Entrevista Fátima de Sousa jornalista fs@briefing.pt
“A quadratura do círculo é sermos mais eficientes, ou seja, conseguirmos fazer mais com menos. Mas a perspectiva dos anunciantes é de não querer menos exposição. Não se pode deixar de anunciar, vai é ter de ser mais barato”. Quem o diz é Eduardo Branco, 52 anos, presidente da Associação Portuguesa de Anunciantes, em vésperas da entrega dos Prémios à Eficácia da Comunicação
Ramon de Melo
Contra a crise, anunciar
Briefing | A APAN prepara-se para entregar, pelo sétimo ano consecutivo, os Prémios à Eficácia da Comunicação. O que reflecte este prémio? Eduardo Branco | Antes de mais, é importante sublinhar que é o único prémio que parte dos anunciantes, é absolutamente isento. E traduz um dos grandes pilares da associação, que é a eficácia da comunicação. Agarra 30
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a publicidade naquilo que é essencial para as empresas, que é conseguir resultados. A publicidade é o que está entre nós, anunciantes, e o mercado, é a peça criativa que conduz o mercado a aderir à nossa proposta de valor e à emoção que as nossas marcas querem transmitir. Estamos absolutamente conscientes de que a publicidade não é meramente informação. www.briefing.pt
Briefing | O que vai então ser reconhecido é o contributo das campanhas para a geração de resultados das empresas? EB | Com certeza. O que está na base do concurso é, de facto, garantir que o dinheiro que se gasta tem retorno. A nós, anunciantes, interessa que haja contrapartida para o dinheiro que investimos em publicidade e que essa contrapartida seja mensurável. As audiências são a medida da eficácia da comunicação. Daí o objectivo da APAN de que haja grande precisão na medição das audiências. Briefing | O desfecho do recente concurso para medição de audiências televisivas satisfaz a APAN? EB | A APAN tem acompanhado muito de perto a questão da medição de audiências e com uma visão muito clara do que quer. Desde a primeira hora que estivemos interessados em que o processo decorresse da melhor forma, com um caderno de encargos elaborado com as melhores práticas internacionais, com supervisão independente internacional.Houve um concurso público em que estiveram os principais players e um deles [a GFK] ganhou. Estamos muito expectantes quanto à implementação do novo sistema, em Janeiro. Briefing | Era urgente um novo sistema? EB | A medição que existia já não dava satisfação às exigências de hoje, havia incompatibilidades várias, nomeadamente ao nível dos equipamentos. A televisão era o meio onde a necessidade de um novo sistema era mais premente, também devido ao que se convencionou chamar o apagão do sinal analógico. Não podíamos ficar, de um momento para o outro, sem medição de audiências. Briefing | A televisão é também o meio onde há mais investimento publicitário… EB | É verdade. O investimento www.briefing.pt
“A nós, anunciantes, interessa que haja contrapartida para o dinheiro que investimos em publicidade e que essa contrapartida seja mensurável. As audiências são a medida da eficácia da comunicação”
“A APAN não está disponível para ficar sem um canal que representa 20 por cento do investimento publicitário em televisão. É verdade que a RTP tem apenas metade do investimento das outras duas estações, mas retirar 20 por cento da oferta em televisão significa que o preço vai aumentar 20 por cento”
publicitário em televisão ronda os 55 por cento, 49 por cento nos canais de sinal aberto e à volta de cinco por cento no cabo. Só por isso seria sempre importante… Há uma penetração crescente do cabo, mas é preciso ver que também há um grande consumo de canais generalistas através do cabo. Há um trabalho muito bem feito das televisões em sinal aberto, com a criação de conteúdos que dizem muito aos portugueses e que acabam por atrair audiências. O investimento no cabo tem crescido mas ainda é residual. É natural que cresça mais uns pontos percentuais, mas não é expectável que nos próximos anos a pay tv tenha capacidade para igualar a televisão de sinal aberto. Não obstante, há realidades a acompanhar. A televisão over the top, por exemplo, é um fenómeno recente, acaba por ser uma fusão entre Internet e televisão, que começa a ter uma adesão com algum interesse entre as camadas mais jovens.
“Quem não está presente no consumidor é esquecido. É muito ingrato”
Briefing | A anunciada privatização da RTP terá certamente impacto no mercado publicitário. Qual é a posição da APAN a este respeito? EB | A APAN não está disponível para ficar sem um canal que representa 20 por cento do investimento publicitário em televisão. É verdade que a RTP tem apenas metade do investimento das outras duas estações, que representam 40 por cento cada, mas retirar 20 por cento da oferta em televisão significa que o preço vai aumentar 20 por cento. E isso está nos antípodas do que defendemos, queremos é que o preço da publicidade baixe, não que aumente. Não sabemos quantos canais são precisos para o serviço público, nem se é sequer preciso algum, o que não aceitamos é que reduzam as possibilidades de chegarmos aos consumidores, ou seja, que >>> Outubro de 2011
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Entrevista
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não reduzam a oferta em sinal aberto. Pessoalmente, em relação à RTP, defendo que a rentabilidade passada não é garantia de rentabilidade futura e que a gestão do Estado não tem sido brilhante. Somos nós que a estamos a financiar e devia haver uma maior parcimónia na gestão do dinheiro dos contribuintes. Briefing | Voltando às audiências, a APAN defende que sejam medidas também no outdoor. Qual o peso deste meio no investimento? EB | Estamos, de facto, a tra-
“O que acontece é que tem havido uma quebra no preço, não tanto em quantidade. E esta tendência vai atravessar todos os meios: vai haver menos orçamento para anunciar, o que obrigará a um ajuste do mercado”
balhar com grande empenhamento para que se comece a fazer medição de audiências de outdoors. Continuam a ser o segundo meio com maior atracção de investimento, representando à volta de 14 por cento. Já temos dito que, em matéria de comunicação e audiovisuais, Portugal não tem de ficar atrás de país nenhum no mundo, somos uma referência, por exemplo, no cabo e na banda larga, mas não se percebe que os outdoors nunca tenham sido medidos, que não tenha-
mos um sistema que seja referencial nesta matéria. Briefing | A Internet é um dos meios que mais cresce. Qual é a vossa percepção? EB | É um meio para o qual estamos a olhar com muita atenção. Cresceu claramente nos últimos meios, cresceu mais rapidamente do que o cabo. Estamos nos 5,6 por cento. E estou convencido de que se houvesse possibilidade de medir de forma diferente as audiências na Internet teríamos ainda mais capacidade de atrair
PERFIL
Atento aos anúncios Eduardo Branco gosta de anúncios. É um consumidor atento à publicidade, gosta de ver uma boa fotografia num outdoor, de ser surpreendido por uma ideia criativa, de se divertir com um anúncio. Mas a publicidade não o faz ceder à tentação da compra por impulso: reconhece à publicidade o efeito “interessantíssimo de aumentar a atenção sobre os produtos”, mas só consome depois de obter mais informação, tipicamente pela Internet. A publicidade é uma realidade que conhece bem, por via de um
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percurso profissional muito construído em áreas comerciais. Esteve 13 anos na TAP, os últimos quatro como director geral comercial. Daí transitou (em 2001) para a Portugal Telecom, primeiro para a PT Sistemas de Informação e, nos últimos três anos, para a administração da PT Compras. Preside desde Março último à Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN), que, com 70 associados, representa cerca de 75 por cento do investimento publicitário em Portugal.
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investimento. Mas ainda temos muito que aprender a respeito de medir audiências nos diversos suportes digitais. O contacto até é mais objectivo, mas é mais difícil avaliar a geração de resultados, ou seja, até que ponto o contacto originou uma retenção da marca. Briefing | Com o crescimento do cabo e da Internet, diria que a imprensa acaba por ser relegada para segundo plano? EB | Há uma queda do investimento publicitário na imprensa, mas não é uma queda igual. Os diários, mais generalistas, acabam por ter um share inferior aos não diários, que constituem um veículo privilegiado para atrair determinados nichos de mercado. Os diários também sofrem uma maior concorrência dos outros meios. O que
“É preciso regressar ao consumo. Muitas vezes, esquecemo-nos de que o Produto Interno Bruto (PIB) tem uma grande dependência do consumo das famílias, não são apenas as obras públicas. Se o consumo das famílias se afunda é um problema”
acontece é que tem havido uma quebra no preço, não tanto em quantidade. E esta tendência vai atravessar todos os meios: vai haver menos orçamento para anunciar, o que obrigará a um ajuste do mercado. Briefing | Fala-se sempre pouco na rádio. Que prioridade lhe atribuem? EB | A rádio continua a ser uma aposta forte das empresas, por ser um meio que lhes permite chegar rapidamente junto dos segmentos-alvo. Há, aliás, determinados sectores que apostam muito na rádio, embora, como não há imagem, obrigue a outra criatividade. Não vejo que seja uma aposta a mudar: é espantoso como o investimento se tem mantido estável e actualmente responde por cerca de sete por cento do total. >>>
“Ainda temos muito que aprender a respeito de medir audiências nos diversos suportes digitais”
Entrevista
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“Achamos importantíssimo que haja ligações fortes entre as empresas e as agências”
Briefing | Voltando aos prémios. Para que a publicidade seja mesmo efectiva, gerando resultados, é preciso uma grande sintonia entre anunciantes e agências. EB | A eficácia resulta de um todo. Tem de haver um grande envolvimento entre as equipas da empresa anunciante, da agência de meios e da agência de publicidade, é isso que faz a diferença. Achamos importantíssimo que haja ligações fortes entre as empresas e as agências, defendendo que essa capacidade de interacção deve ser potenciada. Quando isso não acontece, tem de se fazer uma mudança para obter resultados diferentes. Mal comparado, é como um casamento: às vezes acaba mesmo. Aliás, a APAN pôs recentemente à disposição dos associados um novo serviço que os ajuda, de forma muito segura, a identificar os parceiros certos na comunicação. Reunimos os melhores profissionais e oferecemos um preço muito competitivo: é um serviço isento com o selo de garantia da APAN. E decidimos criar este serviço porque consideramos que a escolha da agência de publicidade é um momento decisivo na vida de uma empresa. Briefing | Em tempo de crise, como se devem comportar os anunciantes? EB | Vão ter de anunciar mais. É preciso regressar ao consumo. Muitas vezes, esquecemonos de que o Produto Interno Bruto (PIB) tem uma grande dependência do consumo das famílias, não são apenas as obras públicas. Se o consumo das famílias se afunda é um problema. Mas, num ambiente difícil, só se conseguem mover as famílias a consumir apelando aos valores da marca, à emoção que esses valores conseguem gerar. As pessoas procuram a felicidade, não vivem para contar um dia atrás do outro. Há pequenas coisas que lhes dão prazer e as marcas têm essa capacidade. É
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“Num ambiente difícil, só se conseguem mover as famílias a consumir apelando aos valores da marca, à emoção que esses valores conseguem gerar”
“As pessoas procuram a felicidade, não vivem para contar um dia atrás do outro. Há pequenas coisas que lhes dão prazer e as marcas têm essa capacidade”
importante que consigam comunicar o prazer. É óbvio que tem de se aforrar, que tem de se aprender com os erros do passado, mas não pode haver retracção do consumo. Briefing | Mas se os orçamentos são mais curtos… EB | A quadratura do círculo é sermos mais eficientes, ou seja, conseguirmos fazer mais com menos. Há uma grande pressão sobre os meios para baixar os preços, o que é uma tendência normal numa economia que está com dificuldade. Se me pergunta se há cortes nos orçamentos, a resposta objectiva é sim. Mas a perspectiva dos anunciantes é de não querer menos exposição. Não se pode deixar de anunciar, vai é ter de ser mais barato. Esse é o desafio, mas anunciar é mais importante do que nunca. Briefing | Os associados da APAN comungam desta perspectiva? EB | As sensibilidades que recolhemos indicam que, neste momento, ninguém está disponível para pagar o mesmo do que há três anos e anunciar menos. Mas se isso acontecer, tenho muito receio dos efeitos. Quem não está presente no consumidor é esquecido. É muito ingrato. Uma marca pode estar a anunciar durante imenso tempo e ter uma notoriedade fantástica, mas se está fora do mercado durante algum tempo deita tudo a perder. Até porque há outro factor: uma campanha hoje dura uma semana, já não dura anos, como aquela das canetas bic, que todos conhecemos e acompanhou várias gerações. Hoje o mercado é mais competitivo, o consumidor mais exigente. Além disso, a forma de fazer publicidade tem vindo a sofrer alterações significativas. Estimo que nos próximos tempos se evolua no sentido de sponsoring dos conteúdos, que é uma nova descoberta proporcionada pela televisão em diferido e que vai responder a novos dewww.briefing.pt
safios. Tenho muita curiosidade em acompanhar este fenómeno com a nova medição de audiências. São novas formas de chegar ao consumidor. O que interessa é ser bem sucedido. Conheço imensos bons produtos que não tiveram sucesso porque não chegaram a tempo ou da melhor forma ao consumidor. Voltamos à questão da eficácia da comunicação. Briefing | E voltamos aos prémios. Qual é a repercussão para os anunciantes? EB | É bom para todos. Para as agências de publicidade que fizeram as campanhas, para os meios que as veicularam, para os anunciantes que surgem aos olhos do grande público como uma empresa competente. E para o consumidor. Porque estou convenci-
“Como diz um amigo meu, ‘quando há crise há sempre os que choram e os que vendem lenços’ e nós queremos estar do lado dos que vendem lenços”
do de que o consumidor gosta de casos de sucesso. Briefing | Para quando a recuperação do sector? EB | O próximo ano vai ser para suster a respiração. Vai ser preciso coragem para continuar a anunciar, mas também vai ser mais desafiante estimular o mercado. As pessoas não gostam de viver em crise e precisam de alguns escapes. É com base nesses escapes que se vai continuar a construir o novo futuro, vai ter de ser com adesão do grande consumo a par e passo com uma nova realidade em termos de custos e de padrões de consumo. Como diz um amigo meu, “quando há crise há sempre os que choram e os que vendem lenços” e nós queremos estar do lado dos que vendem lenços.
“O próximo ano vai ser para suster a respiração. Vai ser preciso coragem para continuar a anunciar”