Será que o Porto está afónico?

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Dois diários, um generalista (JN) e outro desportivo (O Jogo), um canal de televisão por cabo (Porto Canal) e um semanário (Grande Porto). O panorama da Comunicação Social com sede na segunda cidade do país esgota-se em duas linhas. As elites portuenses queixam-se da falta de quem lhes amplifique a sua voz, por forma a fazê-la ouvir 300 km a sul - e de quem elabore uma visão do mundo e das suas mudanças a partir do Porto

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Será que o Porto está afónico?

Há não muitos anos, conviviam no Porto três jornais diários de grande circulação. No entretanto, dois ficaram pelo caminho: O Comércio do Porto, que à data da sua morte era o mais antigo diário do país, e o Primeiro de Janeiro, um dos mais prestigiados títulos nacionais ao tempo de Manuel Pinto de Azevedo, um dos grandes empresários nortenhos de outrora que deu o primeiro emprego, na têxtil Efanor, a um jovem engenheiro chamado Belmiro que haveria que dar que falar neste pais. E o sobrevivente Jornal de Notícias (JN), do grupo Controlinveste (de Joaquim Oliveira, nascido em Penafiel) apesar de se manter pujante, perdeu a liderança para o Correio da Manhã, da Cofina, de Paulo Fer32

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No audiovisual, a primeira tentativa de fazer um canal regional baseado no Porto fracassou com mais prejuízo do que estrondo, disfarçado por a NTV se ter metamorfoseado em RTPN - em que o N deixou de responder por Norte e passou a significar Notícias

nandes, que, apesar de ser natural de Águeda e ter estudado no Porto, confidenciou a Manuel Queiroz: “Não vale a pena investir no Porto. O Porto está de rastos, não existe”. No audiovisual, a primeira tentativa de fazer um canal regional baseado no Porto fracassou com mais prejuízo do que estrondo, disfarçado por a NTV se ter metamorfoseado em RTPN - em que o N deixou de responder por Norte e passou a significar Notícias. No panorama da Comunicação Social portuense, ao respeitável JN e ao seu irmão mais novo O Jogo (diário desportivo habitualmente conotado com o FC Porto) vieram mais recentemente juntar-se o semanário Grande Porto, que integra a rede O novo agregador do marketing.


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“O Grande Porto consegue ter o seu próprio espaço e parece ter condições para ser um projecto bem sucedido, apesar de se basear ainda numa estrutura redactorial pequena”

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“O Porto Canal é um projecto heróico que, muitas vezes, por culpa dos próprios portuenses, não tem atingido os desígnios que lhe foram prometido”

Rui Moreira Presidente da Associação Comercial do Porto

de jornais regionais do grupo Lena (Sojormedia), e o Porto Canal (posição 13 no menu Zon), liderado pelo grupo espanhol Mediapro, que tem procurado, até agora sem sucesso, encontrar parceiros locais para consolidar e expandir o único canal com programação integralmente nacional. As elites portuenses queixamse de que a cidade e a região Norte sofrem de um défice de voz que se faça ouvir nos centros de decisão, opinião que merece a concordância do primeiro director do Grande Porto. “A questão das vozes do Porto não é de número, a meu ver. É de relação. E nessa relação o Porto perde hoje claramente para Lisboa, porque tudo parece estar em Lisboa ou a encaminhar-se para lá”, diz Manuel O novo agregador do marketing.

As elites portuenses queixam-se de que a cidade e a região Norte sofrem de um défice de voz que se faça ouvir nos centros de decisão

Queiroz, que também ele se encaminhou para a capital, onde está a dirigir interinamente o diário i. “Um jornal, nesta fase, deve ser um meio de combate. Como é que o Grande Porto foi uma voz própria? Entre muitas outras coisas, pôs a Regionalização outra vez na agenda, ajudou a que a Red Bull Air Race não se deslocalizasse para Lisboa, tem batalhado para que os fundos comunitários não caiam apenas no Vale do Tejo, que já é uma região desenvolvida segundo todos os indicadores”, acrescenta Queiroz. Rui Moreira, presidente da Associação Comercial do Porto, classifica o Porto Canal como “um projecto heróico que, muitas vezes, por culpa dos próprios portuenses, não

Manuel Carvalho Director adjunto do Público

tem atingido os desígnios que lhe foram prometidos” e lamenta que na atribuição de novos canais, “não se tenha conseguido um projecto que tivesse as suas raízes no Norte e que a RTPN seja RTP Notícias e não RTP Norte. “O Porto, não apenas enquanto cidade, mas também tendo em conta a região em que se insere e lidera, tem expressão para ter uma televisão própria, como tantas outras metrópoles europeias. O Porto Canal é uma prova disso mesmo, tem sobrevivido e terá a sua própria audiência, apesar de se dedicar mais à informação de natureza municipal”, concorda Manuel Carvalho, director adjunto do Público. Nascido em Espanha, onde as comunidades autonómicas têm todas Maio de 2010

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No panorama da Comunicação Social portuense, ao respeitável JN e ao seu irmão mais novo O Jogo vieram mais recentemente juntar-se o semanário Grande Porto, que integra a rede de jornais regionais do grupo Lena, e o Porto Canal, liderado pelo grupo espanhol Mediapro

vozes fortes, Juan Figueroa, director -geral do Porto Canal, não consegue compreender porque é que numa região como o Norte, mais concretamente na sua capital natural, o Porto, “onde se concentra uma grande parte do poder industrial e económico, e da capacidade criativa e artística nacional, não existam meios de comunicação locais/regionais fortes, capazes de dar a conhecer todos estes valores”. O presidente da Associação Comercial do Porto queixa-se do facto das notícias relevantes do Porto e dos seus protagonistas serem habitualmente colocadas em cadernos apenas lidos ao nível local. “O actual caderno Local do Público, em tempos extremamente influente, é, no presente, apenas um resíduo desse projecto”, acusa, acrescentando o Porto precisa de ter voz para a sua afirmação política, cultural e económica a nível nacional. Manuel Carvalho chama a atenção para o desinvestimento da aposta no Norte por parte de publicações como o Expresso e o Diário de Notícias, que chegaram a ter redacções significativas no Porto, e considera o semanário Grande Porto como o primeiro verdadeiro sinal de uma contra maré. “O Grande Porto consegue ter o seu próprio espaço e parece ter condições para ser um projecto bem sucedido, apesar de se basear ainda numa estrutura redactorial pequena”, concluiu o director adjunto do Público. 34

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Portugal sem Norte? No início de 2007, dizia-me o eng.º Paulo Fernandes: “Não vale a pena investir no Porto. O Porto está de rastos, não existe”. Vindas de alguém nascido para os lados de Águeda e que fez o seu curso universitário no Porto, e descontando o seu lado benfiquista, estas eram palavras duras do patrão da Cofina. O Porto ficou com apenas um jornal diário, verdadeiramente. Mas o grande “Jornal de Notícias” luta por uma liderança nacional e a sua agenda é compreensivelmente algo própria. Por isso nasceu o semanário Grande Porto, para ter uma agenda com outras prioridades, num momento em que o Porto e o Norte enfrentam momentos muito difíceis. Sem Porto e sem Norte não haverá Portugal. A questão das vozes do Porto não é de número, a meu ver. É de relação. E nessa relação o Porto perde hoje claramente para Lisboa, porque tudo parece estar em Lisboa ou a encaminhar-se para lá. E um jornal, nesta fase, deve ser um meio de combate. Como é que o Grande Porto foi uma voz própria? Entre muitas outras coisas, pôs a Regionalização outra vez na agenda, ajudou a que a Red Bull Air Race não se deslocalizasse para Lisboa, tem batalhado para que os fundos comunitários não caiam apenas no Vale do Tejo que já é uma região desenvolvida segundo todos os indicadores.

Manuel Queiroz Director interino do i primeiro director do Grande Porto

A nossa identidade O centralismo, como forma de organização política e social, tem uma enorme influência não só na economia e na distribuição da riqueza, mas também em muitos outros aspectos que definem a nossa sociedade. Um dos efeitos que provoca é a perda ou desvalorização das peculiaridades que definem a identidade das regiões que constroem Portugal. A centralização tem-nos levado lentamente para uma “segunda globalização” à escala nacional, que tem criado um progressivo desinteresse da população sobre o que acontece no seu “habitat”, e um desconhecimento cada vez maior do que lhe é mais próximo. Este fenómeno é particularmente evidente no Norte do país e mais concretamente na sua capital natural, o Porto. É difícil perceber como numa área, onde se concentra uma grande parte do poder industrial e económico, e da capacidade criativa e artística nacional, não existam meios de comunicação locais/regionais fortes, capazes de dar a conhecer todos estes valores. Concretamente no Porto não existe um único jornal diário da cidade, e as rádios locais são fundamentalmente espaços de difusão musical. No Porto Canal estamos empenhados em contrariar essa tendência. Com a única grelha com 100% de produção nacional das televisões portuguesas, telejornais com notícias exclusivamente locais e regionais, e um conjunto de programas de cariz informativo e de proximidade, oferecemos aos nossos espectadores a oportunidade de se identificarem com a realidade que os rodeia.

Juan Figueroa Director do Porto Canal

O novo agregador do marketing.


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