www.advocatus.pt
COMUNICAR DIREITO
Diretor: João Teives | Diretora Editorial: Fátima de sousa | Mensal | Ano VI I | N.º 85 | ABRIL de 2017 | 15 euros
08
PAULO MOURA MARQUES O reforço da especialização
A AAMM está apostada em reforçar a especialização, investindo em áreas como private clients e, sobretudo, wealth management. A ambição, essa, é crescer 20% em 2017.
14
CUSTAS JUDICIAIS REDUZIR É A SOLUÇÃO?
22 NUNO AZEVEDO NEVES, SÓCIO DA DLA PIPER ABBC
“Queremos ser um verdadeiro player no mercado ibérico”
É considerado o sistema perfeito para o Estado, mas imperfeito para os cidadãos e empresas. O bastonário assumiu a sua redução como prioridade. Mas bastará? A Advocatus ouviu advogados, juízes e procuradores.
Tudo em 2017 por uma causa justa: Você. LICENCIATURAS
FORMAÇÕES APLICADAS
Direito
Direito do Trabalho
Relações Internacionais
Workshop de Documentoscopia e Grafotecnia
Solicitadoria
MESTRADOS Ciência Jurídica Forense Direito Europeu e Comparado Direito . Especialização em Ciências JurídicoAdministrativas e Tributárias . Especialização em Ciências JurídicoEmpresariais . Especialização em Ciências JurídicoPolíticas . Especialização em Ciências JurídicoProcessuais Globalização, Economia e Direito
CURSOS DE PREPARAÇÃO Admissão ao Centro de Estudos Judiciários Exame de Admissão à Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução
CURSOS EM REGIME PÓS-LABORAL Mais informações em:
www.upt.pt
Siga-nos em:
Do conhecimento à prática.
Principais parcerias:
PUBLISHER / proprietário
Newsengage - Media, Conteúdos e Comunidades, S.A. Edifício Lisboa Oriente Av. Infante D. Henrique, 333 H | 37 1800-282 Lisboa T. 218 504 060 | F. 210 435 935 NIPC 506871711 Administrador Único João Paixão Detentor do Capital Social Mood Marketing - SGPS, S.A. (100%) Diretora-geral Sandra Silva T. 967 088 124 sandrasilva@newsengage.pt
06
cartão do cidadão
FRANCISCO PEÑA É há um ano sócio residente da Gómez-Acebo & Pombo em Portugal, mas já tem lugares preferidos, Guimarães é um deles. E em Lisboa inclina-se pela zona do miradouro de S. Pedro de Alcântara.
Diretor João Teives joao.teives-14761@advogados.oa.pt
12
30
UMA DECISÃO DO TJUE
SEM CONDUTOR E SEM LEI?
Os advogados da PLMJ Daniel Reis e Lourenço Noronha dos Santos analisam uma decisão recente do TJUE relativamente ao sistema de wi-fi e à propriedade intelectual.
Que desafios regulamentares coloca a existência de veículos de condução autónoma? É a esta questão que respondem advogados de cinco sociedades, chamando nomeadamente a atenção para a responsabilidade civil.
OPINIÃO DiretorA EDITORIAL Fátima de Sousa fs@briefing.pt Equipa EDITORIAL Mafalda Carvalho Sara Batista Sofia Dutra gestor comercial João Pereira T. 960 427 959 joaopereira@newsengage.pt Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições) assinaturas@briefing.pt
Tiragem média mensal 2.500 ex. Depósito legal 21725 N.º registo ERC 125859
Impressão TYPIA - Grupo Monterreina Área Empresarial Andalucia 28320 Pinto Madrid - España Estatuto Editorial disponível em www.advocatus.pt
INOVAÇÃO
42
A MAIS LIDA ONLINE
CUATRECASAS FATURA 270 MILHÕES DE EUROS A Cuatrecasas registou, em 2016, um aumento de 1,5% na faturação global, que atingiu os 270 milhões de euros. Em Portugal, a faturação líquida cresceu 3,2%. Diz a firma, de que Maria João Ricou é a managing partner em Portugal, que se manteve assim o percurso de sete anos consecutivos de crescimento económico.
3 advocatus abril 2017
Editorial
advocatus.pt
Custas e Proteção jurídica – Dualidade sem equilíbrio João Teives diretor
O nosso texto fundamental não assegura uma justiça gratuita ou tendencialmente gratuita, como o faz para o ensino e para a saúde. Não obstante, não deixa de ter como pilar base o acesso universal (“A todos é assegurado o acesso aos direitos e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”). Sendo universal o acesso, já a gratuitidade ou menor onerosidade só será assegurada para os mais carenciados (“não podendo ser denegada por insuficiência de meios económicos” na formulação negativa da segunda parte do artigo 20.º, n.º1, da C.R.P.). É evidente que a opção pela gratuitidade não está vedada constitucionalmente. Apenas não é imposta. Efetivamente, sempre seria possível, em abstrato, construir um sistema gratuito ou tendencialmente gratuito, com base nos impostos. Não é essa a nossa tradição jurídica, tendo-se optado pelo sistema de taxas. Ora, as taxas, como é consabido, envolvem, sempre, um juízo de adequação e proporcionalidade face ao serviço prestado. Só em casos raros, como referia o Prof. Teixeira Ribeiro, é que “as taxas excedem o custo de produção”. Sendo certo, ainda, que, na esmagadora maioria dos casos, as taxas são fixadas em montante inferior ao custo do serviço prestado. Muitas vezes, inclusive, de forma muito inferior ao custo, como se passa nos hospitais com as taxas moderadoras. Nestes casos a sua função primordial será a de moderar o consumo excessivo. Para cumprir o comando constitucional, a opção do legislador tem sido, não obstante as alterações ao regime de custas, reiteradamente edificado num sistema dual. Por um lado, fixa-se o regime das
O que tem de existir são, por um lado, mais válvulas de escape no sistema e, por outro, talvez mais escalões em determinado tipo de procedimentos. Um dos bons exemplos de uma válvula de escape é o das causas de valor superior a 275.000€ em que se permite ao juiz dispensar as partes do pagamento final suplementar. Em casos de manifesta ou de reconhecida maior simplicidade, poderia o Juiz, de forma fundamentada, fixar o valor da causa, só para efeitos de custas, num valor inferior. “O nosso texto fundamental não assegura uma justiça gratuita ou tendencialmente gratuita, como o faz para o ensino e para a saúde. Não obstante, não deixa de ter como pilar base o acesso universal (“A todos é assegurado o acesso aos direitos e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”). Sendo universal o acesso, já a gratuitidade ou menor onerosidade, só será assegurada para os mais carenciados”
custas de forma genérica e universal, regulando-se a sua incidência e as isenções, objetivas e subjetivas, sempre de forma genérica, não atendo aos meios económicos das partes. A exceção a esta regra é a norma que prevê a isenção dos trabalhadores ou familiares em matéria de direito do trabalho, quando representados pelo Ministério Público ou pelos
serviços gratuitos do sindicato, desde que aquele não aufira anualmente mais de 200 UC’s. Por outro lado, estabelece-se, autonomamente, um regime de proteção jurídica que deverá assegurar a segunda parte do comando constitucional. Esta proteção era outrora definida pelos tribunais, tendo passado a decisão da verificação das condições de elegibilidade do apoio a ser decididas, prima facie, pelos serviços da segurança social. Dentro deste edifício dual, em que tem de existir um equilíbrio entre as custas genericamente fixados e um regime de que possibilita a dispensa total ou parcial do seu pagamento e da oportunidade do mesmo, não é forçoso, para cumprir o comando constitucional, reduzir as custas, desde que os limites para a obtenção de proteção jurídica, com dispensa total ou parcial, sejam aumentados, para quem mais precisa. Isto significa que a opção pode ser a de redução genérica para todos, necessitem ou não da redução, ou o aumento dos limites da proteção. Um dos problemas é precisamente esse. Aumentaram-se as taxas e simultaneamente diminui-se a limites exíguos de pobreza a proteção. Com esta dupla opção, é certo que tomada, certamente, pela pressão financeira existente sobre o país, o equilíbrio pressuposto pela opção dual perdeu-se, podendo-se afirmar, em muitas situações, como o afirmou o Bastonário Guilherme Figueiredo, que as custas podem ser impeditivas para o acesso da classe média à Justiça. Outro dos problemas é a pouca maleabilidade do sistema atual. Note-se que o sistema da progressividade nas custas sempre foi tradicional entre nós. Veja-se, entre muitos outros
4 advocatus abril 2017
possíveis exemplos, o decreto 8436, publicado na I Série do DR de 21-101922, que já estabelecia o sistema progressivo. Pode-se defender que a complexidade de um processo não advém do seu valor. É certo. Posso ter um processo de um milhão muito simples e um processo de 50.000€ de grande complexidade. Mas mesmo reconhecendo essa realidade, o sistema progressivo é talvez o mais justo e o mais fácil de operacionalizar. Por outro lado, sempre se pode referir que, em rigor, num processo de um milhão de euros, são direitos nesse valor que estão em causa; sendo a utilidade económica dos mesmos superior é natural que o valor das custas do tribunal possa, também ele, ser superior. O que tem de existir são, por um lado, mais válvulas de escape no sistema e, por outro, talvez mais escalões em determinado tipo de procedimentos. Um dos bons exemplos de uma válvula de escape é o das causas de valor superior a 275.000€ em que se permite ao juiz dispensar as partes do pagamento final suplementar. Em casos de manifesta ou de reconhecida maior simplicidade, poderia o juiz, de forma fundamentada, fixar o valor da causa, só para efeitos de custas, num valor inferior. Com esta exceção, a verdade é que a maior parte das situações de maleabilidade visam onerar ainda mais o processo. Para debater este tema, a Advocatus convidou os colegas Adriano Squilacce, Duarte Gorjão Henriques, Luís Couto e Pedro Rica Lopes e ainda o Dr. António Ventinhas, presidente do SMMP, e o Dr. João Paulo Vasconcelos Raposo, secretário-geral da ASJP. A todos muito obrigado pela prestimosa colaboração.
When you have to be right
Com JusNet
✓ Toda a informação jurídica que necessita
✓ Com atualização diária ✓ 3.900.000 links entre todo o tipo de documentos ✓ Legislação desde 1886 ✓ Jurisprudência desde 1932 ✓ Formulários e artigos jurídicos de autores prestigiados
Mais EFICIÊNCIA Menos CUSTOS • Custo-benefício: Desde 0,25 € é quanto custa, no mínimo, a sua segurança, por dia.
• Tarefas desempenhadas em menos tempo.
Mais EFICÁCIA Mais RESULTADOS
• Resolução de processos e consultas com soluções certas e seguras.
• Utilização produtiva dos recursos: Toda a
informação atualizada numa única plataforma.
Mais informação: pt-clientes@wolterskluwer.com • Tel: 308 804 615
Mais IMPACTO Maior SATISFAÇÃO para os seus clientes.
www.jusnet.pt
Cartão do Cidadão
Francisco Peña Há um ano que é sócio residente da Gómez-Acebo & Pombo (GA&P) em Portugal, mas, a par de muitas opções do país de origem, já incorpora nas suas escolhas algumas do país que o acolhe. É o caso do Bacalhau à Brás. Francisco Peña identifica ainda Guimarães como a cidade cuja atmosfera melhor define Portugal e o melhor destino para uma escapadinha em terras lusas. Mas elege a viagem, em família, à Terra Santa como a preferida.
Viagem mais marcante A viagem que fiz em família à Terra Santa, onde visitei Jerusalém e outros locais com repercussão bíblica, como Jericó e o mar de Galileia. A viagem tem uma enorme força espiritual e os locais evocam imagens da infância e a realização de sonhos. Destino para escapadinha em Portugal Guimarães. A cidade e os arredores são muito atrativos. A arquitetura e o urbanismo são tipicamente portugueses e a atmosfera é a que, para mim, melhor define Portugal.
Recanto em Lisboa A Igreja de São Roque e o adjacente Miradouro de São Pedro de Alcântara. Esta igreja é um mini universo do momento de maior riqueza de Portugal. Tem detalhes de enorme beleza. As vistas do miradouro são únicas e permitem-nos apreciar a cidade de Lisboa. Carimbo que falta no passaporte Muitos. Mas a Patagónia chilena é um destino que tenho pendente e um desejo que quero cumprir. Trata-se de desfrutar da natureza mais brutal e esplendorosa e a mais bem conservada do planeta. 6 advocatus abril 2017
Hobbies Golf, pesca do salmão (com a técnica de pesca com mosca seca), música clássica e leitura.
advocatus.pt Livro “Uma Conspiração de Estúpidos” (A Confederacy of Dunces), de John Kennedy Toole. Ignatius J. Reilly é o personagem inadaptado que melhor retrata as misérias do ser humano. Restaurante O Arbidel. É um restaurante na minha terra natal, Ribadesella, Astúrias (Espanha), com uma cozinha muito bem elaborada e sofisticada. Também destaco o 100 Maneiras, em Lisboa. Prato Feijão com amêijoas e arroz com leite. Duas receitas típicas do norte de Espanha. Também gosto muito da cozinha portuguesa, em particular de bacalhau cozinhado, mas especialmente de Bacalhau à Brás. Bebida Um bom vinho tinto da Ribeira do Douro ou de Toro. Por exemplo, o Pintia e o Malleolus. Série Nenhuma. Não gosto de histórias intermináveis.
Filme “Bienvenido, Mister Marshall”, de Luis García Berlanga. É uma sátira da Espanha dos anos 50, em forma de comédia com um sem fim de críticas mordazes. Banda sonora da vida “Cinema Paradiso”, de Ennio Morricone. Um advogado de referência Fernando Pombo. Fundador da GA&P, infelizmente faleceu muito jovem. Inspirava total confiança e obtinha resultados muito positivos para os clientes em assuntos complexos. Um exemplo de vida O de qualquer pessoa que dedica toda a sua vida a ajudar os outros, seja em ONG, seja através de instituições religiosas. 7 advocatus abril 2017
O que lhe falta fazer Muitas coisas, mas, sobretudo, quero ter tempo para os meus hobbies e para a minha família. É advogado porque… Sempre me interessei pelo Direito e pela solução dos conflitos sociais. Esta profissão permite-me ser criativo, obriga-me a estar permanentemente atualizado e em contacto com as pessoas. Se não fosse advogado seria… Médico ou historiador.
Entrevista
Paulo Moura Marques, Managing partner da AAMM - Abecasis, Moura Marques, Alves Pereira e Associados
A especialização é que dita A AAMM está a apostar em private clients e wealth management, áreas que Paulo Moura Marques encara como de futuro. Sinal dessa aposta é a integração de Rui Alves Pereira e equipa. A especialização vai continuar a ser o foco da sociedade, que deverá registar este ano um aumento de cerca de 20% na faturação. A médio prazo, está previsto o crescimento orgânico e o “lateral hiring” de especialistas com as suas equipas, mas o managing partner não exclui “nenhuma possibilidade” de desenvolvimento. 8 advocatus abril 2017
advocatus.pt Advocatus | A sociedade viveu nos últimos tempos alterações com a integração de Rui Alves Pereira e equipa e a saída de Filipe Azoia e a consequente alteração do nome. O que motivou estas mudanças? Paulo Moura Marques | A integração do Dr. Rui Alves Pereira é uma aposta numa área que acreditamos ser de futuro a nível nacional. Portugal tem poucas equipas especializadas exclusivamente em private clients e wealth management. Tenho o gosto de dizer que o advogado mais destacado em Portugal nesta área é claramente o Dr. Rui Alves Pereira. Ele a sua equipa são muito conhecidos, têm um nome seguro no mercado, trilharam muitos caminhos que outros advogados estão a seguir noutras sociedades. Mais do que private clients, consideramos que a área de wealth management vai ser de futuro, ou seja, a gestão global de uma série de assuntos que radicam no núcleo familiar e em todas as relações que daí se desenvolvem, como questões patrimoniais e sucessórias, a projeção da fortuna além-fronteiras. É uma área que se enquadra muito bem com a nossa prática. Queremos desenvolver o “international business”. Temos mercado e pessoas para isso. Advocatus | Esta aposta decorreu das necessidades dos vossos clientes ou o objetivo é captar novos clientes? PMM | As duas coisas. Já sentíamos esta necessidade para os clientes que tínhamos. Não vou esconder que há outros clientes que já o eram e, entretanto, vieram reforçar a aposta no escritório com novas valências. E depois há muitos clientes novos, inclusivamente que não são nacionais, são novos clientes vindos de terceiras jurisdições para atuar em terceiras jurisdições. É utilizar Lisboa como ponte e advogados como ponte para coordenarem uma série de operações de que têm necessidade. Advocatus | Pretendem aumentar mais a equipa para esta área de negócio internacional? PMM | Acabámos de expandir. Não ponho de parte que, a breve trecho, haja novos reforços na equipa, mas não quero levantar o véu. Aliás, a equipa tem crescido constantemente. Advocatus | E reforçar outras áreas? PMM | Sim. Já temos várias “debaixo de olho”, mas não vou adian-
“Estou convencido que a realidade da economia, que se reflete no exercício da profissão de advogado, faz-se muito numa vertente ibérica. Isto não tem nada a ver com menor patriotismo, mas com uma perceção da realidade económica”
tar mais. Nestas coisas, o segredo é a alma do negócio. Advocatus | É a evolução natural da sociedade aos cinco anos? PMM | Esta expansão satisfaz as nossas melhores expetativas em termos de crescimento. Corresponde ao padrão de crescimento que queríamos ter nesta altura. Aliás, diria que está um bocadinho acima das nossas melhores expetativas. A resposta é claramente positiva. No início, eramos muito poucos, o nosso núcleo duro era de seis pessoas. Hoje somos mais de 20. Isto diz tudo.
“A gestão de pessoas inspira sempre cuidados. Temos que perceber as pessoas. Gerir pessoas é gerir expetativas. É criar o melhor espirito de corpo possível. E temos aqui um espírito fantástico”
Advocatus | Equacionam crescer de outra forma, nomeadamente através de integrações ou fusões? PMM | Essa é uma pergunta que está na ordem do dia, porque estamos a assistir a um momento curioso na vida das sociedades de advogados em Portugal, como, por exemplo, a recente integração da ABBC na DLA Piper. Acho que isso se vai replicar. Vamos ter mais grandes sociedades a começarem projetos em Portugal, a procurarem certo tipo de sociedades que sejam a sua porta de entrada, outras vão-se fundir, ou9 advocatus abril 2017
tras vão crescer organicamente. Não me parece, no entanto, que as maiores sociedades portuguesas vão desaparecer enquanto tal, estão há muito tempo estabilizadas, conhecem muito bem o mercado, têm excelentes profissionais. Há, claramente, um movimento de reforço das existentes e haverá um movimento de fusão em que aquelas que não optem por um crescimento orgânico se vão tentar associar a outros projetos. Advocatus | O interesse das firmas internacionais foca-se essencialmente em sociedades de média dimensão em Portugal? PMM | Claramente. Estive recentemente numa conferência onde estavam representadas algumas das maiores sociedades do mundo e quando se falava em Portugal assinalavam essa possibilidade. De resto, não é uma novidade para o mercado português: já se falou em tempos, houve um abrandamento e agora está-se a retomar essa ideia. Também não ponho de parte que haja sociedades portuguesas a juntar-se, tal como não ponho de parte que os escritórios espanhóis – são algumas das maiores sociedades do mundo – venham reforçar a sua posição no mercado português.
Entrevista “Um dos aspetos fundamentais de qualquer sociedade é manter a qualidade. Para nós, sociedades de média dimensão, orientadas para a especialização, não basta chegar ao topo, há que saber manter a qualidade. Isso não é fácil. Os clientes são muito exigentes”
Há muitas oportunidades na Colômbia e Perú Advocatus | Em virtude dos contatos que tem com clientes, que perceção tem da evolução da economia nacional? Paulo Moura Marques | Vejo duas tendências distintas: a nossa realidade portuguesa – e europeia – e a realidade exterior. Nos últimos anos, a realidade portuguesa tem sido marcada pela dificuldade, com limitações e constrangimentos por parte do Estado. E para nós, que trabalhamos em Direito Público, isso tem um peso. Vemos agora uma tendência para alguma normalização. Julgo que a restante economia vai acompanhar. Julgo que temos por diante anos melhores e algum crescimento. Com isso virá uma coisa importante para Portugal: vimos durante a crise e agora na fase mais terminal da crise – espero – o aumento das exportações e o investimento estrangeiro em Portugal. Claramente, estamos a falar de serviços jurídicos, quer num sector, quer noutro. Hoje, uma das modalidades mais interessantes para o advogado português é o acompanhamento de clientes portugueses ou baseados em Portugal para países onde haja seu investimento onde possamos ser uma mais-valia. Neste momento, nos países de expressão oficial portuguesa somos uma mais-valia, porque podemos acompanhar esses clientes em respeito das normas locais. A perspetiva europeia é um pouco como a portuguesa, com as variações de cada um dos Estados. Quanto à perspetiva internacio-
nal: fora do espaço comunitário, estamos a observar que um ou dois grandes blocos estão a adquirir poder de compra. A China está a retomar e em toda a Ásia é interessante prestar serviços de portugueses; a mesma coisa no sentido contrário, o investimento interno. Chamo a atenção para a América Central e do Sul, onde há muitas oportunidades, nomeadamente na Colômbia e Perú. Advocatus | A AAMM está a aproveitar estas oportunidades? PMM | Temos tido muitos contactos nessa matéria. Advocatus | Afirmou que pretendem aumentar a internacionalização. Qual é atualmente o peso do negócio internacional na faturação? PMM | Já vale quase um terço da nossa faturação. Advocatus | E provém, essencialmente, de onde? PMM | Para além de países de língua oficial portuguesa, onde temos muita implementação, também temos pedidos contínuos de serviços jurídicos de países da Europa, dentro e fora da União Europeia. É um dos pilares do escritório e vai continuar a ser. Advocatus | A quota da internacionalização tem aumentado? PMM | Sim, progressivamente nos últimos quatro anos. Começámos com uma quota muito baixa, de cerca de 10%. Hoje temos perto dos 30%.
Advocatus | A AAMM equaciona essa possibilidade? Sendo uma sociedade de média dimensão encaixa no perfil pretendido. PMM | Respondo-lhe com uma expressão que já foi até usada por presidentes da República: o futuro a Deus pertence. Não ponho fora de cogitação nenhuma possibilidade, mas no horizonte de curto e médio prazo isso não está previsto. Está, sim, previsto o crescimento orgânico – este ano fizemos novos sócios – e o “lateral hiring” de especialistas com as suas equipas. Juntarmo-nos a outro projeto, a curto prazo, não está no nosso horizonte. Não quer dizer que, se apresentando, não pensemos nisso. Advocatus | A AAMM pretende manter a especialização? PMM | Claramente. Não consideramos que haja lugar no mercado em que nós queremos estar para uma opção de generalismo. Não estou com isto a dizer que o generalismo não tenha a sua valência e o seu lugar na advocacia. Mas, na forma como vemos a advocacia, o generalismo terá de ser claramente estabelecido pela junção de especialistas em áreas e não tanto por advogados polivalentes que cubram uma série de áreas. O conhecimento no Direito é tão específico que acaba por ditar que as pessoas se especializem. Advocatus | Como é que uma firma de média dimensão concorre com grandes sociedades em Portugal? PMM | Com especialização. O mercado reconhece os especialistas. Não é um fenómeno eminentemente português. A nível internacional, há sociedades de média dimensão que albergam certos tipos de especialistas, porque gostam de estar nesse ambiente mais “cosy”. Não é a nossa filosofia. Se for possível e tivermos apetência para crescer, vamos crescer, de forma estruturada, orgânica, compassada. Portanto, não temos média dimensão apenas por opção. Não é uma opção gestionária, é um momento de gestão. No entanto, a especialização é que dita. Em Portugal ainda vivemos muito do nome e da projeção de certos advogados, poucas sociedades podem dizer que a sua marca suplanta o valor individual dos seus advogados. Aliás, duvido que haja alguma. As próprias marcas das maiores sociedades em Portugal não suplantam em reco-
10 advocatus abril 2017
nhecimento o dos seus mais destacados advogados. Portanto, é assim que se combate. A identidade individual suplanta a marca coletiva. As pessoas querem é o advogado que lhes dá confiança. Advocatus | A escala não é, portanto, um fator de dissuasão da clientela? PMM | Não dissuade, tal como não convence. Os clientes sabem que mesmo grandes sociedades têm equipas de especialização relativamente pequenas. Mesmo numa sociedade com 200 ou 300 profissionais, as equipas têm no máximo 15 pessoas. Equipas de especialidade terão três, quatro ou cinco pessoas. Ora, é esse tipo de unidades que também se encontra nas firmas de média dimensão dedicadas. A dimensão global do escritório não é preponderante. Poderá dizer: tendencialmente, terão mais pessoas mais especialistas em mais áreas. Verdade, mas também não é menos verdade que quando se procura um certo especialista de uma certa área sabe-se qual o escritório em que ele está e vai-se ter com ele. Funciona mais assim do que o contrário.
“Também não é menos verdade que quando se procura um certo especialista de uma certa área sabe-se qual o escritório em que ele está e vai-se ter com ele”
advocatus.pt
“Há uma crítica que faço e em que julgo não estar sozinho: o nosso caminho tem sido errático. Um sector tão importante como a justiça pede estabilidade”
Só alguns advogados deviam ir aos tribunais superiores Advocatus | O negócio que surge por arrasto de clientes de outras áreas, nas grandes sociedades, não é relevante? PMM | São duas formas distintas de ver a advocacia, de ver a relação com os clientes. Uma é de volume, que significa muito volume, mas baixo valor. A outra tem uma lógica diferente: valores elevados porque trabalham eminentemente os especialistas. Advocatus | Qual é, então, o vosso perfil de cliente? PMM | Temos de tudo um pouco, mas preponderam multinacionais e clientela nacional de grandes empresas. Temos muito poucos clientes individuais. Advocatus | Quais as metas da sociedade para este ano? PMM | Em termos de pessoas, atingimos praticamente o número de advogados que queríamos. Admito que ingressem na sociedade mais duas a três pessoas. Vamos fazer também um reforço do pessoal auxiliar. Em faturação, calculamos que poderemos ter um aumento de cerca de 20%, mas vamos ver como se desenvolve o ano.
Advocatus | Como observa a situação da justiça em Portugal? Paulo Moura Marques | Difícil. Tem sido um diálogo muito difícil entre os operadores. Há uma crítica que faço e em que julgo não estar sozinho: o nosso caminho tem sido errático. Um sector tão importante como a justiça pede estabilidade. Só conseguimos modernizar e melhorar um sistema quando há estabilidade nas grandes opções. Não querendo dizer se a atual reforma está certa ou se a anterior estava certa, a verdade é que o nosso caminho é errático, faz-se umas vezes por supressão de instâncias locais e no momento seguinte por reposição. Faz-se umas vezes por simplificação do código, outras por criação de mecanismos laterais. Umas vezes diz-se que tudo é resolvido por alteração legislativa, e outras diz-se que o problema está no emprego dos meios executivos da sentença. Claramente, não estamos a acertar coletivamente com as soluções. As pessoas chegarão à conclusão que se a cada quatro ou cinco anos alteramos o rumo não vamos acertar alguma vez. Até porque em nenhuma das soluções estamos a dar tempo suficiente para elas estabilizarem, para podermos
criar as correções ao sistema para o aperfeiçoar. Depois, claramente, estamos num momento de viragem. Temos que coletivamente – não apenas os operadores judiciários, mas toda a sociedade portuguesa – dar a quem administra a justiça os melhores meios para o fazer. Temos que ser exigentes com o processo. O processo tem que ser célere, mas não pode, à custa disso, sacrificar o próprio princípio de justiça. Não significa que possa atropelar as garantias. E já agora: não acredito que haja excesso de garantias. Existe é excesso de entropias. O processo tem que servir as pessoas. Estar 4, 6, às vezes, 12 anos à espera de uma sentença não é justiça. Por alguma razão, segundo os padrões internacionais, uma decisão em primeira instância deve ter no máximo dois anos, se for de elevada complexidade. Insistentemente em Portugal não se cumpre este princípio, porque há falta de meios para o fazer. Depois há outro problema que parece que não se quer debater em Portugal, que é a falta de qualidade na decisão. A falta de qualidade na decisão é produto de uma de duas coisas:
11 advocatus abril 2017
excesso de volume de quem tem que decidir e má preparação de quem apresenta os processos – os advogados. Sou favorável, designadamente nos tribunais superiores, a que haja uma segregação dos advogados que aí possam ir. Ou seja, quem vai aos tribunais superiores tem que ter demonstrado que tem capacidade para aí pleitear. Não podemos continuar num regime em que todos fazem tudo. Advocatus | Como se faria essa segregação? PMM | Da mesma forma como a Ordem dos Advogados estabeleceu princípios de especialização, também se devia criar provas públicas, em que as pessoas deem mostras de que atingiram um nível tal de execução como advogados que possam estar perante os tribunais superiores. Não digo em todas as instâncias, mas em algumas. Claramente no Direito público, onde o grau de tecnicidade é tão elevado que temos que depurar o que não deve ir às instâncias superiores. Não é produtivo para o sistema termos recursos sem nenhum tipo de preparação. Temos que começar a pensar neste princípio, que, de resto, já foi trilhado por outros países.
Opinião
advocatus.pt
wi-fi e propriedade intelectual DANIEL REIS Sócio e coordenador da PLMJ TMT
LOURENÇO NORONHA DOS SANTOS Advogado estagiário da PLMJ TMT
Imagine que um cliente seu explora um café. Imagine que esse seu constituinte, para atrair clientela, oferece acesso gratuito à Internet através de uma rede local sem fios instalada no seu estabelecimento. Imagine ainda que um freguês do café, através da ligação disponibilizada pelo seu clien-
“Seria tão absurdo responsabilizar um comerciante por aquilo que um cliente seu fizesse através da sua rede de acesso à Internet como seria demandá--lo por algum dos seus fregueses ter proferido injúrias a partir do interior da sua loja”
O TJUE considerou que seria aceitável impor uma palavra-passe como garantia de segurança da conexão à Internet. Tal medida teria o efeito de dissuadir os utilizadores de eventuais práticas ilícitas, já que se veriam forçados a revelar a sua identidade para obter a senha, deixando de poder agir anonimamente. te, coloca uma música na Internet. Por fim, imagine que é ao seu cliente que o titular dos direitos sobre a música vem pedir explicações. Foi o que aconteceu, na Alemanha, a Tobias Mc Fadden. O sr. Mc Fadden, que se dedicava à venda e aluguer de material de som e de iluminação, instalou uma rede sem fios na sua loja. Foi a partir desta que um dos seus clientes disponibilizou na Internet um fonograma sobre o qual a Sony Music tinha direitos. Não conseguindo identificar o transgressor, a Sony exigiu ao sr. Mc Fadden a reparação dos danos sofridos. Na sequência do processo que correu termos nos tribunais alemães, o Tribunal de Justiça da União Europeia foi chamado a pronunciar-se (processo C-484/14). A intervenção do TJUE explica-se pelo facto de a Directiva do Comércio Electrónico conter uma disposição (art.º 12.º – em Portugal transposto através do art.º 14.º do Decreto-Lei n.º 7/2004) que isenta de responsabilidade quem apenas forneça acesso à Internet, sem ter porém controlo sobre a origem, o conteúdo e os destinatários das transmissões que sejam feitas por quem utilize esse serviço. O que o TJUE teve de apreciar, no essencial, foi a compatibilidade dessa isenção com a figura (alemã) da responsabilidade indirecta – a que se assaca ao fornecedor de uma ligação à Internet quando, não sendo possível apurar o autor de uma determinada violação levada a cabo através dessa ligação, o fornecedor não tenha aplicado medidas de segurança no acesso à sua rede. Tendo em conta o teor relativamente lapidar do art.º 12.º da Directiva, o TJUE excluiu que fosse possível responsabilizar o sr. Mc Fadden pela violação do direito da Sony. O comerciante limitara-se a facultar acesso à Internet, não tendo qualquer
“Se no estabelecimento do seu constituinte se disponibilizar acesso à Internet, pode assegurá-lo de que não poderá ser responsabilizado por eventuais transgressões cometidas pelos seus clientes; porém, não deixe de lhe recomendar que crie um mecanismo de palavra-passe”
12 advocatus abril 2017
controlo sobre a origem, conteúdo e destinatários das transmissões feitas pelos seus clientes. E uma loja que disponibilize Internet aos seus clientes não presta um serviço de comunicações electrónicas. Quem presta esse serviço é o operador de comunicações contratado pela loja ou estabelecimento. A regra da Directiva tem razão de ser: seria tão absurdo responsabilizar um comerciante por aquilo que um cliente seu fizesse através da sua rede de acesso à Internet como seria demandá-lo por algum dos seus fregueses ter proferido injúrias a partir do interior da sua loja. De todo o modo, este acórdão apresenta uma novidade importante: o TJUE considerou que seria aceitável impor uma palavra-passe como garantia de segurança da conexão à Internet. Tal medida teria o efeito de dissuadir os utilizadores de eventuais práticas ilícitas, já que se veriam forçados a revelar a sua identidade para obter a senha, deixando de poder agir anonimamente. Esta solução seria um justo equilíbrio entre, por um lado, a liberdade de empresa dos comerciantes e o direito à liberdade de informação dos utilizadores, e, por outro, os direitos de propriedade intelectual dos criadores. Sem invadir excessivamente a esfera de liberdade dos estabelecimentos nem coarctar irrazoavelmente a liberdade de informação dos clientes, dar-se-ia resposta adequada à necessidade de protecção dos criadores. Assim, se no estabelecimento do seu constituinte se disponibilizar acesso à Internet, pode assegurá-lo de que não poderá ser responsabilizado por eventuais transgressões cometidas pelos seus clientes; porém, não deixe de lhe recomendar que crie um mecanismo de palavra-passe. Os tempos já não estão para inocências.
Um evento corporate com “touch” No NewsMuseum, os eventos da sua organização são modernos e originais devido às nossas plataformas avançadas de entretenimento inteligente e interativo – onde (quase) tudo é “touch”. Uma experiência em VR, outra num ecrã tátil de 67 m2. Uma projeção em 360º, a gravação de “vivos” em TV e Rádio. Lançamentos de produtos e serviços, encontros de “team building”, reuniões ativas podem ser transformados numa moderna aventura mediática produzida pela nossa equipa. Visite na Vila de Sintra o mais moderno e interativo centro europeu dedicado ao Jornalismo, aos Media e à Comunicação. E desafie-nos com a sua ideia para um evento corporate com um “touch” especial. www.newsmuseum.pt Mais informação e reservas Marina Freitas marinafreitas@newsmuseum.pt T. +351 962 190 866
Análise
Custas judiciais, o preço da justiça Advogados, juízes e procuradores dão a sua opinião sobre o tema das custas judiciais – cuja redução é uma das batalhas do novo bastonário da Ordem dos Advogados, Guilherme Figueiredo. As custas são um fator dissuasor para os cidadãos portugueses recorrerem aos tribunais? Para Adriano Squilacce, sim. O advogado de contencioso da Uría Menéndez – Proença de Carvalho afirma que o atual sistema de custas é “perfeito para o Estado”. “Por um lado, permite apresentar uma taxa de resolução de litígios favorável e reduzir as pendências, criando a aparência de um sistema de Justiça eficaz. Por outro lado, angaria receitas que, em muitos casos, serão superiores ao custo do serviço, o que viola os princípios da correspetividade e proporcionalidade, que norteiam o serviço semipúblico”. Já o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, António Ventinhas, defende que, “em alguns casos o legislador, conscientemente, condiciona o acesso à justiça por uma opção
de política criminal”. Entende que a cobrança de custas judiciais de grande dimensão “estimula a passagem dos grandes processos para os tribunais arbitrais, pois o pagamento aos árbitros até poderá ficar mais barato em determinados casos”. Por outro lado, adverte que têm de ser repensados casos em que se pagam “quantias diminutas” para discutir “bagatelas jurídicas”. Ao advogado da BCH Advogados Duarte Gorjão Henriques “parece precipitada qualquer pretensão de que os tribunais judiciais são mais caros que os tribunais arbitrais”. “Nem toda a arbitragem é “luxuosa”, diz. Menciona, a propósito, a arbitragem “ad hoc”, em que as partes podem acertar com os árbitros o montante dos seus honorários, e centros de arbitragem – não de consumo – que oferecem so-
luções “que asseguram qualidade a preços bastante acessíveis”. “A bem da certeza jurídica e da equidade, será crucial que, de uma vez por todas, se fixe um regime de custas processuais claro e que leve em linha de conta que os custos de funcionamento da Justiça são já suportados por todos os contribuintes”, comenta. Para o secretário-geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, João Paulo Vasconcelos Raposo, “é demasiado fácil dizer que o problema se resolve com uma redução de taxas. Há muitas outras questões a pensar e trabalhar”, avisa. Como exemplos enumera a ligação do regime do acesso ao direito com o regime de custas, atualmente separados; o regime processual; e o funcionamento da justiça. O advogado da SASLBM & Asso-
14 advocatus abril 2017
ciados Pedro Rica Lopes salienta, por sua vez, que “as taxas cobradas pelo acesso à justiça não podem ser demasiado baixas de modo a não banalizar esse acesso, mas também não podem ser tão caras que impeçam o cidadão de aceder à justiça, sendo que, neste caso, o sistema peca evidentemente por excesso e não por defeito”. Considera ainda que o sistema de isenções deveria ser revisto e que o acesso ao apoio judiciário não deve ser calculado apenas com base no IRS. Já o sócio da Amorim Teixeira, Couto, Borgas & Associados Luís Couto entende que o valor das custas processuais, nalgumas categorias de procedimentos e ações judiciais, constitui “um entrave ao acesso à justiça, sobrecarregando cidadãos e empresas” de forma, que crê, “excessiva”.
advocatus.pt
“Entorses” do regime de custas judiciais O valor das custas processuais, nalgumas categorias de procedimentos e acções judiciais, constitui, a nosso ver, um entrave ao acesso à justiça, sobrecarregando cidadãos e empresas de forma, que consideramos, excessiva.
LUÍS COUTO Sócio da Amorim Teixeira, Couto, Borgas & Associados
O regulamento das custas judiciais (RCJ), actualmente em vigor, foi instituído pelo Decreto-lei 34/2008, de 28 de Fevereiro, o qual já foi alvo de várias alterações. Permitimo-nos aqui tratar sumariamente um aspecto do mencionado regime, que constitui, a nosso ver, um entrave ao acesso à justiça, sobrecarregando cidadãos e empresas de forma, que consideramos, excessiva: o valor das custas processuais, nalgumas categorias de procedimentos e acções judiciais. Assim, estabelece o artigo 3.º do RCJ que as custas processuais abrangem a taxa de justiça e as custas de parte. A taxa de justiça corresponde “ao montante devido pelo impulso processual (…) e é fixada em função do valor e complexidade da causa”, conforme o dispõe o artigo 6º, n.º 1 do RCJ. Nos termos do artigo 5.º do RCJ a taxa de justiça é expressa em unidades de conta (UC), fixada actualmente em 102,00 €. Ora, se atentarmos na tabela II, anexa ao mencionado diploma, que fixa a taxa dos incidentes, procedimentos e execuções, verificamos que a taxa de justiça devida pela interposição de providências cautelares comporta apenas dois escalões: nos procedimentos com valor até 300.000,00 €, a taxa de justiça é fixada em duas UC (204,00 €); nos procedimentos com valor superior a 301.000,00 €, a taxa de justiça é fixada em 8 UC (816,00 €). Ora, pela aplicação da enunciada regra, o valor a pagar a título de taxa de justiça, pela apresentação de providencia cautelar com o valor de 1.000,00 € ou com o valor de 300.000.00 € é o mesmo, o que contradiz o princípio geral de proporcionalidade, considerando o valor da causa, contido no aludido artigo 6.º do RCJ.
“A falta de proporcionalidade onera, de forma inadmissível, a acção cautelar, destinada a preservar direitos ameaçados e susceptíveis de se esfumarem com o decurso do tempo”
No mesmo anexo II, é estabelecido que a taxa de justiça devida pela apresentação de oposição à execução por embargos, por oposição à penhora ou embargos de terceiro e respectivas contestações, comporta, também, dois escalões: nas execuções com valor até 30.000,00 €, a taxa de justiça é fixada em 3 UC (306,00 €); nas execuções com valor superior a 30.001,00 €, a taxa de justiça é fixada em 6 UC (612,00 €). Também aqui se não cumpre o princípio da proporcionalidade, igualando o custo a pagar pelo impulso processual em acções com valores tão dissemelhantes. Não se alcança a razão que presidiu à decisão de furtar o custo dos mencionados procedimentos judiciais à proporcionalidade, em razão do valor económico do processo, que foi estabelecida para as acções (anexo I), falta de proporcionalidade que onera, de forma inadmissível, a acção cautelar, destinada a preservar direitos ameaçados e susceptíveis de se esfumarem com o decurso do tempo, e a oposição a acções executivas desprovidas de fundamento, que, as mais das vezes, permitem a penhora de bens sem prévio escrutínio judicial, como acontece na forma sumária, dificultando o acesso à justiça e roçando, por isso, a inconstitucionalidade por violação do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece o “acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos […] direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”. O custo processual, nos mencionados procedimentos, é algo que merece ponderação e que deverá ser considerado de jure constituendo.
15 advocatus abril 2017
“Não se alcança a razão que presidiu à decisão de furtar o custo dos mencionados procedimentos judiciais à proporcionalidade, em razão do valor económico do processo”
Análise
Custas processuais e custos de arbitragem: valores comparáveis? Duarte Gorjão Henriques Sócio da BCH Advogados
A ideia comum que circula entre estudiosos dos fenómenos processuais é clara e de simples formulação: os custos de arbitragem levam a concluir que se trata de um meio de resolução de litígios para cidadãos abastados. Para avaliar o acerto desta ideia, foi publicado há poucos anos um estudo conduzido sob a égide da Fundação Francisco Manuel dos Santos, o qual formulou um comparativo entre os custos associados a um processo judicial e a um processo de arbitragem, concluindo que o último é apenas mais caro em acções que apresentem um valor inferior a cerca de dois milhões de euros, enquanto que, acima de tal valor, o Estado cobraria mais. Será assim? Sem cuidar agora de qualquer rigor nos cálculos, tomemos como exemplo uma acção com um valor de 100 milhões de euros. As custas finais devidas nos termos do Regulamento das Custas Processuais ascenderiam a aproximadamente € 1,2 milhões. Se consultarmos alguns centros de arbitragem, poderíamos chegar a valores de 500 ou 700 mil euros, o que se revela inferior àquele. Quer um, quer outro dos valores são absolutamente incomportáveis para o cidadão comum. Porém, nem umas nem outras são tão elevadas, tudo dependendo do quadro de regras que vier (e como vier) a ser aplicado. Com efeito, no caso das custas judiciais, o art. 6 do Regulamento de Custas Processuais permite que seja dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça em acções acima de € 275.000 (quando a “especificidade da situação o justificar e o juiz de for-
A bem da certeza jurídica e da equidade, será crucial que, de uma vez por todas, se fixe um regime de custas processuais claro e que leve em linha de conta que os custos de funcionamento da Justiça são já suportados por todos os contribuintes.
“Há que realçar que nem toda a arbitragem é luxuosa. Quando as partes recorrem a arbitragem ad hoc, dispõem de ferramentas para controlar os custos, designadamente acertando com os árbitros o montante dos seus honorários”
ma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”). Este dispositivo legal tem sido interpretado e aplicado nos nossos tribunais, até por força de decisões do tribunal constitucional, de modo a constituir um verdadeiro “poderdever” do juiz: é uma faculdade que o juiz deve usar. Apesar dos seus contornos fluidos, tem-se entendido que “causa complexa” é a que: tem articulados ou alegações prolixas; tem questões de elevada especialização jurídica ou técnica, ou com análise combinada de diversas questões jurídicas; ou que envolva um elevado número de testemunhas, uma prova complexa ou morosa. Como se vê, ainda assim, a margem de discricionariedade deixada ao juiz neste “poder-dever” é considerável. Embora não se acredite que se fixem valores exorbitantes, a incerteza está ali à espera da conta final. De todo o modo, parece precipitada qualquer pretensão de que os tribunais judiciais são mais caros que os tribunais arbitrais. Seja como for, embora não seja este o local apropriado para discutir as diferenças entre arbitragem e contencioso judicial e não esquecendo que abordamos aqui apenas o tema dos custos, há que realçar que nem toda a arbitragem é “luxuosa”. Por um lado, quando as partes recorrem a arbitragem “ad hoc”, estas dispõem de ferramentas para controlar os custos, designadamente acertando com os árbitros o montante dos seus honorários. Exemplo disso são as arbitragens de medicamentos onde, por acordo entre as partes, se
16 advocatus abril 2017
“Há exemplos de centros de arbitragem, que não são propriamente de consumo, que oferecem soluções de arbitragem que asseguram qualidade a preços bastante acessíveis”
praticam valores de algum modo padronizados e distanciados da relevância pecuniária dos interesses em jogo. Por outro lado, exemplos de centros de arbitragem – que não são propriamente de “consumo” – oferecem soluções de arbitragem que asseguram qualidade a preços bastante acessíveis. Vejam-se os casos do Arbitrare para litígios de propriedade industrial e do Centro de Arbitragem da Propriedade e do Imobiliário, para litígios desta natureza. Em suma, nem uma é tão cara, nem a outra é tão barata. Mas, a bem da certeza jurídica e da equidade, será crucial que, de uma vez por todas, se fixe um regime de custas processuais claro e que leve em linha de conta que os custos de funcionamento da Justiça são já suportados por todos os contribuintes.
advocatus.pt
RCP = Revisão das Custas Precisa-se! As taxas cobradas pelo acesso à justiça não podem ser demasiado baixas de modo a não banalizar esse acesso mas também não podem ser tão caras que impeçam o cidadão de aceder à justiça, sendo que, neste caso, o sistema peca evidentemente por excesso e não por defeito.
“O grande objetivo da justiça é substituir a ideia da violência pelo direito.” Alexis de Tocqueville
Todos nós temos presente o direito à Justiça consagrado constitucionalmente e, felizmente, vivemos numa sociedade que (ainda) acredita que a mesma se realiza nos tribunais, não obstante as entropias sobejamente conhecidas, sendo certo que a Lei Fundamental é inequívoca quando afirma no n.º 1 do artigo 20.º que “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”. E as questões que aqui procuraremos abordar são, precisamente, tentar perceber se efetivamente o atual sistema permite que todos tenham acesso ao direito e se existe ou não denegação da justiça por insuficiência de meios e desde já antecipo que, em meu entender, nem todos têm atualmente acesso ao direito e a denegação da justiça é algo que ocorre sistematicamente em Portugal. Tal como estão concebidos o Regulamento das Custas Processuais (RCP) e o sistema de Apoio Judiciário, existem inúmeras pessoas que são excluídas do efetivo acesso à Justiça. As regras atualmente existentes assentam numa lógica puramente economicista, a qual não compreende nem contempla inúmeros
casos concretos de pessoas que têm legítimas pretensões que só podem ser dirimidas em Tribunal. Mas é uma lógica subvertida na medida em que considera todos os rendimentos daquele que pretende ficar isento do pagamento de taxas de justiça, bem como dos seus familiares, mas não considera todas as despesas que os mesmos têm efetivamente. E aqueles que lidam de perto com este fenómeno facilmente concluem que o atual sistema impede uma franja considerável de pessoas de aceder à justiça. E mesmo se tivermos em consideração a possibilidade do pagamento faseado da taxa de justiça facilmente verificamos que tal “regalia” acaba por ser prejudicial, na medida em que a pessoa acaba por pagar muito mais do que devia e só muito mais tarde vê o reembolso, o
“As regras atualmente existentes assentam numa lógica puramente economicista, a qual não compreende nem contempla inúmeros casos concretos de pessoas que têm legítimas pretensões que só podem ser dirimidas em Tribunal”
que leva muitos a nem sequer considerar esta hipótese. Além disso, existem outras bizarrias no sistema, como, por exemplo, a isenção concedida aos trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato e desde que não tenham rendimentos superiores a 200 Unidades de Conta. Ora, ainda que o trabalhador tenha a sorte de calhar com um Procurador diligente que efetivamente dê andamento ao processo, o mesmo acaba por ser penalizado pois, uma coisa é poder contar com um advogado com o qual pode contactar com regularidade e estabelecer uma estratégia que vá de encontro ao caso concreto e às legítimas aspirações do trabalhador e outra, bem diferente, é o acompanhamento que o magistrado possa fazer do processo, por muito mais disponível que seja. Como tal, não faz sentido esta distinção e deveria a mesma ser abolida. Assim, e em suma, diria, quanto ao RCP, que as taxas cobradas pelo acesso à justiça não podem ser demasiado baixas de modo a não banalizar esse acesso mas também não podem ser tão caras que impeçam o cidadão de aceder à justiça, sendo que, neste caso, o sistema peca evidentemente por excesso e não por defeito. Além disso, o sistema de isenções deveria ser revisto de modo a contemplar, entre outros, os casos que referi. Quanto ao Apoio Judiciário, a decisão tem que caber a pessoas que possam analisar cada caso concreto de forma adequada, deixando, assim, de ser as máquinas de calcular a decidir apenas com base no IRS de cada um.
17 advocatus abril 2017
Pedro Rica Lopes Advogado na SASLBM & Associados
“Existem outras bizarrias no sistema, como, por exemplo, a isenção concedida aos trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato e desde que não tenham rendimentos superiores a 200 Unidades de Conta”
Análise
Um fator dissuasor As custas são um factor dissuasor para se recorrer aos Tribunais, que se impõe às pessoas singulares sem apoio judiciário e a pequenas e médias empresas. Adriano Squilacce Advogado de Contencioso da Uría Menéndez – Proença de Carvalho
Desde a entrada em vigor do RCP em 2009, 2015 foi o ano em que registou o menor número processos cíveis instaurados (407.022). Os 3 primeiros trimestres de 2016 (136.346 acções) apontam para que os processos cíveis instaurados, neste ano, tenham caído para cerca de metade face ao ano anterior. Esta redução é explicada, em parte, pela preocupação com as custas, em acções de valor superior a € 275.000. A controvérsia do remanescente da taxa de justiça é conhecida (artigo 6.º, n.º 7, do RCP). Apenas cabe destacar que os Tribunais têm sido mais restritivos na sua dispensa, concedendo-a apenas em “situações de manifesta injustiça, de intolerável desequilíbrio entre o montante a satisfazer e a actividade desenvolvida pelo sistema de justiça” (Ac. do TRL, de 22.11.2016, proc. 3258/05.5TVLSB.L1-7). Justifica-se, agora, colocar o foco no n.º 9 do artigo 14.º do RCP, que exige que, em acções de valor superior a € 275.000, a parte totalmente vencedora (que tenha tido um impulso processual) deve adiantar o remanescente. Apesar de esta regra ter sido introduzida em 2012, os Tribunais começaram a aplicá-la, de forma consistente, apenas desde finais de 2014. As partes devem ser alertadas para esta questão ao ponderar instaurar uma acção de valor elevado ou chegar a um acordo. É que, por exemplo, num processo cível comum de € 3 milhões, a parte vencedora, terá, em regra, de adiantar o remanescente de € 33.354 relativo à 1.ª Instância e, em caso de recurso, mais € 16.677, desconsi-
“Não se pretende fomentar uma litigância irresponsável, mas é inadequado chegar ao extremo oposto, impondo sacrifícios à parte vencedora, em violação do n.º 1 do artigo 20.º da CRP”
derando as taxas pagas ao longo da acção. A parte vencedora pode exigir à parte vencida o reembolso destes valores, mas fica sujeita ao risco da sua cobrança (transferido pelo Estado), que se pode frustrar. Estão em causa valores elevados, o que pode gerar dificuldades para a parte vencedora, até porque se tem entendido que a notificação prevista no n.º 9 do artigo 14.º do RCP deve ser feita nos 10 dias seguintes à “decisão que ponha termo ao processo”, ainda antes do trânsito em julgado. Isto é, o remanescente tem de ser adiantado antes do fim do prazo de recurso e, se houver recurso, muito antes do trânsito.
No entanto, o recurso pode alterar a responsabilidade pelas custas e o remanescente pode até vir a ser dispensado, o que determinará a inutilidade do adiantamento realizado. Em teoria, a lei visa permitir que, aquando do envio da nota de custas de parte, a parte vencedora tenha noção dos valores cobrados pelo Tribunal. Sucede que o prazo para envio da nota de custas de parte é de 5 dias após o trânsito (artigo 25.º, n.º 1, do RCP), já que a responsabilidade tributária é fixada pela decisão definitiva (ainda que o Ac. do TRC, de 8.3.2016, entenda que a nota de custas de parte possa ser enviada antes do trânsito; proc. 3258/05.5TVLSB.L1-7). Assim, será frequente existir um longo hiato entre o adiantamento do remanescente e o termo do prazo para envio da nota de custas de parte. A isto acresce que se tem entendido que os requisitos para dispensa do remanescente devem ser apreciados quanto à acção como um todo, e não apenas relativamente a cada uma das partes, o que impede dispensar apenas a parte vencedora (Guia Prático das Custas Processuais do CEJ, 4.ª Edição, 2016, pág. 109). As custas são um factor dissuasor para se recorrer aos Tribunais, que se impõe às pessoas singulares sem apoio judiciário e a pequenas e médias empresas (que não podem beneficiar de apoio judiciário - cfr. artigo 7.º, n.º 3, da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais). Em 2015, o total das taxas de justiça pagas foi de € 129,5 milhões, o que representou um aumento de 9,40% face a 2014. É verdade que, em 2012, o total das taxas de justiça foi de € 129,4 milhões. Porém, a
18 advocatus abril 2017
pendência de processos (de todas as naturezas) diminuiu em 22,82%, desde 2012 até ao final de 2015. Este sistema de custas é “perfeito” para o Estado. Por um lado, permite apresentar uma taxa de resolução de litígios favorável e reduzir as pendências, criando a aparência de um sistema de Justiça eficaz. Por outro lado, angaria receitas que, em muitos casos, serão superiores ao custo do serviço, o que viola os princípios da correspectividade e proporcionalidade, que norteiam o serviço semi-público. Não se pretende fomentar uma litigância irresponsável, mas é inadequado chegar ao extremo oposto, impondo sacrifícios à parte vencedora, em violação do n.º 1 do artigo 20.º da CRP.
“Por outro lado, angaria receitas que, em muitos casos, serão superiores ao custo do serviço, o que viola os princípios da correspectividade e proporcionalidade, que norteiam o serviço semi-público”
advocatus.pt
A árvore e a floresta Discutir custas é discutir acesso ao direito. Discutir acesso ao direito implica olhar as bases económicas do sistema e trabalhar todas as suas componentes, de forma aberta, racional e efetiva. Importa discutir redução de taxas. Mas também ir muito além disso.
João Paulo Vasconcelos Raposo Secretário-geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses
O tema das custas processuais é dos mais desconsiderados pela comunidade judiciária, mas, se ligado ao acesso ao direito, facilmente concluiremos que é matéria constitucional e, portanto, das mais relevantes regulamentações da justiça. A base do regime assenta numa lógica de equilíbrio entre despesas e receitas. Parte da necessidade de atingir um determinado “bolo financeiro” para pagar um conjunto de custos indexados. Pensa no que há a “pagar” e adequa os “preços da justiça” a essa realidade. Esta lógica invertida tem conduzido a um aumento de “preços” tão relevante que torna irracional a muitas pessoas fazer a “compra judicial”. Até o singelo merceeiro sabe que se subir muito os preços perde clientes e receitas… O grande erro é, obviamente, substantivo. O regime de custas regula o acesso ao sistema de justiça. Isso significa estabelecer as condições de racionalidade que permitam a todos, em situação de igualdade, apresentar ou defender-se de um pedido em tribunal. A racionalização do acesso, numa linguagem de outras áreas, deve “moderar” o recurso desnecessário ao sistema e prevenir o recurso abusivo. O regime atual retira verdadeiramente a possibilidade de muita gente aceder à justiça. Alterações impõem-se. Importa, todavia, fazer uma discussão consistente e evitar a irracionalidade das soluções legislativas “a la minute”. É demasiado fácil dizer que o problema se resolve com uma redução de taxas. Há muitas outras questões a pensar e trabalhar. Há que pensar na ligação do regime do acesso ao direito com o re-
“Porque não pensar em escalões de taxas ligados aos escalões de rendimento, estabelecendo tabelas de custas não dependentes exclusivamente do valor da ação mas também dos níveis de rendimentos?”
gime de custas, atualmente separados. Existe um limiar de acesso gratuito ao sistema, aproximado do nível da pobreza. Quem está abaixo do limiar não paga nada e quem está acima paga tudo. É essencial devolver ao cidadão de rendimentos médios o acesso efetivo ao sistema. Porque não pensar em escalões de taxas ligados aos escalões de rendimento, estabelecendo tabelas de custas não dependentes exclusivamente do valor da ação mas também dos níveis de rendimentos? Porque não pensar numa autorização genérica de pagamento faseado de taxas e custas? Há que pensar também no regime processual. Onde fica o poder de gestão processual do juiz na tributação das causas? Não deveria ter um poder conformador das custas a pagar por referência à complexidade, à situação patrimonial das partes ou até ao nível de cooperação demonstrado no processo? Há que pensar ainda no funcionamento da justiça, nos encargos com perícias e exames e com o transporte de pessoas, especialmente importantes num mapa judiciário como o atual. Porque não pensar em bonificações de taxas assentes na distância? Uma análise compreensiva implica finalmente pensar na regulamentação dos honorários dos operadores privados do sistema, advogados e auxiliares de justiça, seja em regime liberal ou em contexto de apoio judiciário. Têm-se multiplicado irracionalidades que convocam variadas dúvidas. Conseguirá um credor suportar honorários a advogados e agentes de execução num mesmo processo? Qual é o limiar da racionalidade económica asso-
19 advocatus abril 2017
ciada a uma cobrança? Como acomodar os honorários devidos? Faz sentido proibir quota litis a advogados e regulamentar honorários dos agentes de execução proporcionais ao sucesso da cobrança? Discutir custas é discutir acesso ao direito. Discutir acesso ao direito implica olhar as bases económicas do sistema e trabalhar todas as suas componentes, de forma aberta, racional e efetiva. Importa discutir redução de taxas. Mas também ir muito além disso.
“Onde fica o poder de gestão processual do juiz na tributação das causas? Não deveria ter um poder conformador das custas a pagar por referência à complexidade, à situação patrimonial das partes ou até ao nível de cooperação demonstrado no processo?”
Análise
advocatus.pt
As custas judiciais e o acesso ao direito António Ventinhas Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
O acesso ao direito tem consagração constitucional e surge como emanação do princípio da igualdade. Numa sociedade democrática, o acesso à Justiça tem de ser garantido a todos os cidadãos, independentemente das suas condições económicas. Por essa razão, o Estado aloca verbas significativas ao patrocínio judiciário, nas modalidades de pagamento de patrono e dispensa do pagamento de custas judiciais. Num contexto em que algumas áreas relevantes foram desjudicializadas, como a acção executiva ou o processo de inventário, o Estado tem de assegurar que nenhum cidadão fique impedido de exercer os seus direitos, não obstante alguns serem agora tutelados fora dos tribunais. O acesso ao direito é algo de essencial, mas tem sido restringido por razões de ordem essencialmente financeira. Ao mesmo tempo que o acesso gratuito ao direito sofreu limitações, o valor das custas judiciais foi aumentando. O cidadão da classe média que não tem acesso ao apoio judiciário tem de pagar honorários a mandatários, bem como custas judiciais. A soma destas duas parcelas faz com que muitos cidadãos não recorram aos tribunais para aí exercerem os seus direitos. Em alguns casos o legislador, conscientemente, condiciona o acesso à justiça por uma opção de política criminal. Nos pequenos furtos cometidos em estabelecimentos comerciais, o legislador fez com que este crime deixasse de ter natureza semi-pública, para assumir natureza particular.
Há milhares de processos parados porquanto a conta respectiva não foi efectuada. Em processos complexos, a elaboração das contas parece quase uma operação mística em que somente alguns iniciados dominam tal conhecimento. A simplificação das contas permitiria optimizar o trabalho dos funcionários judiciais para outras funções, tornando a nossa justiça mais eficaz, o que todos desejamos.
“Seria mais correcto que o Ministério Público utilizasse a figura da suspensão provisória do processo, do que se limitar o direito a exercer por parte dos cidadãos, mediante a imposição do pagamento de custas judiciais”
Esta circunstância obriga a que os titulares dos estabelecimentos tenham a necessidade de se constituírem assistentes, para que a justiça penal possa ser exercida. Na teoria, o legislador não nega a possibilidade de perseguição penal do tipo de furtos mencionados, mas impõe que se gaste no pagamento das custas judiciais e honorários a mandatário um valor superior ao do bem subtraído. Esta opção, da qual discordo, não é neutra e pode estimular a prática de furtos. No meu entendimento, seria mais correcto que o Ministério Público utilizasse a figura da suspensão provisória do processo, do que se limitar o direito a exercer por parte
dos cidadãos, mediante a imposição do pagamento de custas judiciais. No que diz respeito à justiça civil, as custas judiciais também têm algumas especificidades que importa salientar. O pagamento das taxas de justiça por parte do Estado Português, nos processos em que este é parte, obriga a uma burocracia inútil que poderia ser resolvida por outra via. Muitas vezes o Estado deixa de exercer os seus direitos em processos judiciais porquanto os departamentos não querem suportar o pagamento com as taxas de justiça. No que concerne aos particulares, há afinações que deveriam ser efectuadas no Regulamento das Custas Processuais. Nos processos mais elevados deveria existir um valor máximo de custas a cobrar. Ainda há pouco tempo foi noticiado que num processo o valor das custas foi superior a três milhões de Euros. A cobrança de custas judiciais com esta dimensão estimula a passagem dos grandes processos para os tribunais arbitrais, pois o pagamento aos árbitros até poderá ficar mais barato em determinados casos. Por outro lado, verificamos que há muitas acções que permitem a discussão de bagatelas jurídicas, como a propriedade de Bimbys ou cortinados e os seus autores pagam uma quantia irrisória de custas judiciais. Em determinados casos, o pagamento de quantias diminutas para colocar em funcionamento toda a máquina judicial também tem de ser repensado. Há processos em que se discute a propriedade de prédios rústicos ou
20 advocatus abril 2017
de natureza extremamente morosa e complexa ( como o processo de inventário), em que o valor pago a título de custas é de cerca de 100 Euros. Por último, há necessariamente que simplificar o regime das custas processuais. Há milhares de processos parados porquanto a conta respectiva não foi efectuada. Em processos complexos, a elaboração das contas parece quase uma operação mística em que somente alguns iniciados dominam tal conhecimento. A simplificação das contas permitiria optimizar o trabalho dos funcionários judiciais para outras funções, tornando a nossa justiça mais eficaz, o que todos desejamos.
“Muitas vezes o Estado deixa de exercer os seus direitos em processos judiciais porquanto os departamentos não querem suportar o pagamento com as taxas de justiça”
UM PACTO PARA A JUSTIÇA FISCAL FDUNL/CAAD
9 DE MAIO DE 2017
AUDITÓRIO A DA UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA HORÁRIO: 9H00 ÀS 19H00
CERIMÓNIA DE ABERTURA Jorge Bacelar Gouveia | Presidente do Conselho Científico da NOVA Direito Nuno Villa-Lobos | Presidente do CAAD Guilherme Figueiredo | Bastonário da Ordem dos Advogados Vítor Gomes | Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo Francisca Van Dunem | Ministra da Justiça* O DIAGNÓSTICO DA JUSTIÇA FISCAL MODERAÇÃO: Elisabete Miranda | Jornal de Negócios Mário Aroso de Almeida | UCP Filomena Moreira | Bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados Rui Manuel Leão Martinho | Bastonário da Ordem dos Economistas João Tiago Silveira | MLGTS e FDUL INTERVALO A TERAPÊUTICA NA JUSTIÇA FISCAL MODERAÇÃO: Susana Videira | DGPJ Manuel Fernando dos Santos Serra | Antigo Presidente do STA Lúcio Barbosa | Antigo Presidente do STA António Almeida Calhau | Antigo Presidente do STA Manuela Paupério | Presidente da Associação Sindical de Juizes Portugueses ALMOÇO MEIOS DE RESOLUÇÃO PRÉ-CONTENCIOSA DE LITÍGIOS FISCAIS E ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA MODERAÇÃO: Rui Belfo Pereira | Presidente do TCA Sul Nuno Villa-Lobos | Presidente do CAAD Helena Borges* | Diretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira Jorge Lopes de Sousa | Juiz Conselheiro Tânia Carvalhais Pereira | CAAD e UCP INTERVALO JUSTIÇA FISCAL: OUTROS OLHARES MODERAÇÃO: Rita Pires | NOVA Direito João Manuel Lança Vieira Lopes | Presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal Fernando Jorge | Presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais Paulo Ralha | Presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos Nuno Barroso | Presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Inspeção Tributária e Aduaneira CERIMÓNIA DE ENCERRAMENTO Jorge Bacelar Gouveia | Presidente do Conselho Científico da NOVA Direito Joana Marques Vidal | Procuradora Geral da República José de Faria Costa | Provedor de Justiça Marcelo Rebelo de Sousa | Presidente da República* * A confirmar
ORGANIZAÇÃO
APOIO
Inscrição gratuita limitada à capacidade do Auditório através do e-mail newsletter.cursos@caad.org.pt
© GONÇALO BORGES DIAS
Entrevista
Nuno Azevedo Neves, sócio da DLA Piper ABBC
“Queremos crescer a dois dígitos” “Muito interessantes”. É deste modo que Nuno Azevedo Neves qualifica as taxas de crescimento da ABBC nos últimos anos. Para 2017, depois da integração com a DLA Piper, em março, o sócio manifesta o objetivo da firma “crescer a dois dígitos”. Já, em termos de equipa, o propósito não é crescer de forma “desmesurada”. Com a assimilação, a sociedade beneficia todas as áreas de prática e ganha, sobretudo, a capacidade de prestar serviços de forma “mais integrada e homogénea”, abarcando todas as jurisdições que uma operação pode envolver. 22 advocatus abril 2017
Sofia Dutra, sd@briefing.pt
“A capacidade de atrair e de reter talento é uma das diretrizes mais importantes na vida das sociedades de advogados. É um desafio geracional, porque cada geração tem os seus valores e ambições. É preciso oferecer a cada profissional aquilo que ele procura, de conseguir gerir as expetativas de diferentes pessoas”
Advocatus | O que motivou a decisão de integrar a DLA Piper, dando seguimento à parceria que mantinham desde 2010? Nuno Azevedo Neves | A ABBC era desde 2010 “focus firm” da DLA Piper em Portugal. A relação de parceria foi-se intensificando e levou-nos a perceber duas coisas: primeiro, que havia uma partilha de valores e de visão sobre o que era a função de uma sociedade de advogados e sobre qual era a sua integração num mundo global; e em segundo lugar, houve uma profícua e frutífera relação de trabalho que gerou uma natural evolução nas equipas, nos setores, nas geografias e na nossa capacidade de trabalharmos em conjunto. A necessidade de a relação evoluir para uma fase mais intensa surgiu de forma natural. Não é uma relação disruptiva. Não é uma integração que surgiu como uma aposta para o
futuro, é a evolução do trabalho que tem sido feito, portanto, tem uma solidez que é diferenciadora. Advocatus | Trata-se de uma evolução natural, como diz, mas há certamente coisas que mudam. NAN | Muda em primeiro lugar o nome, mas implica também mudança em termos de sistemas e processos. Um cliente que trabalhe com a DLA Piper trabalha da mesma forma independentemente de onde está. Portanto, teremos que nos adaptar aos modelos, sistemas e garantias de qualidade, por forma a que um cliente em Portugal tenha o mesmo serviço que tem em Londres ou em Hong Kong. O facto de termos a marca DLA é também uma enorme responsabilidade para com toda a sociedade a nível global. Naturalmente, temos desafios pela frente.
Advocatus | Há áreas de prática que vão beneficiar mais com a integração? NAN | A integração não visa nenhuma área em concreto. Todas as áreas vão acabar por beneficiar com esta integração. Uma das forças da DLA é ser uma sociedade verdadeiramente local e verdadeiramente global. Estamos em mais de 40 países e sempre achámos que a força de uma firma global é ter capabilities locais que possam fazer a diferença em cada um dos mercados. Para podermos ser sólidos a nível local, temos que continuar a ser uma sociedade full service com capacidade de gerar valor e negócio nas mais variadas áreas de prática.
Advocatus | Que ligação vão ter com a DLA Piper Espanha? Vão ficar subordinados? NAN | Não. A ideia muito forte da DLA de querer estar presente nos maiores mercados globais e em todos os mercados onde os seus clientes operam leva muitas vezes a que os países não sejam vistos exclusivamente nas suas fronteiras geográficas, mas por mercados económicos. Desde há muito tempo que o mercado ibérico é visto como um mercado único em termos económicos. Tem as suas diferenças, pelo que haverá escritórios diferentes a prestar os serviços, mas a oferta de uma capability ibérica é uma ideia muito forte, porque permite abor-
Advocatus | Quais as consequências da integração a nível da equipa? NAN | Não houve alterações em termos de equipa. O nosso objetivo com esta integração não é, de repente, começar a crescer de forma desmesurada. A nossa sociedade existe em Portugal há 35 anos, entra numa nova fase de evolução face a esta integração, mas continua com o modelo de negócio que sempre teve. As evoluções têm que ser feitas um pouco na continuidade, por forma a assegurar que a base de clientes e os serviços continuam iguais. São as mesmas pessoas que continuam a prestar o serviço, agora com uma nova roupagem, mas mantendo sempre uma aposta muito forte na nossa identidade. Preparamo-nos apenas para prestar mais serviços e poder estar mais presentes nos negócios dos clientes. Advocatus | Não equacionam o crescimento da equipa? NAN | Não é pelo facto de integrarmos agora a DLA que queremos crescer de forma desmesurada ou descontrolada. Iremos crescer, mas como já estava previsto, não está previsto um crescimento exponencial. O nosso modelo de negócio sempre foi de crescimento orgânico e sustentado, que permita termos uma estrutura de sócios, associados seniores e associados juniores equilibrada. Acreditamos que crescimentos demasiado céleres podem ser perigosos.
“Um dos objetivos é ter uma oferta ibérica integrada em todas as áreas de prática e que permita ser um verdadeiro player no mercado ibérico”
23 advocatus abril 2017
Entrevista “Havia uma alavancagem elevada entre sócios e associados. Nós temos vindo a reduzir e queremos reduzir cada vez mais. A única forma de prestar serviços de valor acrescentado tem que ser por profissionais seniores e que sejam capazes de adicionar valor”
dar o mercado na forma como as empresas o veem: como um mercado integrado. Um dos objetivos é ter uma oferta ibérica integrada em todas as áreas de prática e que permita ser um verdadeiro player no mercado ibérico. O mercado ibérico é uma das linhas prioritárias de enquadramento, mas vamos mais longe porque há um conjunto de oportunidades na América Latina ou em África. Advocatus | Têm participado em grandes assessorias, em operações com equipas comuns com a DLA Piper. A que tipo de operações esperam concorrer agora? NAN | Nos últimos anos, temos tido a oportunidade de trabalhar nalgumas das maiores e mais complexas operações que ocorreram no mercado português e a linha manter-se-á a mesma. Hoje, todas as operações maiores ou mais complexas têm sempre uma dimensão internacional, seja porque as entidades intervenientes operam em mais do que um mercado, seja porque há um financiador estrangeiro e terá que ter assessoria nesse país. Cremos que agora podemos dar, de forma mais integrada e homogénea, a capability de prestação de serviços que abarca todas as jurisdições que uma operação pode envolver. E
isso é único e diferenciador: poder ter esta oferta de uma sociedade de advogados global no mercado português. Advocatus | Já concorriam com as grandes sociedades em Portugal e vão continuar a concorrer para o mesmo tipo de operações? NAN | O mercado da advocacia português é extremamente sofisticado. Não partilho da ideia de que o mercado vai ser segmentado em duas ou três sociedades. Vai haver sempre espaço para todos: para sociedades com mais e menos pessoas, mais e menos internacionais, mais e menos especializadas. Cada uma tem é que ser capaz de criar o seu espaço, diferenciar-se das demais e identificar os clientes que se identificam com esse modo de prestação de serviços. Como ABBC, já tínhamos participado em algumas das maiores operações do mercado nos últimos anos, agora com a integração da DLA vamos continuar a fazê-lo, mas o que temos de diferenciador é a capacidade global na oferta de serviços jurídicos e a capacidade de assessorarmos um cliente de forma integrada em todas as jurisdições em que uma operação possa estar. Advocatus | O objetivo é ter menos clientes, mas prestar mais serviços a esses clientes? NAN | É uma análise que tem que ser vista por áreas de prática e por setores. O nosso “aproach” é cada vez mais não por áreas de prática, mas por setores. Se conjugarmos três vetores – áreas de prática, setores de atividade e geografias – temos um conjunto de interseções que permitem identificar onde queremos estar e onde vamos trabalhar mais. Nalguns casos será tentar apostar mais em alguns clientes que possam fazer sentido, outros poderá ser ter uma maior expansão em termos de número de clientes. Não há uma resposta unívoca. Advocatus | Vão criar novos grupos de trabalho? NAN | Não temos prevista uma mudança na forma como estruturamos a sociedade. Cada vez mais vamos é apostar em setores de atividade, transversais por várias áreas de prática. Acreditamos que será uma tendência natural no mercado.
Advocatus | De que forma pode a DLA Piper retirar proveitos desta integração? É sobretudo uma plataforma para países de língua portuguesa? NAN | A DLA quer estar presente nos mercados principais e onde os seus clientes necessitam de apoio. A presença em Portugal, de forma indireta desde 2010, mostrou-se importante na capacidade de oferta de serviços jurídicos por parte da DLA. A integração dos serviços ibéricos é uma necessidade importante, mas também a capacidade que os advogados portugueses têm de apoiar noutras áreas e jurisdições também poderá gerar valor para a DLA. Estamos a falar não só em África, mas também na América Latina, em Timor... Não há uma segmentação global, mas o que define as sociedades de advogados globais é a capacidade de alocar recursos por forma a serem mais completos e eficientes na forma como prestam serviços a nível global. E é isto que é diferenciador, a possibilidade de uma equipa em Portugal poder adicionar valor, seja porque na jurisdição em causa o Direito português é referenciado de alguma forma ou porque o português é uma língua falada. Numa sociedade global, não estamos a falar de uma situação com-
24 advocatus abril 2017
partimentada, em que vamos ficar limitados a Portugal e não fazer nada mais. É uma meritocracia, é uma forma de encontrar onde podemos melhor servir e gerar mais valor para os nossos clientes. Advocatus | A ABBC estava presente em Angola, com a ADCA. Como vai ser agora a ligação? NAN | A ADCA tem uma ligação muito próxima connosco e continuará a ter com a DLA Piper ABBC, continuando a fazer parte do African Group da DLA Piper. A nossa integração é apenas no escritório
“A capacidade que os advogados portugueses têm de apoiar noutras áreas e jurisdições também poderá gerar valor para a DLA”
advocatus.pt
“Há a exigência de que as pessoas tenham conhecimento do sector em que o cliente opera. E isto não pode ser feito só com juniores, tem que haver uma mescla de sócios, associados seniores e pessoas mais novas. Naturalmente que o envolvimento de um ou mais sócios depende da dimensão das operações”
de Lisboa.
É preciso pacificar a classe Advocatus | Que expetativas tem em relação à atuação do novo bastonário da Ordem dos Advogados? Nuno Azevedo Neves | A advocacia tem tido um crescimento exponencial nos últimos anos, com várias formas de exercício da profissão. As três tradicionais: sociedades de advogados, advogados em prática individual e advogados de empresa. A expetativa de todos os advogados é que o novo bastonário tenha – e seguramente que terá – a capacidade de cada vez mais harmonizar a profissão. Mais do que criar diferenças entre as diversas formas como a profissão é exercida, é preciso agregar à volta da Ordem dos Advogados todas as diferentes formas como a profissão é exercida. Esse é um aspeto essencial e esperamos que sejam dados passos para que possa acontecer. Para tal é também essencial que as três formas de exercício da profissão sejam igualmente respeitadas por todos, porque todas são importantes para a afirmação da advocacia portuguesa.
Advocatus | Nos últimos anos essas formas de exercício da profissão estavam desavindas? NAN | Não diria desavindas. O que acontece muitas vezes é olhar-se com desconfiança para o outro e o que precisamos é de um bastonário – e estamos certos de que este será capaz de o fazer – que consiga agregar os diversos grupos. São três formas de expressão da profissão e todas são importantes para a afirmação da advocacia. Temos é que encontrar os equilíbrios, respeitando todos e dando a todos a possibilidade de evoluir. É um desafio tremendo, mas essencial. Advocatus | Quais os grandes desafios da Ordem? NAN | A Ordem tem enormes desafios quanto à deontologia profissional, ao apoio judiciário, à própria forma como é organizada e como é prestado o input dos advogados no processo legislativo. Tem que haver uma pacificação da classe – que é o objetivo porventura mais chave – e cada vez mais afirmar a Ordem como um
órgão verdadeiramente essencial na democracia portuguesa e na sustentação do Estado de Direito, não só na elaboração das leis como também a dar voz ativa a muitas pessoas que por vezes não a têm. Advocatus | Sente que a Ordem tem estado afastada do processo legislativo? NAN | Acho que tem. Não temos ouvido grandes posições da Ordem dos Advogados no processo de elaboração das leis, como se calhar a Ordem não tem sido consultada da forma como deveria ser. Mas são questões em que não estou envolvido. A Ordem deve ser uma fonte independente de prestação de opiniões. Pela diversidade de membros que tem, pode dar um input na forma como o processo legislativo é feito. É um player importante da organização judiciária. Desde que consiga agregar os advogados em seu redor, a Ordem poder ser uma voz ativa em tudo isso.
25 advocatus abril 2017
Advocatus | Que mais-valias cria esta integração em África? A integração com a ABBC ajuda sobretudo na questão humana e cultural? NAN | Os serviços jurídicos não são máquinas, se não as coisas eram relativamente fáceis. Em operações de alguma dimensão num país africano há sempre uma panóplia de jurisdições e Portugal é sempre um player, direto ou indireto. A capacidade que os portugueses têm de perceber África em termos culturais, de perceber melhor a sua legislação – porque há alguma proximidade legislativa – e a ligação que podemos ter com outras jurisdições que possam ter influência criam-nos condições bastante vantajosas para podermos participar. Um advogado português, se calhar, tem mais flexibilidade cultural para perceber algumas operações africanas do que poderá ter um de um país do norte da Europa. Mas África é muito grande. É diferente ser Angola ou Moçambique ou ser Gabão ou Sudão. O que uma sociedade global tem de diferente é poder puxar os recursos certos por forma a assegurar os melhores serviços. Advocatus | Qual a abordagem ao mercado chinês? NAN | A DLA Piper tem escritórios em Hong Kong, Xangai e Pequim e o mercado chinês continua a ser uma aposta bastante intensa, não só em termos de crescimento nas operações na China, como também através do acompanhamento de investidores chineses no estrangeiro. Portugal tem sido um dos destinos privilegiados do investimento chinês na Europa, mas também o investimento nos países africanos de expressão portuguesa é um atrativo muito forte. A capacidade de canalizar e de ter equipas que integradamente conseguem fazer a triangulação China-Europa-África é algo que, no que nos respeita diretamente, é verdadeiramente essencial. Ora, o que a DLA faz é não só focar nesta triangulação, mas em todos os locais que sejam destino de investimento chinês. O investimento chinês é global. Advocatus | Esta integração pode ser vista como um sinal de confiança da DLA Piper na economia portuguesa?
Entrevista
Desafios Que desafios enfrenta a gestão de uma sociedade de advogados? Nuno Azevedo Lopes organiza-os em três grupos: “Em primeiro lugar, a capacidade de atrair e reter talento; em segundo lugar, a sociedade de advogados tem que ser uma parceira de negócios e tem que ter capacidade de gerar valor aos seus clientes; em terceiro lugar, a adaptação tenológica é essencial, vista numa dupla perspetiva: oferecer serviços inovadores e diferenciados; e inovação nos sistemas e nos processos que nos permitam ser mais eficientes”.
“Não creio que tenhamos que copiar o que os outros fazem, mas sem dúvida que a constante mudança fiscal todos os anos não favorece um investidor estrangeiro que queira investir em Portugal”
NAN | Manifestamente. Quando temos um player global na advocacia a focar-se em Portugal é naturalmente uma aposta porque acredita em Portugal e na evolução da economia portuguesa e que podemos adicionar valor a uma estrutura global. Não querendo entrar em análises políticas e económicas, a verdade é que temos tido vários players, de várias áreas e setores, a querer estar presentes em Portugal e a investir. Há uma panóplia grande de investimentos – em infraestruturas, em indústria, em serviços – e que têm que ser analisados de forma diferenciada. Muitos investidores estrangeiros têm mostrado interesse pelas oportunidades que surgem no país. Naturalmente que há ainda um longo caminho a percorrer.
“O que uma sociedade global tem de diferente é poder puxar os recursos certos por forma a assegurar os melhores serviços”
Advocatus | Que entraves é que ainda existem? NAN | É muito difícil dar uma causa única para que o país não possa crescer de forma mais célere. Não creio que haja soluções mágicas. Mas há um conjunto de aspetos que têm que ser trabalhados para assegurar que o investimento possa ser mais profícuo: uma justiça célere, uma previsibilidade legislativa e uma estabilidade fiscal, que permita que não haja alterações a meio dos investimentos. A lei fiscal tem que ser um instrumento de aposta no futuro do investimento. Não podemos atrair investidores e ao fim de dois ou três anos mudar a lei. Nem podemos estar obcecados em ter a lei fiscal perfeita. Sem dúvida que é essa a intenção. Mas, às vezes, ter a lei fiscal perfeita implica que, com tantas
26 advocatus abril 2017
mudanças, as empresas tenham um custo administrativo de gestão muito grande. Não é por acaso que países como o Luxemburgo ou a Holanda acabam por fazer acordos fiscais com investidores – os “tax rulings” – que estabelecem durante um determinado período qual vai ser o regime fiscal. Não creio que tenhamos que copiar o que os outros fazem, mas sem dúvida que a constante mudança fiscal todos os anos não favorece um investidor estrangeiro que queira investir em Portugal. Advocatus | Que objetivos de negócio tem a DLA Piper ABBC para este ano? NAN | O nosso objetivo é continuar a crescer. Temos tido taxas de crescimento muito interessantes nos últimos anos e este ano continuamos a manter o mesmo objetivo de crescimento a dois dígitos. Sobretudo queremos crescer cada vez mais nas capabilities de oferecer serviços sofisticados e integrados aos nossos clientes de lhes gerar valor. Outro objetivo é a valorização interna das pessoas que connosco trabalham, porque são o nosso futuro e o que nos permite oferecer melhores serviços aos nossos clientes.
advocatus.pt
Juan Picón, Global Co-Chairman da DLA Piper
A China está interessada em investir em Portugal Advocatus | O que motivou a DLA Piper a integrar a ABBC? Juan Picón | Na DLA, temos uma clara necessidade estratégica de operar com uma sociedade de advogados única em Espanha e Portugal, não apenas para o mercado ibérico, mas para outro mercado estratégico para nós enquanto firma global, designadamente América Latina e África. Nos últimos 18 meses, expandimos muito significativamente na América Latina – já tínhamos uma presença no Brasil através da Campos Melo – mas desde então temos a nossa marca no México, Colômbia, Porto Rico, Chile e Perú, e Espanha e Portugal têm em conjunto sinergias massi-
vas com a nossa presença na região, que agora com mais de 200 advogados no terreno é uma das maiores. Do mesmo modo, em África, com os nossos escritórios na África do Sul e em Casablanca (Marrocos) e o escritório deles em Angola, vemos potencial para muitas atividades conjuntas. Temos também um grupo de escritórios de advocacia DLA Piper África que nos coloca numa posição única para abordar esse mercado regionalmente, que é um dos USP (“Unique Selling Proposition”) da nossa firma. Advocatus | O que espera a DLA Piper ganhar com a integração
da ABBC e de que modo é a integração diferente da parceria entre as duas firmas? JP | Além dos benefícios que já mencionei, passaremos a ir ao mercado juntos como um, a partilhar clientes e conhecimentos, a trocar advogados entre escritórios, eles farão parte de todas as nossas reuniões e nós das deles. Seremos vistos como um. Advocatus | Como observam o mercado português? JP | Como um mercado com oportunidades de consolidação em determinados setores. Recentemente, temos estado envolvidos em negócios-chave nos
27 advocatus abril 2017
setores financeiro e de seguros que foram claramente grandes negócios para a sociedade global. Mas, para além disso, olho para o mercado português como olho para o espanhol, ou para qualquer outro mercado em que operamos não isoladamente, mas como parte da estratégia regional e global, e, por todas essas razões, olho com otimismo. Por exemplo, somos uma das maiores empresas da China. Estive lá recentemente em reuniões com os nossos clientes e eles continuam a estar realmente interessados na América Latina, em Espanha e Portugal. Para nós, é uma oportunidade.
Estante
advocatus.pt
O estado da arte em Direito Comercial A Smarteca, biblioteca online da Wolters Kluwer, constitui um importante repositório das obras mais atuais em matéria de Direito Comercial e Societário. Nesta edição da Estante apresentamos uma seleção desse acervo, que pode ser consultado a partir de qualquer dispositivo digital.
JusCódigo Comercial
JusBásico Comercial
Reúne numa única obra conteúdos de legislação comercial, minutas de formulários e jurisprudência analisada por especialistas, permitindo o acesso de forma rápida e intuitiva através de links às remissões entre as normas, jurisprudência e formulários relacionados. Sempre que existam alterações nesta matéria, o subscritor recebe gratuitamente durante um ano a obra atualizada.
Mais que um Código e Legislação Comercial, JusBásico Comercial permite aceder a legislação sempre atualizada e disponível ao alcance de um clique.
JusFormulários Sociedades 2.ª edição
JusFormulários Bancário
Esta nova edição dá acesso a formulários, notas de autor com referência a legislação e jurisprudência sobre o direito das sociedades, de que são exemplo matérias como participações sociais; sociedades civis e comerciais; contencioso societário e extrajudicial, entre outras. Além disso, é possível adaptar os formulários às necessidades de cada utilizador: partilhar, editar, tendo também a possibilidade de marcar os textos, incluir notas, criar dossiers e inclusivamente incorporar os seus próprios documentos, de forma a que a informação esteja sempre acessível e sistematizada.
Neste título destacam-se os formulários de direito bancário, nomeadamente sobre os temas sigilo bancário, compensação bancária; locação financeira; garantia bancária; crédito ao consumo; factoring, entre outros temas. Este formato possibilita a adaptação dos formulários às necessidades individuais: partilhar, editar, tendo também a possibilidade de marcar os textos, incluir notas, criar dossiers e inclusivamente incorporar os seus próprios documentos, de forma a que a informação esteja sempre acessível e sistematizada.
JusPrático Sociedades por Quotas e Sociedades Anónimas
O Coupon Swap como Instrumento Financeiro Derivado
Proporciona uma visão global sobre as alterações produzidas no regime das sociedades comerciais por quotas e anónimas e as modificações avulsas que nele se anunciaram, numa obra caracterizada pela inclusão de referências à legislação fundamental e complementar, jurisprudência, doutrina e comentários de autor.
Resulta da reflexão do autor sobre o tema e sobre o debate em Portugal em torno dos contratos swaps, produtos financeiros associados a empréstimos bancários, que saltaram para a ribalta da cena política. Com esta leitura, fica-se a saber o que são e a perceber o que torna problemáticos os contratos assinados por várias empresas públicas.
28 advocatus abril 2017
Dossiê
advocatus.pt
Carros sem condutor… como enquadrar? Advogados de várias sociedades refletem sobre as possibilidades de enquadramento legal da circulação de carros autónomos nas estradas nacionais. A CSBA entende ser urgente desenhar um quadro legislativo onde o “exponencial progresso” nesta área seja acautelado e potencializado. Para a managing partner, Mafalda Rodrigues Fonseca, o atual quadro legislativo é “demasiado incerto e vago”. Considera, pois, imperativa a definição de um regime, principalmente quanto à responsabilidade, que permita a circulação de automóveis sem condutor, no mais curto espaço de tempo. Já a advogada associada do departamento de TMT da PLMJ Inês Castro Ruivo alerta que a programação do software destes veícu-
los coloca dilemas éticos difíceis de resolver. Nota que, para além das questões relativas à imputação de responsabilidade e aos dilemas morais que se podem colocar, uma das preocupações dos fabricantes destes veículos é proteger os respetivos sistemas contra o hacking. Mas aqui, diz, a lei do cibercrime já prevê a criminalização de atos de sabotagem ou acesso ilegítimo a sistemas informáticos. O advogado principal da Abreu Advogados Luis Fraústo Varona propõe, por sua vez, que um dos enquadramentos possíveis para
a responsabilidade civil por danos causados pelos veículos de condução autónoma seja o da sua subsunção no quadro legal que resulta do 493.º do Código Civil, com as devidas adaptações e salvaguardando-se as necessárias adaptações legais em sede de Código da Estrada e do regime jurídico do contrato de seguro automóvel. A associada sénior da CTSU – Sociedade de Advogados Joana Mota Agostinho também antecipa a revisão da legislação rodoviária, bem como a conciliação com as atuais regras de responsabilidade civil e criminal e as re-
29 advocatus abril 2017
percussões no sector dos seguros. Por fim, António Moura Portugal e Inês Santana Metello, da DLA Piper ABBC, salientam as consequências desta nova tecnologia em termos de cibersegurança e de proteção de dados pessoais. Chamam a atenção para as múltiplas implicações que forçam uma revisão dos standards técnicos e legais de segurança rodoviária. E defendem que a legislação nacional deve começar por se debruçar sobre funções de “mera assistência à condução”, reservando os campos mais sensíveis para regulação a nível europeu.
Dossiê
Da responsabilidade civil extracontratual Luis Fraústo Varona Advogado principal da Abreu Advogados
Os veículos sem motorista são, progressivamente, uma realidade à escala global. Diversas multinacionais anunciaram já o serviço destacando as mais-valias desta nova forma de viajar, alegadamente mais segura e cómoda. No verso da medalha está o enquadramento jurídico desta nova realidade, designadamente em matéria de responsabilidade civil extracontratual à luz da legislação vigente em Portugal. Questão prévia à análise do tema da responsabilidade civil é a da actualização da noção de circulação terrestre de veículos autónomos. Dispõe o Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 16 de Março, no seu artigo 11.º número 1, que “todo o veículo ou animal que circule na via pública deve ter um condutor”. Não se ultrapassando este obstáculo legal, o recurso a este tipo de veículos constituirá sempre um ilícito contra-ordenacional sancionável com uma coima que vai dos €60 aos €300. Em sede de responsabilidade civil, os acidentes de viação têm assento legal nos artigos 499.º e seguintes do Código Civil (CC), sendo qualificada a responsabilidade como objectiva. O artigo 503.º, epigrafado de “Acidentes causados por veículos”, impõe que “aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse […] responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo.”, presumindo-se, nestes casos, que é o proprietário quem tem a direcção efectiva do veículo usando-o no seu próprio interes-
Um dos enquadramentos possíveis para a responsabilidade civil por danos causados pelos veículos de condução autónoma será o da sua subsunção no quadro legal que resulta do 493.º do CC, com as devidas adaptações e salvaguardando-se as necessárias adaptações legais em sede de Código da Estrada e do regime jurídico do contrato de seguro automóvel.
se. Contudo, enquanto presunção, esta pode ser ilidida ao abrigo do número 2 do artigo 350.º, provando-se que outrem possuía a direcção efectiva do veículo. Estes dois requisitos da responsabilidade civil decorrentes de danos provocados por veículos sem condutor, sendo de verificação cumulativa, levantam um problema de imprevisibilidade na jurisprudência: sendo possível identificar quem tem o interesse na utilização de um veículo autónomo, discutível se tornará provar e perceber, nos
“Questão prévia à análise do tema da responsabilidade civil é a da actualização da noção de circulação terrestre de veículos autónomos. (…) O paradigma do contrato de seguro automóvel terá, também ele, que se adaptar a esta nova realidade”
casos em que os veículos são autónomos e, por isso, se dirigem a eles próprios, quem é o detentor da sua direcção efectiva. Acresce que o conceito de “direcção efectiva” não reúne unanimidade na jurisprudência. Aqueles que se tornem credores do direito à indemnização correm o risco de o ocupante/proprietário de veículo autónomo refutar a presunção referida naquele artigo 503.º provando que não possuía a direcção efectiva do veículo, caindo-se assim numa lacuna que, em última instância, resultará numa transferência do risco para a seguradora que celebrou contrato de seguro com o tomador em moldes distintos daqueles que têm vindo a ser celebrados, provavelmente com prémios muito superiores aos actualmente praticados. O paradigma do contrato de seguro automóvel terá, também ele, que se adaptar a esta nova realidade. Neste âmbito, surge outra via: a responsabilidade subjectiva. Como pode a culpa, num acidente com veículo autónomo, ser apurada? Refere o artigo 493.º do CC que aquele sobre quem recaia um dever de vigilância sobre coisas responde pelos danos que estas causarem uma vez violado esse dever de vigilância. A culpa in vigilando poderá ser imputada ao responsável pelo accionamento do mecanismo de condução autónoma, de acordo com um critério de razoabilidade, não parecendo concebível que quem accione este mecanismo esteja desonerado do dever de vigilância sobre o veículo autónomo.
30 advocatus abril 2017
“Sendo possível identificar quem tem o interesse na utilização de um veículo autónomo, discutível se tornará provar e perceber, nos casos em que os veículos são autónomos e, por isso, se dirigem a eles próprios, quem é o detentor da sua direcção efectiva”
Um dos enquadramentos possíveis para a responsabilidade civil por danos causados pelos veículos de condução autónoma será o da sua subsunção no quadro legal que resulta do 493.º do CC, com as devidas adaptações e salvaguardando-se as necessárias adaptações legais em sede de Código da Estrada e do regime jurídico do contrato de seguro automóvel.
advocatus.pt
Transportes pelo ar, legislação por terra A quem imputar a responsabilidade em caso de acidente, aos fabricantes dos veículos, ou às seguradoras, por cada um deles, contratadas? Não existe, ainda, legislação nesta matéria.
Mafalda Rodrigues Fonseca Managing partner da CSBA – Sociedade de advogados
Com a rápida evolução da robótica e dos autómatos, quais serão as consequências jurídicas no caso de passarem a circular os denominados “veículos sem condutor”? A autorização da circulação deste tipo de veículos, sem a aprovação do correspondente regime jurídico, suscita inúmeras questões, merecendo especial atenção a da responsabilidade. Em caso de acidente, sobre quem recai a responsabilidade? Deixando de existir um condutor “fisico” é necessário definir de quem será a responsabilidade em caso de acidente. A marca Volvo está disposta a responsabilizar-se pelos danos causados pelos seus veículos, quando o automóvel circule em modo autónomo. Já a Tesla defende que deve ser a seguradora contratada pelo proprietário do veículo a assumir a responsabilidade. A Airbus, que desenvolveu o programa “Urban Air Mobility”, tem como objetivo o transporte de clientes pelo ar dentro das grandes cidades. No Dubai, esta a ser desenvolvido o “taxi-drone”, onde, até julho de 2017, é proposto realizar o serviço de transporte de passageiros entre locais pré-determinados – cenário da “Guerra das Estrelas” a chegar ao século XXI. A evolução obriga a algumas definições. A quem imputar a responsabilidade em caso de acidente, aos fabricantes dos veículos, ou às seguradoras, por cada um deles, contratadas? Não existe, ainda, legislação nesta matéria. Uma possível solução passa por tratar condutores humanos e computorizados da mesma forma. Neste quadro, o veículo autónomo seria considerado responsável nas mesmas circunstâncias, em que um ser humano o seria se adoptasse a mesma conduta.
“É imperativa a definição de um regime, principalmente quanto à responsabilidade, que permita a circulação de automóveis sem condutor, no mais curto espaço de tempo”
Atualmente, a lei existente assume que é um ser humano a controlar o veículo, pelo que empresas como a Google e a Tesla implementaram um sistema híbrido nos seus veículos autónomos, exigindo que o passageiro que se encontra no lugar do condutor mantenha as mãos junto ao volante e esteja concentrado na estrada. Esta não poderá ser, de todo, a solução de futuro. A Lei tem de ir ao encontro dos avanços tecnológicos. Ao longo dos anos foram investidos biliões de euros a desenvolver uma rede de estradas e infraestruturas de transporte com base na visão humana. Apesar de o caminho ser o da alteração dessa infraestrutura e da lei, indo ambas ao encontro da tecnologia, o que é certo é que será sempre um processo moroso e dispendioso. O presente quadro legislativo é demasiado incerto e vago, adjetivos que são contrários ao progresso. É imperativa a definição
de um regime, principalmente quanto à responsabilidade, que permita a circulação de automóveis sem condutor, no mais curto espaço de tempo. De acordo com um estudo realizado nos Estados Unidos, a necessidade de agilizar o processo de implementação de veículos autónomos, prende-se principalmente com a substituição de condutores humanos, por tecnologia de condução automatizada, com capacidade de salvar 30.000 mil vidas humanas/ano. A transição para um sistema de transporte totalmente autónomo pode prevenir, anualmente, cinco milhões de acidentes, conservar sete biliões de litros de combustível, preservando o ambiente, e ainda poupar milhares de biliões de euros em produtividade desperdiçada e custos relacionados com acidentes. A CSBA entende ser urgente desenhar um quadro legislativo onde o exponencial progresso/alteração nesta área seja acautelado e potencializado.
“A CSBA entende ser urgente desenhar um quadro legislativo onde o exponencial progresso/alteração nesta área seja acautelado e potencializado”
31 advocatus abril 2017
António Seabra Advogado estagiário
Dossiê
Da ficção científica para uma realidade próxima Joana Mota Agostinho Associada sénior da CTSU – Sociedade de Advogados
Poucos são os que permanecem céticos quanto à introdução dos veículos autónomos na nossa sociedade como uma realidade próxima e irreversível. Com a comercialização planeada já para 2020, os veículos autónomos serão concebidos para permitir uma circulação autonomizada, sem qualquer intervenção humana, através da incorporação de equipamentos eletrónicos que permitirão uma visão alargada a 360º, com um computador de bordo a processar a informação recolhida e a gerir a posição e o comportamento do veículo. Se é inegável que estes novos veículos trazem novas oportunidades para os diferentes players no mercado da mobilidade, bem como benefícios sociais e ambientais incontestáveis, que adaptações terá o atual quadro regulatório deste sector que sofrer para responder aos desafios daqui resultantes? Em primeiro lugar, antecipamos que a legislação rodoviária terá de ser revista, de forma a enquadrar juridicamente este tipo de transporte e os seus utilizadores e adaptar e/ou eliminar algumas das atuais regras rodoviárias que, por estarem associadas a um comportamento humano, deixam de fazer sentido. Será igualmente prioritário prever novas regras de sinalização de estrada, bem como definir o nível de responsabilidade dos fabricantes, gestores de frota, proprietários e utilizadores destes veículos em caso de acidente, defeito ou falha técnica no sistema da viatura. Não menos importante será a necessidade de definir os níveis de segurança a implementar no carro, de forma a prevenir atos piratas ou terroristas, assim como as sanções para violações desta natureza.
Se é inegável que estes novos veículos trazem novas oportunidades para os diferentes players no mercado da mobilidade, bem como benefícios sociais e ambientais incontestáveis, que adaptações terá o atual quadro regulatório deste sector que sofrer para responder aos desafios daqui resultantes?
“Sem prejuízo da necessidade de legislação, a dúvida de como conciliar a utilização desta tecnologia com as atuais regras de responsabilidade civil e criminal permanecerá”
Sem prejuízo da necessidade desta legislação, a dúvida de como conciliar a utilização desta tecnologia com as atuais regras de responsabilidade civil e criminal permanecerá. Perante um acidente causado por um ato humano alheio ao automóvel (um peão que não atravessa na passadeira ou um ciclista que não respeita as regras de trânsito), quem deverá ser responsabilizado? Acresce, com a entrada em vigor do Regulamento Geral de Proteção de Dados e com a sua aplicação a partir de maio de 2018, como conciliar a análise da informação pessoal recolhida pelas viaturas para efeitos da sua gestão, aperfeiçoamento do serviço (ao nível da segurança e experiência do consumidor) e avaliação de acidente, com as obrigações ali previstas? Haverá ainda repercussões no sector dos seguros, prevendo-se seguros a cobrir apenas os riscos associados a cada viagem e seguros a cobrir os fabricantes ou gestores de frota contra eventuais defeitos na tecnologia, ataques cibernéticos e acidentes provocados por outros veículos ou atividade humana. A introdução dos veículos autónomos no nosso mercado alterará ainda o paradigma da prestação de serviços de transporte para um “Mobility as a Service” em que operadores públicos e privados disponibilizarão os seus automóveis para viagens a pedido, as quais serão geridas e pagas através de uma plataforma eletrónica. Esta nova dinâmica trará as inevitáveis alterações na responsabilidade por eventuais acontecimentos que ocorram durante a viagem, bem como uma interoperabilidade
32 advocatus abril 2017
“Como conciliar a análise da informação pessoal recolhida pelas viaturas para efeitos da sua gestão, aperfeiçoamento do serviço (ao nível da segurança e experiência do consumidor) e avaliação de acidente, com as obrigações previstas no Regulamento Geral de Proteção de Dados?”
de sistemas e serviços nas comunicações vehicle-to-vehicle (V2V) ou vehicle-to-infrastructure (V2I). As situações aqui assinaladas terão que necessariamente ser tidas em contas na regulação deste novo meio de transporte. É recomendável um maior controlo numa primeira fase de testes, em prol da segurança de pessoas e bens, bem como uma implementação faseada, no sentido de garantir que estas e outras questões sejam devidamente identificadas e respondidas, garantindo a segurança da comunidade e o desbloqueio no desenvolvimento da tecnologia e o investimento económico neste sector.
advocatus.pt
Próxima paragem: regulação A regulação ex-ante traz segurança jurídica e previsibilidade, mas também pode consubstanciar uma restrição ao desenvolvimento. Por outro lado, uma regulação ex-post sobre requisitos técnicos pode ser mais acertada, mas existe o risco de poder vir a tornar-se numa barreira de acesso ao mercado de determinados veículos em prejuízo de outros.
Recentemente o Governo anunciou que irá avançar com legislação que permita testar a circulação de carros autónomos nas estradas portuguesas. Este anúncio surge após a receção do projeto AUTOCITS, que pretende ensaiar a condução autónoma nas cidades europeias e que arrancará já este ano. Com efeito, a indústria automóvel tem apostado fortemente nestas tecnologias e as estimativas revelam que os primeiros veículos autónomos – i.e. que não exigem qualquer intervenção humana – poderão estar a circular nas estradas europeias entre 2020 e 2030. Assim, torna-se necessário que a legislação acompanhe as evoluções tecnológicas neste setor e que se regulamente o respetivo funcionamento. O principal dilema será como regular. A regulação ex-ante traz segurança jurídica e previsibilidade, mas também pode consubstanciar uma restrição ao desenvolvimento, uma vez que não é possível prever todo o universo de variações tecnológicas. Por outro lado, uma regulação ex-post sobre requisitos técnicos pode ser mais acertada, mas existe o risco de poder vir a tornar-se numa barreira de acesso ao mercado de determinados veículos em prejuízo de outros. Não obstante, independentemente da opção, há um aspeto que nos parece essencial e que reside na necessária revisão das normas do Código da Estrada. As regras do Código da Estrada, em concordância com os princípios da Convenção de Viena de 1968, estabelecem que todo o veículo que circule na via pública deve ter um condutor. Uma vez que o objetivo da condução autónoma é, precisamente, o de afastar o erro humano ao substituir o homem por um computador, é ne-
“A harmonização destas matérias será essencial para o bom funcionamento do mercado interno, devendo a legislação nacional começar por se debruçar sobre funções de mera assistência à condução, reservando os campos mais sensíveis para regulação a nível europeu”
cessária uma revisão legislativa que autorize o uso destas tecnologias. Outro ponto da maior relevância é a análise das consequências desta nova tecnologia em termos de cibersegurança e proteção de dados pessoais. De modo a garantir a segurança rodoviária e o bom funcionamento dos veículos autónomos, estes estão a ser dotados de uma série de sistemas, câmaras e sensores que registam informação do que os rodeia e que comunicam entre si e com o seu sistema operador. A estes dados acrescem outros relacionados com o próprio utilizador, como as suas rotinas ou hábitos. A sensibilidade desta informação exige que a sua proteção
seja devidamente assegurada, quer para garantir a privacidade dos dados pessoais dos utilizadores, quer para os proteger de qualquer intervenção maliciosa. Outra questão da maior importância que está a ser ponderada é a da responsabilidade em caso de acidente rodoviário. Dependendo do nível de autonomia, pode tornarse particularmente difícil saber a quem imputar responsabilidade: ao fabricante do automóvel, ao programador do sistema ou ao condutor/ ocupante do veículo? Esta questão leva-nos a crer que os níveis de autonomia na condução devem ser devidamente categorizados – preferivelmente através de standards internacionais – e, em relação a cada um deles, determinar quem suportará os custos de um eventual acidente. Em todo o caso, nem assim se resolverão todos os dilemas, uma vez que é necessário prever potenciais avarias do sistema e casos em que este reporta o acidente como inevitável. Igualmente problemática é a questão ética de, perante tal inevitabilidade, ser um algoritmo a decidir questões que tanto impacto têm na vida humana. Em suma, a transferência das funções de condução para uma máquina tem múltiplas implicações que forçam uma revisão dos standards técnicos e legais de segurança rodoviária. Considerando o espetro da mobilidade europeia, parece-nos que a harmonização destas matérias será essencial para o bom funcionamento do mercado interno, devendo a legislação nacional começar por se debruçar sobre funções de mera assistência à condução, reservando os campos mais sensíveis para regulação a nível europeu.
33 advocatus abril 2017
António Moura Portugal Sócio da DLA Piper ABBC
Inês Santana Metello Estagiária da DLA Piper ABBC
Dossiê
advocatus.pt
Do futuro para a sua garagem Inês Castro Ruivo
Onde hoje existe o vazio, nascerá o enquadramento legislativo para a circulação de carros autónomos nas estradas. De quem é a responsabilidade em caso de acidente? Será preciso ter carta de condução para guiar um destes carros? Continuarei a precisar de seguro automóvel?
Advogada Associada do departamento de TMT da PLMJ
De acordo com as previsões mais recentes, os carros totalmente autónomos chegarão ao mercado entre 2020 e 2025. Na opinião dos fabricantes, o caminho tecnológico a percorrer é simples, quando comparado com os demais desafios que a circulação de carros autónomos suscita. Ganhar a confiança dos condutores é o primeiro desafio. Mais de metade dos norte-americanos respondeu, num recente inquérito, que não gostaria de circular na estrada num carro que se guia sozinho.1 Apesar da desconfiança de alguns, grandes marcas como a Apple, a Google, a Toyota, a Uber e a Volvo estão atualmente a testar e a desenvolver tecnologia com o propósito de tornar os carros autónomos. A Tesla Motors anunciou recentemente que todos os carros da marca atualmente em produção estarão equipados com hardware que lhes permitirá conduzir sozinhos. Caberá aos fabricantes alterar a perceção pública, que parece ser conservadora, relativamente a este tipo de tecnologia. Um dos argumentos mais fortes é o aumento exponencial da segurança oferecida pelos carros autónomos. Estima-se, presentemente, que o número de acidentes possa ser reduzido em cerca de 90%. O segundo desafio é jurídico: onde hoje existe o vazio, nascerá o enquadramento legislativo para a circulação de carros autónomos nas estradas. De quem é a responsabilidade em caso de acidente? Será preciso ter carta de condução para guiar um destes carros? Continuarei a precisar de seguro automóvel?
“A programação do software destes veículos coloca dilemas éticos difíceis de resolver. Perante a eventualidade de chocar contra um peão ou, em alternativa, fazer embater o carro e os seus ocupantes contra um outro obstáculo que poderá colocar em causa a integridade física destes, que decisão deve o veículo tomar?”
Nos EUA, alguns Estados já adotaram legislação no sentido de permitir a circulação de carros autónomos. O enquadramento jurídico está, contudo, longe de ser claro e cristalino. Os próprios fabricantes têm diferentes entendimentos quanto à responsabilidade que pretendem assumir. A Volvo afirma que se irá responsabilizar pelos danos causados pelos seus veículos, caso o acidente tenha ocorrido quando o carro estava a circular em modo autónomo. A Tesla, por sua vez, afirma que devem ser as seguradoras do condutor a assumir a responsabilidade por eventuais danos. É claro, no entanto, que um acidente causado por um defeito no hardware ou software do veículo será imputável ao respetivo fabricante, sobretudo se a falha for grave. A programação do software destes veículos coloca dilemas éticos ainda mais difíceis de resolver. Perante a eventualidade de chocar contra um peão ou, em alternativa, fazer embater o carro e os seus ocupantes contra um outro obstáculo que poderá colocar em causa a integridade física destes, que decisão deve o veículo tomar? Para além das questões relativas à imputação de responsabilidade e aos dilemas “morais” que se podem colocar, uma das preocupações dos fabricantes destes veículos é proteger os respetivos sistemas contra ataques maliciosos de terceiros, isto é, contra o hacking. Neste aspeto, os avanços tecnológicos não colocam especiais dificuldades de enquadramento jurídico, uma vez que a Lei do Cibercrime já prevê a
34 advocatus abril 2017
“Ama das preocupações dos fabricantes destes veículos é proteger os respetivos sistemas contra ataques maliciosos de terceiros, isto é, contra o hacking”
criminalização de atos de sabotagem ou acesso ilegítimo a sistemas informáticos. Há cerca de 100 anos, dizia Henry Ford: “If I had asked people what they wanted, they would have said faster horses.” Os céticos de hoje circularão, muito provavelmente, nos carros autónomos de amanhã.
1. Inquérito realizado pela Morning Consult em 2016, disponível em https:// morningconsult.com/2016/02/08/voters-arent-ready-for-driverless-cars -poll-shows/
Www
advocatus.pt
NOTÍCIAS SRS premeia estudantes de Direito
As 100 melhores na arbitragem da GAR A Global Arbitration Review publicou uma lista com as 100 melhores sociedades de advogados do mundo na área de prática de arbitragem. Entre as distinguidas incluem-se oito do mercado português: Cuatrecasas, Garrigues, Morais Leitão,
A SRS Advogadas, em parceria com a Almedina e a LexDebata, acaba de lançar o Prémio Fernando Pessoa Jorge para estudantes de Direito de universidades portuguesas e dos PALOP. Este prémio vai destacar anualmente o melhor trabalho de investigação na área do Direito, apresentado com uma análise critica inédita (de doutrina, jurisprudência e/ou legislação). O vence-
dor receberá 3.000 euros, aos quais acresce a eventual publicação do trabalho e um estágio na sociedade. O júri é presidido por Manuel Porto, da Universidade de Coimbra, e é constituído por docentes da Universidade Nova de Lisboa, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, da Universidade de Lisboa e da Católica Research Centre for the Future of Law.
The Lawyer: firma ibérica do ano é portuguesa A Vieira de Almeida venceu o prémio de firma ibérica do ano na oitava edição dos The Lawyer European Awards 2017. Por sua vez, a Cuatrecasas foi distinguida pelo “negócio bancário e financeiro europeu do ano” devido à assessoria prestada ao Banco de
VdA lidera em reputação A Vieira de Almeida é a sociedade de advogados com maior índice reputacional no mercado português, de acordo com o estudo Global Repscore Pulse, da consultora OnStrategy, realizado em parceria com a Corporate Excellence Foundation. Assim, a firma liderada por João Vieira de Almeida ficou classificada como “marca robusta (B-)” com 74,01 pontos. Também integram
Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS), PLMJ, Uría Menéndez – Proença de Carvalho, CMS, DLA Piper e Linklaters. As distinções são baseadas num inquérito a utilizadores de arbitragem, advogados e árbitros.
o ranking a Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva e Associados (MLGTS), com 71,28 pontos, e a Uría Menéndez – Proença de Carvalho, com 70,13 pontos. Apesar de a pontuação ser mais baixa, ambas integram a mesma classificação de “marca robusta”. O Global Repscore Pulse visa avaliar a reputação das marcas no mercado nacional com um estudo junto de mais de 40 mil cidadãos. 35 advocatus abril 2017
Portugal no processo de resolução do Banif. Os prémios foram atribuídos pela revista britânica The Lawyer, distinguindo 27 firmas, em 24 categorias. O júri foi composto por 19 jurados, sócios de firmas de advogados internacionais e juristas de multinacionais.
Www
ANJAP cria Comissão de Direito Fiscal MLGTS, PLMJ e VdA destacam-se na Chambers A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS), a PLMJ e a Vieira de Almeida & Associados (VdA) são as sociedades portuguesas mais destacadas, em band 1, pelo diretório Chambers & Partners Europe de 2017. A primeira com 12 áreas de prática e as outras duas com 11. A MLGTS é distinguida em Bancário e financeiro; Mercados de capitais; Concorrência; Contencioso; Trabalho; Energia; Seguros; Planeamento; Projetos; Direito Público; Fiscal; e General Business Law Porto. A PLMJ foi salientada em 11 áreas: Concorrência; Fusões e aquisições; Contencioso; Trabalho; Seguros; Propriedade intelectual; Imobiliário; Reestruturações e insolvências; Fiscal; Telecomunicações; e General Business Law Porto. Já a VdA recolhe indicações em Bancário e financeiro; Mercados de capitais; Concorrência; Fusões e aquisições; Propriedade intelectual; Life sciences; Private equity; Projetos; Direito Público; Reestruturações e insolvências; e Telecomunicações.
Segue-se a Linklaters, distinguida em Bancário e financeiro; Mercados de capitais; Fusões e aquisições; Private equity; Projetos; e Reestruturações e insolvências. A Uría Menéndez – Proença de Carvalho conta com quatro áreas indicadas (Mercados de capitais; Fusões e aquisições; Contencioso; e Imobiliário) e a Garrigues três (Propriedade intelectual; Imobiliário; e Fiscal). Com duas áreas destacadas figuram a CS & Associados (Bancário e financeiro; e projetos), a DLA Piper (Trabalho; e Transportes - aviação) e a SRS Advogados (Concorrência; e Telecomunicações). Por último, com apenas uma área estão: a Andrade Dias e Associados (Transportes -marítimo); Anselmo Vaz, Afra e Associados (Life sciences); A. Henriques, A. C. Pimentel (Transportes –marítimo); CMS Rui Pena & Arnaut (Energia); Cuatrecasas (Transportes - aviação); Miranda (Energia); Sérvulo (Direito Público); e Sofia Galvão Advogados (Planeamento).
Católica, NOVA e ISCTE entre os melhores mestrados da Europa A Católica Global School of Law, da Universidade Católica Portuguesa, a Nova IMS, da Universidade de Lisboa, e o ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa integram o ranking dos Melhores Mestrados em Direito da Europa Ocidental, da Eduniversal. O LL.M. “Law in a European and Global Context” da Católica Global School of Law foi considerado o melhor programa de ensino pós-graduado em Direito em Portugal, ocupando a 14.ª posição num ranking de 50 cursos. Esta instituição de ensino coloca outro mestrado no ranking dos
melhores da Europa Ocidental, o “Advanced LL.M. em “International Business Law”, na 27.ª posição. Três lugares antes, na 24.ª posição, está o master in law and financial markets da Nova IMS, da Universidade Nova de Lisboa. Ainda neste top está o mestrado em Direito das empresas, do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, em 40.º. O diretor da Global School of Law, Luís Barreto Xavier, considera a presença nesta seleção de programas “mais um reconhecimento internacional da aposta na inovação e na capacidade para formar para o mercado global”.
A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS
A Associação Nacional dos Jovens Advogados Portugueses (ANJAP) acaba de criar uma Comissão de Direito Fiscal. O objetivo é estudar temas fiscais e aduaneiros, promover conferências e estabelecer parcerias com universidades. A comissão é liderada por Catarina Belim (Impostos Indiretos e Tributação Aduaneira) e José Calejo Guerra (Impostos Diretos e Tributação Internacional), ambos advogados es-
pecializados na área da fiscalidade. Explica a ANJAP que a nova comissão pretende ser uma “plataforma aglutinadora de todos os jovens advogados e advogados estagiários com interesse em temas fiscais”, resultando a sua criação “da perceção da importância destas matérias” e “da necessidade de desenvolvimento de fóruns de discussão e reflexão que contribuam para mais e melhor justiça fiscal”.
WWL: Oito portugueses especialistas em energia A Who’s Who Legal destacou oito advogados portugueses como especialistas na área da energia. Assim, foram indicados Agostinho Pereira de Miranda, Catarina Távora e Nuno Antunes, sócios da Miranda. Da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados foram distinguidos os sócios Nuno Galvão Teles, Ricardo
Andrade Amaro e Tomás Vaz Pinto. Também Rui Amendoeira e Vanda Cascão, sócios da Vieira de Almeida & Associados foram destacados. O Who’s Who Legal distingue advogados em 32 áreas de prática, sendo a seleção efetuada entre os pares e clientes de profissionais originários de 180 países.
SRS faz aliança em Malta A SRS Advogados acaba de assinar um acordo de aliança estratégica com a sociedade maltesa Mamo TCV. “A parceria com a Mamo TCV vem reforçar o nosso alcance internacional, respondendo às necessidades dos nossos clientes com interesses em Malta e que se está a tornar cada vez mais um centro financeiro de destaque a nível mundial”,
36 advocatus abril 2017
destaca o sócio sénior da SRS Advogados, Pedro Rebelo de Sousa. “A Mamo TCV é líder na advocacia em Malta e é um escritório que espelha os mesmos ideais e valores da SRS em Portugal”, acrescenta. A Mamo TCV Advogados é uma sociedade de advogados full-service, composta por 49 advogados e 13 sócios.
advocatus.pt
Pessoas Foi contratado pela Nobre Guedes, Mota Soares & Associados para atuar nas áreas de Direito do Ambiente e Contencioso Ambiental e Urbanístico. Licenciou-se na Faculdade de Direito de Lisboa e concluiu um mini MBA no INDEG/ISCTE. É fundador e presidente do Grupo de Estudos de Ornamento do Território e Ambiente e já esteve ligado à Representação Permanente de Portugal na União Europeia. Desempenhou funções como secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território entre 2013 e 2015.
PAULO LEMOS
Foi designado membro do Conselho de Prevenção da Corrupção por indicação da Ordem dos Advogados. Desde 1994 que integra a Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados e é sócio desde 2005. Coordena uma das equipas de contencioso e arbitragem e é vogal do Conselho de Administração da sociedade desde 2008. Foi membro do Conselho Superior de Magistratura entre maio de 2009 e novembro de 2011.
RUI PATRÍCIO
RUI CAMACHO PALMA
TIAGO MARCELINO MARQUES
É o mais recente sócio da Linklaters. Na sociedade, já era responsável pelo departamento de Direito Fiscal e pela seleção e acompanhamento dos projetos de “community investment” do escritório de Lisboa. O advogado tem um master of Arts in Taxation pela University of London, Institute of Advanced Legal Studies e é docente no mestrado em Direito Fiscal da Faculdade de Direito da Universidade Católica desde 2013.
Assumiu a coordenação do departamento de Trabalho e Segurança Social da Raposo Subtil e Associados. O departamento foi autonomizado, deixando, assim, de estar sob a alçada do Contencioso geral. O advogado está na RSA desde 2010. Concluiu o bacharelato na Escola Europeia de Bruxelas II em 1996, e em 2004 licenciouse pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
O agregador da advocacia
www.advocatus.pt
Toda a Informação por apenas 180 EUROS SIM, desejo assinar o jornal Advocatus com o custo total de 180 euros (12 edições).
Formas de pagamento: Transferência bancária para o NIB 0007 0000 16658500253 23. Envio do comprovativo para o fax 210 435 935 ou através do email assinaturas@briefing.pt Cheque à ordem de Newsengage – Media, Conteúdos e Comunidades, SA, Av. Infante D. Henrique, nº 333 H, 37, 1800-282 Lisboa
A oferta será entregue após boa cobrança.
Assinatura
Os dados recolhidos são processados automaticamente pela Newsengage – Media, Conteúdos e Comunidades, SA e destinam-se à gestão do seu pedido e à apresentação de futuras propostas. O seu fornecimento é facultativo, sendo-lhe garantido o acesso à respetiva retificação. Caso não pretenda receber propostas comerciais de outras entidades, assinale aqui
37 advocatus abril 2017
Montra
advocatus.pt
Cosmética para homens exigentes Johnnie Black é a nova marca brasileira de cosmética que acaba de chegar a Portugal. Exclusivamente masculina, oferece uma gama de produtos de barbearia, para o cabelo e a barba, mas que podem ser também utilizados no corpo. Criada a pensar na satisfação dos homens mais exigentes, foi colocado todo o cuidado na escolha da fragrância, fresca e agradável, e dos princípios ativos, compostos e pH. Também o design é masculino, com cores cortes e alusões visuais a hobbies considerados típicos do género.
Para amantes de champanhe
Uma explosão celestial no pulso O BR S Novarosa é o novo membro da coleção de relógios estelares da Bell & Ross, apresentando-se como uma peça feminina dotada de espírito celeste. O tom rosa dos mostradores alude ao evento supernova, um fenómeno raro onde a explosão de uma estrela no vazio liberta uma auréola rosada. Trata-se de um relógio feminino e elegante, com um design que reinterpreta o modelo icónico BR S. A grande novidade está na opção de um bracelete em malha milanesa, uma técnica de entrelaçamentos de fios de aço.
A Maison Ruinart lançou dois novos vintages para os paladares mais exigentes. O primeiro é um Dom Ruinart Blanc de Blancs 2006, com um equilíbrio elegante e arejado é 100% de Chardonnay de vinhas Grand Cru da Côte des Blancs e da encosta de Reims. O segundo, um Dom Ruinart Rosé 2004, é intenso e aromático, composto por Chardonnay Grand Cru da Côte de Blancs e por Pinot Noir. O cuidado nas proporções e o repouso de quase uma década tornam estes vintages uma boa experiência para os amantes de champanhe.
Mais estilo O CITROËN C4 CACTUS é um automóvel que se apresenta pelo estilo e irreverência, características estas reforçadas com a chegada de duas novidades que tornam este automóvel mais elegante. A primeira é a entrada em Portugal da Série Especial OneTone, em que o contraste visual diminui com a adoção de uma cor única. A segunda novidade está mais ligada ao desempenho: a nova caixa de velocidades automática EAT6, associada ao motor 1.2 PureTech 110 S&S chega em maio para uma condução com maior suavidade e conforto.
Conforto com influência de Niemeyer A influência da Casa das Canoas projetada em 1951 por Oscar Niemeyer é notória nas linhas da poltrona criada pela JSB e que recebeu o apelido do arquiteto. Assim, a poltrona Niemeyer espelha o conforto na cobertura com formas fluidas e arredondadas. O assento curvo recuado em veludo chega mesmo a confundir-se com os braços da poltrona. Uma boa opção para quem gosta de aliar o conforto à arte. 38 advocatus abril 2017
vida
A DEPOIS DO ESCRITÓRIO. Out of Office é o mais recente título da NewsEngage, editora da Briefing. Entrevistas, sugestões, dicas e reportagens para uma leitura descontraída, saboreada sem pressas ou tempo contado. Para que se desligue do trabalho. Revista encartada com Advocatus, Briefing e Médico News.
ADMINISTRATIVO PARCEIRO Sérvulo
DIREITO E GESTÃO Law & Business
PARCEIROS CMS - Rui Pena & Arnaut | Garrigues | KPMG | Uría Menéndez - Proença de Carvalho
EMPRESARIAL FISCAL
PARCEIRO VdA - VdA Academia
PARCEIRO PLMJ
FORENSE OPEN DAY
17 MAIO
PARCEIROS CMS - Rui Pena & Arnaut | Garrigues | KPMG | PLMJ | Sérvulo | Uría Menéndez - Proença de Carvalho | VdA - VdA Academia
www.fd.lisboa.ucp.pt/posgrad mestradosdireito@fd.lisboa.ucp.pt Telefone 217 214 174
MESTRADOS EM DIREITO 2017-2018