Jornal Brasil de Fato / RS - Número 29

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Foto: Alass Derivas | @derivajornalismo

RIO GRANDE DO SUL

ENTREVISTA: “UM MILHÃO DE GAÚCHOS VIVEM COM ATÉ R$ 89 POR MÊS”, DIZ O PRESIDENTE DO CONSEA/RS PÁGIN A 3

18 de outubro de 2021 distribuição gratuita brasildefato.com.br

/brasildefators

Foto: Fabiana Reinholz

COZINHA SOLIDÁRIA DA AZENHA É DESPEJADA DE ESPAÇO ABANDONADO EM PORTO ALEGRE PÁGIN A 4

brasildefato.rs

@BrasildeFatoRS

Ano 3 | Número 29

Foto: Jonathan Heckler

QUANDO O POBRE

AJUDA O POBRE

ESPALHADAS PELO BRASIL, AS COZINHAS SOLIDÁRIAS MATAM A FOME DE MILHÕES E IMPULSIONAM A RETOMADA DA PARTICIPAÇÃO POPULAR NA PERIFERIA. PÁGINA CENTRAL


2 Foto: Carolina Lima

EDIÇÃO N O 29 - 18 DE OUTUBRO DE 2021 - W W W.BRASILDEFATORS.COM.BR

CHARGE | Santiago

Cozinha Solidária da Vila Cruzeiro

Editorial

As cozinhas que servem esperança ▶ Vivemos uma safra de notícias ruins e, talvez por isso, uma boa notícia receba menos atenção do que deveria. É um processo silencioso em curso nas bordas da sociedade. Acontece longe dos olhos da mídia no entorno das grandes cidades. Nasceu em 2020 quando a pandemia se alastrou pelo país. Ao mesmo tempo, esparramou-se com ela uma resposta às populações abandonadas pelo poder público e encurraladas pelo vírus e pela fome. São as cozinhas solidárias. Como contamos nesta edição, são elas que matam a fome daquelas famílias mais desprotegidas diante do desemprego, da desassistência e do desprezo do governo federal e da maioria dos governadores e prefeitos. Nelas, a iniciativa parte dos pobres em favor dos mais pobres. Boa parte dos alimentos são doados pelos assentados da reforma agrária e os agricultores familiares. Aos mutirões não se misturam os banqueiros, ruralistas ou grandes empresários. São sempre os pequenos ajudando os pequenos: movimentos, sindicatos, centrais, associações, igrejas. As cozinhas, porém, não servem apenas comida. Gera-se nelas também outro alimento preparado não pelo fogo, mas pelo calor humano. Se os movimentos reencontram ao redor dos fogões as velhas raízes do trabalho de base e do compromisso social, aquelas pessoas que acorrem à cozinha do bairro por um prato de comida encontram, com frequência, algo mais do que esperavam. Quem vive este cotidiano descreve as cozinhas como um espaço de acolhida e respeito. Nelas aparecem, às vezes, pessoas deprimidas, envergonhadas da sua condição e que necessitam, além do alimento, de um gesto ou palavra. Afora o feijão e do arroz, recebem orientação, informações, uma roupa. Algumas retornam no dia seguinte. Não vêm só em busca de outro prato, mas para se juntarem à tarefa de cozinhar. Vêm carregadas de esperança. É mais uma evidência de que o caminho para o Brasil cumprir seu destino de país decente passa obrigatoriamente pela periferia.

www.brasildefators.com.br (51) 98191 7903 redacaors@brasildefato.com.br /brasildefators @BrasildeFatoRS brasildefato.rs CONSELHO EDITORIAL Danieli Cazarotto, Cedenir Oliveira, Frei Sergio Görgen, Saraí Brixner, Enio Santos, Neide Zanon, Ademir Wiederkehr, Luiz Muller, Télia Negrão, Diva da Costa, Grazielli Berticelli, Bernadete Menezes, Gerson José Ferrari, Salete Carollo, Ronaldo Schaefer, Vito Giannotti (In memoriam) | EDIÇÃO Ayrton Centeno (DRT3314), Katia Marko (DRT7969) | REDAÇÃO NESTA EDIÇÃO Ayrton Centeno, Fabiana Reinholz, Katia Marko, Marcelo Ferreira, Marcos Corbari, Pedro Neves e Walmaro Paz. | DIAGRAMAÇÃO Marcelo Souza | DISTRIBUIÇÃO Ronaldo Schaefer e Saraí Brixner | IMPRESSÃO Gazeta do Sul | TIRAGEM 25 mil exemplares.

Opinião

Fome zero pela primeira vez SELVINO HECK * ▶ 1990, Lula, derrotado nas elei-

ções presidenciais de 1989, institui o Governo Paralelo. Convida Herbert de Souza, o Betinho, para construir, com a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, um Programa de Segurança Alimentar e Nutricional, o primeiro que o Brasil conheceu. É criado o Consea, Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, e realiza-se a primeira Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional em 1994. Em 1995, Fernando Henrique Cardoso, eleito presidente, extingue o Consea. 2003, com 32 milhões de brasileiras-os passando fome, eleito presidente, Lula institui o Programa Fome Zero, o Programa de sua vida, recria o Consea, junto com o Mesa, o Copo, o Prato, o Sal e o Talher. Em 2004, acontece a segunda Conferência Nacional de Segurança Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Surgem as políticas de enfrentamento da fome, em diálogo permanente com a sociedade e com participação popular: o Auxílio Alimentação, depois Bolsa Família, o PAA, Programa de Aquisição de Alimentos, a ampliação do PNAE, Programa Nacional de Alimentação Escolar, as políticas e programas de Economia Solidária, o apoio à agricultura familiar e camponesa. Sempre junto com políticas e programas que visam, além de extinguir a fome, também saciar a sede de beleza, como diz

Frei Betto, com a criação da Rede de Educação Cidadã, Recid, e outras redes de formação com as mulheres, a juventude, negros e negras, trabalhadoras (es). São realizadas mais Conferências nacionais, surgem os Conseas estaduais e municipais, é construído o Plansan, Plano Nacional de Segurança Nacional e Nutricional, o Planapo, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica. Em 2014, o Brasil é declarado, pela primeira vez na história, fora do Mapa da Fome pela FAO/ONU, já no governo Dilma Rousseff. O golpe de 2016 fez retroceder, quando não extinguir, todas estas políticas e programas de combate à fome. No atual governo neofascista e genocida, o Consea nacional mais uma vez é extinto. O Brasil volta ao Mapa da Fome. A sociedade resiste e está realizando a Conferência Popular de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional em 2021, cria os Comitês Populares de Combate à Fome, constrói as Cozinhas Solidárias e Comunitárias. Organizações sociais, movimentos populares, movimento sindical, ONGs, Conseas, Igrejas e Pastorais organizam o enfrentamento da fome, da miséria e do desemprego. Em 2021, apesar de tudo, na boa luta, Esperançar. Outubro de dois mil e vinte um * Membro da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política e da Mesa Diretiva do ConseaRS


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Foto: Carolina Lima

Entrevista - Juliano Ferreira de Sá

“A fome voltou não pela pandemia, mas pelo desmonte do Estado” Presidente do Consea/RS diz que o retrocesso começou com o golpe de 2016 e, já em 2018, dez milhões de brasileiros não tinham o que comer ▶ Tão logo pisou no Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Era janeiro de 2019 e, já naquele momento, dez milhões de brasileiros e brasileiras não tinham o que comer. A tarefa sobrou para os Conseas estaduais. É o que conta Juliano Ferreira de Sá que preside o Consea/RS. No estado, o conselho se uniu à Caritas para criar o Comitê de Combate à Fome, que já arrecadou e repartiu 700 toneladas de alimentos com mais de 65 mil famílias. A seguir, ele levanta os números do drama, mas conta também da comovente resposta dos pobres que se uniram para ajudar seus iguais. AYRTON CENTENO PORTO ALEGRE - RS

Brasil de Fato RS – Movimentos sociais, associações, sindicatos e centrais sindicais, igrejas, pastorais são quem garantem a distribuição de cestas básicas e quentinhas na periferia. A pandemia mostrou que são os pobres que ajudam os pobres? Juliano de Sá – A pandemia revelou os limites do Estado brasileiro. Mas revelou a solidariedade.

Juliano Ferreira de Sá é presidente do Consea/RS

BdF RS – Qual o volume de alimentos entregues à população carente durante a pandemia e de onde veio? Juliano de Sá – São milhares de iniciativas, também de anônimos. Desde o começo da pandemia, o MST doou mais de seis mil toneladas de alimentos Brasil afora. E também o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Aqui, o Consea/RS e a Cáritas criaram o Comitê de Combate à Fome que já arrecadou e distribuiu mais de 700 toneladas para mais de 65 mil famílias. No começo, distribuímos cestas básicas, mas hoje, pelo preço do gás de cozinha, são as cozinhas comunitárias que garantem um prato para quem ganha o alimento e não tem como cozinhá-lo.

Boa parte dos alimentos doados vem dos agricultores e agricultoras familiares e dos assentados da reforma agrária. O pobre doando o pouco que tem.

DEPOIS DO GOLPE, O PRIMEIRO ATO DO CONGRESSO FOI APROVAR A PEC DA MORTE Foto:Divulgação Consea-RS

Comitê de Combate à Fome já arrecadou e repartiu 700 toneladas de alimentos com mais de 65 mil famílias

BdF RS – Como o Brasil retornou ao Mapa da Fome? Juliano de Sá – O Brasil foi o país que mais diminuiu a desigualdade. Em 2014, saiu do Mapa da Fome. Chegou-se a 98,3% da população vivendo em segurança alimentar. O país voltou ao Mapa da Fome não por causa da pandemia, mas pelo fim das políticas públicas e o desmonte do Estado. Tem uma questão central aí que é o golpe contra a presidente Dilma em 2016. O primeiro ato do Congresso foi a PEC da Morte, a emenda constitucional 95, que congelou por 20 anos o teto dos gastos públicos. Entre 2017 e 2018, o Brasil voltou dez anos. No começo de 2018, já tinha 10 milhões passando fome. No

UM MILHÃO DE GAÚCHOS VIVEM COM ATÉ R$ 89 POR MÊS

A GENTE AINDA NÃO VIU UM CAMINHÃO DO AGRONEGÓCIO CHEGANDO NA PERIFERIA final de 2020, já havia 19,8 milhões. Hoje está pior. BdF RS – O Brasil tem fome, mas, ao mesmo tempo, bate recorde em produção agrícola. Como explica essa contradição? Juliano de Sá – O agronegócio não se interessa em produzir comida e sim commodities. Setenta por cento do alimento que chega na mesa da população vem da agricultura familiar. A gente ainda não viu um caminhão do agronegócio chegando na periferia. Viu só os caminhões dos assentados, dos pequenos agricultores... BdF RS – A ex-ministra Tereza Campello calcula que, hoje, mais de 55 milhões de brasileiros não comem o suficiente e avalia que a situação “tende a piorar”. Vamos piorar mais? Juliano de Sá – Mais da metade da população vive algum tipo de insegurança alimentar. O preço (dos alimentos) aumentou porque o Estado não fez as compras que formam o estoque e regulam o mercado. E a indústria agroalimentar fez especulação. Pelos dados do CAD Único (Cadastro Único do governo federal), mais de um milhão de gaúchos vivem com até R$ 89 por mês. São números defasados. Hoje devem ser bem piores.


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Mutirões contra a fome se espal

Porto Alegre, Pelotas e São Leopoldo são apenas alguns dos exemplos de como as co onde 19 milhões não têm o que comer Fotos: Maiara Rauber

FABIANA REINHOLZ E PEDRO NEVES ▶ O Brasil vive um cenário

alarmante de aumento da fome. Estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PenSSAN) mostra que, atualmente, no Brasil há cerca de 19 milhões de pessoas passando fome. Além destas, outras 43 milhões não têm acesso pleno à alimentação. Como o poder público não dá conta de enfrentar a situação, seja por incapacidade ou ineficiência ou mesmo por falta de interesse, as cozinhas solidárias e comunitárias tomaram para si a tarefa. São montadas por movimentos sociais, organizações independentes e comunidades organizadas. Em Porto Alegre, há ações deste tipo, por exemplo, na Grande Cruzeiro e no projeto do Coletivo Multiplicidade que tem diversas cozinhas comunitárias distribuídas pela cidade. Há também a ONG Misturai, que entrega quentinhas em comunidades carentes e para pessoas em situação de rua e já distribuiu mais de 170 mil refeições. No Brasil, o Movimento dos (as) Trabalhadores (as) Rurais Sem Terra (MST) já doou seis mil toneladas de alimentos e um milhão de marmitas. Também o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) se somou ao mutirão. Os alimentos são entregues sob a forma de cestas básicas ou preparados e entregues em quentinhas. Além disso, as cozinhas têm se tornado um espaço de acolhimento e reorganização do trabalho de base nas comunidades. Brasil de Fato RS buscou contato com algumas destas iniciativas para demonstrar como tem sido este desafio.

As cozinhas solidárias funcionam organizadas por núcleos, onde os voluntários atuam preparando e entregando as marmitas

Na Lomba, Marta fica faceira na hora de buscar a quentinha ▶ Na zona Leste, a região da Lomba do Pinheiro é uma das mais populosas (62 mil habitantes) e pobres da capital gaúcha. Lá, nove cozinhas comunitárias solidárias atendem a dez comunidades da região. “A cozinha é muito importante para as pessoas neste momento difícil. Tu vê ali casas com oito pessoas. A comunidade fica bem faceira no dia de ir buscar, porque tudo ajuda nessa dificuldade”, afirma Marta Jurema Lima Oliveira, de 53 anos, mãe de quatro filhos e uma das moradoras beneficiadas.

“UM POUQUINHO DE UM É O MUITO DE TODOS”

Isabel Adriana Klein, que ajuda na coordenação das atividades e é moradora na comunidade de Santo

As cozinhas existem desde o início da pandemia, em março de 2020, entregando 1,2 mil refeições semanais

Antônio, explica que as cozinhas funcionam organizadas por núcleos, onde os voluntários atuam preparando os alimentos. Além disso, há um núcleo específico para a tarefa da arrecadação e distribuição de alimentos, roupas e calçados. As cozinhas existem desde o início da pandemia, em

março de 2020, preparando alimentos variados em dias da semana, somando 1,2 mil refeições semanais. Isabel repara que a continuidade do trabalho só é possível devido ao apoio da sociedade com doações e trabalho voluntário. “Temos um lema que é ´um pouquinho de um é o

muito de todos`. Isto funciona dentro da comunidade. Ela consegue olhar para o próximo com um olhar de solidariedade”, comenta. Assim como Isabel, Zailde Silva coordena uma das cozinhas da região. Moradora do local há 45 anos, dedica-se há mais de 20 às ações comunitárias. Ela trabalha na primeira cozinha que foi instalada pelo Comitê Gaúcho de Combate à Fome e contra o Vírus da Lomba do Pinheiro. Conta que já tinha o hábito de todos os anos, no inverno, preparar uma comida mais quente para as pessoas em situação de dificuldade. “Com a chegada da pandemia estávamos trazendo comida pronta da Igreja da Paz. Então, sugeri ao nosso grupo que cada comunidade se organizasse e que o Comitê Gaúcho de Combate à Fome desse o apoio”, explica.


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lham pelo Rio Grande

Kilombo Urbano luta contra a fome em Pelotas

ozinhas solidárias atuam no enfrentamento da crise no país,

Foto: Ocupação Canto de Conexão

Na Azenha, nova vida para um vazio urbano

“VAMOS COZINHAR NA ESQUINA SE FOR NECESSÁRIO”

“A fome tá batendo na porta de todo mundo, trabalhadores e especialmente pessoas em situação de rua. O que não podemos de forma alguma é recuar no combate à fome”, diz Juliana Ferreira da Mota, uma das coordenadoras da cozinha. “Sairemos cozinhando na esquina se for necessário, mas

Foto: Jorge Leão

▶ Era 26 de setembro quando o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST/RS) ocupou um imóvel da União no bairro Azenha, em Porto Alegre. O prédio estava abandonado havia duas décadas. Surgiu ali a Cozinha Solidária da Azenha que, em 18 dias, distribuiu mais de três mil marmitas. No dia seguinte à ocupação, o governo federal pediu a reintegração de posse. A juíza federal Ana Maria Wickert Theisen aceitou o pedido e a cozinha foi despejada no dia 13 deste mês. O imóvel ocupado pelo MTST foi a leilão no mesmo dia.

A Geladeira Comunitária é usada para fazer a distribuição semanal de refeições

▶ A Ocupação Canto de Conexão fica

Cozinha Solidária da Azenha distribuiu mais de 3 mil marmitas em 18 dias

as pessoas não ficarão sem comer um só dia”, reforça. Para ela “pautar a fome no país que já tem 55% de pessoas que passaram por algum grau de insegurança alimentar é urgente”. Juliana nota que “além da marmita, é um espaço de organização popular. As pessoas conversam aqui, trazem demandas para o movimento”. Morador de rua, Alexandre da Silva, conhecido como Português,

50 anos, é uma das várias pessoas que se beneficiaram da cozinha solidária. “É um trabalho bem interessante para a sociedade. Às vezes, não tem comida para os moradores [de rua] comer. [Além disso] a brigada tira os pertences dos moradores que estão embaixo dos viadutos”, afirma ele, que também integra o Movimento Nacional de População de Rua (MNPR).

Os três eixos de São Leopoldo: cozinhas, hortas e cestas básicas tropolitana, a realidade da fome ficou evidente na pandemia. É o que comentam Cristiano Schumacher e Karina Kamillo (ambos do Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM), juntamente com Marilene Maia, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Juntos, os três mostraram um pouco das experiências de solidariedade do município. Na cidade, o MNLM atua na Rede Solidária São Léo, juntamente com as Missionárias do Cristo Ressuscitado, da Unisinos, e lideranças de 15 comunidades. Nestes locais, existem ocupações e assentamentos urbanos e a Rede atua em atividades de segurança alimentar e combate à fome.

M A IS DE 40 MIL CE S TA S DIS TRIBUÍDA S

A atuação acontece em três eixos: as cozinhas comunitárias, as hortas comunitárias e a distribuição de cestas básicas. Este último eixo, inclusive, obteve o apoio da

Foto: MNLM São Leopoldo

▶ Em São Leopoldo, na Região Me-

MNLM atua na Rede Solidária São Léo, com as Missionárias do Cristo Ressuscitado, da Unisinos, e lideranças de 15 comunidades

prefeitura local, que adquire alimentos da agricultura familiar e os repassa para serem distribuídos nos bairros. Assim, ao longo da pandemia, já foram distribuídas mais de 40 mil cestas. Quanto às cozinhas solidárias, os três militantes contam que elas já existiam no processo de combate à pobreza em São Leopoldo. Porém, foi necessário um esforço redobrado diante dos desafios da pandemia.

Eles consideram que vão enfrentar “um período de muitas dificuldades com uma grave crise econômica e social somada a um governo fascista”. No entendimento dos três, “os movimentos populares e as organizações da sociedade civil comprometidas com a superação da fome e da miséria devem pensar em estratégias de sobrevivência e autonomia das comunidades em seus territórios”.

em Pelotas, na Metade Sul do estado. O prédio que ocupam estava abandonado havia mais de uma década. Em 2017, um grupo de estudantes e moradores ali se instalou. Segundo Giovani Lessa, um dos ocupantes, o local era um depósito de lixo e estava em péssimas condições. Após reformas tocadas pelos próprios moradores, o lugar ganhou outra cara. Em pouco tempo, os moradores passaram a se reconhecer como um “Kilombo Urbano”, assim mesmo com K. Surgiu ali um centro cultural. Na pandemia, com a impossibilidade da circulação de pessoas, o foco se voltou para ações de combate à fome. Articulados com sindicatos, entre eles o dos professores e o dos servidores técnico-administrativos da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), o grupo arrecada alimentos e prepara refeições a serem entregues principalmente para a população pobre da região portuária e seus arredores.

SÃO SERVIDAS 40 QUENTINHAS TODO DOMINGO

No jornal que a ocupação passou a publicar, eles narram que “com a pandemia vimos muitas pessoas tendo suas vidas modificadas, assim como as nossas próprias. Nesse processo de ter que se proteger e, ao mesmo tempo, ter que estar na rua buscando a sobrevivência, percebemos a dificuldade e, do nosso modo, mesmo com poucos recursos, procuramos ajudar”. Atualmente, o Canto da Conexão serve 40 quentinhas todo domingo, juntamente com o projeto Parceiros na Caridade. Além disso, destacam a ajuda dos povos de terreiro, praticantes das religiões de matriz africana, que frequentemente arrecadam alimentos para serem doados ao projeto.


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Solidariedade

No vácuo das ações do governo, movimentos levam toneladas de alimentos para a periferia Foto: Maiara Rauber

Na Capital e no interior gaúcho, movimentos populares, sindicatos, centrais e organizações diversas combatem a fome e discutem um novo país WÁLMARO PAZ PORTO ALEGRE / RS

▶ Com a ausência ou insuficiência das ações dos governos federal, estadual e municipais para socorrer a periferia, os movimentos populares estão arrecadando e distribuindo alimentos nas vilas e bairros das grandes cidades gaúchas. Mais de 700 toneladas de alimentos já foram entregues. Na tarefa estão empenhadas, por exemplo, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e 20 de seus sindicatos, o Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito. O Comitê em Defesa da Democracia já arrecadou mais de R$ 100 mil, transformados em cestas básicas, botijões de gás, fogões, panelas, sabão e detergente. É o que conta sua coordenadora financeira, Sueli Mosqueur. A advogada Jucemara Beltrame lembra que em março de 2020 eles começaram este trabalho com as comunidades carentes de Porto Alegre. Os critérios escolhidos para selecionar as comunidades foram as regiões com menor índice

de Desenvolvimento Humano (IDH) da capital gaúcha. Ilhas do Guaíba, Campo das Tuca, Lomba do Pinheiro, Vila Cruzeiro, comunidades indígenas e quilombolas têm sido auxiliadas.

COMIDA E CON V ER S A S SOBRE O BR A SIL

A CUT e seus sindicatos filiados já doaram mais de 200 toneladas de cestas básicas para comunidades necessitadas de Porto Alegre, Rio Grande, Caxias do Sul, Pelotas, Santa Maria e Erechim. Segundo o presidente da CUT/RS, Amarildo Cenci, essa atividade se somou, no início desse ano, “com as cozinhas comunitárias, com eventos, como um almoço para juntar as comunidades em torno de um prato, para conversar e se fortalecer como sociedade, como povo”. Na sua avaliação, “isto tem dado muito certo, pois tem estimulado e desenvolvido lideranças comunitárias. Tem fortalecido essa experiência de ter pessoas em torno de uma mesa como a gente diz, para debater tantas outras coisas, como agora estamos tratando do plebiscito popular que questiona as privatizações”.

MST/RS já doou mais de 480 toneladas de alimentos em várias comunidades

CADA FAMÍLIA DOA UM POUCO DA SUA PRODUÇÃO ▶ Representando 13,8 mil

famílias de 300 assentamentos de dez regiões do território gaúcho, o MST/ RS já doou mais de 480 toneladas de alimentos, uma lista que inclui 45 produtos. Segundo Gerônimo Pereira da Silva, assentado em Livramento e dirigente estadual do mo-

vimento, é uma lista de 45 produtos que vão desde o arroz, feijão, carne, frutas, hortaliças e até leite em pó. Ele contou que somente na Região Metropolitana de Porto Alegre, o movimento vem mantendo a distribuição em 30 cozinhas comunitárias e 40 associações de moradores.

“Estes produtos são produzidos a mais pelos assentados e doados como contribuição, não se trata de sobras, cada família doa uma percentagem de sua produção”, explicou. Gerônimo foi deslocado de sua região para coordenar esta ação de combate à fome no início da pandemia.

Foto: Carolina Lima

Foto: Divulgação Comitê

Projeto CUT com a comunidade distribuiu marmitas na Vila Barracão

Comitê em Defesa da Democracia entregou cestas para comunidades carentes de Porto Alegre


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Arte e Cultura

Armazém do Campo de Porto Alegre recebe a Semana latinoamericana

Evento lembra o assassinato de Che Guevara em 9 de outubro e a Semana Nacional da Cultura Cubana KATIA MARKO PORTO ALEGRE / RS ▶ Inaugurado em junho deste ano, o Armazém do Campo de Porto Alegre tem aberto suas portas para receber eventos de arte e cultura. De 17 a 23 de outubro realiza a Semana Latinoamericana, em parceria com a Associação Cultural José Marti (ACJM), o MST, a Rede Soberania e o Brasil de Fato RS. Segundo a coordenadora do Armazém do Campo de Porto Alegre, Danieli Cazarotto, a proposta é “nos aproximarmos de Cuba, conhecendo a história e a luta de um povo livre, soberano que tanto nos ensina e inspira”. Danieli afirma que Cuba nos ensina diariamente o valor da solidariedade. “A escolha da programação é tentar nesses dias trazer os

temas da educação, da cultura e da história, mas também das experiências de organização das cooperativas e a produção de alimento em Cuba, e o quanto o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) aprende com essas experiências. Cuba implementou um modelo de agricultura baseado na agroecologia que tornou a agricultura familiar a solução para a garantia da soberania alimentar no país.” Para Danieli, o Armazém do Campo tem esse papel de trazer o debate e as experiências sobre a produção de alimento saudável. As atividades serão presenciais e com transmissão ao vivo pelo Facebook e Youtube do Brasil de Fato RS, Rede Soberania, Armazém do Campo de POA, Associação Cultural José Marti e Mídia Sem Terra. O Armazém do Campo

fica na Rua José do Patrocínio, nº 888, na Cidade Baixa, em Porto Alegre.

RO L E

C UL T URAL

TRÊS GERAÇÕES DE MULHERES

▶ Nova produção do Projeto GOMPA, A Mãe da Mãe da Menina traz diferentes visões de três gerações interpretadas por Sandra Dani, Liane Venturella e Laura Hickmann. Dirigida por Camila Bauer, a obra audiovisual foi totalmente construída a partir de improvisações das atrizes. A inspiração veio de entrevistas realizadas com 18 mulheres durante o processo de criação, que teve a dramaturgia composta a partir desses depoimentos. A estreia será no dia 27 de outubro, às 20h, com venda de ingressos pelo Canal Entreatos (www.entreatosdivulga.com.br/amaedamaedamenina). Olhando diretamente para a câmera, Ruth (San­dra), Marta (Liane) e Júlia (Laura) tornam o espectador cúmplice de seus desejos e frustrações. Mãe, filha e neta revelam percepções sobre cuidados, amor e laços familiares permeados pelo tempo que lhes atravessa e pelos não-ditos que caracterizam essas relações.

REGIÃO DA CAMPANHA RECEBE CASA DE CULTURA ▶ Após 10 meses de trabalho, a Casa de Cultura Juarez Teixeira (CCJT) abre oficialmente suas portas dia 21 de outubro em Caçapava do Sul. A iniciativa - de caráter privado, mas sem fins lucrativos - pretende ser um espaço de arte, memória, cultura e convivência para a região. Por um lado, o espaço conta como era a vida cotidiana no campo e na cidade nos séculos XIX e XX por meio de uma coleção de mais 500 objetos do médico e pesquisador Juarez Teixeira, adquirida ao longo dos últimos 20 anos e oriunda de doações de amigos e outros colecionadores. Por outro, quer ser um ponto de cultura que também olha para o futuro, tanto que se inaugura com o lançamento oficial da Feira do Livro Sem Fronteiras e cinco sessões simultâneas de autógrafos. A abertura ocorrerá na semana de aniversário de Caçapava do Sul. A N I A R A É A M A S C O T E DA C A M PA N H A T R IB U TA R O S S U P E R- R I C O S. AC O M PA N H E N O S S A S R E D E S: facebook.com/tributar.os.super.ricos | @tributar.os.super.ricos @OsTributar |

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Atuação na comunidade

Ativismo solidário atende famílias abandonadas pelo Estado

“QUEM TEM FOME TEM PRESSA”

A frase é de Herbert de Souza, o Betinho, que liderou um movimento em 1993 que resultou na criação da Ação da Cidadania. Melissa Bargmann, coordenadora da Ação da Cidadania RS, explica que, em 2020, a insegurança alimentar e a fome no Brasil retornaram aos patamares próximos aos de 2004. Frente a isso, desde o início da pandemia, mais de 50 mil famílias foram auxiliadas no estado. “Neste ano de 2021 já estamos iniciando com uma das maiores campanhas de arrecadação de alimentos da América Latina, o Natal Sem Fome”, divulga Melissa. As doações devem ser realizadas pela internet, na página oficial da iniciativa: www.natalsemfome.org.br.

Voluntários já distribuíram mais de 87 mil cestas no RS Foto: Divulgação ICPJ

▶ No Rio Grande do Sul, organizações superam o abandono do Estado através de redes solidárias que reúnem movimentos sociais, entidades, igrejas, sindicatos, associações e quem mais estiver disposto a ajudar. Articulada no Comitê Gaúcho de Emergência no Combate à Fome junto da Ação da Cidadania RS e do Consea RS, a Cáritas Regional do RS chega em dezenas de municípios do Interior através das dioceses. Segundo a assessora da entidade Roseli Pereira Dias, do início da pandemia até meados de abril de 2021, voluntários distribuíram cerca de 87 mil cestas básicas no estado. Número que é ainda maior, já que as ações mais recentes ainda não foram contabilizadas. Como o caso da "Semana de Ativismo – Mutirão pela Vida de quem tem Fome", quando em muitas igrejas, durante as celebrações de Corpus Christi, os tradicionais tapetes ganharam versões feitas de alimentos e roupas doados, que chegaram a famílias em vulnerabilidade social. “Uma ação muito significativa, nas 15 dioceses” e que “ajudou a reanimar a solidariedade”, afirma Roseli. Além das ações concretas, foram feitas lives para debater as causas da fome e também anunciar “as inúmeras iniciativas que enfrentam, de forma solidária e comunitária, este contexto desumano”.

VOTE NO PLEBISCITO POPULAR ENTRE 16 E 24 DE OUTUBRO

Doações combatem a fome que retornou aos níveis de 2004 no Brasil

O ICPJ doou sementes crioulas para indígenas no Mato Grosso do Sul

PARTILHA DE ALIMENTOS E SEMENTES ▶ O Instituto Cultural Padre Josimo tem atuado, com apoio de diversas organizações, em duas frentes: partilha de alimentos e garantia de acesso a sementes crioulas para camponeses, quilombolas e indígenas. As ações iniciaram pela região da Campanha e foram estendidas até localidades no extremo Sul e Centro do estado, bem como até comunidades indígenas no Mato Grosso do Sul. Mais de 11 toneladas de alimentos foram levadas até comunidades periféricas, aldeamentos indígenas, quilombos, colônias de pescadores, desempregados, sem-teto e organizações sociais. As doações vieram

de famílias camponesas, pequenos agricultores e assentados da reforma agrária que não aceitam passivamente ver seus irmãos e irmãs passando por necessidade, explica o frei capuchinho Wilson Zanatta, que atua na coordenação das ações de mobilização social. Já o acesso às sementes crioulas visa garantir a produção de alimentos. “Com a omissão dos governos estadual e federal em atender as necessidades mais básicas dos pequenos agricultores, se faz necessária a articulação de ações como essas”, explica Frei Sérgio Görgen, coordenador do ICPJ.

Foto: Divulgação Caritas-RS

MARCELO FERREIRA E MARCOS CORBARI

Foto: Divulgação Consea/RS

A inflação e o desemprego se intensificaram na pandemia. São 19 milhões de pessoas em situação de fome no país. Não fosse a sociedade civil organizada, a situação seria ainda mais grave.

O Plebiscito Popular sobre as Privatizações de estatais gaúchas acontece entre os dias 16 e 24 de outubro para saber a opinião da população gaúcha. O objetivo é defender da privatização a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), a Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs) e o Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul). "Este plebiscito popular, além do trabalho pedagógico e de uma reconexão com a sociedade, é para dizer que não vamos permitir a venda do nosso patrimônio público”, explicam os organizadores.

PARA VOTAR ONLINE

O que é necessário para votar? Se cadastrar via o link https://decidimrs.com.br - Clique no botão “INSCREVER-SE” - No cadastro preencher seu nome; apelido (ao lado do @) seu nome e sobrenome, sem espaço, sem acento ou cedilha; e-mail; senha e confirmação; aceitar os termos de serviços e confirma; para sua segurança será enviado um e-mail de confirmação de cadastro; confirmar no seu e-mail pessoal e você poderá participar da votação.

PARA VOTAR PRESENCIAL

- Os locais de votação na sua cidade serão divulgados com antecedência através dos veículos de imprensa, das redes sociais e do serviço de carro de som. Terão locais fixos e urnas itinerantes. Os locais de votação também podem ser consultados no site www.plebiscitopopular.com.br

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