RIO GRANDE DO SUL
Especial
Futebol
Feicoop transforma Santa Maria na capital mundial da economia solidária
Copa América fecha com sucesso de renda e fracasso de público
ENCARTE ESPECIAL
ESPORTES | PÁG 8
11 a 31 de julho de 2019 distribuição gratuita brasildefato.com.br
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Ano 2 | edição 17
ESPELHO PARTIDO Principal figura da Lava Jato, o ex-juiz Sérgio Moro enfrenta a hora da verdade. Sua imagem estilhaçou-se. Quem nele se espelhava, chocou-se com as revelações trazidas por The Intercept Brasil. No mundo jurídico, sumiram os que o defendiam. De caçador de corruptos passou a ser visto como mais um corrupto. PÁG. 3, 4 e 5
Brasil de Fato RS completa seu primeiro aniversário
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OPINIÃO
PORTO ALEGRE, 11 A 31 DE JULHO DE 2019
ARTIGO | Humanizar dá esperança
CHARGE | Santiago
Jocelaine Teixeira *
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Supremo
Um teste para o
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ovos sinais no ar animam quem espera do Supremo Tribunal Federal alguma atitude para retomar seu papel de guardião da Constituição, sem o qual não existe motivo para que exista. Primeiro, foi a ação desmitificadora de The Intercept Brasil, expondo os intestinos da República de Curitiba através da avalanche de diálogos comprometedores. Ali ficou escancarada a guerra judicial praticada pelo juiz e seus procuradores contra o ex-presidente Lula. Caso o Supremo pretenda se esquivar dos esguichos da mesma lama, algo terá que fazer. Depois, vieram as intervenções do ex-presidente do STF, Nélson Jobim, e do ministro Luiz Edson Fachin. Para Jobim, a corte maior foi “leniente” e “tolerou os exageros, os abusos que foram cometidos (pela Lava Jato) e agora estão ficando muito claros www.brasildefato.com.br redacaors@brasildefato.com.br (51) 99956.7811 (51) 3228-8107 /brasildefators @Brasil_de_Fato
com essa história do Intercept”. Acha que Lula é inocente e que Sérgio Moro teve “conduta inadequada para um juiz”. Saudado com o “Aha Uhu, o Fachin é nosso”, na galhofa do procurador Deltan Dallagnol, o ministro resolveu dar um giro de 180 graus na retórica. Sem citar Moro, criticou a “justiça seletiva” e avisou que “juízes cometem ilícitos e devem ser punidos”. E nem podem fazer do ofício “uma agenda pessoal ou ideológica”. Nada disso absolve Fachin. E muito menos o STF. Em 2016, como aconteceu em 1964, o Supremo convalidou o golpe. E, vitoriosos os dois golpes, juntou-se a eles como se fossem a mesma coisa e com o mesmo propósito. Será preciso aguardar para saber se ainda guarda algum orgulho próprio e compromisso com a sua função. Ou se entregará mais do mesmo. Estão abertas as apostas.
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CONSELHO EDITORIAL Danieli Cazarotto, Cedenir Oliveira, Fernando Fernandes, Ezequiela Scapini, Ronaldo Schaefer, Milton Viário, Frei Sérgio Görgen, Ênio Santos, Isnar Borges, Cláudio Augustin, Maister Silva, Fernando Maia, Neide Zanon, Edison Terterola, Mariane Quadros, Carlos Alberto Alves, Daniel Damiani, Vito Giannotti (In Memoriam) | EDIÇÃO Katia Marko (DRT7969), Marcos Corbari (DRT16193), Ayrton Centeno (DRT3314) e Marcelo Ferreira (DRT16826) | REDAÇÃO NESTA EDIÇÃO Ayrton Centeno, Marcos Corbari, Fabiana Reinholz, Grasiele Berticelli e Marcelo Ferreira. | DIAGRAMAÇÃO Marcelo Souza | DISTRIBUIÇÃO Alexandre Garcia | IMPRESSÃO Gazeta do Sul | TIRAGEM 25 mil exemplares
O Código de Processo Penal não determina que o juiz ou a juíza sorriam, apenas que saibam, minimamente, quem é a pessoa que será julgada. As regras éticas e disciplinares na Magistratura também não determinam que se sorria, apenas preveem que devemos tratar com urbanidade partes, servidores e outros agentes do processo. Devemos tratá-los como gente.
A POIO
EDITORIAL |
espondi boa tarde a uma senhora que vendia panos de prato. Ela retribuiu com “obrigada pelo sorriso”. Seguiu, dizendo, “a gente sente”, “também somos humanos”, “é tão ruim quando dizem, vai pra lá, negra”. E completou ela “essas pessoas não têm amor”. Era uma tarde em que eu não me via com muitos motivos para sorrir, mas ele saiu, estava lá, ainda que tímido. Como juíza criminal, também é assim. Mais de 1.000 audiências realizadas em 10 meses, mais de 1.500 pessoas ouvidas. Pouco tempo, inclusive
para sorrir, mas ele está lá, sai, espontâneo. O Código de Processo Penal não determina que o juiz ou a juíza sorriam, apenas que saibam, minimamente, quem é a pessoa que será julgada. As regras éticas e disciplinares na Magistratura também não determinam que se sorria, apenas preveem que devemos tratar com urbanidade partes, servidores e outros agentes do processo. Devemos tratá-los como gente. Assim procedo. E se o sorriso, se o olhar acolhedor ali estão, em meio a tanto trabalho, são espontâneos. Quando interrogo um acusado, cumprimento, chamo pelo nome e pergunto, como manda o Código de Processo Penal, pela condição familiar, social e econômica, com verdadeiro interesse, com atenção. Nisso, constato que faz muita diferença para a maioria dos acusados um pouco de atenção por parte de quem os julgará, como é importante para eles que se olhe em seus olhos, reconhecendo-os como indivíduos, como sujeitos, como humanamente iguais, como é importante um sorriso, ainda que tímido, impensado. Quando retribuem com outro sorriso ou com a tristeza de quem se percebe vulnerável e desajustado em suas condutas, é compensador. Os acusados sentem, também são humanos. Humanizar a relação processual dá esperança.
* Jocelaine Teixeira é juíza criminal de Porto Alegre e membra da Associação dos Juízes para a Democracia.
GERAL
PORTO ALEGRE, 11 A 31 DE JULHO DE 2019
VAZA JATO
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O SuperMoro encolheu. E a cada dia encolhe mais Foto: Lula Marques
Cinco anos e quatro meses após sua deflagração, a operação Lava Jato começa a ver a fragmentação acelerada da sua principal figura, o ex-juiz Sérgio Moro. AYRTON CENTENO*
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PORTO ALEGRE (RS)
odas as suspeitas sobre a parcialidade de suas ações estão sendo confirmadas pela torrente de diálogos comprometedores do aplicativo Telegram, obtidos e publicados por The Intercept Brasil, veiculados também pela Folha de S. Paulo e Veja, além da Band TV. De caçador de corruptos passou a ser, ele próprio, visto como corrupto. De âncora moral de Jair Bolsonaro – de quem foi elemento decisivo na disputa presidencial de 2018, ao retirar da disputa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – viu sumir o chão aos seus pés, tornando-se dependente dos humores presidenciais. O SuperMoro encolheu. E, a cada revelação, encolhe mais. “Chega a ser estarrecedor”, reage o constitucionalista Eduardo Carrion, abordando as conversas entre Moro, Deltan Dallagnol e outros procuradores do Ministério Público. “Entendê-las como "normais" ou "regulares", sinceramente é, no meu entender, nada ou pouco entender do que seja o direito”, adverte. “Já existem elementos que mostram que o juiz não agiu com imparcialidade.
“Quebra da imparcialidade” “Ele (Moro) e o MP, em conjunto, praticaram lawfare, diz o jurista Lênio Streck, professor da Unisinos/RS e da Universidade Estácio de Sá/RJ (veja entrevista nesta edição). “Manter Moro como ministro da Justiça e Dallagnol e seus comparsas no MP significa decretar a completa falência de nosso país como estado de direito”, agrega a juíza Valdete Severo, presidente da Associação de Juízes pela Democracia (AJD). Antigo apoiador da Lava Jato, Carrion mudou sua percepção. Entendia que poderia ter havido aqui e ali alguma irregularidade, algum erro no plano jurídico, nada porém com a gravidade do que agora aparece. “Tudo aponta para quebra da imparcialidade, necessária e exigida, por parte do magistrado no julgamento do feito”, enfatiza. “O que se condena – acrescenta -- não são propriamente meras conversas do magistrado com uma das partes, mas o teor destas conversas, parecendo orientar, direcionar mesmo o trabalho do Ministério Público”.
Os diálogos revelados, segundo Carrion, apontam para a quebra da imparcialidade de Moro
“Escárnio internacional” Ex-diretor da Faculdade de Direito da UFRGS e professor titular na Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), Carrion salienta que “esse tipo de comportamento (do juiz e dos procuradores), parecendo não medir os meios para atingir os fins, conspi-
ra inconsciente ou indiretamente contra a operação Lava-Jato, expondo-nos ainda ao escárnio internacional”. Para quem busca a fonte onde o jornalista Glenn Greenwald, de The Intercept, conseguiu todo o material que agora vem à tona, Carrion avisa que o mais impor-
tante é o conteúdo das mensagens. “Já há precedentes históricos, como os Papéis do Pentágono (Pentagon Papers) sobre a Guerra do Vietnã, em 1971, a Suprema Corte norte-americana tendo autorizado a publicação independentemente da forma como foram obtidos”, relembra.
“Aha, Uhu, o Fachin é nosso”
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eferindo-se à revelação de que Moro e Dallagnol cogitaram vazar informações para influenciar na crise da Venezuela, Valdete Severo afirma que “não se trata somente de prevaricação ou de ilicitude jurídica, trata-se do uso da máquina pública para fazer valer interesses escusos, inclusive interferindo na política de um país conflagrado”. As conversas pelo aplicativo Telegram mostram Moro como uma espécie de chefe dos procuradores a quem
Fachin, aqui com Moro, foi alvo de escárnio de Dallagnol
transmite ordens e/ou sugestões, algo conflitante com a postura de um julgador isento. Também escancaram a intimidade da chamada “República de Curitiba” com os ministros Luiz Fux e Luiz Fachin, do STF, levantando ainda mais dúvidas sobre as dimensões da guerra jurídica movida pela Lava Jato sobretudo contra o ex-presidente Lula. As frases “Aha, Uhu, o Fachin é nosso”, de Dallagnol, e “In Fux we Trust”, de Moro, já estão irremediavelmente coladas à bio-
grafia dos dois ministros. Carrion repara que, ao longo da história, há juristas que “se prestaram ao papel de agentes de interesses inconfessáveis”. Foram eles que, com suas posturas, “ajudaram assim a pavimentar o caminho para as práticas e os regimes autoritários, independentemente da natureza do projeto político ou ideológico de que se tornaram vassalos”. E adverte: “Estes foram esquecidos, salvo a ignomínia de suas atitudes”.
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GERAL
LAVA JATO
PORTO ALEGRE, 11 A 31 DE JULHO DE 2019
Suspeição é nulidade absoluta, diz jurista Foto: reprodução TVT
Uma das vozes mais críticas à politização do Judiciário, o jurista Lenio Streck, professor titular da Unisinos/RS e da Universidade Estácio de Sá/RJ, questiona a tradição jurídica autoritária brasileira. AYRTON CENTENO
PORTO ALEGRE (RS)
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enio Streck observa que o punitivismo embalou com o Mensalão e encontrou “a tempestade perfeita” na Lava-Jato. Respondendo sobre Sérgio Moro e os diálogos publicados por The Intercept Brasil, repara que a suspeição do juiz implica em “nulidade absoluta” do processo. Acentua que os magistrados não podem interpretar a Constituição ao seu bel prazer, sugere ao STF exercer, de fato, seu papel de guardião da Lei Maior e avisa que os juristas que, no passado, defenderam o autoritarismo simplesmente desapareceram. Adverte, ainda, que uma História verdadeira costuma castigar quem se coloca contra a democracia. Brasil de Fato - Em que momento da vida jurídica brasileira o garantismo perdeu a parada para o punitivismo? Como se chegou a isso e como o Brasil vai sofrer as consequências? Lenio Streck - A pergunta é: algum dia o garantismo havia triunfado? Há nichos garantistas, contudo, o grosso das práticas judiciais ainda é punitivista. Trata-se de uma tradição jurídica autoritária que nunca se tornou garantista, tendo, apenas, inclusões pontuais de concretizações
O bom humor é uma das características das mobilizações dos jovens pelo país Streck: “as pessoas foram se acostumando com a ideia de que os fins justificam os meios”
garantistas. Uma breve digressão histórica demonstra que desde as Ordenações Filipinas, passando pelos códigos processuais penais estaduais e pelo vigente código de processo penal de 1941, produto legislativo do autoritário Estado Novo e inspirado pelo Código Rocco italiano - feito em plena ditadura de Mussolini, há essa tradição. Não vivemos em um período ditatorial, contudo, há brechas dentro do sistema criminal pelas quais transpassam atos autoritários que impedem a realização dessa concepção democrática. Por garantismo, quero dizer: fazer democracia e processo por meio do direito. A lei só pode ser aplicada se for constitucional. Contudo, vige um ideal de Direito Processual Penal máximo e de um Direito
Na verdade, o direito brasileiro, como escrevi à época, é AM-DM (antes do mensalão e depois do mensalão). Depois veio a Lava Jato, que encontrou uma tempestade perfeita. As pessoas foram se acostumando com a ideia de que os fins justificam os meios".
Penal de combate, voltado à punição de crimes graves. Nesse contexto, há um imaginário punitivista que ganhou fôlego com o Mensalão. Na verdade, o direito brasileiro, como escrevi à época, é AM-DM (antes do mensalão e depois do mensalão). Depois veio a Lava Jato, que encontrou uma tempestade perfeita. As pessoas foram se acostumando com a ideia de que os fins justificam os meios. As consequências disso são terríveis: a normalização do desrespeito das garantias. BdF - O que restará do Judiciário brasileiro após a publicação, daqui há algumas semanas ou meses, da última reportagem de The Intercept Brasil? É algo que não se refere apenas ao ex-juiz Sérgio Moro, mas acaba envolvendo outros juízes de 1ª instância, o TRF4, o STJ, o STF, etc. Streck - Bom, não sou pitonisa. Caso fosse, ganharia na loteria. Diria que já existem elementos que mostram que o juiz não agiu com imparcialidade. Ele e o MP, em conjunto, praticaram lawfare, que é o uso político do direito contra adversários. Já escrevi muito sobre isso.
Nas democracias, depois que a constituição e as leis estão votadas e aprovadas, o intérprete não pode interpretar esse "produto" do modo que quiser. Juízos morais e políticos não podem corrigir o direito. Claro que se a lei for inconstitucional, o juiz não deve aplicá-la. Entretanto, se a lei é constitucional, o juiz não só pode como deve aplicá-la". BdF - O STF ainda pode salvar a si mesmo e salvar o Judiciário brasileiro? O que precisaria fazer para tanto? Streck - O STF precisa fazer uma coisa simples: assumir uma interpretação ortodoxa da Constituição. Não se trata de salvar ninguém. Trata-se de ser, efetivamente, o guardião da nossa Carta Magna. Esse, inclusive, é o caminho adequado para concretizarmos a postura garantista da questão anterior. A Constituição constitui, falei há mais de 20 anos em um congresso no Rio de Janeiro. BdF - Depois de tantas soluções sinuosas do Judiciário, sobretudo da corte suprema, condenando ou absolvendo de acordo com o réu, a Constituição de 1988 ainda co-
manda o país ou a "lei maior" deriva dos humores e pendores dos juízes, desembargadores e ministros? Streck - O Direito é produto das injunções morais, políticas e econômicas da sociedade. Desses desacordos nasce a lei e a Constituição. Qual é o problema? Nas democracias, depois que a constituição e as leis estão votadas e aprovadas, o intérprete não pode interpretar esse "produto" do modo que quiser. Juízos morais e políticos não podem corrigir o direito. Claro que se a lei for inconstitucional, o juiz não deve aplicá-la. Entretanto, se a lei é constitucional, o juiz não só pode como deve aplicá-la. Por exemplo, o artigo 283 do Código de Pro-
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PORTO ALEGRE, 11 A 31 DE JULHO DE 2019
cesso Penal diz, claramente, que todos os acusados possuem direito à presunção da inocência. No entanto, a interpretação que o STF vem dando é mais moral e política do que jurídica. BdF - Sei que, a exemplo do general Heleno, o senhor não tem bola de cristal, mas arriscaria prever qual o papel que a História atribuirá ao Judiciário brasileiro e ao MPF nos acontecimentos desta década no futuro? Streck - Hum, hum. A história é uma ciência implacável, desde que ela não seja substituída por pós-verdades. Em tempos de fakenews, a cada dia a história vem sendo reescrita. Golpe vira movimento, tortura vira "ameaça necessária", nazismo vira movimento de esquerda, etc. Uma história autêntica castiga aqueles que se colocam contra a democracia. No direito, quem viola as garantias constitucionais recebe duro tratamento. Veja-se alguns juristas brasileiros defensores do autoritarismo que desapareceram. Alguns ministros de cortes superiores, passados há tão poucos anos, face às suas posturas autoritárias, já vem sendo esquecidos pelas pessoas. Mas são registrados pela história. BdF - Qual foi sua reação ao ler os diálogos de Sergio Moro com os procuradores? Ou não ficou nem um pouco surpreso? Streck - Nós já sabíamos. Jornalistas e jornaleiros já sabiam de tudo. Não me surpreendi. BdF - Os diálogos publicados por The Intercept demonstram, em muitos momentos, que Sergio Moro foi, no mínimo, um juiz suspeito. Neste caso, suas decisões são nulas? Streck - O Código de Processo Penal, que ainda vale (risos), diz que suspeição é nulidade absoluta. Simples assim. Não se diga que, por serem os diálogos fruto de prova ilícita (diz-se, mas não está ainda comprovado que foram produtos de hackeamento), essa prova não serve para beneficiar o acusado. Desde décadas a justiça aceita prova ilícita em favor do réu. Simples assim.
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Antes da Vaza Jato, 122 juristas apontaram parcialidade de Moro
Nas suas 542 páginas, o livro descreveu, examinou e denunciou as falhas da sentença.
Bem antes das revelações trazidas por The Intercept Brasil, 122 juristas, professores de direito, procuradores e advogados já questionavam a imparcialidade de Sérgio Moro. AYRTON CENTENO
PORTO ALEGRE (RS)
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m 2017, lançaram “Comentários a uma sentença anunciada – o processo Lula”, volume de 542 páginas que denuncia a precariedade da denúncia original, a inexistência de provas, as deficiências da sentença, a evidência de uma guerra jurídica movida contra o ex-presidente, as falhas na dosagem da pena e a prática autoritária do juiz transformado em acusador. A professora Liane Cirne Lins, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, aponta a imprecisão dos crimes pelos quais Lula é acusado. Na denúncia do MPF, ele foi denunciado por, supostamente, receber vantagens por favorecimento à empreiteira OAS em contratos com a Petrobrás. No entanto, o próprio Moro registra na sentença jamais ter afirmado que “os valores obtidos pela OAS nos contratos com a Petrobrás foram utilizados para pagamento de vantagem indevida para o ex-Presidente”.
“Condenado por receber o que não recebeu” Ela nota que Moro desqualificou a denúncia recebida do MPF, considerando-a irrelevante. Porém, na
sentença, o juiz, por sua conta, modifica a denúncia inicial, ausente na manifestação dos procuradores. Mas um juiz, caso entenda inconsistente uma denúncia, deve rejeitá-la e não alterá-la... Já o jurista Afrânio Silva Jardim, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a UERJ, repara que o processo não contém provas contra o ex-presidente. Não há evidência, segundo ele, de que Lula tenha recebido vantagens indevidas. “Surreal: Lula foi condenado por receber o que não recebeu e por lavagem de dinheiro que não lhe foi dado... Vale dizer, não teve seu patrimônio acrescido de sequer um centavo!”, observa Silva Jardim.
“Guerra jurídica” O recurso a subterfúgios e falácias foi apontado pela professora Cláudia Barbosa, que ensina Direito Constitucional na PUC, do Paraná. Acentua que a condenação foi baseada sobretudo nos depoimentos dos réus Léo Pinheiro e Agenor Medeiros. Os dois foram ouvidos sem o compromisso de dizer a verdade e com o objetivo evidente de, com uma versão falsa, obterem benefícios, entre eles a redução de suas penas. Sem importar que seus testemunhos conflitassem com os de outros 73 depoentes... Dos textos também emerge a convicção de que estaria em curso um processo de perseguição política. Deflagra-se uma guerra jurídica, o chamado lawfare – neologismo inglês, formado pelas palavras “law” (lei) e “warfare” (guerra)
Surreal: Lula foi condenado por receber o que não recebeu e por lavagem de dinheiro que não lhe foi dado... Vale dizer, não teve seu patrimônio acrescido de sequer um centavo!" -- contra o ex-presidente. Mais tarde, os diálogos obtidos por The Intercept ajudariam a evidenciar o acordo tramado entre juiz e procuradores.
Elemento estranho O professor de direito penal Fábio Bozza, do Instituto de Criminologia e Política Criminal, encontrou dois princípios constitucionais não cumpridos na sentença de Lula. Assinala que as sentenças judiciais devem ser muito bem fundamentadas para que o acusado possa exercer o seu direito de defesa, o que não aconteceu. Explica que, ao fixar o patamar máximo da pena, o julgador recorreu a elemento estranho ao fato, no caso atos de terceiros supostamente envolvidos em esquema criminoso mais amplo. Não demonstra também as razões preventivas para estabelecer pena de 9,5 anos em regime fechado. (*) Com dados de texto elaborado por Greiner Costa e publicado pela Fundação Perseu Abramo.
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TERRA
PORTO ALEGRE, 11 A 31 DE JULHO DE 2019
MINA GUAÍBA | População cobra realização de
uma audiência pública em Porto Alegre
Foto: Leandro Molina
Manifestantes protestaram contra instalação da mina a céu aberto e denunciaram a falta de debates sobre o projeto FABIANA REINHOLZ
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PORTO ALEGRE (RS)
m protesto na frente do prédio da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) no dia 4 de julho chamou a atenção da população de Porto Alegre. Com cartazes e faixas, os manifestantes alertavam as pessoas que passavam pelo local sobre os riscos da mineração de carvão a céu aberto que a empresa Copelmi quer instalar a 16 km da capital gaúcha. Tendo em vista que era o último dia para a impugnação do projeto, que atualmente está em processo de licenciamento junto à Fepam, os presentes protocolaram pareceres contrários aos estudos dos impactos ambientais apresentados pela em-
Projeto prevê remoção de moradores, tem alto impacto ambiental e vai na contramão do uso de energias renováveis, conforme manifestantes
presa responsável pela mina. Pediam, acima de tudo, uma audiência em Porto Alegre. Organizado pelo Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul, que representa entidades ambientais, sindicais, associativas e movimentos sociais, o ato teve, além dos simpatizantes à causa, representantes do poder le-
gislativo que se somaram na cobrança da realização do debate na capital, assim como em outras cidades.
Deputados protocolaram pedido de audiência “Queremos que a Fepam atue como órgão regulador, fiscalizador e não como um órgão militante da Copelmi, essa empresa que quer
trazer para nós prejuízos ambientais e levar o lucro para o bolso de poucos”, declarou o deputado estadual Edgar Pretto (PT). Para o vereador do PSOL, Roberto Robaina, não é possível que um megainvestimento seja feito sem que a sociedade debata. “Temos a obrigação de discutir com todos os porto-
-alegrenses as consequências desse tipo de intervenção, desse tipo de investimento que mostra como o RS está atrasado. Enquanto o mundo inteiro discute a superação de uma energia poluente, aqui querem fazer uma mina de carvão”, criticou. A deputada Sofia Cavedon (PT), presente ao ato, protocolou o pedido para que seja realizada a audiência na capital. “O povo está aqui para fortalecer as análises técnicas feitas e protocoladas hoje, que demonstram o grau de risco e de impacto ambiental que nós vamos sofrer se tiver a aprovação dessa mina. Então, nosso diálogo e do povo gaúcho tem que ser com responsabilidade técnica, com o constrangimento político do governador e de todos que querem explorar a vida humana”, concluiu. Além de Sofia, assinaram o requerimento a deputada Luciana Genro (PSOL), Pepe Vargas (PT), Jeferson Fernandes (PT), Fernando Marroni (PT) e Edgar Pretto (PT).
DIREITOS | MAB oficializa propostas para a
subcomissão de barragens da Assembleia Legislativa Foto: Divulgação MAB
Segundo a entidade, é fundamental e urgente o avanço na garantia de direitos para quem vive no entorno das barragens GRASIELE BERTICELLI*
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PORTO ALEGRE (RS)
Movimento de Atingidos por Barragens do Rio Grande do Sul (MAB) entregou para a subcomissão de barragens da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (ALRS), um ofício com as propostas dos atingidos por barragens do RS para compor o relatório final da Subcomissão de Barragens da Assembleia. A Subcomissão, aprovada pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente da ALRS,
Estão previstos mais de uma dezena de eventos paralelos
Representantes do MAB/RS entregaram propostas para o relatório final da Subcomissão de Barragens da Assembleia
atuou durante 120 dias promovendo audiências públicas no estado, sendo uma na Câmara de Vereadores de Erechim, em 24 de maio, e
uma na ALRS, no dia 3 de junho. Dos debates realizados, resultou a elaboração de um relatório final que aponta os problemas e propõe soluções
na área de segurança de barragens. Enquanto atingidos e atingidas por barragens e entidade representante destes, o
MAB participou de todas as audiências e elaborou um documento, em forma de ofício, com diversas proposições para que se avance no tema da segurança das populações atingidas e ameaçadas que vivem no entorno e a jusante das barragens no estado. Para o MAB, considerando o descaso que as empresas donas das barragens têm em relação à segurança do povo e a não efetivação da política estadual de direitos das populações atingidas e ameaçadas, é fundamental e urgente o avanço na garantia de direitos para quem vive nessas localidades.
* Grasiele Berticelli é integrante da Coordenação Estadual do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB-RS).
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CULTURA & LAZER
HUMOR
HORÓSCOPO ÁRIES (21/3 A 20/4) Cuidado para não tornar tudo uma competição. Evite comparações e entenda que cada indivíduo tem seu próprio caminho a trilhar. É importante lembrar que a saída é sempre coletiva, nunca individual.
TOURO (21/4 A 20/5) Lembre que todas as nossas ações geram reações. É uma lei da física. É momento de deixar tudo bem explicado para não ocorrer mal entendidos. Aproveite para mobilizar contra a reforma da Previdência.
GÊMEOS (21/5 A 20/6) Seu poder de influencia aumenta conforme sua coerência aumenta. Prática e teoria precisam estar alinhadas. Seus relacionamentos são os que mais pedem por isso. Na vida profissional preze por sua saúde mental.
CÂNCER (21/6 A 22/7) O melhor lugar para se estar é no presente. É difícil manter a constância quando forçamos algo que não é de nossa natureza. Procure sempre ser você mesmo e respeite as subjetividades das pessoas que você encosta.
LEÃO (23/7 A 22/8) Procure entender seus relacionamentos com o máximo de nitidez possível. Muitas mudanças precisam acontecer, mas elas só ocorrerão se você mudar de atitude ante elas. Aproveite e faça uma revisão.
VIRGEM (23/8 A 22/9) A paciência histórica existe para que a gente entenda que são necessárias ações bem planejadas. Por isso, não procrastine e aja com cautela. Lembre-se: a vida é a única certeza e ela não é só hoje.
LIBRA (23/9 A 22/10)
GRAFAR
O presente é uma combinação perfeita entre passado e futuro. Há no presente muitas possibilidades, mas as tendências para o futuro quem dita é o passado. Por isso organize a casa e deixe o vento circular.
ESCORPIÃO (23/10 A 21/11) A comunicação é central para você se fazer entender. São necessárias muitas ações, mesmo que pequenas, articuladas e convergentes para que a mensagem seja entendida e sempre lembrada. Se inspire na #vazajato.
SAGITÁRIO (22/11 A 21/12)
TIRINHA | Rango (Edgard Vasquez)
Sua palavra de ordem é confiança. Tenha certeza que suas relações estão alicerçadas na confiança que as pessoas têm em você. É necessário muito cuidado com expectativas e ações impulsivas.
CAPRICÓRNIO (22/12 A 20/1) Às vezes, parece que todos os nossos problemas resolvem dar o ar da graça. A complexidade da vida exige coragem. Muitas vezes, a coragem necessária está nas relações que construímos, no mais, deixe a vida acontecer.
AQUÁRIO (21/1 A 19/2)
TIRINHA | Armandinho (Alexandre Beck)
A família será seu maior ponto de convergência no próximo período. É preciso dar atenção em quais as lições estas pessoas podem te ensinar. Quais exemplos devem ser seguidos e quais devem ser revistos.
PEIXES (20/2 A 20/3) A cabeça pensa onde os pés pisam. Esta é uma frase clássica para entender de onde devem partir seus sonhos. Recusar também é aceitar e você deve utilizar seu poder de decisão com firmeza. Mateus Além Pisciano, jornalista, comunicador popular e militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Tem mais facilidade em guardar o mapa astral do que o nome das pessoas.
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ESPORTES
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FUTEBOL | A Copa América das
arquibancadas vazias
Foto: Tânia Rêgo/ Agência Brasil
Baixa adesão popular à competição e alto valor dos ingressos reacendem debate sobre elitização do futebol no país MARCELO FERREIRA
A
PORTO ALEGRE (RS)
Copa América, que encerrou com o Brasil levantando a taça da competição pela nona vez, promoveu reflexões para além do futebol apresentado pelas 12 seleções que desembarcaram aqui no “país do futebol”. Os estádios vazios, principalmente na primeira fase da copa, e um certo desinteresse popular pelo evento, foram destaques na imprensa brasileira e internacional e nos comentários nas redes sociais, levantando o debate sobre a elitização do futebol. Apesar disso, contradição: a competição rendeu ao Brasil dois recordes de renda no futebol. Primeiro, no jogo de abertura, em que o Brasil venceu a Bolívia por 3 a 0 no Morumbi, a renda foi de mais de R$ 22 milhões, com o tíquete médio na casa dos R$ 485. Depois, os números foram superados na final, contra o Peru no Maracanã, que contou com mais de 58 mil torcedores pagantes, rendendo uma cifra de mais de R$ 38 milhões, com valor médio de R$ 661. Com exceção dos valores cobrados em setores sem cadeiras das Arenas Grêmio e Corinthians, que saíram por R$ 60, os ingressos mais baratos na competição custaram R$ 120. Mais de 10% do valor do salário mínimo brasileiro, que está em R$ 998. Como comparativo, na última Eurocopa, disputada em 2016 na França, os ingressos mais baratos custaram 25 euros (R$ 110), equivalente a 1,64% do salário mínimo francês, que é 1.521 euros. Uma das decepções de público foi a semifinal disputada entre Peru e Chile, na Arena do Grêmio, com metade do estádio vazio. Miguel Baierle, que ganhou um ingresso cortesia para a partida em Porto Alegre, com-
Sensação de estádio vazio na partida entre Bolívia e Peru, no Maracanã, pela segunda rodada da Copa América
partilhou sua percepção, que começou com “um sentimento estranho” já no caminho para o jogo: “Muita polícia, muita pobreza ao redor e também gente feliz da vida porque abriu um negócio na frente e agora fatura uma graninha. Lá dentro, arquibancadas inteiras vazias, pude até trocar de lugar e chegar bem pertinho do campo. A maioria das pessoas parecia ser branca, homem, rico. Vi poucas mulheres, nenhum negro e ninguém vestido com roupas surradas além de mim.”
Pouco público e muito lucro Em competições mundiais, ressalta Maffei, muitas vezes os salários milionários acabam definindo escalações meramente pelo apelo comercial, o que contribui para frustrar e afastar os torcedores dos estádios. “No Brasil, isso é muito gritante porque vivemos um grande retrocesso social e econômico. Nossos jovens que jogam no exterior não sentem amor e identificação com nossa realidade”, opina, lembrando do exemplo de Neymar, “que nos envergonha com suas atitudes bizarras, reduzindo a autoestima de um povo muito sofrido”. Além disso, lembra Stival, “Copa América, Copa das Confederações ou Copa do Mundo são dos eventos mais caros do mundo. Os custos com infraestrutura, funcionários, premiações e outros são estratosféricos”. Mesmo assim, a lógica do marketing e a espetacularização os fazem rentáveis para os organizadores, como provou a competição continental. Na Copa América no Brasil, pouco público e muito lucro foram a tônica da competição que foi pouco vibrada pelas ruas do país. “Na maioria dos jogos”, finaliza Stival, “ficou-se com a sensação de estádios vazios”.
Padrão Fifa Foi na Copa do Mundo de 2014, com as reformas dos estádios e a construção de arenas pelo país com bilhões de reais investidos pelos clubes e também pelos cofres públicos, que o processo de elitização do futebol tornou-se mais visível no país. O conselheiro do Grêmio, David Stival, avalia que “o futebol se elitizou porque se tornou a mercadoria mais cara do mundo, deixando de ser um esporte popular para fazer parte da engrenagem do grande capital e do capitalismo”. A conselheira do Inter e consulesa da região Lomba do Pinheiro Vermelha, Maristela Maffei, acredita que as arquibancadas esvaziadas não se dão apenas pela questão dos altos valores dos ingressos. “Penso que é um processo planejado a médio e longo prazo de segregação social, uma mensagem subliminar de divisão de classe”. Ela recorda do fim da coreia, espaço popular que existia no Beira Rio, que considera “um símbolo de retirada da camada que mais representa o Internacional, de uma diversidade empobrecida”.
TABELINHA GRENAL Internacional
Grêmio
14/07 – 16h – Brasileirão Atlético-PR X Internacional
13/07 – 17h – Brasileirão Grêmio X Vasco
17/07 – 21h30 – Copa do Brasil Internacional X Palmeiras
17/07 – 19h15 – Copa do Brasil Bahia X Grêmio
20/07 – 19h – Brasileirão Internacional X Grêmio
20/07 – 19h – Brasileirão Internacional X Grêmio
24/07 – 19h15 – Libertadores Nacional X Internacional
25/07 – 21h30 – Libertadores Grêmio X Libertad
27/07 – 19h – Brasileirão Internacional X Ceará
29/07 – 20h – Brasileirão CSA X Grêmio
RIO GRANDE DO SUL
11 de julho de 2019 distribuição gratuita brasildefato.com.br
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brasildefators
ENCARTE ESPECIAL
26 FEICOOP prova a força da economia solidária a
Sob ataque dos setores conservadores e desabrigada de políticas públicas de economia solidária, a feira de Santa Maria aposta na força popular para seguir fazendo história MARCOS CORBARI
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SANTA MARIA (RS)
e nos últimos anos – quando o neoliberalismo em sua versão mais selvagem voltou a escalar as instâncias de poder – já foi um desafio manter a Feira Internacional de Cooperativismo e Economia Solidária em pé, esta 26ª edição está se tornando um verdadeiro sinônimo da palavra “resistência”. Porém, se alguém apostava em sufocar o maior evento de Ecosol da América Latina e silenciar o legado do saudoso Dom Ivo Lorscheider – idealizador do evento -, não contava com a obstinação do grupo de voluntários capitaneados pela incansável Irmã Lourdes Dill e todas as manifestações de apoio e solidariedade que estão formando uma corrente onde se propõe concretamente a “ninguém soltar a mão de ninguém”. E assim manter viva a semente do Fórum Social Mundial, plantada na região central, em pleno coração do RS. Irmã Lourdes relembra que a Feicoop “é um grande espaço de articulação, debate, comercialização justa e troca de experiências entre os empreendimentos da economia solidária”. A religiosa e ativista social destaca a participação de iniciativas da agricultura familiar camponesa, reforma agrária, agroecologia, associações de catadores e catadoras, povos indígenas e tradicionais, organizações populares, associações, cooperativas, empreendimentos solidários”, num ambiente onde impera o espírito da participação. “Aqui va-
Feira coloca a cidade de Santa Maria e o estado do Rio Grande do Sul como referência internacional em Economia Solidária
mos muito além da resistência frente à exclusão social e o desemprego, procurando apontar para uma nova prática econômica, para a reinvenção do nosso sentido de coletividade, para a superação desse sistema que aí está”, reflete. Para ela, essa nova construção deve se constituir a partir do trabalho cooperativado, auto gestionário, com gestão participativa entre homens e mulheres que constroem o bem viver”, completa. No ano passado, 302 mil pessoas prestigiaram o evento, que contou com a representação de 3,5 mil empreendimentos organizados em rede, 583 municípios, 26 Estados brasileiros e Distrito Federal e, pelo menos, 25 países. Presença constante nas edições da Feicoop, o deputado estadual constituinte (1987-1990) Selvino Heck relembra um provérbio africano que vem sendo repetido a cada ano pela coordenadora do evento: “Gente simples, fazendo coisas pequenas, em lugares pouco im-
O QUE É ECONOMIA SOLIDÁRIA?
portantes, consegue mudanças extraordinárias”. Para ele, “a economia solidária é um destes espaços onde a gente simples reúne-se em grupos, em cooperativas, em associações, em feiras e comunidades. Planta sementes de vida todos os dias. Constrói o novo e a esperança. Especialmente nestes tempos em que vicejam o ódio, a intolerância, o individualismo, a ganância e o lucro desmedidos”. Durante a Feicoop ocorrem práticas do comércio justo e consumo ético e solidário, trocas solidárias com moeda social e atividades de formação e interação. Os produtos oferecidos na Feira são de procedência ecológica. A organização do evento trabalha com a teoria e a prática, articulando campo, cidade e as diferentes culturas e etnias. São expostos para comercialização na Feira cerca de 10 mil produtos, entre agroindústria familiar, artesanato, alimentação, hortifrutigranjeiros, plantas ornamen-
tais, serviços e produtos de povos indígenas. O ex-governador Olívio Dutra é outro que se soma às vozes que apoiam e valorizam o evento que, ao longo dos anos, tem trazido reconhecimento à Santa Maria e ao Estado em nível nacional e internacional: “A Feicoop é uma iniciativa que instiga a cidadania, de construção pela base de uma democracia que não seja apenas no discurso ou na letra da lei, mas que seja vivida e fluída por milhares de pessoas”. Quanto ao desafio da gestão da feira de agregar forças em diversas instâncias para além dos governos estadual e federal que se omitem em estar presentes ao evento, desafia: “Nós devemos assumir o nosso papel de sujeitos e não objetos da política, e garantir que movimentos e ideias como estas jamais feneçam, ao contrário, se fortaleçam, criando um fio de solidariedade que se estenda e não se rompa nunca”.
É um jeito diferente de produzir, de comprar, de trocar, de vender, de consumir produtos, oferecer e receber crédito. O que move esta economia é o desejo de que não existam excluídos, que a riqueza produzida no trabalho seja partilhada e que todos tenham qualidade de vida. A Economia Solidária é também uma estratégica de desenvolvimento sustentável que considera todas as dimensões (econômica, social, cultural, ambiental, política, etc).
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PORTO ALEGRE,
11 A2019 31 DE JULHO |DE 2019 ENCARTE ESPECIAL FEICOOP - JULHO 2019
Mais de 300 mil visitantes são aguardados em Santa Maria Durante quatro dias, a cidade gaúcha será a capital mundial da economia solidária
Fotos: divulgação
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partir desta quinta-feira, 11, quando serão recepcionadas as caravanas de participantes da 26ª Feicoop, a Feira Internacional de Cooperativismo e Economia Solidária, Santa Maria se torna a capital internacional da Economia Solidária. Conforme tem expressado os organizadores, a expectativa é que seja ultrapassada a marca obtida na feira jubilar de 2018 e para atingir mais de 300 mil participantes até o encerramento da feira, no final da tarde do domingo, 14. É o maior evento de economia solidária da América Latina. Distingue-se dos demais por juntar no mesmo ambiente uma feira com oferta de 10 mil produtos e o debate de temas como organização social, educação alimentar, sustentabilidade, reforma agrária, cooperativismo, agroecologia, entre outros. No total, serão 67 atividades programadas, como seminários, oficinas, reuniões, debates, audiência pública e encontros. “Seguimos a metodologia organizativa do Fórum Social Mundial, com eventos autogestionários, ou seja, nós organizamos, articulamos e fomentamos a Feicoop, mas as atividades são coordenadas, gerenciadas e motivadas pelos seus proponentes”, explica a coordenadora do evento, irmã Lourdes Dill. Algumas particularidades chamam atenção: embora exista comercialização de bebidas alcóolicas artesanais (vinhos, aguardentes e cervejas), o consumo no ambiente da feira é proibido. Também não é permitida a comercialização e consumo de cigarros e de refrigerantes industrializados. Na praça de alimentação são fornecidas bebidas quentes (café, chocolates e
Feira enfrenta desafios para se manter como a principal referência em economia solidária na América Latina assemelhados) e sucos naturais. A água também não é comercializada, mas disponibilizada livremente em pontos estratégicos do evento, sendo incentivados os participantes a trazer seus copos ou canecas para evitar o acúmulo de produtos descartáveis. A Feicoop também é sinônimo de cultura. Nesta edição, serão 57 atividades culturais, como lançamento de livros, gravação de programas, apresentações musicais e exibição de vídeos e documentários sobre Economia Solidária. A organização está a cargo do Projeto Esperança/Cooesperança e Banco da Esperança, braços da Arquidiocese de Santa Maria; Cáritas Brasileira e Cáritas Regional Rio Grande do Sul; Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); e Prefeitura Municipal de Santa Maria, com apoio de diversas entidades e instituições. Confira no site do Brasil de Fato (www.brasildefators. com.br) e no site do Projeto Esperança/ Coopesperança (www.esperancacooesperanca.org) ou ainda nas nossas redes sociais a programação completa dos seminários e oficinas, bem como as atividades culturais previstas ao longo dos 4 dias de Feicoop.
Rede Ideia garante a participação de seus grupos
Empreendimentos de ecosol são fortalecidos pelas ações em rede
O
A Feicoop – Feira do Cooperativismo e Economia Solidária tem por objetivo congregar pessoas de vários países na perspectiva da pro-
moção da geração de trabalho e renda a partir de uma economia mais justa e solidária, bem como, o trabalho que a AVESOL realiza com seus grupos assessorados por meio da Rede Ideia, gerando espaços para que essa economia possa acontecer. Tendo ciência da importância desse momento de trocas e de comercialização solidária, há vários anos a Rede Ideia – AVESOL é a maior delegação de empreendimentos organizados que participa da Feicoop. Por isso, visando a participação nos dias 11 a 14 de julho em Santa Maria, a Rede Ideia vem desde o começo do ano se articulando para que seus grupos integrantes se façam presentes na Feicoop 2019. Nesse viés, foi criada uma rifa com 30 prêmios, que possibilitou que cada grupo integrante da Rede Ideia conseguisse custear (ou ajudar no custeio) ao menos dois representantes seus junto à caravana da Rede Ideia para Santa Maria. Além da representação na parte de comercialização da Feicoop 2019, a AVESOL também estará junto na mesa de debates do Seminário Nacional sobre Reciclagem, bandeira de luta dos ambientalistas contra e incineração, promovido pelo Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis – MNCR e outras organizações, nos espaços de análise de conjuntura e de reuniões promovidos pelos Fóruns Gaúcho e Brasileiro
Mais de 300 mil pessoas passaram pelos corredores da Feicoop no ano passado
de Economia Solidária, o qual a AVESOL integra.
PORTO ALEGRE, ESPECIAL FEICOOP 2019 - RS - JULHO | 2019 11ENCARTE A 31 DE JULHO DE 2019
Tudo o que você precisa saber sobre a 26ª FEICOOP
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A FEIRA
A Feicoop é uma grande escola de organização, formação de convivência, do voluntariado e dos Movimentos Sociais e Economia Solidária. São 26 anos de construção coletiva e interativa. É um braço do Fórum Social Mundial, que constrói um “Outro Mundo Possível” e uma “Outra Economia que já Acontece!”.
26ª EDIÇÃO
A 26ª Feicoop será realizada de 11 a 14 de julho de 2019, no Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, em Santa Maria-RS, com o tema "Construindo a sociedade do bem viver: por uma ética planetária". A entrada é gratuita.
LOCALIZAÇÃO
A maioria dos eventos da Feicoop ocorre em três ambientes interligados: o Parque da Medianeira, onde são instaladas as tendas dos seminários, o palco principal e a praça de alimentação; o Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, onde se concentra a feira de produtos em pavilhões; e o Colégio Irmão José Otão, cujas salas de aula recebem oficinas, reuniões e encontros.
HORÁRIOS
Quinta-feira (11): Dia de chegada de caravanas. Não ocorre comercialização de produtos, apenas seminários de formação em Economia Solidária. Sexta-feira (12): 7h30min às 20h. Sábado (13): 7h30min às 20h. Domingo (14): 7h30min às 18h.
ALIMENTAÇÃO
O almoço (R$ 15,00) será servido entre 11h30min e 14h. Cada almoço dá direito a um pedaço de carne. Se a pessoa desejar um segundo pedaço, deve adquirir um tíquete no valor de R$ 2,00. A feira contará ainda com Praça de Alimentação, junto ao palco principal, onde são servidos lanches variados.
Produção agroecológica mostra sua força no espaço de comercialização da feira
CAMPANHA
Devido à falta de recursos para realização da 26ª Feicoop, o Projeto Esperança/Cooesperança e Cáritas Rio Grande do Sul desenvolvem a campanha Juntos pela Feicoop. A iniciativa visa obter recursos para garantir a estrutura física e logística da Feira. Doações podem ser feitas, até o dia 31/07/19, pelo site http:// caritasrs.colabore.org/Feicoop ou por depósito na conta corrente 30565-0 (Cooesperança), agência 0126 (Banco do Brasil) - CNPJ 93155067/0001.86.
INFORMAÇÕES
Para mais informações sobre a 26ª Feicoop, entre em contato com o Projeto Esperança/Cooesperança pelo telefone (55) 3219-4599 ou pelo e-mail projeto@esperancacooesperanca.org.br ou no www. esperancacooesperanca.org.br.
Participação de empreendimentos da economia solidária na feira popular é marca registrada da Feicoop
Povos tradicionais de matriz africana também tem forte participação na Feicoop
Almoço coletivo reune todos em volta da mesa, para a partilha do alimento e das melhores histórias
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PORTO ALEGRE,
11 A2019 31 DE JULHO |DE 2019 ENCARTE ESPECIAL FEICOOP - JULHO 2019
Brasil de Fato comemora 1 ano de circulação
Juventude marca posição em acampamento realizado em paralelo à programação da feira
Em 2018 o jornal Brasil de Fato teve sua primeira edição lançada no palco da Feicoop
E
m 2018, a programação da Feicoop contemplou o pré-lançamento do jornal Brasil de Fato/RS. De lá para cá, foram 24 edições, publicadas
em periodicidade quinzenal, com tiragem de 25 mil exemplares distribuídos gratuitamente em todo o Estado. Fomentou “uma visão popular do Rio Grande do Sul, do Brasil e do Mundo” através de um noticioso produzido por trabalhadores para trabalhadores. Em 2019 novamente estaremos no evento, celebrando esse primeiro
aniversário e reafirmando nossas páginas como um espaço de resistência e também de construção. Além da distribuição de uma edição especial do jornal para os participantes da feira, é aguardada a presença do músico Zé Martins para interpretar a canção especialmente composta em homenagem ao jornal.
Levante Popular da Juventude realiza acampamento O
Levante Popular da Juventude realiza em Santa Maria mais uma edição do seu acampamento estadual, trazendo como lema “Resistir
e lutar: juventude nas ruas por um projeto popular”. A expectativa dos organizadores é reunir 400 jovens de todas as regiões do Rio Grande para debater os desafios da juventude diante da conjuntura política nacional. Serão três dias com espaços de debate, produção artística e cultural, oficinas diversas que contribuam para a compreensão de que as respostas para a complexidade do momento político que vive o Brasil dependem da organização popular. Além disso, o método de organização do acampamento, com a divisão coletiva das tarefas, proporciona aos jovens a experiência de protagonizar processos de mobilização e organização popular. Fotos: arquivo-ICPJ
MST mostra a força da produção da reforma agrária Instituto Cultural Padre Josimo leva à Feicoop suas publicações e apresenta seus projetos
O trabalho das mulheres assentadas é um destaque especial no espaço do MST na Feicoop
O
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) apresentará mais uma edição do chamado “Túnel da Reforma Agrária”. Nele,
MPA participa defendendo a bandeira da Agroecologia F
omentando a participação de iniciativas camponesas no espaço da feira e demarcando presença ainda com o lançamento de dois livros durante
a programação da Feicoop, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
colocará em exposição e comercialização dezenas de itens produzidos
reforça a presença da bandeira da Agroecologia. A tradicional exposição e
nos assentamentos gaúchos. Para os representantes do MST, retornar
partilha de sementes agrícolas preservadas e multiplicadas pelos guardiões
à Feicoop é reafirmar o projeto de agricultura camponesa, a base de
de sementes também terá espaço, assim como a comercialização de livros
produção agroecológica, a diversidade para comercializar e alimentar
editados pelo Instituto Cultural Padre Josimo. A juventude também terá
o povo brasileiro. Também se colocará em foco a desconstituição dos
papel de destaque com a Caravana Nacional de Luta Camponesa Alexina
programas voltados à agricultura familiar por parte do governo federal
Crespo, que está percorrendo as regiões do estado onde o movimento tem
e a resposta dos movimentos populares do campo que reafirmam a re-
base e promoverá intervenções culturais ao longo de toda a programação
sistência ativa em relação ao projeto de agricultura que se tenta impor.
e em diversos espaços da Feicoop.
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