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O agregador da advocacia
Diretor: João Teives | Diretora Editorial: Fátima de sousa | Mensal | Ano V | N.º 63 | junho de 2015 | 15 euros
06 GILMAR MENDES
O ESTADO DA JUSTIÇA NO BRASIL
O juiz do Supremo Tribunal Federal considera que é preciso combater a morosidade e defende uma reforma política no país.
ESPECIAL ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA
16 JORGE PEREIRA DA SILVA, DIRETOR DA ESCOLA DE LISBOA DA FACULDADE DE DIREITO DA UCP
“OS RECRUTADORES SABEM QUE OS NOSSOS ALUNOS SÃO DIFERENTES”
Portugal pode exportar modelo para CPLP
A ENERGIA DA FAMÍLIA PEREIRA por: MANOEL
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Edifício Lisboa Oriente Av. Infante D. Henrique, 333 H | 37 1800-282 Lisboa T. 218 504 060 | F. 210 435 935
Diretora-geral Maria Luís T. 961 571 629 marialuis@newsengage.pt
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PROFISSÃO O encontro anual das sociedades de advogados pôs, mais uma vez, em confronto as opiniões da bastonária da Ordem dos Advogados e do presidente da ASAP. E a pretexto do estatuto da profissão, a Garrigues e a Uría Menéndez – Proença de Carvalho partilham perspetivas sobre a multidisciplinaridade.
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DIRETOR João Teives 14761@advogados.oa.pt
DIRETORA EDITORIAL Fátima de Sousa fs@briefing.pt
GESTOR COMERCIAL João Pereira T. 960 427 959 joaopereira@newsengage.pt
12 SOCIEDADES
ADVOGAR NOS AÇORES O fundador da BPLD&A, Victor Borges da Ponte, fala da estratégia da firma e da associação à PLMJ.
TIRAGEM MÉDIA MENSAL
2.500 ex. DEPÓSITO LEGAL
O LIVRO DE
RUI DELGADO Sócio fundador da firma portuense Delgado & Associados, escolheu “A vida do espírito”, de Hannah Arendt.
14 OPINIÃO
A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS A associada sénior da CMS RPA Cristina Rogado escreve sobre o CIRE.
DISTRIBUIÇÃO POR ASSINATURA Preço: 85€ (12 edições) assinaturas@briefing.pt
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A MAIS LIDA ONLINE
JORGE DE BRITO PEREIRA DE SAÍDA DA PLMJ
DOSSIÊ
CÓDIGO DA PUBLICIDADE Três advogados dão a sua opinião sobre a adequação (ou não) do novo código à realidade.
21725 N.º REGISTO ERC
113427
32 DIREITO A FALAR
IMPRESSÃO TYPIA - Grupo Monterreina Área Empresarial Andalucia 28320 Pinto Madrid - España
CONTENCIOSO O sócio da SRS Soares Machado explica a razão de ser do Círculo de Advogados de Contencioso. 3 advocatus junho 2015
Após 25 anos, o advogado Jorge de Brito Pereira deixa a PLMJ, de que era sócio desde 1999 e cuja área de Corporate coordenava. O processo é descrito pelas duas partes como amigável, não sendo ainda conhecido o novo projeto do advogado.
Cortar a Direito
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Gravitas A radicalização no discurso é inaudita em quem ocupa um cargo de governo que sempre foi exercido, até agora e por todos aqueles que foram chamados a desempenhar tais funções, a par dos Ministérios da Administração Interna ou da Defesa, com um elevado sentido de Estado. JOÃO TEIVES DIRETOR
“A Senhora Ministra da Justiça e o seu Ministério falharam o cumprimento do programa do governo para a justiça, deixando inacabada a reforma da organização do sistema judiciário e não concluindo o processo de revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais”. Assim começa o comunicado da Associação Sindical dos Juízes Portugueses. E prossegue de forma demolidora: “Querer responsabilizar os juízes por um fracasso político pessoal, usando para tanto argumentos falaciosos, que não correspondem à verdade, não é compatível com as qualidades políticas exigíveis a uma Ministra da Justiça e traduz uma desconsideração intolerável para com os juízes”. A única conclusão possível só poderia ser: “Neste contexto, considerando ter havido uma quebra irreparável e definitiva na confiança
institucional com a Senhora Ministra da Justiça e com a sua equipa ministerial, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, sem prescindir dos seus direitos, corta com aquelas relações institucionais”. Como é que se consegue chegar a este ponto de crispação e de rutura institucional? Há um ponto que julgo fulcral. A radicalização no discurso que é inaudita em quem ocupa um cargo de governo que sempre foi exercido, até agora e por todos aqueles que foram chamados a desempenhar tais funções, a par dos Ministérios da Administração Interna ou da Defesa, com um elevado sentido de Estado. Para se transmitir aos outros tal sentido de Estado, é necessário uma certa gravidade no discurso, um peso, uma seriedade no cumprimento do dever. Virtude a que os romanos de-
nominavam gravitas. É uma virtude que claramente Sua Excelência a Ministra da Justiça nunca quis abraçar. E porquê? Certamente pelas suas características pessoais e políticas. Indubitavelmente. Mas podemos ir mais longe. O palco que a Ministra da Justiça procura é outro que não o das Instituições e dos demais intervenientes da Justiça e da honra, dignidade e elevação que devem pautar aquelas relações. O seu discurso, ao longo do mandato, foi sempre simplificador e maniqueísta. Claramente populista. A Ministra, tal como o Bastonário Marinho e Pinto nos seus mandatos, que pode ser tido como seu percursor, não está a falar para a classe ou para os seus atores e intervenientes. Por isso é-lhe certamente indiferente se a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, a Ordem dos
LIVRO
X de Charrua Certamente há mais de uma década, o Henrique Espírito Santo, insigne produtor cinematográfico de Fonseca e Costa, Oliveira, Luis Filipe Rocha ou Seixas Santos, teve a gentileza de me oferecer um catálogo da exposição de Charrua do Museu de Évora (2001). Devo confessar que foi o meu primeiro contacto com este pintor e que a curiosidade foi enorme. As cores fortes, as formas geométricas, a plasticidade do traço, dava aos quadros uma força inaudita, como se tivesse a repor a ordem no caos. Certo é que nunca consegui ver os quadros, com excelentes reproduções no catálogo do museu de Évora, in loco. Até que o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, resolveu, em boa hora, realizar uma antológica de Charrua que se encontra em exibição e é imperdível. A acompanhar a mesma foi editado um catálogo, X de Charrua. O texto de
Ana Ruivo tem uma citação de Charrua que é uma pista fulcral para decifrar a obra do pintor: “Quero encontrar na morte o alvorecer”. Esta demanda não é exclusiva da parte final da sua obra. Já com as “Anabases” (1969-1971) é clara a influência de Platão e a alegoria da caverna, significando aquelas “um movimento de carácter ascensional capaz de retirar da sombra o espírito agrilhoado na caverna”. Em suma, e quanto à evolução do autor “Se Charrua trabalhou a partir de referentes objectuais concretos, como o são o barco, a bandeira, a cadeira, a porta, o espelho, a tela ou a grade, do que se trata cada vez mais é da utilização de um leque depurado de signos – símbolos, formas ou sólidos geométricos – através dos quais se pensa a pintura, o homem e o pensamento. A consciência na sua origem e transformação. Em tela, no plano”.
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Advogados ou o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público corta ou não relações institucionais. Bem pelo contrário, até pode encarar isso como um ganho, querendo transmitir a ideia de que é uma combatente dos interesses corporativos. O problema mesmo é que a Justiça e as suas reformas não se aplicam sem Juízes, sem Advogados ou sem magistrados do Ministério Público. Esse discurso desagregador, justicialista e proletarizado até pode ser bom para capitalizar ganhos políticos imediatos, mas é claramente nocivo para a boa aplicação da Justiça e para o sentimento de confiança que aquela deve transmitir. Afinal de contas, seja qual for o quadrante ideológico, estamos perante uma função nuclear do Estado. Haja gravitas.
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5 advocatus junho 2015
Entrevista
Gilmar Mendes, juiz do Supremo Tribunal Federal do Brasil
É preciso combater a morosidade da justiça brasileira O Brasil está no bom caminho, mas é necessário continuar a combater a morosidade e as dificuldades de integração da justiça. A convicção é do juiz do Supremo Tribunal Federal do Brasil Gilmar Mendes, que entende que a adoção de um novo sistema eleitoral é essencial para a reforma política. Sobre os mediáticos julgamentos vividos nos últimos anos no país, acredita que, tal como aconteceu no escândalo do mensalão, também no mais recente caso do petrolão o Supremo Tribunal estará à altura do desafio. 6 advocatus junho 2015
SOFIA DUTRA, sd@briefing.pt Advocatus | Como comenta o estado da justiça no Brasil? Gilmar Mendes | A nossa atual Constituição Federal foi promulgada em 1988 e, desde então, temos tido diversos avanços no sentido de ampliar o acesso à Justiça e assegurar a concretização dos direitos e garantias fundamentais. Atualmente, a nossa atenção principal está voltada à celeridade e à efetividade da prestação jurisdicional. Observam-se avanços, sobretudo, em relação ao fortalecimento das Defensorias, do Ministério Público, da advocacia, além de iniciativas de melhoria constante dos serviços judiciários. Nesse domínio, é importante mencionar as ações do Conselho Nacional de Justiça, criado em 2004 e instituído em 2005, que tem atuado no aperfeiçoamento da gestão, no controle e na transparência administrativa e processual do sistema judiciário. Destaco, entre as ações, o ‘Planeamento estratégico do Poder Judiciário’, aprovado pelos presidentes dos 91 tribunais brasileiros, que consiste numa iniciativa pautada pelos propósitos comuns a todos os órgãos. Os objetivos estratégicos são concretizados por meio de programas desenvolvidos no âmbito nacional e local visando um serviço público de qualidade norteado pela credibilidade, acessibilidade, ética, imparcialidade, transparência, responsabilidade social e ambiental. Não obstante as ações promovidas pelo Conselho Nacional de Justiça e os resultados alcançados, verificam-se alguns problemas como, por exemplo, o excesso de procura tendo em vista a disfuncionalidade do serviço público, principalmente, nas questões de saúde e assistência social. Há um cúmulo de processos, muitos casos são referentes a pensões, fornecimento de medicamentos e tratamentos médicos. Na justiça brasileira tramitam cerca de 90 milhões de processos. Segundo os dados do relatório “Justiça em números”, em 2012 havia 92,2 milhões de processos em tramitação, sendo que, destes, 28,2 milhões eram casos novos e 64 milhões estavam pendentes de anos anteriores. Por um lado, nota-se um crescimento no total de processos baixados, por outro lado, constata-se que o número de processos baixados é inferior ao de casos novos. No entanto, percebe-se, nos últimos anos, uma estabilidade nas instituições, o que contribui para a
“Em março, participei numa sessão temática no Senado Federal, em que defendi a necessidade de se repensar a justiça eleitoral no sentido de reforçar o papel dos juízes federais na justiça eleitoral, dando-lhes maior responsabilidade, bem como estabelecer o impedimento para juízes da classe dos advogados, que hoje são, simultaneamente, advogados e juízes”
sedimentação do Estado de Direito e para a concretização dos direitos dos jurisdicionados previstos na Constituição. Apesar de muito já ter sido feito, é preciso continuar a combater a morosidade, as dificuldades de integração da Justiça para alcançarmos um patamar desejável no tocante à tutela jurisdicional efetiva, mas tudo indica que o Brasil está num bom caminho. Advocatus | É necessária uma reforma constitucional de modo a equilibrar os poderes executivo e judiciário? GM | A Constituição Federal brasileira dispõe, minuciosamente, sobre a independência e o controle, de modo a preservar o equilíbrio entre os poderes. Nesse sentido, verifica-se um quadro de normalidade institucional, na medida em
“Mesmo diante dos preceitos constitucionais, não se dispensa a necessidade de melhorias de forma a harmonizar as relações entre os poderes judiciário, executivo e legislativo”
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que os poderes estão a desempenhar os papéis a eles designados. O legislador constituinte teve a preocupação de prever, em vários dispositivos, a respeito da independência do poder judiciário, conforme o artigo 99, o qual preceitua a sua autonomia administrativa e financeira. Mesmo diante dos preceitos constitucionais, não se dispensa a necessidade de melhorias de forma a harmonizar as relações entre os poderes judiciário, executivo e legislativo. Saliento, neste contexto, a espera do Supremo Tribunal Federal quanto à indicação pela presidente Dilma Rousseff do próximo ministro a ocupar a vaga do ministro Joaquim Barbosa que se aposentou em julho de 2014. A inércia do poder executivo, neste caso, tem causado sérias consequências
Entrevista “Observa-se uma verdadeira cultura da judicialização, muitos conflitos, que poderiam ser tratados ou solucionados pela via administrativa, aguardam decisão do Poder Judiciário”
“Apesar da efetivação de diversas ações para assegurar a agilidade na tramitação processual, em obediência ao princípio da razoável duração do processo, ainda é possível verificar que o Poder Judiciário brasileiro tem um considerável acervo processual. Para se ter ideia, apenas o Supremo Tribunal Federal, que é composto por onze ministros, possui, atualmente, cerca de 57 mil processos em tramitação”
devido à falta de quórum para determinados julgamentos. Em março, participei numa sessão temática no Senado Federal, em que defendi a necessidade de se repensar a justiça eleitoral no sentido de reforçar o papel dos juízes federais na justiça eleitoral, dando-lhes maior responsabilidade, bem como estabelecer o impedimento para juízes da classe dos advogados, que hoje são, simultaneamente, advogados e juízes. O que me preocupa também é a duração dos mandatos, tenho afirmado que devem ser mais longos e sem a possibilidade de recondução para os juízes dos Tribunais Regionais Eleitorais (hoje os mandatos são de dois anos, suscetíveis de recondução). É necessário também melhorar a estrutura institucional da justiça eleitoral para a fiscalização e apreciação das contas de campanha e de todo o modelo de financiamento. Penso que a adoção de um novo sistema eleitoral é essencial para a reforma política. Considero que as reformas necessárias devem ser discutidas, aprovadas e implementadas num ambiente de cooperação entre os poderes. Quanto aos poderes judiciário e executivo, existem algumas críticas
em relação ao que alguns denominam “ativismo judicial”, centradas na suposta ingerência do poder judiciário nas questões de políticas públicas. No entanto, trata-se da concretização e proteção dos direitos sociais previstos nas normas constitucionais e para as quais os
juízes, quando demandados, não podem se omitir e não responder ao pedido. De qualquer forma, sempre ressalto a importância de estabelecer um efetivo diálogo institucional para melhor coordenação dos poderes e consolidação do Estado Democrático de Direito. É importante mencionar, também, os Pactos Republicanos, assinados pelos representantes dos três poderes, que representam a união de esforços por um sistema de Justiça mais ágil e efetivo. Advocatus | De que forma propõe que se abrevie o tempo dos julgamentos? GM | Trata-se de um tema importante e que envolve diversas dimensões, desde a garantia do acesso à Justiça até ao cumprimento das decisões emanadas do Poder Judiciário.
No Brasil, muitas ações já foram desenvolvidas para abreviar o tempo de tramitação processual. Ressalto, em especial, as realizadas no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) voltadas a integrar os tribunais por meio do planeamento estratégico e de uma gestão compartilhada, bem como a modernizar e a garantir, com isso, maior transparência e facilidade aos jurisdicionados. Um exemplo é a informatização e modernização do sistema da Justiça, mediante a utilização de meios eletrónicos como a implementação de tabelas e cadastros unificados, a partilha de banco de dados, a virtualização dos processos e a informatização das unidades judiciárias. Entre os objetivos estratégicos destaco a fixação das metas de nivelamento, a exemplo da Meta 2, que resultou no julgamento de 2,72 milhões de processos antigos. Os resultados podem ser verificados na eficiência operacional do sistema, na ampliação do acesso à Justiça, no fortalecimento institucional, na otimização de recursos financeiros e na publicidade do sistema de estatísticas. Destaco o último, como um resultado de suma importância por possibilitar ao cidadão acompanhar a produtividade do magistrado, das varas estaduais e federais, bem como interpor reclamação no CNJ diante da constatação de morosidade no julgamento dos processos. Apesar da efetivação de diversas ações para assegurar a agilidade na tramitação processual, em
CPLP tem papel fundamental para justiças irmãs Advocatus | Como observa a justiça portuguesa? GM | Acompanho a justiça portuguesa por meio dos julgados do Tribunal Constitucional. Atualmente, tenho vislumbrado a jurisprudência da Corte no âmbito da crise, com processos que tratam de temas tão relevantes e sensíveis aos cidadãos, principalmente, na questão dos direitos económicos, sociais e culturais. Há um diálogo institucional entre o Supremo Tribunal Federal e a Corte Constitucional graças ao intercâmbio de ideias no pleito judicial e
académico. Não tenho dúvidas de que a troca de experiências entre as justiças brasileira e portuguesa, bem como a contribuição e a partilha de conhecimentos na área jurídica têm-se revelado fundamental para consolidação das instituições nesses dois países. Afirmo que se trata de “Justiças irmãs” na medida em que a cooperação ocorre em vários âmbitos académicos, institucionais e organizacionais. Considero relevante o papel desempenhado pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) na cooperação entre os
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seus membros. Já participei dos fóruns promovidos pela Comunidade e tenho acompanhado alguns avanços no sentido de fortalecimento e integração dos países de língua portuguesa por meio da promoção de eventos, parcerias e desenvolvimento de projetos no âmbito da ciência e tecnologia, comunicação social, cultura e da justiça. A perspetiva académica, em especial, pode ser verificada nos inúmeros eventos, seminários e congressos realizados com intuito de debater temas e problemáticas na esfera jurídica.
advocatus.pt obediência ao princípio da razoável duração do processo, ainda é possível verificar que o Poder Judiciário brasileiro tem um considerável acervo processual. Para se ter ideia, apenas o Supremo Tribunal Federal, que é composto por onze ministros, possui, atualmente, cerca de 57 mil processos em tramitação. A Constituição de 1988 ampliou de forma significativa o acesso ao Poder Judiciário. O cidadão passou a buscar o reconhecimento e a realização dos seus direitos, ameaçados ou violados, via judicial. Se, por um lado, houve progresso na efetivação e na garantia do acesso à justiça, por outro, verifica-se um cúmulo de demandas que poderiam ser dirimidas por esferas diversas. Observa-se uma verdadeira cultura da judicialização, muitos conflitos, que poderiam ser tratados ou solucionados pela via administrativa, aguardam decisão do Poder Judiciário. É necessária uma mudança de paradigmas, por meio da criação e do incentivo de mecanismos de solução de conflitos e outras formas de desjudicialização, o que diminuiria o número de demandas e, consequentemente, o tempo de apreciação das ações pelo Judiciário. O CNJ tem incentivado a mediação e a conciliação, mas há muito que fazer, no sentido da realização do Direito – especialmente no âmbito da Administração Pública – sem necessidade de judicialização. Advocatus | Como evitar que casos como o mensalão e o petrolão voltem a acontecer? GM | O julgamento do chamado caso do mensalão representou um marco no país e evidenciou o poder institucional da Suprema Corte. O caso demandou tempo extenso de tramitação, cerca de quatro meses, devido ao número de réus – originalmente com 40 réus. A ação produziu mais de 50 mil páginas e demandou a oitiva de 600 testemunhas. O julgamento durou 53 sessões e consumiu mais de 204 horas de funcionamento do plenário, o que demonstra um trabalho árduo, mas, ao mesmo tempo, promissor do Supremo Tribunal Federal. É importante mencionar que o caso resultou na condenação de notórios líderes políticos e autoridades como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o ex-presidente do Partido dos Trabalhadores José Genoíno, o ex-tesoureiro Delúbio
Soares e o ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha, entre outros. Acredito que a apuração do caso da Petrobras também será relevante para a sociedade, devido aos grandes valores envolvidos. E, a exemplo do julgamento do mensalão, penso que o Supremo Tribunal estará à altura do desafio. Evitar tais casos implica o investimento em inovações de mecanismos de fiscalização, o fortalecimento das instituições de controlo e maior transparência na gestão pública. Do ponto de vista do Poder Judiciário, acredito que a melhor forma de evitar a ocorrência de casos semelhantes é deixar claro que possuímos, atualmente, um forte Estado Democrático de Direito. Aos réus, isso traduz-se na garantia do devido processo legal. À sociedade, na certeza de um Poder Judiciário eficiente no combate à cultura da impunidade.
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Parcerias
Cópia privada
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A desatualização de uma lei que ainda não entrou em vigor FRANCISCO MENEZES BORGES Advogado na Comissão de Mercado de Valores Mobiliários Autor Wolters Kluwer
A Apple anunciou, no passado dia 8 de junho de 2015, durante a Apple Worldwide Developers Conference 2015, o novo serviço de músicas por streaming, intitulado Apple Music. A criação do Apple Music segue uma tendência generalizada de disponibilização de música neste tipo de formato e apresenta-se como um forte concorrente (sobretudo no que respeita às mensalidades exigidas aos utilizadores para poderem usufruir do serviço) de outros serviços já disponíveis, nomeadamente o até agora dominador Spotify (que tem mais de 60 milhões de consumidores registados) ou o Tidal (que se distingue dos restantes por apresentar um formato com uma qualidade de som equivalente à de um CD, auto intitulando-se um serviço de “High Fidelity Music Streaming”). Com este novo serviço, a Apple abraça a crescente popularidade de serviços de transmissão de música através da Internet que não exigem o armazenamento de cópias nos computadores: as cópias não são feitas localmente (ficam nos servidores dos fornecedores e não nos computadores e/ou nas boxes dos utilizadores) e, nalguns casos, o uso feito pelos consumidores é limitado no tempo e no espaço. A apresentação do Apple Music faz soar novos (?) alarmes relativamente a uma matéria que tem sido alvo de ampla discussão nos últimos meses: a nova Lei da Cópia Privada, aprovada pela Lei n.º 49/2015, de 5 de junho, que procedeu a uma alteração da taxa devida pela reprodução ou gravação de obras protegidas pelo Direito de Autor, conhecida como “Taxa da Cópia Privada”, passando
A criação do Apple Music mostra que a própria compra de música digital, em serviços como o iTunes, está a cair em desuso, pelo que será uma questão de tempo até que as leis da cópia privada desapareçam.
“A nova LCP é assim uma lei que ainda não entrou em vigor e que já se encontra desatualizada, ou obsoleta”
a abranger diversos equipamentos eletrónicos e novos suportes de armazenamento (como memórias USB, cartões de memória, diversos tipos de memórias e discos rígidos e discos externos integrados em computadores, telefones móveis e tablets), publicada em Diário da República no passado dia 5 de junho de 2015, e que entra em vigor a 4 de julho (LCP). Um dos pontos que mais discussão tem gerado em torno desta nova lei é o facto de a mesma se encontrar totalmente desatualizada face à realidade corrente dos serviços de disponibilização de música, a qual se caracteriza por um claro crescimen-
to do armazenamento de cópias de obras adquiridas pelos consumidores em servidores disponibilizados por terceiros na Internet, de que o Spotify é o principal exemplo. Se o crescimento galopante da disponibilização de música através do streaming era já uma realidade sobejamente reconhecida, a assunção, por parte da Apple, da necessidade de se adaptar a esta realidade – fornecendo um novo serviço que acabará por ser concorrente do próprio iTunes, enquanto último grande serviço de compra de música digital –, surge como a confirmação de uma realidade cada vez mais indiscutível: a monopolização do streaming no que respeita aos serviços de disponibilização de música e a consequente tendência para a extinção da cópia privada. Com efeito, a criação do Apple Music mostra que a própria compra de música digital, em serviços como o iTunes, está a cair em desuso, pelo que será uma questão de tempo até que as leis da cópia privada desapareçam. Já em julho de 2014, a então Vice-Presidente da Comissão Europeia, Neelie Kroes, responsável pela Agenda Digital, chamava a atenção: “Our single market is crying out for copyright reform”. A nova Comissão Europeia já estará a preparar uma diretiva adaptada às novas realidades tecnológicas em que, no caso particular do áudio e do vídeo, a tecnologia de streaming irá dominar, e a atividade do Tribunal de Justiça da União Europeia e as também recentes alterações legislativas em diversos Estados-Membros (como a Espanha e a Finlândia que revogaram
10 advocatus junho 2015
esta taxa e o Reino Unido que decidiu que a mesma não era necessária) apontam para que a cópia privada venha a ser uma das matérias objeto de revisão na primeira iniciativa legislativa do mandato de Günther Oettinger, comissário europeu para a Economia e Sociedade Digitais. A nova LCP é assim uma lei que ainda não entrou em vigor e que já se encontra desatualizada, ou obsoleta, como apelidou o Presidente da República na nota justificativa do veto à Taxa da Cópia Privada, em março passado, porque pouco “sintonizada com a evolução tecnológica já verificada”.
“A nova Comissão Europeia já estará a preparar uma diretiva adaptada às novas realidades tecnológicas em que, no caso particular do áudio e do vídeo, a tecnologia de streaming irá dominar”
11 advocatus junho 2015
Sociedades
Como a BPLD&A vê a insularidade A Borges da Ponte, Linhares Dias & Associados não foi muito afetada pela crise. Quem o diz é o sócio fundador e managing partner da sociedade açoriana, Victor Borges da Ponte, que admite, porém, o peso da insularidade. Concede que existem “grandes questões que só ocorrem nos grandes centros urbanos e económicos” e que ficam fora do âmbito da sociedade, mas assegura que o escritório se mantém próximo dos centros de decisão, através da parceria que tem com a PLMJ.
Advocatus | Como é que a crise económica tem afetado a atividade da BPLD? Victor Borges da Ponte | A sociedade tem há alguns anos uma atividade duradoura de assessoria a diversos agentes económicos institucionais regionais, o que lhe garante um volume de trabalho significativo. Acresce a assessoria no plano do direito público, área em que têm vindo a aumentar as solicitações e onde tem sido feito um significativo investimento em formação nos elementos da sociedade que mais se dedicam a essa área. Estas duas realidades têm permitido que a BPLD não tenha sido muito afetada com a crise económica que se vem vivendo há seis anos.
“A parceria que mantemos com a PLMJ tem-nos permitido participar ativamente em eventos nacionais, designadamente em ações de formação e ou conferências nas cidades em que existem parceiros, na troca de experiências e de serviços”
Advocatus | Quais as áreas de atuação em que desenvolve mais atividade? VBP | Muito embora a sociedade mantenha uma forte componente de contínua atividade no apoio e assessoria a diversas empresas com sede na Região Açores, atualmente a área do direito público, designadamente contencioso pré-contratual e contratação pública, tem assumido relevo significativo no conjunto da atividade desenvolvida. Assim, para além da área do direito público, o direito empresarial, aqui se incluindo o societário, comercial, laboral e contencioso, assumem maior relevância, a par da atividade na área das obrigações (contratos e responsabilidade civil) e direito da família. Por outro lado, fruto da situação económica, a atividade na
área das insolvências e recuperação de empresas é inevitável.
12 advocatus junho 2015
Advocatus | Em que medida o exercício da advocacia é diferente fora dos grandes centros de decisão? VBP | Tudo é relativo. A sociedade BPLD tem a sua sede e escritório principal na cidade de Ponta Delgada (Ilha de São Miguel) que não deixa de ser um centro de decisão regional, quer a nível político, quer a nível económico. Evidentemente que existem grandes questões que só ocorrem nos grandes centros urbanos e económicos e estas ficam, naturalmente, fora do âmbito da sociedade. Mas, a sociedade também possui um escritório na cidade de Angra do Heroísmo (Ilha Terceira) que, economicamente, é a segunda ilha dos Açores mais importante, onde, além dos agen-
advocatus.pt parceiros, na troca de experiências e de serviços, designadamente com a prestação de serviços a clientes da PLMJ residentes em Portugal Continental e ou no estrangeiro em questões que decorrem nos Açores, bem como vice-versa, a prestação de serviços pela PLMJ a clientes nossos em questões que decorrem no território continental e utilização da rede de parcerias internacionais.
“Os Açores vivem ainda uma fase de estagnação, senão mesmo descendente, mas esperamos que em breve venha a evoluir positivamente, aliás, no seguimento do que está a acontecer a nível nacional”
tes económicos locais, estão presentes diversas empresas com atividade em diversas ilhas da região. Por outro lado, a sociedade mantém uma parceria com a PLMJ que proporciona uma ativa troca de serviços e a realização conjunta de eventos em todo o País, designadamente ao nível da formação e da divulgação da legislação e doutrina de temas que sejam atuais, o que nos traz conhecimentos e relacionamentos, mantendo-nos mais próximos dos grandes centros de decisão. Advocatus | Quais as especificidades do exercício da advocacia nos Açores? VBP | A especificidade resume-se na limitação aos assuntos e problemas que ocorrem na região, estando, assim, ausentes algumas questões que são relevantes no mundo da advocacia. Por outro lado, cada vez mais se assiste à centralização dos próprios serviços jurídicos das empresas de âmbito nacional, nos seus departamentos centrais. Acresce que tem de ser sempre levada em conta a diversa legislação aplicável apenas na região e a sua conjugação com a legislação de âmbito nacional. Advocatus | O mercado regional valoriza a prática da advocacia em sociedade? VBP | Talvez possa ainda existir al-
“Procuramos estabelecer acordos com escritórios de advogados em cidades dos Estados Unidos e do Canadá em que residem as comunidades de emigrantes açorianos, não estando afastada a possibilidade de fixar estabelecimento direto neste mercados”
guma resistência pessoal no facto de um assunto ser tratado por mais do que um advogado, em especial em determinados assuntos e ao nível da prática no direito privado. Mas, na generalidade é perfeitamente aceite, verificando-se que atualmente muitos clientes, que inicialmente vieram ao escritório tratar com um advogado específico, já solicitam ser atendidos pelo advogado que mais se dedica à área do direito em que se insere o assunto a ser tratado. Por outro
lado, percebe-se que, sendo os assuntos discutidos internamente, dessa discussão resultam mais-valias para ser atingida a solução pretendida, e o atendimento acaba por ser muitas vezes partilhado, com clara vantagem para o cliente. Advocatus | Como é que a entrada em vigor do novo mapa judiciário alterou a atividade da sociedade? VBP | Como já referi, a sociedade tem escritórios nas duas principais cidades da região, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, que são onde se localizam as unidades de Instância Central da Comarca dos Açores. De resto, uma vez que apenas foram extintos dois tribunais, ambos na ilha de São Miguel, a estrutura física e orgânica mantém-se a que já vinha de antes, ou seja, os Círculos Judiciais de Ponta Delgada e de Angra do Heroísmo e, as restantes seis ilhas (exceção para o Corvo) com um tribunal. Advocatus | De que forma as parcerias que estabelecem com outras sociedades ajudam à atividade da BPLD? VBP | A parceria que mantemos com a PLMJ tem-nos permitido participar ativamente em eventos nacionais, designadamente em ações de formação e ou conferências nas cidades em que existem
13 advocatus junho 2015
Advocatus | Que ambições têm a nível de internacionalização? VBP | Não sendo fácil o estabelecimento de escritórios no estrangeiro, para além de aproveitarmos as parcerias nacionais e internacionais da PLMJ, procuramos estabelecer acordos com escritórios de advogados em cidades dos Estados Unidos e do Canadá em que residem as comunidades de emigrantes açorianos, não estando afastada a possibilidade de fixar estabelecimento direto nestes mercados. Advocatus | Existe margem para o crescimento da BPLD? VBP | Embora o crescimento dependa em grande parte da evolução económica, existe sempre margem para crescimento quando se investe na competência e no trabalho honesto. Os Açores vivem ainda uma fase de estagnação, senão mesmo descendente, mas esperamos que em breve venha a evoluir positivamente, aliás, no seguimento do que está a acontecer a nível nacional. Existe uma necessidade absoluta de investimento e a alteração na política de transportes, designadamente no que respeita ao transporte aéreo, se for bem direcionada, poderá trazer enormes benefícios.
“A especificidade resume-se na limitação aos assuntos e problemas que ocorrem na região, estando, assim, ausentes algumas questões que são relevantes no mundo da advocacia”
Legislação
Contexto mais favorável à recuperação de empresas CRISTINA ROGADO Associada sénior, da área de prática de resolução de litígios da CMS RPA
No passado dia 6 de fevereiro, com a publicação do Decreto-Lei n.º 26/2015, o Governo veio implementar um conjunto de medidas que visam promover um contexto mais favorável à aprovação de planos de recuperação de empresas, introduzindo, assim, alterações ao Sistema de Recuperação de Empresas via Extrajudicial (SIREVE) e ao Processo Especial de Revitalização (PER). De entre as alterações ao SIREVE, destaca-se, desde logo, o facto de ter sido eliminada a possibilidade das empresas que se encontrem numa situação de insolvência atual recorrerem a tal mecanismo. Em paralelo, é imposta a obtenção de uma avaliação global positiva em relação a determinados indicadores económicos e financeiros por parte das empresas interessadas em recorrer ao SIREVE. Por este motivo, foi introduzida uma nova noção de empresa que abrange apenas as sociedades comerciais e os empresários em nome individual que possuam contabilidade organizada, deixando de lado o conceito amplo de empresa constante do Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas (CIRE) que abrange toda a organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica. As empresas passam a poder recorrer, de forma gratuita e confidencial, a um mecanismo de “early warning” ou diagnóstico prévio da sua situação económica e financeira, o qual será disponibilizado pelo
As principais alterações agora introduzidas visam estreitar as empresas com legitimidade em recorrer ao SIREVE, tendo em vista assegurar a eficácia e o efeito prático do recurso ao mesmo, bem como incentivar e alargar a dimensão do leque de empresas que possam interessar-se em recorrer a tal mecanismo.
“Foi introduzida uma nova noção de empresa que abrange apenas as sociedades comerciais e os empresários em nome individual que possuam contabilidade organizada, deixando de lado o conceito amplo de empresa constante do Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas (CIRE)”
IAPMEI no seu site, facilitando-se, assim, a deteção atempada de dificuldades. Este mecanismo estará disponível a partir de julho, de acordo com a informação constante do site do IAPMEI1. Procura-se, por um lado, efetuar, à partida, uma seleção das empresas com legitimidade para recorrer
ao SIREVE baseada em critérios económico-financeiros e, por outro lado, a possibilitar a sinalização atempada de dificuldades com o mecanismo de diagnóstico prévio. Outra novidade introduzida é a extensão da proibição de instaurar ações executivas para pagamento de quantia certa ou outras ações destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias relativamente aos garantes, a qual se verifica após ser proferido pelo IAPMEI o despacho de aceitação do requerimento de utilização do SIREVE e enquanto o procedimento não for extinto, suspendendo-se automaticamente as ações em curso por igual período. Esta medida poderá, no imediato, parecer excessiva. Porém, um olhar mais atento sobre as alterações introduzidas, permite verificar que qualquer credor que não pretenda participar no SIREVE poderá comunicar esse facto ao IAPMEI e, assim, fazer cessar os efeitos do despacho de aceitação em relação a tais ações judiciais. Do mesmo modo, a Fazenda Pública ou a Segurança Social podem, de forma fundamentada, manifestar a sua indisponibilidade para celebrar acordo com a empresa, fazendo igualmente cessar os mencionados efeitos do despacho de aceitação. É ainda com agrado que se vê criado um privilégio creditório mobiliário geral caso a empresa venha a ser declarada insolvente, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos tra-
1. http://www.iapmei.pt/iapmei-not-02.php?noticia_id=1303 2. As percentagens apresentadas têm como fonte o site do IAPMEI http://www.iapmei.pt/resources/download/SIREVE_062014.pdf 14 advocatus junho 2015
balhadores, para os credores que financiarem a atividade da devedora, disponibilizando-lhe capital no decurso do processo para a sua revitalização, à semelhança do sucede já no regime do PER. Esta medida visa tornar bastante mais favorável e apetecível o financiamento das empresas que recorrem a este mecanismo, procurando, assim, compensar o risco assumido pelo credor que se disponibilize a financiar a empresa com a atribuição de tal privilégio. Por motivo idêntico, as garantias convencionadas entre a empresa e os credores durante o processo mantêm-se, mesmo em caso de insolvência, no prazo de dois anos ou novo processo de reestruturação, deixando, assim, de estar sujeitas à possibilidade de resolução em benefício da massa insolvente nos termos do CIRE. Tendo como objetivo tornar as regras mais favoráveis à aprovação de planos de recuperação, com as alterações introduzidas cai ainda a necessidade de um acordo entre a empresa e credores que representem no mínimo 50% do total das dívidas da empresa, passando a exigir-se para aprovação do plano de recuperação (i) o voto favorável de 2/3 da totalidade dos votos emitidos, desde que mais de metade desses mesmos votos corresponda a créditos não subordinados, sendo os votos emitidos terão que representar pelo menos 1/3 do total das dívidas apuradas da empresa, não se considerando as
advocatus.pt abstenções; ou (ii) o voto favorável de credores que representem mais de 50% da totalidade das dívidas apuradas da empresa, desde que mais de metade desses mesmos votos corresponda a créditos não subordinados, não se considerando as abstenções. Assim, passa a ser possível a aprovação de um plano de recuperação com o voto favorável de credores que representem 2/3 de apenas 1/3 da totalidade das dívidas apuradas da empresa. A celebração de acordo entre a empresa e os credores tem como efeito a extinção automática das ações executivas para pagamento de quantia certa instauradas contra a empresa e/ou os seus respetivos garantes, a não ser que o mesmo preveja a manutenção da respetiva suspensão, e mantêm-se suspensas, por prejudicialidade, as ações destinadas a exigir o cumprimento de ações pecuniárias instauradas contra a empresa e/ou os seus respetivos garantes. Contudo, tal não se verifica quando as ações em causa tenham sido instauradas por credores que não tenham subscrito o acordo.
De referir ainda que as empresas que não obtenham acordo no procedimento, não cumpram as obrigações decorrentes de acordo celebrado ou requeiram a extinção do procedimento ficam impedidas, pelo prazo de dois anos a contar da data do despacho de aceitação do requerimento, de apresentar novo requerimento a pedir a utilização do SIREVE. Por fim, e não menos relevante, foi atribuído caráter confidencial ao SIREVE, bem como ao recurso ao mecanismo do diagnóstico prévio, o que irá, certamente, incentivar o recurso aos mesmos. No que respeita ao PER, o diploma legal introduz apenas uma alteração tendente à clarificação do quórum para efeitos de deliberação de aprovação de plano de recuperação, de acordo com a qual este será aprovado no caso de: (i) obter o voto favorável de 2/3 dos credores que representem pelo menos 1/3 do total dos créditos relacionados na lista apresentada pelo Administrador Judicial Provisório, com direito de voto, e desde que mais de metade dos votos não
“As empresas passam a poder recorrer, de forma gratuita e confidencial, a um mecanismo de early warning ou diagnóstico prévio da sua situação económica e financeira, o qual será disponibilizado pelo IAPMEI no seu site, facilitando-se, assim, a deteção atempada de dificuldades”
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correspondam a créditos subordinados; (ii) obter o voto favorável de credores cujos créditos representem mais de metade da totalidade dos créditos relacionados na lista apresentada pelo Administrador Judicial Provisório, com direito de voto, desde que mais de metade desses votos não corresponda a créditos subordinados. De acordo com as informações disponibilizadas pelo IAPMEI, desde o início da implementação do SIREVE e até 30 de junho, cerca de 84% das empresas que recorreram a este procedimento são micro e pequenas empresas, centradas nos setores da indústria, comércio e serviços, em que apenas 46% dos 80% de procedimento aceites são concluídos com acordo2. As principais alterações agora introduzidas visam, portanto, estreitar as empresas com legitimidade em recorrer ao SIREVE, tendo em vista assegurar a eficácia e o efeito prático do recurso ao mesmo, bem como incentivar e alargar a dimensão do leque de empresas que possam interessar-se em recorrer a tal mecanismo.
RICARDO GAUDÊNCIO
Entrevista
Jorge Pereira da Silva, diretor da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da Universidade Católica
“O mercado está ávido dos nossos alunos”
Qualidade e solidez na formação de base, aposta na internacionalização e elevada empregabilidade. Estes são os trunfos da Faculdade de Direito da Universidade Católica, segundo o novo diretor da Escola de Lisboa, o constitucionalista Jorge Pereira da Silva. Trunfos que – assegura – fazem com que o mercado esteja ávido dos alunos que saem da instituição. E que explicam que, para o docente, a dicotomia entre ensino privado e público não se coloque e muito menos a recorrente questão do excesso de cursos e licenciados. 16 advocatus junho 2015
Fátima de Sousa, fs@briefing.pt
“Temos uma licenciatura que é muito internacional e prepara os alunos para o mundo global, mas não podemos descurar uma formação sólida que os nossos recrutadores também exigem”
Advocatus | Assumiu a direção da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da Universidade Católica com que prioridades? Jorge Pereira da Silva | Costumo dizer que tenho uma tarefa particularmente difícil porque não me posso queixar da herança que me deixaram… O meu mandato é, seguramente, de continuação daquele que foi desempenhado pelos meus antecessores. No essencial, há uma continuidade entre as linhas estratégicas que procuro prosseguir e aquilo que se iniciou quando se converteu a licenciatura em Direito numa licenciatura em quatro anos adaptada ao chamado Processo de Bolonha. As três principais linhas estratégicas são a consolidação da ideia de que os alunos têm uma formação sólida naquelas que são as matérias jurídicas essenciais, em segundo lugar a internacionalização – somos, claramente, a licenciatura em Direito mais internacional em Portugal –, e, em terceiro, manter uma relação fortíssima com o mercado e um compromisso com a empregabilidade. Neste último domínio, também temos dado cartas, pois somos a licenciatura com uma relação mais dinâmica com a prática e que mais a sério toma a empregabilidade dos licenciados e dos mestres. Advocatus | São estes compromissos que validam o célebre slogan “Direito é na Católica”? JPS | Para nós, Direito sempre foi na Católica. Esse slogan apela ao elo emocional entre os licenciados e a escola. Tem, em larga medida, a ver com o facto de sempre termos sido uma escola pequena na dimensão, isto é, no número de licenciados – em Lisboa, formamos,
“Direito sempre foi na Católica. Esse slogan apela ao elo emocional entre os licenciados e a escola. Tem, em larga medida, a ver com o facto de sempre termos sido uma escola pequena na dimensão, isto é, no número de licenciados – em Lisboa, formamos, por ano, apenas cerca de cinco por cento dos licenciados em Direito”
por ano, apenas cerca de cinco por cento dos licenciados em Direito, o que é uma percentagem muito reduzida se olharmos ao conjunto dos licenciados em Direito em Portugal. Esta dimensão permite que os alunos tenham com os professores e os colaboradores uma relação muito próxima. Direito é na Católica e é para a vida. Advocatus | Os três pilares estratégicos que mencionou acabam por estar relacionados… JPS | É verdade. Temos, efetivamente, uma licenciatura que é muito internacional e prepara os alunos para o mundo global, mas não podemos descurar uma formação sólida que os nossos recrutadores também exigem. Querem que o licenciado em Direito seja capaz de estar numa reunião com clientes internacionais, de viajar para Londres, Nova Iorque ou Pequim e desenvolver aí a sua atividade, mas também querem que tenham conhecimentos sólidos no tronco
“É notório que os escritórios de advogados são os mais aguerridos e competitivos na captação de talentos. Na minha opinião, o Centro de Estudos Judiciários devia fazer o mesmo para captar os melhores alunos para a magistratura, porque uma postura passiva pode significar que quem é mais ativo acaba por captar os mais competentes”
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da licenciatura em Direito, isto é, Constitucional, Administrativo, Civil, Penal, Processo. O difícil é conciliar as duas vertentes num período de tempo relativamente curto. Por outro lado, esta relação próxima que se desenvolve com os alunos ao longo da licenciatura – os professores conhecem os alunos pelos nomes e os alunos escolhem as cadeiras em função do docente – significa que podemos empenhar-nos na empregabilidade numa perspetiva que não é puramente quantitativa, definindo os pares ideais entre aluno e recrutador. Posso dar um exemplo muito simples: temos recrutadores que preferem sempre os alunos com as notas mais elevadas, mas também remos recrutadores que, tendencialmente, preferem alunos com notas um degrau abaixo das mais elevadas. Essa colocação dos alunos no mercado tem de ser feita com muito cuidado, não apenas para garantir que a taxa de empregabilidade é elevadíssima, mas que a relação é satis-
Entrevista “Basta vir ao Job Shop para perceber de que o mercado está ávido por conhecer os nossos alunos, não está saturado. Pode estar saturado de outro tipo de alunos e de outro tipo de formações, mas não dos que formamos”
“Os nossos alunos são diferentes e os nossos recrutadores dizem isso muito claramente. Ao fim de alguns anos de experiência, sabem perfeitamente onde devem continuar a investir e nós sentimos, da parte dos recrutadores com quem trabalhamos, que os nossos alunos têm muito bom acolhimento”
fatória e benéfica para o aluno e para o recrutador que vai apostar nele. Advocatus | O mercado dos alunos da Católica é maioritariamente o da advocacia ou há apetência por outras profissões jurídicas? JPS | O curso de Direito e os próprios mestrados proporcionam, cada vez mais, uma formação de banda larga. Mas é notório que os escritórios de advogados são os mais aguerridos e competitivos na captação de talentos. Na minha opinião, o Centro de Estudos Judiciários devia fazer o mesmo para captar os melhores alunos para a magistratura, porque uma postura passiva pode significar que quem é mais ativo acaba por captar os mais competentes. É certo que o CEJ não pode contratar da mesma maneira, mas nada o impediria de tentar atrair para os con-
“A existência de uma licenciatura com um perfil diferenciado como esta é a nossa arma concorrencial, relativamente sobretudo às universidades públicas. Não sentimos concorrência significativa por parte de outras universidades denominadas privadas”
cursos os alunos com mais talento. Por outro lado, há empresas que, hoje em dia, têm departamentos jurídicos fortíssimos que já competem com as sociedades de advogados. Ao contrário do que acontecia há alguns anos, o advogado de empresa não tem um estatuto inferior e é uma posição muito apelativa para os nossos alunos. Ao longo da licenciatura, temos muitas clínicas legais, muitos estágios de verão realizados em empresas, designadamente bancos e consultoras. Aliás, no Job Shop, que é a nossa feira de emprego anual, fazemos questão de ter uma oferta diversificada de recrutadores. Advocatus | Voltando à internacionalização, em que moldes é promovida durante a licenciatura? JPS | Durante a licenciatura, temos
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o programa TLC – Transnational Law Curriculum – que é estruturado de forma a permitir aos alunos contactarem com professores de faculdades estrangeiras, com outros ordenamentos jurídicos, com outras metodologias de ensino. É, de certa forma, um modo de terem uma experiência internacional, pois a aula que acontece aqui é idêntica a uma aula que decorre numa universidade americana ou noutro país europeu. Essa sempre foi a nossa principal aposta em matéria de internacionalização – não apenas expor os alunos a aulas lecionadas em língua estrangeira, designadamente em inglês, mas a outras formas de lecionar e de praticar o Direito. Depois disso, podem com grande tranquilidade fazer um LL.M. nos Estados Unidos ou em Inglaterra. Aliás, temos antigos
advocatus.pt alunos espalhados pelo mundo a exercer em escritórios de grande dimensão em Madrid, Londres, Pequim, Genebra ou São Paulo. Advocatus | Diria que há diferenças entre o ensino público do Direito e o privado? JPS | Se não houvesse diferenças, a nossa faculdade não teria o sucesso que tem. A existência de uma licenciatura com um perfil diferenciado como esta é a nossa arma concorrencial, relativamente sobretudo às universidades públicas. Não sentimos concorrência significativa por parte de outras universidades denominadas privadas. Como sabe, há uma certa discussão acerca da natureza da Universidade Católica, que se situa um pouco a meio caminho entre o público e o privado, porque desempenha uma missão que é de interesse público, mas, ao mesmo tempo, tem de gerar os recursos suficientes para desenvolver as atividades de lecionação e de investigação. Estou convencido de que, verdadeiramente, na nossa área, a única universidade não pública que investe em investigação é a Faculdade de Direito da Universidade Católica. E é um investimento forte e consistente ao longo de muitos anos. A questão não é tanto saber se a universidade é pública ou se é privada. Os nossos alunos são diferentes e os nossos recrutadores dizem isso muito claramente. Ao fim de alguns anos de experiência, sabem perfeitamente onde devem continuar a investir e nós sentimos, da parte dos recrutadores com quem trabalhamos, que os nossos alunos têm muito bom acolhimento. Isso deriva da solidez da formação jurídica de base, mas, ao mesmo tempo, da janela que abrimos para poderem trabalhar no mercado mais global, da flexibilidade que isso lhes traz enquanto juristas. Advocatus | Uma questão recorrente aponta para a existência de cursos de Direito e de licenciados a mais. Partilha desta opinião? JPS | Devo dizer, com toda a sinceridade, que é a questão que menos me preocupa. Porque formamos apenas cinco por cento. E relativamente aos licenciados que formamos temos a garantia de que não estão a mais em parte nenhuma. Pelo contrário. Basta vir ao Job Shop para perceber de que o mercado está ávido por conhecer os nossos alunos, não está saturado. Pode estar saturado de outro tipo
“o mercado tem mecanismos que permitem, relativamente a pessoas com formações menos sólidas, encaminhá-las para outras profissões que não as profissões jurídicas mais exigentes”
de alunos e de outro tipo de formações, mas não dos que formamos. De qualquer forma, acho que é típico das profissões reguladas e da Ordem que as representa tentar restringir a entrada de novos profissionais. Não acontece só com os advogados. Relativamente à Medicina, já conseguiu perceber se há médicos a mais ou não? Se calhar, o problema não está no número, está no perfil, na distribuição territorial, na junção entre a oferta e a procura. Além disso, o mercado tem mecanismos que permitem, relativamente a pessoas com formações menos sólidas, encaminhá-las para outras profissões que não as profissões jurídicas mais exigentes. Advocatus | Mencionou o investimento em investigação. Em que moldes acontece? JPS | Estamos precisamente no Católica Research Centre for the Future of Law, uma designa-
“Durante este período, que já se chamou de jurisprudência constitucional da crise, houve um conjunto de decisões em que o tribunal tomou posições que põem em causa a sua jurisprudência anterior, que era uma jurisprudência de contenção”
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ção escolhida para contrariar a ideia de que o Direito está sempre a reboque dos acontecimentos. Este centro é nacional, não é apenas da Escola de Lisboa. Candidatámo-nos ao financiamento da FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia − e penso que, em larga medida, ganhámos porque o projeto era aliciante e porque os curricula dos professores eram muito sólidos. Foi a primeira vez que fomos avaliados e fomos classificados com “muito bom”, tendo obtido um financiamento muito significativo, superior aliás ao dos outros centros das faculdades de Direito que se apresentaram a concurso. Sempre tivemos uma investigação em Direito de grande qualidade, mas era realizada de forma muito individualista, com cada investigador a preparar as suas provas académicas. Hoje, o paradigma está a mudar para uma investigação em
Entrevista
advocatus.pt rede, em que os investigadores se agrupam para desenvolver projetos de maior fôlego e interdisciplinares. O modelo compartimentado de investigação está também a ceder lugar a outro que progressivamente incorpora outros saberes, por exemplo da área da Economia, da Gestão, das Ciências exatas e até da Filosofia.
“Estou convencido de que, verdadeiramente, na nossa área, a única universidade não pública que investe em investigação é a Faculdade de Direito da Universidade Católica. E é um investimento forte e consistente ao longo de muitos anos”
Advocatus | Em que medida é que está orientado para o futuro? JPS | Os próprios temas são temas a olhar para o futuro. Senão vejamos. Já ninguém duvida que grande parte do desenvolvimento da economia portuguesa vai passar pela economia do mar. Outro exemplo é o da justiça intergeracional, que é um problema transversal à sociedade portuguesa, com questões no domínio do ambiente, da segurança social ou da dívida pública. Este é, claramente, um tema central do século XXI. O século XX foi, essencialmente, um século em que as grandes questões, as grandes lutas políticas se ligaram à justiça social, à redistribuição da riqueza entre pessoas que viviam no mesmo lapso temporal. Mas o século XXI já está a evidenciar problemas de justiça entre gerações. É notório no mercado de trabalho, com gerações mais velhas a terem uma estabilidade a que as gerações mais no-
vas não podem aspirar. É um domínio muito transversal em que é fundamental o Direito intervir, mas em que são necessários conhecimentos de múltiplas áreas, pois o Direito sozinho pouco pode fazer.
“A justiça constitucional tem de ter muito presente que do outro lado está o legislador democraticamente legitimado e que tem uma prerrogativa de avaliação das leis, sendo que, muitas vezes, não é possível no momento em que são feitas saber, por exemplo, se são excessivas”
TC tem sido demasiado rigorista Constitucionalista, Jorge Pereira da Silva entende que há lugar para ajustamentos à lei fundamental do País, no sentido de a atualizar. Assim acontece sobretudo no domínio do Estado social, que considera excessivamente regulamentado. Ou no domínio da organização judicial, no sentido de reforçar a legitimação democrática da máquina judicial. Há domínios em que – diz – a realidade se encarregou de matizar um pouco o alcance das normas constitucionais, nomeadamente as de teor económico. Defende a este respeito um maior debate sobre uma questão que tem estado em cima da mesa – a inclusão do limite ao défice e à dívida na Constituição. Pelas implicações que
tem, carece de maior discussão. Muito discutida tem sido a atuação do Tribunal Constitucional e Jorge Pereira da Silva é uma das vozes críticas. Não critica o modo de composição do tribunal e afirma-se mesmo favorável à existência de uma instância com estas funções, mas tem assumido uma postura crítica relativamente a algumas decisões recentes. “Tenho lido com cuidado as decisões do Tribunal e deteto em algumas delas incongruências que são significativas”, resume. “Durante este período, que já se chamou de jurisprudência constitucional da crise, houve um conjunto de decisões em que o tribunal tomou posições que põem em causa a sua jurisprudência ante-
rior, que era uma jurisprudência de contenção, em que se concedia ao legislador um crédito de confiança quando não era possível a priori saber qual ia ser o resultado da aplicação da legislação apreciada. Mas o tribunal tornou-se progressivamente mais exigente, aplicou os diferentes testes dos princípios constitucionais de uma forma cada vez mais rigorista e, por esse caminho, poucas são as medidas legislativas que resistem”, argumenta. Na opinião do professor, “a justiça constitucional tem de ter muito presente que do outro lado está o legislador democraticamente legitimado e que tem uma prerrogativa de avaliação das leis, sendo que, muitas vezes, não é possível no momento em que são feitas
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saber, por exemplo, se são excessivas”. Nessas circunstâncias, o Tribunal Constitucional, “reconhecendo, porventura, que as medidas podem não ser as ideais, deve abster-se de se pronunciar pela inconstitucionalidade”. “Acho que o Tribunal Constitucional tem um histórico de trabalho notável, tem uma jurisprudência riquíssima, muito sólida, mas neste período, em que foi confrontado com muitas medidas legislativas de austeridade, foi demasiado rigorista, demasiado exigente com o legislador nalgumas decisões, antecipando, de certa forma, aquilo que, do meu ponto de vista, devia ser um juízo do eleitorado nas eleições subsequentes”, conclui.
21 advocatus junho 2015
Código da Publicidade
Uma lei a par da realidade? Vinte e cinco anos depois, Portugal vai ter um novo Código da Publicidade, que cumpre, nomeadamente, a função de transpor normas comunitárias. Mas cumprirá os objetivos de uma lei que acompanha e até antecipa a realidade? Três advogados dão a sua opinião.
O governo propôs, no início de maio, um novo Código da Publicidade, que virá substituir legislação já com 25 anos. Uma proposta que, para a especialista em Propriedade Intelectual Leonor Chastre, fica aquém do desejado, quer porque transpõe apenas parcialmente normas comunitárias sobre o tema,
quer porque falta coerência legislativa, quer ainda pela incorreta definição, objetivação e sistematização de conceitos. A advogada da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira chama ainda a atenção para o considera o desfasamento com a atual realidade do mundo publicitário. Crítico é também Vasco Stilwell
d’Andrade, advogado da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, que considera que o diploma demonstra “uma certa vontade de colocar Portugal na dianteira do pelotão do paternalismo publicitário”, enquadrando-o no chamado nanny-statism, tendência que identifica noutros mercados.
22 advocatus junho 2015
Por sua vez, Nuno Cruz, advogado da PCA – Pereira da Cruz e Associados, centra-se num aspeto particular – o ambush marketing – para afirmar que o novo código poderia ter sido uma boa oportunidade para se discutir e regular uma matéria que prejudica seriamente quem investe na contratação de patrocínios.
advocatus.pt
Uma proposta consentânea com o “Admirável Mundo Novo” em que vivemos? A proposta de novo Código fica aquém das desejáveis transposição transparente e não parcial de normas comunitárias, coerência legislativa, ausência de remissão para diversos diplomas legais, correta definição, objetivação e sistematização de conceitos, congruência de regimes aplicáveis aos meios above e below the line por referência às respetivas natureza e atualidade.
Sendo de louvar, e muito, o propósito de unificação legislativa em matéria de publicidade e formas afins – não só não totalmente conseguido pelo Decreto-lei n.º 330/90, de 23 de outubro, como pelas sucessivas alterações ao mesmo – crê-se que, quer pelo conteúdo, quer pela forma, a proposta de novo Código fica aquém das desejáveis transposição transparente e não parcial de normas comunitárias, coerência legislativa, ausência de remissão para diversos diplomas legais, correta definição, objetivação e sistematização de conceitos, congruência de regimes aplicáveis aos meios above e below the line por referência às respetivas natureza e atualidade. Com efeito, e, elencam-se, somente, alguns dos problemas suscitados, começa desde logo por se proceder a uma transposição sui generis, por parcial, das Diretivas 2010/13/EU, de 10 de março de 2010 (Diretiva AVMS) e 2014/40/EU, de 3 de abril de 2014; definem-se no artigo 1.º, de forma redutora, os ramos de Direito subsidiários aplicáveis, erro que já consta do acima mencionado Decreto-lei n.º 330/90. Pretende-se a regulação de várias práticas cujos conceitos associados carecem de definição, como
é o caso das expressões “call center” e “elementos informativos da mensagem”, mantém-se a “clonagem” de conceitos típicos da atividade de radiodifusão sonora e televisiva constante do Decreto-lei n.º 330/90, como os de “difusão” e “transmissão”, esquecendo-se, designadamente, que o que se pretende (ou deveria) regular também inclui o meio internet, bem como outros meios de comunicação digitais (ou não), em coerência com a aplicabilidade do Código a “todos” os suportes. Ao arrepio da melhor doutrina jus-publicitária, continua a consagrar-se a figura do patrocínio como uma forma especial de publicidade, cuja definição legal, aliás, não necessitaria de ser “genérica”, “televisiva” e “radiofónica”, através de três normas diferentes; prima-se, aliás, pela ausência de revogação explícita de várias normas constantes Lei da Televisão e, também, da Lei da Rádio, o que não é aconselhável, por razões de segurança jurídica; repete-se o quadro normativo referente à utilização de imagens subliminares (continuando-se a não definir o conceito) quando é certo que se trata de uma prática há muitos anos em desuso, não se estabelecendo, de forma clara, um
regime para a violação do Princípio da Identificabilidade para a generalidade dos suportes publicitários. Mantém-se inalterada a redação da norma que regula a intervenção de menores como intervenientes principais das mensagens publicitárias, prática que, sobejamente, já provou carecer de uma regulamentação bastante mais apurada. à já pouco clara redação da norma reguladora da publicidade testemunhal (que se mantém) acrescentou-se a figura indefinida de “pessoa com notoriedade”, sem que se imprimam contornos objetivos à noção, e sem que se estabeleçam ,em termos de conceito, as diferenças entre figuras públicas e figuras mediáticas. Verifica-se, ainda, a mudez legislativa no que concerne a um regime jurídico específico e necessário aplicável às comunicações comerciais veiculadas através dos vários suportes publicitários digitais, cuja ausência tem causado, designadamente, uma acentuada distorção da concorrência entre meios. Por fim, seria impossível deixar de comentar a norma que prevê a fiscalização prévia da ANACOM à atividade publicitária dos operadores de comunicações eletrónicas, porquanto há dúvidas quanto à sua
23 advocatus junho 2015
LEONOR CHASTRE Especialista em Propriedade Intelectual pela Ordem dos Advogados
constitucionalidade, por constituir uma restrição à iniciativa económica privada. Existem muitas dúvidas à legalidade desta norma, por ir frontalmente contra aquela que é a tendência europeia de substituição de controlo ex ante por controlo ex post, favorecendo a iniciativa privada e a concorrência, e em particular, no que respeita ao setor das telecoms, por ir frontalmente contra a ideia de criação de um quadro regulatório comum harmonizado que, em país nenhuma da UE, prevê este tipo de controlo. Não se pode esquecer que este setor se caracteriza por um enorme dinamismo e competitividade, podendo a acima mencionada norma vir a introduzir entropia e complexidade desnecessárias na comunicação dos operadores com consumidores. Para mais a referida norma não traz um added value significativo em termos de salvaguarda dos direitos dos consumidores, na medida em que o número de queixas de consumidores em matéria de publicidade não ultrapassa as dezenas, considerando que se fazem milhares de campanhas anuais e que se prestam milhões de serviços de comunicações eletrónicas.
Código da Publicidade
Ambush marketing: Uma omissão no novo código? NUNO CRUZ Advogado da PCA – Pereira da Cruz e Associados
Não existe presentemente em Portugal legislação referente ao denominado ambush marketing. A expressão, como é sabido, designa a estratégia de marketing em que um anunciante, não patrocinador oficial de um determinado evento, faz publicidade usando esse evento para induzir os consumidores a prestarem atenção à sua campanha – ou, mesmo, para desviar a atenção daqueles para a sua campanha, em prejuízo da publicidade feita pelo patrocinador oficial. Tornou-se, na linguagem corrente, um termo pejorativo para significar o “roubo” dos benefícios dos patrocinadores oficiais.1 Em Portugal, foram apreciados pelo ICAP alguns casos claros de ambush marketing. Um deles, ocorrido durante o Mundial de Futebol de 2010, envolveu uma empresa de aparelhos eletrónicos (X), não patrocinadora do evento, que lançou uma campanha intitulada “Promoção X Futebol em Portugal”, em que se usava o slogan “Se Portugal ganhar você também ganha” no qual se veiculava a promoção “Compre o portátil X ou um televisor X e nós oferecemos se Portugal for campeão”.2 Noutro caso, ocorrido durante o Mundial de Futebol de 2014, uma empresa de hipermercados (Y), não patrocinadora deste evento, lançou a campanha “Venha e jogue com Portugal”, oferecendo-se descontos em função de compras realizadas entre determinadas datas
Certo é que o ambush marketing prejudica seriamente quem investe na contratação de patrocínios, preocupando também várias entidades em Portugal, como o Comité Olímpico de Portugal (COP), a Federação Portuguesa de Futebol e o próprio ICAP. Nessa medida, o novo Código da Publicidade poderia ter sido uma boa oportunidade para se discutir e voltar a regular esta matéria
“Portugal foi, contudo, um dos pioneiros na implementação de normas proibindo e punindo o ambush marketing, muito embora limitadas a um evento desportivo específico, o Euro 2004”
e dos resultados obtidos pela equipa portuguesa nesse campeonato.3 Em todos os casos, o Júri de Ética do ICAP, embora reconhecendo que as campanhas das denunciadas haviam criado “uma associação com o momento do campeonato mundial de futebol“ e “com a prestação da Selecção Nacional nesse campeonato”, deliberou no sentido de não existir em Portugal base legal para a proi-
bição dessas práticas de marketing. Portugal foi, contudo, um dos pioneiros na implementação de normas proibindo e punindo o ambush marketing, muito embora limitadas a um evento desportivo especifico, o Euro 2004. Tratou-se do Decreto-Lei nº 86/2004, de 17 de Abril, que teve, entre outras, a finalidade de “criar instrumentos que permitem reagir contra quem, por qualquer meio e não estando autorizado a associar as suas marcas (…) a este evento, o possa desprestigiar ou dele se possa aproveitar para, indevidamente, obter a mesma visibilidade e os benefícios promocionais conferidos aos patrocinadores oficiais”. Findo o Euro 2004, o referido diploma deixou, naturalmente, de ter qualquer aplicação. É de notar que, em duas das suas decisões, o Tribunal Constitucional pronunciou-se no sentido de que as disposições do Decreto-Lei nº 86/2004 não violavam quaisquer princípios ou normas constitucionais.4 Duas das mais prestigiadas associações internacionais de Propriedade Intelectual, a AIPPI5 e a INTA6, recomendaram que a criação de legislação sobre ambush marketing deverá ser feita com prudência, tendo em vista um bom equilíbrio dos vários interesses em jogo. Certo é que o ambush marketing prejudica seriamente quem investe na contratação de patrocínios, preocupando também várias entidades em
(1) Phillip Johnson, “Ambush Marketing and Brand Protection”, 2ª edição – 2011, pág. 8. (2) Processo nº 13J/2010 (3) Processo nº 11J/2014 (4) Acórdão de 06.07.2005, 1ª Secção, Proc. nº 138/05 e Acórdão de 01.07.2008, 1ª Secção, Proc. nº 402/08. (5) Associação para a Protecção da Propriedade Intelectual, Resolução Q210, adoptada em Outubro de 2009. (6) International Trademark Association, resolução do Conselho, de Novembro de 2010. 24 advocatus junho 2015
Portugal, como o Comité Olímpico de Portugal (COP), a Federação Portuguesa de Futebol e o próprio ICAP (a FPF e o ICAP celebraram mesmo, em 1 de Junho de 2010, um “Protocolo em matéria de Ambush Marketing). Nessa medida, o novo Código da Publicidade poderia ter sido uma boa oportunidade para se discutir e voltar a regular esta matéria.
“O legislador optou por um modelo que se afasta da concessão de exclusivos, por intermédio da criação de um quadro normativo suficientemente abrangente e que deverá ser apelativo para o mercado”
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Nanny-statism ou um avanço civilizacional? O novo Código da Publicidade vai muito além de uma simples atualização da legislação nacional em função das tendências internacionais, demonstrando mesmo uma certa vontade de colocar Portugal na dianteira do pelotão do paternalismo publicitário.
À data em que se escreve estas linhas, ainda não é sabido se os contributos apresentados durante a fase de consulta pública sobre o novo Código da Publicidade serão de alguma forma acolhidos pelo Governo. Contudo, o projeto apresentado no início de maio de 2015 já permite concluir que está em curso uma mudança significativa na filosofia que subjaz ao regime geral da publicidade. Há 25 anos, quando o atual Código da Publicidade entrou em vigor, o legislador afirmou ter procurado evitar “intenções paternalistas”, tendo esse ponto sido inclusivamente destacado no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 330/90, que aprovou esse código. O novo Código da Publicidade, que o Governo vem agora propor, abandona essa preocupação e parece abraçar o paternalismo. Um dos exemplos mais paradigmáticos é o novo artigo 10.º, n.º 4, que estabelece que “é proibida a publicidade que utilize o corpo da mulher ou do homem ou partes do mesmo quando desvinculado do produto que se pretende publicitar, ou que associe a imagem da mulher ou do homem a comportamentos estereotipados discriminatórios”. Não é preciso grande salto de imaginação para perceber as dores de cabeça que esta norma altamente subjetiva e indeterminada irá causar aos operadores do sector publicitário. Onde fica essa fronteira entre um produto ou serviço que pode ou não ser publicitado com recurso à imagem do corpo humano (ou parte dele!)? Em entrevista à M&P TV, o Secretário de Estado Adjunto e da Eco-
“Há 25 anos, quando o atual Código da Publicidade entrou em vigor, o legislador afirmou ter procurado evitar intenções paternalistas, tendo esse ponto sido inclusivamente destacado no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 330/90, que aprovou esse código. O novo Código da Publicidade, que o Governo vem agora propor, abandona essa preocupação e parece abraçar o paternalismo”
nomia exemplificou dizendo que uma mulher em biquíni e com um corpo esbelto pode aparecer num anúncio da Nívea mas essa imagem será considerada desajustada num anúncio a automóveis. Pergunta-se: e se for um anúncio
a um perfume? Ou a uma viagem às Caraíbas? Será que um anúncio de uma raquete de ténis já não pode retratar o braço do jogador? E, já agora, quem define o que é um “comportamento estereotipado discriminatório”? Trata-se de uma matéria altamente subjetiva que conduzirá, inevitavelmente, a inúmeras arbitrariedades e gerará insegurança jurídica. Na sua obra “Morality and the Law”, Dworkin sustenta que o paternalismo só é justificável quando estiverem preenchidas duas condições. Em primeiro lugar, o paternalismo deve ter a intenção de proteger o visado de ações irracionais resultantes de uma deficiência cognitiva ou da sua própria ignorância. A segunda condição é a de que as intervenções paternalistas devem limitar-se a situações que são potencialmente perigosas ou cujos efeitos são marcantes e irreversíveis. O mesmo autor afirma ainda que, no que diz respeito à articulação entre o paternalismo e o Direito, cabe ao Estado demonstrar, de forma cabal, qual é o bem jurídico ameaçado e a probabilidade desse dano ocorrer. É manifesto que, no que toca ao novo artigo 10.º, n.º 4 (apenas a título de exemplo), essa demonstração não foi feita. Deve dizer-se, por fim, e em abono da justiça, que o avanço do nanny-statism (Estado ama-seca) na área da publicidade não é uma tendência exclusivamente portuguesa. Com efeito, no início de 2015, o parlamento francês surpreendeu o mundo ao tomar os primeiros passos no sentido de criminalizar o uso de modelos extremamente magras em anúncios publicitários.
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VASCO STILWELL D’ANDRADE Advogado da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados
Em vários outros países, os legisladores têm trabalhado com grande afinco, desde há vários anos, com vista a regular a publicidade relativa a fast-food, bebidas alcoólicas, tabaco e a uma série de outras realidades. Contudo, o novo Código da Publicidade vai muito além de uma simples atualização da legislação nacional em função das tendências internacionais, demonstrando mesmo uma certa vontade de colocar Portugal na dianteira do pelotão do paternalismo publicitário.
“Deve dizer-se, em abono da justiça, que o avanço do nanny-statism (Estado ama-seca) na área da publicidade não é uma tendência exclusivamente portuguesa”
Profissão
ASAP quer ser ouvida, bastonária diz que não há convites “Não há convites, há convocatórias”. Foi com esta afirmação que a bastonária da Ordem dos Advogados, Elina Fraga, respondeu ao apelo do presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal (ASAP), João Afonso Fialho, para ouvir as sociedades acerca da nova legislação. “Fizemos tudo para ser ouvidos”, disse o advogado durante a sessão de abertura do encontro anual da ASAP, que decorreu no dia 3 de junho, em Lisboa.
A bastonária da Ordem dos Advogados, Elina Fraga, e o presidente da ASAP, João Afonso Fialho
Para João Afonso Fialho, “não se pode continuar a legislar sobre sociedades de advogados sem ouvir as sociedades de advogados”. Referia-se aos desenvolvimentos legislativos recentes, como a lei das sociedades profissionais e o Estatuto da Ordem. “Fizemos tudo para ser ouvidos, quer junto do Ministério da Justiça, quer junto da
Ordem dos Advogados, para que o processo fosse diferente”. Garantiu, porém, que apesar da “reiterada manifestação” de disponibilidade, a ASAP nunca foi convidada a participar na discussão destes diplomas. “As sociedades de advogados não podem continuar a viver emparedadas nos seus próprios muros”,
acrescentou, por sua vez, Elina Fraga. “As sociedades de advogados não podem continuar apenas a emergir em temáticas que dizem respeito exclusivamente às próprias sociedades”, notou, referindo aguardar o contributo das sociedades em todas as matérias. “Não deixa de ser preocupante que não possam ou não queiram participar
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em matérias tão importantes como é o caso das incompatibilidades, das buscas aos escritórios de advogados, do segrego profissional e muitas matérias que foram discutidas em sede de Assembleia-Geral da Ordem dos Advogados”, acrescentou. Na sua opinião, “é preciso esbater esse fosso que se cavou entre advogados e sociedades, como se as sociedades de advogados não fossem constituídas por advogados”. Durante o dia, estiveram em destaque temas como a multidisciplinariedade, a abertura do capital, a publicidade, a administração por não advogados e a segurança informática nas sociedades. Uma das conclusões retiradas do encontro foi a necessidade de refletir mais sobre as sociedades multidisciplinariedades. “Esta discussão entre advogados encerra um problema: olharmos para as coisas apenas na perspetiva da profissão”, sustentou o sócio fundador da Cardigos Pedro Cardigos, considerando que “o que eventualmente falta é a visão dos destinatários de tudo isto: os cidadãos”. O advogado lembrou a razão primeira pela qual se vai para Direito – ajudar as pessoas – para afirmar que este motivo não está nas discussões“. Também José de Freitas, da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira, admitiu que “o foco da discussão está na advocacia e devia estar no cidadão”. O antigo bastonário Rogério Alves afirmou-se contra as sociedades multidisciplinares, mas concordou que a discussão em torno da questão deve continuar, salientando que deve ser vista à luz do segredo pro-
advocatus.pt fissional. “Admito as sociedades multidisciplinares se for a maneira mais adequada de viver no mundo atual”, garantindo “a blindagem da defesa dos valores da advocacia”, afirmou. Rui Medeiros, da Sérvulo, destacou, por sua vez, que no mundo atual da advocacia –”diferenciada e competitiva” – “não tem sentido não deixar espaço para a diferença”. “Em Espanha, a multidisciplinaridade é uma forma de competitividade das pequenas sociedades, de poderem oferecer serviços, por
exemplo, de contabilidade. Se os advogados em prática isolada e as pequenas sociedades se perspetivassem a questão da multidisciplinaridade desta forma, na lógica de defesa dos seus próprios interesses, teriam uma posição diferente”, sugeriu. A propósito do tema da multidisciplinariedade, seguem-se artigos de opinião por parte de sócios de duas sociedades ibéricas, que conhecem as diferentes realidades vividas nesta matéria em Portugal e Espanha.
João Afonso Fialho criticou a ausência de diálogo
As alterações legislativas sobre a profissão estiverem em foco no encontro Rui Medeiros, da Sérvulo
Rogério Alves, ex-bastonário
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Profissão
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Ponto de encontro entre fornecedores
Pedro Cardigos
João Afonso Fialho e Daniel Proença de Carvalho
O painel que debateu o impacto da legislação na profissão
Daniel Proença de Carvalho
28 advocatus junho 2015
A GESTÃO PARA JURISTAS GONÇALO VAREIRO, PACC.V «Ter feito o Programa enriqueceu-me pessoal e profissionalmente e entendi que o advogado/jurista, só vestindo a pele do dirigente, está realmente habilitado para compreender os desafios que se apresentam às organizações.»
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Profissão
O benefício da multidisciplinaridade… de conhecimentos DIOGO LEÓNIDAS ROCHA Managing partner da Garrigues
A Lei das Associações Públicas Profissionais (Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro) relançou o tema da multidisciplinaridade no exercício da advocacia, motivando acesos debates sobre a forma de adaptação dos estatutos da Ordem de Advogados ao novo regime. As recentes iniciativas legislativas do Governo consubstanciadas nas propostas de Lei das Sociedades Profissionais e de alteração do Estatuto da Ordem dos Advogados acentuam a urgência da discussão. A proposta de Lei das Sociedades Profissionais prevê a multidisciplinaridade no seu sentido puro: as sociedades profissionais têm por objeto o exercício em comum de atividades profissionais organizadas numa única associação pública profissional e, a título secundário, outra qualquer atividade não incompatível. Aplicada às sociedades de advogados, tal permitiria o exercício da advocacia cumulativamente com outras atividades profissionais. Sem pretender opinar sobre os méritos desta proposta legislativa, sempre poderei dizer que não sinto no mercado da advocacia a necessidade deste tipo de multidisciplinaridade. A prática tem demonstrado que poderão não existir sinergias relevantes no exercício em comum da advocacia e de outras atividades profissionais que motive o sacrifício, maior ou menor, dos valores da independência, sigilo profissional ou conflitos de interesses. Nem acho que os clientes reclamem qualquer tipo de centro comercial de atividades profissionais. Sinto no entanto que o exercício da advocacia beneficiaria muitas vezes
Não sinto no mercado da advocacia a necessidade deste tipo de multidisciplinaridade. Nem acho que os clientes reclamem qualquer tipo de centro comercial de atividades profissionais. Sinto no entanto que o exercício da advocacia beneficiaria muitas vezes com uma certa “multidisciplinaridade de conhecimentos”.
“A prática tem demonstrado que poderão não existir sinergias relevantes no exercício em comum da advocacia e de outras atividades profissionais que motive o sacrifício, maior ou menor, dos valores da independência, sigilo profissional ou conflitos de interesses”
com uma certa “multidisciplinaridade de conhecimentos”: conhecimentos contabilísticos enriquecem uma consultoria em direito societário; conhecimentos de engenharia do ambiente adicionam valor a uma assessoria jurídica nessa área; conhecimentos de economia complementam eficazmente a prática de direito fiscal. Nesse sentido, não vejo inconveniente em que as sociedades de advogados incluam profissionais que não sejam advogados. E na mesma lógica não
vejo razão para que tais profissionais não possam beneficiar do mesmo plano de carreira, e inclusivamente assumir a qualidade de sócios. A Garrigues atua em Espanha como uma sociedade multiprofissional, de acordo com o previsto na legislação espanhola, dedicando-se no entanto exclusivamente ao exercício da advocacia. Na lógica da complementaridade de conhecimentos, inclui um número reduzido de profissionais não advogados, alguns sócios, fundamentalmente economistas, engenheiros ambientais, psicólogos (human capital), e membros do Centro de Estudos Garrigues. Uma grande maioria desses profissionais que prestam serviços a terceiros tem dupla carteira profissional, sendo também advogados. Todos os profissionais assinam uma vez por ano uma declaração em que se comprometem a cumprir os princípios deontológicos da advocacia, nomeadamente sigilo profissional e independência. Os conflitos de interesse são geridos de forma global, abrangendo todos os clientes da sociedade. Os profissionais não advogados podem ser sócios e assumir posições de capital na sociedade, mas a qualidade de sócio está sempre ligada à aportação da sua indústria. Apesar de uma sociedade de grande dimensão necessitar de elevados investimentos de capital, a J&A Garrigues S.L.P não admite sócios meramente financeiros, sendo todas as necessidades de capital satisfeitas pelos seus sócios, necessariamente profissionais. A sociedade é igualmente financiada pelos sócios através de suprimentos, e mediante recurso
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a financiamento bancário. Discute-se por fim se a administração das sociedades de advogados poderia ser aberta a profissionais não advogados. Não vejo nisso qualquer impedimento. A dimensão e complexidade das sociedades de advogados reclamam cada vez mais uma profissionalização da sua gestão. Não só a gestão exige cada vez mais uma dedicação exclusiva, como conhecimentos que extravasam o domínio meramente jurídico.
“A dimensão e complexidade das sociedades de advogados reclamam cada vez mais uma profissionalização da sua gestão. Não só a gestão exige cada vez mais uma dedicação exclusiva, como conhecimentos que extravasam o domínio meramente jurídico”
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Desregulamentação com efeito potencialmente nefasto
Ao papel fundamental desempenhado pela advocacia na administração da justiça e na implementação do direito constitucional de acesso ao direito e à protecção jurídica, corresponde a atribuição aos advogados e às sociedades de advogados de um conjunto de deveres e prerrogativas em termos que estariam provavelmente sujeitos a ser reconsiderados se a natureza destas últimas se alterasse de modo a descaracterizá-las.
O reacender da polémica acerca das sociedades multiprofissionais que culminou com a elaboração do projecto de Estatuto da Ordem do Advogados que expressamente rejeita o exercício, por parte das sociedades de advogados, de actividades em associação ou integração com outras profissões, e o regime distinto quanto a esta matéria existe em Espanha, não suscita para nós qualquer questão em particular. Embora o regime jurídico existente em Espanha permitisse que assim não fosse, a Uría Menéndez não conta entre os seus sócios com nenhuma pessoa que não seja um advogado, os seus órgãos executivos são compostos exclusivamente por advogados, e a sociedade não exerce qualquer outra actividade que não seja a advocacia. A posição reafirmada pelo projecto de Estatuto da Ordem dos Advogados não levanta assim qualquer necessidade de adaptação por parte da nossa sociedade àquela que é, por sua opção, a sua posição quanto a esta matéria. O debate acerca da prestação de serviços de advocacia por parte de sociedades multiprofissionais tem já décadas, e efectivamente reacendeu-se recentemente em Portugal após um período de alguns anos em que, na sequência das convulsões resultantes do caso Enron, o tema esteve mais afastado da ordem do dia. Os argumentos a favor e contra a existência de sociedades multidisciplinares que prestem serviços de advocacia não são novos. Não
obstante a crítica fácil de que a rejeição liminar mais ou menos generalizada por parte dos advogados quanto à existência desse tipo sociedades – rejeição esta que foi abertamente assumida pela Ordem dos Advogados nos trabalhos pre-
“Na maioria dos casos observados, ou as actividades distintas da advocacia prosseguidas por estas sociedades têm uma função meramente complementar ou de suporte àquela, ou quando, pelo contrário, são preponderantes, verifica-se normalmente uma grande dificuldade por parte destas sociedades em se imporem na primeira linha no mercado da prestação de serviços jurídicos dos seus países”
paratórios do projecto de Estatuto – corresponde principalmente a instintos proteccionistas por parte de uma classe profissional, parece-nos ser evidente que a existência desse tipo de sociedades coloca questões extremamente delicadas. Ao papel fundamental desempenhado pela advocacia na administração da justiça e na implementação do direito constitucional de acesso ao direito e à protecção jurídica, corresponde a atribuição aos advogados e às sociedades de advogados de um conjunto de deveres e prerrogativas em termos que estariam provavelmente sujeitos a ser reconsiderados se a natureza destas últimas se alterasse de modo a descaracterizá-las. É assim matéria que carece da devida ponderação e onde a simples desregulamentação teria um efeito potencialmente nefasto. Finalmente, e por outro lado, se observarmos a experiencia dos países onde existem sociedades multiprofissionais que prestam serviços de advocacia, parece-nos estarem ainda por demonstrar as vantagens deste tipo de sociedades. Na verdade na maioria dos casos observados, ou as actividades distintas da advocacia prosseguidas por estas sociedades têm uma função meramente complementar ou de suporte àquela – e têm assim um peso incipiente no conjunto da actividade prosseguida por essas sociedades –, ou quando, pelo contrário, são preponderantes as actividades distintas da advocacia, verifica-se normalmente
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FRANCISCO BRITO E ABREU Sócio do departamento comercial da Uría Menéndez – Proença de Carvalho
“Se observarmos a experiência dos países onde existem sociedades multiprofissionais que prestam serviços de advocacia, parece-nos estarem ainda por demonstrar as vantagens deste tipo de sociedades”
uma grande dificuldade por parte destas sociedades em se imporem na primeira linha no mercado da prestação de serviços jurídicos dos seus países. Assim, também sob este ponto de vista, não é evidente a potencial vantagem que a adopção deste modelo possa trazer, quando comparado aos das sociedades dedicadas em exclusivo ao exercício da advocacia. É, no entanto, esta uma questão que nos parece não estar ainda definitivamente resolvida, e que voltará certamente equacionar-se no futuro. Artigo escrito ao abrigo do anterior acordo ortográfico.
Televisão
Propiciar a comunicação entre operadores judiciários O presidente do Círculo de Advogados de Contencioso, o sócio da SRS Advogados José Carlos Soares Machado, reflete sobre a importância da comunicação entre advogados e magistrados no Direito a Falar, um programa do ETV em parceria com o Advocatus.
ETV | O que é que o Círculo tem feito e quais os seus objetivos? José Carlos Soares Machado | O Círculo foi fundado com um objetivo essencial que foi juntar um conjunto de advogados especializados em litígio civil e comercial, uma área que tradicionalmente era muito tratada por advogados generalistas que fazem um pouco de tudo e continua a ser, mas que, nos últimos tempos, à semelhança dos mercados anglo-saxónicos, vai sendo cada vez mais vista como uma especialização, a que chamam Litigation. Nós congregámos um conjunto de advogados com experiência – um dos requisitos é o número de anos de inscrição – e que se dedicam exclusivamente ao litígio civil e comercial. Foi esse grupo que inicialmente fundou o Círculo em 2012, agora já tem mais membros. O objetivo é pôr os pro-
“O litígio civil e comercial, uma área que tradicionalmente era muito tratada por advogados generalistas que fazem um pouco de tudo e continua a ser, mas que, nos últimos tempos, à semelhança dos mercados anglo-saxónicos, vai sendo cada vez mais vista como uma especialização, a que chamam Litigation”
fissionais da mesma especialidade a trocar impressões.
mos discutir temas que nos dizem respeito e à nossa especialidade.
ETV | E também a falar com os magistrados. JCSM | Esse é já um outro plano dos nossos objetivos. Nós vamos estar precisamente com os magistrados judiciais e do Ministério Público, mas no caso do contencioso comercial mais com os magistrados judiciais do que do Ministério Público. Achámos desde o início que fazia todo o sentido este diálogo entre os próprios especialistas e fora do contexto dos tribunais. Verificámos que acontecia frequentemente, não só entre nós como com os magistrados, era que nos encontrávamos no tribunal, estava cada um do seu lado, nas suas posições, a representar os seus clientes e só. Depois não havia um fórum específico onde pudésse-
ETV | E a conferência que fizeram em Cascais, no dia 5 de junho, foi precisamente sobre este tema. JCSM | Foi a primeira e seguir-se-ão outras. Foi uma conferência de um dia inteiro na sequência de uma série de dez workshops que fizemos com um modelo diferente, de fim de tarde. Para esses workshops convidámos sempre dois magistrados, um de primeira instância, outro de tribunais superiores, para troca de impressões sobre a visão não só de aspetos técnicos da Lei como também do próprio procedimento da justiça. Na advocacia de litígio há muito para além da simples interpretação ou aplicação de uma norma. Há muitos comportamentos que têm a ver com a estratégia processual, com o modelo de comportamento
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do advogado numa audiência, até na comunicação escrita, na forma de transmitir ao juiz aquilo que é a posição do nosso cliente. No fundo, o advogado é alguém que ouve uma versão de factos que lhe é dada pelo cliente e tem que transmiti-la a outras pessoas, neste caso à parte contrária e ao juiz. E há inúmeras técnicas de transmitir estes factos, que nós ensinamos no estágio, mas que muitas vezes a Lei também não explica. Eu acho que há um aspeto fundamental que quem está nos tribunais e na advocacia esquece frequentemente: discute-se muito aquilo que divide as pessoas, quando na verdade temos muito mais em comum, aquilo que nos divide é menos do que o que temos em comum. ETV | Para o futuro, que tipo de eventos estão a pensar organizar? JCSM | Nós vamos continuar com os workshops que temos vindo a fazer desde há três anos, com regularidade mais ou menos bimensal. Vamos alterar-lhes um pouco o modelo. São workshops com uma
“Na advocacia de litígio há muito para além da simples interpretação ou aplicação de uma norma. Há muitos comportamentos que têm a ver com a estratégia processual, com o modelo de comportamento do advogado numa audiência, até na comunicação escrita, na forma de transmitir ao juiz aquilo que é a posição do nosso cliente”
perspetiva ligeiramente diferente daquilo que foi esta conferência, que foi um diálogo entre magistrados e advogados onde as pessoas falaram umas com as outras e se ouviram. Os workshops bimensais visam aspetos mais técnicos e de execução da Lei, trocamos impressões sobre alterações em matéria de processo, como o Código de Processo Civil, Código de Insolvência e até Lei da Arbitragem. No caso do Código de Processo Civil, já contamos com quase dois anos de experiência. ETV | E que balanço faz destes dois anos do Código? JCSM | Ainda não é fácil fazer um balanço. Há normas inovadoras que, às vezes, um ou dois anos depois da entrada em vigor ainda não foram utilizadas. Mas houve um aspeto na conferência que foi unanimemente considerado importante: este Código aponta muito para um trabalho de cooperação entre os chamados operadores judiciários. Mais do que nunca é importante que as pessoas
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se entendam e não tenham surpresas, porque esta lei dá uma grande margem de manobra ao juiz e também aos advogados para executar o que está nas normas de uma manei-
“Mais do que nunca é importante que as pessoas se entendam e não tenham surpresas, porque esta lei dá uma grande margem de manobra ao juiz e também aos advogados para executar o que está nas normas de uma maneira ou de outra”
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“A admissão tem sido lenta, porque um dos fatores que esteve na origem do próprio Círculo era fazer a diferença pela experiência das pessoas que lá estão, pela indiscutível especialização”
ETV | Disse há pouco que o Círculo tem agora mais membros. Ao todo quantos associados tem? JCSM | Temos 42 neste momento.
ra ou de outra. Há juízes a fazer as mesmas diligências, de uma maneira um pouco diferente, e o Código dá-lhes esse poder de adequar, de gerir. Mas isso só funcionará com uma mudança de mentalidades, na qual o Círculo também poderá ajudar. ETV | Refere-se a uma magistratura mais aberta? JCSM | Exatamente. Sem complexos. Tivemos este exemplo muito claro de magistrados que não se importaram nada de estar numa assembleia em que a grande maioria dos presentes eram advogados. A troca de impressões decorreu com uma elevação extraordinária. ETV | E que pontos é que causaram mais discordância entre magistrados e advogados? JCSM | Alguns pontos que têm a ver com aspetos que no Código de Processo Civil estão regulamentados de uma forma um pouco menos concreta. A audiência prévia, por exemplo. Alterações como a forma de
“Além da oposição natural é necessária inteligência, capacidade e talento para encontrar os pontos comuns de colaboração para que a justiça seja melhor. Com isto o Código veio aproximar-se um pouco daquilo que já se fazia na arbitragem. É um desafio para os profissionais”
articular esta nova regulamentação que distingue a relevância jurídica e a necessidade de articular factos essenciais, complementares, concretizadores ou instrumentais. Tudo isto depois leva a que seja necessário, quer em audiência prévia, quer em audiência final de julgamento, que os advogados e juízes estejam muito atentos, porque surgem factos e têm de ser relevantes. Antigamente era muito fácil, porque surgia um facto novo na audiência que não era referido pelas partes e o juiz, em 90 por cento dos casos, não validava esse facto. E cada vez que isso acontecia falhava-se um pouco mais o objetivo de atingir a verdade material, porque estávamos a deixar factos de fora. Com a nova lei isso mudou. Além da oposição natural é necessária inteligência, capacidade e talento para encontrar os pontos comuns de colaboração para que a justiça seja melhor. Com isto o Código veio aproximar-se um pouco daquilo que já se fazia na arbitragem. É um desafio para os profissionais.
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ETV | Reúne os principais advogados desta área de prática? JCSM | Todas as maiores sociedades de advogados estão representadas por um ou por dois membros dos seus departamentos de contencioso, normalmente o responsável. Algumas sociedades médias, com especialização na área de litígio, também têm um membro. A admissão tem sido lenta, porque um dos fatores que esteve na origem do próprio Círculo era fazer a diferença pela experiência das pessoas que lá estão, pela indiscutível especialização. A ideia é juntar aqueles que praticam contencioso a 100%. Eu costumo dizer que nós, os 20 e tal que fundaram o Círculo, todos juntos somávamos mais de 500 anos de experiência e agora já estamos quase nos mil. Em litígio a experiência conta muito. ETV | E como é que têm sido as relações com a Ordem? JCSM | Não temos tido um relacionamento nem bom, nem mau. Cada um está no seu papel, não se cruzam. Aqui não há nem conflito de competências, nem coincidência. A Ordem é uma associação absolutamente necessária do meu ponto de vista, de caráter público, representa todos os advogados independentemente da sua experiência e da sua área de especialidade, e tem o seu papel próprio e insubstituível. O Círculo é completamente diferente. Claro que temos relações institucionais com os órgãos da Ordem e vamos continuar a ter, mas são objetivos diferentes.
O livro de
advocatus.pt
FERNANDO VELUDO
Rui Delgado
Rui Delgado, sócio fundador da Delgado e Associados
Há um conceito que há muito tempo venho tentando compreender ou, seguindo a etimologia, saber o que nele está contido. Esse conceito é o da liberdade individual. Com pequenas excepções, os autores da Antiguidade não abordaram directamente a questão da liberdade individual. Para os Gregos, a liberdade – a sua eleutheria – significava tão só a capacidade de nos movimentarmos. Era livre aquele que podia ir para onde quisesse, isto é, o senhor, o não dependente. É ainda e tão só a liberdade do eu-posso e não a liberdade do eu-quero. Foi preciso esperar por Santo Agostinho e pelo seu liberum arbitrium para
que o problema da liberdade individual fosse colocado como questão central e incontornável na história do pensamento e como uma das traves mestras do Cristianismo, por contraposição ao fatalismo, ao determinismo, à predestinação dominantes na quase totalidade das restantes religiões. Tratava-se da coexistência da omnisciência de Deus e da vontade livre do homem. És livre para seres responsável. Gostas da liberdade ou preferes fugir à sua terrível responsabilidade, refugiando-te em qualquer fatalismo? Atrevo-me a pensar que o desenvolvimento das sociedades ocidentais, em todas as suas vertentes, nomeadamente a económica, muito ficou
a dever a esta herança agostiniana. Só com Montesquieu surge a distinção entre liberdade individual ou filosófica e liberdade cívica ou política. Para ele, consiste a primeira “… no exercício da nossa vontade” e a segunda “…na segurança, ou pelo menos na opinião que temos sobre a nossa segurança”. Com os autores modernos – de Heidegger e dos existencialistas a Isaiah Berlin, passando pelo contributo de alguns psicanalistas – o problema da liberdade densifica-se, mas não me parece que o conceito tenha ganho em clareza. Pensar a liberdade individual implicará certamente o estudo das prin-
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cipais pulsões (reprodução/sexo, sobrevivência) da necessidade e das diversas causalidades, dos limites impostos pelas linguagens (mesmo as não-verbais). Talvez acabemos por concluir que o reino da mais completa liberdade individual é e poderá ser sempre o da mais radical solidão. É por tudo isto que, a propósito da faculdade da vontade e do problema da liberdade, considero tão estimulante a leitura daquela que foi a última e inacabada obra de Hannah Arendt – A Vida do Espírito – Vol. II – Querer. Texto escrito segundo as regras do anterior acordo ortográfico
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NOTÍCIAS Garrigues assessora REN A Garrigues assessorou a REN no processo de transmissão de ativos concessionados de armazenamento subterrâneo de gás natural da Galp (detidos pela sua participada Transgás Armazenagem) para a sua representada, anunciou a sociedade de advogados, em comunicado. Com a conclusão deste negócio, através de uma transmissão parcial da concessão, avaliado em mais de 70 milhões de euros, a REN passa a explorar em regime de serviço público as cavidades de armazenamento subterrâneo de gás natural até então exploradas pela Transgás Armazenagem, tendo igualmente garantido o direito a construir mais duas cavidades.
Cuatrecasas assessora vencedor da privatização da TAP A Cuatrecasas, Gonçalves Pereira (CGP) foi a sociedade que assessorou a Gateway, o consórcio vencedor do concurso à privatização da TAP, formado por David Neelman e Humberto Pedrosa. A CGP prestou assessoria a nível de due diligence, negociação, formulação e submissão da proposta à reprivatização, com uma equipa que envolveu advogados de vários departamentos, “devido à complexidade do negócio”. A assessoria jurídica à operação foi liderada por Diogo Perestrelo, sócio da área de M&A e um dos managing partners da CGP em Portugal, e envolveu os advogados: Luís Soares de Sousa e Telma Carvalho (Direito
de Aviação); Ana Graça Remondes, Margarida Leal Oliveira, Elsa Pizarro Pardal, Nuno Marques, Stéphanie Sá Silva e Guilherme Seabra Galante (Corporate e M&A); António Vitorino e Rita Leandro Vasconcelos (Direito Europeu e da Concorrência). Participaram ainda Sandra Silveira, Ana Isabel Marques, Lourenço Vilhena de Freitas, Marta Costa Martins, Ana Sofia Silva, Pedro Vidal Matos, Graça Quintas, Sónia Queiróz Vaz, Ana Costa Teixeira, Bruno Neves de Sousa, Marta Cabral Pestana, João de Lemos Portugal, Rita Caçador e Lukeno Alkatiri (equipa responsável pela Due Diligence, envolvendo vários departamentos).
CMS RPA e PLMJ na subconcessão do Metro e Carris A CMS Rui Pena & Arnaut (CMS RPA) foi a sociedade que prestou assessoria jurídica à Avanza, no concurso para a subconcessão do Metro de Lisboa e da Carris, que venceu no dia 19 de junho. Por sua vez, a assessoria jurídica da Carris/Metro esteve a cargo da PLMJ. A equipa da CMS RPA foi coordenada pelos sócios Mónica Carneiro Pacheco (Direito Público), Francisco Xavier de Almeida (Direito
Societário/M&A), Susana Afonso (Direito Laboral), e o managing partner, José Luís Arnaut. Já a equipa da PLMJ envolvida foi a de Direito Público, coordenada pelo sócio Pedro Melo. Roland Berger foi o consultor financeiro. A espanhola Avanza foi escolhida para gerir durante oito anos os transportes urbanos de Lisboa, por 1.075 milhões de euros.
Concórdia elege novos órgãos sociais A Concórdia elegeu em assembleia geral os órgãos sociais para o mandato 2015-2017. Rui Pena mantém-se como presidente do Conselho Executivo, tendo como vice-presidentes João Nuno Azevedo Neves e Diogo Lacerda Machado, Miguel Cancella de Abreu como secretário-geral, Leonor Chastre como tesoureira e os vogais António Magalhães Cardoso e Manuel Cavaleiro Brandão. As principais alterações ocorrem no Conselho Superior, que, mantém o presidente José Lebre de Freitas, mas passa a contar também com a participação de Agostinho Pereira de Miranda, Ana Paula Costa e Silva e Jorge Veríssimo. A Assembleia Geral é presidida por Augusto Lopes Cardoso, com António Esteves na vice-presidência e Clara Moreira Campos como secretária. O Conselho Fiscal fica a cargo de Armindo Ribei-
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ro Mendes (presidente), João Perry da Câmara (vice-presidente) e João Paulo Ferreira da Conceição (vogal). Por fim, a Comissão de Gestão do Centro Concórdia (2014-2016) integra Tito Arantes Fontes (presidente), Joaquim Shearman de Macedo e Miguel de Almada.
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Pessoas
LUÍS NETO GALVÃO
LAI LEN NG
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Foi nomeado consultor do Conselho da Europa na área da privacidade e proteção de dados. O sócio da SRS é um de quatro consultores europeus, e o único português, designados pelo Conselho da Europa para desenvolver o curriculum de um curso de proteção de dados pessoais e privacidade para a formação de juristas (juízes, procuradores e advogados).
CATARINA FRANCO MADEIRA
Vem reforçar o Asian Desk da RFF & Associados. A advogada residia anteriormente em Macau, sendo fluente em chinês dada a sua nacionalidade. A equipa da Asian Desk foi criada para lidar com o mercado asiático (Macau, China e Timor).
PAULO NETO
É o novo reforço da área de Direito Público da AAMM – Abecasis, Azoia, Moura Marques & Associados. Transita da Vieira de Almeida & Associados e é especializada em matérias de Direito Administrativo, nomeadamente contratação pública, concessões, regulação e supervisão, com especial incidência em contencioso administrativo e regulatório e arbitragem, prestando assessoria jurídica a entidades públicas e privadas.
O senior partner da Diogo, Neto, Marques e Associados (DNM) foi reeleito para o cargo de vice-presidente da AEA – International Lawyers Network. A AEA é uma associação internacional de advogados, sedeada em Alicante, Espanha, que congrega milhares de profissionais de todos os países do mundo.
O agregador da advocacia
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Montra
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Quando a madeira e a arte se fundem A artista plástica Vanessa “The Super Van” Teodoro dá cor à primeira edição da SKOG Signature Limited Series. Óculos de sol feitos à mão, em madeira e bambu, com lentes polarizadas, e onde a artista definiu uma intervenção a laser dando lugar a um padrão único, em tons de azul e cobre.
A beleza granítica do Porto O granito é uma parte integrante da cidade do Porto e sobre a qual se ergue a cidade. Um elemento que inspirou o designer Marco Sousa para a conceção da mesa de jantar “Stone”. De edição limitada e integrada na Porto Collection da Bat Eye, a obra artesanal reflete a beleza do granito e é revestida por folha dourada.
Elegância em liberdade
Horas protegidas por aço
Para o verão, Luís Onofre apresenta três linhas de sandálias de edição limitada, inseridas na coleção Under the Bluest Sky on a Silky Road, que cruzam sofisticação, elegância e conforto. Dividida em dez modelos distintos, cada uma das três linhas recorre a combinações especiais entre aplicações metálicas, peles, camurça e cristais Swarovski. Os chinelos baixos ou com salto suave incluem tiras que envolvem os dedos e o pé, em tons de nude, pêssego, cinza claro, preto e azul forte.
A Officine Panerai sugere os relógios com caixa de aço polido Radiomir Black Seal e Radiomir 8 Days. Com movimento mecânico de corda manual, caixa de 45 milímetros, reserva de marcha até 192 horas e resistência à água até 100 metros de profundidade, apresentam mostrador preto com números arábicos e índices luminescentes.
Eternidade estimulante, inspiradora e viciante São estes os elementos-chave da fragrância Eternity Summer for Men, de Calvin Klein. No interior reúne aromas de toranja e pimenta preta, com um acorde marinho, folha de figo, cipreste e baga de zimbro, almíscar e âmbar, que aludem a uma masculinidade rica, confiante e calorosa. O frasco em tons de amarelo, dourado e azul petróleo pretende captar a visão do mar e as cores vivas do céu.
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MASTER OF LAWS
Inovador. Diferenciador. Global. Um programa que se destaca • Um LL.M. único e exigente, que oferece a preparação certa para compreender o Direito em toda a sua complexidade. • Os mais conceituados professores Americanos e Europeus apresentam novas metodologias de ensino, que garantem uma visão abrangente do Direito, no seu contexto político, económico e social. • Pelo 5º ano consecutivo entre os mais inovadores do mundo (Financial Times).
CATÓLICA GLOBAL SCHOOL OF LAW CUTTING EDGE LEGAL EDUCATION
www.catolicalaw.fd.lisboa.ucp.pt catolica.law@ucp.pt PARCEIROS
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