In house com muito gosto

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Testemunho

Nuno Moraes Bastos, 35 anos, é um advogado in house convicto. Já trabalhou em sociedades de advogados, mas regressar não está nos seus planos. Aprecia a polivalência e a proximidade com o negócio. Como director jurídico da seguradora Zurich, onde está desde Maio, a simplificação e a criatividade são as suas armas

Ramon de Melo

In house com muito gosto

Nuno Moraes Bastos é director jurídico da Zurich desde Maio. Uma experiência curta, mas “muito intensa”. E a intensidade advém do facto de não haver dois dias iguais: “Aqui não há o repeat a deal, como se diz em jargão. Há sempre projectos a decorrer, sempre necessidades a ser satisfeitas e eu valorizo imenso isso. É o facto de não me repetir que me permite aprender”. Este não é o primeiro contacto de Nuno com o sector segurador. Licenciado pela Universidade Católica de Lisboa, estagiou na Coelho, Ri18

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beiro & Associados, uma sociedade com muito enfoque na arbitragem, na propriedade industrial e no Direito informático onde teve a possibilidade de “fazer um pouco de tudo”. Um ano depois de concluído o estágio, trocou a sociedade do antigo bastonário da Ordem dos Advogados pela então Simmons & Simmons Rebelo de Sousa. E foi durante os três anos que lá trabalhou que tomou conhecimento com o enquadramento jurídico das seguradoras: “Tinha duas ou três de estimação, com as quais trabalhava muito”, sobretudo no ramo

vida, mas também produtos de investimento e fundos de pensões. Não é, contudo, a mesma coisa: são dois lados de uma mesma realidade, mas não se confundem. “Estar por dentro da máquina é completamente diferente. A proximidade com o negócio é maior, por oposição a um conhecimento mais abstracto do negócio”, argumenta. São duas maneiras diferentes de resolver o problema a um cliente que é o mesmo, só que a proximidade evita os erros de resposta por aproximação”. Ainda assim, ter estado do lado da

assessoria externa foi importante, proporcionou-lhe bagagem e conhecimento do mercado que, de outra forma, não teria. “Somos o que vamos fazendo ao longo do tempo”, comenta. A proximidade ao cliente é real, não apenas um princípio: em Maio, quando entrou para a seguradora suíça que está em Portugal desde 1918, Nuno Moraes Bastos dedicou-se a tomar o pulso à empresa – fez-se à estrada para conhecer pessoalmente a rede de agentes e auscultar as necessidades por eles sentidas. É O agregador da advocacia


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que são eles os ouvidos do cliente final, o consumidor. Ainda é um “namoro” que está no princípio, mas o advogado identificou desde logo a necessidade de simplificação. E essa é, juntamente com a criatividade, a sua preocupação. Ser criativo quando se é director jurídico de uma empresa enquadrada num sector tão regulado como o dos seguros passa por experimentar todas as vias até encontrar uma que seja realizável, a mais apropriada para o negócio. A regulação coexiste com a diversidade dos ramos do Direito que condicionam os seguros. “Não há área em que não toque, do Direito Administrativo ao Fiscal, passando pelo Civil e pelo Financeiro”. Uma polivalência que agrada a Nuno Moraes Bastos: “É muito aliciante”. É um facto que contraria a tendência para a especialização dos advogados, mas o director jurídico da Zurich escolheu precisamente não fazer…escolhas. “Gosto de variar. E felizmente isso foi-me permitido”, justifica. Não é apenas um advogado de gabinete. Não abdica de fazer contencioso, de que gosta: “Tenho sempre a toga no meu gabinete”. Nos poucos meses que leva na seguradora ainda não foi a tribunal, mas irá “seguramente”. Em tribunal, está-se “literalmente sem rede”, o que “é bom para o raciocínio, porque obriga a pensar de forma diferente”. De fora fica a litigiosidade relacionada com os sinistros: para essa há um departamento próprio. Antes de ingressar na Zurich, esteve num banco de investimentos, uma actividade que não é muito distante da seguradora, já que ambas têm as finanças como denominador comum e ambas são muito reguladas. Desde a Simmons que Nuno se mantém como advogado interno e não trocava: “Tive alguma dúvida no início, mas agora nem por um segundo me arrependo”. Foi quando aprendeu a comunicar por excel que passou a gostar verdadeiramente de ser in house. Pode não se perceber de imediato, mas a explicação é simples: “Às vezes é muito mais fácil explicar uma questão, fiscal por exemplo, numa folha excel, apresentando as diferenO agregador da advocacia

Ser criativo quando se é director jurídico de uma empresa enquadrada num sector tão regulado como o dos seguros passa por experimentar todas as vias até encontrar uma que seja realizável, a mais apropriada para o negócio

tes alternativas de uma mesma transacção e fazendo logo os cálculos, do que escrever memorandos muito formais com páginas a explicar cenário atrás de cenário e as respectivas normas de incidência… É muito mais directo”. O gosto pela consultoria interna leva-o a recusar qualquer abordagem que mostre o advogado in house como um mero gestor de avenças: “Advogado é advogado. É suposto saber o que faz, gerir o risco e providenciar soluções”. A única diferença que admite é na adaptação da linguagem, na medida em que a perspectiva que se tem de uma empresa enquanto consultor externo é muito diferente da que se ganha com a integração no negócio. “Há menos filtros. O cliente interno quer uma solução objectiva”. Do mesmo modo, afasta os receios de perda de independência técnica: “Nunca a senti tolhida em nenhum lado por onde passei. Sempre fui encorajado a pensar”. Único advogado na família e advogado por opção alimentada desde a infância – “Já queria ser advogado antes de saber o que os advogados faziam” – Nuno Moraes Bastos afirma, sem hesitar, que não trocava o in house para voltar a uma sociedade – “Garantidamente. É aqui que me realizo”.

“Estar por dentro da máquina é completamente diferente. A proximidade com o negócio é maior, por oposição a um conhecimento mais abstracto do negócio”

PERFIL

Um prazer em terra, outro no mar Nuno Moraes Bastos é um claro adepto da prática desportiva, mas nenhum desporto lhe conquistou ainda a exclusividade do gosto. Aos 35 anos, é entre o golfe e a vela que divide os tempos livres – se o tempo o permite, caso contrário rende-se à leitura. Entre um desporto individual e outro completamente colectivo, não escolhe: o importante – afirma – é fazer o que dá gozo. Do golfe retira o prazer de se superar, da vela a adrenalina da competição. Tacadas só quando o amor-próprio permite – é o que diz para justificar que não tem “grande jeito”. A maior dificuldade surge no jogo curto, ou seja, quando é

preciso acertar no buraco. Num campo de 18, o seu preferido é o 19… o convívio com os amigos. É também com amigos que veleja, ultimamente como amador mas até há uns dois, três anos como federado. Dos resultados comenta que o melhor que obteve foi ficar em nono no campeonato nacional. Bom? Eram nove concorrentes… “Os marinheiros eram do melhor, o material é que nos atraiçoou, o nosso barco era claramente o mais antigo”. Não importa, porém, porque o fundamental é “fazer o que dá gozo” e a vela proporciona um “prazer indiscritível”.

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