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OPINIÃO
PORTO ALEGRE, 22 DE FEVEREIRO A 8 DE MARÇO DE 2019
CHARGE | Santiago
ARTIGO | Cidade para quem? Gilberto Cardoso de Aguiar e Suelen Aires Gonçalves (*)
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Rir será nossa vingança
nde começa a política e termina o Carnaval? Difícil saber no governo Bolsonaro. Por isso mesmo, houve uma irrupção espontânea de marchinhas carnavalescas em 2019, estimuladas pela atmosfera circense que tomou conta do Brasil com a posse da nova gestão. A musa dos compositores e compositoras que inundaram as redes sociais com sua graça é o realismo fantástico da gestão mais mambembe, grotesca e boçal da história da República. É o que estamos mostrando nesta edição. Ao longo das décadas, o Carnaval sempre zombou dos poderosos, fossem de esquerda, centro ou direita. Mas dificilmente qualquer um deles inspirou tanto a veia satírica quanto Jair Bolsonaro, suas ideias, seus filhos, seu partido, seus assessores, seus ministros, seus aliados. Seu governo é um saco de risadas. A inexperiência da tropa que desembarcou em Brasília converteu-se em combustível de alta octanagem para o humor nacional. Para www.brasildefato.com.br redacaors@brasildefato.com.br (51) 99956.7811 (51) 3228-8107 /brasildefators @Brasil_de_Fato
tanto, tudo colabora. O despreparo incapaz de enfrentar questões elementares, a predisposição à autofagia, a ignorância, o conservadorismo, as tropelias, as escolhas estapafúrdias na montagem do ministério que ostenta uma penca de processados. A convivência do presidente e seu clã com laranjas e a proximidade das milícias atiçou ainda mais o deboche. Além disso, um governo de militares, neoliberais e evangélicos, todos fundamentalistas, é uma tentação e tanto. Autoritários – todos sabemos – são um prato cheio para os espíritos livres. Nada disso, porém, oculta as dificuldades pela frente: o assalto aos direitos dos assalariados, o sequestro da previdência, a educação atacada, a saúde combalida, o meio ambiente agredido, as chacinas sob proteção legal. E a necessidade de combate à agenda medieval. Mas é Carnaval e ainda temos o direito de zombar do opressor. Rir será nossa vingança.
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CONSELHO EDITORIAL Danieli Cazarotto, Cedenir Oliveira, Fernando Fernandes, Ezequiela Scapini, Ronaldo Schaefer, Milton Viário, Frei Sérgio Görgen, Ênio Santos, Isnar Borges, Cláudio Augustin, Maister Silva, Miriam Cabreira, Fernando Maia, Jonas Tarcísio Reis, Rogério Ferraz, Adelto Rohr, Fábio Castro, Mariane Quadros, Carlos Alberto Alves, Daniel Damiani, Vito Giannotti (In Memoriam) | EDIÇÃO Katia Marko (DRT7969), Marcos Corbari (DRT16193), Ayrton Centeno (DRT3314) e Marcelo Ferreira (DRT16826) | REDAÇÃO NESTA EDIÇÃO Ayrton Centeno, Maiara Marinho, Eduarda Schein, Marcos Corbari e Marcelo Ferreira | DIAGRAMAÇÃO Marcelo Souza | DISTRIBUIÇÃO Alexandre Garcia | IMPRESSÃO Gazeta do Sul | TIRAGEM 25 mil exemplares
O que leva à falta de investimento público nas periferias? Assim é Porto Alegre, capital com déficit de 75 mil novas moradias e, simultaneamente, com 48 mil imóveis vazios. A POIO
EDITORIAL |
que leva um pai, uma mãe, a levarem seus filhos para baixo de uma lona preta? Será masoquismo o que os leva a entrarem nos grotões mais insalubres do Brasil? Será que é por gostarem de vê-los sofrer? Não. É por viverem no país com o maior índice de desigualdade territorial do planeta. Ao mesmo tempo, o que leva um judiciário a descumprir sistematicamente todo um arcabouço jurídico que garante a função social da propriedade e da cidade? A ignorar acordos internacionais de direitos humanos? A desprezar a Constituição, o Estatuto das Cidades e os pactos que tratam os conflitos fundiários urbanos? O que leva à falta de investimento público nas periferias? Assim é Porto Alegre, capital com déficit de 75 mil novas moradias e, simultaneamente, com 48 mil imóveis
vazios. Estamos com inúmeras reintegrações de posse prestes a serem efetivadas a qualquer momento. Por exemplo, a Ocupação “2 de Julho” no prédio do IPERS na avenida Borges de Medeiros. A ocupação é de 1997 e a reintegração concedida em agosto de 2018. Também a “Saraí”, ocupação realizada em três momentos diversos. Primeiro em 2005, depois 2006 e por fim em 2011. O prédio foi erguido ainda na ditadura (1964/1985) para servir de moradia popular, mas nunca cumpriu seu destino. Chegou a ser utilizado pelo crime organizado. Aconteceu em 2006, quando o Primeiro Comando da Capital (PCC) cavou um túnel no imóvel para tentar roubar uma agência do Banrisul. Em 2014, a ocupação obteve o compromisso do então governador, Tarso Genro (PT), para a desapropriação. Mas o processo foi paralisado durante o mandato de José Ivo Sartori (MDB). Agora, com o desinteresse do poder público, a proprietária do prédio recorreu à Justiça para pedir o despejo dos moradores. O ano de 2018 foi marcado pela disputa pela cidade. E pela disputa sobre a função social da propriedade. E 2019, sabemos, será um ano duro para as maiorias despossuídas do país. Mas daremos nossa resposta. Teremos um período de muitas mobilizações pelo direito à cidade e à moradia como pautas fundamentais da nossa luta. Quando morar é um privilégio, ocupar é um direito! (*) Dirigentes do Movimento Nacional de Luta pela Moradia.