado, a simpatia da gente mineira. A bordo de um XC 90, por caminhos de terra antes pouco trilhados, desbravamos os segredos da Serra da Canastra, o berçário das águas do rio São Francisco POR EDUARDO PETTA | FOTOS CAROL DA RIVA
Silêncio e negro asfalto. O Volvo XC 90 flutua com o motor V8 nos limites da velocidade permitida. Rumo: Serra da Canastra. Da capital paulista até Mococa, um mar de cana, rodovias sem percalços de uma terça-feira de sol. Finalmente, o sul de Minas Gerais: buracos e pista única. Experimento o motor para ultrapassar em segurança. Seis horas e 480 quilômetros depois, Delfinópolis ao cair da noite.
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devaneio
O centro de informações está aberto.
não veio. Curvas se sucedem, rochas
Mostro o mapa. Planejei o óbvio: cruzar
sobre rochas sobrepostas. O XC 90 vai
Dormimos cedo e acordamos com
o Parque Nacional da Serra da Canas-
adquirindo uma segunda pele, feita de
o canto dos pássaros. Uma volta pela
tra por Sacramento. Atencioso, o se-
pó, e se mimetiza com o meio, enquan-
pequena cidade de janelas coloniais,
nhor Edinho nos mostra as fotos de um
to desloca a carroceria musculosa. O
e pausa para pedir a bênção na igreja
caminho alternativo, “pela Serra Bran-
calor aumenta, sugiro cachoeira. “Tem
matriz. “Bem-vindos à minha cidade”,
ca”, longe do mundaréu de cana-de-
mais de cem”, diz Elves. E nos leva à do
diz José Leite, simpático senhor a pou-
açúcar que domina a paisagem. “Estão
Luquinha. De alma lavada, voltamos à
cos dias de completar 80 anos. “Sou de
de 4 x 4?”. Aponto o nosso carro, ele
estrada. Tudo é tão bonito que lembro
1927”. Coincidência, o mesmo ano em
liga para um guia. “É fácil se perder”. O
Eça de Queiroz: “O caminho mais curto
que nasceu a Volvo na Suécia. O se-
guia Elves (com “e” mesmo) sobe a bor-
entre dois lugares não é a linha reta, é
nhor está bem conservado. “São os
do. Seu pai era fã do cantor? “A cidade
a volta distraída”. E distraídos vamos
ares. O tempo aqui passa devagar”.
inteira era”.
transpondo porteiras, fazendinhas e serras.
Respirei fundo. Ar puro. Parada para o café. “A pressa é inimiga da refeição”,
E então partimos. Para a terra, para
o slogan do restaurante do Simões. Seu
o pó, no fio do dia sem nuvens e sem
De repente, porteira fechada. O guardião
cardápio fumegante: leitão pururuca,
azul no horizonte, esfumaçado pela
da chave, sorriso aberto, Zé do Agenor.
torresminho, tutu de feijão, frango cai-
massa cinzenta da queima da cana.
“Agenor é meu pai”. Aqui, todo mundo
pira, lombo, lingüiça, costelinha. “Não
Meados de outono, auge da seca, e os
é alguém de alguém. O nome do pai
faço milagres. Faço comida boa”. Mas
galhos retorcidos do cerrado parecem
vale mais que sobrenome. Zé é “faze-
são sete da manhã.
implorar aos céus pela chuva que ainda
dor de queijo”, e conversa sem parar
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de trabalhar. Filhotes de cães brincam, ele derrama o leite. Depois mostra os queijos: “fresco, meia cura, curado”. Queijo canastra, tradição portuguesa trazida há 200 anos da Serra da Estrela. De domingo a domingo, na lida com o gado, os dias do Zé são sempre iguais: ordenhar as vacas, produzir o queijo. “Vaca não tem feriado. Nem eu”. Seu Zé tem oito filhos. O mais velho, 36 anos; o mais novo, três. Suas mãos trabalham a massa, formatam a peça. Seu Zé, 58 anos, é empregado. Cuida de 14 vaquinhas e só vai à cidade de três em três meses. “Não tenho TV porque não quero”. A luz chega à sua porta. Já vamos, Zé. “É cedo”. Abraço, Zé. Prosseguir. A estrada pontilhada de canelade-ema. Seu verde brilha acima de todos os verdes, mas a flor lilás ainda não desabrochou. Pena! Mas a flor da íris vermelha brilha sob o sol. Sorte! Sobe a Serra. Agora o altiplano, mil metros de altitude, campos rupestres, desafio de pedras e crateras no chão. Chão que muda de cor a todo instante, ora preto, ora amarelo, várias vezes branco, a cor da serra. O que não muda é o deserto humano. Em todo o dia, apenas uma moto cruzou o nosso caminho.
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devaneio O XC 90 não dá sinais de fadiga. E me deixa absoluto ao presente: subidas íngremes e descidas abruptas. Os olhos grudam na paisagem insólita de jardins de pedras com pequenos arbustos que parecem bonsais. Muros de rochas vão além do horizonte, no silêncio da serra recortada de tantos caminhos. Parece a vida. Qual caminho tomar? O sol vai se pôr. Acelero até o mirante da igreja, no vão da Canastra. A fumaça da cana vem de longe e empresta a tonalidade rosa ao sol. Um gavião cruza o astro, suas asas resplandecem. O Parque Nacional diante de nós, do outro lado do vale, com paredões imponentes. Imenso berçário das águas em forma de baú, de canastra, cesta larga que carrega o essencial, as nascentes do São Francisco. Essencial foi dormir em São José do Barreiro, 290 habitantes. As acomodações são simples, mas o aconchego humano compensa. Ao raiar do dia, Atala, a dona da pousada, nos serve café preto com pãozinho de queijo. Mais queijo, doce de leite e outros quitutes. Vou engordar. Atala e seu marido Orlando são os primeiros moradores por onde passa o rio São Francisco. A casa deles está a apenas dois quilômetros da Casca d’Anta, o primeiro salto do velho rio. Vamos a ela: um ingresso na porta-ria, três reais; uma trilha, 30 minutos. Agora, olhar: 186 metros de queda, quase 30 me-tros de véu. Mesmo em tanta secura, a água da grande cachoeira não pára de bombear. Seu lago esverdeado, umidade absoluta, sob eterna chuva de gotas. Depois dali, lá vai o velho Chico serpenteando sertões, na longa jornada de quase 3 mil quilômetros até o oceano. O rio é uma cobra: a cauda na chuva e a boca no mar, na foz, entre Alagoas e Sergipe, onde foi “achado” pelo florentino Américo Vespúcio em 4 de
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outubro de 1501, dia do santo que lhe deu o nome. Rio peregrino, nasce e deságua em verdes cores a apenas 14 quilômetros da Casca d’Anta. É o maior rio totalmente brasileiro. Os índios o chamavam de opará, o rio-mar. Mas o que me espanta é essa queda, com tanta água a escorrer pelo paredão. Bate o vento e dança o véu da Casca d’Anta. Venta pra cá, lá vem o véu. E o véu pra lá, quando pra lá venta. A massa de água que despenca às vezes desce ligeira como meteoro, parece uma estrela cadente. Por outras, desce lenta, abrindo em leque, feito pára-quedas. O lago não é para se banhar. É fundo, perigoso. A água é gelada, turbulenta. É lago para devaneios. Mas o São Francisco é generoso. Basta ir um pouco além das quedas para colher suas águas em refrescantes piscinas naturais. Da portaria da Casca d’Anta até Vargem Bonita a estrada de terra ladeia o velho Chico e tem como cenário de fundo a serra que os nativos chamam de Chapadão, talvez o trecho mais poético da Canastra. Ao chegar em Vargem Bonita acaba a terra, o sonho, e começa o asfalto, a concreta realidade. Na primeira ponte o rio já aparece assoreado, com cicatrizes dos tempos do garimpo que existiu até 1989. O destino agora é São Roque de Minas, 8 mil habitantes e 800 propriedades rurais famosas por produzir o melhor queijo canastra do Brasil. É a cidade mais perto da Portaria IV do Parque Nacional. Prazer, São Roque.
“Arranca suspiros e intervenções de admiração de todos que se encontram com tal capricho dos deuses”. Auguste de Saint-Hilaire, naturalista francês, em Viagem às nascentes do rio São Francisco, ao avistar a Casca d’Anta em 1819.
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devaneio
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E boa noite. Nos vemos amanhã. Hoje o projeto é dormir cedo. E amanhecer no Parque. Quatro e trinta toca o despertador. Carol diz que não. “É um galo. Dorme”. Confiro no relógio. Quatro e trinta. A cama está quentinha, mas o céu repleto de estrelas promete. “Deus ajuda quem cedo madruga”. Em menos de meia hora (5,5 quilômetros de chão) estamos na Portaria IV. Uma autorização prévia (o Parque só abre às 8 horas) nos permite entrar e procurar um mirante para ver o dia nascer e tingir os chuveirinhos de dourado. A chance de avistar um animal nesse horário é boa. Apesar da semelhança com as savanas africanas, o cerrado esconde outros bichos. Não há aqui os elefantes, os rinocerontes, as zebras e os leões. Mas temos o tamanduá-bandeira, a onça-parda, o tatu, o veado-campeiro, as emas e as seriemas, o pato-mergulhão e, ainda, o curioso loboguará, quase todos eles em via de extinção. No safári à moda brasileira, nosso saldo da manhã: uma perdiz, duas corujas, várias espécies de gavião, alguns tucanos e, aleluia, um mamífero comedor de formigas e cupins, o tamanduá. Toda essa fauna está protegida desde 1972, quando foi criado o Parque Nacional da Serra da Canastra, com 71.525 hectares. Uma paisagem feita de escarpas, falhas, rochas e paredões, esculpida pelo vento, pelas chuvas e pelos rios durante milhões de anos. Um processo geológico que ao terminar foi forrado pelos mais diversos tipos de vegetação de cerrado, um paraíso da biodiversidade marcado por plantas e arbustos baixos, espinhosos, de folhas peludas e flores mil. Solo marcado por ranhuras, entranhas e brejões de onde jorram nascentes aos borbotões. Uma abundância de águas que nascem próximas, na serra, mas logo dividem seus rumos: parte vai abastecer a bacia do São Francisco, parte vai para a bacia do Paraná. Endereços
distintos,
trajetos
comuns: Eurobike magazine . 69
devaneio descer os paredões da Canastra em dezenas de cachoeiras, muitas delas com mais de 100 metros de altura. As mais belas: Rolinhos, Capão-Forro, Cerradão, Antônio Ricardo, e a preferida dos guias nativos, a do Fundão. O nome justifica. Fica no cafundó do Parque, longe que só. Mas vale o esforço ver seu lago de águas turquesa, repleto de lambaris, receber a grande queda do Fundão. Último dia. Amanhecer na roça. Cabeça de vaca pendurada no curral para tirar mauolhado, cata-vento, pés de café, galinhas, pintinhos, galo, cavalo, boi, vaca, gato, cachorro preguiçoso. Muuu, cocoricó, piu-piu. Onomatopéica fazenda rasgando o silêncio da manhã. Com as mãos nas tetas das vacas, Zé Mário Baltazar Silva, 60 anos, e seus filhos, Car-
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los e Eudes, passam a manhã ordenhando. O leite sai em jatos quentes (38 ºC) e preenche o vazio dos baldes prateados. O bezerro fica com a sobra, e suga esfomeado a teta da vaca. A matriarca da família, Dona Valdete, de galochas, luvas e gorro, aguarda em um cômodo azulejado (como manda o Ministério da Saúde) a chegada dos baldes prateados para juntar o coalho ao leite. Mistura, mexe e espera. O tempo é o melhor ingrediente do queijo. O sol esquenta. Dona Valdete acende o fogão a lenha, separa o feijão, dá milho às galinhas. Os canarinhos-da-terra e os pássaros-pretos se aproveitam da sobra e depois se empoleiram na cerca para cantar. Desde quando você faz queijo, Zé Mário? “Uai, eu já nasci debaixo de vaca”. Em 2004 ganhou o primeiro lugar na festa do queijo canastra. Esse ano ficou em quarto. “A vida bagunçou. Minha caçula era o esteio da casa. Casou e mudou. É triste demais da conta”. Zé Mário
lamenta a erosão familiar, os olhos marejados. Dona Valdete disfarça a saudade. Chama as vacas pelo nome: Farrinha! Ela olha. Lavoura! Ela vira o pescoço, levanta as orelhas. Para Zé Mário não há de ser nada, não. “Enquanto tiver forças, vou fazer o meu queijo. Amo essas vacas. Se o povo fosse bom de lidar que nem gado, o mundo era o céu”. Meio-dia, queijos prontos. Lufada de comida mineira no ar. Dona Valdete ajeita o almoço, Eudes leva as vacas para o pasto, Carlos limpa o curral e Zé Mário arruma seus “trens”. Tudo na plácida rotina da fazenda tem o seu tempo. O XC 90 está parado na garagem da casa centenária, ao lado do fusquinha do Zé, de outros tempos. A família Baltazar Silva passará a tarde em seus afazeres na roça. Para nós, é tempo de regresso. Vou tentar ir sem pressa, no sereno tempo mineiro de pilotar a vida.
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devaneio
Informações Turísticas Parque Nacional da Serra da Canastra Visitação: das 8h às 16h. Fecha às terçasfeiras. R$ 3 por pessoa. Bem sinalizado, a maior parte das atrações é acessível por veículos de passeio. O Parque possui quatro Portarias: I – São José do Barreiro; II – Sacramento; III – São João Batista; IV – São Roque de Minas. Ibama: (37) 3433-1195 Parte Alta – sede (Portaria IV): Está a 5,5 km de São Roque. Visite a nascente do São Francisco, a parte alta da Casca d’Anta e a cachoeira dos Rolinhos. Para a cachoeira do Fundão é preciso guia e carro 4 x 4. Parte Baixa – (Portaria): Está a 18 km de São José do Barreiro. Trilha de 30 minutos até a Casca d’Anta. Recomendamos guias para qualquer percurso na parte alta. Como chegar: Saindo de São Paulo, pegue a Bandeirantes, a Anhangüera no entroncamento, e siga para o anel viário de Campinas. Dali siga para Mogi-Mirim, Casa Branca, Mococa e São Sebastião do Paraíso. A partir daí, quem vai a Delfinópolis deve seguir por Cássia. E quem vai a São Roque de Minas, por Passos e Piumhi.
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Delfinópolis Onde ficar: Pousada Rosa dos Ventos: (35) 3525-1358 Centro de Apoio ao Turista: (35) 3525-1662 Existem mais de 100 cachoeiras catalogadas na região. A travessia de Delfinópolis até São José do Barreiro pela Serra Branca é imperdí-vel, mas é necessário um guia experiente. Na época das chuvas recomenda-se também um carro de apoio. São Roque de Minas Onde ficar: Pousada Barcelos: (37) 3433-1216 (peça o quarto Master) Agência de Turismo: Tamanduá: (37) 3433-1452 Vargem Bonita Onde ficar: Fazendinha da Canastra: (37) 3435-1111 Dicas do Editorial: Todas as pousadas da região são muito simples, mas com atendimento hospitaleiro. O Restaurante Girassol, em São Roque, faz boa comida mineira.
A Fazenda Agroserra [(37) 3433-1214], a 2 km de São Roque de Minas, tem visitação e venda do queijo canastra. Novembro e dezembro são meses de chuva forte. As estradas de terra ficam precárias, mas pode pintar arco-íris no céu. Pontos altos da viagem: O pôr do sol no alto da Casca d’Anta e a própria Casca d’Anta vista de baixo. A travessia pela Serra Branca. O mirante da Igreja em São José do Barreiro. A cachoeira do Fundão. A produção do queijo canastra. E a sensacional simpatia mineira.