7 minute read

Ponto de Vista_jornal360_ed218_mar24

Chicken or Pasta?

*Leonardo Medeiros
imagem: canva.com/jornal360

Me lembro as vezes desse filme dos anos 80 que se chamava “O Turista Acidental”. Na época não achei nada especial, mas de um jeito furtivo, a trama ficou marcada a fogo no meu inconsciente. Por que será? É a história de um sujeito que viaja o mundo escrevendo essa coleção chamada “Turista Acidental”, nada mais nada menos que um guia dedicado a quem não gosta de viajar, mas o faz por obrigação profissional. O protagonista, um americano bolha, vai para Paris, a quintessência do destino turístico, em busca de hotéis, restaurantes e atividades; a procura de ambientes que façam ele se sentir numa cidadezinha de Ohio, como se Paris e os franceses não existissem. Ele não gosta de sair de casa e viaja o mundo atrás de uma sensação de nunca ter saído. Torci o nariz porque não compreendia como alguém poderia não gostar de viajar. Eu costumava vagar por aí de mochila nas costas em busca de praias e montanhas. Na primeira oportunidade levei minha mochila para o exterior.

De lá para cá viajei o mundo, estudei fora, passeei, trabalhei, mil carimbos no passaporte e, para sua surpresa… cansei. Demorei para compreender. A verdade é que sempre me senti no mesmo lugar, não importavam as coordenadas. E na maioria das vezes a sensação não era de uma miríade de destinos, apenas dois. Em casa, ou fora dela. Fui elaborando o sentimento até chegar à conclusão de que “o melhor lugar do mundo é aqui, e agora” (como dizia o poeta). Aqui entre nós, me sinto mais em casa em Santa Cruz do Rio Pardo do que em New York.

O turismo não me seduz. Naquela fila entre milhares de sujeitos que se aglomeram para entrar na Catedral de Notre Dame, entre as centenas de celulares apontados para a tímida Mona Lisa, entre assédios agressivos dos vendedores nas vielas de

Marrakesh vendendo bugigangas árabes (made in China), me sinto verdadeiramente desumanizado. Esses milhões de sujeitos, que na maioria esmagadora das vezes economizaram o ano inteiro pra sentar numa ínfima poltrona de avião em torturantes 20 ou 30 horas de viagem (“chicken or pasta?”); todos são conduzidos por um impulso consumista de predar o desconhecido sem antes terem visitado os recônditos da própria alma. Um impulso humano de conquista e exploração, mais uma anacrônica excrecência do mundo macho alfa, explorado pelos tubarões da indústria do turismo para tirar de você seus suados dólares. Preguiça. Prefiro ficar em casa. Prefiro usar meus dólares pra manter uma casa confortável, ter um belo jardim, um sofá confortável e um bom notebook para escrever bobagens como essa. Eu turista me sinto solitário competindo por um centímetro quadrado de Piazza Navona contra vorazes turistas japoneses, com seus indefectíveis celulares querendo fotografar tudo. Voltamos pra casa com milhares de imagens inúteis, de lugares e coisas já fotografadas a exaustão, frenéticos, mas sem boas histórias de grandes encontros ou aventuras.

Uma viagem deveria ser um caminho de evolução pessoal e abertura de horizontes.

Por isso me intrigou tanto aquele filme. Podia ter aproveitado aquela obra de arte (a arte faz isso com a gente) economizando viagens frígidas. Podia ter entendido o recado. O filme era uma esfinge que eu só decifrei décadas depois. Nem sei se o filme é exatamente assim do jeito que descrevi, vale a pena ver de novo. Mas ficou marca

*ator, escritor e vocalista de banda de rock
*ator, escritor e vocalista de banda de rock

Ansiedade

* Maurício Salemme Corrêa

imagem_canva.com

Parece que essa é a doença que afeta muitas, mas muitas pessoas nos dias atuais, sim nunca se falou tanto nela. Dá para entender: tudo acontece de maneira imediata, na hora, ou melhor, em um segundo e acabamos caindo nessa arapuca das coisas da vida serem imediatas.

Há algum tempo, nem sei se você viveu isso, mas as pessoas esperavam que a sua música favorita, tocasse no rádio, inclusive para gravá-la e poder ouvir quando quisessem... Quando íamos a um restaurante, fazíamos o pedido e aguardávamos o prato escolhido, quase sempre com a boca salivando... E quando o assunto era o amor, seja de filhos, pais ou companheiros, também era assim. Aguardávamos a carta que levava dias até ser entregue pelo dedicado funcionário dos Correios, que com alegria, nos entregava, como se a felicidade fosse dele...

Sim, houve uma evolução. Hoje a música que você quer ouvir, basta colocar no seu celular e pronto... Para comer, basta entrar em um aplicativo, pedir ou, mais fácil, entrar em um restaurante e escolher o alimento sem nem antes se sentar e pensar, só vai pegando.... Para falar com alguém próximo, ou não, basta ter o contato e, em segundos, mandar o seu texto, áudio ou vídeo.... Muito bom né????

Mas por que a ansiedade está tão presente entre nós????? Mesmo com toda a tecnologia, dá para tentar ser menos ansioso: Vamos pensar juntos: quando for ouvir uma música que lhe agrada, procure ouvir o álbum inteiro do artista, para entender melhor como esse foi concebido.... Dê preferência, quando for se alimentar, a fazer com calma seu prato, de preferência, aguarde um pouco antes de se servir, sinta o aroma e as características do local onde você está. Quando for se comunicar com seus amores, faça com tempo e, principalmente, com ouvidos bem abertos e sem pressa, faça valer esse momento especial.

As tecnologias estão aí para nos ajudar e nos aproximar, porém, existem armadilhas que podem fazer uma coisa boa, acabar nos levando à ansiedade.

Aproveite o dia, sem pressa e sem correria... Vamos tentar?????

AnsiedadeA vilania do dinheiro

* Fernanda Lira
imagem_canva.com

Barata quando cai no melado, se lambuza. Esse dito das antigas serve para ilustrar uma outra frase muito sábia: tudo que é demais, não é bom. O dinheiro que chega às mãos de talentos do esporte e do entretenimento é fora de contexto num planeta com tantas pessoas passando fome e com a maioria das pessoas vivendo com 1.550,00 por mês, valor do salário mínimo do Brasl.

Não há nenhum gol de placa ou performance em campeonato que justifique os valores hoje pagos a jogadores de futebol. Muito menos a artistas, sic, que conseguem sim ter milhões de seguidores em redes sociais outros milhares em suas aparições públicas, mesmo sem produzir arte que mereça ser conhecida. Nada justifica essa grana toda tão fácil e que eles usam da maneira mais ostensiva, espalhafatosa e cafona possível.

Daí para cair na vala de quem acha que está acima do bem e do mal ou, principalmente, das outras pessoas, podendo, inclusive, se valer delas para uso próprio e sem o devido consentimento, é um pulo. Muitas vezes, nem isso.

Esse universo de babacas de todos os gêneros, que vira e mexe se move dos noticiários tão ávidos quanto eles por atrair

público para a bandidagem de pior espécie, que inclui violência extrema como o estupro e assassinato, não existiria se todos ganhassem um salário justo, digno de seu talento. Nada além disso.

Senhores pais que sonham ter filhos bons de bola ou de lábia ganhando fortunas mundo afora, pensem bem. Vale a pena ir atrás de toda essa grana podendo ser um dia pai, mãe, irmão de alguém capaz de ser tão vil?

PS: Nosso repúdio à soltura de um estuprador mediante fiança milionária. Isso é o mesmo que colocar uma etiqueta de preço à dignidade, integridade e alma de uma mulher.

* jornalista paulistana que adora o interior
This article is from: