Cidades precisam de se vender

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Marketing Territorial

Cidades precisam de se vender

Vitor Nascimento/Who

As cidades competem entre si para atrair investidores, visitantes e mesmo residentes. Cada cidade precisa, portanto, de evidenciar as suas vantagens competitivas. Ou seja, precisa de se vender

Pode uma cidade ou região ser promovida e gerida como um produto? Pode constituir uma marca e, como tal, ser detentora de atributos diferenciadores de outras cidades ou regiões? À luz das teorias e práticas de marketing territorial a resposta às duas questões é afirmativa. A aplicação das técnicas de marketing a uma cidade ou região é ainda relativamente recente, mas a globalização tem vindo a impor novos comportamentos por parte de quem tem a responsabilidade da gestão. Na tese de mestrado 32

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em Ciências Empresariais, que defendeu em 2010 na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, Paulo Henrique Moreira acrescenta à globalização a natural limitação dos recursos para justificar uma crescente competição entre os lugares. António Azevedo, Duarte Magalhães e Joaquim Pereira, autores de City Marketing – MyPlace in XXI, comungam este pensamento. E sustentam que os territórios se confrontam com a necessidade imperiosa de desenvolverem estratégias de afirmação visando

obter vantagens competitivas. Os lugares enfrentam actualmente um desafio, diz Paulo Moreira, que é o do fortalecimento das suas capacidades e competências com vista a serem capazes de se adaptarem rapidamente a uma envolvente em constante mudança, aproveitando as oportunidades para sustentar a sua competitividade perante a concorrência. Neste novo conceito de cidade empreendedora – o conceito pode estender-se a uma região ou território – emerge uma ferramenta até há uns anos impensável na

gestão municipal ou territorial: o marketing. E o marketing pressupõe, naturalmente, a existência de um produto. Em City Marketing desenvolve-se a ideia de que esse produto é a cidade em si mesma, com todas as suas ofertas, bens e serviços que disponibiliza, a economia, as infra-estruturas de que dispõe, o valor arquitectónico dos edifícios, o valor paisagístico e a qualidade do meio ambiente, as vivências pela dinâmica das realizações que promove, a cultura, as tradições e os costumes das suas gentes, a educação, a ciência e O agregador do marketing.


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“Uma cidade é, por definição, uma marca”

“Quisemos provar que aqui no Alentejo o tempo passa devagar e há ‘tempo para ser feliz’”

“Quem não conhece Badajoz? Mesmo Mérida e Cáceres? Mas quantos são os portugueses que já se afoitaram mais além? Poucos”

“Não pode haver em Portugal alguém que não saiba que Guimarães será em 2012 a Capital Europeia da Cultura”

Maria João Vasconcelos brand & behaviour advisor da ativism

Andrea Valenti director unidade negócios Draftfcb

Teresa Rainha directora da delegação da Extremadura em Lisboa

Cristina de Azevedo presidente da Fundação Cidade de Guimarães

tecnologias, as acessibilidades… É, pois, um produto complexo que importa diferenciar: afinal, as cidades competem entre si para atrair investidores, visitantes e mesmo residentes. Cada cidade precisa, portanto, de evidenciar as suas vantagens competitivas. Ou seja, precisa de se vender. Para isso, precisa de uma estratégia de atractividade orientada para os seus diferentes públicos. Para que a diferença seja valorizada, defende Paulo Moreira na sua tese, a cidade carece de uma identidade – de missão, visão e valores. Porque o que está em causa é influenciar positivamente os mapas mentais para gerar primeiro preferência e depois lealdade dos públicos. Esse é o valor da marca. E a marca é, argumentam os autores de City Marketing, o ponto de partida para uma estratégia de marketing territorial. A marca – confirma o mestre em Ciências Empresariais que estudou o caso concreto da empresa Porto Turismo – é o facilitador da decisão. O processo de construção da marca começa na identificação clara das razões por que um lugar necessita dela: a partir daí, o processo é dinâmico, assente numa relação directa com os pú-

blicos, em dois patamares – racional e simbólico. Um logótipo não basta. O imediatismo de uma campanha promocional também não. Os vários autores são consensuais: uma marca territorial exige uma estratégia global e a longo prazo. Porque o que está em causa é reconstruir e redefinir a imagem de uma cidade, conferindo-lhe uma identidade única e diferenciável. Competitiva. Maria João Vasconcelos, brand & behaviour advisor da ativism, leva à prática estes conceitos. À sua agência se deve a campanha de rebranding de Viana do Castelo. Desenvolvida com a convicção de que “uma cidade é, por definição, uma marca”. E é marca porque – explicou num testemunho ao Briefing — define um território e tudo o que nele acontece, porque tem uma identidade específica – a sua cultura, o seu carácter e a sua personalidade, porque tem símbolos – a bandeira ou outros elementos que historicamente a definem – porque tem alma, os seus heróis, os seus mitos e os seus líderes. Tal como os autores de City Marketing e da tese de mestrado sobre “Gestão da Marca Cidade”, defende que numa sociedade global, aberta e a funcionar como um grande mercado, os recursos

são escassos e todos têm de lutar para os conquistar, sejam pessoas, investimentos ou turistas. E o marketing, enquanto ferramenta do mercado, é também aqui chamado a aplicar os seus princípios e as suas técnicas para “posicionar e promover a adesão dos alvos às promessas e aos objectivos”. Com duas diferenças substanciais em relação a outros produtos: a primeira é que as cidades ou territórios são um produto altamente compósito e diversificado e, muitas vezes, imprevisível; a segunda é que as promessas que irão dar corpo ao posicionamento da cidade não são propriedade de alguns, são de todos, e por todos têm de ser suportadas e alimentadas. Foram estes conceitos que presidiram ao reposicionamento de Viana do Castelo: colocar a cidade no mapa mental dos portugueses, dando-lhe visibilidade e notoriedade, foi o objectivo, perseguido também no intuito de renovar o património identitário da cidade, para que fosse um elemento aglutinador das suas gentes e esforços. “Viana fica no coração” foi a marca encontrada para ir ao encontro destes objectivos. Uma marca a que a ativism chegou com “muito amor, suor e lágrimas” e que teve

como ponto de partida a “cultura do amor”, — há muito património de Viana. O mais “ousado” – recorda Maria João Vasconcelos — foi assumir esse património e não ter medo (de possíveis interpretações depreciativas). Foi preciso ousar em Viana, como no Alentejo. Havia aqui que mudar a percepção que existia em relação a esta região, rompendo com a oferta antiquada e pouco atractiva, promovendo a imagem de um destino moderno, com uma oferta turística diversificada e de qualidade. Foi este o desafio assumido pela Draftfcb. Andrea Valenti, director de unidade de negócios, não tem dúvidas de que a definição do posicionamento e do território de comunicação da marca são factores de sucesso para o reconhecimento de qualquer destino turístico. Sendo o Alentejo um destino tão vasto, tão heterogéneo e com tantas valências, o grande desafio foi definir uma linha de comunicação, trabalhando os conceitos de transversalidade e autenticidade. Havia que promover o que de mais genuíno o Alentejo tem para oferecer. Nada melhor do que valorizar aquilo que é um activo único - “o vagar alentejano” – que está no ADN das gentes e da própria terra.

O agregador do marketing.

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Viana do Castelo

Alentejo

“Viana fica no coração” foi a marca encontrada para ir ao encontro destes objectivos. Uma marca a que a ativism chegou com “muito amor, suor e lágrimas” e que teve como ponto de partida a “cultura do amor”

Nada melhor do que valorizar aquilo que é um activo único - “o vagar alentejano”, que está no ADN das gentes e da própria terra. “Tempo para ser feliz” foi assim o grande eixo de comunicação

“Tempo para ser feliz” foi assim o grande eixo de comunicação: é – nas palavras de Valenti ao Briefing – uma frase simples que condensa em si uma promessa e potencia aquilo que é reconhecido como uma mais-valia do Alentejo. “Quisemos provar que aqui o tempo passa devagar e há ‘tempo para ser feliz’”. Depois de identificada a assinatura da comunicação, havia que desenvolver uma estratégia que proporcionasse ao turista uma perspectiva holística e actual da oferta da região. Um levantamento exaustivo das potencialidades turísticas do Alentejo, quer ao nível do território natural e do património cultural, social e gastronómico, quer ao nível dos equipamentos, permitiu definir 34

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ofertas e segmentos de mercado para quem essas ofertas seriam atractivas. É este – resume o director de negócios da Draftfcb – “o grande diferencial” face a outras campanhas de comunicação de destinos turísticos: foram definidos quatro grupos-alvo – namorados, famílias com filhos menores, seniores activos e (jovens), “mochileiros” – a pensar em promover aquele que é um dos destinos nacionais com maiores taxas de crescimento. Andrea Valenti assume que, mais do que criar uma marca, era “urgente” mudar a percepção do Alentejo. É também essa a ambição da delegação da Extremadura em Lisboa: mudar a percepção que os portugueses têm desta

região espanhola fronteiriça, mas não porque seja negativa, antes porque é ténue. Quem não conhece Badajoz? Mesmo Mérida e Cáceres? Mas quantos são os portugueses que já se afoitaram mais além? Poucos, na perspectiva da directora da delegação extremenha, Teresa Rainha. Não se trata aqui de criar uma marca, porque ela já existe. Trata-se de lhe conferir visibilidade. Projectando uma Extremadura moderna, que partilha com Portugal mais do que a linha de fronteira. Que é um acesso natural a Espanha. Uma porta aberta, receptiva: tanto que o fio condutor da comunicação é um convite – “Por favor, invadam-nos!”. Em Portugal, a Extremadura quer

ser (re)conhecida como uma terra de oportunidades, inovação, confiança e qualidade. Uma terra que quer partilhar com Portugal as suas valências. E que dá provas concretas desta intenção, com uma defesa inédita da língua portuguesa – é já a segunda língua estrangeira mais estudada nas escolas da região. E a ideia é que el portugués abre puertas, portas para que, juntos, espanhóis e portugueses cheguem a 800 milhões de pessoas em todo o mundo. Com uma delegação em Lisboa, desde meados de 2009, a Extremadura quer aproveitar a proximidade geográfica para potenciar o triângulo estratégico Lisboa-Madrid-Sevilha e promover um turismo alternativo ao tradicional sol-eO agregador do marketing.


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Extremadura

Guimarães

A Extremadura moderna apresenta-se como uma porta de entrada em Espanha, uma porta aberta, receptiva: tanto que o fio condutor da comunicação é um convite – “Por favor, invadam-nos!”

Guimarães diferencia-se: a experiência em curso propõe-se aliar a tradição simbólica, de berço da nacionalidade, e a tradição industrial, com forte presença da produção têxtil, a um novo factor de atracção – a cultura

-praia, em que a arte e o património ocupam lugar de relevo. A Extremadura quer abrir-se a Portugal, como se quer abrir ao mundo. E aos demais espanhóis. Teresa Rainha reconhece que a região está um pouco esquecida em Espanha, carecendo de ser reposicionada também dentro do território nacional como terra de potencial e futuro. Não é por acaso que uma cegonha em voo ascendente é o símbolo da marca. Os símbolos não surgem por acaso. O de Guimarães – Capital Europeia da Cultura 2012 – inspirou-se nas ameias do castelo da cidade e no elmo de D. Afonso Henriques para moldar um coração que é, ao mesmo tempo, janela que se desdobra em múltiplas faces, porque pode O agregador do marketing.

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ser recriado e apropriado por cada um. É o logótipo a celebrar a diversidade cultural de um evento concebido para atrair a Guimarães milhão e meio de visitantes. Foi esse o compromisso assumido na candidatura, é para esse objectivo que trabalha a comunidade impulsionada pela Fundação Cidade de Guimarães. O que está em curso é – afirma a presidente da fundação, Cristina de Azevedo – um processo de transformação. “E tudo se transforma” é, precisamente, o conceito criativo estratégico, na convicção de que todos quantos forem tocados pelo evento sofrerão um processo de transformação, de melhoria. Assim acontece já com os cidadãos envolvidos

no projecto: muitos deles nunca tinham tido qualquer experiência artística. A cidade está ela própria a ser transformada fisicamente. São etapas de uma estratégia que se propõe criar mais uma camada de vida para Guimarães, uma camada que não apaga as outras, antes as completa. E a cidade diferencia-se: a experiência em curso propõe-se aliar a tradição simbólica, de berço da nacionalidade, e a tradição industrial, com forte presença da produção têxtil, a um novo factor de atracção – a cultura. Cristina de Azevedo elogia em Guimarães a rica simbiose entre o passado e o futuro, mas acredita que a história não pode funcionar como um sofá, mas como um trampolim. Um trampolim para que

mude a atitude face à cidade, gerando maior curiosidade e expectativa, motivando a visita. Afinal, a matéria-prima – o simbolismo histórico – já está na cabeça de todos os portugueses… Ainda assim, há uma preocupação: não pode haver em Portugal alguém que não saiba que Guimarães será em 2012 a Capital Europeia da Cultura. Todavia, este não é o fim: é o princípio, o catalisador do desenvolvimento da cidade. E não é o fim em Guimarães, como não é em Viana do Castelo, no Alentejo ou na Extremadura: em nenhum dos territórios a estratégia se resume a uma campanha. Não basta criar a marca, é preciso dinamizá-la. Não basta mudar as percepções, é preciso manter a atractividade. Fevereiro de 2011

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