Diretor: João Teives
n
Diretor Editorial: Hermínio Santos
n
Mensal
n
Ano III
n
N.º 25
n
Abril de 2012
n
15 euros
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Rui Moura Ramos Presidente do Tribunal Constitucional
Juízes não são comissários dos partidos Pág. 30
5 601073 210256
5 601073 210256
00025
06
Silva Peneda, presidente do CES
Todos vivem na sua capelinha
O que aconteceu com os dirigentes patronais e sindicais no acordo de Concertação Social não é o comportamento médio do cidadão português. “Todos vivem na sua capelinha, ela é que é importante e não estamos ainda numa fase de interação muito grande”, diz Silva Peneda, presidente do Conselho Económico e Social, uma instituição que se tem distinguido pelos diagnósticos certeiros sobre Portugal
12
Assessoria jurídica no mercado da energia
As questões da eletricidade e do gás natural estão na ordem do dia em Portugal, muito impulsionadas pelo memorando da troika. O sector está sob forte pressão. E será que essa pressão se reflete sobre a atividade das sociedades de advogados? Maura Capoulas Santos, associada sénior da Sérvulo & Associados, Bruno Azevedo, da ABBC, Carla Branco, sócia da pbbr, e Jorge Santiago Neves, advisory counsel da Gómez-Acebo & Pombo, dão a sua opinião
www.advocatus.pt
Destaques
18 Diretor-geral João David Nunes jdn@briefing.pt Diretor João Teives joao.teives-14761l@advogados.oa.pt Diretor Editorial Hermínio Santos hs@briefing.pt Editora Executiva Fátima de Sousa fs@briefing.pt
Diretora de Marketing Maria Luís Telf. 961 571 629 ml@briefing.pt
Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias) assinaturas@briefing.pt
reforma
Prós e contras do novo mapa judiciário
Autarquias e populações têm contestado a intenção do Governo de mudar o mapa dos tribunais em Portugal, temendo o seu encerramento e a perda de influência regional. Nove sociedades de advogados dizem o que pensam sobre o novo mapa
22
TESTEMUNHO
Nos bastidores do petróleo
É uma adepta do trabalho em equipa e define a sua função como de gatekeeper. Ana Major, diretora-geral jurídica da unidade de negócio da Chevron na África Austral, está sediada em Luanda e é uma especialista no sector do oil & gas
26
PASSEIO PÚBLICO
Advogada de conciliação
Privilegia a advocacia preventiva e considera que há sempre uma solução para resolver todos os assuntos. Queria muito seguir Filosofia mas na hora da verdade – leia-se pragmatismo – Maria Augusta Fernando escolheu a advocacia. Está há 18 anos na JPAB
Tiragem média mensal: 2.500 ex. Depósito legal: 308847/10 N.º registo erc 125859 Editora Enzima Amarela - Edições, Lda Av. Infante D. Henrique, 333H, 44 1800-282 Lisboa Tel. 218 504 060 Fax: 210 435 935 advocatus@briefing.pt www.advocatus.pt Impressão: Sogapal, Rua Mário Castelhano, Queluz de Baixo 2730-120 Barcarena
Comunicação, Design e Multimédia Av. Marquês de Tomar, 44-7 1050-156 Lisboa Tel: 217 957 030 geral@motioncreator.net
PRODUTORA DE AUDIOVISUAIS Rua Luis Simões, 14 | 2745-033 Queluz Tel: 214 348 010 www.comsom.tv
RAMONDEMELO
PHOTOGRAPHY www.ramondemelo.com
Rua Luz Soriano, 67-1º E Bairro Alto 1200-246 Lisboa - PORTUGAL www.who.pt// contacto@who.pt
O agregador da advocacia
42
OFFICE WITH A VIEW
A natureza em Lisboa
César Pratas, senior partner da César Pratas & Associados, é o primeiro convidado desta nova rubrica do Advocatus que pretende mostrar as paisagens que se observam dos escritórios de advogados. César Pratas gosta de olhar pela janela do escritório e apreciar a natureza do Parque Eduardo VII, em Lisboa Abril de 2012
3
www.advocatus.pt
Cortar a direito
João Teives diretor
A reforma do processo civil Na exposição de princípios do projeto de reforma do processo civil são novamente chamados à baila a oralidade, a concentração do processo e o reforço do inquisitório. Será suficiente para dizermos que existe uma alteração de paradigma relativamente ao Código de José Alberto dos Reis? Temo que não e que se poderia ter ido um pouco mais longe “O regime da oralidade e a concentração do processo tornaram a justiça mais pronta. Os poderes de iniciativa do Juiz na averiguação da matéria de facto, bem como o combate às formalidades supérfluas, asseguraram por seu turno uma justiça mais perfeita, porque mais próxima da correta aplicação do direito substantivo”. Poderia parecer a exposição de motivos da nova reforma do processo civil apresentada pelo Ministério da Justiça. Mas não se trata disso. São afinal as palavras do Prof. Antunes Varela, no seu Manual de Processo Civil, a páginas 34, ao referir-se ao Código de 1939, da autoria do insigne Prof. José Alberto dos Reis, por contraposição ao Código de Processo Civil de 1876, de matriz liberal, da autoria do ilustre advogado Alexandre de Seabra. Os ciclos repetem-se e os objetivos mantêm-se. Na exposição de princípios do projeto de reforma do processo civil são novamente chamados à baila a oralidade, a concentração do processo e o reforço do inquisitório. Será suficiente para dizermos que existe uma alteração de paradigma relativamente ao Código de José Alberto dos Reis? Temo que não e que se poderia ter ido um pouco mais longe.
“Em suma, parece-me que, com exceção da inversão de contencioso, as soluções encontradas, mesmo sendo genericamente positivas, não traduzem ou incutem nos operadores judiciários um corte profundo com o passado, uma mudança de paradigma ou uma revolução no processo”
Grande parte de algumas medidas tidas por inovatórias já correspondia a alguma prática judiciária que tinha acolhimento nas soluções processuais já legalmente consagradas. A mero título de exemplo, já se agendavam julgamentos nas audiências preliminares tendo em conta o número de testemunhas e era, é certo que nem sempre, efetuado um esforço por escalonar a produção de prova no número de sessões adequado ao número de testemunhas existentes,
tendo em conta a complexidade da base instrutória. Tudo isso já existia, tal como o princípio de adequação formal, de utilização, aliás, mais do que residual. Assim, o princípio de gestão processual, sendo certo que reforça os poderes do Juiz, não traduz, necessariamente, nenhuma revolução na forma de encarar o processo. A grande modificação na forma de entender o processo poderia estar no ónus de concretização dos factos que concretizam a causa de pedir. É certo que se prevê, na redação proposta, que às partes só cabe alegar os factos essenciais. Sucede, porém, que pelo regime atribuído aos factos complementares ou concretizadores de factos essenciais, aliado à manutenção do ónus de impugnação específica em termos rígidos, é de temer que esta alteração acabe por não ter as consequências práticas desejadas, pelo menos na fase dos articulados. Veremos, na fase de saneamento e condensação, como serão interpretadas estas normas e se, mais uma vez, não teremos, na prática, a especificação e questionário sob novas vestes, tal como sucedeu na reforma de 95/96. Pela negativa, a manutenção da cisão do momento da leitura da res-
posta de facto e da sentença. Essa partição, eventualmente justificável em processos de maior complexidade, é injustificável, a meu ver, na grande maioria dos processos e é um fator gerador de grandes atrasos na resolução dos litígios. Quantos meses, às vezes anos, é verdade, à espera de uma sentença... Pela positiva, a solução encontrada, no domínio da justiça cautelar, de inversão de contencioso, podendo dispensar-se o requerente do procedimento de instaurar a ação principal de que aquele dependia, obrigando o requerido a instaurar ação destinada a impugnar a existência do direito acautelado nos trinta dias subsequentes à notificação, sob pena de a providência decretada se consolidar como solução definitiva do litígio. Em suma, parece-me que, com exceção da inversão de contencioso, as soluções encontradas, mesmo sendo genericamente positivas, não traduzem ou incutem nos operadores judiciários um corte profundo com o passado, uma mudança de paradigma ou uma revolução no processo. E talvez esse corte ou mudança de paradigma fosse necessário para que, mudando-se algo, tudo não fique na mesma.
LIVRO
Os processos ganham-se só na barra dos Tribunais? O ponto de partida de “In the Court of Public Opinion – Winning Strategies for Litigation Communications” de James F. Haggerty, advogado e consultor de comunicação, é precisamente esse. Este spin doctor defende que os processos não se ganham só nos tribunais mas também e sobretudo no tribunal da opinião pública. Ao ponto de tal vitória poder determinar, no limite, a própria inexistência do processo. Mas mesmo que ele exista pode ser determinante para uma vitória em Tribunal, visto que os decisores são, também eles, recetores de comunicação. O essencial é que de pouco 4
Abril de 2012
servirá uma vitória em tribunal se o bom nome e boas práticas de uma pessoa, individual ou coletiva, ficarem definitivamente afetados perante o olhar crítico do público. O aumento exponencial da cobertura mediática dos casos, quer na imprensa, quer nos blogues ou redes sociais, faz com que seja determinante a existência de uma estratégia de comunicação. Ela pode envolver muitos ou poucos meios, pode ser maior ou menor, mas ela é sempre necessária e tem de existir. O agregador da advocacia
JusNet.pt É uma base de dados que combina o maior acervo documental atualizado diariamente e cujo motor de pesquisa semântico, único no mundo jurídico, permite o acesso imediato aos documentos que se pretendem consultar
Aceda a informação jurídica privilegiada de forma rápida e intuitiva + de 120 000 diplomas em versão vigente + de 2000 instruções administrativas da DGCI + de 2000 diplomas organizados por ramos de direito (códigos) + de 75 000 decisões de todas as instâncias + de 6000 referências bibliográficas e artigos doutrinais + de 2000 minutas e procedimentos + de 300 Convenções Coletivas de Trabalho + de 65 000 links
Para mais informações: 211 20 70 72 | infoprodutos@coimbraeditora.pt | www.lojacoimbraeditora.pt Torres de Lisboa — Rua Tomás da Fonseca, Torre G — 6º. A— 1649-970 Lisboa www.jusnet.pt
www.advocatus.pt
Entrevista
Hermínio Santos jornalista hs@briefing.pt
Os órgãos de poder político têm acesso a um conjunto de observações do Conselho Económico e Social (CES) que “são genericamente consensuais e que deviam merecer mais atenção do que aquela que tem merecido até agora”, afirma o presidente da instituição, Silva Peneda, 61 anos, que lamenta não existir em Portugal uma verdadeira “cultura do compromisso”
Ramon de Melo
Mais atenção ao CES
Advocatus | Qual é hoje a importância do Conselho Económico Social (CES) tendo em conta a situação económica e social que se vive em Portugal? Silva Peneda | O CES tem várias vertentes de funcionamento. Uma delas é de carácter consultivo: emite pareceres para o Governo e Assembleia da República sobre temas fundamentais, como o Orçamento 6
Abril de 2012
Geral do Estado – ultimamente esses pareceres têm sido votados praticamente sem votos contra. O que significa que, sendo pareceres muito críticos em relação às propostas que os Governos submetem, consegue-se fazer um exercício interno dentro do CES com os diversos conselheiros que levam a soluções de compromisso. Isto significa que os órgãos do poder político têm acesso
a um conjunto de observações que são genericamente consensuais e que deviam merecer mais atenção do que aquela que têm merecido até agora. Não foi por acaso que eu tomei a iniciativa de propor ao plenário que anexasse todo um conjunto de parágrafos de pareceres anteriores que, se tivessem sido devidamente escutados, o País, seguramente, não estaria na situação em que está.
Advocatus | Que outras funções é que o CES tem? SP | O CES tem também uma função de concertação. No contexto europeu o CES é um modelo original por razões históricas pois resulta da fusão de várias instituições que existiam. Ficou estabelecido que seriam criadas três comissões dentro do CES, entre as quais se conta a Comissão Permanente de ConcertaO agregador da advocacia
www.advocatus.pt
ção Social, presidida pelo primeiro-ministro. Depois há uma terceira função, mais recente, que é a da arbitragem para resolver determinado tipo de conflitos – principalmente a definição de serviços mínimos dos transportes - e que tem funcionado muito bem. O CES também pode emitir pareceres por sua própria iniciativa e temos dois na calha. Já emitimos um muito importante sobre o futuro da zona euro, que enviei para a Assembleia da República e cujo feedback foi nenhum. Das entidades para quem enviámos o parecer, só o Presidente da República fez perguntas. Neste momento os dois pareceres que estão em curso têm a ver com as consequências do aumento da população idosa em Portugal e como a sociedade se deve organizar para se adaptar a essa nova realidade. Os pareceres do CES devem pensar num horizonte à la longue, a 10, 20 anos de distância. Em Portugal, há um défice muito grande de pensar nas coisas a médio-prazo. O CES tem por obrigação ocupar esse espaço. O outro parecer em curso é sobre a competitividade das cidades. Devemos ver como é que as políticas públicas se devem orientar para que as cidades se tornem mais atrativas. Advocatus | Em termos jurídicos, o CES tem algum núcleo de apoio interno? Recorre a escritórios externos à instituição? SP | O CES funciona com uma estrutura muito leve. Tem um gabinete que é equiparado a um gabinete ministerial, mas não tem propriamente quadros técnicos. Os conselheiros, quando são relatores de um parecer, sabem como mobilizar os seus quadros técnicos para os ajudar a preparar esses pareceres. Eu prefiro que o CES não tenha um quadro técnico pois são muitas as matérias que temos de abordar e é melhor mobilizar os recursos conforme as necessidades e recorrer aos centros de excelência que existem no País. Advocatus | O que é que destaca das atividades do CES em 2011? SP | Os pareceres da Conta Geral do Estado de 2009, das Grandes O agregador da advocacia
“O CES também pode emitir pareceres por sua própria iniciativa e temos dois na calha. Já emitimos um muito importante sobre o futuro da zona euro, que enviei para a Assembleia da República e cujo feedback foi nenhum. Das entidades para quem enviámos o parecer, só o Presidente da República fez perguntas”
Opções do Plano para 2012-2015 e do Orçamento de Estado para 2012. São três pareceres fundamentais. Já lhe falei dos pareceres de iniciativa própria do CES e também houve uma grande atividade de arbitragem obrigatória. A concertação social foi muito intensa durante 2011. Advocatus | Na mensagem que tem publicada no site do CES afirma que “a natureza e gravidade dos problemas que o País enfrenta requerem grandes esforços na busca de compromissos entre órgãos de soberania”. Há disponibilidade de todos os atores para esses compromissos? SP | Acho que este acordo de concertação é uma exceção no comportamento médio dos portugueses. Nós temos muitas qualidades mas também temos alguns defeitos e é bom que nos conheçamos como sociedade. O problema das relações interpessoais é difícil em Portugal. Noto que as pessoas, muitas vezes, têm medo de avançar com propostas e ideias com receio de serem criticadas. A busca de compromissos obriga a que as pessoas lancem para a mesa ideias e propostas que podem ser derrotadas e as pessoas não devem ter receio da
“Em Portugal, há um défice muito grande de pensar nas coisas a médio-prazo. O CES tem por obrigação ocupar esse espaço”
>>>
política
Portugal não tem cultura de compromisso Advocatus | Como é que analisa o acordo de concertação social que foi assinado com o Governo? SP | Costumo dizer que em Portugal estamos muito habituados a não valorizar a cultura do compromisso. Procuramos sempre valorizar o vencido e o vencedor. Este acordo é de compromisso, balizado pelo acordo da troika que todos assumiram que tinham de respeitar – a CGTP votou contra e percebe-se porquê pois não concordava com o acordo – e o acordo assinado em março do ano passado. Não foram negociações fáceis, foram muito duras, mas os parceiros sociais diziam que a assinatura de um acordo era bom para o País e para eles. O País tem sorte em ter dirigentes nas confederações patronais
e nas sindicais, neste caso a UGT, que acredita que vale a pena estabelecer pontes e compromissos. Acho que é bom para o País. Todos cederam mas é um compromisso que dá para o País, uma orientação sobre qual o rumo a seguir nos próximos tempos. Mas o acordo não é o fim do processo. Há toda uma execução de medidas de carácter legislativo que têm de ser postas em prática e isso exige mais exercício de concertação e muitas vezes é no detalhe que está o problema. Portanto, estão apontados um conjunto de orientações mas a partir de agora terá que vir ao Conselho Permanente de Concertação Social toda a parte executiva dessas medidas e isso vai obrigar a afinar ainda mais o processo de concertação.
Abril de 2012
7
www.advocatus.pt
Entrevista
>>>
“O CES funciona com uma estrutura muito leve. Tem um gabinete que é equiparado a um gabinete ministerial mas não tem propriamente quadros técnicos”
derrota. Se olharmos para a história da Humanidade todas as grandes evoluções nunca foram uma ideia isolada, resultaram sempre de uma interação – nos Descobrimentos, na ida do homem à lua…Isto foi sempre trabalho de equipas. Ora hoje vivemos numa fase em que as interdependências são cada vez maiores, nenhum de nós é uma ilha, estamos super influenciados por tudo. Hoje, o poder político e o Governo não são um único centro de poder, têm que interagir com muitos centros de poder. Costumo dizer que o modelo de governação moderna não pode deixar de equacionar este problema real que é a interação entre as partes. Hoje, a capacidade de antecipação aos problemas é algo de vital ao poder político. Isso exige uma interação muito grande. Costumo dizer que isto funciona bem quando funciona como uma orquestra mas queremos ser todos solistas ou maestros ou maestrinas, não gostamos de tocar no nosso momento certo. Antigamente para se ser desenvolvido era preciso ter matérias-primas ou grandes recursos, hoje é a sociedade de informação que domina, que precisa de pessoas a
“Mesmo que executemos exemplarmente o programa da troika ninguém pode garantir que vamos ter crescimento logo a seguir. Costumo dizer que estamos perante uma situação que é de angústia pois nós cumprimos isto tudo, há uns sacrifícios enormes que são pedidos aos portugueses, mais a uns do que a outros, mas e a economia?”
PERFIL
Da Região Norte a presidente do CES José Albino da Silva Peneda, natural de São Mamede de Infesta, estreou-se nas lides governamentais em 1979, sete anos depois de ter iniciado a sua vida profissional como técnico da Comissão de Planeamento da Região Norte, ao mesmo tempo que era docente na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, onde se licenciou. O primeiro cargo governamental foi o de secretário de Estado da Administração Regional e Local, no V Governo constitucional. Entre 1981 e 1985 foi vice-presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte. Voltou ao Governo a partir de 1985, tendo chegado a ministro do Emprego e da Segurança Social, no XII Governo. Depois, voltou à Comissão para ser presidente e entre 1997 e 2004 foi membro da direção da Sonae Investimentos. Chegou a ser presidente
8
Abril de 2012
do conselho de administração do Jornal de Notícias e da Global Notícias. Durante cinco anos, entre 2004 e 2009, foi deputado ao Parlamento Europeu. É presidente do Conselho Económico e Social desde 2009, ano em que também passou a exercer a presidência da Fundação Rei Afonso Henriques. Em 2008, foi um dos primeiros adeptos dos eurobonds (títulos de dívida pública europeus) numa altura em que Jean-Claude Juncker, hoje um dos entusiastas da solução, os considerava inviáveis. Com humor diz que criou o seu atual posto de trabalho com 20 anos de antecedência. Porquê? Foi o ministro responsável pela publicação do decreto-lei que regula o funcionamento do Conselho Económico Social, uma instituição criada no âmbito de uma revisão constitucional.
interagir umas com as outras. Isso só se faz através de uma cultura de compromisso. Infelizmente o que aconteceu com os dirigentes patronais e sindicais não é o comportamento médio do cidadão português. Todos vivem na sua capelinha, ela é que é importante e não estamos ainda numa fase de interação muito grande. Advocatus | Como é que isso resolve? SP | Não se faz por decreto, só num clima de confiança, quando as pessoas não tenham temor de avançar com ideias e propostas. Uma sociedade que se pretende desenvolver tem de ser uma sociedade sem temor, o que obriga a esse exercício de compromisso. A forma de gerir empresas, por exemplo, só teria a ganhar se existisse interação entre todos e hoje as empresas mais bem sucedidas são as que têm mais horizontalidade e menos verticalidade. O que se passou na concertação social foi bom, um excelente exercício, mas tenho a noção de que, infelizmente, este tipo de cultura não está ainda enraizada no tecido social do nosso País como eu gostaria. Advocatus | Para o CES, “Portugal tem de criar urgentemente condições para sair da difícil situação em que se encontra, não sendo o caminho de definhamento económico e degradação social uma inevitabilidade”. Já teve funções governativas, é um homem “público”. Quais seriam as suas sugestões para evitar este definhamento? SP | O acordo da troika surge perante uma situação de rutura financeira, de falência, e pretende resolver os problemas do País para pagar aos seus credores, embora se tenha dito que tinha preocupações de crescimento económico, mas não há muitas. Mesmo que executemos exemplarmente o programa da troika ninguém pode garantir que vamos ter crescimento logo a seguir. Costumo dizer que estamos perante uma situação que é de O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
angústia pois nós cumprimos isto tudo, há uns sacrifícios enormes que são pedidos aos portugueses, mais a uns do que a outros, mas e a economia? Há um artigo no Tratado da União Europeia, o 125, que diz que nenhum Estado-membro pode ser responsável pelas dívidas dos outros Estados e a União Europeia também não pode ser responsável pelas dívidas dos Estados-membros, exceto no caso de haver um programa específico. Temos de arranjar um programa específico para que a União Europeia como um todo e os Estados-membros sejam responsáveis pelas nossas dívidas. E o que é que podia ser esse programa específico? O nosso problema é o aumento da competitividade e isso não se faz em dois anos, demora uma década. Portanto, era preciso estabelecer um programa com um horizonte de uma década em que se mobilizasse determinado tipo de recursos, e estou a pensar nos fundos estruturais, que podiam ser canalizados para o crédito às empresas, ou, por exemplo, no Banco Europeu de Investimento (BEI), e tentar ver quais eram as medidas de política que podiam estimular o aumento da competitividade das empresas. Isso é que era um programa que devia ser subscrito pelas autoridades portuguesas e comunitárias. Eu não acredito que, por si só, o programa da troika vá resolver o problema da economia portuguesa. Pode dar um enquadramento e pôr as contas mais equilibradas e ponto final. Dois anos não é tempo para que se veja o impacto das reformas estruturais. Há ainda outra condicionante, que é o futuro da zona euro. Advocatus | Está pessimista sobre esse futuro? SP | Estou desiludido com a forma como as questões têm sido discutidas. Vejo o eixo franco-alemão muito ativo e muita passividade no eixo Portugal, Espanha, Itália – embora com o Mário Monti as coisas tenham mudado um pouco. Com o prestígio que tem e a associação de ideias que tem com O agregador da advocacia
“Eu não acredito que, por si só, o programa da troika vá resolver o problema da economia portuguesa. Pode dar um enquadramento e por as contas mais equilibradas e ponto final. Dois anos não é tempo para que se veja o impacto das reformas estruturais”
“Uma sociedade que se pretende desenvolver tem de ser uma sociedade sem temor, o que obriga a esse exercício de compromisso. A forma de gerir empresas, por exemplo, só teria a ganhar se existisse interação entre todos e hoje as empresas mais bem sucedidas são as que têm mais horizontalidade e menos verticalidade”
o Jean Claude Juncker, que pode ser muito importante neste processo, acho que podemos ter um núcleo de países da Europa do Sul que pode falar a uma só voz dentro do Conselho e pôr tudo mais equilibrado. Vejo com muita preocupação o apagamento da Comissão e do seu presidente neste processo, o que é mau para os países pequenos. É preciso reforçar a ideia de que a Europa é o expoente de uma cultura que se baseia na diversidade e pensar que há uma política económica europeia traçada a régua e esquadro pelos interesses alemães é a negação do projeto europeu. Para mim é claro que não pode haver uma moeda única numa zona onde não haja coesão social e regional. Correu tudo bem durante 10 anos porque a Europa crescia e por isso não vinham ao de cima estas vulnerabilidades. O problema é que a Europa deixou de crescer e esse é o grande problema. Mas, para crescer, a Europa tem de ter uma estratégia em relação às outras potências. Qual é a estratégia em relação à China? Não conheço. Se a Europa quer ser um player neste jogo internacional onde se estão a passar coisas importantes e há uma deslocalização do poder dos EUA para os países asiáticos, precisa de uma estratégia. Portugal não pode deixar de ser um player ativo nestas matérias até pela posição que ocupa e das ligações ao Brasil e a África.
“Acho que este acordo de concertação é uma exceção no comportamento médio dos portugueses”
Advocatus | O Governo tem ânimo, força e credibilidade para levar por diante quer as reformas quer integrar-se nessa política europeia de que fala? SP | Vamos ser realistas: este Governo foi apanhado para executar aquele programa da troika que é uma “ditadura” financeira que se sobrepõe a todo o resto. Eu não tenho ilusões que os primeiros dois anos deste Governo vão ser muito condicionados pela aplicação do programa e que não dá tempo para respirar. Face às circunstâncias, julgo que, em termos globais, seria muito difícil fazer melhor. Abril de 2012
9
Coimbra Editora JusJornal
Estante
www.advocatus.pt
A Estante é uma página de parceria entre a Advocatus e a Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer
Coimbra Editora JusNet
Os mais vendidos Direito da Sociedade da Informação e Direito de Autor Coord. José de Oliveira Ascensão 2012 19,20 €
Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficias de Contas Paula Marques 2011 23,58 €
Código de Processo Civil – Anotado Alberto dos Reis 2012 29,44 €
Os mais consultados Analogias Fernando Pinto Bronze 2012 24,90 €
Tribunal Constitucional – 35.º aniversário da Constituição de 1976 Rui Moura Ramos, Carlos Costa, António, Vitorino, Sérgio Ribeiro, Paulo Otero, Marcelo Neves, Manuel Clemente, Paulo Rangel, António Barreto, José Carlos Vieira de Andrade. 2012 15,85 € Manual de Direito Constitucional – Tomo IV Jorge Miranda 2012 31,70 €
10
Abril de 2012
O dever de proteção policial No contexto da maior crise económica dos últimos 30 anos e numa altura em que muito se discute o verdadeiro papel do Estado e a força vinculativa da Constituição da República Portuguesa, Jorge Silva Sampaio, advogado da Sérvulo & Associados, aborda o tema, do ponto de vista da investigação, na recém-publicada obra da Coimbra Editora, “O Dever de Protecção Policial de Direitos, Liberdades e Garantias”. Sobre a relevância e atualidade do tema escolhido, Jorge Silva Sampaio adianta que o dever de proteção policial de direitos, liberdades e garantias trata da obrigação estatal de proteção dos particulares dos mais variados perigos, como aqueles que ameacem a sua segurança, integridade física, saúde, ambiente, etc. Assim, a obra versa sobre uma matéria do maior interesse teórico na dogmática dos direitos fundamentais e dos deveres de proteção — tema, aliás, muito pouco explorado em Portugal —, e, para além disso, tem também utilidade prática já que se trata de um tema transversal ao Direito Administrativo e que, refere o Autor, especialmente a partir da aprovação do Regime Jurídico da Responsabilidade Civil do Estado, viu tal utilidade aumentar imenso em função da possibilidade de se responsabilizar entidades públicas por excesso ou por insuficiência de atuação de proteção dos particulares.
A obra está estruturalmente dividida em duas partes. Na primeira parte constrói-se o conceito de polícia no seu sentido material e funcional, propondo o alargamento das atuações positivas de proteção de direitos fundamentais impostas jurídico-constitucionalmente a todos os poderes estaduais. E na segunda, demonstra-se a existência de um dever de proteção policial e identificam-se os três principais limites que condicionam e traçam o âmbito deste dever, nomeadamente o princípio da legalidade, o princípio da proibição do excesso e o princípio da proibição da insuficiência; e aborda-se ainda o conceito de direito subjetivo público e a discussão sobre a possibilidade de os particulares, perante a violação do dever de proteção policial de algum dos seus direitos, poderem invocar judicialmente tais pretensões.
resumo Esta obra versa sobre uma matéria do maior interesse teórico na dogmática dos direitos fundamentais e dos deveres de proteção. O conceito de polícia no seu sentido material e funcional e a demonstração da existência de um dever de proteção policial, identificando os três principais limites que condicionam e traçam o âmbito deste de-
ver, são as questões fulcrais presentes nesta edição. A obra aborda também o conceito de direito subjetivo público e a discussão sobre a possibilidade de os particulares, perante a violação do dever de proteção policial de algum dos seus direitos, poderem invocar judicialmente tais pretensões.
O agregador da advocacia
PRÓXIMOS DE CADA UM DOS NOSSOS CLIENTES Somos a maior Consultora de Comunicação em número de Clientes permanentes e cada um é acompanhado de perto por equipas focadas, motivadas e disponíveis. A nossa dimensão permite-nos acumular e partilhar conhecimento. Estamos organizados para garantir máxima proximidade e dedicação.
LPM : consultoria de comunicação
MEDIÁTICA
estratégias de mediatização
INFORFI agência de comunicação
LPM Comunicação SA Edifício Lisboa Oriente - Av. Infante D. Henrique, n.º 333 H, Esc. 49 | 1800-282 Lisboa T. +351 218 508 110 | F. +351 218 530 426 | lpmcom@lpmcom.pt | www.lpmcom.pt
SKILL
programas de relações públicas
www.advocatus.pt
Energia
A política energética nacional está condicionada, pelo menos no horizonte mais próximo, pelo memorando de entendimento celebrado com a troika. Liberalização é a palavra de ordem, ainda que o sector se mantenha altamente regulado. E é essa especificidade que o torna um mercado potencial para a assessoria jurídica. Quatro advogados dão a sua opinião
Pressão e oportunidade
Gonçalo Alho/Who
A liberalização dos mercados da eletricidade e do gás natural vai mesmo ser uma realidade. Chega a Portugal a par e passo com a revisão dos sobrecustos associados à produção de energia nos regimes ordinário e especial. Assim é por força do memorando de entendimento celebrado entre o governo português e a troika. Uma política que alimentou a ideia de que a eletricidade passou a ser cara em virtude da incorporação dos renováveis na tarifa: chegou assim ao fim a convicção geral de que a eletricidade tem de ser um bem barato. Uma convicção que advinha da chamada tarifa política, havendo agora a tentação de atribuir o encarecimento a políticas erradas dos agentes económicos. O sector está, por isso, sob forte pressão. E será que essa pressão se reflete sobre a atividade das sociedades de advogados? Quatro advogados dão a sua opinião: Maura Capoulas Santos, associada sénior da Sérvulo & Associados, Bruno Azevedo, da ABBC, Carla Branco, sócia da pbbr, e Jorge Santiago Neves, advisory counsel da Gómez-Acebo & Pombo.
12
Abril de 2012
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
A litigância imposta (?) pela troika A pretensão de colocar o ónus de algumas políticas erradas e pouco transparentes sobre as empresas/investidores é questionável, quer de um ponto de vista económico, quer de um ponto de vista jurídico Nas duas últimas décadas, o setor da energia registou fortes alterações em matéria da sua organização, com necessárias alterações regulatórias e um forte investimento privado. Razão pela qual assistimos a um crescimento da importância do setor na economia nacional e, consequentemente, na atividade das sociedades de advogados, especialmente em matéria regulatória e transacional associada ao setor. Em virtude da atual conjuntura económica, esta tendência inverteu-se. Subitamente, a sociedade portuguesa, via troika, descobriu que a energia - para o caso a eletricidade - é cara. A culpa, surpreendentemente, será das empresas do setor, que, tendo dado resposta às políticas governamentais e comunitárias para o setor e após desempenhar um papel ativo na reconfiguração do mesmo, através de fortes investimentos, pasme-se, pretendem reembolsar a dívida contraída no desenvolvimento dos projetos e gerar lucros! Ora, a pretensão de colocar o ónus de algumas políticas erradas e pouco transparentes sobre as empresas/investidores é questionável, quer de um ponto de vista económico, quer de um ponto de vista jurídico. Desde logo porque se pretende abordar o problema sem ir ao cerne da questão: em Portugal, os consumidores têm vindo a pagar menos do que o custo combinado da produção de eletricidade devido à fixação anual de uma tarifa “política” a pagar pelo consumidor de eletricidade e ao diferimento parcial do pagamento devido às empresas que realizaram os seus investimentos com base em expectativas legítiO agregador da advocacia
“A tarifa ‘política’ deixou um rasto pernicioso. Em primeiro lugar, a convicção geral da comunidade de que a eletricidade tem de ser um bem barato. Em segundo lugar, a convicção de que a eletricidade somente passou a ser cara em virtude da incorporação das renováveis, dos CAE e, posteriormente dos CMEC na tarifa”
“A pressão gerada sobre o setor reflete-se, naturalmente, na atividade das sociedades de advogados, a quem competirá a defesa dos direitos e expectativas legítimas dos diversos stakeholders”
mas criadas pelo Estado legislador/ administração. Neste cenário, a eletricidade era barata, os consumidores não estavam insatisfeitos e a política energética nacional era do agrado do Governo e da União Europeia. Contudo, a tarifa “política” deixou um rasto pernicioso. Em primeiro lugar, a convicção geral da comunidade de que a eletricidade tem de ser um bem barato. Em segundo lugar, a convicção de que a eletricidade somente passou a ser cara em virtude da incorporação das renováveis, dos CAE e, posteriormente, dos CMEC na tarifa. Estranhamente, até a própria UE, que foi impondo a reorganização do setor e metas em matéria de geração a partir de FER, pretende agora ver reduzidos os custos com a produção de eletricidade. Porém, será importante responder a quatro questões simples: (i) será possível ter menos capacidade instalada, num setor estratégico para o país e em relação ao qual a capacidade de geração tem de andar relativamente “casada” com a procura (a alternativa será a importação pura e dura)?; (ii) é financeiramente viável (e juridicamente admissível) para as empresas reduzirem as receitas a meio do jogo?; (iii) como poderá o país cumprir as metas impostas pela UE em matéria de renováveis sem PRE instalada e a produzir?; sem CAE/CMEC como teria sido possível a alteração do modelo do setor e a incorporação de novas tecnologias? Neste contexto, o papel das sociedades de advogados terá, obrigatoriamente, de ser substancialmente diferente. A pressão gerada sobre o setor reflete-se,
Bruno Azevedo licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, possui pós-graduações em Direito Fiscal e do Programa Avançado sobre Parcerias Público-Privadas para executivos. Integra desde 2009 a ABBC, concentrando a sua atividade em Direito da Energia e Recursos Naturais
naturalmente, na atividade das sociedades de advogados, a quem competirá a defesa dos direitos e expectativas legítimas dos diversos stakeholders - até porque será ingénuo acreditar-se que a renegociação pretendida será pacífica num cenário em que a mesma é incomportável para os modelos financeiros dos projetos, coloca em causa os direitos e expectativas das empresas produtoras e em estado de sobressalto as entidades financiadoras. O tempo dirá se evoluiremos de uma lógica transacional e de expansão para uma lógica contenciosa de distressed debt. Em qualquer dos casos, as sociedades de advogados terão um importante papel a desempenhar num ou noutro cenário, quando a questão passar de meramente política a jurídica. Abril de 2012
13
www.advocatus.pt
Energia
E o futuro dirá… É essencial obter do Governo o posicionamento efetivo quanto ao futuro do sector energético em Portugal e definir uma estratégia global que vise assegurar uma maior eficiência energética
É inquestionável que uma indústria energética doméstica é essencial para o bem-estar económico de qualquer nação, mas a era da energia barata, assente nas fontes de combustíveis fósseis, é uma memória que começa a ser distante. Apesar da clara aposta de Portugal nas energias renováveis como aproveitamento do potencial endógeno e redução da dependência externa, a época atual é de estagnação, aguardando-se a efetiva opção estratégica do Governo, que tarda em aparecer e é determinante para o futuro da área. Em razão da transversalidade da matéria, os temas de energia abrangem várias vertentes, e os desafios surgem em termos regulatórios, económico-financeiros, ambientais, tecnológicos, num quadro jurídico complexo e de desenvolvimento rápido. A energia é um sector com enorme capacidade para gerar investimentos e um fator de desenvolvimento económico e tecnológico que é indissociável da intervenção jurídica. O potencial existe para o mercado da advocacia, mas a especialidade dos temas e a dimensão do mercado português reconduzem a área a um nicho de mercado especializado, para as sociedades de advogados que queiram apostar no sector. Apostar significa a formação contínua na área, o conhecimento integrado da legislação e das tecnologias em concreto, a perceção do negócio, a interação com os players, a flexibilização e criatividade. Em termos de oportunidades concretas (e sem prejuízo da atual suspensão na atribuição de novas licenças para a produção de 14
Abril de 2012
“O potencial existe para o mercado da advocacia, mas a especialidade dos temas e a dimensão do mercado português reconduzem a área a um nicho de mercado especializado, para as sociedades de advogados que queiram apostar no sector”
“Não podemos esquecer que a nova economia associada à ‘Energia Verde’ vai gerar novos negócios, desenvolvimento da tecnologia, oportunidades de empregos especializados, que vão exigir o constante acompanhamento jurídico”
eletricidade em regime especial), com a aguardada revisão pelo Governo do enquadramento legal da produção de eletricidade em regime especial e dos atuais regimes de apoio aos produtores, aliada à necessidade de revisão e renegociação dos acordos estabelecidos com as produtoras de eletricidade (os CMEC, os CAE e as Garantias de Potência) visando a redução das rendas, em linha do acordado com a troika, seguramente que haverá um incremento em termos de assessoria jurídica. Não podemos esquecer que a nova economia associada à “Energia Verde” vai gerar novos negócios, desenvolvimento da tecnologia, oportunidades de empregos especializados, que vão exigir o constante acompanhamento jurídico. Se atendermos ao crescimento significativo nos últimos anos das patentes associadas a energias limpas, constatamos a necessidade crescente de acompanhamento jurídico destes processos. Ao nível do desenvolvimento tecnológico no sector, têm surgido projetos e parcerias internacionais com elevada componente de I&D, e com uma contratualização ajustável em razão do desenvolvimento e da maturação da tecnologia associada. São projetos a médio e longo prazo, que em Portugal ainda assumem uma expressão reduzida, mas desafiantes em termos do suporte jurídico, e que acabam por instituir uma relação de continuidade. Adicionalmente, com a descarbonização do sistema energético com o objetivo da redução das emissões de CO2 (patente no Roteiro para a Energia 2050), aliada à necessidade de instituir mecanis-
Carla Branco sócia da pbbr, dedica-se ao Direito Comercial e Societário, Fusões e Aquisições, Energia e Imobiliário. Licenciada pela Faculdade de Direito de Lisboa, possui pós-graduações em Direito da Sociedade da Informação e em Direito da Energia
mos de eficiência energética, os Estados-membros terão de adequar as suas políticas nacionais de energia e definir os respetivos enquadramentos jurídicos, e também aqui há espaço para a intervenção dos advogados. Outros aspetos tais como a descentralização da produção elétrica, as infraestruturas energéticas, o reequipamento, a reabilitação, as redes inteligentes, etc., envolvem oportunidades de atuação para a advocacia; todavia, é essencial obter do Governo o posicionamento efetivo quanto ao futuro do sector energético em Portugal e definir uma estratégia global que vise assegurar uma maior eficiência energética, mantendo a flexibilidade nas opções relativas ao mix energético e permitindo cumprir as metas já definidas. O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
O memorando da troika e a energia A política energética nacional está condicionada, nos próximos tempos, pelo Memorando de Entendimento celebrado entre o Estado Português e a troika A política energética nacional está condicionada, nos próximos tempos, pelo Memorando de Entendimento celebrado entre o Estado Português e a troika, cujos objectivos para o sector da energia passam, sobretudo, pela continuação do processo de liberalização dos mercados da electricidade e do gás natural e pela revisão dos sobrecustos associados à produção de electricidade nos regimes ordinário (PRO) e especial (PRE - abrange renováveis e cogeração). Relativamente ao processo de liberalização dos mercados, foi já definido o calendário para a liberalização total das tarifas reguladas a clientes finais de electricidade e de gás natural – numa 1.ª fase, a partir de 1 de Julho de 2012, serão extintas as tarifas reguladas para pequenas empresas e grandes agregados familiares e, numa 2.ª fase, a partir de 1 de Janeiro de 2013, serão extintas as tarifas reguladas para todos os consumidores de electricidade e de gás natural, incluindo os pequenos consumidores domésticos – mantendo-se, ainda assim, uma tarifa transitória, aplicável aos consumidores que não tenham procedido à escolha de comercializador de mercado. A referida tarifa será fixada anualmente pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), durante um horizonte temporal não superior a três anos, e deverá induzir, através de um factor de agravamento, a adesão gradual dos consumidores às formas de contratação oferecidas no mercado. No que respeita aos sobrecustos da PRO e da PRE, as atenções têm-se centrado na imposição de renegociação ou revisão em baixa dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) e dos contratos O agregador da advocacia
“Subsiste ainda uma outra questão que resulta do Memorando, menos badalada mas não menos relevante, e que tem a ver com a obrigação de transposição das Directivas do Terceiro Pacote Energético. Refiro-me à concretização dos poderes sancionatórios da ERSE”
“As Directivas atribuem competências às entidades reguladoras nacionais para, por exemplo, aplicar ou propor a aplicação de sanções até 10% do volume de negócios anual do operador da rede de transporte”
de aquisição de energia (CAE) e de revisão dos esquemas de apoio à cogeração e às energias renováveis. No entanto, subsiste ainda uma outra questão que resulta do Memorando, menos badalada mas não menos relevante, e que tem a ver com a obrigação de transposição das Directivas do “Terceiro Pacote Energético”. Refiro-me à concretização dos poderes sancionatórios da ERSE. De facto, apesar de o poder sancionatório da ERSE já se encontrar legalmente previsto desde 2006, o decreto-lei específico que permitiria a sua concretização nunca chegou a ser aprovado. Já em 2008, o Tribunal de Contas alertava para os prejuízos que a ausência de um quadro legal completo para o sector da energia acarretava para o bom funcionamento dos mercados e para o desempenho eficaz da regulação. Esta ausência assume uma relevância acrescida no actual cenário de privatização das empresas concessionárias das redes energéticas nacionais, cujas actividades são exercidas em regime de monopólio e, por isso, fortemente reguladas. No entanto, a eficácia desta regulação está profundamente dependente do regime sancionatório que venha a ser aprovado. Neste âmbito, as Directivas atribuem competências às entidades reguladoras nacionais para, por exemplo, “aplicar ou propor a aplicação de sanções até 10% do volume de negócios anual do operador da rede de transporte”. Resta saber se, como e quando a ERSE o poderá fazer.
Maura Capoulas Santos associada sénior da Sérvulo & Associados, é licenciada pela Faculdade de Direito de Lisboa e possui pósgraduações em Direito Comercial Internacional e em Direito e Gestão de Empresas
Artigo elaborado segundo as regras do anterior acordo ortográfico. Abril de 2012
15
www.advocatus.pt
Energia
O desafio da especialização Haja ou não crise económica, a atividade do setor da energia será sempre fonte de trabalho para as sociedades de advogados. É, no entanto, um setor que exige especialização e subespecialização O setor de energia é altamente regulado, complexo, envolve verbas avultadas a nível de transação e investimento, e está em constante mutação em função das alterações sociais e económicas das quais depende, mas que também influencia. É um setor que por estes motivos não pode ser ignorado por qualquer organização de prestadores de serviços profissionais, muito menos por sociedades de advogados. Haja ou não crise económica, a atividade deste setor será sempre fonte de trabalho para as sociedades de advogados. É, no entanto, um setor que exige especialização e subespecialização, pelo que as sociedades que pretendem oferecer um serviço de qualidade neste campo são obrigadas a investir na formação dos seus advogados e a dedicar recursos significativos para acompanhar tendências e evoluções. As oportunidades mudam conforme o momento, de acordo com o contexto geopolítico e a definição de prioridades, mas podemos, sem preocupação de rigor excessivo, afirmar que, na atualidade, os grandes temas da energia e realidades afins no caso Português, Europeu e global são: a regulação do mercado e implementação do MIBEL; o futuro das energias alternativas e, em particular, o impacto que terá uma nova política tarifária sobre estas; as questões de ordem de política concorrencial que suscitam os comportamentos paralelos dos distribuidores de combustível na definição dos seus preços; a definição de uma correta política sobre emissões e a consequente aplicação de taxas de carbono (com recentes alterações que agora abrangem a aviação, 16
Abril de 2012
“As sociedades que pretendem oferecer um serviço de qualidade neste campo são obrigadas a investir na formação dos seus advogados e a dedicar recursos significativos para acompanhar tendências e evoluções”
“Trata-se de um setor que é transversal a todas as especialidades de direito, onde operam a uma escala global agentes sofisticados e exigentes que têm o poder económico para escolher os melhores assessores no mercado”
trazendo uma ameaça de conflito comercial com a China e India); o futuro do armazenamento de carbono; os avultados investimentos necessárias para desenvolver novas fontes de hidrocarbonetos, incluindo o shale, com a polémica associada do cracking na exploração, e outras questões ambientais relacionadas com a exploração de fontes de energia; o futuro da energia nuclear, e os incalculáveis valores relativos a indemnizações resultantes de acidentes como os de Fukushima, e as indemnizações que um dia pesarão sobre a indústria nuclear por não ter conseguido encontrar uma solução satisfatória para o armazenamento seguro dos detritos nucleares. Estas são apenas as questões mais evidentes que se relacionam com o setor energético, mas são suficientes para compreender o potencial que este representa para as sociedades, não apenas em termos da especialização em matéria de energia, mas também para outras especialidades de direito, v.g. responsabilidade civil e penal, direito da concorrência, seguros, direito administrativo, etc. Em suma, trata-se de um setor que é transversal a todas as especialidades de direito, onde operam a uma escala global agentes sofisticados e exigentes que têm o poder económico para escolher os melhores assessores no mercado, o que representa um desafio irrecusável para as sociedades de advogados.
Jorge Santiago Neves advisory counsel da GómezAcebo & Pombo. Licenciado em Direito pela Universidade Lusíada de Lisboa, conta ainda com um mestrado em Direito Comercial e Societário pela University College of London
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
O agregador da advocacia
Abril de 2012
17
www.advocatus.pt
Mapa judiciário
A extinção de comarcas com o inerente encerramento de tribunais é a face mais visível da proposta de reorganização judiciária. E, por isso também, o alvo da maior polémica, com receios de que seja limitativa do acesso dos cidadãos à Justiça. Nove sociedades de advogados dão a sua opinião sobre as virtudes e os riscos da proposta do governo
Entre o economicismo e a dimensão humana BAPTISTA, MONTEVERDE E ASSOCIADOS
Vantajosa em teoria A eliminação de comarcas mais pequenas e com uma reduzida atividade, afetando-as a tribunais que centralizem, por exemplo, todos os processos de um determinado distrito judicial, parece a decisão mais acertada, em teoria. Ao contrário do que tem sido invocado, não parece que a alteração do mapa judiciário venha a produzir um grande impacto na movimentação das populações de uns concelhos para os outros. Aliás, é reduzido o número de vezes que cada cidadão necessita de se deslocar a um Tribunal. Se não existe um hospital em cada concelho do país não é percetível por que razão deverá existir um Tribunal. Na verdade seria muito mais vantajoso para as populações o acesso a tribunais especializados com Juízes com grande experiência nas áreas que estão a julgar, mesmo que, para tanto, tenham de se deslocar mais alguns quilómetros. A grande preocupação reside na eficácia da aplicação
de uma medida com esta dimensão num curto espaço de tempo. Recorde-se a transferência dos processos dos tribunais que ficaram adstritos às comarcas criadas pelo D.L. 25/2009, de 26 de janeiro (Comarca da Grande Lisboa Noroeste, Comarca do Baixo Paulo Monteverde Vouga, Comarca do Alentejo Litoral), cujos imsócio pactos, positivos e negativos, ainda estão a ser avaliados. Embora pareça uma solução vantajosa para o aumento da eficiência dos tribunais e da própria Justiça, a verdade é que a alteração do mapa judiciário com a extinção de dezenas de comarcas, caso não seja conduzida de forma eficiente (em particular através da formação prévia dos funcionários judiciais prestada pela Ministério da Justiça), poderá não gerar a ambicionada poupança.
SRS
Cautela na execução Tenho dito e escrito, repetidamente, nos últimos anos, que a principal reforma de que a justiça carece passa pela reorganização dos tribunais. Por uma mais eficiente gestão dos recursos e por uma melhor disciplina e aproveitamento dos mesmos. Por isso, creio que esta reforma vai pelo caminho certo. Mas é preciso pôr uma especial cautela na forma como se executa uma reforma destas, porque é muito difícil de pôr em prática, mexe com muitos interesses. O facto de se prever o encerramento de diversos tribunais pode contribuir para agilizar o sistema mas para tal são necessárias outras mudanças estruturais. Os sistemas de gestão da secretaria e dos processos precisam de ser completamente revistos. O processo de avaliação do trabalho dos magistrados e funcionários não funciona adequadamente. O ponto central é de facto, a reorganização dos tribunais, tendo por base uma efetiva otimização de recursos humanos e materiais com os seus 18
Abril de 2012
dois vetores essenciais: a redução de custos (a aí com o necessário encerramento de algumas comarcas) e a melhoria da eficiência. Se a eficiência dos novos tribunais e a qualidade, que é tão importante como a eficiência, não for exemplar depois da extinção dos excedenSoares Machado sócio tes, então esta reorganização falhará. A importância da Justiça não se compadece com experimentalismos. É necessário reformar com rapidez, mas é preciso pensar e ponderar bem todos os aspetos envolvidos. Esse é o grande desafio desta reforma. Desde que tive responsabilidades na Ordem dos Advogados, entre 93 e 98, que venho defendendo esta ideia. No meu Programa de candidatura a Bastonário para 99/01, era um tema absolutamente central. O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
MIRANDA CORREIA AMENDOEIRA & ASSOCIADOS
PAZ FERREIRA & ASSOCIADOS
Garantir acesso à Justiça
Meritório, mas…
A proposta de revisão do mapa judiciário em discussão prevê: (i) a redução de 232 comarcas para apenas 20 comarcas, que coincidem com o território das Regiões Autónomas e, no Continente, com os Distritos Administrativos; (ii) substituição dos atuais 308 tribunais judiciais por 18 tribunais distritais, 1 tribunal dos Açores e 1 tribunal da Madeira; (iii) extinção Carla Mascarenhas de 46 tribunais e 1 juízo. Nas palavras do Governo, à redução do número de tribunais não advogada corresponderá uma diminuição de oferta de meios nem prejuízo para a aplicação da Justiça. Nos termos da proposta, a alteração que decorre da extinção dos tribunais traduz-se, na pior das hipóteses, num percurso acrescido de 124 kms de distância e/ou a uma deslocação de 94 minutos entre o tribunal extinto e o tribunal que o substitui. Por outro lado, a proposta integra um modelo de gestão que visa um controlo mais efetivo, eficiente e transparente da máquina judiciária. A gestão dos tribunais torna-se unitária, com orçamento único e definição integrada dos objetivos processuais, com vista à otimização dos recursos disponíveis, o aumento da produtividade e o controlo de custos da Justiça. Estamos em crer, com base no que analisámos, que um eventual prejuízo resultante da nova distribuição geográfica dos tribunais será compensado com ganhos resultantes da racionalização dos meios humanos e materiais disponíveis, que assegurem uma Justiça em tempo útil. Ainda assim, o acesso à Justiça terá de ser garantido a todos os cidadãos e sobrepor-se à visão economicista que parece dominar a proposta. Como serviço público de primeira necessidade, a Justiça tem de ser acessível a toda a população, o que cabe ao Estado assegurar.
VIEIRA DE ALMEIDA
Espera-se estabilidade Reformou-se o mapa judiciário em 1999, e com essa reforma foram criados tribunais, reformou-se novamente, de forma provisória (que nunca chegou a definitiva) em 2008 e suspendeu-se a reforma para reduzir agora o número de tribunais. Foram dezenas de diplomas que balançaram entre o alargamento e a redução do número de tribunais. As propostas ora anunciadas de encerramento de alguns tribunais (propostas que vão para além disso) Sofia Ribeiro Branco fundam-se em diversos critérios, uns organizacionais, outros de gestão, não parecendo advogada estar ainda claramente definidos os moldes da concretização dos princípios ordenadores do modelo da futura organização judiciária. Prevê-se uma nova matriz territorial, mais alargada, de especialização das jurisdições e de criação de um novo modelo de gestão dos tribunais. Se a redução do número de comarcas permitir a desejada agilização do sistema, os cidadãos poderão ter melhor Justiça, mas importará, sem dúvida, garantir que é respeitado o acesso de todos ao Direito, garantia que a Constituição elege como fundamental e que não admite desigualdades em função do território. Os cidadãos reclamam a estabilização do sistema judiciário, a justiça de proximidade e decisões de qualidade em prazos razoáveis. É o que se espera que resulte do novo mapa judiciário: estabilidade, proximidade, qualidade e celeridade.
ABREU ADVOGADOS
Flexibilidade e eficiência O grande objetivo da reorganização judiciária, com a redução de comarcas, que passarão a ser apenas 20, correspondentes aos distritos administrativos e regiões autónomas, é que esta estrutura de tribunal distrital funcione com diversas seções em vários pontos do distrito, as quais não funcionarão de uma forma autónoma mas como secções de um único Natália Garcia Alves tribunal, o que permitirá uma maior mobilidade de recursos humanos e materiais e de prosócia cessos/atos processuais. A definição de um número global de magistrados por comarca e a criação de um quadro complementar de funcionários judiciais incrementarão uma flexibilidade até agora inexistente, que, acompanhada do tratamento de pendências por grupos para tal especialmente alocados, poderão revelar-se importantes, possibilitando uma maior eficiência e qualidade do sistema. Sendo a morosidade da Justiça o problema mais grave do nosso sistema judicial, se estas medidas se concretizarem poderão, a seu tempo, satisfazer aqueles cujas vozes agora se levantam contra o encerramento de cerca de 50 tribunais em que a pendência é, alegadamente, reduzida e não justifica a sua manutenção. A reforma do sistema judicial é inevitável para que os cidadãos voltem a respeitar e a confiar na Justiça, mas, para que se torne célere e eficaz, é fundamental que a mentalidade de todos os envolvidos acompanhe e interiorize as alterações legislativas, de forma a melhor contribuir para o Estado de Direito. O agregador da advocacia
Eduardo Paz Ferreira sócio
Está instalado na sociedade portuguesa, desde há largos anos, mas com especial relevância nos últimos tempos, por força da intensidade da cobertura mediática de alguns casos judiciais, um sentimento de que a justiça está em crise e que essa crise tem contribuído para o estado crítico a que o país chegou. A crispação instalada não permitiu que se desse a devida atenção a vários pequenos mas relevantes passos que em certas áreas foram melhorando a situação ou que se tentasse pôr cobro a situações que de abuso do recurso ao sistema público de justiça. Um consenso generalizado parece ter-se, assim, formado em torno da necessidade de uma reforma radical do sistema da justiça. A ideia teve uma expressão em entendimentos interpartidários e entre os diferentes agentes judicias. O mapa judiciário que, com a inclusão de algumas alterações, corresponde ao que vinha sendo trabalhado, propõe-se um conjunto de objetivos meritórios, sobretudo se enquadrados num âmbito mais alargado de potenciação das novas tecnologias e de utilização de métodos de gestão mais modernos. Entre os aspetos mais positivos figura a tendência para a especialização de certas áreas jurisdicionais, de que podem resultar manifestos benefícios para a qualidade das decisões, bem como a flexibilização dos recursos humanos. Entre os mais preocupantes, não posso deixar de referir a possibilidade da extinção de comarcas vir a contribuir para uma maior desertificação do interior ou para o sentimento de uma justiça cada vez mais longe dos cidadãos e remetida para o domínio puramente da técnica, em detrimento da dimensão de cidadania. Abril de 2012
19
Mapa judiciário
www.advocatus.pt
PLMJ
CAIADO GUERREIRO
Um problema de organização territorial
Por maior abertura
Anuncia-se a suspensão da reforma estabelecida pela Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto que permitiu implementar 3 das 39 comarcas previstas. São reduzidos os dados comparativos para sustentar uma avaliação profunda. Não será, por isso, prematuro afastar o modelo anterior sem que estejam estabilizados os dados que decorrem da reforma de 2008? Vamos, apesar de tudo, ultrapassar esta questão com a ideia de que é necessário reduzir Paulo Farinha Alves custos e comarcas. Das 39 previstas na reforma de 2008 a ideia é passar sócio para 20. Justifica-se a extinção de comarcas? A resposta não é evidente. Sim em alguns casos porque isso permitirá uma mais adequada gestão de meios sem sacrifício excessivo para as populações. Esta situação poderá ocorrer com maior facilidade em meios urbanos sem dificuldade de acesso a vias de comunicação e transporte. A resposta será diversa, porém, em comarcas do interior. E poderá ser muito delicada se mergulharmos no interior profundo em que, para além de comarcas com pouca pendência processual se verifica uma perda demográfica significativa. Alguns dirão que a decisão é mais fácil nesses casos considerando que não existe população suficiente que justifique a existência de um tribunal. Porém, a recondução dos cidadãos utentes da justiça a tribunais que se encontram a dezenas de km representa um retrocesso civilizacional e talvez a última machadada nas possibilidades de captação de investimento produtivo que permita fixar as populações locais e atrair novos habitantes. A justiça ficará mais cara e para alguns ficará mesmo incomportável. Em alguns casos o país colocará mais uma pedra no abandono do seu interior. O problema da organização judiciária não é, por isso, apenas um problema de justiça. É sobretudo uma questão de organização territorial. Serão ponderados todos os fatores?
URÍA MENENDEZ – PROENÇA DE CARVALHO
Uma oportunidade O novo mapa judiciário prevê um conjunto de medidas que vão muito além do encerramento de 46 tribunais - os que no período de 2008/2010 tiveram um movimento processual médio inferior a 250 processos ano - visando simFernando Aguilar plificar a organização judiciária, centralizar a gestão dos tribunais e melhorar de Carvalho a afetação dos recursos, de modo a aumentar a capacidade de resposta do sócio sistema. Contempla medidas como fazer coincidir o mapa judiciário com o mapa administrativo, com 20 comarcas correspondendo aos distritos administrativos de Portugal Continental e Regiões Autónomas dos Açores e Madeira, o estabelecimento de uma gestão centralizada para cada tribunal de comarca e a criação de tribunais de primeira instância de competência nacional especializada - tribunal central de instrução criminal, marítimo, propriedade intelectual e concorrência, regulação e supervisão (o propósito anunciado de afetação de um só juiz para cada um destes tribunais é matéria a rever). Prevê ainda a revisão da forma de distribuição de Magistrados e Funcionários por cada um dos novos tribunais de comarca e respetivas secções, libertando meios para atacar o problema das pendências excessivas que tem corroído o sistema por dentro. Em suma, parece constituir uma oportunidade para, através da melhor afetação de recursos e da introdução de uma gestão integrada e centralizada em cada comarca, agilizar o sistema, restando saber se não ficará, tal como a atual reforma, a meio, perdida entre as boas intenções, a resistência às mudanças e a falta de vontade ou capacidade para as levar até ao fim. Os primeiros sinais de resistência aí estão, com autarcas a liderar as reclamações contra o encerramento de tribunais, mas salvo uma ou outra exceção, não creio que daí resulte uma maior dificuldade dos cidadãos no acesso à justiça: assim a reforma resulte numa efetiva redução da demora média de cada processo e já terá valido a pena. 20
Abril de 2012
Sandra Ferreira Dias advogada
A organização judiciária portuguesa há muito que urge ser reformada. De facto, o atual modelo não tem respondido de uma forma eficaz às necessidades dos cidadãos – não só pela morosidade que geralmente lhe está associada, mas também pelas consequências adversas que disso mesmo advêm. Inclusive, a própria garantia efetiva dos direitos legalmente previstos é, por vezes, colocada em causa. Impõe-se, assim, uma otimização dos recursos existentes, de modo a ser potenciada a agilização do sistema e a respetiva eficácia. Neste contexto, o novo mapa judiciário contempla a redução de comarcas, que passarão a corresponder aos distritos administrativos e às regiões autónomas. Tal realidade tem a virtude de simplificar a estrutura atual, podendo contribuir, se acompanhada de um modelo de gestão eficiente, para melhorias significativas no sistema judiciário português. Questão diversa prende-se com o encerramento efetivo de 47 tribunais. Se é verdade que, de um ponto de vista estritamente económico-financeiro, a manutenção de certos tribunais não encontra justificação, não pode deixar de ser tido em conta, por outro lado, o profundo impacto social que aquela decisão acarreta, a qual pode ter implicações na efetiva concretização do direito fundamental de acesso à justiça. Por este motivo, impera indagar a valia da utilização exclusiva de critérios rígidos e inflexíveis – importa observar com a maior amplitude e abertura possíveis a realidade das populações. O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Insolvências
Recuperar e não liquidar A grande alteração que se discute prende-se com o facto de ter sido recuperada a ideia subjacente ao CPERF e que era a sua própria ratio legis, ou seja, as empresas e as próprias pessoas singulares devem, se possível, ser recuperadas e não, no caso das empresas, liquidadas Negociação, negociação, negociação… Sem dúvida que esta é a palavra que mais se adequa a várias reformas legislativas em curso. No entanto, como estamos a versar as alterações ao CIRE (Código da Insolvência e Recuperação de Empresas), convém fazermos uma alusão histórica ao CPERF (Código do Processo Especial de Recuperação da Empresa e de Falência). A grande alteração que se discute prende-se com o facto de ter sido recuperada a ideia subjacente ao CPERF e que era a sua própria ratio legis, ou seja, as empresas e as próprias pessoas singulares devem, se possível, ser recuperadas e não, no caso das empresas, liquidadas. Com efeito, desde logo, o Artigo 1º muda radicalmente o seu caminho, porquanto, na atual lei, refere que o processo de insolvência é um processo de execução universal que visa a liquidação do património de um devedor. Já na proposta em fase de aprovação, o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores segundo um plano de insolvência, baseado na recuperação da empresa. Com tal desiderato, nasce o Processo Especial de Revitalização (PER), que terá início com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores no sentido de se iniciarem negociações, que não poderão exceder os três meses. Durante este período, e este aspeto é muito relevante, suspendem-se as ações que estejam a correr, assegurando-se a necessária calma para a criação de um verdadeiro plano de recuperação. O agregador da advocacia
“Na proposta em fase de aprovação, o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores segundo um plano de insolvência, baseado na recuperação da empresa”
“Está prevista uma limitação da utilização do PER, para que o processo não seja utilizado de forma abusiva, não servindo como instrumento dilatório de não cumprimento de obrigações”
Este processo tem a virtude de poder ser submetido à homologação do tribunal, já com o plano aprovado pelo requerente e credores. Se forem encontrados mecanismos de recuperação, podendo, por acordo dos envolvidos, mas sujeito às maiorias previstas no código, ser indicados novos gestores que não os constantes da lista de Administradores judiciais, ao Juiz cabe o poder/dever de homologar o acordo alcançado. O poder do juiz coloca-se, assim, no plano da fiscalização e não da tutela do processo. Quando não se tenha logrado acordo conducente à revitalização do devedor, duas hipóteses se configuram: se as negociações forem encerradas e o devedor não se encontrar em situação de insolvência, o processo será extinto, deixando de produzir efeitos; se o devedor já se encontrar em insolvência, deve o administrador judicial provisório, após ouvir o devedor e os credores, requerê-la ao tribunal, devendo o juiz declará-la no prazo de três dias úteis. De realçar que está prevista uma limitação da utilização do PER, para que o processo não seja utilizado de forma abusiva, não servindo como instrumento dilatório de não cumprimento de obrigações, se o devedor desistir deste processo não poderá recorrer ao mesmo durante dois anos. Sem prejuízo de esta ser, sem dúvida, a alteração mais relevante, outras são alvo desta proposta de Lei. Assim, está previsto um reforço da responsabilidade do devedor e dos seus administradores de direito ou de facto caso tenham sido causadores da situação de insolvência com culpa; prevê-se uma tramitação mais simplificada
Fernando Antas da Cunha fundador da Antas da Cunha, Ferreira & Associados, é licenciado em Direito pela Universidade Moderna de Lisboa. Atua sobretudo nas áreas do Direito Comercial e Societário, Contencioso e Insolvências
para a efectivação das reclamações de créditos; encurtam-se prazos, em particular, reduz-se de 60 para 30 dias o prazo de apresentação voluntária à insolvência; a reclamação ulterior de créditos só poderá ser feita nos seis meses subsequentes à declaração de insolvência; a impugnação da resolução de negócios a favor da massa insolvente é reduzida de seis para três meses; a resolução de negócios em benefício da massa insolvente sofreu um corte de quatro para dois anos. Outra das novidades consiste em transformar o incidente de qualificação da insolvência de carácter obrigatório num incidente cuja tramitação está dependente de provas carreadas para o processo de que a situação de insolvência provém de culpa do devedor ou dos seus administradores de direito ou de facto. Uma última palavra para a alteração ao veículo de publicidade dos actos relativos ao processo de insolvência, que passa a ser o citius, em detrimento do Diário da República Eletrónico. Abril de 2012
21
www.advocatus.pt
Testemunho
Há 18 anos que trabalha no sector do petróleo e do gás e conhece as diferentes “linguagens” do negócio e as linhas estratégicas que o orientam. Ana Major, diretora-geral jurídica da unidade de negócio da Chevron na África Austral, está sediada em Luanda, chefia 20 pessoas e diz que o trabalho de equipa é fundamental para cumprir os objetivos do seu departamento
Advogada do oil & gas É um gatekeeper. É assim, sem disfarçar a sua tendência para usar expressões inglesas, que Ana Major responde à pergunta: o que faz um advogado in house da Chevron África Austral? “Estamos envolvidos em todas as áreas de negócio e sabemos que o que não ficar bem feito no início vai trazer problemas no futuro e daí que tenha essa preocupação”, afirma. Responsável pelo sector jurídico da multinacional norte-americana em toda a África Austral – a Chevron tem atualmente atividades em Angola, República do Congo e República Democrática do Congo –, tem o seu quartel-general em Luanda, onde chefia uma equipa de 20 pessoas. Tem uma função transversal a todas as áreas da empresa e por isso sabe que tem de falar as “várias linguagens dos diferentes clientes internos”. Num dia tem de entender o que diz o departamento de informática, no outro o dos recursos humanos e noutro ainda o dos serviços médicos, por exemplo. Foi esta possibilidade de envolvimento na gestão do negócio e das pessoas que a levou a aceitar, em 1997, um convite para entrar na então Texaco, que mais tarde seria absorvida pela Chevron. Na altura, Ana Major estava numa companhia de seguros angolana, a ENSA, e era advogada externa, onde já assessorava empresas do sector do oil & gas. Curiosamente, na altura foi também entrevistada pela Chevron que estava a
Ramon de Melo
Apesar de ter uma equipa de 20 elementos, a Chevron não hesita em recorrer a advogados externos quando tal é necessário. É habitual fazer o outsourcing das idas a tribunal, por exemplo, mas também pode acontecer um envolvimento a outro nível 22
Abril de 2012
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
pensar abrir um escritório jurídico em Luanda. Apesar de ter uma equipa de 20 elementos, a Chevron não hesita em recorrer a advogados externos quando tal é necessário. É habitual fazer o outsourcing das idas a tribunal, por exemplo, mas também pode acontecer um envolvimento a outro nível. “Gostamos de ver os advogados externos envolvidos connosco na busca de soluções preventivas pois o nosso objetivo é sermos mais proactivos na busca dessas soluções”, afirma Ana Major. A relação com estes advogados é a de uma “autêntica parceria”. A mesma responsável afirma que também pode recorrer aos serviços centrais jurídicos da Chevron Angola – aliás, ela tem um duplo report: à divisão jurídica da Chevron e ao diretor-geral da companhia em Luanda. Essa relação com a sede central tem duas vias. Ana Major explica: “Podemos usar todos os recursos da companhia, que estão à nossa disposição, assim como podemos ceder conhecimentos e lições que aprendemos com a nossa operação local”. O departamento jurídico da Chevron Angola também pode ser chamado a emitir uma opinião sobre legislação que o governo angolano esteja a preparar para o sector petrolífero, cada vez mais regulado no país. Grande parte da equipa de Ana Major está em Luanda mas há uma unidade jurídica em Malongo, a base operacional da Chevron em Angola. Os assuntos relacionados com as operações nos dois Congos também são tratados a partir da capital angolana. A advogada considera que a companhia norte-americana é uma autêntica escola, até pela diversidade de projetos que desenvolve em Angola, desde a atividade petrolífera à participação no consórcio Angola LNG, com instalações no Soyo e que vai exportar gás natural liquefeito, principalmente para os EUA. A advogada considera “fascinante” a quantidade de assuntos em que está envolvida, que vão desde o ambiente aos recursos humanos, O agregador da advocacia
Grande parte da equipa de Ana Major está em Luanda mas há uma unidade jurídica em Malongo, a base operacional da Chevron em Angola
passando pela regulação e até pelo compliance. Trabalho de equipa é o seu método de gestão preferido. Costuma dizer que “nenhum de nós individualmente sabe mais do que o team” e por isso preocupa-se em respeitar cada pessoa que trabalha diretamente consigo e reconhecer as suas contribuições individuais. Outra das suas prioridades é reforçar o processo de angolanização em curso na Chevron, uma empresa onde 80 por cento da força de trabalho já é angolana. Nos cargos de chefia, cerca de 50 por cento da direção é angolana. O grande desafio é “angolanizar na forma e no conteúdo”, diz Ana Major. “Levamos a sério a carreira das pessoas e quando há talento e potencial levamos a sério a transferência de conhecimento”, afirma. Como as universidades em Angola são novas, os quadros ainda são insuficientes para as necessidades e, por isso, a angolanização também passa por convencer os angolanos que estão no estrangeiro a regressar ao país. Essa tem sido uma das missões de Ana Major quando está presente em iniciativas de recrutamento, como foi o caso da edição de 2012 do Fórum Elite Angolan Careers, que decorreu em março, em Lisboa.
Trabalho de equipa é o seu método de gestão preferido. Costuma dizer que “nenhum de nós individualmente sabe mais do que o team”
CARREIRA
Três anos nos EUA Em 1976/77 a Antropologia era um luxo numa Angola que estava no início de uma longa guerra civil que iria durar até 2002. O sonho de Ana Major era mesmo a Antroplogia mas o curso não existia no país e teve de optar pela segunda prioridade: o Direito. Licenciou-se na Universidade Agostinho Neto e quando esteve três anos nos EUA, a trabalhar e a conhecer melhor o universo Chevron, tirou um mestrado em Business Law na Davis School of Law, da Universidade da Ca-
lifórnia. Com duas filhas, Ana Major gostava um dia, quando se reformar da Chevron, de trabalhar nos seus hobbies preferidos: a decoração de interiores e a jardinagem. Durante o seu tempo de estudante universitária também cantou e fez teatro. O sonho da Antropologia ficou pelo caminho mas não foi esquecido. Ainda lê muito sobre a matéria e tenta “influenciar resultados” na sua atual posição. Como? Envolvendo-se em projetos com as comunidades.
Abril de 2012
23
www.advocatus.pt
Arrendamento
Simplificar e agilizar É notório o intuito de simplificação e agilização do arrendamento — por um lado, retira-se dos Tribunais o processo de denúncia do contrato de arrendamento, que passa a ser feita através de mera comunicação ao arrendatário, e, por outro, reduzem-se os valores de indemnização e os prazos de realojamento —, e ainda de articulação com o regime da reabilitação urbana Perante a actual crise do crédito e com o envelhecer do edificado nacional, tanto o arrendamento como a reabilitação se assumem como matérias de relevantíssimo interesse. A ligação entre a reabilitação, o urbanismo e a habitação afigura-se patente, e é no seio destas matérias que a reabilitação tem vindo a assumir um particular relevo, por estar em harmonia com uma nova lógica de ocupação do território e com um novo paradigma de urbanismo: um urbanismo de contenção dos perímetros, em que as necessidades urbanísticas são satisfeitas com a mobilização dos solos expectantes dentro dos perímetros urbanos — urbanismo de colmatação — e com a utilização (após reabilitação) do edificado existente, precedida da requalificação de espaços públicos que os servem — urbanismo de reabilitação urbana. É neste contexto que foi aprovada a Proposta de lei n.º 24/XII, de 30 de Setembro de 2011, que visa alterar o Regime Jurídico da Reabilitação Urbana, e, mais recentemente, foram também aprovadas as Propostas de Lei n.º 38/XII, de 29 de Dezembro de 2011, e n.º 47/XII, de 10 de Fevereiro. Fixemo-nos na última, que pretende rever o Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados. Após uma primeira análise, verifica-se que não são muitas as alterações, ainda que seja notório o intuito de simplificação e agilização do arrendamento — por um lado, retira-se dos Tribunais o processo de denúncia do contrato de arrendamento, que passa a ser feita através de mera comunicação ao arrendatário, e, por outro, reduzem-se os valores de indemnização e os prazos de realojamento —, e 24
Abril de 2012
“Ao fixar-se a indemnização, em todo e qualquer caso, no valor de seis meses de renda, mesmo que, por exemplo, o valor das despesas, benfeitorias, etc. ultrapasse tal valor, vislumbra-se que eventuais problemas de constitucionalidade possam afectar esta norma”
“No fundo, está-se a restringir um direito de cariz análogo ao de propriedade, o que parece ser inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade e da justa indemnização”
ainda de articulação com o regime da reabilitação urbana. Na impossibilidade de abordar as diversas alterações pretendidas, limitar-nos-emos à denúncia do contrato de arrendamento para remodelação ou restauro. A denúncia do contrato de duração indeterminada para realização de obra de remodelação ou restauro profundos obriga o senhorio, mediante acordo e em alternativa: (a) ao pagamento de uma indemnização correspondente a seis meses de renda; ou (b) ao realojamento do arrendatário por período não inferior a dois anos. Em relação à indemnização, o legislador operou uma alteração importante ao introduzir uma indemnização fixa, cujo valor passa a corresponder sempre a seis meses de renda, ao contrário do actual regime, em que o valor da indemnização abrange a totalidade das despesas e danos suportados pelo arrendatário, incluindo o valor das benfeitorias realizadas e dos investimentos efectuados em função do locado, e tem um limite mínimo de dois anos de renda. Ainda que se perceba a opção, assinale-se que ao fixar-se a indemnização, em todo e qualquer caso, no valor de seis meses de renda, mesmo que, por exemplo, o valor das despesas, benfeitorias, etc. ultrapasse tal valor, vislumbra-se que eventuais problemas de constitucionalidade possam afectar esta norma. No fundo, está-se a restringir um direito de cariz análogo ao de propriedade, o que parece ser inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade e da justa indemnização. Por sua vez, no que diz respeito ao realojamento do arrendatário, pretende-se reduzi-lo para um período não inferior a dois anos, que
Jorge Silva Sampaio associado da Sérvulo & Associados, é licenciado pela Faculdade de Direito de Lisboa. Autor da Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer
é a nova duração de referência dos contratos de arrendamento. As condições mantêm-se incólumes, ficando o senhorio obrigado a proceder ao realojamento (i) no mesmo concelho e (ii) em condições análogas às que o arrendatário detinha, quer quanto ao local quer quanto ao valor da renda e encargos. Poderia aqui o legislador ter precisado o conceito de “condições análogas”, de forma a adaptá-lo aos diferentes casos com que os senhorios se possam deparar, já que subsistem algumas situações em que se torna quase impossível o realojamento. Caso as partes não cheguem a acordo, mantém-se a indemnização como solução supletiva. Assim, se o senhorio e o arrendatário não chegarem a acordo em 30 dias a contar da recepção da comunicação ao arrendatário para a “denúncia justificada”, fica o senhorio obrigado ao pagamento da indemnização.
Artigo elaborado segundo as regras do anterior acordo ortográfico. O agregador da advocacia
ARST VENDING Um serviço de qualidade adaptado às necessidades dos clientes. Equipamentos fiáveis com produtos de pastelaria fresca de muita qualidade. Peça amostras dos nossos produtos frescos. Colocação gratuita Número verde
800 913 280
ARST VENDING Rua Silva Pedro, Lote 60, 1685-467 Caneças Tel.: 218 031 059, Tlm: 925 823 028 E-mail: arst@arstvending.pt • www.arstvending.pt
www.advocatus.pt
Passeio Público
Não há impossíveis. Esta foi a lição-mor que Maria Augusta Fernando, 46 anos, aprendeu durante o estágio na JPAB. Uma lição que a advogada procura verter num dia-a-dia guiado pelo pragmatismo mas também pela preocupação de não prejudicar o próximo. “Se conseguirmos isso, o resto vem por acréscimo”…
n/factos
Não há impossíveis
Direito não parecia estar, de todo, no caminho de Maria Augusta Fernando. Não obstante o pai advogado, não sentia vocação nem afinidade. Era, antes, a Filosofia que a atraía: fascinava-a tentar perceber o pensamento humano, perceber a existência. Este fascínio, contudo, não venceu perante 26
Abril de 2012
a sua vincada faceta pragmática: “A minha vontade, sinceramente, era seguir Filosofia, mas percebi que não me ia levar a lado nenhum”. Letras e Literaturas também a interessavam, e não era pouco, mas, mais uma vez, colocou a si própria a questão das saídas profissionais. Braga até
Era, antes, a Filosofia que a atraía: fascinava-a tentar perceber o pensamento humano, perceber a existência
lecionava um curso de Literatura e Filosofia (que conciliava academicamente os seus dois amores) mas o ensino seria o desfecho mais provável e não a atraía. Pensou, pois, que o melhor seria enveredar pela advocacia. Não por pressão paterna, assegura, comentando que o pai, que também gosO agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Com uma amiga, início dos anos 1970
tava de Filosofia e com quem tinha conversas “muito interessantes”, sempre a incentivou a seguir estudos filosóficos se era o que queria… Ainda se inscreveu no chamado “ano zero” da Universidade Católica, no Porto, superou com sucesso os exames de admissão, mas no seu horizonte acabou por ficar Coimbra. Naqueles anos, a sua cidade, a invicta, não possuía ainda curso superior público de Direito, pelo que a opção foi seguir os passos paternos e rumar à cidade dos estudantes. Foram – recorda – cinco anos marcantes, enriquecedores: “Vivíamos em quartos alugados, comíamos juntos, contávamos o dinheiro… “. Aprendeu então a independência: sem família por perto, reforçam-se os laços da fraternidade e da solidariedade. Maria Augusta não pertenceu propriamente à associação académica, mas aderiu a tudo. Foi uma experiência que ficou para a vida, ainda assim não suficiente para se ficar por Coimbra finO agregador da advocacia
Em Caminha, na infância, com a mãe e os irmãos
De regresso ao Porto, mal teve tempo para matar saudades: oito dias depois já estava a estagiar, no escritório em que, volvidos 18 anos, se mantém – a JPAB. Estagiou diretamente com o fundador da sociedade – José Pedro Aguiar Branco
Na Queima das Fitas, em Coimbra, nos anos 80
da a licenciatura. É que no Porto estava toda a sua vida, a família e o namorado, com quem viria a casar. Mas ficou-lhe uma grande paixão: a Briosa (ver caixa). De regresso ao Porto, mal teve tempo para matar saudades: oito dias depois já estava a estagiar, no escritório em que, volvidos 18 anos, se mantém – a JPAB. Estagiou diretamente com o fundador da sociedade – José Pedro Aguiar Branco, advogado de profissão e atual ministro da Defesa. Foi um estágio “muito rico”, do qual retirou uma lição ímpar – “Não há impossíveis”: “Pode parecer uma ilusão, mas aprendi que é sempre possível trabalhar para evitar que situações que pareciam difíceis e até irresolúveis cheguem a tribunal”. Coloca o seu lado humano ao serviço dessa máxima, fazendo valer a sua maneira de ser simples e humilde; reconhece que a sua facilidade em comunicar tem tido o mérito de abrir algumas portas e destrinçar alguns nós profissionais. Atualmente uma das três sócias
de Indústria, Maria Augusta Fernando é sobretudo uma advogada de conciliação, privilegiando a advocacia preventiva. Dedica-se em particular ao societário, defensora das virtudes de um contrato bem elaborado: “Muitas vezes os contratos são mal feitos e depois é tarde demais”. O “tarde demais” significa que já não se consegue evitar o conflito e que o tribunal é a paragem seguinte. Desfecho que prefere evitar, até porque a barra não a seduz. Durante o estágio foi naturalmente a tribunal. E ainda se recorda bem da sua primeira vitória: foi no Tribunal de Santa Maria da Feira, defendia uma companhia de seguros cujo segurado teve um acidente na A1 porque conduzia a 120 km/h na faixa da esquerda… “Foi gratificante”. Mas não o suficiente para a convencer. Prefere de longe a negociação. Até porque – argumenta - em tribunal o advogado não depende apenas de si próprio. Entre os impedimentos do próprio tribunal e as faltas de testemunhas, Abril de 2012
27
www.advocatus.pt
Passeio Público
>>>
“Pode parecer uma ilusão, mas aprendi que é sempre possível trabalhar para evitar que situações que pareciam difíceis e até irresolúveis cheguem a tribunal”.
há uma “sensação de improdutividade terrível”. Maria Augusta Fernando gosta de ser dona do seu tempo. E não é porque exerce advocacia preventiva que se sente menos útil. Antes pelo contrário, assegura que o ideal de advogado que faz o bem e ajuda o próximo se aplica perfeitamente ao seu trabalho. E motiva-a: “Quando contribuo para construir um contrato a evitar um conflito, estou a ajudar o outro e de que maneira”. Conta mesmo um dos casos mais marcantes da sua carreira: o de uma cliente de há muitos anos que enfrentava um difícil caso de licenciamento de uma residência no Gerês – “Tudo indicava que teríamos de recorrer a tribunal, mas, com diplomacia, argumentando e conversando, foi possível ajudar todas as partes. Foi mais gratificante do que vencer uma causa em tribunal”. Este espírito de conciliação que acompanha Maria Augusta Fernando é indissociável do cristianismo. Nascida numa família católica, não se diz católica, mas sim cristã. E o exemplo que procura seguir é o de Jesus Cristo:
Atualmente uma das três sócias de Indústria, Maria Augusta Fernando é sobretudo uma advogada de conciliação, privilegiando a advocacia preventiva. Dedica-se em particular ao societário, defensora das virtudes de um contrato bem elaborado
“É na vida de Cristo que me inspiro. Acredito que foi um exemplo para todos nós e, embora não o consiga, é o exemplo que procuro seguir”. É por isso que entre os seus valores pontua o “não prejudicar o próximo”. O resto – acredita – “vem por acréscimo”.
PAIXÕES
A Briosa e Dostoiesvki Maria Augusta Fernando cita Miguel Torga, o autor transmontando adotado por Coimbra, para verbalizar uma das suas paixões: “A Académica é uma causa”. Não é que seja uma entusiasta do futebol, antes é uma apaixonada pelo clube da cidade dos estudantes, “tanto faz que ganhe ou que perca” – vem “sempre satisfeita” de um jogo. De tal forma que já tem bilhete para a final da Taça de Portugal, no Jamor a 20 de maio, que a sua Briosa disputará com o Sporting. Esta é uma causa ainda anterior aos tempos em que frequentou a Universidade de Coimbra. Foi-lhe incutida pelo pai, também ele um academista. Mas não é a sua única paixão: rivaliza com a literatura russa, sobretudo com Dostoievski, o seu autor de eleição pela “forma simples de escrever”. Já leu quase todos os livros, mas há um que a prende particularmente – “Crime e Castigo”. E porquê? A explicação – comenta – também ajuda a perceber por
28
Abril de 2012
que a advogada gosta tanto de Filosofia: “Consegue, numa só personagem, conter o que há de melhor e de pior num ser humano, uma personagem que comete um crime horrendo e de que, no entanto, não se consegue deixar de gostar”. Maria Augusta Fernando lê outros autores, mas esta ligação – reconhece – só a consegue sentir com Dostoievski. Não lê tanto quanto gostaria, aproveitando as férias para compensar as leituras atrasadas. E para pôr em dia o cinema, outra paixão que lhe vem dos tempos de escola mas que agora passou das salas públicas para a sua sala de casa, porque só em vídeo consegue recuperar os títulos da sua preferência. É entre os livros, os filmes e os passeios na praia que desfruta das férias, na companhia de amigos e família, para descansar e apreciar o viver sem horários.
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Televisão
Reformas em análise As diversas alterações legislativas, consequência do Memorando de Entendimento com a Troika, dominaram o Direito a Falar durante o mês de março Falta de estabilidade Este é o principal problema apontado pelos especialistas em Fiscalidade convidados a participar no Direito a Falar sobre o tema - M. Fernandes Ferreira (PLMJ), Tiago Caiado Guerreiro (Caiado Guerreiro & Associados) e João Espanha (Espanha & Associados). O grande problema do atual sistema fiscal nacional é a falta de estabilidade, o que, na opinião destes especialistas, se traduz numa desvantagem competitiva de Portugal, em comparação com a maioria dos países, na captação de investimento externo. O sócio da PLMJ Rogério Fernandes Ferreira chega inclusive a referir que a grande maioria dos governos não resiste a fazer, todos os anos, uma “verdadeira revolução fiscal” na altura da apresentação da proposta de Orçamento de Estado. Os convidados apontaram ainda como entrave ao investimento estrangeiro em Portugal a elevada carga fiscal, que temem que resulte no ressurgimento de uma economia paralela.
Enfoque na recuperação O Governo propôs no início do ano a alteração do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), com vista a uma maior incidência sobre a recuperação. Em simultâneo, esta reforma pretende agilizar os processos, aumentar a responsabilidade dos administradores das sociedades insolventes e melhorar a articulação entre a ação executiva e a insolvência. Objetivos que os convidados do Direito a Falar sobre Insolvências enaltecem. O programa contou com o contributo de Alexandre Mota Pinto (Uría Menéndez-Proença de Carvalho), João Santos (Miranda Correia Amendoeira & Associados) e Frederico Gonçalves Pereira (Vieira de Almeida & Associados). Como principal ponto deste novo código destacam a possibilidade de o devedor dar início ao processo de proteção, além de considerarem a proposta de novos prazos também como uma medida a destacar.
Concorrência: falta de equidade A nova lei da Concorrência, que irá revogar na totalidade a que se encontra em vigor, esteve em debate na emissão do Direito a Fala que juntou em estúdio Gonçalo Anastácio (SRS), Ricardo Oliveira (PLMJ) e Carlos Botelho Moniz (Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados). Os advogados concordaram que o legislador conseguiu cumprir com os objetivos propostos, exceto no caso da equidade entre Autoridade da Concorrência e a defesa das empresas. Apesar das críticas, os especialistas em concorrência destacaram de forma positiva o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pela Autoridade da Concorrência.
As reformas do Código do Trabalho Os advogados especialistas em Direito do Trabalho António Garcia Pereira (Garcia Pereira & Associados), Inês Pinheiro (Serra Lopes, Cortes Martins & Associados) e Anabela Salvado (Pedro Raposo & Associados) foram os convidados do Direito a Falar que se propôs analisar as grandes alterações ao Código do Trabalho. Uma reforma que resulta essencialmente do Memorando de Entendimento com a Troika e, posteriormente, do Acordo de Concertação Social, e cujo objetivo é a criação de emprego e o aumento da competitividade entre as empresas. Anabela Salvado realçou a importância da flexibilidade nesta reforma, nomeadamente na relação entre o empregador e o funcionário. Por seu lado, Garcia Pereira mostrou-se crítico a estas alterações, afirmando que servem para agravar a situação de precariedade dos trabalhadores. O agregador da advocacia
Abril de 2012
29
www.advocatus.pt
Entrevista
Fátima de Sousa jornalista fs@briefing.pt
“É evidente que os juízes não podem ser – e não o são – comissários de partidos. O parlamento designa pessoas que, obviamente, têm em relação a esse mesmo parlamento um dever de ingratidão”. É assim que o presidente do Tribunal Constitucional responde às dúvidas que se levantam sobre o processo de nomeação dos juízes. Em final de mandato, Rui Moura Ramos, 61 anos, faz o balanço da justiça constitucional em Portugal à luz dos seus nove anos como juiz e cinco como presidente do órgão que zela pela conformidade das leis à lei magna
Ramon de Melo
Temos um dever de ingratidão
Advocatus | Termina este mês (abril) o seu mandato como juiz do Tribunal Constitucional. Com a sua saída ficam quatro lugares vagos porque a Assembleia da República tarda em nomear os três que são da sua competência. Justifica-se esse impasse? Rui Moura Ramos | De facto, 30
Fevereiro de 2012
termino o mandato de nove anos – fui eleito em 2003 – no dia em que o meu sucessor como juiz for escolhido. Sem contar com a minha saída, há três lugares por preencher e que serão preenchidos por designação da Assembleia da República. Quando isso acontecer, o tribunal ficará com 13 juízes e nesse momento
”Creio que tem desempenhado o papel que é de esperar de um TC, que é fazer juízo crítico das leis na sua conformidade com a Constituição”
os 10 juízes nomeados pelo parlamento vão poder cooptar outro juiz. O meu sucessor será, como eu fui, designado por cooptação e quando ele tomar posse eu abandono o tribunal. Em tempos houve impasses grandes nas designações, mas recentemente não tem havido. Os colegas que saíram em 2007 O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
foram substituídos em poucos meses. Agora são três os que têm de ser substituídos e parece-me que a Assembleia está empenhada no processo. Depois, internamente, a cooptação deverá ser mais rápida. Advocatus | Uma das questões mais controversas à volta do TC é precisamente o facto de a maioria dos juízes ser escolhida pelo parlamento. O que responde aos receios de partidarização? RMR | É bom diferenciar a politização da partidarização. A politização é o princípio, na medida em que o Tribunal Constitucional desempenha, devido à sua natureza, uma função política relevante. A circunstância da designação dos seus membros pelo parlamento, não sendo magistrados de carreira como nos demais tribunais, tem uma justificação: é que temos de ter uma legitimidade que não seja apenas técnica. É perfeitamente normal que num tribunal desta natureza haja uma participação de órgãos políticos na designação dos seus membros; aliás, acontece em quase todos os países europeus e nos Estados Unidos. A questão da legitimidade política dos tribunais constitucionais não constitui, pois, um problema, é até algo sadio. Mas uma coisa é a politização, outra a partidarização. É evidente que os juízes não podem ser – e não o são – comissários de partidos. O parlamento designa pessoas que, obviamente, têm em relação a esse mesmo parlamento um dever de ingratidão, considerando não conformes à Constituição leis emanadas do parlamento quando assim o entender. E é um dever dos partidos procurar designações que assegurem essa independência. Não é uma designação partidária, mas uma designação por consenso, que exige uma maioria de dois terços. A alternativa ao consenso seria uma maioria circunstancial. O agregador da advocacia
“É perfeitamente normal que num tribunal desta natureza haja uma participação de órgãos políticos na designação dos seus membros; aliás, acontece em quase todos os países europeus e nos Estados Unidos”
Advocatus | A maioria de dois terços é um garante da independência do TC? RMR | A garantia não está no consenso, está nas escolhas e no comportamento das pessoas escolhidas. Mas diria que estes mecanismos não prejudicam e não impedem que as escolhas sejam as adequadas. A circunstância de a designação dos membros do tribunal ser feita por um órgão que é a expressão da vontade popular não põe em causa a independência do tribunal. Advocatus | A duração do mandato e a não renovação também se destinam a acautelar essa independência. Concorda com estes requisitos? RMR | A não renovação do mandato foi uma boa solução porque afasta qualquer noção de que o juiz pudesse desejar uma nova nomeação e, portanto, que o seu comportamento pudesse ser afetado por isso. A tendência atual é, aliás, no sentido de mandatos longos e não renováveis e há até países que foram mais longe do que nós, com mandatos de 12 anos, mas penso que nove anos já é suficientemente longo. Um mandato com esta duração é visto como um acrescento de garantia de independência.
“A garantia (de independência) não está no consenso, está nas escolhas e no comportamento das pessoas escolhidas”
>>>
CARREIRA
De volta a Coimbra Rui Moura Ramos vai regressar a Coimbra a tempo inteiro. Ao fim de um mandato como juiz e como presidente do tribunal Constitucional. Nove anos que foram “um grande desafio e uma grande responsabilidade”, ainda que “uma responsabilidade partilhada porque o Tribunal é um coletivo”. “Foi muito enriquecedor poder exercer uma missão de serviço público nesta casa, com estes juízes
e neste quadro constitucional”, comenta. Quando for substituído, retomará o percurso como professor na Faculdade de Direito de Coimbra. Um percurso interrompido em 1995, quando foi eleito juiz do Tribunal Geral da União Europeia, cargo que ocupou até 2003, ano em que foi cooptado para o Constitucional. Agora volta à faculdade, onde viveu “23 anos muito interessantes”.
Abril de 2012
31
www.advocatus.pt
Entrevista
>>>
Advocatus | Um mandato de nove anos nunca coincide com uma legislatura… RMR | Não há, de facto, coincidência temporal. Se tudo correr bem, um juiz exerce o mandato com duas maiorias parlamentares; além disso, como há juízes que renunciam, a designação acaba por ocorrer com alguma irregularidade, não em momentos fixos.
“Está no seu direito e está no seu direito também não estar acompanhado pela maior parte das situações que se conhecem nos países europeus e nos latino-americanos” – referindo-se à opinião de Noronha do Nascimento de que o TC devia ser uma secção do STJ
“A não renovação do mandato foi uma boa solução porque afasta qualquer noção de que o juiz pudesse desejar uma nova nomeação e, portanto, que o seu comportamento pudesse ser afetado por isso”
Advocatus | Qual a sua opinião sobre a tese de que o Presidente da República deveria ter influência na nomeação dos juízes? RMR | É uma boa tese que se pode suportar em argumentos de Direito comparado. Mas o facto de o Presidente não estar envolvido tem a ver com o momento em que o Tribunal Constitucional foi instituído, um momento de acesa luta política entre a maioria e o Presidente da altura [Ramalho Eanes]. Em função disso, o Presidente não foi considerado como uma entidade que pudesse participar na nomeação dos juízes. Oiço muitas vezes que assim poderia ser e é um argumento com alguma razoabilidade. Em Itália, o Presidente, que não é eleito pelo povo mas sim pelo parlamento, designa um terço dos juízes do TC – são 15, ele designa cinco, o parlamento outros cinco e a magistratura os restantes.
PENDÊNCIA
“Não é significativa” No Tribunal Constitucional, também há pendências, mas, diz o seu presidente nos últimos cinco anos, não é significativa. Assim, o ano passado, entraram 915 processos e o tribunal fechou 973, o que significa que recuperou alguma pendência. Em 31 de dezembro de 2011
32
Abril de 2012
estavam no tribunal 321 processos; desses, 84 tinham decisão que aguardava o prazo do trânsito em julgado, que só se verificou em janeiro devido às férias judiciais, em que os prazos não correm. A pendência oscila, pois, entre 200 e 300 processos.
Em Portugal não é assim e, por maioria de razão, não poderia ser porque o Presidente é eleito pelo povo. Mas há outro argumento; é que em Itália, o Presidente não pode colocar questões ao TC e em Portugal pode e fá-lo; exerce até, pelo menos no último ano, com alguma intensidade a chamada fiscalização preventiva. Por isso, é discutível que deva nomear juízes. Em Itália não há fiscalização preventiva. As questões estão ligadas. Compreendo a solução atual, mas é uma questão em aberto. Advocatus | E quanto ao facto de a magistratura também não ter influência na composição do tribunal? RMR | Noutros países tem, mas em Portugal a única forma de participação da magistratura é que seis dos juízes têm de ser magistrados de carreira. Sejam designados pelo parlamento ou cooptados. Acho que é uma solução feliz, um compromisso. Advocatus | Assim sendo, diria que a fórmula de constituição do TC é equilibrada? RMR | A solução foi claramente marcada pelo momento inicial, mas o comportamento posterior do tribunal retirou razão aos receios que pudessem existir face à natureza do compromisso alcançado aquando da sua constituição. Pode-se sempre mudar, mas não vejo que a presente solução levante particulares problemas, tem funcionado bem. Advocatus | Qual a sua opinião sobre as vozes, nomeadamente de Noronha do Nascimento, que dependem que o TC deveria ser uma secção do Supremo? RMR | Está no seu direito e está no seu direito também não estar acompanhado pela maior parte das situações que se conhecem nos países europeus e nos latino-americanos. Os tribunais constitucionais surgiram no século XX, o primeiro foi o austríaco, antes da guerra, depois vieram o italiano e o aleO agregador da advocacia
www.advocatus.pt
“O comportamento posterior do tribunal retirou razão aos receios que pudessem existir face à natureza do compromisso alcançado aquando da sua constituição”
mão, em países então com novas Constituições e em que havia um passado recente de não respeito pelos direitos do homem. Surgiu depois o Conselho Constitucional francês, que era um órgão híbrido, mas que recentemente se tem aproximado do perfil dos tribunais constitucionais. Com a democratização, o modelo estendeu-se aos países do sul da Europa, como Portugal, Espanha e a Grécia. A queda do muro de Berlim deu origem à criação de tribunais em quase todos os países do leste europeu e depois nas democracias que resultaram do desaparecimento da URSS. Hoje em dia, na Europa há 47 tribunais constitucionais. O Reino Unido é uma exceção porque não tem Constituição escrita. A Holanda e a Noruega também não têm, mas, embora coincida com a monarquia, não é uma implicação necessária.
“A nossa fiscalização é sobretudo sucessiva, embora o controlo da constitucionalidade em Portugal seja mais percebido pelo público em relação aos casos de controlo preventivo, quando o Presidente da República coloca questões ao Tribunal antes de as leis entrarem em vigor. São momentos de alguma sensibilidade”
Advocatus | Se essa tese vingasse, seria então uma particularidade nacional? RMR | Seria um empobrecimento do sistema de controlo da constitucionalidade. Há uma especificidade desse controlo que justifica a existência do Tribunal Constitucional. Reconheço, naturalmente, o direito de pensar diferentemente, mas essa opinião não parece fundada nos factos e não corresponde à solução que o Direito comparado tem generalizado, sobretudo na Europa. E até em África: por exemplo, na República da África do Sul, onde o Tribunal Constitucional desempenha um papel relevante. Advocatus | O TC português nasceu num período conturbado. Quase 30 anos depois, diria que tem cumprido a sua missão? RMR | Nasceu com a primeira
revisão da Constituição, quando ainda estava presente a legitimidade do Conselho da Revolução, que era, aliás, o órgão que tinha competências em matéria de constitucionalidade. Quando foi extinto, parte das suas funções foi para o governo, nomeadamente em matéria de forças armadas, e outras para o Tribunal Constitucional. O tribunal surgiu nesse momento crítico, mas creio que se conseguiu impor porque não concretizou as más expectativas associadas à sua criação; pelo contrário, é um órgão independente. E, respondendo à sua pergunta, creio que tem desempenhado o papel que é de esperar de um TC, que é fazer juízo crítico das leis na sua conformidade com a Constituição. A nossa fiscalização é sobretudo sucessiva, embora o controlo da >>>
O agregador da advocacia
Abril de 2012
33
www.advocatus.pt
Entrevista
>>>
constitucionalidade em Portugal seja mais percebido pelo público em relação aos casos de controlo preventivo, quando o Presidente da República coloca questões ao tribunal antes de as leis entrarem em vigor. São momentos de alguma sensibilidade, mas desde que estou em funções diria que o tribunal foi chamado a exercer a fiscalização preventiva umas 15 vezes, tendo exercido a fiscalização sucessiva 52. Sem contar com as mais de nove centenas de decisões por ano que nos chegam em sede de recurso judicial com o fundamento de que a norma aplicada pelo juiz viola a Constituição.
“O tribunal teve, em momentos importantes, uma intervenção decisiva e creio que assim foi compreendida pela comunidade”
“O facto de o Presidente não estar envolvido tem a ver com o momento em que o Tribunal Constitucional foi instituído, um momento de acesa luta política entre a maioria e o Presidente da altura [Ramalho Eanes]. Em função disso, o Presidente não foi considerado como uma entidade que pudesse participar na nomeação dos juízes”
Advocatus | Em relação aos recursos, passa para a opinião pública a ideia de que há um uso excessivo dessa prerrogativa legal. Concorda? RMR | O sistema em Portugal permite que se chegue ao TC em sede de recurso, diferentemente do que acontece na maior parte dos países europeus, em que quem formula a questão ao tribunal são os juízes relativamente a normas que pretendem aplicar. São questões prévias, não subsequentes como em Portugal.
RAIO-X
Números de um mandato Rui Moura Ramos é juiz do Tribunal Constitucional por cooptação: iniciou funções a 11 de abril de 2003 e a 4 de abril de 2007 foi eleito presidente. Um mandato de cinco anos aqui traduzido em números: • 5560 acórdãos e decisões sumárias; • 15 casos de fiscalização preventiva; • 51 de fiscalização sucessiva; • 2071 casos de fiscalização concreta motivada por recursos;
34
Abril de 2012
• 439 casos de fiscalização concreta motivada por reclamações; • 111 acórdãos relativos a processos eleitorais; • 53 relativos a partidos e coligações; • 8 relativos a referendos; • 24 associados a declarações de património e rendimentos; • 5 relacionados com incompatibilidades; • 54 relativos ao financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais.
Desde 1911 que o nosso sistema tem um mecanismo, que é norte-americano e chegou a nós por influência do Direito brasileiro, em que o juiz tem acesso direto à Constituição, pelo que pode e deve recusar a aplicação de uma norma se entender que ela é contrária à Constituição. Isso não é possível na maior parte dos países europeus. Entre nós, o juiz aplica a norma ou decide não a aplicar e, depois, as partes podem recorrer. Se o juiz aplica a norma, pode haver recurso de uma das partes alegando que não é conforme à Constituição; se não aplica, o Ministério Público é obrigado a recorrer para o TC. É evidente que os casos de recurso particular podem estar imbuídos dessa suspeita de dilação, se bem que isso não tenha grandes efeitos porque o tribunal decide com alguma rapidez, podendo até haver lugar a decisão sumária do juiz relator. Essa ideia de dilação pode ser combatida, mas é evidente que o facto de ser o particular a recorrer para o TC introduz uma nota de subjetividade que não existe nos sistemas em que a questão é colocada pelo juiz. Entendeu-se, porém, que não se devia voltar atrás. Mas é verdade que os recursos de particulares têm um grande peso nas apreciações do tribunal – das 900, quase mil decisões que o TC proferiu o ano passado à volta de 700 foram de fiscalização concreta. Advocatus | E quanto aos pedidos de fiscalização preventiva? Em nove anos como juiz diria que o Presidente tem exercido essa faculdade com frequência? RMR | São pedidos que surgem quando há alguma conflitualidade em volta de uma lei. O TC compreende que o Presidente pretenda que se faça luz a esse propósito, até porque a nossa intervenção tem sanado o conflito. Concorde-se ou não, a decisão tem sido acatada. Claro que se essa intervenção O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
[do Presidente] for excessiva desequilibra o funcionamento do tribunal, pois as questões preventivas têm de ser decididas num prazo curto, de 25 dias, o que faz com que a atividade do tribunal gire nesse período à volta daquele caso, que é importante mas não o único. Deve, pois, ser exercida com alguma moderação, mas julgo que nos últimos anos isso tem-se verificado. Houve Presidentes que exerceram com mais intensidade do que outros, mas o padrão que conheço desde 2003 tem sido de moderação. Advocatus | As competências do TC vão muito para além do controlo da constitucionalidade… RMR | Exato, é preciso ter presente que o tribunal é ainda competente num conjunto de outras questões em que exerce funções, por assim dizer, de tribunal administrativo: em matéria eleitoral, de controlo de decisões internas de partidos políticos, nos processos de referendos, no financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, em relação à divulgação do património e rendimento dos titulares de cargos políticos. A fiscalização das campanhas eleitorais e das contas dos partidos, por exemplo, é uma atividade pesada. Este ano, já decidimos as eleições para o Parlamento Europeu, vamos agora apreciar as contas das legislativas de 2009, depois as das autárquicas… A questão do financiamento das campanhas é muito relevante porque a nossa lei entendeu – e creio que bem – que os partidos devem poder conquistar votos mas sem dinheiro privado. Portanto, o TC tem de fiscalizar as contas para que não haja suspeição de controlo do poder económico sobre o partido. Trata-se de saber se as contas revelam ou não a entrada de dinheiro indevido e se houve realização de despesas para além do que está previsto. Estamos a tentar aproO agregador da advocacia
“Entre nós, o juiz aplica a norma ou decide não a aplicar e, depois, as partes podem recorrer. Se o juiz aplica a norma, pode haver recurso de uma das partes alegando que não é conforme à Constituição; se não aplica, o Ministério Público é obrigado a recorrer para o TC”
“Se essa intervenção [do Presidente] for excessiva desequilibra o funcionamento do Tribunal, pois as questões preventivas têm de ser decididas num prazo curto, de 25 dias, o que faz com que a atividade do Tribunal gire nesse período à volta daquele caso”
ximar o tempo de decisão, mas consome tempo e recursos ao tribunal.
“Os casos de recurso particular podem estar imbuídos dessa suspeta de dilação, se bem que isso não tenha grandes efeitos porque o tribunal decide com alguma rapidez, podendo até haver lugar a decisão sumária do juiz relator”
Advocatus | O controlo da vida interna dos partidos é uma faceta menos conhecida. Em que se traduz? RMR | Não são casos muito frequentes, mas acontecem quando há decisões dos partidos que afetam os direitos de participação política dos militantes. Na maior parte das vezes, o tribunal nem tem conhecimento, pois há uma regra que determina que, antes de ir ao TC, o militante deve dirigir-se ao órgão de jurisdição do partido; essa condição muitas vezes não é respeitada, o que impede o tribunal de tomar conhecimento da questão. O caso mais conhecido foi uma decisão de 2003 relativa a militantes suspensos e depois afastados do PCP. O tribunal concluiu que essa decisão não violava os
princípios da Constituição nessa matéria – temos de ter presente que os partidos são organizações voluntárias, participa quem quer e de acordo com as regras que o partido estabelece. Advocatus | Ao fim de nove anos como juiz, diria que o TC tem contribuído para a paz jurídica no País? RMR | Penso que tem desempenhado um papel particularmente relevante. O tribunal teve, em momentos importantes, uma intervenção decisiva e creio que assim foi compreendida pela comunidade.
Abril de 2012
35
www.advocatus.pt
Carreira
Ana Duarte
Ter sucesso no mundo da advocacia é um repto cada vez mais difícil de cumprir, numa profissão em que a competitividade aumenta em relação inversa às oportunidades e ao número de vagas. Com o intuito de auxiliar os estudantes na construção do futuro, António Silva criou o UDireito
Advogar o futuro
“Advoga o teu futuro” - é este o conselho dado pela plataforma UDireito para obter sucesso no mundo do Direito. O projeto – uma página de internet que agrega informação relevante para os estudantes e interessados na área jurídica – surgiu há cerca de dois anos, como forma de colmatar uma lacuna: é que, até esse momento, não existia em Portugal um site exclusivamente dedicado aos estudantes de Direito. “Impunha36
Abril de 2012
-se deste modo criar uma plataforma para o estudante de Direito, de fácil acesso, com conteúdos atualizados dando resposta às necessidades atuais”, explica o mentor do projeto, António Silva, ele próprio estudante de Direito. Atualmente, com a ajuda de três editores e de alguns colaboradores esporádicos, dinamiza a página do UDireito na internet e nas redes sociais. O grosso do trabalho consiste em pesquisar e
analisar informações que possam ser pertinentes para os seguidores da página, e, posteriormente, divulgá-las. Para António Silva, esta página representa “um ativo valioso na inclusão de conteúdos formativos da atualidade jurídica, no panorama do ensino do Direito”. Os alunos podem encontrar informações sobre divulgação de eventos e formações, notícias sobre o ensino superior, além de que funciona ainda como plata-
forma de e-learning. Tendo como missão tornar-se uma mais-valia para quem aceda à página, os dinamizadores do UDireito apostam numa forte relação com a comunidade académica de Direito, núcleos de estudantes e com a ELSA (European Law Students Association). No entanto, uma das principais preocupações desta iniciativa é perceber quais as necessidades dos estudantes e tentar colmatá-las com informação pertinente. O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Atento às novas tecnologias, o projeto já se encontra presente nas redes sociais, nomeadamente no Facebook, Twitter e Google+, e está prevista a criação de um perfil no LinkedIn. As redes sociais têm, aliás, sido as grandes impulsionadoras da iniciativa, na medida em que possibilitam um contacto mais direto e imediato com os seguidores. Principalmente através do Facebook, o UDireito tem conseguido interagir com os internautas, promovendo concursos e desafios que ajudam a tornar esta rede social uma ferramenta importante para o crescimento do projeto. Mas o objetivo do UDireito não consiste somente em informar: propõe-se também estimular “a partilha de opiniões, contribuir para a discussão construtiva de conhecimentos e envolver a comunidade, no estímulo de trabalhar na área jurídica”, sustenta o mentor do projeto. A estratégia consistiu em traçar um perfil transversal pretendendo ajudar os estudantes de Direito nos “primeiros passos” – quando ingressam na universidade – mas também em formações adicionais como pós-graduações e mestrados, no ingresso na Ordem dos Advogados, além de outras áreas jurídicas do universo em que desenvolvem atividade. A adesão ao projeto tem sido grande e, de acordo com António Silva, é isso que os tem levado a “prosseguir com mais segurança”. Uma adesão que não se limita aos estudantes de Direito, tendo já alastrado à própria comunidade académica. Cada vez mais as universidades têm interesse em divulgar informações no UDireito. Além disso, diversos agentes da área jurídica têm mostrado vontade em estabelecer contactos, parcerias e até mesmo publicidade de conteúdos, procurando reforçar a sua posição junto deste projeto. Tendo em conta os bons resultados e ambicionando crescer ainda mais, os dinamizadores da iniciativa estão a proceder O agregador da advocacia
A grande ambição é “crescer enquanto referência”, tornando o projeto reconhecido como uma mais-valia para o percurso dos estudantes de Direito
ao registo da patente da marca UDireito no Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Com o intuito de salvaguardar os direitos da marca e consolidá-la. Ao fazer um balanço, António Silva não poderia estar mais satisfeito. Os resultados representam o “culminar de um esforço real”, refere. Mas a sua grande ambição é “crescer enquanto referência”, tornando o projeto reconhecido como uma mais-valia para o percurso dos estudantes de Direito. De acordo com a máxima do UDireito – “advoga o teu futuro” – o que pretendem é que os estudantes aprendam a adaptar-se, defender-se e a criar oportunidades. E, em simultâneo, incentivá-los a fundamentar a formação em bases sólidas com o intuito de melhorar o futuro profissional.
“Impunha-se deste modo criar uma plataforma para o estudante de Direito, de fácil acesso, com conteúdos atualizados dando resposta às necessidades atuais”
advocacia
O que preocupa os estudantes Com a criação desta plataforma, e sendo ele próprio um estudante de Direito, António Silva conhece em profundidade as questões que mais preocupam os alunos. Não tem dúvida de que o principal problema hoje em dia é conseguir entrar no mercado de trabalho. Inquietação acentuada por a maioria dos licenciados em Direito pretender seguir advocacia, apesar de, ao longo do curso, haver estudantes que aumentam o leque de opções. Isto resulta principalmente de experiências em estágios de verão e de Julgados de Paz que permitem alargar horizontes e identificar outros caminhos no âmbito do Direito. Cada vez mais, os alunos optam por alternativas, como ingressar no Centro de Estudos Judiciários, na Polícia Judiciária ou no Notariado. Quanto ao ensino do Direito em Portugal, crê que atingiu um bom nível e prova disso – diz - são as “posições de distinção” que as faculdades portuguesas conseguiram conquistar em rankings internacionais.
Faz, no entanto, um reparo: na sua perspetiva, as faculdades deveriam estar mais próximas do mercado de trabalho. E é nesse sentido que destaca a iniciativa de algumas universidades de promover feiras de emprego (jobshop). O fundador do UDireito aponta ainda o exame à Ordem dos Advogados como outro dos obstáculos ao ingresso na profissão, principalmente por poder representar um atentado à liberdade de acesso à profissão. Mas, as preocupações não ficam por aqui: os estágios não remunerados, a impossibilidade de concorrer ao apoio judiciário e a falta de participação efetiva em julgamentos também preocupam os alunos. É por isso que, num mercado cada vez mais exigente como o da advocacia, o UDireito se propõe alertar os estudantes para a necessidade de planearem o futuro e enriquecerem a formação.
Abril de 2012
37
www.advocatus.pt
Jet Advocatus
A nova lei da arbitragem esteve em debate numa conferência internacional organizada, em Lisboa, pela SRS Advogados. A nova lei portuguesa, as novas regras da arbitragem internacional, o exemplo espanhol e as providências cautelares foram alguns dos temas da iniciativa, realizada no dia 12 de março no auditório da sociedade. Soares Machado, advogado da SRS, falou sobre o novo regime de impugnação da decisão arbitral
SRS debate arbitragem
José Robin de Andrade, presidente da Associação Portuguesa de Arbitragem
Da esquerda para a direita: António Abrantes Geraldes, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, Soares Machado, sócio da SRS, e Gonzalo Stampa, advogado e professor da Universidad Complutense de Madrid
Armindo Ribeiro Mendes, advogado e professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
Da esquerda para a direita: Soares Machado, Armindo Ribeiro Mendes, advogado e professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Mariana França Gouveia, consultora da SRS Advogados, e José Robin de Andrade, presidente da Associação Portuguesa de Arbitragem 38
Abril de 2012
Maria Helena Brito, docente da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Brasil
A EIRELI confere ao investidor a oportunidade de explorar uma atividade económica salvaguardando os seus bens pessoais e de limitar a sua responsabilidade ao valor do capital da empresa, tornando mais claros os limites de uma eventual garantia oferecida a terceiros
Uma nova perspetiva para investidores A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) é o novo diploma legal que introduz no mundo negocial brasileiro a possibilidade de constituição de sociedade unipessoal. Antigamente os investidores tinham sempre que encontrar um sócio para poderem constituir uma sociedade. Com a entrada em vigor da EIRELI, a 9 de janeiro de 2012, este ponto deixou de ser obrigatório. Agora pode constituir-se uma empresa no Brasil apenas com um titular, sem que o seu património corra o risco de responder pelas obrigações empresariais. Este novo tipo societário, implementado através da Lei nº 12.441/2011, que veio adicionar o inciso VI do Art. 44, Art. 980-A e o parágrafo único do Art. 1.033 do C.C., visa combater a falta de formalidade e registo dos pequenos negócios. Para Portugal aplica-se o Estatuto da Igualdade de Direitos que autoriza a constituição de EIRELI por pessoa de nacionalidade portuguesa, desde que não se trate de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens (sendo esta apenas permitida a brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos, nos termos do Art. 222 da Constituição Brasileira). Se a pessoa em causa for residente ou domiciliada no estrangeiro, terá que constituir um procurador residente no Brasil, ou, para ser administrador da sua própria EIRELI, deve ter autorização de residência (visto permanente). A eventual possibilidade de constituição da EIRELI por pessoa coletiva foi afastada, de pleno direito, com a entrada em vigor da Instrução Normativa 117, de 22 de novembro de O agregador da advocacia
“Para Portugal aplica-se o Estatuto da Igualdade de Direitos que autoriza a constituição de EIRELI por pessoa de nacionalidade portuguesa, desde que não se trate de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens (sendo esta apenas permitida a brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos)”
2011, que aprovou o Manual de Atos de Registros de EIRELI. Este manual, ao interpretar a nova forma societária, restringiu o seu âmbito de aplicação às pessoas singulares (pessoa física). Para pessoas coletivas (pessoa jurídica) existem outros tipos empresariais, tais como a Sociedade Limitada (Ltda.) ou a Sociedade Anónima (S/A). Contrariamente à Limitada, para a qual não há qualquer exigência quanto ao capital inicial, no que toca à constituição da EIRELI, é necessário um montante equivalente a 100 vezes o maior salário mínimo vigente no Brasil, que corresponde, hoje em dia, a R$ 62.000,00 (cerca de EUR 27.000,00). Em comparação com o regime jurídico português, tanto para a Sociedade Unipessoal por Quotas
como para o EIRL, a exigência legal brasileira é muito maior. O critério utilizado para fixar o capital inicial tem sido debatido e é já objeto de uma ação de declaração de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal (Tribunal Constitucional do Brasil). Foi apresentado, ainda, um projeto de lei que propõe o corte do capital inicial para metade do legalmente fixado. Outra vantagem para o pequeno investidor consiste na hipótese de utilização do Programa Simples Nacional (desde que preenchidos os seus requisitos legais), um sistema integrado de pagamento de impostos e contribuições que se considera “equivalente” ao regime de tributação simplificado português, pois deixa de lado a maior parte da burocracia, facilitando o cálculo e pagamento de impostos. Embora as PME representem individualmente pequenos empreendedores, os seus números, em conjunto, causam um impacto importante na economia brasileira. O legislador decidiu, portanto, criar um instituto de menor complexidade que outros instrumentos societários já existentes, que trouxesse, ao mesmo tempo, vantagens para o empresário. Deste modo, a EIRELI confere ao investidor a oportunidade de explorar uma atividade económica salvaguardando os seus bens pessoais e de limitar a sua responsabilidade ao valor do capital da empresa, tornando mais claros os limites de uma eventual garantia oferecida a terceiros. Embora os detalhes deste diploma legal sejam ainda muito discutidos, espera-se que o novo tipo societário traga uma solução apelativa para o registo de PME no Brasil.
Maria Oliveira e Carmo jurista na Pellon & Associados Europe LLP, é licenciada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa. Colaborou com o escritório MCF Advogados entre 2009 e 2011. Frequentou o Mestrado Forense na UCP e aguarda a discussão da dissertação
Marina Souza advogada brasileira e portuguesa, é Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa e em Direito Europeu pela Université Paris 1 – Panthéon – Sorbonne. A sua atividade centra-se principalmente em M&A e outras operações societárias
Abril de 2012
39
www.advocatus.pt
Manuel Jardim é o novo diretor-geral da CMS Rui Pena & Arnaut. Esta contratação prende-se com as novas necessidades de gestão de negócio e de organização de uma sociedade com a dimensão e estrutura da CMS. Licenciado em Economia pela Universidade Católica Portuguesa, conta ainda com um MBA da Universidade de Cambridge, Reino Unido. Dário Moura Vicente é o novo consultor da Serra Lopes, Cortes Martins & Associados. O advogado é especialista em Arbitragem, Direito Civil e Propriedade Intelectual. Atualmente, é professor universitário na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, atividade que irá manter em simultâneo com a nova função na sociedade. Pedro Pinto, sócio fundador da pbbr, foi nomeado presidente da Câmara de Comércio Luso-Belga-Luxemburguesa (CCLBL). Gonçalo Bastos Lopes e Francisco Santos Costa são os novos sócios da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira. A equipa da sociedade em Portugal passa assim a ser constituída por 26 sócios. Marta Gaudêncio, associada da Pedro Raposo & Associados, é a responsável pelo programa Consultório Fiscal, que integra a grelha do Económico TV. Semanalmente, à terça-feira pela manhã, são analisados temas da atualidade fiscal com impacto na vida dos contribuintes. No programa os telespectadores podem colocar dúvidas sobre matérias fiscais, tema que preocupa não só as empresas, mas também os cidadãos particulares. 40
Abril de 2012
MLGTS a melhor classificada na Chambers A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS) foi a única sociedade portuguesa a obter a classificação 1st ranked em todas as áreas em análise nos Chambers Global Awards 2012. A Linklaters e a Vieira de Almeida & Associados (VdA) destacaram-se em quatro áreas, sendo band 1 em Banking & Finance, Capital Markets, Corporate/M&A e Projects. De destacar, ainda, a Uría Menéndez – Proença de Carvalho (UM-PC), que foi 1st ranked nas áreas Banking & Finance, Capital Markets, Dispute Resolution, e a PLMJ, nomeada em band 1 em Corporate/M&A e em Dispute Resolution. Os Chambers Global Awards 2012 têm como objetivo avaliar a advocacia de negócios em mais de 180 jurisdições nas áreas de Corporate/M&A, Dispute Resolution, Capital Markets, Banking & Finance. Este ano foi acrescentada a área de Projects.
Franco Caiado Guerreiro passa a Caiado Guerreiro A Franco Caiado Guerreiro decidiu encurtar o nome para Caiado Guerreiro. Esta ação tem como intuito a simplificação da designação da sociedade, devido à presença em diversos mercados. Além disso, a nova denominação coincide com o domínio do website e do endereço de e-mail. A mudança não representa qualquer alteração na equipa da Caiado Guerreiro. Atualmente, a sociedade atua em vários mercados, especialmente nos PALOP e Brasil, mas também representa clientes noutras jurisdições. Trabalha ainda em sectores tão diversos como energia, banca, mercado de capitais, seguros, tecnológicas, farmacêuticas e minerais, entre outras.
O SITE DO ADVOCATUS EM março* As mais lidas ILO elege sócio PLMJ como melhor advogado de Direito Público Faleceu Mário Melo Rocha Advogados de Contencioso juntam-se em iniciativa inédita Liderança e Advogados Espírito de missão
As mais partilhadas no Facebook Advogados chineses obrigados a prestar juramento ao partido ILO elege sócio PLMJ como melhor advogado de Direito Público Almedina organiza 2º Congresso “Direito das Sociedades” Era uma vez a estrada da Justiça A Concertação Social e as Alterações à Legislação Laboral *Dados referentes ao período de 29 de fevereiro a 28 de março
O agregador da advocacia
Assine o Advocatus e fique descansado Advogados de Contencioso juntam-se em iniciativa inédita
Farto de informação negativa que só lhe provoca mal-estar, ansiedade e stress? A melhor terapia é assinar o Advocatus. Porque, neste caso, a informação dá-lhe prazer. A assinatura do Advocatus inclui um programa gratuito de relaxamento e diversão na Odisseias. É uma oportunidade única para, gratuitamente, melhorar a saúde física e mental.
Veja em www.odisseias.com o programa que mais lhe agrada Os representantes de algumas das principais sociedades de advogados em Portugal decidiram unir-se para promoverem uma iniciativa pioneira – a criação do Círculo de Advogados de Contencioso em Portugal. Este organismo tem como intuito discutir temas de interesse na área de prática do Contencioso Civil e Comercial. Numa primeira fase, a prioridade do Círculo será refletir sobre a reforma do Processo Civil e da Organização dos Tribunais. O grupo pretende debater temas relacionados com a Justiça e apresentar ao Governo projetos de reforma. Fazem parte deste organismo personalidades conhecidas do mundo da advocacia como Soares Machado (SRS Advogados), António Pinto Leite (MLGTS), Tito Arantes Fontes (Uría Menéndez - Proença de Carvalho), Nuno Líbano Monteiro (PLMJ), Carlos Cruz (CCA Advogados), Frederico Gonçalves Pereira (VdA), Miguel Esperança Pina (Cuatrecasas, Gonçalves Pereira), António Andresen Guimarães (HAAG), Miguel Pinto Cardoso (Linklaters), João Nuno Azevedo Neves (ABBC), Daniel Proença de Carvalho (Uría Menéndez – Proença de Carvalho), António Serra Lopes (Serra Lopes, Cortes Martins & Associados), José Manuel Galvão Teles (MLGTS), Fernando Ferreira Pinto (Sérvulo & Associados), Pedro Faria (PLMJ), Maria José Tavares (SRS Advogados), entre outros. A escritura de constituição teve lugar a 21 de março no Grémio Literário de Lisboa.
Be Cool Baptismo de mergulho, Baptismo de Moto 4, Bridge Jumping, Canoagem, Baptismo de Windsurf, Back Massage, Bob cat Experience, Segway Discover ou Speed Boat Be Happy Massagem Sweet Escape, Spa Experience, Esfoliação de Chocolate, Aula de Maquilhagem, Aula particular de esgrima, Cook Experience, Gocar City Break ou Baptismo de Moto 4
Para receber, na volta do correio, o voucher do programa escolhido basta assinar o Advocatus – o agregador dos Advogados. Com o Advocatus fica informado e… fica descansado. Não é todos os dias que tem uma oferta destas.
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Toda a informação por 180 €
Envie para: Advocatus • Av. Infante D. Henrique, nº 333 H, 44 • 1800-282 Lisboa
SIM, desejo assinar o jornal Advocatus com o custo total de 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias).
Formas de pagamento:
Transferência bancária para o NIB 0010 0000 43265960001 81. Envio do comprovativo para o fax 210 435 935 ou através do email assinaturas@briefing.pt Cheque à ordem de Enzima Amarela Edições Lda. • Av. Infante D. Henrique, nº 333 H, 44 • 1800-282 Lisboa O voucher Odisseias será entregue após boa cobrança. Be Cool
Be Happy Assinatura
www.advocatus.pt
Office with a view
Ramon de Melo
Como um quadro
Em dias de muito trabalho, sentado à secretária e rodeado de processos difíceis, César Pratas gosta de olhar pela janela do escritório e apreciar a natureza do Parque Eduardo VII, em Lisboa. Para o senior partner da César Pratas & Associados, o escritório tem uma “linda vista” para uma das áreas laterais do parque, permitindo-lhe admirar as “árvores, as flores e os passeantes”. Em dias ventosos é inclusive possível ouvir a agitação das árvores e vê-las vergarem-se perante essa força. O advogado gosta de contemplar a vista do escritório como se tratasse de um quadro, fá-lo sentir-se “perto da natureza e longe das florestas de betão”. Acredita que uma boa vista, num trabalho exigente e stressante como a advocacia, tem a capacidade de conferir calma e, em simultâneo, dar aso à reflexão e ao aprofundamento de questões. Mas, apesar de apreciar a vista que tem do Parque Eduardo VII, aponta-lhe pontos negativos como o ruído do trânsito e dos aviões; confessa embora que “é o preço de se trabalhar em Lisboa perto do Palácio da Justiça”. Para o advogado, numa vista ideal estaria presente o mar, preferencialmente o Cabo Espichel, local onde se “espraia o olhar pelo oceano ou se veem as ondas a desfazer-se contra as rochas”. Este destino agrada-lhe principalmente pela imponência que transmite, além de ser um local místico, cheio de lendas e tragédias “bem reais como os naufrágios” a que um dia teve o infortúnio de assistir. 42
Abril de 2012
César Pratas senior partner da César Pratas & Associados. Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra e pós-graduado em Direito Penal Económico e Europeu pela mesma faculdade, é ainda diplomado em estudos comerciais
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Hobby
Ramon de Melo
Miguel Quintans
O boxe é o hobby escolhido por Miguel Quintans, consultor da CMS Rui Pena & Arnaut (CMS RPA), para descarregar o stress do trabalho. Pratica-o há cerca de cinco meses e, embora seja um hobby recente, dedica-se-lhe com todo o afinco. Duas a três vezes por semana, vai até ao ginásio no Santana Futebol Clube, em Campolide (Lisboa), onde treina e tenta aliviar a tensão acumulada. A apresentação a este desporto foi feita por um amigo. Miguel sempre se mostrou bastante hesitante relativamente a esta prática desportiva, mas, depois de experimentar, ficou convencido. Para Miguel, uma das mais-valias do boxe é ser um desporto bastante completo, “tanto do ponto de vista físico como mental”. Esta é uma atividade que o obriga a “trabalhar nos limites”, um pouco à semelhança do que o faz no dia-a-dia no trabalho. Mas as semelhanças não ficam por aqui: assim como no exercício da advocacia, também no boxe é necessário muito “rigor e concentração, respeitando sempre o adversário”. Este foi um desporto que o cativou assim que o experimentou, mas não tem o exclusivo entre os seus hobbies: sempre que tem tempo e companhia, o advogado aproveita para ir até à praia e fazer bodyboard.
O agregador da advocacia
Miguel Quintans consultor técnico da CMS Rui Pena & Arnaut, é licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e tem uma pós-graduação em Direito da Propriedade Industrial, da Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa e da Associação Portuguesa de Direito Intelectual (APDI)
Abril de 2012
43
www.advocatus.pt
Restaurante
Manuel Falcão diretor-geral da Nova Expressão
Tapear, provar, conversar, fadistar
Tosca - Taberna S. Paulo
Povo
Praça de S. Paulo, 21 tel. 218 034 563
Começo por explicar que isto hoje é mais virado para as visitas noturnas do que para almoços de trabalho – embora eles também possam ser possíveis na zona do Cais do Sodré, como veremos. A Praça de S. Paulo é um daqueles bons bocados de Lisboa. De matriz pombalina, espaço amplo, calçada portuguesa, bancos de jardim, uma igreja ao fundo, prédios de habitação de um lado e um conjunto de edifícios que, dizem, daqui a algum tempo vai partilhar um hotel de charme com apartamentos, depois de devidamente recuperado. Frente à igreja, do outro lado do largo, fica a Tosca - Taberna S. Paulo, no mesmo sítio onde anteriormente estava a leitaria Estrela da Manhã. A recuperação do espaço privilegiou os materiais originais e a simplicidade e o conceito é mesmo recriar o espírito das antigas tabernas, um local de convívio em volta de um copo de vinho e de petiscos. Para animar as conversas, atrás do balcão, há um mural a toda a largura da parede com uma ilustração alegórica à transformação da água em vinho. Para despachar o tema dos almoços, a casa dispõe diariamente de três sugestões mais ou menos tradicionais mas a bom preço, incluindo ainda uma sopa para quem estiver para aí virado.
A arte do petisco Ao fim do dia começam as coisas sérias – provas de vinhos ou então 44
Abril de 2012
simples tertúlias em volta de petiscos. À noite o petisco reina – desde variedades de bom presunto a enchidos diversos, passando por queijos de várias estirpes (destaco o de Serpa), ou outras propostas mais substanciais como pataniscas de bacalhau ou uns belos cogumelos salteados. Quem quiser tem filetes de anchova bem apetitosos. O couvert é composto por pão e uma seleção de azeites – muito bons os azeites, o pão podia e devia ser melhor. A carta de vinhos é razoável e a bons preços, a seleção de vinhos e espumantes a copo é boa. A ideia pode ser mesmo pedir presunto, queijo e uns copos e, à medida que a conversa vai avançando, reforçar os pedidos com coisas mais substanciais – lá estão as tais pataniscas, uma alheira, ovos verdes, uma salada de polvo ou outra de orelha. Por 20 euros por pessoa petiscam e bebem
Rua Nova do Carvalho, 32-36 tel. 213 473 403
bem. A Tosca é uma petiscaria, uma casa onde a informalidade anda de mãos dadas com um serviço atento. As mesas e cadeiras são confortáveis e acomodam conversas longas, antes de voltar à rua. Quando a Tosca abriu ainda o Cais do Sodré não era aquilo em que se transformou, desde as obras na Rua Nova do Carvalho. Portanto, hoje em dia, vale a pena sair da Tosca e andar umas dezenas de metros até à rua-que-tem-o-alcatrão-pintado-mas-agora-já-um-bocado-descorado.
Depois do jantar Não vou falar da Pensão Amor, nem do velho Jamaica, nem do Music Box, menos ainda das conservas do Sol e Pesca ou sequer do Bar da Velha Senhora. A minha atenção vai toda para o Povo, uma distinta casa onde se ensaia cantar o fado e, às vezes, se consegue. À primei-
ra vista parece um café dos antigos, um bar a todo o comprimento, sala com mesas e cadeiras, um pequeno espaço a servir de palco ao fundo. A ideia do Povo é ter um fadista-revelação como residente todos os meses. No fim do processo cada um grava um disco e pelo meio vai sugerindo convidados que por lá aparecem. Aqui também se servem petiscos (moelas, pica-pau, pimentos padron, morcela assada…), há vinho a copo, cerveja e bebidas brancas das melhores origens nacionais e estrangeiras. O ambiente é mesmo descontraído, fala-se de uma mesa para a outra, faz-se silêncio respeitoso quando se canta e não há purismos desnecessários. É uma boa alternativa aos outros bares da zona, para quem ainda quer prolongar um bocado a conversa pela noite fora. Texto escrito segundo as regras anteriores ao acordo ortográfico
BANDA SONORA
Home Again - Michael Kiwanuka O nome não é o mais fácil de memorizar, mas lembrem-se dele porque suspeito que vão ouvir este rapaz várias vezes nos próximos tempos. Nascido e criado em Londres, filho de pais ugandeses, Michael Kiwanuka tem um dom natural para construir canções que combinam, de forma quase perfeita a pop e a soul music, com fortes influências do jazz. Aos 24 anos Kiwanuka fez um dos grandes álbuns de estreia dos últimos tempos e é difícil resistir a canções como
“Tell Me A Tale” ou “I’m Getting Ready”. A seu favor está o facto de utilizar a voz sem querer imitar os grandes cantores da soul – preferindo uma interpretação que em alguns momentos faz lembrar nomes tão diferentes como Tim Buckley ou Terry Callier. Apesar da sua curta carreira, Michael foi o escolhido pelos ouvintes da BBC, que o elegeram BBC Sound of 2012.
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Montra
Irresistível e eletrizante É como a Givenchy quer que a mulher fique depois de usar a nova fragância Very Irrésistible Electric Rose, que reúne a arrogância e rebeldia do rock n’roll e a sensibilidade da perfumaria protagonizada pela modelo e cantora Liv Tyler. Alegremente ácida, numa tonalidade do mirtilo, é ritmada pela vivacidade de limão fresco, com um acorde de manjericão e verbena que promete ativar os sentidos masculinos. Apresentada num frasco de traços fortes e “requintada transparência”, ajusta-se à mulher com uma rock atittude.
A decisão certa, a horas “I’m not afraid of the consequences of my decisions” é a frase gravada no fundo dos novos relógios da deLaCour. A frase é da autoria do “melhor treinador do mundo”, José Mourinho, e inspira a nova coleção da marca: são 88 peças em ouro e carbono e uma série limitada de 333 peças em titânio e carbono num conjunto de criações alternativas e exclusivas para “homens com confiança”. De nome Coleção Mourinho City Ego, revela linhas de prestígio, sem dar olho às tendências das runways da moda, pronta a dar relevância aos pulsos masculinos.
Versatilidade masculina à mão Inspirando-se no universo masculino, a Longchamp deu uso à versatilidade, sem descurar a elegância e requinte, e desenhou uma nova linha de acessórios para marcar esta primavera. Small bags predominam nesta criação em três linhas - Baxi, Boxford + e Parisis H. Com um leque de cores neutras e com a mestria artesã e design exuberante, apresentam-se como os novos companheiros dos homens para qualquer lugar.
Glamour nos pés Sandálias com detalhes são a proposta da Sacoor Brothers para esta primavera/verão. Abertas e de salto raso, foram criadas para oferecer um calçado confortável e sofisticado para conjugar no dia-a-dia com peças do vestuário feminino. Em bege e dourado, estas sandálias vão realçar sobre as cores mais in desta estação floral.
Uma solução à medida Porque uma empresa para começar precisa de tecnologia, a Vodafone vestiu-se de fato e gravata e criou o Pack Start-up. Promete ser a solução completa, flexível e pronta a usar, incluindo todos os serviços e equipamentos necessários para dar início ao negócio com o pé direito. Com voz móvel, banda larga móvel, voz fixa, internet fixa e telemóveis, propõe-se ser um serviço líder nas novas empresas, e ao melhor preço. O agregador da advocacia
Abril de 2012
45
www.advocatus.pt
Os filmes de ...
Grandes êxitos do cinema como Pulp Fiction, Cinema Paraíso ou Era Uma Vez na América são as escolhas cinematográficas do sócio da PLEN Tiago Ferreira de Lemos
Tiago Ferreira de Lemos
01
sócio da PLEN
46
Abril de 2012
Título: Pulp Fiction, 1994 Realizador: Quentin Tarantino Protagonistas: John Travolta, Samuel L. Jackson, Uma Thurman História: Triller policial composto por vários episódios, em que a trama é diferente mas com um fio condutor. Assassinos profissionais, gangsters, raparigas um pouco loucas, pugilistas e assaltantes juntamse num cenário moderno misturado com traços dos anos 30 e 40.
02
Título: Era Uma Vez na América (Once upon a time in America), 1984 Realizador: Sergio Leone Protagonistas: Elizabeth McGovern, James Woods, Robert de Niro História: Tendo como pano de fundo os 50 anos de história do submundo americano, retrata a amizade de um grupo de jovens de Lower East Side, Nova Iorque, que começam por cometer pequenos crimes mas acabam por se tornar verdadeiros mafiosos…
03
Título: Cinema Paraíso (Cinema Paradiso), 1988 Realizador: Giuseppe Tornatore Protagonistas: Antonella Attili, Enzo Cannavale, Isa Danieli, Leo Gullotta História: O personagem principal é um cineasta bem-sucedido que, ao saber da morte do amigo Alfredo, regressa à cidade natal, 30 anos depois. É uma verdadeira viagem ao passado, para recordar os dias em que era apenas uma criança – Totó – e fugia sempre que podia para o Cinema Paraíso.
04
Título: O Carteiro de Pablo Neruda (Il Postino), 1994 Realizador: Michael Radford Protagonistas: Linda Moretti, Maria Grazia Cucinotta, Massimo Troisi, Philippe Noiret História: Baseado no livro de Antonio Skármeta, relata a amizade entre o poeta Pablo Neruda e o seu carteiro, quase analfabeto. O jovem vai aprendendo que basta uma paisagem para dar largas à imaginação e escrever poesia. E o poeta vai descobrindo a grandeza dos homens que, apesar das origens simples, se entregam à causa da revolução.
05
Título: A Força do Poder (Scarface), 1983 Realizador: Brian de Palma Protagonistas: Al Pacino, Steven Bauer, Michelle Pfeiffer História: Remake do filme Scarface, de Howard Hawks, narra a história de um imigrante cubano nos EUA que começa por fazer pequenos trabalhos para um conhecido traficante, mas que em pouco tempo cria o seu próprio império. Contudo, a paixão pela mulher proibida e o vício da cocaína acabam por decretar a sua ruína. O agregador da advocacia