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Reputação
Fátima Sousa jornalista fs@briefing.pt
Londres é a capital mundial da lavagem de reputação? Governos acusados de violação dos direitos humanos estão a contratar consultoras de Relações Públicas, um fenómeno que está a gerar discussão, entre os que defendem o direito de lutar pela reputação e quem questiona os limites éticos deste negócio
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A face oculta do lobbying
Governos acusados de violação dos Direitos Humanos estão a contratar consultoras de Relações Públicas sediadas em Londres e Bruxelas para fazer lobby. Um fenómeno que está a gerar discussão, entre os que defendem o direito de lutar pela O agregador do marketing.
Indiscutível é a tendência para cada vez mais governos contratarem consultoras britânicas
reputação e quem questiona os limites éticos deste negócio. Mais ou menos públicos, os exemplos sucedem-se. Governos como os do Cazaquistão, Sri Lanka e Ruanda, acusados por organizações como as Nações Unidas e a Amnistia Inter-
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nacional de violação dos Direitos Humanos, estão a descobrir as potencialidades das Relações Públicas, contratando agências de renome para melhorar a sua imagem internacional. Bruxelas é um dos centros deste novo lobbying. É uma “face pouco conhecida”, mantida a salvo do escrutínio público pelo “silêncio das embaixadas e consultoras” de acordo com um relatório produzido em Maio último pelo Corporate Europe Observatory (CEO), organização que se dedica ao estudo dos grupos de pressão. Esta “subcontratação da diplomacia” nem está sempre relacionada com a necessidade de lavar a reputação (o relatório inclui o governo português e a Região Autónoma dos Açores). Mas, dos 15 casos estudados e descritos, a maioria envolve governos que, directa ou indirectamente, são conotados com repressão e violação dos Direitos Humanos. É assim com o Sri Lanka, onde a guerra movida pelo Movimento de Libertação dos Tigres Tamil contra o governo causou entre 80 a 100 mil vítimas, com ambas as partes beligerantes a merecerem a condenação das Nações Unidas por violação dos Direitos Humanos. Pelas mesmas razões, a União Europeia removeu do país um programa de auxílio ao desenvolvimento, fazendo depender o regresso do respeito pelas convenções internacionais. Para combater esta decisão, o governo de Colombo lançou-se numa campanha de lobby sem precedentes, a cargo da firma inglesa Bell Pottinger Sans Frontières, especializada em aconselhar governos estrangeiros. Trata-se de uma divisão da Chime plc, de Lord Bell, antigo conselheiro da “Dama de ferro”, Margaret Thatcher. Segundo o jornal britânico The Guardian, só em 2009, Bell ganhou 67 milhões de libras com estes contratos, mais 37 por cento do que em 2008. É também Bell que representa o governo zambiano, acusado 18
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“Governos como os do Cazaquistão, Sri Lanka e Ruanda, acusados por organizações como as Nações Unidas e a Amnistia Internacional de violação dos Direitos Humanos, estão a descobrir as potencialidades das Relações Públicas, contratando agências de renome para melhorar a sua imagem internacional”
“Fazemos trabalho de comunicação. Se as pessoas querem comunicar os seus argumentos, somos da opinião de que têm esse direito. Não somos um corpo internacional de ética”
“Tal como as organizações não governamentais têm o direito de comunicar os seus pontos de vista, também os indivíduos e os governos devem poder transmitir as suas mensagens e responder às críticas”
Lord Bell Bell Pottinger
Richard Ellis director de comunicação da PRCA
em Maio de albergar suspeitos do genocídio no vizinho Ruanda. Na página da consultora na internet, é possível identificar a Zâmbia entre os seus clientes, ainda que apenas venha mencionada uma intervenção anterior a esta acusação protagonizada por organizações de defesa dos Direitos Humanos. A Bell foi contratada em 2008 para conduzir a campanha eleitoral do então presidente em exercício, Rupiah Banda, que carecia de “melhorar o perfil” para ser aceite como sucessor natural do falecido presidente Mwanawasa. Banda ganhou as eleições. Questionado pelo The Guardian, Lord Bell respondeu: “Fazemos trabalho de comunicação. Se as pessoas querem comunicar
os seus argumentos, somos da opinião de que têm esse direito. Não somos um corpo internacional de ética”. A Bell Pottinger não é caso único. A também londrina Portland PR trabalha directamente com o Kremlin, visando suavizar as suas relações com as instituições britânicas e, sobretudo, promovê-lo nos media. A Racepoint PR aconselha o governo do Ruanda, não obstante um relatório de 2009 da Commonwealth Human Rights Initiative ter concluído que o respeito pelos Direitos Humanos no país era “muito baixo”. E a BGR Garbara gere a reputação do Cazaquistão a partir de Londres mas também junto das instituições europeias. O gover-
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no cazaque foi acusado pela Human Rights Watch de ter sentenciado o principal defensor dos Direitos Humanos no país a quatro anos de prisão sem um julgamento justo. E, num relatório divulgado no início do ano, a Amnistia Internacional denunciou a tortura de presos como sendo uma rotina neste estado saído da URSS. Todavia, o presidente da BGR Garbara, Ivo Garbara, rejeita estas associações. Foi o que fez numa declaração ao Briefing: “Rejeito fortemente qualquer associação entre o meu cliente, o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Cazaquistão, e eventuais ‘regimes estrangeiros controversos’ que possam trabalhar com agências de relações públicas de Londres”. E justifica a sua posição: “Em Novembro de 2007, 56 estados membros da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), numa votação livre e por esmagadora maioria, decidiram confiar ao governo do Cazaquistão a presidência da organização em 2010. A OSCE é uma organização internacional líder na defesa dos valores democráticos e o Cazaquistão tem desempenhado um papel exemplar na presidência. A prova disso é que, no início deste Verão, os países membros aceitaram o convite do presidente Nazarbayev para organizar a primeira cimeira da OSCE, em mais de dez anos. Em Dezembro, chefes de governo e de estado de 56 países, representando o mundo livre e democrático, irão ao Cazaquistão e tenho dificuldade em imaginar isto a acontecer se fosse um regime controverso”. Indiscutível é a tendência para cada vez mais governos contratarem consultoras britânicas. É, aliás, reconhecida pela PRCA – a associação que congrega as agências de Relações Públicas, que a atribui à reputação do conselho made in Grã-Bretanha. O director de comunicação da associação, Richard Ellis, comunga de certa forma da opiO agregador do marketing.
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“Para o Corporate Europe Observatory, este é um mercado em crescimento: e, mais do que lobbying, é country branding – trata-se de pôr um país no mapa, melhorando a sua imagem para vencer o isolamento político”
nião de Lord Bell: ao Briefing, sustentou que “tal como as organizações não governamentais têm o direito de comunicar os seus pontos de vista, também os indivíduos e os governos devem poder transmitir as suas mensagens e responder às críticas”. E precisamente numa alusão às críticas de que essas consultoras são alvo por alegadamente infringirem princípios éticos, Ellis remete para o código da PRCA: “Os membros têm o dever de, em todas as alturas, respeitarem a verdade e não disseminar intencionalmente ou irresponsavelmente informação falsa ou errónea, devendo adoptar os cuidados necessários para não o fazerem”. E se o fizerem? A PRCA abrirá uma investigação e desencadeará os procedimentos disciplinares adequados, da admoestação à expulsão. Até agora, este cenário não se colocou. A Bell Pottinger não é subscrito-
ra deste código de ética, nem do registo europeu de representantes de interesses, uma tentativa de Bruxelas para conferir alguma transparência ao lobbying. Existe desde 2008, mas a adesão não é obrigatória e mesmo empresas signatárias relutam em inscrever todos os interesses que representam. Para o Corporate Europe Observatory, este é um mercado em crescimento: e, mais do que lobbying, é country branding – trata-se de pôr um país no mapa, melhorando a sua imagem para vencer o isolamento político. O observatório lamenta que as mesmas consultoras que abraçam o discurso da responsabilidade social pareçam não hesitar em aceitar regimes controversos, não obstante os problemas éticos envolvidos. E questiona: “Assim como algumas recusam fazer lobby pela indústria do tabaco, não devia uma consultora ‘ética’ recusar-se a representar um regime repressivo?”.
MADE IN EUROPE
As pistas búlgara e bielorrussa O mais recente relatório do Corporate Europe Observatory (CEO) apresenta o lobbying governamental como um negócio lucrativo que gira à volta de Bruxelas. Eis dois exemplos:
a promessa da Assembleia Parlamentar da Europa de que o país recuperará o seu estatuto de “convidado especial” quando abolir a pena de morte. Ainda não aconteceu.
Bielorrússia. Considerada “a última ditadura europeia”, contratou a Bell Pottinger, em Agosto de 2008, para “assegurar um correcto fluxo de informação com figuras-chave de Bruxelas”. Lord Bell, presidente da firma de Relações Públicas sediada em Londres, assumiu a conta pessoalmente e promoveu o presidente bielorrusso, Lukashenko, na Comunicação Social, garantindo-lhe entrevistas em jornais como o The Financial Times e o Wall Street Journal. E até a audiência papal, em Abril de 2009, correu mundo em imagens. O resultado foi o fim da moratória nos encontros entre a União Europeia (UE) e Minsk e
Bulgária. Em Novembro de 2008, a UE cortou 220 milhões de euros na ajuda ao desenvolvimento devido à escalada de corrupção e crime organizado. Mas podiam ter sido 500 milhões se o governo búlgaro não tivesse entrado em modo de gestão de crise e contratado uma equipa liderada pelo ex-primeiro-ministro francês Dominique de Villepin, complementada pela firma de Relações Públicas Alber & Geiger. Missão: desvanecer a imagem do país como o “papão europeu”. Certo é que no barómetro internacional de transparência de 2009 a Bulgária é o mais corrupto dos estados-membros.
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