Adovcatus, 24

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Diretor: João Teives

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Diretor Editorial: Hermínio Santos

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Mensal

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Ano II

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N.º 24

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Nuno Morais Sarmento, sócio da PLMJ

MP sem ordem nem comando Pág. 30

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Risco de evasão fiscal

“Um aumento da tributação pode determinar maior evasão e uma baixa da receita fiscal efetiva”, afirma o fiscalista Pedro Pais de Almeida, sócio da Abreu Advogados. Mas o problema não está apenas na evasão e incumprimento, também se coloca ao nível da retração do consumo, que começou a ser nítida na economia portuguesa no segundo semestre do ano passado e que se pode acentuar este ano 5 601073 210256

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15 euros

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Pedro Pais de Almeida, sócio da Abreu Advogados

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Expectativas sobre a nova lei da arbitragem

Quatro advogados especialistas na matéria dão a sua opinião sobre a nova Lei da Arbitragem Voluntária que entra este mês em vigor. São eles Agostinho Pereira de Miranda, sócio fundador e presidente da Miranda Correia Amendoeira & Associados, Fernando Tonim, presidente do ILMAI, Tiago Amorim, managing partner e fundador da Amorim & Associados, e João Duarte de Sousa, sócio da Garrigues



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Destaques

18 Diretor-geral João David Nunes jdn@briefing.pt Diretor João Teives joao.teives-14761l@advogados.oa.pt Diretor Editorial Hermínio Santos hs@briefing.pt Editora Executiva Fátima de Sousa fs@briefing.pt

reflexões

O diagnóstico de um senador

Duas vezes ministro, juiz de profissão, Álvaro Laborinho Lúcio é um dos senadores da Justiça em Portugal. Voz autorizada, conhecedor profundo das realidades dos tribunais, escreveu um livro, “Levante-se o véu”, onde dá conta das suas preocupações

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TESTEMUNHO

Pessoa para aliviar a pressão

Pensa em versos de Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, quando está sob pressão e o maior desafio é contribuir para a redução dos custos, mantendo, simultaneamente, o mesmo nível de excelência dos serviços. Eis Cristina Perez, diretora de Assuntos Legais e de Regulação da Vodafone Portugal

Diretora de Marketing Maria Luís Telf. 961 571 629 ml@briefing.pt

Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias) assinaturas@briefing.pt Tiragem média mensal: 2.500 ex. Depósito legal: 308847/10 N.º registo erc 125859 Editora Enzima Amarela - Edições, Lda Av. Infante D. Henrique, 333H, 44 1800-282 Lisboa Tel. 218 504 060 Fax: 210 435 935 advocatus@briefing.pt www.advocatus.pt Impressão: Sogapal, Rua Mário Castelhano, Queluz de Baixo 2730-120 Barcarena

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PASSEIO PÚBLICO

Gosto pelos números

Filha de uma médica e de um informático, Rita Magalhães, 39 anos, sempre teve uma paixão pelos números e pela matemática mas acabou por seguir Direito, apesar de não haver tradição na família. Não se arrependeu e hoje é associada da Vieira de Almeida & Associados

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HOBBY

Estudar a história das famílias

José Carlos Soares Machado, sócio da SRS, aproveita os serões e os fins-de-semana para colocar em prática o seu hobby preferido: a genealogia. O gosto por esta parte da História despertou há cerca de 30 anos, quando foi pai pela primeira vez Março de 2012

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Cortar a direito

João Teives diretor

Justiça e território Não vislumbro como será possível combater a pendência e a morosidade com menos oferta judiciária A organização territorial da Justiça, ou organização judiciária, andou, ao longo da história, de braços dados com a organização administrativa do território. E, assim, se no século XV tínhamos seis comarcas a que correspondia o magistrado administrativo e judicial, no século XIX, com a reforma administrativa de Mouzinho da Silveira, passámos a ter a regra, com exceções ou não seria uma regra, de um tribunal por comarca. Em que medida é que esta divisão prejudica a Justiça? Julgo não errar que se trata primacialmente de uma questão de gestão de recursos e da sua mobilidade para fazer face às regras da procura e da oferta. Se dividir o território numa miríade de comarcas e nelas alocar estruturas rígidas e dificilmente alteráveis nunca poderei, por um lado, ter ganhos de escala, nem, por outro, dar resposta a necessidades prementes. O que é que isto significa na prática judiciária? Se tiver um tribunal com excesso de procura não poderei, facilmente, colocar um ou mais juízes e funcionários que permitam dar resposta a esse excesso de procura. Por outro lado, se tiver um tribunal com pouca procura não poderei realocar juízes e funcionários atenta o quadro rígido da estrutura. Vou assim ter tribunais com excesso

“Uma política integrada do território não pode olhar só ao que existe atualmente mas ao que queremos e desejamos que exista no futuro. Se eu não quero a desertificação do interior, não devo fechar aí escolas, serviços de saúde, nem tribunais...”

de pendência o que gera desmotivação pela incapacidade de resolvê-la independentemente de todo o esforço humanamente possível para combatê-la e vou ter tribunais com pouca pendência, em que o menor trabalho gera mecanismos letárgicos que também entorpecem a desejável e necessária celeridade processual. Para resolver isto é necessário criar estruturas com maior dimensão que permitam uma máxima adaptabilidade à oferta e à procura judiciária, o que, implica, necessariamente,

mobilidade de juízes e funcionários e um corpo de gestão do tribunal que adeque, em cada momento, a oferta à procura, combatendo a pendência excessiva, a morosidade processual e o consequente descrédito da Justiça aos olhos dos cidadãos. Penso que já era esta a matriz do anterior “novo mapa judiciário” das 39 comarcas. Assentava tal modelo em três vertentes, todas elas determinantes: nova matriz territorial, acentuada especialização e novo modelo de gestão dos tribunais assente num juiz presidente, num administrador e num conselho de comarca com composição multifacetada e representatividade abrangente. Troca-se agora a divisão territorial de acordo com a unidade estatística das Nuts III, a que correspondiam concelhos com problemas e desafios semelhantes pela lógica dos distritos com disparidades e heterogeneidade de problemas dentro de si. Ganha-se alguma coisa? Diria que se podia, com este novo modelo, ganhar dimensão. E ao ganhar dimensão aumento a liberdade na gestão dos recursos. Teria mais recursos ao meu dispor e poderia afetá-los de forma mais produtiva. Temo, porém, que não seja essa a lógica que presidiu à escolha das novas comarcas com matriz distrital,

em contraponto aliás com a organização administrativa do território (governos civis). Analisado o “Ensaio para a reorganização da estrutura judiciária”, da Direção-Geral da Administração da Justiça, verifica-se que o critério é puramente restritivo, economicista e teve por base a diminuição acentuada da oferta judiciária. São menos 317 juízes de quadro de comarca. Com exceção da nova comarca de Portalegre, que ganharia dois juízes, todas as outras comarcas perdem juízes, pelo que, inevitavelmente, perdem oferta judiciária. Ora, não vislumbro como será possível combater a pendência e a morosidade com menos oferta judiciária. Para além disso, há outro aspeto que não podemos negligenciar e que é transversal na oferta dos serviços do Estado. Uma política integrada do território não pode olhar só ao que existe atualmente mas ao que queremos e desejamos que exista no futuro. Se eu não quero a desertificação do interior, não devo fechar aí escolas, serviços de saúde, nem tribunais... O que poupo no curto prazo pode sair bem mais caro no futuro. Mas para isso era necessário ter uma política de território e isso, nos dias que correm, se calhar é pedir muito.

LIVRO

Cicero the Advocate Para além de um grande filósofo, político, escritor e orador, Marcus Tullius Cicero foi o grande Advogado da era do fim da República. Jonathan Powell, Professor de Latim da Royal Holloway, University of London, e Jeremy Paterson, Senior Lecture em História Antiga, da Universidade de Newcastle upon Tyne, organizam um conjunto de estudos que se centram na análise do Cícero Advogado. Os discur-

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sos de Cícero são aqui analisados com enorme profundidade. O enfoque aqui não é o tradicional. Não se trata de meros exercícios estilísticos, mas sim de grande Advocacia. Peças processuais a que corresponde sempre uma estratégia de defesa (Pro) ou de acusação (In). Uma excelente edição da Oxford.

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Entrevista

Uma nova subida de impostos em 2012 para cumprir as metas do défice “é mais um tiro no pé”. A opinião, convicta, é de Pedro Pais de Almeida, 49 anos, sócio da Abreu Advogados. Especialista em fiscalidade, não tem dúvidas de que, em matéria de carga fiscal, o País “já atingiu o limite”

Pedro Pais de Almeida, sócio da Abreu Advogados

Ramon de Melo

Aumentar impostos é tiro no pé

Advocatus I 2012 trouxe um aumento da carga fiscal ao consumo. Era inevitável? Pedro Pais de Almeida I Eu acho que essa pergunta é fundamental. Sobretudo porque se fala numa nova subida de impostos, ainda em 2012, para conseguir cumprir os números do défice acordados com a troika. Eu acho que é mais um tiro no pé. Creio que estamos 6

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muito perto do limite, se não o ultrapassámos já. A verdade é que, atingido esse limite, o aumento da tributação não significa um aumento da receita fiscal. Um aumento da tributação pode determinar maior evasão e uma baixa da receita fiscal efetiva. Mas não estamos só a falar de evasão e incumprimento. Estamos também a falar de uma retração do consumo. Que começou

a ser nítida na economia portuguesa no segundo semestre do ano passado e creio que se vai acentuar este ano. Por isso, é que também falamos numa retração do PIB entre 3 e 3,5 por cento este ano. A verdade é que, se houver novo aumento de impostos, muito provavelmente a receita fiscal vai descer. Não resolve problema nenhum, muito pelo contrário, agrava o problema.

Advocatus I Assistimos a uma atuação mais centrada na receita. Não seria mais eficaz se fosse centrada na despesa do Estado? PPA I Repare, há sempre aquela teoria de que a redução ao nível da despesa demora mais tempo a ser efetiva. Por exemplo, se eu fundo dois organismos públicos a redução da despesa não é imediata, O agregador da advocacia


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porque são processos que demoram algum tempo, é necessário integrar as pessoas noutros órgãos… Eu compreendo essa justificação, de qualquer forma está-se a avançar muito lentamente desse lado da despesa e está-se a atacar o lado que dá receita de forma mais imediata e mais fácil. Mas acho que já se atingiu o limite porque não se pode continuar a aumentar impostos. Isso resulta num refreamento do consumo, aumentando as dificuldades das empresas, o desemprego, a despesa do Estado com subsídios de desemprego, com segurança social. Estamos num equilíbrio muito difícil. Advocatus I Essa penalização fiscal afeta o tecido empresarial. Terá sido essa a razão da deslocalização da Jerónimo Martins? PPA I Acho que o grupo Jerónimo Martins teve o azar de fazer esta deslocalização numa altura em que as coisas estão de facto bastante complicadas, como tal esta operação caiu logo debaixo dos holofotes dos media. A verdade é que a Jerónimo Martins muda para lá a sede, mas mantém cá a direção efetiva, o que, em termos de impostos, é exatamente a mesma coisa. Creio que, numa primeira fase, isso não foi bem explicado. Mas, do ponto de vista fiscal, não há alterações, porque a sociedade vai continuar a ser tributada da mesma forma. Segundo as explicações do grupo, esta alteração deve-se à facilidade de acesso aos mercados de financiamento externos. Uma explicação que me parece perfeitamente plausível. Mas acho que isso está relacionado com outra questão, que é saber se podemos continuar a dar tiros no pé aumentando impostos atrás de impostos. Principalmente, quando temos parceiros na União Europeia, como é a Irlanda com uma taxa de IRS de 12,5 por cento sobre os lucros da empresa, quando temos uma Bulgária e um Chipre com 10 por cento. E como é que nós achamos que podemos competir no seio da União Europeia com uma taxa de 25 por cento?

“Um aumento da tributação pode determinar maior evasão e uma baixa da receita fiscal efetiva. Mas não estamos só a falar de evasão e incumprimento. Estamos também a falar de uma retração do consumo”

“Vejo com alguma preocupação que este exemplo (da Jerónimo Martins) seja seguido e que outras empresas deslocalizem as suas atividades, mas por completo, incluindo a direção efetiva”

Advocatus I Haverá o risco de mais empresas se mudarem para países com fiscalidade mais favorável? PPA I O mais possível! Porque é lícito às empresas no seio da União Europeia e de acordo com o Tratado de Roma. Depois do caso do Pingo Doce, alguns parlamentares pediram que o Governo propusesse à Assembleia da República a criação de um novo imposto, que representasse um obstáculo à possibilidade de deslocalização das empresas portuguesas para outros países da União Europeia. Ora, não o podem fazer. Se houver alguma medida legislativa nesse sentido, rapidamente o Tribunal da Justiça das Comunidades vai anulá-la, alegando que é ilegal. Por isso, vejo com alguma preocupação que este exemplo seja seguido e que outras empresas deslocalizem as suas atividades, mas por completo, incluindo a direção efetiva. Eventualmente, Portugal só tributará os acionistas dessas empresas se eles continuarem a ser residentes cá e se houver distribuição de dividendos, caso contrário, nem isso.

“Atualmente, assistimos a empresas a deslocalizarem as suas atividades para o estrangeiro e a cancelarem projetos de investimento em Portugal”

Advocatus I Se Portugal deixa de ser atrativo para as empresas nacionais também deixa de o ser para o investimento estrangeiro… PPA I De facto, Portugal deixou de estar na linha do investimento estrangeiro. Atualmente, assistimos a empresas a deslocalizarem as suas atividades para o estrangeiro e a cancelarem projetos de investimento em Portugal. Novos projetos de investimento não existem, porque a carga fiscal é muito elevada. Diria que temos quase confisco, porque a verdade é que temos uma taxa de IRS de 46,5 por cento para rendimentos superiores a 153 mil euros. Depois temos a taxa adicional de IRS, 2,5 por cento, que é mais uma taxa de salvação nacional. O que significa que temos 49 por cento de imposto para este escalão de IRS. Isto, de facto, não é um quadro que atraia quer a produtividade, quer o investimento estrangeiro em Portugal. >>>

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Entrevista

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“O comum dos mortais, que está nos últimos escalões de IRS, tem de pagar impostos e não pode reclamar. Grande parte fica-lhe logo em retenções na fonte”

Advocatus I O que poderá evitá-lo? PPA I Este ano no Orçamento de Estado foi eliminada a taxa de 12,5 por cento de IRC para as pequenas empresas que tinham lucros até 12.500 euros. Se eu fosse secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o que faria era, pura e simplesmente, o contrário. Teria eliminado a taxa de 25 por cento, as empresas passavam a pagar uma taxa de 12,5 por cento independentemente do volume dos lucros. Assim, estou seguro de que iríamos atrair investimento estrangeiro à séria para Portugal. Caso contrário, não estou a ver forma de isso acontecer. A primeira pergunta que um potencial investidor faz quando vem para Portugal é ‘qual é a tributação sobre as empresas e as pessoas?’. A segunda pergunta é ‘como é que funciona o sistema de justiça? Quanto tempo é que levo a cobrar uma dívida?’. A resposta é que pode demorar entre um ano a ano e meio. Os dois principais atrativos da economia portuguesa passam a ser um problema. Ora, há 26 jurisdições

“Teria eliminado a taxa de 25 por cento, as empresas passavam a pagar uma taxa de 12,5 por cento independentemente do volume dos lucros. Assim, estou seguro de que iríamos atrair investimento estrangeiro à séria para Portugal”

política

Esperança para Portugal Pedro Pais de Almeida fez, como o próprio diz, uma “perninha” na política. Foi candidato a eurodeputado pelas listas do Movimento Esperança Portugal (MEP). Era o terceiro da lista e reconhece que, “obviamente”, havia a consciência de que o partido não iria eleger três deputados. Mas se elegesse “estava pronto para fazer as malas e partir para a Europa na defesa dos interesses dos portugueses”. “Era muito difícil”, comenta. Porquê? Porque “era um movimento de cidadãos anónimos, sem políticos carreiristas”: “De não anónimos tínhamos a cabeça de lista, a Laurinda Alves, e pouco mais. Por isso, foi no fundo uma tentativa de envolver cidadãos comuns na política, que não resultou. Porque o partido foi duas vezes a eleições e não conseguiu eleger nenhum deputado. Nem sequer chegou a ter o número de votos sufi-

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cientes para ter direito a subvenção pública”. O MEP extinguiu-se entretanto, mas Pais de Almeida acredita que o partido teve o grande mérito de ter falado na esperança para Portugal: “Quando começámos a falar de esperança as pessoas riam-se e pensavam ‘quem são estes maluquinhos que não percebem nada disto que vêm para aqui falar de esperança. Coitadinhos são muito bem-intencionados’”. Obama e o seu livro “The audacy of hope” foram a inspiração do MEP: “É um livro extraordinário e que obviamente nos influenciou. Mas a verdade é que no ideário político português nós fomos os primeiros a falar de esperança. E pelos vistos pegou, porque agora ouve-se falar de esperança e os nossos governantes vendem-nos esperança quase todos os dias”. De que – remata – o país precisa.

alternativas na União Europeia a competir connosco. Obviamente, entre localizar uma atividade produtiva na Irlanda, na Bulgária, no Chipre ou em Portugal, dificilmente encontro justificação para o fazer em Portugal. Já para não falar na vizinha Espanha. Temos uma tributação mais elevada que o nosso concorrente direto. Muitas empresas internacionais não falam em Portugal e em Espanha, mas sim em Ibéria. Muitas das vezes, a questão põe-se em colocar a sede em Lisboa, Madrid ou Barcelona. Mais uma vez, aqui também perdemos, no IVA e na tributação direta às empresas e às pessoas. Advocatus I Seria suficiente manter a taxa a 12,5 por cento? PPA I Seria um primeiro passo. Seria também necessário que o Estado português prometesse outra coisa – estabilidade fiscal. O que temos é inflação fiscal ou legislativa. Estamos sempre a produzir leis, em todos os sectores, mas acho que é pior no sector da fiscalidade. Só o Orçamento de Estado tinha cerca de 150 medidas legislativas a nível fiscal… Isto não são reformas, são revoluções fiscais. Sem estabilidade legislativa não é possível atrair investimento estrangeiro. Ao dizer que lanço uma taxa uniforme de IRC de 12,5 por cento em Portugal, e passo para uma taxa única, teria que prometer que ela seria válida e que se manteria em vigor pelo menos por cinco anos. Advocatus I Fala em confisco em relação à taxa de IRS para os escalões superiores. Qual é a alternativa? PPA I O Governo português tem uma visão um bocado miserabilista do que são os milionários. Considera-se que quem está no último escalão do IRS é milionário. E então tributa-se com 49 por cento. Ora quem tem uma remuneração nesta ordem de grandeza, é uma pessoa muito bem remunerada, mas está lonO agregador da advocacia


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“Os aumentos do IVA e afins, esses, vieram para ficar. Mais uma vez considero que é um erro, sobretudo a nível do IVA, porque as nossas taxas deveriam estar o mais próximo possível das espanholas e estão bastante acima”

ge de ser milionária. E a verdade é que, ao tributar com esta pressão, o que se consegue é pura e simplesmente desincentivar o trabalho e a poupança. Se, de facto, se quer tributar os milionários, então tem de ser ir para uma solução do género francês, onde existe um imposto sobre a fortuna. Deveria ser tributado quem tenha património superior a um determinado valor, os Warren Buffets deste mundo. Quem tem um nível de rendimento de muitos milhões por ano acaba por ter uma série de benefícios e uma serie de hipóteses de planeamento fiscal. Enquanto o comum dos mortais, que está nos últimos escalões de IRS, tem de pagar impostos e não pode reclamar. Grande parte fica-lhe logo em retenções na fonte, hoje em dia a máquina fiscal felizmente funciona de forma eficiente e ponto final. Não tem qualquer hipótese. Mas não é avançar com uma triO agregador da advocacia

“Novos projetos de investimento não existem, porque a carga fiscal é muito elevada. Diria que temos quase confisco, porque temos uma taxa de IRS de 46,5 por cento para rendimentos superiores a 153 mil euros. Depois temos a taxa adicional de IRS, 2,5 por cento, que é mais uma taxa de salvação nacional”

butação do património e manter as taxas de IRS nos mesmos níveis. O que eu faria era introduzir uma medida de tributação da fortuna, mas traria as taxas de IRS para os níveis de 1989. Em que o escalão máximo era de 40 por cento, que já é bastante elevado. Advocatus I Voltando ao início: o aumento da carga fiscal é justificado com as metas definidas pela troika. Crê que veio para ficar? PPA I A nível da taxa adicional de IRS e de IRC, diz-se expressamente que é para vigorar nos anos de 2012 e 2013 - isto é o que está na lei, mas facilmente também se alteram esses artigos e se diz que é para vigorar em 2014, 2015 e 2016… Eu tenho esperança que isso seja cumprido à risca. Os aumentos do IVA e afins, esses, vieram para ficar. Mais uma vez considero que é um erro, sobretudo a nível do IVA, porque as

nossas taxas deveriam estar o mais próximo possível das espanholas e estão bastante acima. Este ano vai ser seguramente mau, 2013 depende um bocadinho do comportamento da economia. Os mais otimistas dizem que Portugal já pode crescer qualquer coisa como 0,2 ou 0,3 no PIB. Vamos ver se é possível. Espero que, em 2014, de facto seja possível reduzir a tributação a nível das empresas e das famílias, pelo menos por via da redução da taxa adicional. Mais redução de impostos, infelizmente, não creio que seja expectável.

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Coimbra Editora JusJornal

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Estante

A Estante é uma página de parceria entre a Advocatus e a Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer

Coimbra Editora JusNet Responsabilidade tributária

Os mais vendidos Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficiais de Contas Paulo Marques 2011 23,58 €

A Acção Declarativa Comum à luz do Código Revisto José Lebre de Freitas 2011 29 €

Código das Sociedades Comerciais e Legislação Conexa Filipe Cassiano dos Santos Ricardo Afonso 2011 19,34 €

Os mais consultados Criminologia – O Homem delinquente e a Sociedade Criminógena Jorge de Figueiredo Dias Manuel da Costa Andrade 2011 33,96 €

Direito Industrial – Noções fundamentais Pedro Sousa e Silva 2011 34,90 €

Código do Trabalho F. Jorge Coutinho de Almeida 2012 36 €

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Num cenário global marcado por uma grave crise económica e financeira, assiste-se ao aumento muito considerável de empresas que revelam insuficiência patrimonial para cumprir os compromissos com o Fisco. Pelo que se adivinha um crescimento das questões relacionadas com a responsabilidade tributária dos gestores bem como dos técnicos oficiais de contas. Tratando-se de dívidas tributárias contraídas pelas empresas envolvendo a atuação daqueles responsáveis, a sua responsabilidade é pelas dívidas de outrem (do ente coletivo) mediante a reversão do processo de execução fiscal. O livro Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficiais de Contas analisa com minúcia vários temas estruturantes tais como os deveres tributários dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, assentes nas boas práticas (artigo 32.º, da LGT) bem como os deveres de lealdade e diligência (artigo 64.º, do CSC). O enquadramento do responsável como sujeito passivo da relação de imposto (artigo 18.º, n.º 3, da LGT), a audição prévia (artigo 23.º, 4, da LGT), as especificidades da citação (artigo 191.º, n.º 3. do CPPT), as garantias de defesa do responsável designadamente a reclamação graciosa e impugnação judicial (artigo 22.º, n.º 4, da LGT), revisão do ato tributário e da matéria coletável (artigos 78.º e 91.º, da LGT), oposição à execução e reclamação (artigos 203.º e 276.º, do CPPT) são igualmente objeto de estudo criterioso.

Uma especial atenção é conferida aos pressupostos da reversão e penhora de bens dos gestores e TOC, designadamente a insuficiência patrimonial da empresa, analisando-se com minúcia a repartição do ónus da prova (alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 24.º, da LGT) Os meios conservatórios da garantia patrimonial são igualmente analisados, designadamente os requisitos do arresto em relação ao responsável subsidiário (artigos 136.º e 214.º, do CPPT), a impugnação pauliana (artigo 610.º, do Código Civil), bem como o regime sancionatório aplicável em caso de frustração de créditos (artigo 88.º, do RGIT). Alguns temas mais recentes e pouco tratados na doutrina, como a compensação e a publicitação na lista de devedores, sem esquecer a recente polémica doutrinal e jurisprudencial em torno da (in)constitucionalidade da reversão de coimas contra o responsável tributário e as respetivas garantias de defesa.

resumo Esta obra analisa o quadro legal vigente, bem como a evolução da melhor jurisprudência e doutrina. É feita uma análise minuciosa e rigorosa de múltiplos temas estruturantes tais como: • os deveres tributários dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, • a audição prévia, • o benefício da excussão, • a reversão do processo de execução fiscal,

• o arresto dos bens do responsável subsidiário, • a citação, • os meios de defesa, • a culpa, • o ónus da prova, • a compensação tributária, • a publicitação na lista de devedores, • a problemática da reversão das coimas.

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Arbitragem

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Sobre a nova Lei da Arbitragem Voluntária, que entra este mês em vigor, recaem muitas expectativas: será a panaceia para muitos dos males da Justiça, nomeadamente o das pendências processuais, e, enquanto alternativa para a resolução de litígios, será um passo no caminho do retomar da confiança dos investidores estrangeiros em Portugal?

A Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro, entra este mês em vigor. É conhecida como nova Lei da Arbitragem Voluntária e, por constituir um quadro normativo mais completo do que o anterior, é apresentada como um estímulo para a consolidação da arbitragem entre os meios de resolução de litígios, tornando-a verdadeiramente alternativa aos tribunais. É-lhe igualmente reconhecido o potencial mérito de tornar o País atrativo para a resolução de arbitragens internacionais. Sobre ela recai ainda a esperança de que contribua para uma verdadeira mudança cultural no sentido da adesão às melhores práticas internacionais. Por fim, mas não menos importante poderá ter um papel a desempenhar no incentivo ao investimento externo na economia nacional. Mas será suficiente mudar a lei? Quatro advogados especialistas em arbitragem respondem: Agostinho Pereira de Miranda, sócio fundador e presidente da Miranda Correia Amendoeira & Associados, João Duarte de Sousa, Sócio da Garrigues, Fernando Tonim, presidente do ILMAI, e Tiago Amorim, managing partner e fundador da Amorim & Associados. 12

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Gonçalo Alho/Who

No reino das expectativas

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Anos de desconfiança, séculos de respeito A nova LAV, aprovada em Dezembro de 2011 e que entra este mês em vigor, é a plataforma ideal para essa verdadeira mudança cultural que começa a verificar-se na comunidade arbitral portuguesa Há muita gente com a aparente convicção de que a arbitragem é uma invenção dos tempos pós-modernos e do estado exíguo. Nada mais errado. Formas relativamente primárias do que hoje consideraríamos uma arbitragem voluntária foram já detectadas pelos historiadores do Direito no Código de Hamurabi, isto é, 1.700 anos antes da Era Cristã. O Digesto de Justiniano dedicava-lhe um dos seus 50 livros. Em Portugal a arbitragem é tão antiga como a própria nação. Na Constituição de 1822, saída da Revolução Liberal, era reconhecido o direito de recorrer à arbitragem “nas causas cíveis e nas criminais civilmente intentadas” (artigo 123.º). Essa promessa, vinda da Revolução Francesa, de uma justiça mais próxima da comunidade a que se dirigia foi porém liquidada pela legislação processual civil do início da ditadura salazarista. O renascimento da arbitragem na Europa do século XX correspondeu, grosso modo, à vitória dos ideais democráticos, particularmente depois da 2.ª Guerra Mundial. Não surpreende, pois, que entre nós só depois do 25 de Abril se tivesse começado a pensar em retirar a arbitragem voluntária da tutela dos tribunais. Esse mérito teve-o o então ministro da Justiça e bastonário Dr. Mário Raposo que, em 1986, fez aprovar na Assembleia da República a Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto (Lei da Arbitragem Voluntária). A LAV, minutada pela Professora Magalhães Collaço, é um diploma de grande rigor e patente elegância jurídica. Infelizmente, ignorou quase completamente um documento radicalmente inovador e cujo paradigma viria a ser adoptado pela maioria dos países da OCDE. Trata-se da Lei O agregador da advocacia

“No nosso país consolidou-se a perigosa ideia de que os árbitros designados pelas partes não estão sujeitos aos mesmos deveres a que está vinculado o árbitro presidente”

“Um sinal de encorajamento provém de uma nova geração de advogados e potenciais árbitros que aderiram desde muito cedo às melhores práticas internacionais”

Modelo para a Arbitragem Comercial Internacional, que em 1985 fora aprovada pela Comissão da Nações Unidas para o Direito do Comércio Internacional (CNUDCI/UNCITRAL). Esta falta de aggiornamento com as tendências mais progressivas noutros países iria dar como consequência uma prática arbitral nacional que tem o seu expoente mais negativo no chamado “árbitro de parte”, isto é, o árbitro comprometido com a parte. Os árbitros portugueses são, na sua esmagadora maioria, pessoas íntegras e competentes que respeitam a natureza da sua missão. Mas há alguns que parecem desconhecer os seus deveres mais básicos de independência e imparcialidade. Quem faz arbitragens em Portugal sabe bem que não é invulgar o árbitro designado pela parte comportar-se como se fosse seu advogado. No nosso país consolidou-se a perigosa ideia de que os árbitros designados pelas partes não estão sujeitos aos mesmos deveres a que está vinculado o árbitro presidente. Essa atitude, e as práticas nocivas a que ela deu lugar, conduziram a uma crescente desconfiança do público português relativamente à arbitragem. Esta ainda hoje é vista por certos sectores da sociedade como uma instância de transacção em que apenas se negoceia e não como uma instância jurisdicional privada encarregada de administrar a justiça, aliás nos termos previstos na Constituição. Felizmente este estado de coisas está a mudar. A nova LAV, aprovada em Dezembro de 2011 e que entra este mês em vigor, é a plataforma ideal para essa verdadeira mudança cultural que começa a verificar-se na comunidade arbitral portuguesa.

Agostinho Pereira de Miranda sócio fundador e presidente da Miranda Correia Amendoeira & Associados. Licenciado pela Faculdade de Direito de Coimbra, integra a direção da Associação Portuguesa de Arbitragem

Um sinal de encorajamento provém de uma nova geração de advogados e potenciais árbitros que aderiram desde muito cedo às melhores práticas internacionais. Conhecedores do que se passa noutros países com maior tradição arbitral do que o nosso, eles (e um número cada vez maior de magistrados) perceberam que a arbitragem só vingará em Portugal se conseguir ganhar a confiança dos cidadãos na sua integridade e respeitabilidade. A justiça arbitral tem uma história de séculos. Muito antes dos juizes alvidradores do rei, eram os homens bons que administravam consensualmente a justiça privada dos cidadãos. A legitimidade destes fundava-se apenas no respeito dos vizinhos pelo seu saber e rectidão. É que a arbitragem, sendo justiça privada, tem de ser, acima de tudo, Justiça. Texto escrito segundo as regras anteriores ao novo acordo ortográfico. Março de 2012

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Arbitragem

Da lei à atitude Será suficiente mudar a lei para tornar o País atrativo para a realização de arbitragens internacionais e tornar a arbitragem doméstica um modo de resolução de litígios verdadeiramente alternativo aos Tribunais? Portugal dispõe de uma Nova Lei da Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011, de 14 de dezembro – NLAV). A nova lei corresponde à concretização de uma antiga aspiração que reunia um amplo consenso de todos aqueles que se dedicam, quer como estudiosos quer como práticos, à arbitragem, os quais reclamavam a necessidade de modernização do nosso quadro legal em matéria de arbitragem. O processo político-legislativo visando dotar o País de uma nova Lei de Arbitragem sofreu diversas vicissitudes, as quais foram definitivamente removidas pela necessidade de dar cumprimento a uma das medidas do Memorandum de Entendimento celebrado com a Troika, na qual se previa a apresentação, pelo Governo, de uma nova Lei da Arbitragem até ao final de setembro de 2011. A NLAV irá assim pôr termo à “velha” LAV que vigora há mais de 25 e que, à época, foi um diploma inovador mas hoje claramente insuficiente e ultrapassado. Optou-se, e bem, não por procurar rever, aditar ou corrigir a “velha” LAV mas por fazer um texto legislativo totalmente novo e coerente. Optou-se, e bem, na esteira, designadamente, de outros países da Europa, como a Alemanha e a Espanha, por aproximar o novo regime português da Lei Modelo sobre Arbitragem Comercial Internacional da CNUDCI/UNCITRAL. Com efeito, nesta matéria ganharíamos pouco com inovações e originalidades nacionais, a segurança e a previsibilidade do recurso a soluções reconhecidas e testadas internacionalmente serão decisivas para alcançar um dos principais propósitos da NLAV: tornar Portugal 14

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“Estou certo que a NLAV irá contribuir decisivamente para o avanço da arbitragem em Portugal, desde logo pelo interesse, reflexão e estudo que as suas soluções irão suscitar, quer no meio académico quer na prática arbitral”

“Estou também em crer que a alteração legislativa efetuada só por si, se desacompanhada de outros fatores de promoção e de apoio à arbitragem, se desacompanhada de uma jurisprudência adequada, não basta”

um País atrativo e credível para – as suas principais cidades - ser eleito como sede na realização de arbitragens internacionais, designadamente para aquelas em que intervenham empresas de países lusófonos ou cujo litígio se relacione com estes. Por outro lado, procura-se também com este novo regime que a arbitragem doméstica ganhe um impulso e fulgor renovado que permita uma maior divulgação e utilização deste modo de resolução de litígios por parte dos operadores económicos internos, colocando Portugal, também neste ponto, a par com outros ordenamentos jurídicos em que o recurso à arbitragem se encontra solidamente implantado. Certo é que a aproximação agora realizada à Lei Modelo permite a Portugal ingressar no clube de países dotados de uma lei “amiga” da arbitragem, i.e., de uma lei que favorece a arbitragem. Mas, alcançado este desiderato, uma pergunta se impõe: será suficiente mudar a lei para tornar o País atrativo para a realização de arbitragens internacionais e tornar a arbitragem doméstica um modo de resolução de litígios verdadeiramente alternativo aos Tribunais? Ou estaremos ante uma questão mais complexa, de mudança paulatina de mentalidades e de cultura? Com que atitude encaramos a arbitragem? Que espaço e atenção reservamos à arbitragem como modo de resolução alternativa de litígios? A NLAV constitui, sem dúvida, um incentivo forte para que se produza a desejável mudança em favor de uma verdadeira e ampla cultura arbitral no nosso País e, nessa medida, as expectativas colocadas na NLAV são elevadas.

João Duarte de Sousa sócio da Garrigues, é responsável pela área de Contencioso e Arbitragem. Licenciado pela Universidade Católica, possui diversos cursos de especialização, nomeadamente em Arbitragem Internacional

Estou certo que a NLAV irá contribuir decisivamente para o avanço da arbitragem em Portugal, desde logo pelo interesse, reflexão e estudo que as suas soluções irão suscitar, quer no meio académico quer na prática arbitral. Contudo, estou também em crer que a alteração legislativa efetuada só por si, se desacompanhada de outros fatores de promoção e de apoio à arbitragem, se desacompanhada de uma jurisprudência adequada não basta e só o tempo dirá se a lei se revelou, afinal, suficiente para operar o mind shift que urge ser feito, quanto a esta matéria, em Portugal. O agregador da advocacia


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Por uma cultura arbitral Precisamos de desenvolver uma cultura arbitral para incentivar a economia e criar melhores condições para os investidores. Hoje não há qualquer contrato internacional que não preveja uma cláusula arbitral No início de fevereiro, a companhia aérea australiana Qantas decidiu de repente uma paragem total. Irritada com o impasse nas negociações laborais com os pilotos, engenheiros e colaboradores, a companhia mandou parar imediatamente os seus 108 aviões em todo o mundo. No entanto, um dia e meio depois, numa segunda-feira de manhã, o Tribunal Arbitral já apresentava uma solução: ordenou retomar o transporte aéreo e fixou uma trégua de 21 dias entre a companhia e os sindicatos. Tão célere e eficaz é a mediação e arbitragem. No caso da Qantas evitou prejuízos de 15 milhões de euros por dia sem voos, ou seja, 215 milhões no total. Como na Austrália e nos países mais desenvolvidos do mundo, precisamos urgentemente de uma cultura arbitral em Portugal. O caso da cerâmica Valadares podia ter sido resolvido de uma forma mais célere e económica e, se os dois lados assim o desejassem, sem exposição mediática, antes de forma discreta. Precisamos de desenvolver uma cultura arbitral para incentivar a economia e criar melhores condições para os investidores. Hoje não há qualquer contrato internacional que não preveja uma cláusula arbitral. Assim, o bom funcionamento de uma justiça complementar pode ser um fator decisivo para o investimento em Portugal. Com a introdução da nova lei de arbitragem, passamos a dispor de ferramentas para dirimir conflitos que até à data nunca tínhamos tido. A lei anterior, implementada há 25 anos, foi pouco alterada no decurso do tempo, de maneira que nunca chegámos a desenvolver uma cultura de direito favorável à mediação e arbitragem. Não temos acompanhado a evolução dos países mais desenvolvidos do mundo, onde os O agregador da advocacia

“Temos de começar a aproveitar os novos instrumentos judiciais, de forma frequente e abrangente. As novas possibilidades vão estimular a nossa economia e ajudar as empresas a ultrapassar este tempo mais conflituoso, próprio de situações de crise”

“Mediar em português é uma das missões do Instituto de Mediação e Arbitragem Internacional. Estamos atualmente empenhados em criar o Tribunal Arbitral da CPLP com o objetivo de entrar em pleno funcionamento em 2013. Esta instituição vai estimular os negócios entre os países de língua portuguesa e aproximar as empresas internacionais”

meios alternativos já têm tradição. Uma vez que esta cultura incentiva a economia, temos de aproveitar a oportunidade que a nova lei nos traz. Temos de começar a aproveitar os novos instrumentos judiciais, de forma frequente e abrangente. As novas possibilidades vão estimular a nossa economia e ajudar as empresas a ultrapassar este tempo mais conflituoso, próprio de situações de crise. A nova lei de arbitragem amplia em muito as possibilidades de dirimir conflitos, também para os cidadãos. Assim, vai também contribuir para resolver o problema das pendências e reduzir a morosidade da justiça. Não admira que a troika dedicasse um capítulo inteiro ao sistema judicial, insistindo sobretudo na justiça alternativa. Os representantes do Fundo Monetário Internacional, do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia exigiram ao governo português a aprovação de uma nova lei de arbitragem a muito curto prazo para que a resolução alternativa de litígios funcione em pleno. Para além disso, a nova lei da arbitragem cria uma oportunidade única para avançarmos com outra inovação que completará a cultura arbitral em Portugal e em toda a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). É a altura ideal para finalmente fundarmos um Tribunal Arbitral que funcione em português. A nível da CPLP, as empresas lusófonas que optam por dirimir um conflito fora dos tribunais comuns têm de se deslocar a Paris, Londres, Nova Iorque ou Hong Kong, onde se situam os principais centros de arbitragem internacional, que funcionam em inglês e francês. Mediar em português é uma das missões do Instituto de Mediação e

Fernando Tonim presidente do ILMAI e representante da Union Internationale des Advocats

Arbitragem Internacional. Estamos atualmente empenhados em criar o Tribunal Arbitral da CPLP com o objetivo de entrar em pleno funcionamento em 2013. Esta instituição vai estimular os negócios entre os países de língua portuguesa e aproximar as empresas internacionais, dando-lhes a segurança de poder resolver conflitos de uma forma célere, discreta e mais económica. Como se vê, a nova lei da arbitragem traz uma série de oportunidades. Há que aproveitá-las. Março de 2012

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Arbitragem

Consolidar a arbitragem Sendo este novo quadro normativo mais completo do que o anterior, parecem estar reunidas as condições para a consolidação da arbitragem no âmbito dos meios de resolução de litígios Entra este mês em vigor a nova Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro. De acordo com o referido diploma, podem ser dirimidos por arbitragem voluntária os litígios que envolvam interesses de natureza patrimonial e, quando seja admissível transação sobre o direito controvertido, os que envolvam interesses de outra natureza. Inovação importante é a consagração da admissibilidade do requerimento de providências cautelares antes ou durante o processo arbitral, quer perante um tribunal estadual, quer (a menos que as partes tenham estipulado o contrário) perante o tribunal arbitral. Sendo a regra a da audiência prévia da parte requerida, a lei prevê a possibilidade de emissão, pelo tribunal arbitral, de uma ordem preliminar, sem audiência prévia, nos casos em que o tribunal considere que a prévia revelação do pedido de providência cautelar pode frustrar a finalidade da própria providência. No que toca à fase dos articulados, destacam-se a previsão da possibilidade de dedução de reconvenção, se o respetivo objeto estiver abrangido pela convenção de arbitragem, e a regra supletiva de que a falta de contestação não implica a aceitação dos factos invocados pelo demandante. Inovadora é também a previsão da intervenção de terceiros num processo arbitral em curso, desde que se encontrem vinculados (desde a conclusão da convenção ou através de adesão subsequente) à respetiva convenção de arbitragem. Se o tribunal se encontrar já constituído, a intervenção carece de declaração do interveniente 16

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“Inovadora é também a previsão da intervenção de terceiros num processo arbitral em curso, desde que se encontrem vinculados (desde a conclusão da convenção ou através de adesão subsequente) à respetiva convenção de arbitragem”

“Este regime pode potenciar a escolha de Portugal como sede de arbitragens internacionais, na medida em que se aproxima da Lei Modelo da UNCITRAL (United Nations Comission on International Trade Law)”

no sentido da aceitação da composição do tribunal, presumindo-se essa aceitação em caso de intervenção espontânea. A nova LAV alargou o prazo de prolação da decisão arbitral: o tribunal deve notificar às partes a decisão final dentro dos 12 meses seguintes à aceitação do último árbitro. Este prazo pode ser prorrogado livremente por acordo das partes e, a menos que as partes a isso se oponham expressamente e por períodos sucessivos de 12 meses, mediante decisão fundamentada do tribunal. Se as partes não acordarem no julgamento por equidade, os árbitros julgam segundo o direito constituído. O novo diploma prevê ainda a possibilidade de o tribunal decidir o litígio por apelo à composição das partes na base do equilíbrio dos interesses em jogo, se as partes assim convencionarem. A decisão proferida segundo a equidade ou mediante composição amigável é sempre irrecorrível, sendo a decisão proferida segundo o direito constituído suscetível de recurso apenas nos casos em que as partes o tenham previsto na convenção de arbitragem. Tratando-se de arbitragem internacional, a decisão só é recorrível se as partes tiverem expressamente acordado a possibilidade de recurso e regulado os respetivos termos. À semelhança do previsto na agora revogada Lei n.º 31/86, a nova LAV prevê a possibilidade de impugnação com vista à anulação da decisão. A impugnação da decisão não se confunde com o recurso, sendo admissível – apenas nos casos excecional e taxativamente previstos na lei – mesmo quando a decisão seja irrecorrível.

Tiago Amorim managing partner e fundador da Amorim & Associados, trabalha sobretudo nos domínios do Direito Público, Contencioso e Arbitragem, entre outros. Foi distinguido pela revista Iberian Lawyer no âmbito do prémio “40 under forty” 2009

Sendo este novo quadro normativo mais completo do que o anterior, parecem estar reunidas as condições para a consolidação da arbitragem no âmbito dos meios de resolução de litígios. Além disso, este regime pode potenciar a escolha de Portugal como sede de arbitragens internacionais, na medida em que se aproxima da Lei Modelo da UNCITRAL (United Nations Comission on International Trade Law). O agregador da advocacia


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Reflexões

Fátima de Sousa jornalista fs@briefing.pt

Por duas vezes exerceu a tutela da Justiça. Juiz de profissão, Álvaro Laborinho Lúcio, 70 anos, mantém um olhar atento sobre o sistema, um olhar que verteu recentemente nas páginas de “Levante-se o véu!”, obra da Oficina de Livro que também obteve o concurso do advogado José António Barreiros e do investigador José Braz. Às suas reflexões sobre o exercício da Justiça em Portugal deu o nome de “Virtudes privadas, vícios públicos”

Virtudes e vícios da Justiça

Advocatus I Como surgiu este livro de certa forma escrito a três mãos e cujos autores apresentam percursos distintos no sistema – um juiz, um advogado, um investigador? Álvaro Laborinho Lúcio I Surgiu por iniciativa exclusiva da editora que, inicialmente, convidou os autores para escreverem dois artigos cada um, sendo um sobre as virtudes e outro sobre os defeitos da justiça. Porque nenhum de 18

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nós se encontrou com os outros, nem trocámos impressões sobre o que estávamos a produzir, os trabalhos acabaram por surgir com abordagens formais distintas, o que, do meu ponto de vista, acaba por enriquecer a obra final. Advocatus I Porquê o título do seu capítulo – “Virtudes privadas, públicos vícios”? ALL I A escolha do título que dei ao conjunto dos meus dois arti-

gos, na linha da proposta que havia sido feita, pretendeu retomar a conhecida expressão “vícios privados, públicas virtudes”, recolhendo a ironia crítica que ela comporta e transferindo-a para o campo da justiça, mantendo idêntica ironia, mas invertendo o sentido, na medida em que hoje são apenas os vícios que se publicitam, enquanto as virtudes, que também as há, se mantêm afastadas do juízo da opinião pública.

Advocatus I Entre os vícios do sistema inclui o défice de eficácia e eficiência, as limitações no acesso à justiça, a ausência ou deficiência na prestação de contas… Para usar a linguagem da medicina da adição, é possível a reabilitação? ALL I É claro que é possível a reabilitação. Só que, para continuar a usar o mesmo tipo de linguagem, é fundamental que se acerte no diagnóstico, que se procure deO agregador da advocacia


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finir o grau de intervenção a promover e a densidade invasiva, isto é, modificadora, desta. Para isso é necessário que se compreenda a indispensabilidade de gerar cooperação ativa e corresponsabilização na aplicação das terapia, e no acompanhamento, após a sua adoção, das medidas de fundo a tomar, desde logo, evitando o ruído interno, em benefício da credibilidade externa das ações a desenvolver.

“É importante que se não perca a noção de que a independência dos tribunais constitui uma garantia, se quiser, um direito dos cidadãos e não um direito originário dos tribunais”

Advocatus I As garantias são uma virtude ou arriscam (por excessivo uso?) tornar-se um vício? ALL I As garantias são uma virtude do Estado de direito democrático e respondem pela maturidade de um povo e dos cidadãos que o integram. Por isso, que o que deva atacar-se e reprimir-se seja o abuso no seu uso e a sua utilização com vista à obtenção de objetivos para os quais elas não foram previstas. Atacar as garantias significa perda de densidade democrática e de cidadania. Atacar o seu uso indevido representa a assunção de uma responsabilidade coletiva que, por isso, se impõe a todos.

Advocatus I Apresenta a independência (dos tribunais) como uma virtude. É-o efetivamente? Isto é, a independência é, deveras, real e praticada? ALL I Sobre isso não tenho dúvidas. Poderá sempre adivinhar-se, aqui ou ali, uma ou outra exceção, mas tal apenas confirma a sustentabilidade da regra. É, todavia, importante que se não perca a noção de que a independência dos tribunais constitui uma garantia, se quiser, um direito dos cidadãos e não um direito originário dos tribunais. A estes assiste, isso sim, o dever de serem independentes, justamente para garantirem o respeito por aquele direito dos cidadãos e para assegurarem, assim, além do mais, a validade do princípio do primado da lei, como pilar do Estado de direito. Advocatus I Como se assegura a imparcialidade num setor dominado por corporações e onde o corporativismo é trazido com regularidade para a praça pública? ALL I Devemos distinguir os conceitos de independência, com a sua dimensão institucional, de isenção, na sua projeção pessoal, psicológica e ética, e de imparcialidade, com o seu sentido de regra de forte natureza processual. Esta imparcialidade deverá ser, pois, garantida pelo próprio regime jurídico adjetivo e sindicada quanto ao respetivo dever de respeito, no interior do próprio processo. A sua pergunta parece, assim, ser mais dirigida à isenção do que à imparcialidade e aí a minha resposta vai no sentido de que, acreditando,

embora, nela, entendo que o sistema de responsabilização deve conhecer alterações por forma a deixar claro que, no plano democrático, não é a fé nas pessoas que dá corpo à confiança, mas sim a garantia de que existem instrumentos adequados para intervir sempre que algum eventual desvio possa vir a ocorrer.

“Vai-se instalando um sentimento de crise de credibilidade que, também inovadoramente, atinge hoje as próprias elites. E, neste ponto, creio que, para isso, muito tem concorrido um enorme défice de comunicação com o exterior”

“No plano democrático, não é a fé nas pessoas que dá corpo à confiança, mas sim a garantia de que existem instrumentos adequados para intervir sempre que algum eventual desvio possa vir a ocorrer”

Advocatus I A que se deve o “persistente sentimento de crise acerca do funcionamento da justiça”? Como mitigá-lo? ALL I Em grande parte à perceção de ineficácia na justiça. À sua lentidão, à dificuldade de dar corpo material ao direito constitucional, a uma tutela jurisdicional efetiva, numa época em que a efetividade da tutela não pode deixar de ser relacionada com a sua utilidade e, por isso, com a valorização do tempo oportuno para uma decisão. E aqui, apenas uma resposta mais rápida da globalidade do sistema poderá mitigar o sentimento de crise. Este, que constitui um problema que não é novo, adquiriu uma visibilidade bem maior quando a morosidade da justiça passou a produzir efeitos nefastos sérios no funcionamento da própria economia, representando um entrave ao desenvolvimento económico, o que, só por si, veio abrir um espaço de crítica e de reclamação ocupado por agentes com outro poder que vieram contribuir >>>

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Reflexões

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“Importa começar por colocar grandes questões, por formular perguntas fortes, para que possa chegar-se a respostas fortes”

decisivamente para a denúncia de uma dificuldade que se sentia já latente no sistema. Por outro lado, e isso é novidade, por idênticas razões, vai-se instalando um sentimento de crise de credibilidade que, também inovadoramente, atinge hoje as próprias elites. E, neste ponto, creio que, para isso, muito tem concorrido um enorme défice de comunicação com o exterior, seja na transmissão de conteúdos e na indefinição de uma estratégia de informação, seja, ainda, na perda de uma verdadeira dimensão de Estado que deve presidir à intervenção pública dos principais agentes da justiça, e seus representantes, que, devemos reconhecer, nem sempre tem sido tão cuidada quanto porventura se desejaria que fosse. Uma vez mais, importa instalar mecanismos de cooperação e de corresponsabilização que envolvam todo o sistema de justiça, que garantam uma efetiva accountability, transmitindo segurança aos cidadãos, num tempo no qual a informação e a confiança constituem pressupostos indispensáveis para consolidar a necessária credibilidade das instituições e do Estado. Advocatus I Porque é que as reformas da justiça tantas vezes mais não parecem do que simples reformulações? ALL I Não diria isso de todas as reformas que têm tido lugar na justiça. Mas é verdade que muitas acabam por não resultar em mais do que meras reformulações. Penso que importa começar por colocar grandes questões, por formular perguntas fortes, para que possa chegar-se a respostas fortes. Ora aquilo a que vimos assistindo é à colocação de perguntas fracas convidando a respostas da mesma natureza. Quero com isto dizer que, antes de medidas, interessa definir políticas e que para tanto importa não fugir ao debate de questões difíceis mas que se mostram urgentes. Por exemplo, urge repensar o verdadeiro e atual sentido da divisão de poderes, o significado, nas suas várias ver-

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“Atacar as garantias significa perda de densidade democrática e de cidadania. Atacar o seu uso indevido representa a assunção de uma responsabilidade coletiva”

tentes, da independência dos tribunais, a distinção entre poder judicial e sistema de justiça, o papel e o lugar a reconhecer à gestão do sistema e à partilha, aí, de responsabilidades, a distinção, enfim, entre interesse público e corporativismo. Tudo matérias que, a montante, impõem respostas capazes de induzirem estratégias novas para responderem a questões novas. Por esta via será possível promover reformas de fundo que deixem, uma vez por todas, de se apresentar como simples reformulações. Advocatus I Se virtudes e vícios são faces de uma mesma moeda, será alguma vez possível que as virtudes superem os vícios? ALL I Confio plenamente nessa possibilidade. Mas é preciso querer que tal aconteça e nem sempre estou seguro de que todos o queiram. Olhando a justiça a partir do cidadão, dando relevância ao que ocorre no exterior e procurando aí a verdadeira legitimação material do sistema, será certamente possível. Ao contrário, olhando-se apenas para dentro, buscando-se auto legitimações sucessivas e, por vezes, contraditórias entre si, privilegiando-se os poderes internos em detrimento de uma ideia de responsabilidade a assumir para fora, dificilmente se construirá um caminho virtuoso que restaure a credibilidade no sistema de justiça.

“Urge repensar o verdadeiro e atual sentido da divisão de poderes, o significado da independência dos tribunais, a distinção entre poder judicial e sistema de justiça, o papel e o lugar a reconhecer à gestão do sistema e à partilha, aí, de responsabilidades, a distinção, enfim, entre interesse público e corporativismo” O agregador da advocacia


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Profissão

Manual de sobrevivência As qualidades para um advogado sobreviver e ter sucesso, enquanto advogado, são: ética, trabalho, estudo, solidariedade com o cliente. Se quisesse reduzir ainda mais, escolheria a ética Pretendi escrever um livro sobre o que é essencial na profissão de advogado, sejam quais forem a idade, a experiência, a estrutura onde se está integrado. Passando das aparências, entendo que as qualidades para um advogado sobreviver e ter sucesso, enquanto advogado, são: ética, trabalho, estudo, solidariedade com o cliente. Se quisesse reduzir ainda mais, escolheria a ética. Princípio ao qual tudo acaba por se reduzir. Mas ficarei pelos “detalhes” para maior clareza. O trabalho de um advogado – em princípio profissional liberal – não conhece horários nem férias. Se há trabalho, faz-se. Isto não significa que o advogado não possa, e deve, ser membro de uma família, ser solidário com os mais necessitados, cuidar de si próprio. Com estes fins pode recusar trabalho novo. O Direito evolui constantemente num diálogo teoria/prática. Surgem novos ramos de Direito, subdividem-se os já existentes, aprofundam-se os institutos, etc. Portanto, um advogado tem de estudar constantemente. Não só estudar cada novo caso (como se fosse o primeiro), como acompanhar a evolução de Direito. A Universidade constitui uma base indispensável. Mas é só uma formação que serve de ponto de partida. Finalmente, o advogado tem de estar totalmente focado no cliente e nos seus interesses. Promovendo estes com toda a energia e todo o saber. Tendo consciência que são primordiais. Sabendo, embora, que a sua conduta deve ter um conteúdo ético inesquecível. Se o advogado cumprir este programa, pode ganhar mais ou menos; ser conhecido ou desconhecido; chefiar, ou não, uma grande sociedade. Mas será, com certeza, um advogado realizado. Mais: não conheço outro caO agregador da advocacia

“Um advogado tem de estudar constantemente. Não só estudar cada novo caso (como se fosse o primeiro), como acompanhar a evolução de Direito”

“Os advogados são um dos grupos sociais de referência da sociedade portuguesa. A justiça e, portanto, o bem-estar coletivo dependem muito de nós”

minho para se atingirem os objetivos considerados importantes (fortuna, poder, prestígio) senão a via indicada. Esta permitirá ver na sua devida dimensão os inúmeros obstáculos; e levará a considerar que “sucesso” e “insucesso” são equivalentes. A Universidade não ensina, nem tem que ensinar, a conduta na vida prática. Mas a formação que dá, não só científica como ética, é um ponto de partida fundamentalmente. Durante toda a sua vida, o advogado vive de conceitos e modos de exprimir o seu pensamento que aprendeu na Universidade. É hoje preocupação dos jovens advogados o saber se vão encontrar trabalho. Reconheço que é cada vez mais difícil perante uma procura de serviços jurídicos sempre decrescente. Mas: uma sociedade evoluída, com sentido de justiça, socorre-se muito de serviços jurídicos; a complexidade da vida social está sempre a fazer novas exigências aos advogados; a formação em Direito é plurivalente, flexível, permitindo a adaptação a muitos tipos de trabalho. Os valores estruturantes da sociedade estão expressos nos direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira gerações. Diz-me a experiência que, na generalidade dos países, os advogados têm sido os seus principais defensores e promotores, numa função social imprescindível. Depois, preocupam-se os advogados, sobretudo os mais novos, com a qualidade da sua preparação e com a qualidade da prática jurídica portuguesa. Nesta matéria posso dizer-lhes que Faculdades de Direito portuguesas há que não têm nada a invejar às estrangeiras. E que, se veem deficiências no ensino, devem superá-las através de trabalho redobrado. A prática jurídica portuguesa é de

Diogo Leite de Campos sócio da Leite Campos, Soutelinho e Associados, é doutor em Direito pelas universidades de Coimbra e Paris II e em Economia pela Universidade de Paris IX. É autor da obra “Manual de sobrevivência do advogado”

qualidade - naturalmente variável – existindo em Portugal muitos advogados de grande e merecido prestígio. Portanto, a inserção na prática jurídica portuguesa é valiosa. Cabendo ao jovem advogado, sempre que possível, escolher um patrono capaz e solidário com o estagiário. É fácil? Não é! Mas a alternativa “fácil” não é digna. Os advogados dotados das qualidades que indiquei fazem-se à custa de muita paciência, durante a vida inteira, percurso nunca terminado. Nunca percam a confiança em vós, mas não hesitem em reconhecer os erros e corrigi-los, e analisar cuidadosamente as razões do insucesso ou do sucesso. Sejam humildes. Confio, e os portugueses confiam, em nós todos. Os advogados são um dos grupos sociais de referência da sociedade portuguesa. A justiça e, portanto, o bem-estar coletivo dependem muito de nós. Não hesitemos em continuar a promover a justiça como seres humanos “para os outros” que somos. Março de 2012

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Testemunho

Cursou Direito com o sonho de ser “embaixadora de causas”, mas um daqueles felizes acasos da vida, sob a forma de anúncio, suspendeu-lhe o sonho e conduziu-a à Telecel. Estava-se em 1996. Hoje, aos 42 anos, Cristina Perez é diretora de Assuntos Legais e de Regulação da Vodafone Portugal, uma função que exige dedicação, determinação, resistência e grande espírito de missão

Ramon de Melo

Espírito de missão

“Para ser grande, sê inteiro: nada Teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és No mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda Brilha, porque alta vive”. Os versos são de Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, a citação de Cristina Perez, diretora de Assuntos Legais e de Regulação da Vodafone Portugal. São “palavras 22

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estoicas e nobres” em que pensa nas “alturas de maior pressão”. E pressão não lhe falta: basta atentar nos dossiês que ocupam a sua agenda – o processo de atribuição dos direitos de utilização das frequências para a prestação de serviços de comunicações móveis de quarta geração, o acesso às redes de nova geração, o serviço univer-

“O advogado de empresa é um parceiro da equipa de gestão”

sal, a regulação das tarifas de terminação… A lista parece interminável. Desafios também não lhe faltam. Diz mesmo que “o momento não poderia ser melhor”: “Todos nós, enquanto comunidade, atravessamos uma das mais difíceis crises da nossa história recente e é precisamente nestes momentos que vejo grandes oportunidades de O agregador da advocacia


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crescimento, profissional e pessoal, pois as circunstâncias, não sendo as mais propícias, obrigam-nos a unir todos os esforços para procurar incessantemente a eficiência, a racionalização e a diferenciação e a não ceder à onda de pessimismo que assola e assombra o País”. Enquanto diretora jurídica da Vodafone Portugal os desafios são mais concretos. O maior consiste, “naturalmente”, em contribuir para a redução dos custos, mantendo, simultaneamente, o mesmo nível de excelência dos serviços que a equipa de advogados que lidera presta a todas as áreas da empresa, sem prejuízo da motivação. São – sublinha - “condições necessárias para ganhar a confiança, admiração e satisfação” dos clientes internos e externos. São também razões suficientes para Cristina Perez dizer da sua função que “comporta permanentes desafios e exige naturalmente muita dedicação, determinação, resistência e um grande espírito de missão”. Exercê-la requer desde logo uma grande proximidade e envolvimento com o negócio e a equipa de gestão, mas também uma capacidade forte de liderança de uma equipa de advogados especialista nas mais variadas áreas do Direito relacionadas com as comunicações eletrónicas. Uma equipa cujo desempenho é coadjuvado por assessores externos, que ajudam a defender em tribunal as causas da Vodafone, “grandes e pequenas”. É – enfatiza Cristina Perez - a conjugação da “excelência” destas duas equipas jurídicas que garante “o bom acompanhamento dos processos mais críticos e estratégicos para a empresa e a tomada de decisões esclarecidas e sustentáveis do ponto de vista legal e regulatório”. Dominar a miríade de áreas do Direito que enquadram a regulação do setor das telecomunicações é inerente à função de quem tutela os assuntos legais da operadora – entre o Direito das Telecomunicações e o Direito da Concorrência, passando pelos Direitos de Autor, há uma necessidade transversal, a de estar sempre atualizada. Nem poderia ser de outra forma num terreno tão marO agregador da advocacia

O maior desafio consiste, “naturalmente”, em contribuir para a redução dos custos, mantendo, simultaneamente, o mesmo nível de excelência dos serviços

cadamente dinâmico como aquele em que a Vodafone opera. Há que conhecer o negócio e conhecer a empresa. Só assim é possível assumir a responsabilidade da adoção de mecanismos legais de gestão de risco, mecanismos que, na opinião de Cristina Perez, constituem, hoje em dia, um fator estratégico de diferenciação que contribui para a competitividade das empresas. É esta responsabilidade ativa que a leva a afirmar, sem dúvidas, que “o advogado de empresa é um parceiro da equipa de gestão”. É esse o seu papel desde 2005, ano em que assumiu a direção de Assuntos Legais e de Regulação depois de quase uma década na Direção de Regulação e Relações com os Operadores. Chegou à operadora em setembro de 1996, ainda a Vodafone era Telecel, depois do estágio de advocacia no então Grupo Legal Português. Estava – conta – determinada a continuar o trilho enquanto advogada, mas um anúncio com o qual se cruzou desviou-a. “Fiquei entusiasmada”, recorda. Um entusiasmo que a levou a abraçar um desafio profissional que a conduziu aos dias de hoje.

“As circunstâncias, não sendo as mais propícias, obrigam-nos a unir todos os esforços para procurar incessantemente a eficiência, a racionalização e a diferenciação”

PERFIL

Embaixadora de causas Cristina Perez licenciou-se em Direito pela Universidade Católica de Lisboa com o sonho de ser diplomata ou mesmo embaixadora de causas, com preocupações de longo prazo, universais e sustentáveis. Um sonho em nome do qual se lançou num mestrado em Direito Europeu no Collège d’Europe, na cidade belga de Bruges. Ainda o acalenta, mas “outras agradáveis surpresas de vida” fizeram-na mudar de rumo. Abriram-lhe as portas da então Telecel. Aos 42 anos, elege entre os seus maiores gostos a família

e o desporto. Desde pequena que praticou diversas modalidades, futebol nomeadamente… Numa família dominada por rapazes – dois irmãos e oito primos – não lhe restou muita alternativa a não ser “dar tréguas às bonecas”. Atualmente, a natação e a dança são os seus desportos de eleição, sendo que as corridas e as pequenas maratonas a têm seduzido, por “culpa” do repto lançado por um grupo de “simpáticas e recentes amigas”. Um repto a que não resistiu e que reconhece ser fonte de “muito bem-estar”.

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Empresas

Responsabilidades dos gestores Compreende-se a opção do legislador pela responsabilidade penal fiscal cumulativa das empresas e gestores administradores, embora exista um agravamento do limite das coimas Os corpos sociais de gestão determinam a vontade coletiva das empresas. Pelo que se compreende a opção do legislador pela responsabilidade penal fiscal cumulativa das empresas e gestores administradores (artigos 6.º e 7.º do RGIT), contrariamente ao que sucede em relação à responsabilidade contraordenacional dos entes coletivos em que a lei exclui a responsabilidade individual dos respetivos agentes (artigo 7.º, n.º 4 do RGIT), embora exista um agravamento do limite das coimas (artigo 26.º, n.º 4, do RGIT). Trata-se de uma responsabilidade diferenciada, conferida a dois sujeitos (empresa e gestores), apesar de assentes no mesmo facto e culpa, envolvendo o sancionamento distinto de cada um deles. Os gerentes de facto também podem responder patrimonialmente por reversão em sede de execução fiscal (artigos 23.º e 24.º da LGT) em relação às dívidas tributárias, mas nesse último caso, trata-se de uma responsabilidade por dívidas de outrem (da empresa), daí o seu cariz meramente subsidiário e não cumulativo. No caso de falta de entrega dolosa de imposto superior a €7.500 por declaração, os gestores são, à semelhança da empresa, destinatários de notificação para a entrega do tributo em falta, o pagamento dos juros devidos e da coima aplicável, no prazo de 30 dias, enquanto condição de punibilidade (artigo 105.º, n.º 4, do RGIT). Apesar da isenção de juros de mora (artigo 23.º, n.º 5 da LGT), no plano criminal tributário, a lei impõe ao gestor o pagamento dos mesmos juros como oportunidade derradeira de evitar a sanção criminal no caso de dívida de imposto declarado não entregue ao Estado. 24

Março de 2012

“A maioria da doutrina e jurisprudência tem considerado que os gestores visados terão de ser pelo menos de facto, não sendo então imprescindível a sua consagração na lei, ou nos estatutos da sociedade comercial”

“Quando haja vários gerentes (…) entendemos que o regime da responsabilidade civil não é aplicável, em regra, devendo apurar-se concretamente em que medida cada um dos gestores da empresa contribuiu dolosamente para o resultado criminoso”

A maioria da doutrina e jurisprudência tem considerado que os gestores visados terão de ser pelo menos de facto (“quem dá ordens na empresa”), não sendo então imprescindível a sua consagração na lei, ou nos estatutos da sociedade comercial. Pensamos que, sobretudo nos crimes tributários omissivos, como é, por exemplo, o caso do crime de abuso de confiança fiscal (falta de entrega dolosa de imposto já suportado por terceiros), nada obsta ao sancionamento do gestor somente de direito que se prove não exercer qualquer poder efetivo de gerência na empresa, uma vez que o mesmo está sujeito a um especial dever de “diligência de um gestor criterioso e ordenado” (artigo 64.º, n.º 1, alínea a), do CSC). Por outro lado, o gestor, ao constar no registo comercial (artigo 11.º do CRCom), vincula-se perante terceiros, criando expectativas legítimas no Fisco, nos fornecedores, clientes, trabalhadores e na sociedade civil em geral. Uma questão igualmente pertinente consiste na responsabilização criminal do gestor nos casos de gerência plural, designadamente no sistema de gerência conjunta. Quando haja vários gerentes, e salvo cláusula do contrato de sociedade que disponha de modo diverso, os respetivos poderes são exercidos conjuntamente, considerando-se válidas as deliberações que reúnam os votos da maioria e a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos gerentes ou por ela ratificados (artigo 261.º, n.º 1, do CSC). Entendemos que o regime da responsabilidade civil (artigos 72.º e 73.º, do CSC) não é aplicável, em regra, no direito sancionatório tributário, devendo apurar-se concretamente em que medida cada um dos

Paulo Marques jurista, inspetor tributário, pós-graduado em Ciências Jurídico-Administrativas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. É autor, entre outros, de Elogio do Imposto – A relação do Estado com os Contribuintes, editado pela Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer

gestores da empresa contribuiu dolosamente para o resultado criminoso (ex: dano ao erário público causado pela não entrega do imposto), sendo a respetiva responsabilidade criminal individualizada, independentemente do modo de vinculação da sociedade, embora este possa ainda assim relevar quando, por exemplo, atendendo ao regime legal ou contratual aplicável, a abstenção de algum dos gestores tiver viabilizado o facto criminoso. O agregador da advocacia


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Passeio Público

Ana Duarte

A paixão pela Matemática e pelos números sempre marcou a vida de Rita Magalhães, talvez por isso se tenha especializado em Fiscal. É com uma energia contagiante que, aos 39 anos, a associada da Vieira de Almeida & Associados fala da carreira e do que a levou ao Direito

Ramon de Melo

Fascinada pelos números

Energia, argumentação e capacidade de persuasão não faltam a Rita Magalhães. Advogada de profissão, sempre teve uma personalidade marcada por estas características. Que o pai identificou desde cedo. E que o levou a aconselhá-la a seguir Direito. Os testes psicotécnicos confirmaram 26

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a tendência e Rita concordou que era uma boa opção. Hoje, é associada da Vieira de Almeida & Associados e sente-se realizada profissionalmente. Filha de uma médica e de um informático, na família não existia qualquer tradição de cursar Direito, tinha somente uma tia

Desde muito nova que gosta de defender as suas ideias até ao fim. E, quando se depara com uma injustiça, nada a consegue demover de intervir

formada nesta área e que Rita admirava muito intelectualmente. Talvez aí tenha nascido o primeiro interesse pelo Direito, conta. Ao terminar o secundário, teve ainda um momento de hesitação e ponderou inscrever-se em Relações Internacionais, talvez impelida pelo gosto por viagens. Mas O agregador da advocacia


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Num restaurante, um dos seus prazeres

o Direito falou mais alto. Afinal, desde muito nova que gosta de defender as suas ideias até ao fim. E, quando se depara com uma injustiça, nada a consegue demover de intervir. Nascida e criada na capital, foi na Universidade de Lisboa que estudou. Durante o curso, sentiu um certo apelo e curiosidade por viver noutro país. Tentou inscrever-se no Erasmus, mas o programa ainda se encontrava pouco desenvolvido e a Faculdade de Direito não dispunha dessa possibilidade. Hoje, confessa que tem pena de não ter tido essa experiência, mas o Direito é “uma área que está muito ligada com o próprio país”, o que a fez não querer arriscar mais tarde. Foi na faculdade que descobriu o gosto por Direito Fiscal. “Sempre fui fascinada por números”, comenta. Matemática sempre fora das suas cadeiras preferidas e ao longo do curso foi percebendo que Fiscal era a área que mais a cativava. Até hoje, Rita não consegue explicar porquê: “Talvez por O agregador da advocacia

Na estação de caminho-de-ferro de Maputo, durante a viagem a Moçambique

O gosto pelos números que já vinha dos tempos de escola reflete-se no seu dia-a-dia. Rita é uma advogada prática, que gosta que “dois mais dois sejam quatro”. O que ajuda a explicar a preferência por Fiscal

No Kruger Park, num safari ao final do dia

ser uma das áreas mais económicas do Direito e que tem impacto em quase todas as vertentes da nossa vida em sociedade”, arrisca. Ao terminar o curso, surgiu a oportunidade de ingressar no escritório de Fernando Castro Silva, um reconhecido fiscalista. Não a deixou escapar. Da experiência destaca a “capacidade de trabalho fora de série” que caracteriza o seu patrono e o rigor que exige no escritório. Foi uma experiência que a marcou e ajudou a formar-se a nível profissional. No entanto, passados sete anos, Rita ambicionava integrar um projeto maior e onde tivesse maior “autonomia e responsabilização”. Foi exatamente isso que encontrou na VdA. Em 2003, ingressou na sociedade para integrar a equipa de Direito Fiscal que Tiago Moreira e Conceição Gamito tinham acabado de criar. Ao fim de oito anos, o balanço é bastante positivo: Rita Magalhães faz o que mais gosta, num sítio onde se sente muito bem.

O gosto pelos números que já vinha dos tempos de escola reflete-se no seu dia-a-dia. Rita é uma advogada prática, que gosta que “dois mais dois sejam quatro”. O que ajuda a explicar a preferência por Fiscal. Determinada e dedicada na vida profissional, é assim – diz - que também age na vida pessoal. Casada e com dois filhos, um rapaz de sete anos e uma rapariga de três, reconhece que o mais difícil de gerir é o grau de exigência da profissão e, em simultâneo, desempenhar o papel de mãe. Mais difícil do que “qualquer problema de um cliente”. A advocacia é “super exigente em termos de dedicação, de disponibilidade mental e de tempo”, um tempo de que os filhos também necessitam. Daí que Rita tente ser uma mãe presente, fazendo questão de estar a par do que se passa com eles e de os acompanhar nas tarefas do dia-a-dia, desde os trabalhos de casa à leitura de um livro antes de deitar. É por acreditar que, para os filhos, é importante partilhar moMarço de 2012

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Passeio Público

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Nas suas viagens, há uma paragem obrigatória – os restaurantes. A advogada é uma apaixonada por gastronomia, portanto, antes de partir, já leva todos os restaurantes pensados e até alguns marcados

mentos com os pais que as férias são, preferencialmente, passadas em família. Viajar é, aliás, uma das paixões da advogada. Recorda, com entusiasmo, a viagem que fez o ano passado a Moçambique e ao Kruger Park, na África do Sul. Foi – diz - inesquecível, principalmente por ter desfrutado da companhia do filho. Que ainda hoje fala dessa viagem, como “se fosse a coisa mais importante que já fez na vida”. “Talvez até tenha sido”… No entanto, a viagem de sonho de Rita Magalhães é a Machu Picchu, no Perú. Por enquanto, fica adiada, porque gostava de levar os filhos e o percurso exige alguma preparação física que a idade deles ainda não permite. Mas garante que um dia a concretizará. Nas suas viagens, há uma paragem obrigatória – os restaurantes. A advogada é uma apaixonada por gastronomia, portanto, antes de partir, já leva todos os restaurantes pensados e até alguns marcados.

Rita sente orgulho em ser advogada, pois acredita que o Direito é Justiça. A determinação e persistência que a caracterizam levam-na a entregar-se aos casos, defendendo as causas até ao fim, explorando todos os pormenores

Depois das férias é sempre tempo de regressar ao trabalho. Rita sente orgulho em ser advogada, pois acredita que o Direito é Justiça. A determinação e persistência que a caracterizam levam-na a entregar-se aos casos, defendendo as causas até ao fim, explorando todos os pormenores. Considera até que é “chata”. Mas é a fazê-lo que se sente completamente realizada a nível profissional, principalmente quando encontra uma solução que é “exatamente o que o cliente quer, tecnicamente robusta e à prova de bala”. Ao olhar para trás, confessa: “Não me estou a ver a fazer outra coisa”.

opinião

Defensora da Arbitragem Rita Magalhães é uma forte defensora da Arbitragem Tributária. Para a associada da VdA, esta pode ser uma forma de resolver o problema das pendências, além de ir ao encontro dos objetivos dos clientes. Nomeadamente, em termos de tempo. A Arbitragem possibilita uma resposta rápida e, por experiência, Rita sabe que a morosidade dos tribunais é incompatível com as necessidades dos clientes. Além disso, as custas também são menores e o processo é mais simples, o que também agrada aos clientes. Contudo, reconhece que esta prática ainda não está totalmente divulgada. E, por ser uma nova forma de resolver problemas, gera alguma des-

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confiança. Mas “primeiro estranha-se, depois entranha-se”, pelo que Rita acredita que à medida que as decisões forem publicadas a desconfiança vai acabar. É que as resoluções podem ser consultadas e as pessoas podem verificar que “as decisões são tomadas com todos os fundamentos e todo o processo é transparente, percebendo em quem confiar”. Em julho passado, Rita Magalhães foi nomeada para integrar a lista de árbitros do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD). Espera desta forma poder dar o seu contributo para demonstrar a eficácia desta alternativa aos tribunais. E acredita que “cabe aos advogados ajudar os clientes a perceber as vantagens da Arbitragem Tributária”.

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Insolvência

A alternativa extrajudicial Idealmente, o processo de recuperação extrajudicial teria o efeito de uma espiral ascendente de sucesso para credores e empresas. Há que publicitar este tipo de solução menos morosa, menos custosa e mais benéfica, especialmente numa conjuntura em que aumenta gravosamente o número de insolvências O encerrar de empresas e o desmoronar financeiro das famílias tem vindo a ser galopante desde 2010 e, infelizmente, a tendência não adivinha melhorias. A falta de dinâmica no mercado, originando pouco fluxo comercial, gera inevitavelmente um decrescer da atividade económica, e, consequentemente, incapacidade de cumprimento das obrigações constituídas. A insolvência é encarada como uma “tábua de salvação” para muitos particulares e empresas. Todavia o pretendido fresh start, após um processo em que os insolventes ficam desprovidos de todos os seus bens, não é uma tarefa fácil. E findo o processo de insolvência? Pretender-se um “começar de novo” nos tempos que correm é, para alguns, quase imaginário. Há que estabelecer mecanismos que evitem um despojar de tudo o que os indivíduos possuem, que passem por uma recuperação amigável da situação de incumprimento, quer das famílias quer das empresas, beneficiando todas as partes. Com esse objetivo, o Governo Português divulgou a Resolução n.º 43/2011 quanto aos princípios orientadores da recuperação extrajudicial de devedores a par de novas alterações que serão levadas a cabo no Código de Insolvência e Recuperação de Empresa. Os princípios incluídos na referida Resolução vão no seguimento do que era já estabelecido no Procedimento Extrajudicial de Conciliação, mediado pelo IAPMEI. A Resolução vem acrescentar que o procedimento extrajudicial de recuperação de devedores apenas deverá ser iniciado quando os O agregador da advocacia

“A insolvência é encarada como uma ‘tábua de salvação’ para muitos particulares e empresas. Todavia o pretendido fresh start, após um processo em que os insolventes ficam desprovidos de todos os seus bens, não é uma tarefa fácil”

“O procedimento extrajudicial de recuperação de devedores apenas deverá ser iniciado quando os problemas financeiros do devedor possam ser ultrapassados e o devedor possa com forte probabilidade manter-se em atividade após a conclusão do acordo”

problemas financeiros do devedor possam ser ultrapassados e o devedor possa com forte probabilidade manter-se em atividade após a conclusão do acordo. Sugere-se aos credores que, durante o período de acordo, não pratiquem atos lesivos do património do devedor, abstendo-se de intentar novas ações judiciais e suspender as existentes. Claro está que ao devedor é proibida a prática de quaisquer atos que prejudiquem as garantias de pagamento dos créditos. Permite-se – ou indica-se como princípio – que sejam concedidos financiamentos adicionais à empresa devedora. Nada de novo aqui, pois tal já acontece mesmo com ações judiciais em curso. Em algumas situações consegue-se um bom resultado, fornecendo uma maior liquidez e uma maior margem de manobra para cumprimento de obrigações, sendo possível liquidar na totalidade créditos mais pulverizados. Todavia, casos há em que o efeito é exatamente o inverso, sobrecarregando-se ainda mais o nível das obrigações mensais das empresas. É necessário um grande controlo sobre a concessão de financiamento a empresas já em dificuldades, não sendo poucos os casos em que o património sai da esfera dos devedores. As intenções contidas nos princípios têm um bom ponto de partida. Pretende-se que a empresa se mantenha em atividade, sem passar por um processo de insolvência, e, consequentemente, mantendo postos de trabalho; que os credores possam ver-se ressarcidos em montantes mais elevados, comparativamente ao que

Vanda Castro Lopes Advogada no Departamento de Contencioso da Kennedys Portugal LLP, exerce atividade nas áreas de Direito Executivo, Direito da Insolvência, Direito dos Seguros e Direito Bancário

seriam por via da liquidação – em grande prejuízo para credores não garantidos. Afastam-se os efeitos nocivos da publicidade de um processo de insolvência e a ideia de que uma empresa insolvente é uma empresa “perdida”. Idealmente, o processo de recuperação extrajudicial teria o efeito de uma espiral ascendente de sucesso para credores e empresas. Há que publicitar este tipo de solução menos morosa, menos custosa e mais benéfica, especialmente numa conjuntura em que aumenta gravosamente o número de insolvências – dado largamente divulgado na comunicação social, onde nunca se ouve falar do processo extrajudicial. Março de 2012

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Entrevista

Hermínio Santos jornalista hs@briefing.pt

A orgânica hierarquizada e funcional do Ministério Público foi tão questionada nos últimos anos que deixou de existir “ordem e comando” naquela estrutura, diz Nuno Morais Sarmento, 51 anos, sócio da sociedade de advogados PLMJ, e que acredita na “coragem e capacidade de desconstrução” da ministra da Justiça para levar por diante as mudanças que são necessárias no sector

Nuno Morais Sarmento, sócio da PLMJ

Ramon de Melo

Ministra tem coragem

Advocatus I Já é tempo de fazer um balanço da atividade da ministra da Justiça. O que pensa da sua atuação até agora? Nuno Morais Sarmento I Já é tempo de fazer algum comentário mas ainda é cedo para fazer um balanço e portanto é sempre com esta reserva que acho que as opiniões devem ser expres30

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sas neste momento. A dra. Paula Teixeira da Cruz tem desde logo uma característica pessoal que me levou a ver com entusiasmo a sua escolha para a pasta da Justiça: a capacidade de desconstrução. Assistimos a intervenções desconstrutivas no tempo em que estava na Câmara Municipal de Lisboa e na liderança

“Como relacionar a autonomia da PJ com a tutela da investigação pelo MP merece reflexão”

do PSD, com Marques Mendes. Ora, entendo que algumas das soluções para os problemas da Justiça em Portugal passam por uma desconstrução. Advocatus I Porquê? NMS I Porque estamos muito anquilosados, temos posições muito rígidas e consolidadas das O agregador da advocacia


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diferentes corporações no sistema judicial. Este sistema segue o mesmo modelo há décadas, não tem alterações nos protagonistas principais, na organização do Ministério Público (MP) e das polícias de investigação, na relação entre a magistratura do MP e a magistratura judicial. O resultado é que isso tende a cristalizar os protagonistas pela sua longevidade e eu penso que essa é uma das razões da inoperância das sucessivas tentativas de reforma. A dra. Paula Teixeira da Cruz tem coragem e capacidade de desconstrução. Isso foi uma coisa que me animou. Em cima disso tem uma experiência prática do Direito. É uma mulher que viveu como advogada em interação com o sistema judicial, com o funcionamento prático da Justiça. Tem também uma experiência nas instituições da Justiça, quer nos conselhos quer, principalmente, na Ordem dos Advogados. Tudo isto são condições positivas para o desempenho da função. Advocatus I Mudaria a arquitetura do Ministério Público? NMS I Em primeiro lugar, antes de discutir o modelo de report e de tutela do Ministério Público (MP), falaria sobre o seu funcionamento. No modelo atual, e sem precisar de o alterar, eu não percebo porque é que o MP deixou de ter hierarquia. O MP tinha uma cadeia de comando, e faz sentido que a tenha, e a partir de determinada altura, sempre pelas notícias que surgiram sobre uma eventual alinhamento político ou coincidências com posições políticas, questionou-se a lógica orgânica hierarquizada e funcional do MP. O resultado foi que nada melhorou porque deixou de haver ordem e comando. Desde os tempos de Cunha Rodrigues que os procuradores-gerais ficaram relativamente diminuídos pela opinião pública no exercício dessa tutela funcional sobre os magistrados do MP. Vimos isso com Souto Moura, de maneira clara, e O agregador da advocacia

“Desde os tempos de Cunha Rodrigues que os procuradores-gerais ficaram relativamente diminuídos pela opinião pública no exercício dessa tutela funcional sobre os magistrados do MP. Vimos isso com Souto Moura, de maneira clara, e também com o atual procurador, embora seja um homem mais afirmativo”

“Noutro dia ouvia, com espanto, alguém dizer que as sociedades de advogados, num tempo destes de dificuldades económicas, iriam ter problemas e que o modelo deveria ser mais o dos pequenos e médios escritórios. Não percebi o racional pois é precisamente o contrário”

também com o atual procurador, embora seja um homem mais afirmativo. Foi pela leitura da opinião pública e pela atuação dos outros operadores judiciais que se chegou a esta situação. Esta pressão dos “tempos”, em que todos, de uma forma ou de outra, colaborámos, desfuncionalizou o MP. Advocatus I Deve o MP ficar sob a tutela do Ministério da Justiça? NMS I Tenho as maiores dúvidas que isso represente a solução dos problemas que têm sido apontados ao funcionamento do MP. Considero que é imediatamente mais importante resolver, por exemplo, o problema da relação entre o MP e a Polícia Judiciária (PJ) na fase de inquérito e de investigação, que não está resolvido nem é simples de resolver, não porque tenha havido má vontade ou incompetência daqueles que para o tema olharam mas sim porque não há uma solução mágica. Parece-me importante manter a autonomia da PJ, que é um órgão de polícia e não um instrumento de investigação do MP. Como relacionar a autonomia da PJ com a tutela da investigação pelo MP merece reflexão e é mais importante operacionalizar isso do que resolver a questão da tutela ou não tutela do MP pelo Ministério da Justiça.

“A dra. Paula Teixeira da Cruz tem coragem e capacidade de desconstrução. Isso foi uma coisa que me animou”

Advocatus I No caso das pendências qual é a sua ideia para “descongestionar” o sistema? NMS I Uma medida imediata é a de tirar dos tribunais as “paletes” de execuções que por lá andam. Isso pode fazer-se de várias maneiras: atribuindo uma competência decisória a instâncias de mediação de conflitos, a tribunais de primeira instância, a soluções que permitam resolver as pequenas execuções imediatamente – mas isto só resolve a pendência de hoje, não se altera o modelo ou estrangulamento que hoje tem. Tirar dos tribunais as execuções de pequeno volume é um processo que já vem de Março de 2012

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Entrevista

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“Em muitos casos é, para mim, menos imponderável uma sentença arbitral do que uma judicial”

anteriores Governos e elas são, de facto, a primeira razão quantitativa do bloqueio dos tribunais. Depois, e como modelo de execução, eu diria que toda ela pode ser agilizada – ainda é muito “garantística” -, os agentes de execução têm que ser profissionais, rápidos e responsabilizados pelos resultados, não existindo nenhuma razão para termos agentes de execução que conseguem resultados e outros que parecem repetir os erros tradicionais do sistema. Há muitas pessoas disponíveis ou com vontade para desempenharem as funções como agentes de execução. A fase da penhora tem de ser simplificada e aí estamos prestes a dar um passo importante que é o da possibilidade de penhora das contas bancárias.

“Quando Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite vieram dizer que o País estava de tanga quiserem chamar a atenção para o problema que temos hoje e que todos assumimos que é preciso resolver. Nessa altura o que se passou foi que o País não queria ouvir dizer que estava de tanga pois aquilo significava mudar de vida e ninguém o queria”

Advocatus I Acha que a Justiça tem sido “refém” de grupos de pressão? NMS I Não, até porque os grupos de pressão atuam na Justiça Penal, não é na Cível. As execuções que estão nos tribunais não têm nada a ver com os grupos de pressão. As ações declarativas também não, assim como o processo administrativo. Em Portugal temos o hábito de encontrar um terceiro que seja responsável pelas nossas culpas – é o mais fácil. Advocatus I Uma das suas áreas no escritório é a arbitragem. Como avalia a sua evolução? NMS I É um sector que está em expansão pois trata-se de um mecanismo alternativo de resolução de conflitos que é mais garantido no seu resultado. Em muitos casos é, para mim, menos imponderável uma sentença arbitral do que uma judicial. Advocatus I Porquê? NMS I Porque na arbitragem os árbitros são escolhidos. Cada uma das partes indica um árbitro e cada vez mais, principalmente em litígios de grande dimensão, os árbitros têm de ter um comportamento a sério de indepen32

Março de 2012

“Não faço leituras de responsabilidade política individual mas a apontar um nome, a primeira pessoa que eu chamaria sobre o que se passou seria Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, que fez tudo ao contrário do que deveria ter feito. O Banco de Portugal deveria ter sido o nosso travão, o sinal vermelho. Deveria ternos dito o que disse a troika”

dência. Sou, com frequência, advogado e árbitro e tenho arbitragens internacionais em curso, com árbitros de parte escolhidos por mim e pelo meu cliente com quem nunca falei durante o processo porque pura e simplesmente os árbitros internacionais nem falam com a sua parte. Este exemplo dá para perceber que não é uma função levada a brincar porque, se assim fosse, esses árbitros arriscar-se-iam a deixar de integrar colégios de árbitros. Na arbitragem os árbitros são escolhidos e depois, entre eles, escolhem o presidente do tribunal, que é o decisivo, ou, na ausência de acordo, há mecanismos de indicação consoante o tipo de arbitragem em que estamos a funcionar. Ou seja, na arbitragem os juízes-árbitros são escolhidos e normalmente as partes escolherão quem perceba do assunto, quem tenha vivência prática das matérias. Quando nós vamos para os tribunais cíveis e nos sai um jovem juiz ou uma jovem juíza de 25 ou 30 anos que nunca viu um contrato internacional é difícil que não haja uma grande imponderabilidade na sua sentença, até porque não tem prática nem formação naquela matéria nem especialização. Isto acontece demasiadas vezes nos tribunais. Quantas vezes já senti que em tribunal o juiz não tinha percebido coisa nenhuma daquilo que de técnico estava em causa. Isto não é nenhuma crítica ao juiz pois é impossível que ele seja especializado em qualquer tipo de matéria que lhe apareça à frente. Nas arbitragens esse risco está ultrapassado pela existência de vários mecanismos, existindo menos possibilidade de “jogar” com as formalidades do processo. Advocatus I Por isso é que a arbitragem é um caminho cada vez mais escolhido… NMS I Sim e até a velocidade de decisão de uma arbitragem é definida no princípio pelas partes. Quer em termos de tempo quer em termos de regras processuais O agregador da advocacia


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“Olho para o ano de 2012 de uma forma muito simples: se o pior ainda está para vir, o melhor de nós também”

a arbitragem tem óbvias vantagens sobre os tribunais. Mas o que é que está a acontecer que vai ser negativo para a arbitragem? Primeiro, não estava dominada por corporação nenhuma, era um processo em crescimento e por isso bastante livre. Neste momento começamos a ver colégios de peritos de determinadas organizações que se consideram detentores de um maior conhecimento ou verdade sobre processo arbitral. Ou seja, estão-se a construir, aos poucos, pequenas corporações na arbitragem e teremos pela frente problemas parecidos com aqueles que temos na Justiça. O segundo problema que identifico na arbitragem proximamente é que ela só serve para processos caros pois envolve custos sig-

“Quantas vezes já senti que em tribunal o juiz não tinha percebido coisa nenhuma daquilo que de técnico estava em causa. Isto não é nenhuma crítica ao juiz pois é impossível que ele seja especializado em qualquer tipo de matéria que lhe apareça à frente. Nas arbitragens esse risco está ultrapassado pela existência de vários mecanismos”

nificativos – os julgados de paz “bebem” um pouco da ideia da arbitragem mas temos de encontrar mecanismos sucedâneos à arbitragem para processos simplificados e de menor valor económico. Se assim não for arriscamo-nos a ter encontrado uma maneira de funcionalizar a Justiça para os grandes casos sem solução equivalente para os pequenos casos, que são a esmagadora maioria. Quando se olha para as alterações a introduzir no sistema judicial – e alguém como a dra. Paula Teixeira da Cruz que, seguramente, já teve experiências em processos de arbitragem – uma das coisas que se pode fazer é olhar para o processo arbitral, que todos reconhecemos ser mais rápido, eficiente e justo, e perceber o que é

que podemos “importar” para o outro processo. Advocatus I Tem uma formação “generalista” mas, apesar disso, reconhece que, hoje em dia, em termos de organização de advogados, as sociedades são incontornáveis? NMS I Noutro dia ouvia, com espanto, alguém dizer que as sociedades de advogados, num tempo destes de dificuldades económicas, iriam ter problemas e que o modelo deveria ser mais o dos pequenos e médios escritórios. Não percebi o racional pois é precisamente o contrário. Porquê? Primeiro porque as grandes sociedades conseguem, precisamente pela sua dimensão, comportar diversidade dentro de si. Nós temos nesta sociedade >>>

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Entrevista

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“Esta pressão dos “tempos”, em que todos, de uma forma de outra, colaborámos, desfuncionalizou o MP”

de advogados todas as competências especializadas necessárias no Direito. Um pequeno escritório, de cinco advogados, por exemplo, não consegue cobrir com a mesma capacidade técnica todas as especialidades do Direito. Isto significa que quando temos uma organização que enfrenta problemas de diversa ordem – com os fornecedores, clientes, autoridades, registos e patentes, concorrência – ou ela anda a dividir-se por vários advogados ou pode, numa plataforma de advogados como esta, encontrar a resposta sem sequer sair do quadro de confiança da relação de confiança com um advogado. Nós precisamos de sociedades de advogados para dar resposta a certas realidades empresariais, associativas, públicas e precisamos de advogados individuais para dar resposta a outro tipo de questões. Eu não vejo que as sociedades de advogados tirem espaço à prática individual, não a substituem nem são uma alternativa suficiente e integral. Penso que tenderemos para ter, nos pequenos escritórios, aquilo a que chamamos boutiques especializadas e as sociedades como plataformas. Sou muito

“O MP tinha uma cadeia de comando, e faz sentido que a tenha, e a partir de determinada altura, sempre pelas notícias que surgiram sobre uma eventual alinhamento político ou coincidências com posições políticas, questionou-se a lógica orgânica hierarquizada e funcional do MP. O resultado foi o de que nada melhorou por que deixou de haver ordem e comando”

PERFIL

Político, advogado e viajante Foi a política que lhe deu visibilidade mediática. A advocacia é desde sempre a sua opção de vida. As viagens e o mergulho são alguns dos seus hobbies. Com Moçambique, país que visita com frequência, mantém uma relação especial, um misto de negócios com prazer. Nuno Morais Sarmento é licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (1984) e está inscrito na Ordem dos Advogados desde 1992. É sócio da PLMJ, foi deputado, dirigente partidário e ministro nos Governos de Durão Barroso e Pedro Santana Lopes. No PSD foi sempre um barrosista e nas últimas eleições no partido apoiou Paulo Rangel. Na sua atividade política ficou conhecido pela

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determinação como geriu a reestruturação da RTP. Frontal, sem qualquer problema em defender ideias de rutura, elege Vítor Constâncio como o principal responsável pela crise que estalou em Portugal. Ex-praticante de boxe no Sporting, é um adepto do mergulho e gosta de viajar. Do seu percurso profissional destacam-se os cargos de assessor da Provedoria da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, em 1991, administrador Delegado do Hospital de Alcoitão, em 1992, e membro do Conselho Superior do Ministério Público, em 1997. É comentador político na Rádio Renascença e convidado frequente dos media para falar sobre atualidade política, da qual permanece um observador atento.

defensor da prática individual pois só concebo uma sociedade como esta onde sou sócio como sendo um conjunto de advogados que o são individualmente. Na minha perspetiva, as sociedades de advogados não podem substituir nem sequer atentar contra a inalienável liberdade de cada advogado que a relação entre advogado e cliente exige. Quando estou num caso sinto-me vinculado ao cliente e às regras da profissão, antes de estar vinculado à sociedade onde estou. É por isso que eu digo que a prática individual tem de ser defendida. No momento em que a perdermos as sociedades de advogados podem virar sociedades de funcionários jurídicos. Advocatus I Continua a ser um observador atento do País, com intervenção pública. Está otimista sobre o futuro de Portugal? NMS I Olho para o ano de 2012 de uma forma muito simples: se o pior ainda está para vir, o melhor de nós também. Temos que ser nós a resolver o problema. É evidente que há uma série de fatores externos que podem condicionar ou até determinar o nosso futuro próximo mas quanto a isso somos relativamente impotentes. Para lá disso o essencial que é a nossa vida em 2012 depende de nós próprios, da atitude, do compromisso que assumimos. Advocatus I E sobre o Governo? Havia algum ceticismo inicial da sua parte em relação a este Executivo… NMS I Eu disse a certa altura – e acho que responsavelmente era assim que muita gente pensava, embora em Portugal se tenha esse medo de se falar o que se pensa – que Passos Coelho era o ovo Kinder. Com isso quis dizer que relativamente a ele tínhamos que esperar para ver. Tinha características que eram auspiciosas e outras que nos levavam, responsavelmente, a ter reticências ou dúvidas a nível, por exemplo, da experiência profisO agregador da advocacia


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sional e traquejo na vida em que todos andamos fora da política. Hoje digo que a surpresa que o ovo guardava era boa, não tenho nenhum problema em dizê-lo. Em primeiro lugar pela atitude, mais até do que pelas medidas, e distingo o primeiro-ministro do Governo, pois acho que ele tem valido tanto como todo o Executivo. A atitude dele no compromisso sério que revela, na determinação que tem em, nos casos de dúvida, optar pela verdade e não pela mentira é uma mudança que pode ser pequena mas é radical em termos de prática. Advocatus I Fez parte de um Governo onde o primeiro-ministro disse na altura que o País estava de tanga e toda a gente se escandalizou. Dez anos depois o País está mesmo de tanga? Aquele Governo foi, de alguma forma, injustiçado? NMS I É uma tanga já muito puída…Não me preocupa se foi ou não injustiçado mas foi, sem dúvida, o primeiro Governo pós25 de Abril que chamou objetivamente a atenção para o problema. Quando Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite vieram dizer que o País estava de tanga quiserem chamar a atenção para o problema que temos hoje e que todos assumimos que é preciso resolver. Nessa altura o que se passou foi que o País não queria ouvir dizer que estava de tanga pois aquilo significava mudar de vida e ninguém o queria. Entre o País mudar de vida ou mudar de Governo, foi mais simples esta última hipótese. Agora, o processo de reversão é complicado. Vai-se fazer pelo empobrecimento do País, recolocando-o no nível anterior ao do momento de enlouquecimento coletivo em que todos vivemos durante 10 anos. A década perdida é, no meu entender, entre 1992 e 2002 e, desde então e até hoje, o que fizemos foi meter a cabeça na areia, continuámos a fazer o que não podíamos fazer. Não faço leituras de responsabilidade O agregador da advocacia

“As execuções que estão nos tribunais não têm nada a ver com os grupos de pressão. As ações declarativas também não, assim como o processo administrativo. Em Portugal temos o hábito de encontrar um terceiro que seja responsável pelas nossas culpas – é o mais fácil”

“Eu não vejo que as sociedades de advogados tirem espaço à prática individual, não a substituem nem são uma alternativa suficiente e integral”

política individual mas, a apontar um nome, a primeira pessoa que eu chamaria sobre o que se passou seria Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, que fez tudo ao contrário do que deveria ter feito. O Banco de Portugal deveria ter sido o nosso travão, o sinal vermelho. Deveria ter-nos dito o que disse a troika. Pasmo como é que andamos a apontar o dedo a políticos que, apesar de tudo, ainda têm a seu favor não serem técnicos, e não falamos do então governador do Banco de Portugal.

“A década perdida é, no meu entender, entre 1992 e 2002 e, desde então e até hoje, o que fizemos foi meter a cabeça na areia, continuámos a fazer o que não podíamos fazer”

Advocatus I É adepto do plano do Governo para a RTP (Morais Sarmento foi responsável pelo programa de reestruturação da televisão pública no Governo de Durão Barroso)? NMS I Essa é uma matéria sobre a qual intencionalmente não me tenho pronunciado, apesar das solicitações, e por duas razões: porque até hoje faltavam peças para entender o plano todo e, em segundo lugar, porque falta perceber as opções do Governo

em questões fundamentais neste processo como, por exemplo, o papel dos media, a reconfiguração do mercado e dos seus protagonistas, as regras de funcionamento em matéria de publicidade. Daquilo que é conhecido discordo de algumas coisas e concordo com outras. A minha avaliação, quando a fizer, não será inteiramente coincidente com a do Governo. Até que ponto é que ela será divergente ou não, aguardo por alguns capítulos desta novela que ainda não foram disponibilizados publicamente. A realidade e a leitura que o País fez deste sector em 2002 e a faz hoje é completamente diferente e portanto não vou aqui dizer que o que eu fiz é que era bom. Atacámos determinadas questões, algumas delas mantêm-se, outras não e há outras novas que surgiram. É uma das áreas em que não podemos ter uma intervenção casuística, onde se resolve a cada momento as questões que estão em cima da mesa. Tem de haver uma estratégia e opções tomadas antes de as reformas serem implementadas. Março de 2012

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Trabalho

Destacamento: que regras? Em situações tão díspares como as da prospeção de novos mercados ou da prestação de serviços em Angola ou Moçambique, as empresas portuguesas confrontam-se frequentemente com a necessidade de destacar trabalhadores Este enquadramento desdobra-se por diferentes vertentes, impondo-se a sua conjugação. Antes de mais, há que olhar para as regras locais de entrada e permanência de estrangeiros (salvo para nacionais do país de destino). Para Angola como para Moçambique é necessário visto de trabalho e é quase sempre aqui que começam as dificuldades do destacamento de quadros portugueses. A articulação das regras internas de contratação de estrangeiros (ex. quotas máximas) com os requisitos e formalidades de concessão de vistos é um ponto fulcral de qualquer processo de destacamento. Para além disso, há que considerar as alternativas de enquadramento da relação trabalhador destacado/ empregador, a que pode acrescer a vertente da relação com a empresa beneficiária do trabalho prestado em regime de destacamento. Esta pode pressupor uma relação triangular como no caso do trabalho temporário ou acordos tripartidos, como acontece na cedência ocasional (transfronteiriça). O tratamento jus-laboral daquela relação pode ser muito diverso, o que reflete a diversidade de situações legalmente submetidas ao regime do destacamento. A consideração de que o destacamento impõe um dever de comunicação à ACT e que pode gerar obrigações de informação (ex. sobre condições de repatriamento ou o acesso a cuidados de saúde) é outro aspeto de natureza laboral que não pode ser descurado. O mesmo se diga da previsão em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho de regras aplicáveis ao destacamento. No plano das políticas internas alguns são os exemplos dos grupos 36

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“A articulação das regras internas de contratação de estrangeiros (ex. quotas máximas) com os requisitos e formalidades de concessão de vistos é um ponto fulcral de qualquer processo de destacamento”

“A vigência dos princípios da universalidade e da territorialidade em sede de IRS impõe, em caso de destacamento, que se afira as obrigações declarativas e contributivas mas, acima de tudo, que se identifiquem caminhos para prevenir a dupla tributação”

empresariais em que a regulamentação do destacamento serve o desenvolvimento de carreiras ou apresenta-se como fator de motivação dos quadros. O destacamento também é indissociável da questão previdencial. Há que encontrar o quadro indicado para cada caso e soluções capazes de responder às prioridades das partes. O caráter temporário e a duração do destacamento, a par do regime previdencial do Estado de destino, são aspetos determinantes para a escolha das opções possíveis. No caso de Angola e de Moçambique não há instrumentos bilaterais em vigor. Embora celebrados, aguardam entrada em vigor. No destacamento temporário pode manter-se o enquadramento no regime de segurança social português, sujeito a formalidades ou autorizações, consoante a duração do destacamento. Tanto o regime angolano como o moçambicano preveem a possibilidade de isenção dos trabalhadores destacados desde que provem estar inscritos no país de origem. A alternativa de suspensão do enquadramento no regime português também existe, dependente de formalidades e da sujeição no país de destino a regime de proteção social obrigatório. Em sede contributiva, especial atenção deve ser dada aos casos excluídos do conceito de destacamento para efeitos de segurança social. A alternativa do seguro social voluntário pode ser, por vezes, a resposta para garantir a continuidade contributiva em Portugal. Por fim, indissociável do destacamento é a vertente tributária. A vigência dos princípios da universalidade e da territorialidade em sede de IRS impõe, em caso de

Helena Tapp Barroso sócia da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, integra a equipa de Trabalho e Segurança Social. É licenciada pela Universidade Católica Portuguesa

destacamento, que se afira as obrigações declarativas e contributivas mas, acima de tudo, que se identifiquem caminhos para prevenir a dupla tributação. No caso de Moçambique, há convenção de dupla tributação, coisa que não sucede no caso de Angola. Em jeito de conclusão diremos que quando se trata de acompanhar, de forma integrada, cada caso de destacamento e de apresentar as melhores soluções, uma perspetiva de conjunto que olhe às várias vertentes e ordenamentos é essencial. A recente realização do seminário “Destacamento de trabalhadores para Angola e Moçambique” sinaliza a atualidade e relevo que o tema tem no nosso dia-a-dia com os clientes. Ilustra também a enorme vantagem das parcerias do MLGTS Legal Circle. Neste caso, com a Angola Legal Circle (Angola) e com a SCAN (Moçambique), como noutros, as que mantemos no Brasil e em Macau. O agregador da advocacia


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Televisão

Um mês em retrospetiva A abertura do ano judicial, a entrada de capital chinês em empresas nacionais, o impacto da crise nas sociedades de advogados e a situação económico-financeira do País foram os temas em foco nas emissões de fevereiro do Direito a Falar, uma parceria do Advocatus com o Económico TV O novo ano judicial A abertura do ano judicial foi o tema do primeiro Direito a Falar de fevereiro. A emissão contou com a presença de Rogério Alves (ABBC), Jorge Neto (Jorge Neto & Associados) e Augusto Athayde (Kennedy’s Portugal). Analisaram a cerimónia oficial de abertura do novo ano judicial, debruçando-se ainda sobre o braço-de-ferro entre a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, e o bastonário da Ordem dos Advogados, António Marinho e Pinto. Para Rogério Alves não existem inocentes nesta batalha, convicção partilhada por Jorge Neto, que, no entanto, aponta principalmente críticas à estratégia adotada pela ministra. Ainda que mais moderado, Augusto Athayde disse acreditar que esta batalha não conduzirá a nada de novo.

Salvos pelos chineses Esta é a convicção do sócio da Linklaters Jorge Bleck, que defende que o País devia dar graças pela entrada dos chineses na EDP e na REN. A mesma ideia defendeu o sócio da Serra Lopes, Cortes Martins e Associados Luís Cortes Martins, que assessorou a CTC na privatização da elétrica nacional. Os dois advogados foram, com o sócio PLMJ Jorge Brito Pereira, os protagonistas da emissão do Direito a Falar dedicada às operações de privatização. Os advogados estão confiantes de que Portugal tem capacidade para atrair investimento estrangeiro, principalmente porque é visto como uma porta de entrada para Angola, Moçambique e Brasil. Na sua opinião, é aí que reside a grande mais-valia da entrada de capital chinês em Portugal.

A crise nas sociedades de advogados O impacto da crise na advocacia em Portugal e Espanha foi outro dos temas em análise nas emissões de fevereiro. Para comentar o tema estiveram em estúdio António Villacampa (Uría Menéndez-Proença de Carvalho), Miguel Esperança Pina (Cuatrecasas, Gonçalves Pereira) e Albano Sarmento (Gómez-Acebo & Pombo). Para António Villacampa os advogados têm sempre trabalho, quer a situação do País seja positiva ou negativa, o problema é quando nada acontece. Por isso, mostrou-se especialmente preocupado com os anos de 2013 e 2014. Já Albano Sarmento mostrou-se apreensivo com a falta de financiamento, apesar de defender que Portugal tem capacidade para captar novos parceiros. Miguel Esperança Pina esteve otimista, acreditando que a nova lei da Arbitragem pode ser um instrumento bastante importante neste contexto de crise.

Otimismo moderado É desta forma que José Pedro Fazenda Martins (Vieira de Almeida & Associados) e António Soares (Linklaters) encaram 2012. Ambos ex-diretores da CMVM foram os convidados de mais uma emissão do Direito a Falar, que pretendeu analisar a atual situação económica e financeira de Portugal. Como principal problema do país destacam a falha na regulação. Não por carência do sistema legislativa, mas pelo facto de as leis não serem as mais adequadas. Para Fazenda Martins uma das soluções passaria por regular para a exceção. Por seu lado, António Soares acredita que estes problemas não se resolvem com leis, mas sim com a criação dos meios necessários à fiscalização. O agregador da advocacia

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Tema

A aprovação pelo Parlamento, em fevereiro, da nova lei do enriquecimento ilícito foi o ponto de partida para ouvir a opinião de especialistas: Teresa Serra e Pedro Duro, advogados da Sérvulo & Associados, e Manuel Magalhães e Silva, da Jardim, Sampaio, Magalhães e Silva & Associados.

Um meio para atingir o fim?

Pedro Duro associado sénior da Sérvulo & Associados

Teresa Serra, sócia principal da Sérvulo & Associados

“Não se vislumbra ‘habilidade’ doutrinária ou jurisdicional que permita que o referido crime escape à inconstitucionalidade”

A 8 de fevereiro, e ao fim de mais de três horas de discussão, os votos favoráveis dos deputados do PSD, CDS, PCP e Bloco de Esquerda conduziam à aprovação, na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, da lei de criminalização do enriquecimento ilícito. Votava contra o PS, invocando o argumento da inconstitucionalidade. A votação colocava fim a um impasse de quatro meses desde a aprovação da lei na generalidade, a 23 de setembro de 2011, um impasse entre os partidos da maioria parlamentar que não se entendiam quanto a alterações a introduzir ao articulado a discutir na especialidade. Mas os dois partidos acabaram por fazer cedências: o CDS aceitou que o novo crime de enrique38

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cimento ilícito seja aplicável a todos os cidadãos e não apenas a titulares de cargos políticos, enquanto o PSD acedia à figura dos julgamentos rápidos para crimes cometidos com flagrante delito. As críticas socialistas de inconstitucionalidade pairaram sobre toda esta negociação. Terão razão de ser estas críticas? Advogados de duas sociedades respondem ao Advocatus: Manuel Magalhães e Silva, sócio da Jardim, Sampaio, Magalhães e Silva & Associados, e Teresa Serra e Pedro Duro, respetivamente sócia principal e associado sénior da Sérvulo & Associados. Magalhães e Silva, autor de uma proposta de alterações ao texto conjunto do PSD e do CDS, concorda com o argumento do PS de que existe uma violação do prin-

As críticas socialistas de inconstitucionalidade pairaram sobre toda esta negociação. Terão razão de ser estas críticas? Advogados de duas sociedades respondem ao Advocatus

cípio da presunção de inocência com a inversão do ónus da prova. Porém, contrapõe que “o PS sabe perfeitamente que é possível uma formulação conforme com a Constituição e, todavia, nada fez para que o texto fosse modificado”. “Donde, o sinal político inequívoco é o de que o PS não quer criminalizar o enriquecimento ilícito, escondendo-se atrás dos projetos” dos demais partidos. Já os advogados da Sérvulo tendem a concordar com o sentido das dúvidas socialistas. Argumentam que, “embora não seja tecnicamente impossível sustentar a posição da maioria parlamentar, o que é certo é que o tipo penal de enriquecimento, tal como está construído, mina gravemente as regras processuais que resultam da consagração constitucional da presunção de inocência”. E concluem que, desse ponto de vista, “não se vislumbra ‘habilidade’ doutrinária ou jurisdicional que permita que o referido crime escape à inconstitucionalidade”. O entendimento entre sociais-democratas e populares permitiu estender a tipificação deste crime a todos os cidadãos e não apenas a titulares de cargos públicos. Magalhães e Silva concorda, sustentando que “o dever de transparência patrimonial impende sobre todos os cidadãos”. Daí que defenda, no projeto de alteração que elaborou, que o cidadão seja obrigado a comunicar às autoridades – de preferência fiscais, para comparação com os rendimentos declarados O agregador da advocacia


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– os acréscimos patrimoniais incompatíveis com o património ou rendimentos conhecidos, com indicação circunstanciada dos meios de aquisição”. Não o fazendo, “o crime de enriquecimento ilícito – melhor se denominaria injustificado – consumou-se, porque o escândalo da comunidade, não tendo havido comunicação, já teve lugar pela omissão”. Outra crítica que impende sobre a lei é a de que é discriminatória, permitindo mais facilmente a criminalização das pessoas com menores rendimentos. Uma crítica que as propostas de Magalhães e Silva permitem ultrapassar: que aquisições acima de 100 salários mínimos mensais tenham de ser declaradas e justificadas às autoridades. Uma solução que “reequilibra ricos e pobres”. Por esta mesma razão, Teresa Serra e Pedro Duro refutam como não sendo inteiramente justa aquela crítica. Mas deixam uma ressalva: “A verdade é que, a partir de um determinado nível de sofisticação, os agentes do crime começam a ganhar vantagem, o que também já sucede noutros crimes financeiros”. E, é precisamente a propósito da existência de outros crimes financeiros já tipificados como tal, que os dois advogados da Sérvulo se manifestam contra a criação de um crime de enriquecimento ilícito de que pode ser autor qualquer cidadão: é – afirmam – “uma inovação criticável, ao arrepio da opinião dominante, que restringe este crime a um crime de funcionário”. “Dada a vigência do princípio da legalidade no nosso direito processual penal, esta inovação imporá ao Ministério Público a investigação de todo o tipo de denúncia que eventualmente venha a surgir, com prejuízo do aprofundamento da investigação de casos mais graves, designadamente do enriquecimento ilícito de funcionários, titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos”. O agregador da advocacia

Mas será, afinal, esta lei o meio que faltava para atingir o fim do combate ao enriquecimento ilícito? Teresa Serra e Pedro Duro são céticos. Admitem que, do ponto de vista da prevenção geral, o meio pode revelar-se parcialmente eficaz, já que criará obstáculos aos “branqueadores” mais sofisticados

Ao abrigo do articulado legal aprovado em fevereiro, o enriquecimento ilícito passa a ser crime público. O que – na opinião de Teresa Serra e Pedro Duro – “é normal”, uma vez que não está ligado, em primeira linha, a interesses de vítimas concretas. Reconhecem, no entanto, que este crime pode propiciar a denúncia anónima e a prossecução de objetivos particulares. Também Magalhães e Silva admite que há o risco de toda e qualquer pessoa ficar sob suspeita. E foi contra esta possibilidade que propôs o dever de comunicação, “tranquilizador para todos os cidadãos honestos, que são quem precisa, neste âmbito, de ser salvaguardados”. Mas será, afinal, esta lei o meio que faltava para atingir o fim do

combate ao enriquecimento ilícito? Teresa Serra e Pedro Duro são céticos. Admitem que, do ponto de vista da prevenção geral, o meio pode revelar-se parcialmente eficaz, já que criará obstáculos aos “branqueadores” mais sofisticados. Mas chamam a atenção que existem formas de ocultação do património que permitem manter a aparência de proveniência lícita. E, assim sendo, esta lei não é o meio para atingir o fim porque “só serve para apanhar os ‘branqueadores’ distraídos’” e porque “está minada por um grave problema de determinação da consumação do crime, com efeitos colaterais graves como o da aferição de prescrição”. Mas também porque “a questão da consumação coloca sérios problemas processuais e constitucionais na determinação do início do processo, na determinação da fundada suspeita para a constituição do arguido, no que concerne ao direito ao silêncio e à presunção de inocência”. E ainda porque “suscitará problemas complexos de concurso”. Diferente é o entendimento de Manuel Magalhães e Silva. O advogado, que foi candidato a bastonário em 2007 e consultor para os assuntos de justiça nos dois mandatos de Jorge Sampaio em Belém, entende que a criminalização do enriquecimento ilícito é um meio para combater esta realidade quando falham as espécies criminais que o originam, a saber corrupção, tráfico de influências, entre outras. “Mas é mais do que isso: quando alguém enriquece injustificadamente – quem cabritos vende e cabras não tem – tal facto é motivo de escândalo para a comunidade. E por isso tem de ser encontrado meio de punir essa lesão do bem comum”. Permanecem as questões da alegada inconstitucionalidade. Sobre elas poderá pronunciar-se o Presidente da República, a quem cabe a faculdade de solicitar a fiscalização preventiva dos diplomas.

Manuel Magalhães e Silva sócio da Jardim, Sampaio, Magalhães e Silva & Associados

“Quando alguém enriquece injustificadamente – quem cabritos vende e cabras não tem – tal facto é motivo de escândalo para a comunidade. E por isso tem de ser encontrado meio de punir essa lesão do bem comum”

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Alberto Saavedra é o novo membro do departamento de Concorrência e Regulação da SRS Advogados. O advogado é licenciado pela Universidade Católica e pós-graduado em Direito Europeu e da Concorrência pelo King’s College. Posteriormente, concluiu ainda o LLM pela University College London em Direito Europeu e da Concorrência.

Luís Fábrica reforçou a equipa da área de prática de Direito Público & Ambiente (APDP&A) da Abreu Advogados. Com a contratação deste consultor a sociedade pretende fortalecer a aposta na ligação ao meio universitário.

Advogado da Miranda leciona em Timor O advogado da Miranda Correia Amendoeira & Associados Nuno Antunes foi convidado a lecionar o módulo sobre Direito Petrolífero, na Universidade Nacional de Timor Lorosa’e (UNTL). Esta cadeira integra-se no curso de especialização pós-graduada em Direito da Energia. O advogado colabora com a Miranda desde 2006 e tem centrado a sua prática nas áreas de Energia (Petróleo e Gás), Direito Tributário e Direito Internacional. Foi também responsável pela coordenação da instalação do escritório da sociedade em Timor-Leste. Do percurso profissional de Nuno Antunes destaca-se o trabalho que desenvolveu como assessor jurídico do primeiro-ministro de Timor-Leste. Nuno Antunes é licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, fez um mestrado em Fronteiras Internacionais e um doutoramento com tese em delimitação de fronteiras marítimas pela Universidade de Durham, no Reino Unido.

MLGTS recebe prémio “Client Choice 2012” A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS) foi galardoada com o prémio “Client Choice 2012”, em exclusivo para Portugal. Da lista de candidatos faziam parte os melhores escritórios de advogados do mundo. A sociedade portuguesa já tinha conquistado este prémio na edição de 2011 e na de 2005. Três sócios da MLGTS foram ainda eleitos pela Internacional Law Office (ILO) como os melhores advogados de Portugal nas suas áreas de prática. João Soares da Silva foi destacado na área de prática de Direito Comercial, Carlos Osório de Castro em Fusões e Aquisições e Rui Patrício em Contencioso. Este prémio pretende reconhecer as sociedades e advogados que se destacaram a nível mundial, pela qualidade e excelência do serviço prestado ao cliente e pela capacidade de acrescentar valor aos negócios e atividades dos clientes. Os vencedores são escolhidos tendo por base critérios como qualidade do serviço prestado, valor acrescentado, sentido comercial, capacidade de comunicação, transparência a nível de faturação, tempo de resposta, experiência e uso de tecnologia.

O SITE DO ADVOCATUS EM fevereiro* Alberto de Sousa Basto e Bárbara de Sousa Basto são as novas contratações da TLCB Advogados. Alberto de Sousa Basto atua principalmente nas áreas de prática de Direito Comercial e Societário, Direito do Trabalho e Direito do Ambiente. Por seu lado, Bárbara de Sousa Basto está mais direcionada para as áreas de prática de Direito do Trabalho, Direito dos Seguros e Direito Penal.

Francisco Pedro Balsemão e Fernando Araújo são os dois juristas nacionais nomeados para os European Counsel Awards (ECA), a atribuir este mês. O primeiro encontra-se nomeado na categoria de General Commercial, enquanto o segundo concorre na categoria de Corporate Tax. No total foram selecionados 53 juristas que competem a título individual ao ECA. 40

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As mais lidas Alterações ao Código das Insolvências Especialista da saúde SRS reforça departamento de Concorrência TC considera exame de acesso ao estágio inconstitucional BPO Advogados reforça equipa

As mais partilhadas no Facebook TC considera exame de acesso ao estágio inconstitucional Alterações ao Código das Insolvências ILO elege sócio PLMJ como melhor advogado de Direito Público Autonomia legislativa das regiões autónomas analisada em obra SRS reforça departamento de Concorrência *Dados referentes ao período entre 29 de janeiro a 28 de fevereiro

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Assine o Advocatus e fique descansado Abreu e Montepio ajudam entrada de PME em Bolsa A Abreu Advogados aliou-se ao banco Montepio, com o apoio da NYSE Euronext, com o objetivo de impulsionar a entrada em bolsa de pequenas e médias empresas nacionais. O ano passado, a bolsa de Lisboa lançou o NYSE Alternext, especialmente dedicado ao sector das PME, contudo ainda não existe nenhuma empresa portuguesa cotada. “A colaboração com a NYSE Euronext e o Montepio Geral permite oferecer uma solução integrada e low cost para o acesso ao mercado de capitais, como fonte de financiamento alternativa para as PME, numa altura em que as alternativas de funding escasseiam. Permite ainda, sobretudo, às empresas ajustarem a sua estrutura económica, financeira, jurídica e fiscal de forma transparente para o assessment de risco por parte de quaisquer stakeholders, independentemente da abertura e colocação do seu capital em terceiros. O trabalho desenvolvido pela NYSE Euronext, Montepio Geral e Abreu Advogados permitirá, desde logo, a obtenção de recursos financeiros a um custo mais justo para a empresa e os investidores”, explicou ao Advocatus o managing partner da Abreu Advogados, Miguel Castro Pereira. O acordo define as várias competências de cada entidade envolvida, cabendo à Abreu Advogados acompanhar juridicamente todo o processo de preparação da empresa para efeitos de admissão à negociação da mesma no NYSE Alternext.

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Séries

Antas da Cunha é fã de “Suits”

“Suits” retrata a história de Mike, um jovem brilhante que sempre sonhou ser advogado, mas que se viu obrigado a desistir do curso de Direito. Mike tem uma característica que o distingue: uma memória fotográfica que lhe permite absorver facilmente uma grande quantidade de informação. O que acaba por lhe valer a concretização do seu sonho, ao ser contratado por Harvey Specter, um dos melhores advogados de Manhattan. Foi exatamente a postura de Harvey Specter, papel desempenhado pelo ator Patrick J. Adams, que cativou o sócio fundador da Antas da Cunha, Ferreira & Associados, Fernando Antas da Cunha. Ao longo da trama, os “valores da profissão e a ética dos advogados” são constantemente colocados à prova. Para o advogado, não deixa de ser “curioso” analisar a reação e a atitude de cada personagem perante esses desafios. Principalmente, a reação de Harvey Specter, que opta sempre por “respeitar o código deontológico pelo qual se rege e demonstra uma enorme solidariedade com aqueles com que colabora”. Fernando Antas da Cunha revê-se na “perseverança e vontade de vencer” desta personagem, que, como ele, tenta que no escritório prime a solidariedade entre colegas e o espírito de equipa. Se tivesse de estabelecer um paralelismo entre a série e o seu dia-a-dia, destacaria as “negociações que são feitas à margem do tribunal”, que têm muitas semelhanças com o que passa na realidade. É que, explica, “trata-se de um jogo em que as regras não são claras”, por isso é necessário uma constante adaptação sob pena de se perder esses processos.

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Hobby

Ramon de Melo

José Carlos Soares Machado

José Carlos Soares Machado é um apaixonado por História, mas é a história da família, ou melhor das famílias em geral, que mais o interessa: é que o seu hobby é a genealogia. O gosto por esta ciência despertou há cerca de 30 anos, quando foi pai pela primeira vez: nesse momento sentiu que, além da história do País e do mundo, tinha como missão transmitir à filha a história dos próprios avós. Na perspetiva do sócio da SRS, a genealogia permite tomar consciência de que cada um “não é mais do que uma pequena peça numa engrenagem, numa corrente milenar que nos antecedeu e que seguirá depois”. Apesar de ter uma vida bastante ocupada, aproveita os serões e os fins-de-semana para colocar em prática esta atividade, que o transporta para “outro mundo” e lhe permite descansar o “espírito” dos problemas do dia-a-dia. Para explicar este hobby o advogado compara-o a um jogo de estratégia: “É preciso investigar e fazer deduções como se fosse um detetive, interpretar documentos, retirar conclusões, explorar hipóteses. Umas vezes ganha-se, quando se descobre um novo antepassado, outras perde-se porque se seguiu uma falsa pista...” Mas Soares Machado não se limita a pesquisar: há 25 anos foi o impulsionador da Associação Portuguesa de Genealogia, de que é atualmente presidente. A paixão e a dedicação a esta atividade levam-no ainda a fazer parte de diversos organismos e a colaborar em publicações várias. Em 2005, publicou “História Genealógica de uma Linhagem Medieval – Os Braganções”, uma obra sobre genealogia medieval que lhe exigiu cerca de dez anos de trabalho e investigação. Com ela conquistou o prémio IPH/Lusitânia, para melhor estudo de genealogia do ano. Como o próprio defende é “uma coisa que só é possível fazer-se por gosto e com gosto”. Quem entra no gabinete do sócio da SRS Advogados pode ainda apreciar um outro fruto da sua dedicação à descoberta das ramificações do passado - uma árvore “genealógica” do Direito, feita pelo próprio. O agregador da advocacia

Soares Machado sócio da SRS, responsável pelo departamento de Contencioso e Arbitragem. Licenciado em 1976 pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, foi presidente do Conselho Distrital de Lisboa da OA e candidato a bastonário. É professor convidado da Universidade Nova de Lisboa

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Restaurante

Manuel Falcão diretor-geral da Nova Expressão

Harmonia, criatividade & conforto Pedro e o Lobo

mais profissional, à noite muitos estrangeiros dos hotéis vizinhos e casais portugueses.

Rua do Salitre 169 Tel. 211 933 719 www.facebook.com/Restaurante. Pedro.e.o.Lobo

Prova cega

Aberto de segunda a sexta ao almoço e jantar, sábado só ao jantar e encerrado ao domingo

Uma obra de Sergei Prokofiev chamada “Pedro e o Lobo” foi decisiva para eu perceber melhor a música e a importância dos diversos instrumentos. Ouvi-a pela primeira vez no antigo primeiro ciclo dos liceus, imagine-se que numa aula de francês, pela mão de Mário Dionísio, um professor absolutamente extraordinário que tinha por objectivo didáctico abrir-nos a cabeça para o mundo. A narrativa era dita em francês, daí a sua inclusão numa aula dessa disciplina. Recordo que quando a ouvi foi uma descoberta, passei a escutar a música, os sons, os instrumentos, de outra maneira. É das boas memórias – e são várias – que tenho do Liceu Camões. De maneira que quando em 2010 foi aberto um restaurante com este nome fiquei com curiosidade. Infelizmente nessa altura a recepção a quem procurava o local era gélida, tão gélida que pus na cabeça que aquele devia ser apenas mais um local de moda que entendia não necessitar de clientes. De modo que abdiquei do sítio durante muito tempo. Há poucas semanas um amigo chamou-me a atenção para a qualidade do restaurante “Pedro e o Lobo”. Resolvi esquecer o passado e experimentar como as coisas estavam agora, no presente. Não me arrependi.

Uma sala romântica Comecemos pela sala. À entrada há um bar pequeno mas acolhedor, 44

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óptimo para um aperitivo. A sala é quente, com madeiras, com uma certa influência nórdica, leve, discreta, contemporânea e muito confortável – e romântica, se for essa a intenção. O atendimento, agora, é simpático e muito eficiente – os progressos nesta área em relação ao pretensiosismo inicial são flagrantes. Na sala os empregados são conhecedores da lista, explicam como são feitos e o que contêm alguns pratos. São sempre atenciosos sem serem intrusivos. “Pedro e o Lobo”, o restaurante, divide-se em duas vidas: o almoço, mais leve e profissional, e o jantar, mais dado a conversas, repousado. Situado na esquina da Rua do Salitre com a Rua de São Mamede, o “Pedro e o Lobo” é comandado por dois chefs – Diogo Noronha e Nuno Bergonse. Momento de fazer um

bocadinho de história: Diogo trabalhou no Per Se, de Thomas Keller, em Nova Iorque e Nuno Bergonse passou pelas cozinhas do Vírgula e do Hotel Ritz. Juntaram-se a outros sócios e criaram o seu próprio restaurante em Lisboa. Actualmente propõem menus de almoço que mudam a cada semana (podem saber o que esperar na página do Facebook), com um preço médio por pessoa, sem bebidas, à volta dos 20€. Claro que ao almoço também há a possibilidade de escolher da lista. À noite há um menu degustação, a 46 euros. Mas como eu abomino os menus degustação, felizmente há a possibilidade de ter uma carta bem organizada para escolher o que se pretende e não aquilo que nos pretendem dar, mesmo que seja com as melhores intenções do mundo. Ao almoço a clientela é

Num destes dias ao almoço experimentei um pastel de peixe, acompanhado de alfaces salteadas, cogumelos e mousse de mostarda que estava surpreendente. Numa outra visita, ao jantar, na opção de escolha da carta, um lombo de bacalhau e uma pescada glacê revelaram-se óptimas escolhas, cozinhadas com criatividade nos ingredientes principais e nos acompanhamentos. Antes havia-se dividido um pastrami, como entrada, perfeito. No couvert destaque para a focaccia, talvez a melhor que actualmente se consegue ter em Lisboa. A carta de sobremesas é tentadora e o palmier ultrapassa qualquer expectativa. A lista de vinhos é comedida, na quantidade, e reconheçamos, no preço. As sugestões de vinhos e espumantes a copo são acima da média. Um jantar com todos os pertences e mesmo um digestivo final, para duas pessoas, ficou ligeiramente acima dos 100 euros. Não é nada barato, mas foi um daqueles dias em que se deu o dinheiro por bem empregue. Texto escrito segundo as regras anteriores ao acordo ortográfico

BANDA SONORA

Old Ideas - Leonard Cohen Aos 77 anos Leonard Cohen regressa com um novo disco de originais que mostra várias canções acima da média. A talhe de foice recordo que “Songs Of Leonard Cohen” foi editado há 44 anos. Das novas canções, “Different Sides” é a minha preferida, mas muito perto de “Going Home”, “Crazy To Love You” ou “Darkness”, esta última com um dedilhado de guitarra absolutamente fantástico. Claro que

com esta idade Cohen defende-se – cada vez a sua interpretação é mais falada e menos cantada, cada vez mais os coros femininos encarregam-se da parte melódica. Mas isto acaba por colocar em primeiro plano a escrita de Cohen e essa é sempre a melhor parte dos seus discos.

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Montra

Puro e solidário A verbena é a essência do novo perfume da gama pureDKNY, ícone do projeto de solidariedade da Estée Lauder cujo rosto é a modelo Angela Lindvall. Ao escolher a verbena como matéria-prima, a marca deu o primeiro passo para beneficiar a população carenciada do Togo, depois de em 2010 ter contribuído para o combate á pobreza no Uganda com o primeiro pureDKNY, com o aroma da baunilha.“Gota a gota, todos podemos fazer a diferença” é o conceito subjacente a este perfume com consciência.

Para a mulher atual Elegante e irreverente – é assim a mulher atual vista pela Eletta. E foi para esta mulher que a marca criou a gama Lounge. Com um estilo retro trendy, os relógios da nova linha apresentamse em três versões: com caixa de aço prateada e mostrador prateado, com mostrador cool grey em bracelete prateada ou com mostrador dourado com caixa e bracelete em aço revestido a plaqué dourado. A intemporalidade é o traço comum a todos os modelos.

Partilhar emoções É a proposta do vinho Your Calheiros Cruz: de rótulo personalizável, é o ideal para partilhar emoções e surpreender em momentos festivos como o próximo Dia do Pai. Feito a partir das castas touriga nacional, roriz e touriga franca, carateriza-se pelo aroma intenso, frutado e amadeirado e pelo sabor encorpado e aveludado. É o mais recente exemplo da inovação da Calheiro Cruz, uma marca do Douro com 30 anos.

Olhar revivalista Os anos 50 e 60 foram a inspiração da Pepe Jeans para a coleção de armações para esta primavera/verão. Em materiais muito leves e tecnologicamente evoluídos, apresentam um design arrojado, em modelos criados a pensar nos homens modernos, sofisticados e irreverentes. São a proposta da Optivisão para este Dia do Pai, mas que valem para todos os dias do ano.

Branco e rosa, tendência em smartphones O branco parece ter vindo para ficar nos smartphones. Que o diga a Samsung que apostou no branco para três dos seus modelos – o Galaxy S Plus, o Galaxy Ace e o Galaxy Gio. E para celebrar esta tendência a Vodafone lançou a campanha “Não deixe passar esta oportunidade em branco”. Ao mesmo tempo, a operadora lançou em exclusivo o Sony Ericsson TXT em cor-de-rosa – um smartphone com teclado QWERTY, direcionado para messaging e redes sociais.

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Obra de Arte

Ramon de Melo

Patrícia Borges

A história da obra de arte de eleição de Patrícia Borges cruza-se com o seu percurso profissional. Ao acabar o estágio na F. Castelo Branco & Associados (FCB&A), foi nomeada advogada associada do escritório. E para celebrar esse facto, decidiu adquirir uma obra de arte para colocar no gabinete. No entanto, não poderia ser uma peça qualquer, teria de conseguir retratar o dia-a-dia de um advogado. Com essa missão, começou à procura da obra ideal e, quando encontrou a escultura “Estudos para uma nova pele”, de Pedro Pires, teve a certeza de que era o que procurava. Em gesso pintado a branco, representa uma cabeça – segundo o artista, a sua própria cabeça – colada à qual se multiplicam pequenos soldados de armas em riste. É quase como um campo de batalha. Simbolicamente, relembra todas as lutas que Patrícia teve de travar para terminar o estágio. Além disso, evoca, tal como pretendia, o quotidiano profissional: “Na minha cabeça, o meu diaa-dia acaba por ser um campo de batalha constante, com as necessárias tomadas de decisões sobre se uso este ou aquele argumento, se vou por este ou por aquele caminho…”. “Estudos para uma nova pele” tem ainda a capacidade de a distrair. Depois de um dia a olhar exclusivamente para textos, uma imagem – ou melhor uma obra de arte – acaba por valer por mil palavras… Desde o final de estágio, esta peça tem lugar de destaque no escritório da advogada. Pelo otimismo e pela necessidade de constante conquista que lhe transmite: “Jamais nos deveremos acomodar ou contentar com algo; os desafios com que somos diariamente confrontados devem servir sempre para nos relembrar que temos margem para crescer, evoluir e aprender, por muito que achemos que já crescemos, já evoluímos e já aprendemos tudo”. 46

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