Entrevista a Paulo Rosado

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Filipe Santa Bárbara jornalista

“Aquilo que a OutSystems tem para prometer, para já, é uma quantidade absolutamente descomunal de inovações que vão sendo periodicamente lançadas. Prometemos aos nossos clientes aumentos de produtividade constantes”, diz Paulo Rosado, ceo da Outsystems, defensor do empreendedorismo, da internacionalização e de falências rápidas das empresas moribundas

Paulo Rosado, ceo da Outsystems

Ramon de Melo

“Prometemos inovações”

Fibra | Como é que surgiu a OutSystems? Paulo Rosado | Nós tínhamos um problema grande para resolver: a falta de produtividade e eficiência dos departamentos de informática. Eu já tinha tido, juntamente com outros colegas, uma empresa em 1997, e uma das coisas que reparámos que acontecia foi que os primeiros projectos de internet 6

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que se faziam tinham um grau de falhanço altíssimo. Nunca eram entregues, nem a horas, nem com o dinheiro que se tinha pedido inicialmente. Quando tentámos resolver esse problema, chegámos à conclusão que era insolúvel resolvê-lo de uma maneira normal. Em 2001, resolvemos fazer uma empresa, lançar um produto que olhava para este problema de uma

maneira completamente nova. Ao invés de assumir que os sistemas têm de ser feitos bem à primeira, era uma plataforma que permitia corrigir com um custo muito baixo. Portanto, assumia que o sistema estava errado e que depois se conseguia corrigir. A Agile Platform, no fundo, nasce um bocado desse conceito, por isso é que na altura aparece como um produto O novo agregador das comunicações


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muito expedito. Ao mesmo tempo nós tínhamos ingenuamente assumido que a cloud, que na altura não se chamava cloud, ia disparar em 2003. Então criámos na plataforma com uma arquitectura pronta para esta noção de que toda a operação é feita remotamente e que os servers estão todos remotos. Daí até o nome: OutSystems – sistemas que estão out.

“A internacionalização nasceu logo no dia 1. O mercado português é um mercado muito pequeno. Uma das coisas que se deve fazer é criar a empresa logo com a estrutura toda para se internacionalizar”

Fibra | Qual é a vossa proposta para as empresas? PR | Quando as empresas querem montar um call center, portais, aplicações online, extranets e intranets, workflows empresariais que ligam nove departamentos, por exemplo, todas estas aplicações têm uma característica comum: estão constantemente a ser alteradas. Há necessidades constantes de negócio que fazem com que elas estejam em constante mutação. A nossa plataforma o que permite é desenvolver muito rápido. Mas depois, mais importante do que isto é que nós conseguimos gerir o ciclo todo de vida dessas aplicações de modo a que elas possam ser alteradas muito rapidamente com custos muito baixos. Fibra | A OutSystems tem outras plataformas para além da Agile? PR | Nós somos monoproduto. Isto é uma plataforma que está actualmente implementada em 22 indústrias. Portanto, é uma abrangência extraordinariamente grande: o nosso modelo aqui é um foco muito grande em escala. Fibra | Estão também na Holanda e nos Estados Unidos. Como surgiu a internacionalização? PR | A internacionalização nasceu logo no dia 1. O mercado português é um mercado muito pequeno. Uma das coisas que se deve fazer é criar a empresa logo com a estrutura toda para se internacionalizar. Isto obriga a criar, logo desde raíz, DNA e estruturas que permitam muito facilmente poder escalar a empresa para fora. O novo agregador das comunicações

“É muito difícil ser um empreendedor. Criar uma empresa em Portugal é terrivelmente complicado. Quando dizem “vamos fomentar a inovação e o empreendedorismo”, a única coisa que se pode tirar daqui é a frase “fomentar a inovação” porque na realidade não se faz nada de concreto”

Fibra | Porquê escolher a Holanda e os Estados Unidos? Qual foi a estratégia? PR | A Holanda, sinceramente, foi uma anomalia. Acabou por estar relacionado com o nosso primeiro investidor, que era holandês. Havia uma rede de contactos do investidor e começámos por aí. Nos Estados Unidos, tem que ver com o facto de a nossa plataforma ser uma plataforma de aceleração brutal de produtividade. Funciona muito bem em regiões onde o custo do IT seja muito alto, que é o caso dos países ocidentais. Os Estados Unidos têm uma vantagem: são a maior economia ao nível de alta tecnologia do mundo. Fazia sentido nós irmos para um país que tivesse uma escala muito grande. Fibra | Lançaram há pouco tempo a nova versão. O que é que traz de novo? PR | Uma das coisas que traz de novo é o suporte para dispositivos móveis. Este é o ano do iPad, o ano passado foi o ano do iPhone e do Android, e portanto nós nesta altura lançámos uma versão que permite fazer um portal ou mobilizar um site em dois/três dias, no máximo. Uma coisa extraordinariamente rápida e altamente produtiva. Depois, continuámos com o nosso catálogo de aplicações já embebido com a plataforma. Lançámos na 6.0 também o suporte nativo da plataforma em cima da cloud, sendo que permitimos nesta altura, em questões de horas, um ambiente pronto a funcionar através da rede.

“As pessoas falam muito das coisas mas, um dos grandes problemas de Portugal é o facto de não haver, do ponto de vista legislativo e de controlo, um processo tão draconiano de pagamento entre as empresas como o Estado exige dos seus contribuintes”

Fibra | Foram apontados várias vezes, nacional e internacionalmente, como uma empresa promissora. O que é que ainda têm para prometer? PR | Nós, embora do ponto de vista nacional sejamos realmente um dos bons exemplos de como as coisas se podem desenvolver, ainda temos muito para andar. O mundo está muito pouco explorado do ponto de vista da OutSystems. Aquilo que a OutSystems tem para prometer, para já, é uma

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quantidade absolutamente descomunal de inovações que vão sendo periodicamente lançadas. Prometemos aos nossos clientes aumentos de produtividade constantes. E depois é a escala, ou seja, é basicamente crescer.

“Não se consegue contratar muito facilmente porque também não se consegue despedir facilmente”

Fibra | Sabemos que é um entusiasta do empreendedorismo. Acha que há pouco no nosso país? PR | Eu acho é que há poucas empresas. Acho que o povo português, em termos de estrutura ou de apetência, é um povo empreendedor. Ao contrário do que muita gente diz, é um povo que até arrisca. Mas há limites! Se pensar que um empreendedor não tem direito a subsídio de desemprego, se for despedido, ou seja se tiver de fechar a empresa… Não pode despedir ninguém, tem de ser ele e depois, para se conseguir safar, tem de criar o tal trabalho precário, que é o recibo verde. Não se consegue contratar muito facilmente porque também não se consegue despedir facilmente. Tem uma taxa absolutamente descomunal em termos de segurança social, portanto, o dinheiro esvai-se todo para as pessoas que tem e que também não consegue despedir. E depois, trabalha basi-

“As empresas que não têm dinheiro vão à falência, que é outra coisa que nós precisamos desesperadamente: falências rápidas! Uma empresa que não vá à falência rapidamente, é moribunda, vai consumindo dinheiro, vai-se arrastando e não paga a ninguém”

camente dentro de uma economia que não compra. É muito difícil ser um empreendedor. Criar uma empresa em Portugal é terrivelmente complicado. Quando dizem “vamos fomentar a inovação e o empreendedorismo”, a única coisa que se pode tirar daqui é a frase “fomentar a inovação” porque na realidade não se faz nada de concreto. Fibra | E concreto seria… PR | É muito simples. Seria, em primeiro lugar, reduzir o risco ou, pelo menos, equiparar o risco de ser trabalhador por conta de outrém ou trabalhar por conta própria, ou seja, em termos de regalias. Em segundo lugar, ter um país em que as empresas pagam umas às outras a tempo e horas. Este é um dos grandes dilemas de Portugal. As pessoas falam muito das coisas, mas um dos grandes problemas de Portugal é o facto de não haver, do ponto de vista legislativo e de controlo, um processo tão draconiano de pagamento entre as empresas como o Estado exige dos seus contribuintes. Havendo o dinheiro a fluir entre as empresas, que não existe, elas devem ser obrigadas a pagar, por exemplo, em 30 dias. As empresas que não têm

PERFIL

Do Alentejo a Sillicon Valley Alentejano, natural de Évora, fez a sua formação base em Engenharia Informática na Universidade Nova de Lisboa. Depois disso, passou 20 meses na Força Aérea e descreve esse período como uma “bela experiência”. Ainda em termos académicos, foi para os Estados Unidos e fez um mestrado em Stanford tendo ficado a trabalhar no Sillicon Valley durante alguns anos. A veia de empreendedor começou em 1997 quando funda uma empresa de informática com os amigos e, desde então, considera-se um entusiasta do empreendedorismo. Nos “muito poucos tempos livres” que tem, gosta de ler artigos ou livros de gestão e técnicos. Para além disso e do tempo dedicado à família,

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gosta também de nadar e de ciclismo. Nasceu no Alentejo e acredita que os alentejanos dão excelentes empreendedores. Comenta que quando veio para Lisboa estudar, veio também um grupo grande e que “as pessoas achavam estranho e não percebiam como eram tão activos”. Confessa que nunca se relacionou com o estereótipo de “alentejano mole” e que não o relaciona às gentes do Alentejo no geral: “É muito difícil chamar mole àquelas pessoas!”, refere. No que diz respeito a gadgets, tem um laptop pequeno, um iPad e um iPhone. No entanto, dá ainda pouca utilização ao iPad - “essencialmente uso o iPhone”, conclui.

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“É muito melhor ter uma boa pessoa do que uma boa ideia. E portanto nós temos a máxima de que as melhores pessoas do mundo criam uma empresa impossível de bater”

dinheiro vão à falência, que é outra coisa que nós precisamos desesperadamente: falências rápidas! Uma empresa que não vá à falência rapidamente, é moribunda, vai consumindo dinheiro, vai-se arrastando e não paga a ninguém. Eventualmente engorda, deixa depois uma porção de gente na rua e, no entretanto, comeu uma porção altamente relevante da economia. É como se fossem toxinas dentro do corpo, estas empresas escavacam completamente a economia. Esta é outra das falácias portuguesas: falências é uma coisa má! Não, falências é uma coisa boa… É como depurar o corpo. Isto controla-se obrigando toda a gente a pagar a tempo e horas. E depois a lei laboral: por exemplo, é absolutamente disparatado O novo agregador das comunicações

“Temos parcerias também do ponto de vista de apoio a algumas cadeiras e alguns dos métodos que nós utilizamos aqui internamente passamo-los também para as universidades”

que uma pessoa que tenha um ordenado anual de 65 mil euros tenha regalias semelhantes às que tem um desgraçado que recebe 600 euros [por mês]. Quem ganha mais de 65 mil euros, normalmente, são os managers. Os managers, se forem incompetentes, fazem um mal terrível às empresas e às economias todas que estão à roda. Têm de ser despedidos de um dia para o outro, tem de ser possível fazer isso. Portanto, tudo coisas completamente impopulares e que dariam cabo do governo, mas que são fundamentais. Fibra | A OutSystems tem alguma ligação às universidades? PR | Nós temos parcerias com algumas universidades ao nível de áreas de ponta em termos de investigação. Temos parcerias também do ponto

de vista de apoio a algumas cadeiras e alguns dos métodos que nós utilizamos aqui internamente passamo-los também para as universidades. Fibra | Essas relações com as universidades também funcionam numa óptica de recrutamento? PR | Sim. É muito melhor ter uma boa pessoa do que uma boa ideia. E, portanto, nós temos a máxima de que as melhores pessoas do mundo criam uma empresa impossível de bater. Portanto, nós temos um processo de recrutamento, de atracção e de filtragem de talento muito sofisticado em que o nosso objectivo é termos as melhores pessoas do mundo. Em Portugal temos uma massa muito grande, podemos ir buscar as melhores pessoas às universidades e a outras empresas. Agosto de 2011

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