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Diretor: João Teives

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Diretor Editorial: Hermínio Santos

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Mensal

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Ano IV

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N.º 39

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Junho de 2013

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15 euros

O agregador da advocacia

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Jorge de Brito Pereira, sócio da PLMJ

Problemas do sistema judicial não se resolvem num mandato

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Rui Mayer, sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira

Oportunidades na energia

Em determinados nichos de mercado, no sector da energia, Portugal oferece muitas oportunidades a companhias que se queiram instalar no País. Também há oportunidades na melhoria de qualidade de serviços e de diversificação da oferta de produto para as que já estão instaladas. Esta é a convicção de Rui Mayer, o mais recente sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira.

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O valor da independência dos advogados

Jean-Marie Burguburu, presidente da União Internacional de Advogados (UIA), esteve em Lisboa para participar num encontro sobre a reforma da Contratação Pública e conversou com o Advocatus sobre o estado atual da advocacia e do mundo e também acerca do próximo congresso a instituição, que se realiza em Macau, de 31 de outubro a 4 de novembro. Independência foi uma das palavras que mais usou durante a entrevista.


a influenciar desde 1986

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Diretor-geral João David Nunes jdn@briefing.pt Diretor João Teives joao.teives-14761l@advogados.oa.pt Diretor Editorial Hermínio Santos hs@briefing.pt Editora Executiva Fátima de Sousa fs@briefing.pt

Diretora de Marketing Maria Luís Telf. 961 571 629 ml@briefing.pt

Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias) assinaturas@briefing.pt Tiragem média mensal: 2.500 ex. Depósito legal: 308847/10 N.º registo erc 125859

Destaques

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MULTIDISCIPLINARIDADE

A experiência dos EUA

Kenneth Standard, ex-bastonário da New York State Bar Association, esteve em Lisboa para participar numa conferência sobre multidisciplinaridade organizada pelos Conselhos Distritais de Lisboa e Coimbra e falou sobre a sua experiência nesta matéria.

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DOSSIÊ

Quando a Justiça é primeira página

João Afonso Fialho, sócio da Miranda Correia Amendoeira & Associados, Francisco Proença de Carvalho, sócio de contencioso da Uría Menéndez-Proença de Carvalho, e Paulo Farinha Alves, sócio da PLMJ, dão a sua opinião sobre as relações entre Justiça e Media.

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testemunho

Envolvimento nas decisões estratégicas

Paulo Marinho, advogado in house da Ascendi, fala da sua experiência e como se tem mantido um baixo nível de litigiosidade no grupo. Isso tem muito a ver com o envolvimento em grande parte das decisões estratégicas.

Editora Enzima Amarela - Edições, Lda Av. Infante D. Henrique, 333H, 44 1800-282 Lisboa Tel. 218 504 060 Fax: 210 435 935 advocatus@briefing.pt www.advocatus.pt Impressão: TYPIA – Grupo Monterreina Área Empresarial Andalucía 28320 Pinto Madrid - España

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trabalho

Direito Laboral em alta

Vasco Salgueiro, manager da Michael Page Tax & Legal, afirma que a procura por especialistas em Direito Laboral está a aumentar. Na edição de maio 2013, no diretório Diretores Jurídicos, a informação sobre o Diretor Jurídico da empresa AFAVIAS – Engenharia e Construções está errada. A diretora jurídica desta empresa é Elizabeth Nunes. Junho de 2013

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Cortar a direito

João Teives diretor

O Engenho Não deixa de ser irónico que a atual governação, que nunca teve qualquer preocupação em qualificar os seus funcionários, agora queira qualificá-los para depois despedi-los. No passado dia 6 de junho, o Governo apresentou duas propostas de lei na Assembleia da República (153/XII/2ª e 154/XII/2ª) que visam o aumento do tempo de trabalho dos trabalhadores com funções públicas, por um lado, e a cessação do respetivo vínculo, por outro. Inserem-se tais diplomas na proclamada reforma do Estado e na alegada necessidade de reduzir mais de quatro mil milhões de euros na despesa pública. Antes de mais, cumpre referir que o discurso sobre a função pública, e muitas vezes sobre a própria Justiça, encontra-se eivado de uma poluição turva que por vezes torna difícil um diagnóstico justo e correto. Basta recuar não mais do que uma década para percebermos que muito mudou, e para muito melhor, na Administração Pública, no seu funcionamento e no relacionamento com os particulares. Dou pequenos exemplos na Justiça. Quem não se recorda de actos do registo comercial, pre-

dial ou automóvel que duravam meses, sim meses, a serem realizados. Hoje em dia, sendo certo que existem menos registos por transcrição, quando a realização de um ato de registo demora mais de 48 horas já achamos estranho. Nos tribunais, por muito que possa criticar a arquitetura do sistema, o Citius traduz uma avanço formidável no desenvolvimento do processo e um aumento inexpugnável na transparência com que são conduzidos os mesmos. Os exemplos podiam multiplicar-se, quer na desburocratização do programa Simplex, quer na qualidade da Administração prestadora, de que o SNS continua a ser impar. Aliás, não deixa de ser sintomático que a Ministra da Justiça tenha vindo recentemente reconhecer que os mercados públicos representam cerca de 20% do PIB europeu, sendo a contratação pública eletrónica uma fator essencial de promoção do crescimento sustentável. Ocorreu assim, numa década, uma autêntica revolução no relacionamento entre o Estado e os

particulares, a que o Simplex não é alheio. Na Administração prestadora continua a ser ímpar o serviço prestado pelo SNS. Muito certamente há que ser feito, mas há que reconhecer que muito já foi feito, e que se encontravam lançadas as bases para uma Administração Pública ágil, moderna e eficiente. O discurso de uma Administração Pública totalmente ineficiente, com gorduras excessivas nos gastos intermédios, julgo que não cola, decididamente, com a realidade. O que, como é óbvio, não significa que tudo está bem e nada deva ser alterado. Deve. O sistema deve ser alvo de constante qualificação e avaliação. Mas não será esse o objetivo desta nova proposta de lei do governo, de requalificar os funcionários públicos? Temo, infelizmente, que não e que estamos perante um caso cristalino em que o discurso e objetivos políticos são dissonantes do discurso jurídico da proposta apresentada. Em traços gerais, o que se propõe? A colocação de um funcionário no sis-

tema de mobilidade leva a que, caso não seja reafetado, se inicie um processo, com o prazo de doze meses, de requalificação. Findo esse prazo, e caso não tenha obtido colocação, é praticado um ato de cessação do vínculo, ou seja, o funcionário é despedido, com o direito a uma compensação calculada nos termos do código do trabalho. Será esta solução má, inaceitável? Não seria se não existisse, à partida, um objetivo quantificado e comunicado de redução de despesa do Estado por esta via. O que, na realidade, acaba por tornar todo este procedimento uma encenação, com um fim escrito à partida. Não vale a pena ter ilusões, mas também acho que ninguém as tem, a casa ganhará sempre. O processo terminará com os atos de cessação dos vínculos. Não deixa de ser irónico que a atual governação, que nunca teve qualquer preocupação em qualificar os seus funcionários, agora queira qualificá-los para depois despedi-los. Belo engenho.

LIVRO

Amor e Justiça “Entre a poética do amor e a prosa da Justiça, entre o hino e a regra formal” será possível lançar uma ponte que as relacione? Amor e Justiça é o tema desta luminosa conferência que Paul Ricoeur (1913-2005), filósofo, proferiu ao receber, em 1989, o prémio Leopold Lucas. De acordo com John Rawls o aumento da vantagem do mais fa-

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vorecido deve ser compensado pela diminuição da desvantagem do mais desfavorecido. É o segundo princípio da justiça, maximizar a parte minimal. Ricouer relaciona este segundo princípio da justiça com o mandamento do amor e propõe-nos que só a poética deste pode evitar o utilitarismo daquele.

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Entrevista

Ana Duarte

Rui Mayer é o mais recente sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira. Transita da Galp, onde era diretor jurídico, para liderar a nova área de prática da sociedade, vocacionada para os sectores de Energy, Oil & Gas. A sua experiência de mais de 30 anos permite-lhe afirmar que o mercado português oferece, em determinados nichos, oportunidades para novos operadores de energia. Contudo, ressalva que é um mercado que irá sofrer profundas alterações nos próximos anos, principalmente ao nível dos valores.

Rui Mayer, sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira

Ramon de Melo

Energia: Há oportunidades no mercado nacional

Advocatus I Até há pouco tempo era diretor dos serviços jurídicos da Galp Energia, agora ingressou numa sociedade. O que o levou a tomar esta decisão? Rui Mayer I Há momentos em que nos apetece fazer outras coisas e olhar para desafios que podem aparecer. Uma vontade de ainda 6

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ser capaz de fazer outras coisas, de ter energia para isso. Apareceu aqui este projeto - que é muito interessante. É uma start up e consiste em começar com uma nova área. Um departamento do zero. Esse desafio foi, de facto, aliciante e achei que era uma boa altura para tentar alguma coisa nova.

Advocatus I Fez praticamente toda a sua carreira como advogado in house. Agora vai mudar um pouco. Como descreve a experiência como advogado in house? Quais as principais diferenças? RM I Primeiro que tudo, um advogado in house é um quadro da empresa. Tem que se assumir como tal.

Depois tem que se comportar como alguém que é um parceiro estratégico das unidades de negócio. Com a função de conhecer o negócio - o fundamental - como qualquer outro quadro da empresa. Tem a responsabilidade de contribuir para identificar os riscos da atividade, conhecer muito bem o que se passa O agregador da advocacia


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com os projetos e, de um modo geral, aconselhar os responsáveis das unidades de negócios na tomada de decisão. Sem, no entanto, criar um obstáculo. Contribuindo para a criação de valor, para o desenvolvimento da vida da empresa e dando-lhes a confiança de que, se alguma coisa correr mal, lá estará para os ajudar a enfrentar as dificuldades no momento. Há que saber pesar e avaliar os riscos e assumi-los. O advogado externo tem talvez uma função mais virada para a especialidade, para o complementar das competências do advogado interno. Tem uma postura mais independente. Pode fazer uma avaliação diferente das circunstâncias dos negócios, dos casos em concreto. Tem uma outra atitude de descrever as circunstâncias, as legalidades jurídicas sem se imiscuir de algum modo nos processos internos da empresa, que são processos de tomada de decisão. Fornece informação, análise e input para a tomada de decisão, mas afasta-se desse processo. Nesse aspeto mantém uma atitude mais independente.

“Aqui claramente a aposta é em diversificar, em crescer, em oferecer uma nova área de prática aos clientes. Não é necessariamente uma reação a uma situação conjuntural. É ter identificado um potencial específico para oferecer qualquer coisa de diferente relativamente aquilo que existia”

Advocatus I Não acha que essa visão dos advogados in house se aplica cada vez mais dentro das sociedades, uma vez que estas se afirmam cada vez mais como empresas? RM I Evidentemente que tem algumas semelhanças. Aproxima-se mais do modelo, embora mantenha a deontologia típica característica da profissão de advogado. O facto de estar dividido por departamentos ou áreas de especialidade é exata-

mente para proporcionar uma maior especialização. Dentro da empresa, tendencialmente, o advogado é mais um generalista. Numa sociedade de advogados - sendo um agrupamento de profissionais do mesmo ofício - podemos olhar muito mais para a especialização, em concreto, e portanto ter um outro tipo de intervenção. É o complementar, na vertente da especialidade, as competências internas da empresa e beneficiar do facto de haver grupos de pessoas que têm esse potencial de uma forma mais desenvolvida. Advocatus I Veio para a Cuatrecasas para criar a área de Oil, Gas & Mining. O que levou a sociedade a decidir criar esta área? RM I Claramente é uma área em crescimento no conjunto de mercados em que a Cuatrecasas, Gonçalves Pereira está presente. É uma área com grande potencial de desenvolvimento de negócio, de atividade. A sociedade sentiu a necessidade de complementar a oferta de serviços aos clientes nestes mercados criando esta área. É uma área em que reconhecidamente a sociedade não tinha ainda uma competência específica. Há clientes? Há clientes com certeza. Há potência nos mercados locais, há oportunidades nos mesmos e houve clientes da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira que chamaram à atenção para a necessidade de a sociedade poder oferecer este serviço doutra maneira. É um passo que me parece lógico, tendo em conta o que a sociedade é e pretende vir a ser.

“Apareceu aqui este projeto - que é muito interessante. É uma start up e consiste em começar com uma nova área. Um departamento do zero. Esse desafio foi, de facto, aliciante e achei que era uma boa altura para tentar alguma coisa nova”

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perfil

As voltas da vida Quando Rui Mayer ingressou no curso de Direito na Universidade de Lisboa tinha como objetivo a carreira diplomática. Era isso que se imagina a fazer. Contudo, a vida trocou-lhe um pouco as voltas. A necessidade de começar a trabalhar levou-o para a advocacia. Nunca mais a abandonou. Se se arrepende de não ter ido para a carreira diplomática? Responde, convicto, que não.

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“Tive a sorte de conseguir sempre apaixonar-me por aquilo que faço. Nas várias “encarnações” que tive na minha carreira profissional sempre consegui retirar um grande prazer naquilo que estava a fazer”, acrescenta. Do seu percurso profissional fazem parte empresas com a Partex – Companhia Portuguesa de Serviços, a empresa finlandesa Neste Oy ou

a Galp Energia. Sempre que tinha de tomar decisões recolhia a informação, pedia conselhos, refletia e decidia. Mas nunca olhou para trás. Aprendeu por experiência própria que não valia a pena fazer planos a longo prazo, pois a vida “mete-se pelo meio e transforma tudo”. Agora enfrenta mais este novo desafio… sem olhar para trás.

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Entrevista

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Advocatus I A atuação irá centrar-se mais fora de Portugal? RM I Isto é uma atividade fundamentalmente internacional. A atuação poderá centrar-se em mercados em que a Cuatrecasas, Gonçalves Pereira está presente: Portugal e outros países, nomeadamente Angola, Moçambique, Brasil. Mas também em mercados onde os nossos clientes pretendam a nossa colaboração e aí não temos limitações específicas, poderemos ir com os clientes para outras áreas geográficas.

“Acho que estou numa posição de poder colaborar, de poder continuar a contribuir para a Galp e continuar a colaborar com eles no sentido de desenvolver a empresa”

“É uma área em crescimento no conjunto de mercados em que a Cuatrecasas, Gonçalves Pereira está presente. É uma área com grande potencial de desenvolvimento de negócio, de atividade”

Advocatus I A equipa foi criada de raiz. Procuraram aproveitar dentro da sociedade alguns dos recursos já existentes ou decidiram procurar advogados de fora? RM I Claramente houve a preocupação de identificar talentos dentro da sociedade e, portanto, de identificar algumas pessoas que estivessem num momento adequado no desenvolvimento da sua carreira para começarem a tomar contacto com esta temática. Poderia já haver algum conhecimento incipiente, mas agora vamos trabalhar de facto na criação de um núcleo de competências e de excelência. E temos uma equipa para isso. Temos jovens promissores. É mesmo começar do zero.

Advocatus I Quais os objetivos da Cuatrecasas ao criar esta nova área de prática? RM I É basicamente afirmar esta valência na oferta da sociedade. Colocarmo-nos à disposição dos nossos clientes, alavancarmos esta atividade com a experiência já adquirida noutras áreas de prática e complementarmos também com o que outras áreas oferecem relativamente a esta indústria. Portanto, será começar gradualmente a ganhar “quota de mercado”, digamos assim, nesta área de atividade. Advocatus I Conhece bem o mercado energético em Portugal. É nesse sentido que lhe pergunto que mais-valias retira do conhecimento que adquiriu ao longo dos anos e que poderá aplicar agora na Cuatrecasas? RM I Eu julgo que é toda a experiência do facto de estar a trabalhar há 30 anos ligado a temas da indústria de petróleo e gás. E nos últimos 12 anos com responsabilidade muito incisivas na área jurídica de uma empresa petrolífera que se desenvolveu e cresceu e se veio a afirmar como uma empresa integrada e em desenvolvimento. Penso que é um capital de experiência adquirida que é valioso. Advocatus I Esta decisão da Cuatrecasas é também uma forma de a sociedade reagir ao mercado, funcionando com um contrapeso à situação atual? RM I Eu julgo que é evidente que o mercado nacional está a atravessar algumas dificuldades, felizmente a sociedade não se ressentiu muito

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dessa dificuldade. Evidentemente, que terá havido necessidade de fazer alguma adaptação mas aqui claramente a aposta é em diversificar, em crescer, em oferecer uma nova área de prática aos clientes. Não é necessariamente uma reação a uma situação conjuntural. É ter identificado um potencial específico para oferecer qualquer coisa de diferente relativamente aquilo que existia.

“É um mercado em que temos a presença de alguns operadores que estão preparados para um salto qualitativo muito grande e que têm uma ambição clara de se desenvolverem e crescerem”

Advocatus I Atualmente qual a análise que faz do mercado energético nacional? RM I Parece-me que é um mercado em que temos a presença de alguns operadores que estão preparados para um salto qualitativo muito grande e que têm uma ambição clara de se desenvolverem e crescerem. Estão-se a preparar para isso. Portanto, vamos assistir à internacionalização evidente destes operadores, porque o mercado português não é suficiente para sustentar essa vontade de crescimento. Por outro lado, julgo também que, em determinados segmentos, nichos, o mercado português oferece muitas oportunidades a outro tipo de operadores e a outras companhias que se queiram instalar de novo e portanto puderem alavancar aqui, também, alguma atividade. Acho que é um mercado que vai necessariamente sofrer algumas alterações estruturais nos próximos anos. Vamos assistir a uma consolidação de algum tipo de operadores, que estão presentes de alguma O agregador da advocacia


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maneira mas ainda em crescimento. Assim como a alterações regulatórias. Vamos assistir a um aumento de preocupação para determinado tipo de valores, que estavam relativamente seguros se pensássemos em outro tipo de situações. Assim como a uma crescente tomada de consciência do papel do consumidor, dos valores de ambiente, de boa corporate governance, da necessidade dos operadores se apresentarem de forma transparente e de comunicarem de uma forma mais aberta com os seus clientes.

“Eu julgo que é evidente que o mercado nacional está a atravessar algumas dificuldades, felizmente a sociedade não se ressentiu muito dessa dificuldade”

Advocatus I O atual quadro legislativo nacional está adequado a todas estas transformações ou não? RM I Acho que o enquadramento legislativo vai refletir a necessidade de fazer adaptações. A todas as mudanças, a uma maior integração, a nível ibérico no caso de Portugal, a nível europeu no caso da Península Ibérica como um todo. Acho que tem muito a ver também com as perspetivas políticas e com objetivos que se traçarem. E aí é que eu acho que não tem havido suficiente cuidado com a correta articulação dos muitos objetivos e dos muitos programas que se criam, que acabam por chocar uns contra os outros e revelarem-se incoerentes.

Advocatus I Refere a internacionalização dos sectores. Acha que isso pode ser positivo para Portugal ou por outro lado poderá colocar o País em segundo plano? RM I Acho que haverá uma mistura das duas coisas. Haverá claramente um ganho. Um aumento do peso dos mercados externos na composição das receitas das empresas, de outras empresas e sectores. Não creio que isso signifique um esquecimento ou um abandono do mercado português, que é um mercado onde há uma base de sustentação forte e consistente, que vai com certeza continuar a ser trabalhada. Acho que há oportunidades no mercado nacional. Advocatus I Quais? RM I Há oportunidades de melhoria de qualidade de serviço, de melhoria de diversificação da oferta de produto. Vamos assistir a isto na Galp – com a passagem do bifuel para o trifuel, na EDP com o incrementar da oferta de gás em paralelo com a de eletricidade, vamos assistir a outro tipo de operador a querer ter uma intervenção diferente, os operadores mais locais, mais regionais, de outros segmentos de mercado. Vamos assistir a um agregar de valor às ofertas de valor das companhias através da inclusão de serviços, de produtos. Há aqui a possibilidade de fazer parcerias, de dialogar com o cliente numa outra perspetiva oferecendo mais valor àquilo que são os produtos clássicos. Advocatus I Isso seria também positivo para o cliente? O agregador da advocacia

RM I Com certeza. Isto é dinâmico, é positivo para o consumidor, para as empresas, para os outros pequenos operadores do mercado que se irão agregar aqui. Acho que é uma mudança estrutural do mercado. Isto é o resultado normal da concorrência, da evolução da postura dos consumidores, da regulação, etc. Que cria a consciência de que há aqui a necessidade de ter uma outra postura. Não basta ser-se incumbente, é necessário fazer-se mais e lutar por firmar os seus galões.

“Vamos assistir a um agregar de valor às ofertas de valor das companhias através da inclusão de serviços, de produtos. Há aqui a possibilidade de fazer parcerias, de dialogar com o cliente numa outra perspetiva oferecendo mais valor àquilo que são os produtos clássicos”

“Vamos assistir (…) a uma crescente tomada de consciência do papel do consumidor, dos valores de ambiente, de boa corporate governance, da necessidade dos operadores se apresentarem de forma transparente e de comunicarem de uma forma mais aberta com os seus clientes”

Advocatus I Se a Galp pedisse assessoria à Cuatrecasas sentir-se-ia numa posição difícil ou não? RM I Não, de modo nenhum. Claramente, conheço muito bem aquela casa, conheço muito bem as pessoas, conheço muito bem o negócio. Acho que estou numa posição de poder colaborar, de poder continuar a contribuir para a Galp e continuar a colaborar com eles no sentido de desenvolver a empresa. A Galp é uma grande empresa nacional, com valor, com potencial. É uma empresa na qual eu me orgulho muito de ter trabalhado, da qual gosto muito e gostaria muito de poder continuar a trabalhar com a Galp e a ajudá-la. Acho que é uma empresa com muito potencial, com muito futuro. Com excelentes quadros, com projetos, com dinamismo, com ambição. Como português é uma empresa que me orgulha. Junho de 2013

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Media

A comunicação social tradicional e os novos desafios multimédia O desafio consiste em procurar um equilíbrio entre os meios de comunicação tradicionais e os novos meios de comunicação multimédia, em nome da preservação dos valores da democracia e da cidadania. Os tradicionais meios de comunicação social (v.g. imprensa, rádio, televisão e cinema) reinventaram-se em consequência da emergência de novas tecnologias multimédia, que, numa só plataforma e num contexto de interatividade, permitem combinar texto, imagem, vídeo e áudio, englobando ainda as telecomunicações e as redes sociais (v.g. Twitter e Facebook). Neste âmbito, verifica-se uma convergência de meios de comunicação social, que se cruzam e se combinam, fazendo emergir versáteis plataformas de comunicação, como o tablet, o ipad, o smartphone ou o iphone que agregam, em simultâneo, várias alternativas de comunicação, permitindo telefonar, aceder à internet, ler livros, jornais e revistas online, receber e enviar emails, ver filmes, ouvir rádio e música ou ver televisão. Mas a conversão para este novo modelo multimédia tem constituído uma revolução que está a metamorfosear os meios de comunicação social e a agitar violentamente as águas em que tradicionalmente navegava o jornalismo. O desafio consiste em procurar um equilíbrio entre os meios de comunicação tradicionais e os novos meios de comunicação multimédia, em nome da preservação dos valores da democracia e da cidadania. Embora aqueles procurem correr para alcançar os novos modelos emergentes, nomeadamente disponibilizando versões online de jornais e revistas, é certo que este processo evolutivo está longe de se poder afirmar estabilizado pelo que ainda não é possível adivinhar 10

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“Emergem fortes contrariedades para os meios de comunicação social tradicionais, como o problema da sua própria sustentabilidade económica, desencadeado por vários fatores, como a queda da venda de jornais e revistas e o facto de os anunciantes começarem a preferir as novas plataformas multimédia”

o futuro dos meios de comunicação social clássicos. A disponibilização online de notícias por empresas como a Google também não deixa de despoletar inconvenientes de relevo, pois as notícias divulgadas online (v.g. na Google News) são retiradas de jornais e revistas, que assentam em estruturas empresariais que dependem das vendas para poder manter o funcionamento da empresa e pagar aos vários sujeitos envolvidos no processo informativo. Numa época em que o acesso à informação conhece novas características, em que se procuram as notícias na internet e em que os próprios cidadãos também se assumem como emissores no processo de comunicação, nomeadamente pela via das redes sociais,

é certo que a esfera de discurso público é reforçada, refletindo-se muito positivamente nas liberdades da comunicação. Todavia, como reverso da medalha, emergem fortes contrariedades para os meios de comunicação social tradicionais, como o problema da sua própria sustentabilidade económica, desencadeado por vários fatores, como a queda da venda de jornais e revistas e o facto de os anunciantes começarem a preferir as novas plataformas multimédia. O modelo de negócio dos órgãos de comunicação social tradicionais sofre, assim, graves repercussões, não se conseguindo evitar mesmo alguns despedimentos de jornalistas e o encerramento de jornais. A debilidade económica dos meios de comunicação social fragiliza ainda o jornalismo de investigação, que constitui a pedra de toque do jornalismo compreendido como “cão-de-guarda” (watchdog) da democracia, desempenhando um papel essencial no controlo da atividade governativa e dos poderes públicos. Neste grave contexto de problemas, têm sido ensaiados novos modelos e diferentes soluções, que partilham de um mesmo objetivo: preservar uma estrutura policêntrica de comunicação na qual o pluralismo de opiniões e o jornalismo de qualidade possam sobreviver e ser reforçados. Esta é uma finalidade que se reveste da maior importância jurídico-constitucional, considerando que estão em causa os pilares da democracia, do Estado de direito e do pluralismo político e social.

Jónatas Machado Professor de Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, autor Wolters Kluwer

Iolanda Rodrigues de Brito Mestre em Direito, autora Wolters Kluwer

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In Memoriam

Gustavo Andresen, um Advogado de Valores Numa sociedade cada vez mais dominada pela ditadura da quantificação e do efémero, há homens que trilham outros caminhos e fazem outras escolhas. Homens para quem o cerne da existência é uma vida que respeite as suas possibilidades individuais, os seus afetos, os seus valores. Um desses homens era o Gustavo Andresen. Agostinho Pereira de Miranda sócio presidente da Miranda Correia Amendoeira & Associados

Num tempo em que a amizade não conhecia interesses, a mão generosa da Nató abriu-me a porta do mais prestigiado escritório da advocacia lisboeta nos finais dos anos 70: na Rua do Alecrim 75 tinham banca o Francisco Sousa Tavares, o Daniel Proença de Carvalho, o Manuel Luís Gomes e o Sebastião José de Lorena. Uma tarde por semana eu juntava-me ao Miguel Sousa Tavares e ao Gustavo Andresen, os jovens advogados de serviço aos Mestres. Nos outros dias acolhia-me um minúsculo escritório em Vila Franca de Xira, onde eu, só e atrevido, aprendera a iludir as subtilezas do Direito Administrativo e a defender com convicção o mais recente réu cigano acusado de homicídio. O Gustavo adorava as estórias de Vila Franca. Os meus clientes eram invariavelmente pobres, intensos e agressivos. Muito distantes dos clientes do Tio Francisco ou do Dr. Daniel. E o Gustavo, tão curioso e afetivo como sempre, queria saber pormenores, ouvir o relato dos meus julgamentos e rir-se das inevitáveis gafes do pouco experimentado colega. O Gustavo deixou-nos num dia frio do último Inverno. Com ele finou-se o escritório da Rua do Alecrim, O agregador da advocacia

que, nos últimos anos, apenas a presença do Gustavo animava. É uma daquelas imagens que valem por mil palavras. O advogado solitário, de guarda ao que foi uma praça-forte da advocacia portuguesa; o profissional corajoso que serve até ao último dos seus dias os clientes que durante decénios o procuraram no mesmo local; o homem sensível que não vai em modas e se mantem fiel aos sítios, às rotinas e aos amigos. De par com a família e os clientes, os amigos eram a âncora do quotidiano do Gustavo. Tinha sempre tempo para nós. Nos últimos anos, depois de ter ganho o primeiro round ao cancro que o havia de vencer, o Gustavo assumia uma atitude estoica ainda mais vincada. O seu olhar de menino raramente empalidecia. Não parecia temer a morte. Numa sociedade cada vez mais dominada pela ditadura da quantificação e do efémero, há homens que trilham outros caminhos e fazem outras escolhas. Homens para quem o cerne da existência é uma vida que respeite as suas possibilidades individuais, os seus afetos, os seus valores. Um desses homens era o Gustavo Andresen.

“O Gustavo deixou-nos num dia frio do último Inverno. Com ele finou-se o escritório da Rua do Alecrim, que, nos últimos anos, apenas a presença do Gustavo animava.”

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Entrevista

“É impossível ser um bom advogado se não for independente dos Estados, dos juízes, dos tribunais, dos clientes”, afirma Jean-Marie Burguburu, presidente da União Internacional de Advogados (UIA). De passagem por Lisboa, onde participou num encontro sobre reforma da Contratação Pública, falou com o Advocatus sobre os problemas que afetam hoje os advogados e também sobre o próximo congresso da instituição, que será em Macau.

Ramon de Melo

Advogados têm de ser independentes

Advocatus | Como presidente da UIA quais são as grandes tendências que verifica atualmente na carreira de advogado? Jean-Marie Burguburu | A UIA foi fundada em 1927, depois da I Guerra Mundial. Na altura, um dos objetivos era contribuir para a paz com os advogados e a lei. Hoje não é apenas esse o objetivo e defendemos a profissão e os advogados que se sentem ameaçados no seu exercício pelos governos, como na Turquia ou na Colômbia, por exemplo. Gostaria de salientar alguns problemas espe12

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cíficos sentidos atualmente. O primeiro é a independência – os advogados têm de ser independentes. É impossível ser um bom advogado se não for independente dos Estados, dos juízes, dos tribunais, dos clientes. O segundo é económico – os advogados, tal como outras pessoas no mundo e na Europa, estão a ser atingidos pela crise económica. Porquê? Porque os clientes estão relutantes em pagar o que pagavam noutros tempos. Até as empresas abrem concursos para terem a prestação de serviços de um advogado

e optam pelo mais barato. Os jovens advogados não encontram trabalho nas sociedades de advogados. Saem da escola e depois é difícil arranjar um emprego a sério. Uma terceira questão tem a ver com os ataques de governos a advogados quando não estão satisfeitos com a independência destes. Uma última palavra sobre o apoio judiciário. Nas nações democráticas temos esse apoio mas ele não existe em todo o mundo. À medida que as pessoas vão tendo menos dinheiro há cada vez mais solicitações para este tipo

de apoio, pelo qual os advogados não recebem qualquer remuneração especial. Claro que recebem uma verba do Estado mas é diminuta. Advocatus | Qual é a região do mundo mais crítica para ser advogado? J-MB | Na Europa existe a tradição familiar na profissão – o meu pai foi advogado, o meu avô também, a minha mulher é advogada, assim como as minhas duas filhas. Mas há outras formas de ser advogado, não apenas a tradição familiar. Nalguns O agregador da advocacia


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países ser advogado é uma forma de ascender socialmente, passar de uma classe baixa para outra superior. Em África ou no Extremo Oriente alguns chegam a advogados porque sabem ler ou escrever, debatem, têm capacidade para falar com as empresas e o pessoal administrativo. Nestes países, um advogado é um link social entre várias pessoas que não compreendem documentos legais, por exemplo. Advocatus | A UIA vai ter um congresso em Macau, em novembro. Quais serão os grandes temas em debate? J-MB | Na maior parte das vezes há três tópicos principais nestes congressos. Eu decidi apenas ter um único tópico principal, com vários grupos de trabalho a funcionarem. O tópico é: advogados contra a corrupção. Não deixa de ser curioso o congresso acontecer em Macau, uma parte da China, país que tem um novo presidente que, no primeiro discurso, fez da luta contra a corrupção uma prioridade. Advocatus | O que se pretende com esse tópico? J-MB | Explicar que os advogados não são cúmplices da corrupção, podem lutar contra ela e evitá-la. Temos 40 comissões que funciona-

rão no congresso durante três dias, de manhã e à tarde, com os vários ramos do Direito, desde o Fiscal até ao Imobiliário. Trata-se de um congresso internacional, que reúne advogados de todo o mundo. A UIA representa mais de 3 milhões de advogados. Foi fundada há 85 anos mas não é uma “velha senhora”, mantém a sua vitalidade e o seu presidente é eleito para um mandato de um apenas um ano e não pode ser reeleito – portanto eu vou sair da presidência logo a seguir ao congresso de Macau. Já sei quem são os meus próximos sucessores: um é advogado de New Jersey, nos EUA, e o outro será do Uruguai. Advocatus | Quais foram os objetivos do seu mandato na UIA? J-MB | Um deles era ter mais membros do sexo feminino na UIA - em França, cerca de 50 por cento dos advogados são mulheres e na geração mais jovens essa percentagem é de 75 por cento. Um outro era chamar os advogados mais novos e um outro foi melhorar a representação da UIA a nível internacional, recorrendo às novas tecnologias, por exemplo. Temos uma sede em Paris mas podemos usar ferramentas como o Skype para nos encon-

trarmos e debatermos os assuntos que nos preocupam. Advocatus | Como advogado e cidadão europeu que leitura faz da actual crise europeia? Está otimista ou pessimista? J-MB | Viajo muito e posso dizer que fora da Europa o sentimento é muito melhor. Uma das minhas filhas tem vivido em Xangai nos últimos três anos e um dos filhos nasceu lá. Quando lá vamos verificamos que têm melhores condições do que em Paris. Estamos a assistir a uma mudança de um mundo velho para um mundo novo. Daqui a 50 anos olhar-se-á para esta época e dir-se-á que foi nesta altura que essa mudança foi feita, é isso que os livros de História dirão. Mas nós estamos a viver esta época agora e as coisas não são fáceis. A Europa deixou de ser o centro do mundo. A China, os países do Médio Oriente, Tailândia, Malásia, Indonésia, Birmânia, os BRIC, todos eles estão a mudar o mundo. Advocatus | Qual será o papel da Europa nesse mundo em mudança? J-MB | Continua a ter um papel a desempenhar. Não o de líder para tudo e em todo o lado, mas em as-

CONGRESSO

Macau será ponto de encontro de advogados de todo o mundo A Union International des Avocats (UIA) promove o 57º congresso em Macau (China), entre 31 de outubro e 4 de novembro. Esta é a primeira vez que a associação organiza um congresso neste território chinês. “Corrupção, segurança jurídica e livre mercado” será o tema principal do encontro, que segundo a organização contará com a presença de vários portugueses. Neste encontro está já confirmada a presença dos advogados da SRS José Moreira da Silva, Pedro Rebelo de Sousa e Gonçalo Reis Martins, do advogado da Vieira de Almeida & Associados Tiago Marreiros

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Moreira, presidente do ILMAI (Instituto de Mediação e Arbitragem Internacional) Fernando Tonim e o sócio da Abreu Advogados e diretor de Comissões da UIA, Pedro Pais de Almeida. José Moreira da Silva dirige o debate sobre Direito da Concorrência, enquanto Tiago Marreiros Moreira, Pedro Rebelo de Sousa e Gonçalo Reis Martins são oradores no painel “Direito Financeiro, Fiscal, Fusões & Aquisições, Investimento Estrangeiro”. Por fim, Fernando Tonim participará no painel dedicado ao investimento estrangeiro.

petos como o modo de vida, a tolerância, educação, respeito pelas pessoas, liberdade individual, independência. Veja, por exemplo, a questão da legislação para os casamentos homossexuais. A Europa tem de passar de um período industrial para um período de serviços e tecnologia. É óbvio que vai ser difícil porque muitas pessoas não têm competências para essa mudança. Eu não quero ser um pessimista, procurou afirmar-me como otimista. Advocatus | Qual a sua opinião sobre os advogados portugueses e a Justiça portuguesa? J-MB | Há em Portugal um excesso de advogados – em termos comparativos há mais advogados do que em França - mas é impossível fechar a porta. É uma profissão independente, onde qualquer um pode entrar desde que passe no exame. Claro que isso não basta pois depois é preciso arranjar um trabalho e isso é difícil. Pode optar por trabalhar por conta própria mas onde é que estão os clientes? Mas, tal como em outros países, os advogados são inteligentes e penso que encontrarão uma saída para estes problemas. Advocatus | Esteve em Lisboa para falar num seminário sobre procurement. Como é que os governos podem financiar obras públicas em tempos de difícil acesso ao crédito? J-MB | Estive presente na condição de presidente da União Internacional dos Advogados (UIA) e tenho uma visão generalista sobre o assunto. O procurement continua a ser uma boa forma de os governos financiarem grandes projetos de obras públicas e é normal que se mantenha um controlo público sobre a sua execução. Como vivemos numa era global qualquer país pode procurar financiamento para esses projetos noutros países.

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Sociedades

Os riscos da multidisciplinaridade O advogado norte-americano Kenneth Standard, ex-bastonário da New York State Bar Association, esteve em Lisboa para participar na conferência “A multidisciplinaridade no exercício da advocacia”, organizada pelos Conselhos Distritais de Coimbra e Lisboa. Ao Advocatus explicou por que nos EUA há cuidados especiais com este tema. Advocatus | Que conselhos que daria aos advogados portugueses sobre o assunto? KS | Além das 50 jurisdições dos estados dos EUA, temos o Distrito de Columbia, onde está situada a capital, Washington. Aí, há alguns advogados que estão organizados de uma forma que podemos considerar próxima da multidisciplinaridade. Aconselho os portugueses a continuarem a fazer o que têm feito: estudar e debater a questão e apresentar e dar a conhecer as suas observações da forma mais ampla possível. Isso foi o que os advogados fizeram aqui. Advocatus | Que tipo de problemas é que a multidisciplinaridade pode colocar à independência dos advogados? KS | Entre os receios manifestados pelos opositores das práticas jurídicas multidisciplinares está a perda de controlo da sociedade pelos seus membros advogados para acionistas que não são advogados, levando à perda de tradições jurídicas como, por exemplo, o inabalável dever de lealdade para com o cliente mesmo à custa de interesse pessoal do advogado.

Advocatus | Em Portugal, há um intenso debate sobre a multidisciplinaridade. O que pensa sobre este assunto? Kenneth Standard | O tema da multidisciplinaridade é digno de um extenso debate. Temos debatido 14

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intensamente o assunto nos EUA e concluímos, em cada um dos nossos 50 estados, que há uma falta de evidência, neste momento, de que que o público e a profissão jurídica obteriam benefícios significativos com uma mudança.

Advocatus | Imagina um dia as sociedades de advogados virem a ser cotadas em bolsa? Quais serão as consequências? KS | Aparentemente já existem algumas sociedades de advogados no Reino Unido que têm acionistas não-advogados. Teremos que esperar para ver quais as consequências para o sistema britânico. Nos EUA, exceto o já referido exemplo do District of Columbia, optámos por não correr o risco de

ter os acionistas ou outros proprietários de escritórios de advocacia que não são advogados. Advocatus | Quais serão as grandes tendências para as sociedades de advogados nos próximos anos? KS | Normalmente seria de esperar que as sociedades de advogados nos principais centros financeiros simplesmente continuassem a tendência recente de se tornarem cada vez maiores, a fim de servir os seus clientes, também cada vez maiores e mais dispersos. No entanto, a revolução digital pode servir como um contrapeso a essa consolidação e tendência e reduzir a necessidade de advogados em geral, pois um modelo inteiramente novo de clientes, incluindo o aumento do self-service, pode tornar-se forte e causar uma enorme perturbação no profissão. Advocatus | Trabalhou no setor público e privado. Quais são as principais diferenças? KS | Cada sector tem seus pontos bons e menos bons. A principal diferença é que no setor público não é preciso preocupar-nos em trazer clientes à porta. Existe uma fonte interna de clientes. Além disso, pode haver uma tendência no setor público para ser arrogante no tratamento dos clientes, pois pode não haver alternativa para estes a não ser trabalhar com o advogado designado pelo governo para tratar do assunto. No entanto, a minha experiência diz-me que todos os bons advogados tratam os clientes da mesma forma. O agregador da advocacia


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Justiça e Media

Qual é a fronteira entre o segredo de justiça e o direito de informar? Que limites devem existir, se é que devem existir, à mediatização dos casos judiciais? Como se devem os agentes da justiça relacionar com os jornalistas? Três advogados dão a sua opinião sobre as relações entre a justiça e os media.

Inimigos íntimos?

Falcão Lucas/ Who

A discussão acende-se sempre que os contornos de casos judiciais transbordam para as páginas dos jornais ou para os noticiários televisivos. E quando esses casos envolvem figuras públicas, por si só mediáticas e mediatizáveis, a discussão inflama-se ainda mais. E são mais audíveis as vozes que reclamam maior regulação do segredo de justiça. Mas deverá a justiça manter-se exclusivamente dentro de portas ou deverá pautar-se por critérios de transparência e, assim sendo, permitir que os jornalistas informem o público? O sócio da Miranda Correia Amendoeira & Associados João Afonso Fialho escreve sobre “os (justos) limites da mediatização” para defender que a justiça deve ser o mais transparente possível, mas que não devem ser os próprios agentes da justiça os fautores da notícia, muito menos manipulando ou aproveitando oportunidades para a autopromoção. Já o sócio da Uría Menéndez-Proença de Carvalho Francisco Proença de Carvalho sustenta que a abertura do meio judicial à sociedade é um caminho irreversível, pelo que ignorá-lo ou tentar travá-lo é uma atitude sem correspondência com a realidade. Ainda assim critica a permanente permanente gestão da informação e contrainformação que, nos casos mais sensíveis, se transmite à opinião pública, com vista à obtenção de decisões apriorísticas na praça pública. Também o sócio da PLMJ Paulo Farinha Alves partilha da opinião de inevitabilidade quanto à relação entre justiça e media, assinando para o Advocatus uma parábola sobre os diversos tempos do relacionamento entre advogados e jornalistas.

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Os (justos) limites da mediatização A justiça deve ser o mais transparente possível e operar de forma a permitir que os media informem adequadamente o público do que na vida judiciária se vai passando. O que não deve suceder é serem os próprios agentes da justiça – advogados, juízes, procuradores, funcionários judiciais, etc. – os fautores da notícia, como tantas vezes vemos acontecer. É impossível falar da relação entre a justiça e os media sem pensar nos processos judiciais mediáticos, que prendem a nossa atenção em estilo telenovelístico. Contudo, a relação está longe de ser unidimensional, cobrindo desde a política de justiça, às interações entre os agentes da justiça – individual ou corporativamente considerados – e a opinião pública, a intervenção dos advogados nas mais diversas transações comerciais e, claro está, o patrocínio judicial. No plano dos princípios, entendo que a justiça deveria ser administrada à margem dos meios de comunicação social. Os agentes da justiça não deveriam abordar publicamente temas que não fossem exclusivamente de política de justiça e a reserva, assim conseguida, deveria permitir aos clientes a tranquilidade de que necessitam – e, o mas das vezes, exigem – e aos tribunais fazerem o seu trabalho de forma serena, com o mínimo de perturbação externa. Não quer isto dizer que a justiça seja algo de sacrossanto, insuscetível de “sindicação” pela opinião pública. Pelo contrário, a justiça deve ser o mais transparente possível e operar de forma a permitir que os media informem adequadamente o público do que na vida judiciária se vai passando. O que não deve suceder é serem os próprios agentes da justiça – advogados, juízes, procuradores, funcionários judiciais, etc. – os fautores da notícia, como tantas vezes vemos acontecer. Mas o puro plano dos princípios é raras vezes compaginável com a realidade de uma sociedade cada vez mais sedenta de notícias e, acresO agregador da advocacia

“Mas não serão os juízes, procuradores e as próprias instituições a quem compete administrar a justiça, influenciados ou influenciáveis pelos préjulgamentos da opinião pública? Não será essa uma forma nada democrática de pressão sobre os tribunais, só ao alcance de quem tem poder, seja qual for a sua natureza, sobre os media?”

cente-se, conscienciosa e legitimamente preocupada com os temas da justiça. É exatamente a conjugação destes fatores que torna a justiça um tema aliciante os media, gerando novas necessidades que os agentes da justiça não podem ignorar. O exemplo máximo do que acima ficou dito são as regras deontológicas que impõem aos advogados o dever de ser absterem de comentar publicamente os processos pendentes em juízo. Contudo, não raras vezes, vemos cidadãos e instituições serem alvo de julgamentos jornalísticos, quase invariavelmente com base em relatos parciais e nada cuidados. Como devem então reagir os advogados – a quem incumbe em primeira linha a defesa dos seus constituintes – perante estes

julgamentos paralelos? No rigor da lei a resposta é simples, deveriam não proferir quaisquer declarações e deixar os tribunais tramitar normalmente os processos. Mas não serão os juízes, procuradores e as próprias instituições a quem compete administrar a justiça, influenciados ou influenciáveis pelos pré-julgamentos da opinião pública? Não será essa uma forma nada democrática de pressão sobre os tribunais, só ao alcance de quem tem poder, seja qual for a sua natureza, sobre os media? Claro que sim! Como tal, o único recurso nestas situações – para além das soluções mais sofisticadas de lançamento de livros ou tentar nivelar o terreno com as mesmas armas, o que não está ao alcance de todos – é fazer uma interpretação atualista da lei no sentido de permitir ao advogado defender o seu cliente perante a opinião pública. No entanto, este exercício deve ser efetuado com cautela, discernimento e sentido da proporção, o que desde logo deve afastar a tentação de substituir os tribunais pelas televisões e jornais. Utilizar os media para informar e put the record straight não é o mesmo que manipular ou aproveitar oportunidades para autopromoção – o mais das vezes em prejuízo ou sem qualquer vantagem tangível para o cliente –, o que deve ser combatido e sancionado pela Ordem de uma vez por todas, sem olhar ao agente de tais atos. Quanto a todas as demais situações, deve continuar a prevalecer a reserva na relação, nem sempre fácil, com os meios de comunicação social, tendo a defesa dos interesses do cliente como único objetivo.

João Afonso Fialho Sócio da Miranda Correia Amendoeira & Associados. É licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

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Justiça e Media

Uma relação íntima e obscura Fechar-se a Justiça aos media é uma solução impossível na sociedade actual. A abertura do meio judicial à sociedade é um caminho irreversível, pelo que ignorá-lo ou tentar travá-lo parece-me uma atitude naive sem correspondência com a realidade. A relação entre o meio judicial e os media é muito íntima. Tão íntima que, geralmente, ocorre na “escuridão”, nas cumplicidades perigosas entre agentes da Justiça e jornalistas, nas meias verdades sobre processos em curso, prosseguindo objectivos mais ou menos ocultos. Nos casos mediáticos e sensíveis, há uma permanente gestão da informação e contra-informação que se transmite à opinião pública, com vista à obtenção de decisões apriorísticas na praça pública, sem qualquer hipótese de defesa decente para os visados. Essas condenações populares acabam por ser, não raras vezes, revogadas pelos tribunais, mas tardiamente e já com o linchamento público consumado. O que fica para sempre na cabeça das pessoas é a visão do acusador, independentemente do resultado judicial. Há uma alimentação mútua entre media e uma parte relevante do sistema judicial. Os agentes da Justiça dão informação e os jornalistas criam a opinião que convém a quem constrói os processos. Simultaneamente, fazem uma promoção mediática que tem levado ao nascimento de super estrelas judiciais, que ganham um tamanho poder popular que os torna praticamente irremovíveis do seu posto pelos órgãos competentes, afastando um princípio de rotatividade funcional, que é essencial para o bom funcionamento de uma Justiça democrática, de pensamento diversificado e sem preconceitos. Num mundo que é cada vez mais de informação e imagem em tempo real, na internet, nas redes sociais, sem grandes filtros, o princípio da obscuridade continua a imperar no mediatismo judicial. Isto não é aceitável, ainda para 18

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“Nos casos mediáticos e sensíveis, há uma permanente gestão da informação e contrainformação que se transmite à opinião pública, com vista à obtenção de decisões apriorísticas na praça pública, sem qualquer hipótese de defesa decente para os visados”

mais num tempo em que o interesse dos cidadãos por matérias judiciais é cada vez maior. Raro é o dia em que casos judiciais não fazem manchete, normalmente com notícias tendenciosas e sem rigor, que prejudicam a verdade, a dignidade das pessoas e a realização da Justiça. Perante este estado de coisas, há um longo caminho a percorrer para a promoção de uma relação transparente e equilibrada entre os diversos intervenientes do sistema e os meios de comunicação social. A realização da Justiça deve ocorrer no local próprio e com serenidade, mas fechar-se a Justiça

aos media é uma solução impossível na sociedade actual. A abertura do meio judicial à sociedade é um caminho irreversível, pelo que ignorá-lo ou tentar travá-lo parece-me uma atitude naive sem correspondência com a realidade. No entanto, por um lado, exige-se maior formação dos intervenientes (de um lado e de outro) para lidarem com o mediatismo e tecnicidade dos assuntos; por outro, é imperioso promover a transparência nesta relação, de modo a que a notícia sobre matérias judiciais deixe de ser através de fugas de informação criteriosas e parciais, de fonte oculta e com uma agenda própria, para passar a existir maior igualdade de armas entre as partes, e com acesso mais directo do público ao que se passa dentro dos corredores do mundo judicial. Obviamente, para que esta solução não transforme Portugal na república judicial das bananas, exigem-se regras claras de intervenção e responsabilização dos diferentes agentes, de divulgação de documentos processuais, de debate público de argumentos, de transmissão mediática de julgamentos, como sucede, por exemplo, nos Estados Unidos da América. Tenho presente que o nosso meio judicial é conservador e que não se muda facilmente um paradigma vigente há vários anos que, ainda por cima, tantos poderes absolutos tem ajudado a criar e a manter confortavelmente sem o devido escrutínio democrático. Mas tenho esperança que num mundo que, para o bem e para o mal, é cada vez mais aberto e exigente, também um espírito de abertura mediática regulada e transparente chegue à Justiça portuguesa.

Francisco Proença de Carvalho Sócio de Contencioso da Uría Menéndez-Proença de Carvalho. Licenciado em Direito, Universidade Católica Portuguesa, conta também com uma pós-graduação em Direito e Gestão de Empresas, na Universidade Nova de Lisboa.

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O jornalista e o advogado. Histórias de pimenta e refresco Antes falava o jornalista e depois o advogado. Fala agora o advogado pelo jornalista, o jornalista pelo juiz, o advogado é jornalista e o jonalista é advogado. Um por todos e todos por um. Era uma vez, há muitos anos, um advogado e um jornalista. Trabalhavam ambos na mesma cidade grande mas pouco se conheciam. Cada um ocupava-se dos seus afazeres. Não nutriam, um pelo outro, grande amizade. Nas poucas vezes que se encontravam o advogado interrompia sempre a conversa. O pouco que aquele podia contar e que podia ultrapassar as estreitas fronteiras do sigilo era revelado numa linguagem de tal forma cifrada que o jornalista não parecia compreender. E com isso, fazendo o seu papel, repetia o jornalista as mesmas perguntas utilizando outras formas e outras abordagens. Enfadado e limitado nos seus deveres profissionais o advogado terminava abruptamente a conversa sem que o jornalista compreendesse verdadeiramente o motivo. E mesmo quando o jornalista pretendia ir um pouco mais além, procurando assistir às vivências profissionais do advogado, ou não encontrava motivos de interesse ou perdia-se nas hermeneuticas da tal linguagem cifrada. E durante muito tempo foi assim: o advogado lá ia advogando entre o seu escritório, os tribunais e os seus clientes e o jornalista ia jornalando, recolhendo matérias para a edição do dia seguinte. Um belo dia, porém, os clientes do jornalista – entre os quais o próprio advogado – amanheceram com muita necessidade de informação e ela cresceu de forma exponencial. Foram criados meios de comunicação que não existiam e os que existiam cresceram e multiplicaram-se. Deixou de ser notícia o homem que mordeu o cão porque as pessoas passaram a querer também saber o nome do cão e a conhecer a casa do homem. A sociedade criou e multiplicou regras e o advogado passou a ter mais trabalho. E surgiO agregador da advocacia

“Um belo dia, porém, os clientes do jornalista – entre os quais o próprio advogado – amanheceram com muita necessidade de informação e ela cresceu de forma exponencial”

ram mais jornalistas para alimentar os meios, e mais advogados para criar regras e para defender a sua aplicação. Tudo muito. Tudo mais. Da janela do escritório do advogado e do local de trabalho do jornalista passou a ver-se mais mundo. Passou a ver-se o mundo. Era, por isso, inevitável que se reencontrassem mais vezes, que os seus caminhos se cruzassem com mais frequência. Na primeira vez em que se reencontraram neste novo mundo, os dois profissionais olharam-se com desconfiança. O advogado queria continuar a viver no seu escritório, contemplando a placa com o seu nome que ostentava orgulhosamente a sua profissão. O jornalista, por seu lado, queria saber coisas dos clientes do advogado incluindo os seus segre-

dos e passou a escrever mais sobre o mundo dos advogados e sobre as teias da justiça que o advogado urdia juntamente com os magistrados nos seus encantados tribunais. Outrora lugares frios e desconfortáveis estes locais tornaram-se destinos de romaria e objecto de notícia. Os jornalistas passaram a opinar sobre tudo o que mexia, mesmo que sobre movimento nada soubessem. O advogado passou a dar-se melhor com o jornalista. Aliviou o seu segredo, aliviaram-lhe o seu segredo. Alguns passaram a desconhecer a palavra “segredo”. Antes falava o jornalista e depois o advogado. Fala agora o advogado pelo jornalista, o jornalista pelo juiz, o advogado é jornalista e o jonalista é advogado. Um por todos e todos por um. Não raras vezes ao mesmo tempo. A notícia também mudou. O homem continuou a morder o cão mas o homem tem agora gravata e colarinho branco e o cão passou a chamar-se Estado. E não raras vezes morde também no homem. E isso é também notícia. Criaram-se reguladores do homem e do cão, regulações de reguladores. Supervisões de regulação e reguladores de supervisão. Nomes finos para quem pouco faz. Mas tudo é notícia ou consumido como se tal fosse. Um dia destes, nos novos tempos, o jonalista encontrou-se com o advogado. Queria mudar-lhe os hábitos, os ritmos e as Leis. Tinha opinião sobre a justiça e sobre a forma como ela devia funcionar. Sobretudo a justiça para os outros. Reclamou resultados com avidez e veemência. Manifestou incompreensão. O advogado deteve-se e depois de uma pequena pausa olhou longamente a paisagem e contou-lhe uma história antiga com pimenta, fundo das costas e refresco.

Paulo Farinha Alves Sócio da PLMJ. Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa, é pós-graduado em Contabilidade e Assessoria Jurídica de Empresas pela mesma instituição.

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Opinião

Para internacionalizar há que arriscar e para se arriscar é essencial ir bem preparado e bem acompanhado, caso contrário será uma aventura que conduzirá ao fracasso. O parceiro certo, no mercado certo, é a combinação ideal, mas não surge de forma imediata.

As três etapas vitais para a internacionalização Conhecer os mecanismos de apoio

Leonor Guedes de Oliveira Advogada da JPAB – José Pedro Aguiar-Branco & Associados

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Dados recentes apontam para continuação da recessão da economia portuguesa nos próximos anos e para a queda do consumo privado em cerca de 6% este ano. Porém, os empresários que pretendam desenvolver a sua actividade fora do território nacional, podem recorrer a instrumentos de apoio à internacionalização das empresas no QREN - Quadro de Referência Estratégico Nacional, nomeadamente no Sistema de Incentivos à Qualificação e Internacionalização de PME (SI Qualificação PME). Este sistema prevê como susceptíveis de apoio as tipologias de investimento em factores dinâmicos da competitividade – a internacionalização –, incluindo acções de prospecção e presença em mercados externos, participação em concursos internacionais, em certames internacionais nos mercados externos, acções de promoção e contacto directo com a procura internacional, acções de promoção e marketing internacional. Outro instrumento financeiro a considerar pelos empresários é a linha de crédito PME Crescimento 2013, que disponibiliza até 2000 milhões de euros. Esta linha é constituída pelas linhas específicas (micro e pequenas empresas, 400 milhões de euros) e geral (tem um montante específico destinado às empresas exportadoras de 900 milhões de euros). Uma novidade deste instrumento consiste no fac-

“Conhecer os mercados, os sectores de actividade mais carenciados, os concursos que são lançados, as condições para apresentar candidaturas/propostas são condições essenciais”

to de 10% dos valores globais da dotação se destinarem exclusivamente ao sector primário (agricultura e pesca). No entanto, sublinhem-se quatro requisitos para atribuição de financiamento: a certificação electrónica junto do IAPMEI das micro, pequenas e médias empresas (PME); a sua localização em território nacional; a situação tributária (Fisco e Segurança Social) regularizada ou a regularizar com recurso a financiamentos bancários intercalares; e a inexistência de incidentes não justificados ou incumprimentos junto da banca.

A importância do diagnóstico Quanto ao diagnóstico sobre a capacidade e preparação da empresa, muitos empresários consideram a internacionalização como uma saída para a sua actividade, com consideráveis dificuldades a nível financeiro e fiscal e ao nível do próprio escoamento dos produtos no mercado interno. Muitos pretendem apenas exportar, outros procuram um agente, neste ou naquele mercado. Esta é a primeira fase, a fase de “percepção”, do conceito internacionalizar ou exportar. Segue-se o momento de real capacidade para concretizar os dois primeiros caminhos e indicações/sugestões de estratégia para a própria empresa, nomeadamente a informação sobre mercados/países em que os produtos/ serviços poderão ter maior e melhor aceitação. Outra questão a analisar nesta O agregador da advocacia


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fase é a noção de escala. Mercados como os da Colômbia ou Moçambique têm, respectivamente, uma dimensão de 46 e de 24 milhões de habitantes e taxas de crescimento económico de 4% e de 8%. Estas economias são eleitas por empresários portugueses que procuram oportunidades em sectores como a construção, imobiliário, infraestruturas públicas nos sectores energéticos, telecomunicações, transportes (ferroviário e rodoviário), entre outras, mas que, comparativamente, são muito pequenos e pouco competitivos em termos de preço de produto/ serviços. Há, no entanto, um ponto a destacar: o know-how das empresas portuguesas, concretamente na área da construção/projecto, comprovado e reconhecido e que não pode ser desvalorizado.

A singularidade dos mecanismos jurídicos Decidida a estratégia de internacionalização de uma empresa, escolhido o(s) mercado(s) alvo, segue-se todo um processo que compreende a prestação dos serviços jurídicos que decorram do mandato outorgado, neles se incluindo as acções necessárias à representação junto dos diversos agentes, nacionais e internacionais, que para o efeito se considerem como relevantes para o objectivo pretendido – empresariais ou institucionais. A vertente legal compreende, por um lado, a análise dos principais aspectos que caracterizam os orO agregador da advocacia

denamentos jurídicos locais (em matéria de relações institucionais, com os mercados, parcerias, investimento estrangeiro, fiscalidade) e com os instrumentos de apoio à internacionalização que o ordenamento jurídico português prevê (financeiros e fiscais, entre outros). Por outro, essa mesma vertente engloba a identificação, avaliação e gestão do risco da internacionalização, que deve ter abordagens jurídica, económico-financeira e técnica, atenta a necessidade de minimizar ou mesmo eliminar aquele risco. A participação em diferentes ordenamentos jurídicos, em novos mercados e em novos processos a isso obriga. Para internacionalizar há que arriscar e para se arriscar é essencial ir bem preparado e bem acompanhado, caso contrário será uma aventura que conduzirá ao fracasso. O parceiro certo, no mercado certo, é a combinação ideal, mas não surge de forma imediata. Conhecer os mercados, os sectores de actividade mais carenciados, os concursos que são lançados, as condições para apresentar candidaturas/propostas são condições essenciais. Também nesta fase, a condução, acompanhamento, preparação e execução de todo o processo de constituição de sociedades, tanto em Portugal com capitais estrangeiros, como no estrangeiro com recurso a capitais portugueses, ou outras formas de associação jurídica devem ser analisadas ao pormenor. Texto escrito segundo as regras do anterior acordo ortográfico Junho de 2013

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Testemunho

Assessoria jurídica permanente e conhecimento mais aprofundado do negócio. Estas são duas mais-valias que Paulo Marinho, responsável pela direção jurídica da Ascendi, encontra na advocacia in house. O que, no seu caso, se traduz num envolvimento em grande parte das decisões estratégicas, uma intervenção que qualifica como criativa. E que tem redundado num baixo nível de litigiosidade.

Ramon de Melo

Intervenção criativa

Paulo Marinho é um advogado in house convicto. Independentemente da sua vocação pessoal, encontra na assessoria jurídica interna uma mão cheia de vantagens para as empresas. “Mesmo esquecendo a vertente financeira, relevante na decisão empresarial de manter um advogado e/ou um corpo de advogados internos, a disponibilidade permanente de uma assessoria jurídica é hoje considerada uma mais-valia, especialmente se associada a um conhecimento mais aprofundado do negócio que é exigível aos advogados internos”, sustenta. Para a Ascendi, certamente. “A gestão dos contratos de concessão, dos contratos financeiros associa22

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dos e o especial enquadramento legal da atividade de operação rodoviária implicam uma especialização de conhecimentos que não é exigível a prestadores externos, ou então que o será a um custo insuportável”, afirma, a propósito da empresa de que é há oito anos diretor jurídico. A estas outras razões se somam, em particular, “as situações quotidianas que não se compadecem com os normais tempos de espera que decorrem da consulta de um prestador externo, que pode não estar disponível de imediato, que pode não ter nunca analisado uma situação semelhante, que não está tão próximo dos interlocutores internos quanto o necessário para esclarecer

“A gestão dos contratos de concessão, dos contratos financeiros associados e o especial enquadramento legal da atividade de operação rodoviária implicam uma especialização de conhecimentos que não é exigível a prestadores externos, ou então que o será a um custo insuportável”

as questões colocadas”. Um advogado in house possui, por definição, um conhecimento mais próximo e aprofundado do negócio da empresa a que presta assessoria. E na Ascendi, assegura Paulo Marinho, essa proximidade é uma realidade, com o envolvimento do diretor jurídico em grande parte das decisões estratégicas. Uma intervenção que acontece em vários passos do processo decisório e que – sublinha – gosta de qualificar como criativa, na busca da solução, na procura da inovação, na consubstanciação da proposta de decisão, na verificação da sua legalidade e enquadramento contratual. E aqui reside – enfatiza – uma das mais-valias de um corpo jurídico inO agregador da advocacia


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terno: “Conhecedores das características e envolvimento da atividade, podemos ir além das consultas que nos são dirigidas e agir proativamente na procura de soluções e cenários mais adequados”. Não significa, porém, que o recurso a assessoria externa seja excluído. Nem poderia ser, dada a complexidade do enquadramento legal e contratual da Ascendi. “Orgulhamo-nos de contar com as mais prestigiadas sociedades de advogados entre os nossos prestadores e interlocutores, o que faz com que o desafio da interação com qualquer delas torne a função de diretor jurídico muito interessante, um desafio quotidiano”, afirma, para acrescentar: “O dimensionamento da equipa jurídica interna é a pedra de toque a este nível, isto é, ela tem que ser capaz de responder ao que cada organização define como seu escopo e limites, mas com a versatilidade para se rendibilizar quando não é necessária, a humildade de reconhecer os seus limites e a ambição de se ultrapassar constantemente”. Tendo em conta a amplitude da atividade da Ascendi, da conceção e projeto à cobrança de portagens nas concessões, são igualmente diversas as questões jurídicas que se colocam e os ramos do Direito que as contemplam. Daí – explica Paulo Marinho – a necessidade de um equilíbrio tendencialmente perfeito

entre a prestação interna e a externa: “Direito Administrativo, Civil, expropriações e acidentes de viação, contencioso tributário e contraordenacional, em tudo tocamos, com maior ou menos profundidade – sendo que o mero encaminhamento para prestadores externos exige um conhecimento suficiente para fazer o primeiro enquadramento das questões e o acompanhamento do desenvolvimento das prestações”. Ao gerir infraestruturas rodoviárias, a Ascendi está naturalmente exposta ao escrutínio público, nomeadamente dos utentes das concessões. Mas a litigiosidade não é elevada. O que o diretor jurídico atribui a uma atitude de “transparência” adotada pela empresa: “Gosto de dizer que, se uma questão chega à fase de litígio, é porque alguém não conseguiu desempenhar bem o seu papel. Isto é, um litígio surge quando uma pergunta ou reclamação não foi suficientemente bem respondida, não logrou esclarecer devidamente quem a colocou. Daí que na Ascendi se aposte na transparência no relacionamento com os utentes, se invista no seu esclarecimento em caso de dúvidas ou divergências. Enquanto responsável pelo jurídico na casa, tento que, mesmo quando reclama, o nosso utente continue a ser visto como cliente e não como reclamante. Resultado desta postura, diria que temos um nível de

contenciosidade muito baixo”. Nem sempre, contudo, se consegue evitar a via judicial: “É claro, porém, que uma não assunção de responsabilidade ou de pagamento, por exemplo, por muito bem justificada que seja e honesta a sua fundamentação, gera sempre uma reação negativa, e redunda em acionamentos judiciais, mas estamos satisfeitos com os resultados conseguidos em sede judicial, no sentido em que, e mesmo considerando o relativo desfavor da nossa atividade, genericamente vemos as nossas teses confirmadas”. E como se comporta a litigiosidade numa conjuntura económica desfavorável? O diretor jurídico da Ascendi reconhece que há mais reclamações, mas ressalva que os custos envolvidos num acionamento judicial levam a que o saldo seja muito próximo de anos anteriores. O esforço de racionalização de custos está, aliás, subjacente a toda a estratégia da empresa, e aplica-se também ao relacionamento com a assessoria jurídica externa. Não obstante, Paulo Marinho sublinha que, “temas há que, pela sua especialização e/ou pela relevância estratégica, carecem de um acompanhamento que se não compadece com uma lógica de crise”. Usando uma expressão popular, resume: “Não podemos poupar na farinha para gastar no farelo”.

“Gosto de dizer que, se uma questão chega à fase de litígio, é porque alguém não conseguiu desempenhar bem o seu papel. Isto é, um litígio surge quando uma pergunta ou reclamação não foi suficientemente bem respondida, não logrou esclarecer devidamente quem a colocou”

Perfil

In house por vocação Ser advogado in house foi uma escolha. Paulo Marinho ainda manteve durante alguns anos a atividade liberal, mas não era, “definitivamente”, a sua vocação. “Gosto do trabalho de gabinete, da preparação da fundamentação, do argumentário, gosto muito da negociação, mas a barra, com o seu pendor processualista, as marcações, os adiamentos, os atrasos, conflituam dramaticamente com a minha obsessão pela pontualidade, com o conforto da planificação. Na atividade diária os imprevistos, as urgências, abundam, mas na vida de empresa sinto-me mais confortável”, explica. Aquilo que

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assume como “uma total falta de vocação para a advocacia tradicional” levou-o a, depois de, por muitos anos, ter mantido a inscrição na Ordem, ter optado por cancelá-la. “É para mim definitivo que não serei nunca advogado – sou um jurista que coordena advogados, quer internos quer externos”. O contacto com a advocacia de negócios começou cedo, logo no estágio findo o curso de Direito da Universidade Católica do Porto. E confirmado ao longo dos anos que antecederam a sua entrada na Ascendi, em 2011, quando ainda era AENOR. Começou como respon-

sável pela gestão da carteira de seguros das concessionárias, beneficiando da experiência adquirida numa seguradora de proteção jurídica, assumindo, três anos depois, a tutela da direção jurídica. Com uma pós-graduação em Direito da Banca, Bolsa e Seguros, pela Universidade de Coimbra, Paulo Marinho lecionou a disciplina de Teoria Geral dos Seguros, no âmbito da Associação Portuguesa de Seguradores, tendo tido ainda a oportunidade de fazer uma formação no INSEAD/Fontainebleu, sobre técnicas de negociação.

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Trabalho

A procura por especialistas em Direito Laboral está a aumentar exponencialmente. É a conclusão que resulta da análise dos processos de recrutamento da Michael Page Tax & Legal. Razão: o aumento das restruturações de empresas e as alterações à legislação laboral. Outra tendência é a procura por advogados in house. Razão: a relação custo-benefício para as empresas. De uma forma ou de outra, a advocacia parece estar em contraciclo com a economia.

Laboral em alta

O recrutamento de profissionais na área legal está a mudar em Portugal. A crise económica não parece repercutir-se negativamente na procura de advogados, mantendo-se, pois, a oferta de emprego. É, antes, indutora de uma alteração no perfil de recrutamento. Estas são as conclusões que emanam da análise que a Michael Page Tax & Legal efetuou aos seus próprios processos de recrutamento. 24

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Os advogados continuam a ser os profissionais da indústria legal mais requisitados, correspondendo a 90 por cento do total. Todavia, e contrariando uma tendência de anos anteriores, a procura centra-se sobretudo em especialistas nas áreas processuais e laborais. E aqui, sim, é possível identificar uma relação direta com o atual contexto económico do país, assim explicada por Vasco Salgueiro, manager

Na Michael Page, assistiu-se nos primeiros meses deste ano a um incremento de 25 por cento na procura de advogados especializados em Direito do Trabalho.

da consultora: “No contexto atual, caracterizado por uma forte retração económica, surgem de forma massiva reestruturações empresariais que originam grandes necessidades de consultoria jurídica que justificam a tendência expansiva do Direito Laboral. Adicionalmente, as recentes alterações à legislação laboral vêm acentuar as necessidades de recorrer ao apoio nesta área”. Vasco Salgueiro concretiza a neO agregador da advocacia


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cessidade deste recrutamento: os especialistas nas áreas laborais e processuais são indispensáveis para assegurar uma permanente conformidade das empresas à lei laboral, para prevenir a ocorrência de litígios laborais ou assegurar a sua eficaz e célere resolução e para as auxiliar na definição das políticas de recursos humanos. A verdade é que, na Michael Page, se assistiu nos primeiros meses deste ano a um incremento de 25 por cento na procura de advogados especializados em Direito do Trabalho. Por oposição à quebra de 70 por cento, no mesmo período, no recrutamento de especialistas em operações de fusão e aquisição. A procura cresceu, mas não apenas nas sociedades de advogados: as empresas estão, também elas, a recrutar, tendo absorvido cerca de 40 por cento dos profissionais legais empregados pela divisão Tax & Legal da Michael Page. A crise ajuda a explicar, mas não em exclusivo. Diz Vasco Salgueiro que esta tendência já se verifica há algum tempo, atribuindo-a a duas ordens de fatores: por um lado, a importância de cada vez mais compaginar custos e benefícios e, por outro, a mais-valia que o conhecimento do negócio pelo diretor jurídico aporta para a empresa. “Na relação custo-benefício da contratação de serviços jurídicos externos muitas vezes a decisão económico-financeira tende para a contratação de um advogado interno: os custos são comparavelmente menores e muitas das vezes o facto de o advogado interno ter uma aproximação ao negócio acaba por ser uma vantagem competitiva importante. A assessoria jurídica enquadrada e adaptada ao negócio da empresa é cada vez mais valorizada”. Isto não significa – ressalva que não se continue a necessitar de recorrer a sociedades de advogados em determinados domínios. A verdade é que as firmas de advocacia estão em contraciclo, crescendo apesar O agregador da advocacia

“Na relação custo-benefício da contratação de serviços jurídicos externos muitas vezes a decisão económicofinanceira tende para a contratação de um advogado interno: os custos são comparavelmente menores e muitas das vezes o facto de o advogado interno ter uma aproximação ao negócio acaba por ser uma vantagem competitiva importante”

de não estarem imunes à recessão. Foram, é certo, forçadas a um exercício de contração de honorários, mas isso – acredita o manager da Michael Page Tax & Legal - não se reflete no desempenho. Antes pelo contrário: “Esta contração implica uma alteração de paradigmas, assim como reestruturações nas equipas de trabalho para que a qualidade do serviço prestado se mantenha. Maior eficiência e otimização na gestão de equipas passam a ser prioridades. A perceção de qualidade de serviços prestados pelas sociedades é uma condição fundamental para a sua sobrevivência”. Vasco Salgueiro vê como positiva esta evolução no recrutamento de advogados, considerando mesmo que se assiste a uma dupla janela de oportunidades: “Quando um candidato sénior sai de uma sociedade de advogados para assumir um cargo de direção jurídica numa empresa, esta situação pode deixar em aberto uma oportunidade de recrutamento na sociedade. Adicionalmente, a passagem para o lado do cliente é uma tendência natural e recorrente de quem está nas sociedades de advogados (e para aqueles que não querem ou não podem fazer carreira nestas estruturas)”. A oportunidade estende-se aos estagiários. Grandes empresas e sociedades de advogados continuam a apostar na formação, recrutando “jovens talentos” que ajudam a dar continuidade ao volume de trabalho gerado. Um recém-licenciado pode, nestas circunstâncias, auferir um rendimento mensal entre os 1000 e os 1400 euros brutos. Já um advogado com mais experiência pode receber na ordem dos 7000 euros brutos. Vasco Salgueiro conclui que “os bons advogados continuam a ter excelentes oportunidades de trabalho, em Portugal e no estrangeiro, e continuam a ter upgrades salariais interessantes nessas mudanças profissionais. São as leis de mercado que assim o ditam”.

Vasco Salgueiro Manager da Michael Page Tax & Legal “Os bons advogados continuam a ter excelentes oportunidades de trabalho, em Portugal e no estrangeiro, e continuam a ter upgrades salariais interessantes nessas mudanças profissionais”

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Rankings

Meros instrumentos de marketing ou espelho do reconhecimento das sociedades de advogados? O que valem os diretórios internacionais, que peso têm no negócio e no sucesso das firmas? Advogados de seis sociedades apresentam a sua visão sobre a importância dos rankings regularmente divulgados por publicações internacionais do sector. Transversal às várias opiniões, o entendimento de que estes diretórios devem ser olhados com alguma prudência, de certa forma relativizando mas sem ignorar as hierarquias que estabelecem. Em comum também o reconhecimento de que, embora no limite sejam os clientes a escolher, ficar bem posicionamento num destes rankings constitui um cartão de visita credibilizador.

O que valem os diretórios internacionais?

BAPTISTA, MONTEVERDE & ASSOCIADOS

Credibilização e marketing Assiste-se atualmente a uma proliferação de diretórios internacionais referenciando sociedades de advogados. Embora alguns desses diretórios se limitem a indicar os contactos das sociedades de advogados, outros há que recolhem informações sobre as sociedades de advogados fazendo uma verdadeira avaliação sobre sua performance. Uma vez recolhida essa informação, em geral junto de outras sociedades de advogados e dos próprios clientes, esses diretórios elegem as sociedades de advogados que se destacaram numa área do direito, durante um determinado período. São estabelecidos rankings entre as várias sociedades de advogados, por área de atuação, e, nalguns casos, atribuídos prémios àquelas que foram consideradas as sociedades de advogados que mais se destacaram. Não obstante, há que estar prevenido: muitos desses diretórios internacionais não efetuam nenhuma pesquisa sobre as atividades desenvolvidas 26

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pelas sociedades de advogados. Limitam-se atribuir relevância a determinadas sociedades de advogados, apenas com o intuito de posteriormente tentar obter dividendos quanto à publicitação dos prémios que foram atribuídos. Em qualquer caso, a referência das sociedades de advogados ou advogados em diretórios internacionais, para além constituir um elemento de credibilização, em especial, em Paulo Monteverde matérias que requerem um elevado grau de Sócio especialização, acaba também por se traduzir, em geral, numa poderosa ferramenta de marketing, que exponencia a reputação das sociedades de advogados e dos advogados que as integram. O agregador da advocacia


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CAIADO GUERREIRO & ASSOCIADOS

Uma mais-valia No atual contexto económico de recessão e de angústia financeira os diretórios internacionais vêm assumindo um papel de cada vez maior relevância devido ao interesse que a advocacia de negócios vai despertando nos media e na sociedade. Os diretórios internacionais funcionam através de rankings onde as Sociedades de Advogados são avaliadas, podendo ser ou não escolhidas. Escolha essa que assenta inicialmente num processo de análise e investigação que, como todos os processos, é naturalmente falível. O que não quer dizer que os rankings estejam errados. Significa apenas que lhes deve ser dado, como aos prémios atribuídos por publicações especializadas, o seu devido valor. Nem mais, nem menos. Por exemplo, é evidente que os rankings e os prémios tendem a favorecer os incumbentes de cada sector, privilegiando as sociedades de advogados mais antigas face às mais jovens e as com mais advogados face às menores.

Inegável é que os diretórios internacionais constituem uma mais-valia para as Sociedades recomendadas na medida em que estas passam a ter uma maior visibilidade face ao público providenciando assim informação adicional aos seus clientes e potenciais clientes das suas áreas de atuação bem como da sua expertise. Na Caiado Guerreiro, sentimos que os prémios e distinções que temos recebido são tidos em João Caiado Guerreiro Managing Partner conta pelos nossos clientes e por aqueles que seguem as sociedades de advogados de negócios. Nesta área, a advocacia vai-se parecendo com a banca de investimento, onde aparecer nos rankings e ganhar prémios – goste-se ou não- se torna cada vez mais importante.

CCA ONTIER

Uma ferramenta útil Os diretórios de advogados são, na minha opinião, uma ferramenta bastante útil, se bem que, da ótica do leitor/usuário, é preciso ter alguma prudência ao consultar os mesmos e saber, de antemão, quais as suas limitações. São uma ferramenta importante, pois funcionam para os respetivos leitores como o primeiro ponto de contacto com o nosso setor e, muitas vezes, como uma autêntica cábula para uma primeira seleção ou uma primeira filtragem, já que dão alguma garantia de qualidade em relação aos profissionais que marcam presença nos diretórios. E se pensarmos bem, a sua importância é ainda maior num setor que tradicionalmente tem muitas limitações na sua publicidade e ainda mais importante numa lógica recente de internacionalização. É preciso não esquecer que muitos dos diretórios são absolutamente globais, ou seja, oferecem uma informação a número de players que de outra forma

dificilmente eram rastreáveis. É verdade que estes diretórios têm algumas lacunas. E também é verdade que funcionam melhor em determinados países do que em outros. Além de muitas vezes oferecerem uma visão incompleta do panorama da nossa classe, a informação disponível é também superficial e insuficiente. No entanto, desde que se tenha consciência de que os diretórios não podem ser entendidos como um autêntico espelho da realidade da nossa profissão, julgo que servem perfeitamente o propósito para o qual foram criados.

Bernardo Reynolds de Carvalho Sócio

CMS RUI PENA & ARNAUT

Há diretórios e diretórios Quando falamos de Diretórios Internacionais de Advogados, uma questão prévia que deve ser abordada é a sua credibilidade e se de facto fazem uma boa pesquisa para elaborar os seus rankings. Nos últimos tempos têm-se multiplicado os diretórios e literalmente “bombardeiam” os Advogados de e-mails propondo a participação nos mesmos com alguma contrapartida financeira, outras vezes anunciando que o advogado ganhou um suposto prémio cuja divulgação fica dependente de uma participação paga em determinado suplemento, na reserva e pagamento de mesa na cerimónia da entrega dos prémios, ou qualquer outro estratagema para conseguir algum lucro. Este tipo de propostas coloca em causa a credibilidade e parcialidade destes editores e os respetivos rankings. Há também casos em que os diretórios quase não fazem pesquisa, repetindo-se os mesmos rankings ano após ano. Sem embargo, temos ainda algumas honrosas exceções de diretórios que se esforçam por fazer uma pesquisa imparcial e de qualidade, merecendo reconhecimenO agregador da advocacia

to pelos advogados e também pelos potenciais clientes. É pois importante para as sociedades e os advogados fazerem por estar presentes e bem colocados nos rankings dos diretórios de referência, submetendo as suas candidaturas de forma que melhor demonstrem o seu trabalho, uma vez que essa presença significa um reconhecimento público da sua competência e qualidade dos seus serviços. Este facto gaJorge Tavares d’ Almeida nha ainda mais relevância no caso de sociedaMarketing & Business Development Manager des e advogados que prestam ou ambicionam prestar serviços a clientes internacionais, uma vez que, não tendo estes clientes o conhecimento local do mercado ou outras referências, é natural que tenham em conta os diretórios da sua confiança no processo de escolha de advogados nacionais. Junho de 2013

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Sociedades

MACEDO VITORINO & ASSOCIADOS

PBBR & ASSOCIADOS

Um fenómeno de marketing

Opinião dos clientes é que vale

Os rankings que diretórios internacionais divulgam são um misto de investigação sobre as sociedades de advogados e respetivos advogados nos diversos setores da advocacia e de negociação de espaços publicitários e de eventos pagos. Os diretórios não prestam um serviço aos decisores da contratação jurídica, mas sim às sociedades de advogados, já que o acesso aos rankings é gratuito. A investigação, João Vitorino Sócio fundador quando existe (casos há em que as nomeações são simplesmente compradas), depara-se com o sigilo profissional e com a dificuldade em classificar um trabalho jurídico. Ela é, de um modo geral, feita à distância e baseia-se em recolhas junto das sociedades (umas mais sérias que outras) e de opiniões junto dos clientes. É, pois, natural que os resultados não sejam reflexo da realidade. Acontece que os redatores dos diretórios acabam por confiar mais no volume de transações e na dimensão dos clientes, que em critérios de avaliação do trabalho jurídico. Os rankings que ordenam as sociedades pelo valor das transações (onde as sociedades portuguesas aparecem esporadicamente) são mais fidedignos que os rankings que pretendem ser o resultado de uma análise do mercado. Quer isto dizer que os rankings não têm utilidade? Não creio que existam decisores a fazer escolhas em função da classificação dos rankings. Mas, estar ou não estar nos rankings pode influenciar uma escolha. Já as sociedades de advogados fazem um grande uso publicitário dos rankings. A Advocatus é, aliás, exemplo pela divulgação que faz destas classificações. Trata-se, mais que tudo, de um fenómeno de marketing.

Há anos um dos vários Diretórios que por aí circulam dignou-se cotar-me como advogado highly recommended no SHIPPING. Sendo certo que tinha como cliente uma agência de navegação a quem prestava uma diversidade de serviços, mesmo assim e sem falsa modéstia o afirmo, a citação embaraçou-me por nunca ter notado a minha “excelência” na referida área e, sobretudo, por não ver referidos no “ranking” César Bessa Monteiro Sócio alguns colegas que, eles sim, eram referências pelo seu saber, experiência e mérito incontestado. Dito isto gostaria, no entanto, de salientar que não descarto em absoluto a importância que pode ter a referência ao nosso perfil em certos Diretórios e a mais-valia que daí possa resultar. Há, no entanto, Diretórios e Diretórios e em alguns, provavelmente poucos, só se aparece depois de ter sido cuidadosamente ponderado o currículo, de ter tido lugar uma entrevista rigorosa e de serem ouvidas as opiniões de colegas e clientes. Diria, então, que tanto quanto sei a referência nestes Diretórios poderia constituir elemento, provavelmente não exclusivo, de ajuda na escolha de advogado. Em qualquer caso, diz-me, também, a experiência que mais importante para nos afirmarmos na profissão é a opinião dos clientes para quem trabalhamos e que estando satisfeitos com o nosso desempenho constituem uma rede sólida e, certamente, mais justa de referências. E tal circunstância até nos faz acreditar que não há “promoção” ou “influência” que resista à qualidade dos serviços que por nós é prestado.

“Os diretórios não prestam um serviço aos decisores da contratação jurídica, mas sim às sociedades de advogados, já que o acesso aos rankings é gratuito”

“Em qualquer caso, diz-me, também, a experiência que mais importante para nos afirmarmos na profissão é a opinião dos clientes para quem trabalhamos e que estando satisfeitos com o nosso desempenho constituem uma rede sólida e, certamente, mais justa de referências”

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Crédito

Restruturação da dívida O Regime Extraordinário de Protecção de Devedores de Crédito à Habitação em Situação Económica Muito Difícil, consagrado na Lei n.º 58/2012, de 9/11, é aplicável às situações de incumprimento de contratos de mútuo celebrados no âmbito do sistema de concessão de crédito à habitação. O Regime Extraordinário de Protecção de Devedores de Crédito à Habitação em Situação Económica Muito Difícil, consagrado na Lei n.º 58/2012, de 9/11, é aplicável às situações de incumprimento de contratos de mútuo celebrados no âmbito do sistema de concessão de crédito à habitação. O agregado familiar em causa tem de se encontrar em situação económica muito difícil. Para preencher este requisito a lei estabelece vários critérios cumulativos, tais como: a) situação de desemprego ou uma redução do rendimento anual bruto igual ou superior a 35%; b) aumento da taxa de esforço superior a 45% ou 50%; c) valor total do património financeiro inferior a metade do rendimento bruto anual do agregado familiar. Será ainda necessário que o crédito à habitação esteja garantido por hipoteca que incida sobre imóvel que seja a habitação própria, permanente e única do agregado familiar. Os mutuários que estiverem interessados em aceder a este novo regime devem apresentar um requerimento junto da instituição de crédito com quem tenha celebrado o contrato. Este requerimento poderá ser apresentado até ao final do prazo para a oposição à execução relativa a créditos à habitação e créditos conexos garantidos por hipoteca ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual a hipoteca do crédito à habitação, caso não tenha havido lugar a reclamação de créditos por outros credores. Com a apresentação deste requerimento a instituição de crédito fica impedida de promover a execução da hipoteca que constitui garantia do crédito à habitação até que cesse a aplicação das medidas de protecção previstas na presente lei. O agregador da advocacia

“Durante a vigência do plano de reestruturação a instituição de crédito não poderá resolver o contrato de crédito à habitação nem intentar acções judiciais, declarativas ou executivas, tendo em vista a satisfação do seu crédito”

A instituição de crédito dispõe de 15 dias para, por escrito e de forma fundamentada, comunicar ao mutuário o deferimento/indeferimento do seu pedido. As medidas de protecção, que poderão ser aplicadas isoladamente ou em simultâneo, são: a) Plano de Reestruturação das dívidas emergentes do crédito à habitação Na hipótese da instituição de crédito deferir o pedido do mutuário, esta fica obrigada a apresentar uma proposta de plano de reestruturação, a suspender automaticamente o processo de execução e ainda a comunicar esse deferimento ao tribunal. Relativamente ao plano de reestruturação, poderão ser aplicadas uma ou várias das seguintes medidas: concessão de um período de carência; prorrogação do prazo de amortização do empréstimo; redução do spread aplicável durante o período de carência; concessão de um empréstimo adicional autónomo. Após a apresentação da proposta

pela instituição de crédito, o mutuário dispõe de 30 dias para negociar e acordar alterações ao plano proposto. Durante a vigência do plano de reestruturação a instituição de crédito não poderá resolver o contrato de crédito à habitação nem intentar acções judiciais, declarativas ou executivas, tendo em vista a satisfação do seu crédito. b) Medidas substitutivas da execução hipotecária Estas medidas são subsidiárias às anteriores e apenas se aplicam quando se verificarem uma das seguintes situações: i) a instituição de crédito não apresentar uma proposta de plano e reestruturação; ii) o mutuário recusar ou não formalizar uma proposta de plano; iii) as partes não tenham chegado a um acordo sobre a adopção de medidas complementares, dentro do prazo estipulado. Caso estejam preenchidas estas circunstâncias o mutuário deverá apresentar à instituição de crédito, no prazo de 30 dias, um requerimento escrito solicitando a aplicação destas medidas. As medidas substitutivas previstas são: dação em cumprimento do imóvel hipotecado; alienação do imóvel a FIIAH; permuta por uma habitação de valor inferior, com revisão do contrato de crédito e redução do capital em dívida pelo montante da diferença de valor entre as habitações. c) Medidas complementares ao plano de reestruturação Estas medidas são de aplicação voluntária. A Lei entrou em vigor no dia 10/11/12 (com excepção do prazo de resposta da instituição de crédito) e vigorará até ao dia 31/12/15.

Mariana Polido de Almeida Advogada na BPO Advogados, é licenciada pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e possui uma pós-graduação em Direito Comercial Internacional, pela mesma instituição.

*artigo escrito segundo as regras anteriores ao atual acordo ortográfico. Junho de 2013

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Sociedades Entrevista

A justiça é “claramente uma desvantagem competitiva” em relação a outros países quando os investidores olham para Portugal como potencial destino dos seus investimentos. Quem o diz é Jorge de Brito Pereira, sócio da PLMJ, que defende um pacto de regime no sector. Financeiro e Bancário, Mercado de Capitais e Privatizações são as áreas de prática de um advogado que é um maratonista convicto, músico e, desde 1990, professor universitário.

Jorge de Brito Pereira, sócio da PLMJ

Ramon de Melo

Justiça é desvantagem competitiva

Advocatus | Que avaliação é que faz das privatizações feitas em Portugal por este Governo? Jorge de Brito Pereira | Sem responder numa perspetiva ideológica, parece-me incontestável que o programa de privatizações levado a cabo nos últimos dois anos é um sucesso. A capaci30

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dade de, num momento complicado como aquele que a economia portuguesa atravessa, atrair investidores com a qualidade e capacidade dos que acorreram aos vários processos conduzidos nos últimos anos e, mais ainda, o facto de estes investidores terem proposto pagar prémios mui-

to significativos para adquirir as participações sociais em causa, é um dos maiores sinais de confiança no futuro de Portugal a que temos assistido. Note ainda dois factos adicionais. O primeiro, que em mais que uma ocasião o Governo teve na sua mão a difícil escolha entre opções estratégicas

diferentes, todas de elevada qualidade e atratividade. Ser spoiled by choice num momento destes é verdadeiramente notável. O segundo, que só as três mais recentes privatizações – EDP, REN e ANA – geraram um encaixe que é cerca de 800 milhões de euros superior àquilo que o Programa O agregador da advocacia


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de Ajustamento previa para todo o processo, o que nos dá uma boa perspetiva sobre a forma como os resultados superaram as previsões. Advocatus | A banca tem sido um dos sectores mais fustigados pela atual crise europeia. Como é que o sector vai sair desta crise: mais fortalecido ou diferente? JBP | Ainda é cedo para responder a essa pergunta; apenas podemos tentar adivinhar. A banca sofreu nos últimos anos um conjunto de alterações de consequências imprevisíveis. É importante tentar por as coisas em perspetiva para tomarmos consciência da magnitude do terramoto – este foi o tempo da primeira corrida aos depósitos em quase século e meio em Inglaterra; o tempo de transferências massivas de créditos e ativos para bad banks em sistemas que estávamos habituados a ver como fortes e estáveis como, por exemplo, Espanha, a Alemanha e vários países do centro e norte da Europa; o tempo de uma redução de liquidez no sistema sem exemplo; o tempo de um nível de desintermediação financeira como nunca tinha sido visto. A lei, como sempre acontece, reage a posteriori e assim, entre a implementação do que ficou acordado em Basel 3 e um forte movimento reformista ao nível da União Europeia, tudo está a mudar. Qualquer análise de ciclos económicos não nos deixa dizer que as coisas nunca voltarão a ser o que eram há cinco anos, mas parece claro que, no curto prazo, o sistema sairá da crise com um perfil muito diferente. Advocatus | O Direito Financeiro e Bancário e o Mercado de Capitais são duas das suas áreas de prática. Que avaliação é que faz da regulação destes sectores em Portugal? JBP | Em termos de qualidade técnica, tenho uma apreciação francamente positiva. Sabendo que existiram algumas exceções O agregador da advocacia

“Qualquer análise de ciclos económicos não nos deixa dizer que as coisas nunca voltarão a ser o que eram há cinco anos, mas parece claro que, no curto prazo, o sistema sairá da crise com um perfil muito diferente”

“A banca sofreu nos últimos anos um conjunto de alterações de consequências imprevisíveis”

“A cultura empresarial portuguesa não é muito diferente da europeia continental, sobretudo daquela que encontramos na Europa mediterrânica. Mas esta é muito diferente da norte-americana. Profundamente diferente”

de intervenções verdadeiramente desastradas, é inquestionável a qualidade geral da legislação financeira produzida em Portugal nas últimas décadas mas, sobretudo, desde a aprovação em 1999 do Código dos Valores Mobiliários. Já em termos de estabilidade, de rumo, de previsibilidade, tenho uma apreciação menos positiva. As sucessivas reformas do sistema, na maior parte dos casos a reboque da iniciativa europeia, produziram uma instabilidade que é prejudicial a um funcionamento eficiente do sistema financeiro. Advocatus | As bolsas dos EUA estão a bater recordes, as europeias têm ganhos mínimos. Como se explica esta diferença? JBP | Não é fácil explicar a dife>>>

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Entrevista

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rença e eu não serei certamente a pessoa indicada para o fazer. Admito no entanto que uma parte importante da resposta a essa questão passe pelo programa de estímulo à economia que tem vindo a ser aplicado nos Estados Unidos e que é favoravelmente avaliado pelos investidores, sobretudo quando comparado com a forma bastante desastrada como a Europa tem lidado com a crise nos últimos anos. A recente reação violenta dos mercados norte-americanos ao rumor segundo o qual a Reserva Federal vai abrandar a compra de dívida pública permite sustentar a validade desta resposta. “O mercado de fusões e aquisições não está adormecido. Está, infelizmente, animado pelo sell side, ou seja, é um mercado em que há muitos a querer vender e poucos a querer comprar”

Advocatus | A cultura empresarial portuguesa é muito diferente do resto da Europa ou da norte-americana? JBP | A cultura empresarial portuguesa não é muito diferente da europeia continental, sobretudo daquela que encontramos na Europa mediterrânica. Mas esta é muito diferente da norte-americana. Profundamente diferente. Um grande professor norte-americano que muito admiro – Mark Roe – tem uma explicação provocadora para as grandes diferenças entre os dois sistemas de corporate governance – os ventos políticos europeus não são compatíveis com um sistema económico e empresarial como o norte-americano. Numa parte, a diferença passará por aí. Mas acaba por se traduzir em tanta coisa em que somos diferentes – as estruturas acionistas das sociedades cotadas são muito diferentes, com maior concentração na Europa continental e maior fragmentação nos Estados Unidos; os problemas básicos da relação entre os administradores e os acionistas são diferentes; a forma como o sucesso e o fracasso são encarados não tem nada a ver. Advocatus | Espera alguma reanimação do mercado de fusões e aquisições em Portugal? Para quando? JBP | O mercado de fusões e

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“Só as três mais recentes privatizações – EDP, REN e ANA – geraram um encaixe que é cerca de 800 milhões de euros superior àquilo que o Programa de Ajustamento previa para todo o processo, o que nos dá uma boa perspetiva sobre a forma como os resultados superaram as previsões”

aquisições não está adormecido. Está, infelizmente, animado pelo sell side, ou seja, é um mercado em que há muitos a querer vender e poucos a querer comprar. Quando assim acontece, há uma grande pressão sobre o preço e sobre as próprias condições da transação; por outro lado, o perfil do comprador muda, surgindo investidores especializados, nomeadamente fundos de reestruturação e investidores com acesso a fontes de financiamento que não estão ao alcance dos investidores nacionais. Mas, com estas diferenças, o mercado de fusões e aquisições está a funcionar de pode mesmo dizer-se que está animado – note, aliás, que nos últimos dois anos a média de transações não tem sido inferiores àquela que existia uns anos antes. Advocatus | Portugal é atraente para o investimento estrangeiro? JBP | A atratividade não é uma categoria absoluta. Temos de nos comparar, como destino de investimento, com outros; com aqueles que são alternativas viáveis a Portugal. E aí qualquer avaliação, mesmo que superficial, terá que concluir que, tendo perdido muito investimento estrangeiro nas últimas décadas, isso será resultado do facto de nos termos transformado num destino menos atrativo. Várias razões concorrerão para isso – umas são-nos imputáveis – e eram até bastante previsíveis - e outras resultam do facto de outras economias terem conseguido aumentar a sua capacidade de atração de investimento estrangeiro. Existem em Portugal, apesar de tudo, algumas exceções – o turismo será uma das mais importantes. Mas, como tendência de médio e longo prazo, estamos num processo de perda de atratividade e será preciso fazermos muito para invertermos essa tendência. Advocatus | A atual Justiça portuguesa “atrapalha” ou “facilita” os negócios? JBP | A justiça é claramente uma O agregador da advocacia


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desvantagem competitiva. É importante ter presente que assistimos nas últimas décadas a uma grande alteração de paradigma na forma como o mercado nacional é olhado pelos investidores. Durante anos, como destino de investimento, comparávamo-nos com países cujos sistemas judiciais eram ainda mais ineficientes que o nosso; o nosso era lento, pesado e burocrático, mas mantinha uma imagem de sistema sério e respeitado, o que fazia com que, no fim de contas, não funcionasse como verdadeira desvantagem competitiva. Ganhávamos na comparação. Não tendo conseguido melhorar a eficiência do nosso sistema de justiça – muito pelo contrário -, hoje, como destino de investimento, comparamo-nos com países com sistemas judiciais muito mais eficazes que o nosso e, claro, perdemos duas vezes na comparação – perdemos por goleada. Advocatus | Tem uma opinião positiva sobre a atual ministra da Justiça? JBP | Tenho uma opinião muito positiva sobre a atual ministra da Justiça, sendo certo que acho que a avaliação do mandato deve ser feita tendo em consideração as condições que a atual ministra tem para o cumprir que, pela negativa, são inéditas. A verdade é que as dificuldades que o país atravessa são dificilmente compatíveis com um mandato notável. E, apesar disso, muito tem sido feito. É importante perceber que os problemas de que o sistema judicial padece nunca poderão ser resolvidos por um ministro ou num mandato. É preciso um programa de ação; um plano que atravesse Governos e diferentes partidos. Infelizmente a nossa tradição partidária pouco passa por esse tipo de pactos de regime o que faz com que todas as reformas que não sejam coerentes com os ciclos políticos fiquem por fazer. O agregador da advocacia

“Não tendo conseguido melhorar a eficiência do nosso sistema de justiça – muito pelo contrário –, hoje, como destino de investimento, comparamo-nos com países com sistemas judiciais muito mais eficazes que o nosso e, claro, perdemos duas vezes na comparação – perdemos por goleada”

Advocatus | Se fosse convidado para ministro da Justiça aceitava o cargo? JBP | Confesso que nem consigo imaginar esse cenário. Advocatus | Entre a austeridade e o crescimento qual a “receita” que escolheria para reformar Portugal? JBP | Essa opção, que monopoliza parte importante do nosso debate político, é uma profunda falácia e equivale a dizer que é melhor ser rico, bonito e com saúde do que pobre, feio e doentinho. Por diferentes palavras: ninguém no seu juízo perfeito, podendo escolher entre a austeridade e o crescimento, opta pela primeira, e o que se passa em França é disso sinal - mais de um ano depois da eleição de François Hollande, vivemos um momento em que as previsões da OCDE para a economia francesa apontam para não crescimento em 2013 e para crescimento inferior a 1% em 2014. A austeridade não é, evidentemente, uma opção em si mesma, sendo antes a decorrência de uma opção maior que passa pela nossa permanência no euro. Existem, claro, opções a tomar dentro da austeridade que vivemos e, infelizmente, muitas delas não têm sequer sido debatidas, o que equivale a dizer que as despesas públicas foram nos últimos anos cortadas de forma transversal e sem qualquer critério que não seja o da redução percentual. E isso é mau porque significa que não tomamos opções. A despesa é, no essencial, a mesma sob o ponto de vista qualitativo, mas como gastamos menos onde antes gastávamos mais somos piores, menos eficientes e ainda menos assistenciais.

“Como tendência de médio e longo prazo, estamos num processo de perda de atratividade e será preciso fazermos muito para invertermos essa tendência”

Advocatus | Este ano há eleições para a Ordem dos Advogados. Costuma seguir o dia a dia da Ordem? JBP | Tenho uma relação difícil com a Ordem dos Advogados e não sou muito visto por lá – creio que a última vez entrei na sede da Ordem foi na noite em que o José Miguel Júdice, meu Patrono, foi eleito Bastonário. Reconheço que a Ordem >>> Junho de 2013

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Entrevista

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“A austeridade não é, evidentemente, uma opção em si mesma, sendo antes a decorrência de uma opção maior que passa pela nossa permanência no euro”

dos Advogados foi durante muito tempo um notável instrumento de defesa dos direitos, liberdade e garantias dos cidadãos e de promoção do acesso ao direito. Reconheço também que foi veículo de promoção da função social, dignidade e prestígio da profissão de Advogado. Hoje, infelizmente, já não é nada disso - a Ordem foi-se despojando dos seus nobres papéis e funções para se transformar no que hoje mais a define, ou seja, numa barreira no acesso à profissão que defende quem está no mercado e afasta ou atrasa quem quer nele entrar. Um produto do corporativismo, que se justificou ao longo de décadas por todas as boas razões para além do mero corporativismo, acaba como o pior exemplo do corporativismo na atual sociedade portuguesa. Nunca me revi na Ordem e por tudo isto cada vez me revejo menos. Advocatus | Como é que avalia hoje a formação dos advogados? JBP | A formação dos jovens licenciados é profundamente desigual; provavelmente mais desigual do que alguma vez foi. As boas universidades portuguesas têm um nível de formação técnica cada vez melhor (o que, aliás, a Ordem não reconhece, agarrada que está a uma filosofia de formação de juristas com cinquenta, setenta anos e que ainda é por muitos defendida). As más Universidades têm no entanto um nível de formação técnica cada vez pior, mantendo-se agarradas a um estilo de ensino ultrapassado que, além do mais, é levado a cabo de forma deficiente. Ensino, como sabe, na Universidade Católica – a minha escola – e não tenho qualquer dúvida em afirmar que, em regra, um jovem licenciado tem hoje melhor formação do que tinha nos anos 80 ou 90. No que ao estágio respeita, essa desigualdade de nível agrava-se mais. Um conjunto de jovens estagiários, por sorte, talento ou vocação consegue fazer excecionais estágios; os que não têm

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“Tenho uma opinião muito positiva sobre a atual ministra da Justiça, sendo certo que acho que a avaliação do mandato deve ser feita tendo em consideração as condições que a atual ministra tem para o cumprir que, pela negativa, são inéditas”

essa sorte fazem estágios miseráveis. E a formação institucional da Ordem pouco ou nada ajuda a corrigir essas assimetrias. Advocatus | O que é que o levou a ser advogado? JBP | É difícil responder a essa pergunta. Foi um processo bastante natural que, no momento da escolha final, acabou por não me deixar grandes dúvidas no espírito. Advocatus | Porque é que escolheu as áreas financeiras? JBP | Essa foi uma escolha muito conduzida pelos acasos. Sempre fui curioso e, no estágio, trabalhei em várias áreas completamente diferentes. É provável que a ajuda que dei ao José Miguel Júdice, em 1991, na assessoria à Finantia na OPA concorrente à Sofinloc tenha sido uma das mais marcantes e tenha ajudado a definir o caminho. Daí veio muito trabalho subsequente num mercado que estava bastante quente, veio a minha tese de Mestrado sobre OPAs uns anos depois, a coordenação da área de mercado de capitais em PLMJ, a docência na Faculdade em várias cadeiras da área do Direito Financeiro, etc. Tenho no entanto perfeita consciência que as coisas podiam ter sido completamente diferentes se as marés me tivessem atirado para outro lado da praia. São processos pouco lineares que por vezes se iniciam com uma mera opção que muda tudo o que lhe sucede. Advocatus | Qual a importância de lecionar? Qual o “valor acrescentado” ao seu dia-a-dia? JBP | Dou aulas ininterruptamente desde o 5º ano do curso, em 1990, primeiro na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e agora na Universidade Católica – são quase 25 anos a dar aulas. É uma paixão que me realiza muito e que é parte fundamental da forma como vejo a minha vida profissional. Equilibra-me, obriga-me a trabalhar com o Direito de forma mais sistemática e menos O agregador da advocacia


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parcial em relação ao resultado, desafia-me e traz-me um conjunto de realizações que a minha vida como Advogado, por si só, não traria. Acho que este contributo para a minha felicidade é o verdadeiro “valor acrescentado”. Advocatus | Como se interessou por escrever um livro com o título “Contratos de Organização Comercial no Direito Angolano”? JBP | Em 2003, meses após o fim da guerra em Angola, atravessei Angola num pequeno Suzuki Vitara com dois amigos, dois portugueses e um angolano. Começamos em Luanda, atravessamos o Bengo e boa parte do Cuanza Norte e do Cuanza Sul e daí fomos até à ponta Sul do país, perto da Namíbia. Escuso de lhe dizer que foi uma viagem muito emocionante - a Angola que exis-

“O gosto pela música vem de sempre e é uma paixão que se reflete no meu dia a dia. Dito isto, deve ser salientado que a música é uma atividade para a qual tenho muito pouco talento, o que só abona a favor do Luís Pais Antunes e dos outros membros da banda”

tia em 2003 era muito diferente da Angola dos dias de hoje; as marcas da guerra estavam presentes de forma muito vívida por todo o lado, das pessoas à paisagem; o estado das estradas estava para lá de qualquer descrição e a desminagem ainda era muito insuficiente; inexistiam muitas infraestruturas básicas fora das grandes cidades. Quando regressei a Lisboa quis deixar uma marca dessa viagem e foi daí que veio a ideia do livro. Tenho pena de não saber pintar ou escrever um romance; se o soubesse era isso que provavelmente teria feito. Note que, apesar de ter um enorme fascínio por África, não tenho qualquer ascendência africana nem tinha na altura qualquer relação profissional com Angola. A minha relação subsequente com Angola acabou por ser uma outra coincidência.

“Desde há cerca de seis anos que corro duas maratonas por ano, sempre no estrangeiro, uma na primavera e outra no outono”

HOBBIES

Das maratonas aos fora da lei Advocatus | Que maratonas é que vai fazer este ano? JBP | Desde há cerca de seis anos que corro duas maratonas por ano, sempre no estrangeiro, uma na primavera e outra no outono. Este ano, em março, já corri a Maratona de Paris e no outono, pela primeira vez, vou apostar em Lisboa e no projeto de termos uma grande maratona internacional na cidade de Lisboa. É um projeto que tem tudo para dar certo. Advocatus | Como é que alguém que nunca tinha corrido começa a correr aos 39 anos e fica fã? JBP | Nem lhe sei bem explicar. A primeira maratona resultou de duas motivadoras conversas em momentos diferentes – uma com um aluno e outra com um cliente – em que ambos me diziam que uma maratona é apenas, ou sobretudo, um exercício de força de vontade. Acabei por me impor o desafio

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de correr uma maratona antes dos 40 anos, naquilo que foi provavelmente um efeito da crise dos 40. A verdade é que podia ter sido pior. A segunda foi por amizade ao meu cunhado e um grupo de amigos que prometi acompanhar na sua primeira maratona. A partir daí ficou o gosto e a vontade de cumprir a disciplina que me imponho duas vezes por ano. Advocatus | Porque é que chamou à sua banda de música “Fora da Lei”? Quando é que a fundou? JBP | O nome da banda foi dado pela Madalena Aguiar e, claro, tem a ver com o facto de sermos todos Advogados. Gosto muito do nome, mas teria preferido aquela que era a minha primeira proposta – “37 graus não é febre”. Falando mais a sério, é uma brincadeira de vários amigos que gostam muito de música e de outros que são nossos amigos e por isso nos ouvem e que começou há cerca

de cinco anos para o Rock & Law. Diverte-nos muito. Advocatus | Qual a sua inspiração para as letras das canções? JBP | Tenho muitas dúvidas que as minhas letras sejam inspiradas ou seriam certamente melhores. Advocatus | Como é que nasceu o gosto pela música? JBP | O gosto pela música vem de sempre e é uma paixão que se reflete no meu dia a dia. Dito isto, deve ser salientado que a música é uma atividade para a qual tenho muito pouco talento, o que só abona a favor do Luís Pais Antunes e dos outros membros da banda que, ao aturar-me, estão a fazer um enorme investimento na probabilidade de alcançarem o Paraíso. Mas também por isso tenho mais vontade de tocar. Dá-me mais trabalho que aos outros para fazer o mesmo, mas dá-me muito prazer.

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Mestrados e LL.M em Open Day Dar a conhecer a oferta da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (Escola de Lisboa) e da Católica Global School of Law ao nível dos mestrados e LL.M foram os objetivos da edição de 2013 do Open Day. Trata-se de um espaço de diálogo e conhecimento que envolve alunos, advogados e professores e que conta com a parceria de várias sociedades de advogados.

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Passaporte

Advogar num país jovem Um pouco de paciência, polivalência q.b. e vontade de saber mais sobre o país: esta é a fórmula que a associada da Vieira de Almeida & Associados Nadia Crujeira da Costa recomenda para quem quer exercer a profissão em Timor-Leste.

Poderia dizer-se que advogar em Dili é praticamente igual a advogar em qualquer outro país de língua portuguesa, mas estaríamos a resumir a experiência a muito pouco. Advogar em Dili é um exercício de paciência, polivalência, vontade de conhecer a cultura do país e de ser parte activa na sua educação para o desenvolvimento. Timor-Leste é um país em crescimento e áreas como o petróleo e as infra-estruturas afirmam-se como motores de um desenvolvimento que se espera florescente. Também outros sectores registam uma enorme evolução. Em 2012, o mercado das telecomunicações viu-se liberalizado, o que permitiu a uns poucos juristas privilegiados (como eu própria) participar num mundo novo de concorrência e regulação. Tal como muitos outros países de expressão portuguesa, a legislação timorense tem muito da nossa, embora haja um esforço admirável na busca por um sistema legal próprio, adequado e independente. A maior diferença assentará nos mecanismos que – como também seria de esperar – não são os mesmos e, mais importante ainda, no mindset comum em Timor-Leste que está O agregador da advocacia

muito longe do dos países do mundo ocidental. Antes de mais, Timor é um país jovem, dos mais jovens do mundo, e tão jovem quanto o país é o seu sistema judicial. Aquando do final da ocupação indonésia, o sistema judicial instalado encontrava-se totalmente em ruínas e Timor-Leste via-se a braços com a inexistência absoluta de juízes, procuradores ou advogados – funções vedadas aos cidadãos timorenses durante a ocupação –, e com uma legislação rejeitada pela população local e em choque com os Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos. Em 10 anos pode ver-se nascer um sistema que, embora resultante de um louvável esforço, se depara com obstáculos diários de concretização. Se a falta de experiência dos agentes judiciais locais, a inexistência de juízos especializados em razão da matéria (com raras excepções), a inexistência de determinados tribunais embora referidos na lei (o caso do Supremo Tribunal de Justiça no Código de Processo Civil) e a necessidade de apoio intenso e contínuo de especialistas internacionais constituem atualmente um problema, maior problema é a

relação difícil que o povo timorense tem com a justiça como a conhecemos e como a pretendemos. Este é um povo habituado à justiça tradicional e imediata – sucedem-se casos de “justiça pelas próprias mãos”, o que não podemos estranhar num país onde mais de metade da população não está familiarizada, sequer, com o conceito de tribunal. Não é por acaso que a prisão preventiva em vez de excepção, se tornou regra. A capacitação do sistema judicial impõe-se e constitui, felizmente, uma prioridade do Governo. Na verdade, e em súmula, para advogar em Timor-Leste é necessário ser mais do que um advogado. É necessário ser abrangente, proactivo, entender em pleno o negócio das empresas que se representa e o seu posicionamento neste país. É também e ainda assumir-se como responsável por ensinar, por mostrar que mais do que um bom, há o melhor caminho. E pode ser deles.* *Artigo escrito segundo as regras do anterior acordo ortográfico. Junho de 2013

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António Vitorino é o novo sócio responsável pela coordenação do departamento de Direito Europeu e da Concorrência da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira. O advogado, ex-ministro e ex-comissário europeu, detém uma longa experiência e reconhecimento nestas matérias. A nomeação é apresentada como representando mais um passo na aposta do desenvolvimento da área de Direito Europeu e Concorrência. Luís Gonçalves da Silva é o novo consultor da Abreu Advogados. Mestre em Direito e fundador dos Institutos de Direito do Trabalho e de Direito do Consumo da Faculdade de Direito de Lisboa (FDUL), o jurista integrará a área de prática de Direito do Trabalho. Joaquim Freitas da Rocha é o novo reforço da equipa da TLCB Advogados. O jurista irá integrar o departamento de Direito Fiscal, como consultor. Atualmente, é professor universitário da Escola de Direito da Universidade do Minho. Octávio Castelo Paulo (SRS Advogados) foi eleito leading adviser na área de TMT (Telecomunicações, Media e Tecnologia), na edição de 2013 do Global Leading Advisers 100. A distinção foi atribuída pela publicação internacional DealMakers, que elege anualmente os 100 melhores consultores em várias áreas de prática. 38

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Miranda “certificada” para ser parceira de empresas britânicas

Esta é a principal mais-valia que o sócio presidente da Miranda, Agostinho Pereira de Miranda, retira da recente distinção da sociedade nos prémios UK Trade Investiment. A firma foi reconhecida pelo governo britânico com o prémio “Business Internationalization”, sendo a única sociedade de advogados a conquistar este galardão. Em declarações ao Advocatus,

Agostinho Pereira de Miranda referiu que a sociedade pode agora ser escolhida como “o parceiro de primeira escolha para as empresas britânicas”. O Business Internationalization Award é atribuído anualmente pelo governo britânico às empresas que escolhem o Reino Unido como mercado chave nas suas estratégias de expansão internacional.

Manuel Barrocas publica obra sobre Arbitragem

O advogado e sócio fundador da Barrocas Advogados, Manuel P. Barrocas, é o autor da obra com o título “Lei da Arbitragem Comentada”, uma edição da Livraria Almedina. O especialista nesta área analisa e comenta a Nova Lei Portuguesa da Arbitragem Voluntária (LAV). Este livro junta-se ao “Manual de Arbitragem” publicado em 2010 pelo advogado e que constituiu a primeira obra do género em Portugal. Este trabalho foi também publicado no Brasil.

O SITE DO ADVOCATUS EM Maio As mais lidas Firmas de advocacia recrutam para áreas processuais e laborais TLCB Advogados reforça equipa de Direito Fiscal A relevância da perícia psicológica na avaliação do dano corporal Linklaters elege novo sócio para escritório de Lisboa Processo de Inventário 2.0 beta

As mais partilhadas no Facebook TLCB Advogados reforça equipa de Direito Fiscal Miranda reconhecida pelo governo britânico Garrigues eleita firma fiscal do ano pela quarta vez consecutiva Ministério da Justiça não consegue diminuir pendências Pecados de uma reforma

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Team Genesis, a nova equipa da MLGTS

Assine o Advocatus e fique descansado Farto de informação negativa que só lhe provoca mal-estar, ansiedade e stress? A melhor terapia é assinar o Advocatus. Porque, neste caso, a informação dá-lhe prazer. A assinatura do Advocatus inclui um programa gratuito de relaxamento e diversão na Odisseias. É uma oportunidade única para, gratuitamente, melhorar a saúde física e mental.

Veja em www.odisseias.com o programa que mais lhe agrada A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS) lançou a Team Genesis, uma nova equipa multidisciplinar vocacionada para o aconselhamento jurídico na área da inovação e do empreendedorismo. O grupo irá assessorar start-ups e Pequenas e Média Empresas (PME), aconselhar business angels e ainda empresas capital de risco institucional (venture capital e private equity). A Team Genesis será constituída por advogados especializados em diferentes áreas do Direito, com o intuito de poder responder a clientes de qualquer sector de atividade, inclusive desde o início do projeto, nomeadamente na preparação e apresentação de candidaturas a financiamentos públicos e privados, nacionais e comunitários. Os clientes da Team Genesis terão acesso às plataformas e redes de contactos internacionais da sociedade, em que incluem os escritórios que constituem a MLGTS Legal Circle (Angola, Moçambique e Macau) e a rede internacional Lex Mundi.

Be Cool Baptismo de mergulho, Baptismo de Moto 4, Bridge Jumping, Canoagem, Baptismo de Windsurf, Back Massage, Bob cat Experience, Segway Discover ou Speed Boat Be Happy Massagem Sweet Escape, Spa Experience, Esfoliação de Chocolate, Aula de Maquilhagem, Aula particular de esgrima, Cook Experience, Gocar City Break ou Baptismo de Moto 4

Para receber, na volta do correio, o voucher do programa escolhido basta assinar o Advocatus – o agregador dos Advogados. Com o Advocatus fica informado e… fica descansado. Não é todos os dias que tem uma oferta destas.

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Garrigues consolida posição Italian Desk será plataforma de liderança na Europa para investimentos em África A Garrigues voltou a ocupar a primeira posição do ranking “The Lawyer’s European 2013 – Euro 100”, elaborado pela publicação internacional The Lawyer. A firma foi novamente designada como líder do mercado na Europa Continental, tendo conquistado uma faturação de 337,6 milhões de euros em 2012. A sociedade mantem-se como maior firma legal da Europa Continental, quer em faturação, quer em número de colaboradores. Entre as áreas do escritório que mais se desenvolveram no ano passado, des-

taque para os departamentos de Fiscal, Laboral e Reestruturações & Insolvências. Numa análise geral, a Alemanha continua a ser o maior mercado legal da Europa Continental com uma faturação agregada dos escritórios alemães presentes no “Euro 100” a somar os 1.500 milhões de euros. Contudo, a Garrigues (1º lugar) e o escritório francês Fidal (2º) são as únicas firmas independentes que apresentam uma faturação superior a 300 milhões de euros.

Melhorar o serviço aos clientes italianos em Portugal e dar-lhes acesso à PLMJ Network são os principais objetivos da PLMJ ao lançar a Italian Desk. A coordenadora do projeto, a sócia fiscalista Serena Cabrita Neto, referiu ao Advocatus que esta desk poderá servir como plataforma para os investimentos italianos em países como os da África lusófona. A equipa será também composta pelas advogadas Marta Costa e Célia Vieira de Freitas, do escritório da PLMJ em Lisboa e por Renata Valenti, advogada de origem italiana que trabalha no escritório associado de PLMJ em Angola – GLA - Gabinete Legal Angola.

PLMJ e FDUCP firmam SRS apoia projeto de parceria em prol da formação inclusão social CDI Portugal

A Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (FDUCP) – Escola de Lisboa e a PLMJ estabeleceram um protocolo de colaboração na área da formação especializada a cargo da Católica Global School of Law (CGSL). A parceria visa a formação dos advogados da PLMJ pela CGSL e o apoio da sociedade à edição de 2013-2014 do mestrado em Direito Fiscal da UCP. O protocolo irá interligar o Centro de Formação Excelentia PLMJ com a Universidade Católica Portuguesa (UCP), prevendo a colaboração em matérias de formação e apoio a programas específicos da FDUCP e da CGSL. Os advogados da PLMJ terão acesso a um programa exclusivo 40

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de formação, conduzido por professores da CGSL, que contempla profissionais de universidades internacionais. No âmbito desta parceria, foi já elaborado um programa de formação feito à medida dos advogados e que terá a duração de um semestre, com seis módulos, sob o tema: Global Business Programme. O acordo prevê ainda o apoio ao mestrado de Direito Fiscal por PLMJ, único parceiro da edição 2013-2014, que arranca em Setembro. Este programa contará com a colaboração da sócia de Direito Fiscal Serena Cabrita Neto. A sociedade terá ainda um sócio como representante no Advisory Board da CGSL.

A SRS Advogados é uma das entidades que apoia o lançamento do projeto CDI Portugal – Centro de Inclusão Social, da Microsoft, ao qual irá prestar assessoria jurídica. Esta iniciativa tem como missão mobilizar e transformar comunidades, em particular com jovens provenientes de contextos socioeconómicos desfavorecidos, através da utilização da tecnologia. O CDI pretende criar uma rede nacional de centros de inclusão digi-

tal beneficiários. O centro piloto situa-se no Bairro da Bela Vista, em Setúbal, e está já a ser preparado o lançamento do segundo piloto, em Vale de Cambra, Porto. A ambição do CDI é vir a gerir, com metodologia própria, uma rede de centros de inclusão digital em Portugal, expandindo-a para escolas, prisões e outros locais onde a tecnologia possa reconverter e abrir novas oportunidades para os mais jovens.

César Bessa Monteiro preside a grupo português da AIPPI O sócio fundador da PBBR, César Bessa Monteiro, foi o escolhido para desempenhar o cargo de presidente da direção do grupo português da Associação Internacional para a Proteção da Propriedade Intelectual (AIPPI). O grupo português da AIPPI foi criado em 1975 e conta atualmente com cer-

ca de 100 membros. A AIPPI é a organização não governamental dedicada ao desenvolvimento e estudo da Propriedade Intelectual, no qual se incluem as patentes, as marcas e os Direitos de Autor. Congrega cerca de nove mil membros, que representam mais de 100 países. O agregador da advocacia


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Televisão

Atualidade em debate A gestão das sociedades de advogados, a responsabilidade dos administradores ou a aplicação da multidisciplinaridade foram temas em debate, em maio, no Direito a Falar, com o contributo de vários advogados. Lugar ainda para uma entrevista de vida, com José Carlos Soares Machado.

Consequências da multidisciplinaridade na advocacia A multidisciplinaridade na advocacia integra a proposta de revisão do Estatuto da Ordem dos Advogados. Direito a Falar ouviu Vasco Marques Correia, presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, Jaime Martins, vice-presidente do mesmo organismo, Jorge de Abreu, sócio fundador da Abreu & Marques e Associados, e o advogado em prática individual Luís Paulo Relógio. Vasco Marques Correia classifica a multidisciplinaridade como o “cancro da advocacia”, considerando-a algo “perigoso”, pois – sustenta - a advocacia tem uma lógica que a distingue das outras atividades, isto é, não é mercantilista. Visão partilhada por Jaime Martins, que acrescenta que os advogados têm um conjunto de incompatibilidades como forma de manter a independência. Luís Paulo Relógio acredita que o que está em causa é, acima de tudo, o “interesse público”. Sendo um dos pilares da advocacia o segredo profissional, o conflito ético e na relação com o cliente poderá colocá-lo em causa. Por fim, Jorge Abreu alertou para o facto de os advogados não poderem trabalhar “paredes meias” com aqueles que praticam profissões que não estão sujeitas às mesmas regras.

Gestão em tempo de crise No ano em que a JPAB – José Pedro Aguiar-Branco & Associados comemora uma década, o sócio fundador Pedro Botelho Gomes e a associada Joana Silva Aroso abordaram como se gere uma sociedade em época de crise. Pedro Botelho Gomes considerou essencial o foco no cliente e na defesa dos seus interesses, defendendo, numa perspetiva económica, que as firmas de advocacia devem ter as mesmas cautelas que outras empresas. Já Joana Silva Aroso afirmou que a principal mudança se registou no tipo de clientes, que deixaram de ser essencialmente empresas para predominarem os particulares.

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O excesso de advogados O excesso de advogados é, atualmente, o maior problema da advocacia em Portugal, na perspetiva do sócio da SRS José Carlos Soares Machado. O advogado, que conta com mais de 35 anos de carreira, decidiu agora enveredar por um novo desafio – candidatar-se à presidência do Conselho Geral da Ordem dos Advogados. Uma decisão que tomou por considerar que este é um órgão muito importantes para os advogados. Relativamente às eleições para bastonário, o sócio da SRS acredita que o número de candidatos reflete a falta de pacificação que tem existido nos últimos anos. E espera que, com um novo bastonário, o futuro seja diferente, de preferência mais pacífico.

Responsabilidade pessoal dos administradores A responsabilidade pessoal dos administradores de empresas esteve em debate, com os contributos dos advogados da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira José de Freitas e Pedro Sousa Machado. Os juristas apresentaram situações em que os administradores podem ser chamados a responder pessoalmente, a nível penal, civil, ambiental e fiscal, devido às decisões que tomam quando dirigem o destino de uma empresa. Na perspetiva de José de Freitas, os administradores não têm plena consciência da atividade que desempenham e das responsabilidades que isso acarreta: Já Pedro Sousa Machado acredita que os administradores sempre estiveram bem informados, principalmente a nível fiscal. Isso leva-os a tentarem precaver-se. Junho de 2013

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O livro de…

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João Nuno Azevedo Neves

O tema que me é proposto “o livro da sua vida” é nuvem ciclópica para quem já com a minha idade tem na leitura um dos seus maiores prazeres. Seria fácil indicar uns quantos do universo das minhas leituras, destacando: o Quarteto de Alexandria, os Maias, o Livro do Desassossego, Garcia Lorca, Jorge Amado, Graham Greene, Faulkner, Fitzgerald, Steinbeck, Hemingway, Somerset Maugham, Camus, Russel, Coetzee, Mishima, Garcia Marquez, Vargas Llosa, Bolaño e Phillipp Meyer. Porém, a escolha que me impus busco-a somente em recentes ficções, afastando as biografias e o atinente a áreas específicas por as entender fora do proposto. Desse crivo, mas sempre hesitante, opto por “As velas ardem até ao fim”, de Sándor Marai, escritor húngaro emigrado nos Estados Unidos após a chegada do regime comunista. Porquê? Cultivando a amizade como forma segura da tranquilidade do espírito e da necessidade de vivermos muito para e no sentimento dos outros, não podia deixar de me sentir envolvido, ao viver neste fascinante romance a tão sensível reflexão sobre a amizade, num mundo que poderá não regressar mais, encerrando-se, por vezes, com a simples perda de um amigo. É um verdadeiro poema que abarca também as paixões que jamais se lhe sobrepõem. O diálogo fascinante, cheio e saudoso de dois velhos amigos de personalidades bem diferentes que se reencontram para jantar e questionar ao fim de inúmeros anos, após uma juventude vivida como irmãos, enche, pela sua profundidade, a esperança a que todos aspiramos de um dia podermos ter essa reflexão, superando paixões, falsidades e afastando a implícita vontade de agredir quem muito amamos. Só ao recuperar toda uma vida, que não o ato isolado que a não mostra, bem como ao senti-la nos factos que a constituem encontram a resposta às dúvidas persistentes de quarenta anos, renovando a alma, o coração e a vida para o que dela resta. Um diálogo/monólogo imortal. 42

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Sándor Marai: “As velas ardem até ao fim” Editora: Dom Quixote – 2001

João Nuno Azevedo Neves Sócio da ABBC & Associados. Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Trabalha principalmente nas áreas de Contencioso e Arbitragem.

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nFactos

Com o mar no horizonte

Sempre que olha pela janela, Sara Castro Tavares tem o privilégio de poder observar a praia. Por vezes, acaba por se perder a descobrir a imensidão do mar, cortada pelos barcos que navegam rumo ao porto de Leixões. Para a advogada da Azevedo, Brandão & Associados (ABA) é “impossível ficar indiferente a esta vista”. O mar é o elemento que destaca, pois “representa um infinito inatingível” e permite que cada um se lembre da pequenez e da fragilidade do ser humano perante a força deste elemento. Os advogados trabalham largas horas, por isso Sara considera a vista que tem da janela uma aliada. “É a nossa maior aliada em momentos de maior tensão e stress, assim como quando necessitamos de redescobrir a nossa inspiração e concentração”, afirma. A vista foi preponderante na escolha da localização do escritório no Porto. Na perspetiva de Sara, consegue reunir tudo o que a sociedade pretendia, pois, apesar de estar longe da “azáfama do centro da cidade”, está próximo do que a equipa necessita, tendo a “tranquilidade” como mais-valia. “Quando estamos a trabalhar e sentimos “necessidade” de olhar pela janela, normalmente, estamos a apelar à inspiração, na medida em que o mar e a natureza representam o expoente máximo da liberdade que se transpõe, muitas vezes, para o nosso trabalho, ao nível da liberdade intelectual que deverá caracterizar o trabalho de um advogado”, explica. Como vista ideal não consegue imaginar uma melhor do que a do litoral português. Para Sara, as praias e as esplanadas são os melhores sítios para apreciar o melhor que a natureza de Portugal tem para dar. O agregador da advocacia

Sara Castro Tavares Advogada da Azevedo, Brandão & Associados Junho de 2013

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Restaurante

Manuel Falcão diretor-geral da Nova Expressão

Assumidamente carnívoro

O Talho

Rua Carlos Testa 18 www.otalho.pt ou no Facebook Telefone 213 154 105 Encerra ao domingo, aberto de segunda a sábado entre as 10H30 E AS 24H

Durante uns anos Kiko e Maria Martins dedicaram-se à viagem e descoberta e foram provando petiscos pelo mundo fora. Das suas viagens e experiências deram testemunho no Expresso e no site eattheworld. com - mais tarde passado a papel no livro “Comer o Mundo”. Desde há pouco tempo a experiência dos dois passou da escrita para a prática e abriram “O Talho”, na rua que sai do largo de São Sebastião da Pedreira, ao Quartel General, e sobe para frente ao El Corte Inglés. Kiko Martins é um cozinheiro com provas dadas, passou pelo Eleven e pelo Estufa Real e aperfeiçoou a sua arte em Paris. A páginas tantas apaixonou-se pelas várias formas de cozinhar carne, desde o Brasil à Ásia, e essa foi a razão de ser deste seu novo projeto, assumidamente carnívoro. Em março passado abriu finalmente o seu restaurante, “O Talho”, de seu nome completo “O Talho, Parte & Reparte”. Primeiro uma descrição do local - à entrada está verdadeiramente um talho, onde se pode comprar carne para levar para casa, desde rolos temperados até rosbife asiático mas também salsichas frescas e várias outras qualidades e cortes das melhores carnes. No balcão um talhante está pronto a satisfazer os seus pedidos especiais. Nas prateleiras vários acompanhamentos preparados (como um puré de batata com manteiga noisette), azeites, molhos, batatas fritas estaladiças, queijo de Azeitão e vinho. Desta parte do talho pode levar para casa uma 44

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refeição - que pode incluir petiscos como croquetes de cozido à portuguesa ou empadas de cabidela, que, em querendo, também lhe serão dados a provar no restaurante. Logo a seguir entra no restaurante, uma bela sala muito simpática, com uma decoração simples e criativa que inclui paredes de garrafas vazias e pratos sortidos, mas também máquinas de picar carne manuais (está uma bela coleção logo à entrada) ou fiambreiras domésticas antigas. Descendo por uma escada forrada a tampas de caixas de madeira dos melhores vinhos portugueses, chega-se à garrafeira, onde se pode

escolher o vinho para a refeição - ou aceitar a sugestão da casa, em vinho a copo, que é boa. Na sala há duas mesas grandes que podem receber grupos de dimensão variável - de dois a doze. O serviço é muito simpático e atencioso. A dimensão das mesas é boa, as cadeiras são invulgares e muito confortáveis, com uma clara influência asiática, e a luz é adequada. Pormenor muito importante: a acústica é ótima, não há sons estridentes e não se ouve a cacofonia infelizmente habitual nos restaurantes. Existe um menu de almoço a preços mais módicos (e destaco o hambúr-

guer nas várias variedades que a casa proporciona). À noite guiamo-nos pela carta que está em evolução e que em breve incluirá leitão Ah...- e esquecia-me de dizer que os talheres são negros. Invulgares e curiosos. A minha experiência, ao almoço e jantar, correu sempre bem. O almoço é naturalmente mais movimentado, mas à noite, mesmo num dia de semana, a casa é animada q.b. Ao almoço experimentei o novo burguer manjerico (feito em honra ao mês de junho), mas ao jantar a coisa foi mais séria. Começámos por um foie gras, que estava magnífico na forma como foi servido e muito bem acompanhado por um branco Quinta do Romeu, a copo. A seguir veio um rosbife asiático com algas e cebola e uma posta alta e suculenta de vitela maronesa, acompanhada de salada e batata frita - tudo isto na companhia de um tinto Quinta do Mouro, também a copo, e boa sugestão da casa. A rematar, a sobremesa foi um bolo de chocolate com gelado de pistachio. Devo ainda confessar que o miminho que o chefe ofereceu logo no início da refeição ajuda e bem a entrar no ambiente da casa. Bem vistas as coisas o jantar para duas pessoas ficou cerca dos setenta euros e o almoço, solitário, andou um pouco abaixo dos 20 euros.

banda sonora

Jamie Cullum - Momentum Ao seu sexto disco Jamie Cullum largou a onda do jazz mais tradicional e atirou-se com a melhor das poucas vergonhas ao pop mais descarado. Neste disco Cullum passa dos clássicos do jazz vocal para um território que fica entre os sons dos Coldplay e algumas incursões descaradas no hip hop e no funk - como se percebe pela sua versão de um clássico de Cole Porter, “Love For Sale”, onde introduz um sample da voz de Roots Manuya, tudo pontuado pelo solo do próprio Collum num Fender Rhodes - aliás a sonoridade dos sintetizadores dos anos 70 é parte integrante do conceito de produção do disco. Jamie Cullum passa de uma faixa para outra com uma energia que nalguns momentos evoca os bonecos da publicidade das pilhas

Duracell. Esta música é inevitavelmente feita para ser dançada e é garantido que este disco fica desde já eleito como a banda sonora ideal para cocktails de fim de tarde - evocando aqueles momentos em que o jazz não tinha vergonha de ser pop e dançável. É justo destacar temas como “The Same Things”, logo a abrir o disco, baseada em sonoridades de Nova Orleães, mas também a percussão de “Edge of Something”, ou “Anyway” e “Take Me Out (Of Myself). Para rematar sugiro uma balada arrasadora que dá pelo nome de “Save Your Soul”.

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Montra

Branco, para horas mais claras É o primeiro relógio da Officine Panerai com um mostrador branco. Desportivo, o Luminor Marina 1950 3 Days Automatic mantém a caixa em aço inoxidável. Sobre o branco, sobrepõem-se números pretos de grande dimensão que permitem a máxima claridade e legibilidade. Resistente à agua, apresenta-se com uma correia castanha em pele de crocodilo com fecho de aço escovado e é fornecido com uma ferramenta especial para substituir a correia e uma chave de parafusos de aço.

Um perfume para usar ao sol O uso de produtos solares bem sempre é compatível com a utilização habitual de um perfume clássico. Não era, pelo menos, porque a Lancaster concebeu um perfume inédito, exclusivamente para o verão e que se pode usar ao sol. Eau de Toillete Summer Splash é a resposta para quem quer tirar partido do sol sem abdicar de um toque perfumado.

Escrita de luxo A visão noturna e mística do lago Léman, situado na fronteira entre a França e a Suíça, serviu de inspiração ao mais novo elemento da “família” Caran d’Ache – a coleção Léman Noir Matte. Disponível em caneta, roller, esferográfica e lapiseira, combina o preto fosco com o prateado banhado a ródio e a assinatura Caran d’Ache. Esta coleção vem reforçar, assim, a qualidade suíça e a sua pormenorizada produção nos ateliers de Genebra.

Vintage progressivo Cor e um revivalismo vintage. Estas são as tendências que inspiram a coleção feminina primavera-verão da Fly London. Interpretadas numa perspetiva progressiva e nunca convencional, são transpostas para sapatos e malas em que predominam as combinações de cores - laranja, verde-musgo, branco, azul petróleo e turquesa – num design revivalista.

Clássicos reiventados Entre o retro e o futurista, a Ray-Ban acaba de relançar o Clubmaster, o modelo mais icónico da marca agora em duas edições exclusivas: uma em alumínio e outra dobrável. Com origens entre os anos 50 e 60, surgem agora com novos materiais e um design mais contemporâneo, em que é dada maior atenção aos detalhes técnicos

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Os filmes de ...

O sócio da PLMJ Manuel Lopes Rocha é um apaixonado por cinema. Os filmes antigos que retratam histórias de vida ocupam o top cinco das escolhas cinematográficas do especialista em Propriedade Intelectual.

Manuel Lopes Rocha

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Sócio da área de TMT da PLMJ

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Título: A Terra Treme (La Terra Trema), 1948 Realizador: Luchino Visconti Protagonistas: Luchino Visconti, Antonio Pietrangeli História: Aci Trezza é uma pequena aldeia, no sul da Sicília, em que os pescadores são forçados a vender o fruto do seu trabalho a grossistas sem escrúpulos. Até ao dia em que António se revolta e decide iniciar um negócio por conta própria. No entanto, a “nova vida” não irá ser mais fácil que a anterior…

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Título: O Mundo a seus pés (Citizen Kane), 1941 Realizador: Orson Welles Protagonistas: Agnes Moorehead., Dorothy Comingore, Joseph Cotten, Orson Welles História: Charles Foster Kane é um magnata da imprensa que começou do zero mas conseguiu construir um império e tornar-se multimilionário. Ao morrer, a última palavra que profere é “Rosebud”. Um jovem jornalista acredita que pode ser a pista para um grande mistério e não descansa enquanto não o descobre.

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Título: Rocco e seus irmãos (Rocco i suoi fratelli), 1960 Realizador: Luchino Visconti Protagonistas: Alain Delon, Claudia Cardinale, Renato Salvatori História: Uma família siciliana à procura de uma vida melhor decide mudar-se para Milão. No entanto, a sorte teima em não sorrir para a viúva Rosaria e os cinco filhos Rocco, Ciro, Luca, Simone e Vincenzo na “grande cidade”. Apesar de todas as dificuldades, o que vai ditar a destruição da família é a luta de dois dos irmãos pela mesma mulher.

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Título: Juventude Inquieta (Rumble Fish), 1983 Realizador: Francis Ford Coppola Protagonistas: Diane Lane, Matt Dillon, Mickey Rourke, Nicolas Cage História: É a história de dois irmãos que mantêm uma relação complicada e seguem uma vida de delinquência. O mais novo tenta estar à altura da reputação do irmão, líder de um gangue motard já extinto. Ambos procuram encontrar sentido para as suas vidas, num filme que retrata a adolescência urbana em Oklahoma.

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Título: Gente de Dublin (The Dead), 1987 Realizador: John Huston Protagonistas: Anjelica Huston, Dan O’Herlihy, Donal McCann História: A hospitalidade característica do povo irlandês está plasmada neste filme, que conduz o espetador numa viagem pela sociedade de Dublin no início do século XX. A música e a atmosfera da cidade são mostradas ao longo do filme, que é uma reflexão sobre a vida e a morte, tendo como ponto de partida um conto de James Joyce. O agregador da advocacia




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