E STA D O D E M I N A S
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MUITO
prazer EDUARDO AVELAR
D O M I N G O ,
D E
degusta
E nós aqui... Fazendo jus ao apelido de “ferrinho de dentista” que ganhei de dona Eunice na infância – talvez pelo meu jeito insistente de querer as coisas –, volto a bater no mesmo dente, digo, na mesma tecla do cachorro correndo atrás do rabo. Na semana que passou, mais uma vez estive acompanhando chefs mineiros trabalhando, como convidados, em restaurantes de colegas. Um jantar excepcional foi preparado por Felipe Rameh no Restaurante Gomide, para um público seleto. Anteriormente já havia me deliciado com uma homenagem a dona Lucinha e dona Nelsa prestada por cinco competentes meni-
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nas no Restaurante Trindade. Essa saudável prática tem sido repetida por nossos jovens profissionais, dando verdadeiro exemplo aos mais experientes, que se esquivam desses programas caseiros – que só deixam de ser “chatos” e se tornam “até atrativos” quando contam com a presença da mídia nacional. Lembro-me bem de quando surgiram os grandes chefs franceses e italianos por aqui. Logo se formou uma panelinha intransponível aos simples mortais, e quando um profissional daqui era chamado para algum evento, se dedicava tanto que até se esquecia de convidar algum “concorrente” local para compartilhar
N O V E M B R O
a experiência. Que bom que esse tempo ficou apenas na lembrança. As dificuldades vendidas outrora a preço de ouro pelos “escolhidos” sucumbiram aos “furos” disponíveis na internet. Os “segredos” dos grandes, manobrados com avidez e competência pela meninada viajada e bem temperados pelo espírito de companheirismo, certamente vão conduzir a gastronomia de Minas Gerais a outro patamar. O exemplo hoje seguido pelos jovens do Brasil vem de um grande profissional que sempre se destacou e se tornou respeitado por valorizar a nossa cultura, mas acima de tudo por lançar novos talentos, que compactuam com as suas crenças, no Brasil e no mundo. O chef Alex Atala tem constantemente levado diferentes chefs, que praticam e defendem a culinária nacional, a eventos internacionais.
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E nós, por aqui, continuamos a valorizar e a promover ilustres desconhecidos em detrimento de dezenas de craques que atuam no estado, muitas vezes sem o apoio do empresariado do setor. É aquele velho provincianismo que espera o sucesso ser chancelado lá fora para só depois valorizar a prata da casa. Na semana passada, vários jovens chefs daqui, que poderiam ser classificados de “grandes concorrentes”, estiveram em São Paulo – juntos e por conta própria, diga-se de passagem – para participar de um importante evento de tendências gastronômicas, trocando experiências com colegas de todo o país, inclusive o mestre Atala, que sempre tem um gesto de incentivo a oferecer. E nós, aqui, continuamos a correr atrás do rabo, reclamando de tudo, em vez de trabalhar juntos para o
crescimento coletivo. Já não suporto ouvir reclamações de quem não faz nada para o cenário melhorar, tampouco ver a inércia de quem poderia fazer algo mais e se finge de morto. E veja, amigo da cozinha, Minas Gerais vai, em janeiro, representar o Brasil no maior evento mundial de gastronomia. Falta ainda apoio de empresas e, especialmente, de alguns setores da mídia aos nossos profissionais neste momento tão especial. A competência e a união desses jovens cozinheiros de Minas deveriam nos fazer refletir melhor sobre onde podemos chegar. Até quando ficaremos cultuando o passado ou gravitando em torno de São Paulo e Rio, que a despeito da força de sua comunicação estão distantes anos-luz das incontáveis referencias gastronômicas que temos para mostrar ao mundo?
LEANDRO COURI/EM/D.A
RAFAEL MOTTA/TV ALTEROSA
A extensa lista de benefícios nutricionais aliada ao gostinho adocicado e à coloração forte e atraente coloca a cenoura no pódio das hortaliças mais consumidas no planeta *PATRÍCIA CRESPO
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Saudavelmente saborosa Terrine de cenouras com ricota defumada e pesto de rúculas
dem ser agrupados em cenouras ocidentais e orientais. Pelos países do Oriente ainda se encontra com facilidade as espécies com as cores de suas ancestrais. Cenouras púrpuras, brancas e amarelas são amplamente comercializadas e consumidas em países como o Irã e o Afganistão. Por lá comem-se tanto a raiz quanto as folhas aromáticas que brotam acima da terra. Na Índia, é famosa uma sobremesa de nome gaajar kaa, uma deliciosa mistura cozida e homogeneizada de cenouras, leite, nozes e manteiga. A versão ocidental na cor laranja foi desenvolvida pelos holandeses, para homenagear o grande impulsionador do movimento de independência dos Países Baixos, Guilherme I, príncipe de Orange, durante a guerra contra a Espanha, no século 16. Da Holanda a novidade se espalhou por toda a Europa virando moda e símbolo de status na Inglaterra durante o reinado de Elisabeth I. Os portugueses a trouxeram para o Brasil. Com eles aprendemos a usá-las em conservas, cozidos, guisados, omeletes, purês, saladas, sopas, sucos, e suflês como também em sobremesas e quitandas como bolos, pães, rocamboles e tortas. A doçura e a textura das cenouras permitem e harmonizam-se perfeitamente com sabores picantes e ácidos tornando-se um delicioso brinquedo nas mãos de criativos chefs da atualidade. A China é o maior produtor da raiz, mas a cidade norte-americana de Hotville, no es-
tado da Califórnia, foi declarada capital mundial da cenoura. Por lá, anualmente promove-se um festival para celebrar e divulgar a produção local, com direito a concorridos concursos para eleger os maiores e menores exemplares da hortaliça. Em Viena, na Áustria não só se comem como se tocam cenouras. Os músicos da curiosa Orquestra Vegetal de Viena removem o miolo do legume, formando um cone onde são feitos furos, e como numa flauta, saem notas musicais da cenoura. O Brasil ainda é tímido na lavoura do legume se comparado aos números chineses e americanos, entretanto nossa produção é suficiente para suprir a grande demanda nacional. Com muito orgulho os mineiros podem se considerar campeões na produção de cenouras. A cidade de São Gotardo, no Alto Paranaíba, organiza todos os anos a Fenacen (Festa Nacional da Cenoura) para comemorar com shows e feiras gastronômicas, os milhares de toneladas do vegetal colhidos pelos agricultores da região. Com cenouras mineiras preparamos uma terrine leve e refrescante, com toques de limão e gengibre para ilustrar esta página do Degusta. A receita pode ser modificada e alterada conforme o gosto do freguês. Use a criatividade para compor as camadas, mas só não deixe faltar a cor e o sabor das cenouras. *Formada em jornalismo pela PUC-Minas e em gastronomia pela Estácio de Sá
INGREDIENTES
1 pacote de pão para torta fria, 500ml creme de leite fresco, 300g de ricota defumada, ervas frescas picadas 6 cenouras médias cozidas no vapor e transformadas em purê, 1 colher de chá de gengibre ralado, gotas de limão a gosto, 1 maço de rúculas, 150ml de azeite de olivas extra-virgem, 50g de nozes, 100g de queijo parmesão ralado fino, sal e pimenta-do-reino moida na hora a gosto MODO DE FAZER Creme de cenouras: tempere o purê de cenouras com o gengibre, o limão, sal e pimenta a gosto. Reserve. Creme de ricota: processe a ricota com a metade do creme de leite, misture as ervas picadas e tempere a gosto. Reserve Pesto de rúcula: processe a rúcula, as nozes, o queijo e misture o azeite. Reserve. Montagem: Tempere o restante do creme de leite com sal e pimentado-reino e molhe uma por uma as camadas de pão. Não deixe de molho, vá molhando as fatias de acordo com a necessidade da montagem. Forre fundo e laterais de uma fôrma de bolo inglês com papel-filme. Vá montando a torta intercalando as camadas de pão com creme de cenouras, o creme de ricota e o pesto. Termine com uma camada de pão. Feche a terrine com o papel filme e leve para o refrigerador por no mínimo 2 horas. Desenforme e decore a gosto.
KIKO CAVALCANTI/DIVULGAÇÃO
as primeiras colheradas oferecidas aos bebês, as papinhas de cenouras amassadas têm aceitação garantida. Associada à imagem de lendários coelhinhos, o vegetal faz sucesso com a criançada. Adolescentes colocam-na no prato sem restrições. Para os adultos é garantia de saúde, bem-estar e boa forma. Presença confirmanda em todas as fases da vida, o vegetal contribui para que a alimentação seja mais rica, colorida e saborosa. Um gostinho que conquista os sentidos pelo sabor doce, pelo aroma fresco com um toque anizado e por uma cor vibrante e estimulante. Crua, cozida, grelhada, assada, frita, ou transformada em purê, a cenoura é um ingrediente versátil que pode ser consumido sem muitas intervenções no dia a dia ou utilizado para elaborar pérolas da gastronomia atual. Raiz lisa ou lenhosa, de formato cilíndrico ou cônico, apresenta tons alaranjados bem acentuados, graças a atuação de um pigmento chamado betacarotená que é transformado em vitamina A pelo nosso organismo fazendo um bem danado para nossa visão, pele e mucosas. Atua como antioxidante, prevenindo o envelhecimento das células. Contribui para o sistema imunológico ajudando no combate às infecções, além de ser boa fonte de fibras e minerais como fósforo, potássio, cálcio e sódio, importantes para o bom funcionamento do sistema nervoso e para formação dos ossos. Diante dessa poderosa e extensa lista de benefícios nutricionais fica impossível não abrir um bocão para saborear e dar boas-vindas às cenouras. O popular vegetal que se come hoje é uma forma domesticada e modificada da Daucus carota selvagem, originária da Europa e de países do Sudoeste e centro asiático. Traços de sementes da planta foram encontrados em habitações pré-históricas na Suíça, confirmando sua presença em solos europeus. Do mesmo modo, seu nome consta na lista de plantas cultivadas nos jardins reais da Babilônia (8 a.C.), atestando também suas origens orientais. Por isso mesmo, os cultivares da planta po-