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Privatizemos, então Já que não podemos escolher o que privatizamos e quando privatizamos, que escolhamos ao menos com maior liberdade a forma como a privatização deve ser feita e, sobretudo, que o governo tenha liberdade para actuar em termos de maximização dos activos que vão ser alienados Há momentos em que as coisas são mesmo assim. Logo quando o ímpeto privatizador dos Governos da República dos anos 90 tinha refreado e se ia gerando algum consenso sobre um conjunto de activos públicos não privatizáveis, dificilmente privatizáveis ou, noutros casos, lentamente privatizáveis, surge uma súbita aceleração da história com o Memorando assinado pelo Governo Português com o FMI, BCE e Comissão Europeia. Vamos privatizar e vamos fazê-lo rápida e generalizadamente, numa sequência de processos, ao longo dos próximos meses, quase sem precedentes na nossa história recente. As razões para o fazermos são, por coincidência, aquelas que, na segunda metade da década de 80 e na década de 90, justificaram os processos de então - redução da intervenção do Estado na economia, crescimento da produtividade por passagem de meios de produção para a iniciativa privada, aumento da competitividade das empresas e, sobretudo, arrecadação de receita para amortização da dívida pública e da dívida do sector empresarial do Estado. A grande diferença, no entanto, é que antes a opção sobre o que privatizar, e quando, correspondia a uma esfera de liberdade política de cada governo e, agora, corresponde a uma mera tarefa administrativa de execução – o calendário está definido e o jogo, com o relato traçado, está prestes a iniciar-se; a liberdade transformou-se em estado de necessidade. Dir-se-á assim que este é, certamente, o pior momento das últimas décadas para alienar vários dos activos que constam do memorando; mas assim se fará, por razões que nada têm que ver com a política de priO agregador da advocacia
“Antes a opção sobre o que privatizar, e quando, correspondia a uma esfera de liberdade política de cada governo e, agora, corresponde a uma mera tarefa administrativa de execução – o calendário está definido e o jogo, com o relato traçado, está prestes a iniciar-se”
“Os procedimentos deveriam ser mais abertos e flexíveis, sem a preferência pelo concurso público, oferta na bolsa de valores ou subscrição pública que, sendo justificáveis na década de 90, são agora empecilhos que podem ser sinónimo de perda de valor para o Estado”
vatizações, mas apenas com os mecanismos de controlo da nossa dívida externa. Dores de quem teve demasiada festa. Vamos, por isso, retomar os procedimentos da Lei nº 11/90, mais conhecida como Lei-quadro das Privatizações, sobre a qual tanto se trabalhou até há algum tempo. E vale, por isso, a pena pensar se aquilo que se definiu em 1990 como devendo corresponder ao enquadramento de qualquer privatização não deveria agora ser revisto. Acredito que sim e só a urgência de avançar fará com que não olhemos para isso. O mundo mudou dramaticamente de 1990 até agora e Portugal, já se sabe, também. Não parece, por isso, ter qualquer sentido falar no reforço da capacidade empresarial nacional, na necessidade de ampla participação dos cidadãos portugueses na titularidade do capital das empresas ou na preservação dos interesses patrimoniais do Estado e valorização de outros interesses nacionais como objectivos das privatizações que aí vêm – o que se quer é maximização da receita sem comprometer, tanto quanto possível, outros objectivos estratégicos nacionais. Da mesma maneira, deveríamos ter processos mais rápidos, desformalizados e expeditos, sem o peso dos procedimentos típicos dos anos 90. Por fim, os procedimentos deveriam ser mais abertos e flexíveis, sem a preferência pelo concurso público, oferta na bolsa de valores ou subscrição pública que, sendo justificáveis na década de 90, são agora empecilhos que podem ser sinónimo de perda de valor para o Estado – o recente concurso público para a privatização do BPN é um bom exemplo. Já que não podemos escolher o que privatiza-
Jorge Brito Pereira Sócio da PLMJ da Área de Prática de Corporate / M&A, Financeiro e Bancário, Mercado de Capitais. Desde 2004, regente da cadeira de Direito dos Valores Mobiliários, na Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa
mos e quando privatizamos, que escolhamos ao menos com maior liberdade a forma como a privatização deve ser feita e, sobretudo, que o governo tenha liberdade para actuar em termos de maximização do valor dos activos que vão ser alienados. Julho de 2011
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