www.advocatus.pt
Debate
Não basta reformar Mais do que simplesmente se pretender agilizar, simplificar e descongestionar, exige-se que o legislador tenha, acima de tudo, uma visão do que quer para a Justiça – ganha a Justiça – e que seja sensato na forma como introduz as alterações – ganhamos todos Vivemos num mundo perversamente (des)organizado e numa época de tensão económica e social. Se a isto adicionarmos a “condição” mediterrânea de ferozes litigantes – em que os problemas só podem ser resolvidos em tribunal –, apercebemo-nos da nossa natural propensão para os conflitos e da tendência para o respectivo aumento. Os tribunais, em especial as normas processuais civis, têm de estar preparados para responder a este desafio. Este cenário, porém, não é de agora. Já em 1998, com a aprovação do regime dos procedimentos para o cumprimento de obrigações pecuniárias, se falava em excesso de litigiosidade, do perigo de os tribunais se converterem em extensões de empresas e da “funcionalização dos magistrados, que gastam o seu tempo e as suas aptidões técnicas na prolação mecânica de despachos e de sentenças”. Ora, em face da incapacidade do poder judicial em resolver esta tendência, a solução tem passado pela intervenção do poder legislativo. Em vão. As intervenções legislativas têm-se mostrado ineficazes, não só pela forma improvisada e retalhista como têm sido realizadas, como também pela necessidade de novos enquadramentos legais. Não advogamos, ainda assim, um corte radical com o passado. Tudo não se faz do nada. Mas, se nada for feito, com nada ficaremos! Tal qual estão, as regras processuais mostram-se desajustadas e desactualizadas. Devem ser alteradas. Mas, com a devida ponderação e cautela, fruto de um esforço colectivo e 36
Julho de 2011
“As intervenções legislativas têm-se mostrado ineficazes, não só pela forma improvisada e retalhista como têm sido realizadas, como também pela necessidade de novos enquadramentos legais”
“O problema maior de todos está identificado: a acção executiva. Há dívidas que nunca deveriam ter existido, porque era evidente que não havia capacidade para suportar o crédito e dívidas há que não vale a pena executar, porque é evidente a ausência de bens. Contudo, umas e outras continuam a ser executadas”
participativo de todos os administradores da Justiça e nunca por pressão política ou, pior ainda, por mera resposta mediática. O problema maior de todos está identificado: a acção executiva. Há dívidas que nunca deveriam ter existido, porque era evidente que não havia capacidade para suportar o crédito e dívidas há que não vale a pena executar, porque é evidente a ausência de bens. Contudo, umas e outras continuam a ser executadas. Assim, mais do que um novo paradigma, o legislador deveria atacar este problema, quer a montante – regulando de forma efectiva a concessão de crédito –, quer a jusante – admitindo a emissão das certidões de incobrabilidade sem recurso à via judicial quando esta se mostrar inconsequente e desnecessária. Além disso, é necessário introduzir alterações na tramitação declarativa, simplificando procedimentos, sem olvidar, nunca, os princípios processuais basilares, com especial relevo, o do contraditório. Desde logo, importa responsabilizar os juízes pela condução do processo, designadamente atribuindo-lhes um maior poder de gestão processual e admitindo, como regra, o despacho liminar (exceptuando-se, sempre, os casos em que é requerida a citação urgente), com vista a um de três despachos: rejeição liminar, convite ao aperfeiçoamento ou citação. Depois, importa revalorizar a audiência preliminar, limitar o recurso à prova testemunhal e introduzir a gravação do som e imagem, permitindo-se reforçar o recurso da matéria de facto. Não basta, por isto, reformar.
João Martins Costa Licenciado em Direito pela Universidade do Porto, em 2003, tem uma pós-graduação em Direito das Autarquias Locais e Urbanismo, pela mesma instituição, e outra em Regulação Pública e Concorrência, pela Universidade de Coimbra. É advogado da JPAB
Mais do que simplesmente se pretender agilizar, simplificar e descongestionar, exige-se que o legislador tenha, acima de tudo, uma visão do que quer para a Justiça – ganha a Justiça – e que seja sensato na forma como introduz as alterações – ganhamos todos! O agregador da advocacia