LIVROS DE ARTISTA, LIVROS-OBJETOS: REFLEXÕES E PESQUISAS A exposição “Livros de artsta: produção, pesquisa e refexão”, apresentada na Casa Contemporânea, reúne produção e pesquisa desenvolvida nos encontros dos grupos de estudo da Fundação Ema Klabin e dos grupos de pesquisa da Faculdade Santa Marcelina e da Universidade Estadual de Campinas. A produção é recente, suscita inquietações e refexões sobre um território vasto; meandros e tangências de linguagens expressivas que convergem no livro de artsta. Desde o papel, os tecidos, as fotografias, as gravuras até os vídeos, as projeções, as instalações, o livro de artsta entendido num campo expandido. Do acaso ao livro organizado e planejado, nessa exposição, há a reunião da produção de mais de vinte artstas, que refetem sobre narratva visual, sequencialidade, relações entre espaço, tempo e memória, os quais encontraram no livro seu princípio e seu fim, seu conteúdo e sua forma. Como artsta e professora, acompanho essa produção intensa, e, por conta desse interesse, busco estmulá-los a refetr sobre as questões da estétca, da visualidade e também da síntese das sequências visuais criadas. O que contém um livro? Por que esse objeto nos fascina tanto? Evidentemente, há os artstas que se dedicam à construção de livros a partr de narratvas pessoais, enquanto outros abordam, em seus trabalhos, assuntos mais universais. Tratando-se de uma mostra coletva, percebem-se aproximações e tendências, como o uso de transparências, sobreposições, como também de certas linguagens, a fotografia,a tpografia, a escrita, o desenho e a gravura, além dos conceitos que circundam o universo da memória ao serem utlizadas caixas, arquivos, gavetas, etc... Cada artsta busca, em determinadas linguagens e conceitos, a construção de trabalhos artstcos com o intuito de expressar-se no e com o mundo, tendo como ponto de partda sua admiração pelo livro. Luise Weiss
Marilia Lourenรงo
LĂlian Arbex
Marilde Stropp
Paula Éster
Wagner Priante
Rosa Esteves
Marcia Gadioli
Norma Vieira
Maria Irene P. Guerreiro
Marcia Rosemberger
CĂŠlia Alves
Ana Almeida
Adriana Dias
Luise Weiss
Luise Weiss
Angelo Capellari
Marisa Garcia de Souza
Danilo Perillo
LĂşcia Loeb
Rafaela Jemmene
Rafaela Jemmene
Daniela Avelar
Marcia Rosa
Fabiola Notari
Parcerias ___________________Poétcas
Aqui, parcerias horizontais - entre o status da curadora e dos artstas partcipantes, entre ser orientador e ser orientando - deságuam na mostra LIVRO DE ARTISTA: produção, pesquisa e refexão, cujo ttulo indicia estas trilhas . Os livros de artsta que compõem esta mostra são frutos de um sistema colaboratvo de trocas de experiências e informações, sob a ótca da horizontalidade, resultantes de encontros sistemátcos, fora do âmbito acadêmico, cujo núcleo gira em torno da figura-chave de Luise Weiss que, atravessada pela função de artsta-orientadora-propositora-educadora, potencializa e promove vórtces nas relações afetvas- efetvas em torno e a partr de um objeto poétco – o livro de artsta. O tripé produção+pesquisa+refexão habita os interstcios e as conexões entre “como pensar e como produzir” livros de artsta, conjugando os arcos extensos de possibilidades poétcas e a projeção deles dentro de um espaço expositvo – Casa Contemporânea. O agenciamento deste pensar+pesquisar+refetr+projetar+produzir+realizar ganha, aqui, um corpo coletvo promovido tanto pela figura-chave que orquestra os procedimentos quanto pela própria natureza do objeto poétco – livro de artsta -,
a espinha dorsal que pontua tantos
horizontes. A produção de livro de artsta é prátca recente aqui no Brasil, desde idos de 60, cujos conceitos que amplificam esta modalidade artstca se firmaram, de maneira mais consistente, há menos de uma década. É absolutamente fascinante constatar sua vocação virótca, pela natureza naturalmente múltpla, passível e possível de ser reproduzido em tragens abertas e, quem sabe, infindas, mesmo sendo um! Gênero poétco multplicador, geometricamente progressivo, o livro de artsta povoa trampolins – em saltos e mergulhos – codificando outros modos de pensar a criação, produzir refexões, pesquisar procedimentos, projetar práxis poétcas, construir plataformas específicas para sua produção e circulação: seja através de ambiências propícias para trocas, tais como as feiras de livros de artsta que tem acontecido de forma sistemátca, por todo o Brasil, nestes últmos anos; seja pela presença cada vez mais constante em exposições, galerias, museus, insttuições culturais, até mesmo em escolas, universidades; seja na aquisição de livros de artsta para compor acervos de Museus e Bibliotecas.
Para visualizarmos os índices iniciais destes percursos, algumas sinalizações, agora marco e fronteira: o primeiro livro sobre livro de artsta, aqui no Brasil, nasce dentro da Universidade, editado em 1991 pela UFRGS, fruto da pesquisa teórica de Paulo Silveira. ‘Página Violada’ sistematza e organiza informações e conceitos, balizando as primeiras estruturas genétcas do que se nomeia genericamente como livro de artsta, alinhando conceitos e procedimentos históricos – tanto dentro do circuito nacional quanto do internacional - fundamentais para a construção de repertório visando a prátca desta refexão ou a refexão desta prátca, dentro do contexto universitário. Livro-antena, intuição do que viria por vir, Paulo Silveira antecipa o que agora estamos reverberando, fora do contexto acadêmico. Desde este primeiro sinal de alerta, o livro de artsta tem pratcado a vocação virótca, até pelas condições inatas de seu fazer, conjugando colaborações, oriundas de outros campos de saberes e sabores, que vão das técnicas de impressão – sejam artesanais ou industriais- ao conhecimento dos artstas do livro que dissecam sua arquitetura/engenharia – o ofício dos artesãos tradicionais e/ou os artesãos-designers. A apropriação de uma “práxis refexiva” aqui, na mostra, é incorporada através desta horizontalidade posta, em seus paralelismos - da qualidade colaboratva destes encontros à apropriação do objeto poétco livro de artsta, cuja linguagem, em si, potencializa as distntas camadas de ações que se somam, em elos. A prátca da experiência da poétca ou da poétca da experiência permeia todos os traçados da mostra, composta pelos artstas-pesquisadores: da concepção à realização, da refexão à produção – fazendo emergir o que há de mais vivo e fundante nas relações humanas – a educação como passaporte para a construção das singularidades e alteridades. A etmologia da palavra educação, de origem latna, desvela a qualidade humanizadora: ação de nutrir, criar e cultvar, cujas ‘sinonímias’ são as palavras delicadeza e sapiência. Este leque de sentdos traduz o espírito do trabalho, ultrapassando as fronteiras da formalidade hierárquica e insttucional dos modelos educacionais, extrapolando os fundamentos acadêmicos que avalizam formatos do binômio pensar/fazer. Aqui encontraremos um leque de trabalhos resultantes destes encontros, balizados pelo tripé pesquisa+refexão+produção,cujo leitmotv é o livro de artsta, objeto poétco que, de forma sintônica, cultva, simultaneamente, o de vir da multplicidade e o tônus da intmidade, construindo assim uma ponte metafórica entre a natureza do livro de artsta e a arte dos encontros realizada por este grupo – aproximações afetvas e afinidades eletvas dadas pelo gosto das parcerias poétcas. Edith Derdyk março 2014
Livro de Artista: Produção, Pesquisa e Reflexão Memória e narratva Adrienne Firmo “Certamente, se nossa impressão pode apoiar-se não somente sobre nossa lembrança, mas também sobre a dos outros, nossa confiança na exatdão de nossa evocação será maior, como se uma mesma experiência fosse recomeçada, não somente pela mesma pessoa, mas por várias.” (Maurice Halbwachs, A memória coletva)
A mostra Livro de artsta: produção, pesquisa e refexão origina-se da experiência conjunta dos artstas em grupos de estudos e pesquisa e tem como tema central suas refexões acerca da memória. Cada uma das obras traz em si o trabalho individual de um sujeito que, a partr de seu repertório pessoal, se lembra e traduz o recordado em obra artstca, porém, sua consttuição em arte e mais, em arte de memória, só se faz coletvamente, uma vez que apenas o grupo pode dar densidade e relevância ao testemunho da lembrança, ser o ouvinte de uma narratva. Walter Benjamin, em seu ensaio O narrador, enfatza o aspecto fundamental que diferencia escritor e leitor de romance de narrador e ouvinte de uma narratva: a companhia. Tanto o escritor como o leitor estão sozinhos; narrador e ouvinte estão entre outros, em grupo, existem coletvamente. Assim, se memória é ela mesma uma narratva, apenas seu compartlhamento garante-lhe existência e consistência. Como narratvas mnemônicas, os trabalhos expostos podem ser considerados como documentos/monumentos, por romperem a barreira física da memória encapsulada no indivíduo. Assim, enquanto registros, ocupam o lugar de documentos, arquivos nos quais as lembranças podem ser acessadas pelo sujeito/artsta que rememora, e também partlhadas com o público/visitante que o consulta. Por outro lado, enquanto produção artstca, são também, monumentos ou lugares em que a recordação é perpetuada e celebrada socialmente. Na mostra, cada obra surge materialmente como a conservação do fragmento de memória a ser trazido à luz, e conceitualmente como semente de rememoração, a elaborar e transmitr a experiência. Cada obra é, então, a memória mediada, enquanto que a exposição é a garanta da polissemia do coletvo e o fundo legitmador daquilo que é compartlhado, entre obras, artstas e público.
Desse modo, a execução da mostra, ao erigir como orientação para a escolha e produção dos trabalhos o tema da memória, parece ser uma afirmação e celebração do convívio, da troca de experiências e da construção da realidade conjunta. Se, num primeiro momento, o voltar-se para as questões relatvas à memória traz um aspecto de retraimento, de trajetória solitária, de exílio em si mesmo, em seguida converte-se na experiência partlhada, caminhada comunitária e pertencimento ao grupo. Condição confirmada pelo próprio ambiente de estudo e aprendizado comunitário e grupal que a motvou. Não cabe aqui o debruçar-se sobre cada um dos trabalhos exibidos, mas àquilo que fenomenicamente os torna um conjunto expositvo, lembrando que o fenômeno é a aparição da coisa à consciência. Assim, o que é trazido, neste caso, à consciência são os fatos de memórias travestdos em arte, expressos por meio de técnicas variadas e relatos subjetvos. Quanto à modalidade livro de artsta, a exposição permite a observância das inúmeras formas, variedade de soluções e expressões que podem assumir, explicitando a dificuldade comum a toda a arte contemporânea de abarcamento de obras por meio da descrição estrita em tpologias artstcas fechadas, bem como a riqueza de possibilidades a serem pesquisadas e exploradas pelos artstas. Toda experiência expositva busca relacionar ou ligar o conjunto das obras expostas, a fim de conferir-lhes unidade, tornando-se, dessa forma, veículo privilegiado de entendimento da produção artstca e da insttucionalização de tendências e categorias, além de procurar corresponder a certa inscrição da produção artstca no campo estétco e de fornecer instrumentos e meios para a compreensão das obras exibidas. Para tal, conduz-se na trilha das escolhas plástcas, categoriais, técnicas, conceituais ou temátcas que reúnam os trabalhos exibidos. No caso da mostra Livro de artsta: produção, pesquisa e refexão, duas são as vias que orientam a seleção: a categoria e o tema. Categoria: livro de artsta; tema: memória. Desde seus primórdios o livro de artsta é, em geral, tomado como aquela modalidade artstca materializada na unidade oriunda da fusão entre visualidade e literatura. É possível, então, abordá-lo como um objeto plástco que conta uma história. Um objeto narrador. A memória, por sua vez, é o trabalho de tornar o passado em presença atva no presente, é reconhecimento e reconstrução do já ido, portanto, também, princípio de ação narratva. Uma refexão narradora. A aptdão narratva seria, então, o fio que une os trabalhos na mostra, tal qual a memória é o que ata os seres, as coisas e os fatos. Adrienne Firmo é doutoranda pela FAU-USP, mestre em Estétca e História da Arte, graduada em Filosofa, atua como pesquisadora em artes visuais e curadora independente.
ABERTURA 15/03/2014
CONVERSA COM ARTISTAS "Livro de artsta: entre o ateliê e a sala de aula" Edith Derdyk, Luise Weiss e Ulysses Bôscolo Mediadora: Marília Lourenço
22/03/2014
"AlĂŠm das pĂĄginas do livro: o livro de artista como campo expandido" Paulo Silveira e Adrienne Firmo Mediadora: Luise Weiss
12/04/2014
Artstas: Adriana Dias, Ana Almeida, Ângelo Capellari, Célia Alves, Daniela Avelar, Danilo Perillo, Fabiola Notari, Lílian Arbex, Lúcia Loeb, Luise Weiss, Márcia Gadioli, Márcia Rosa, Márcia Rosenberger, Maria Irene P. Guerreiro, Marilde Stropp, Marília Lourenço, Marisa Garcia de Souza, Norma Vieira, Paula Éster, Rafaela Jemmene, Rosa Esteves, Ulysses Bôscolo, Wagner Priante Curadoria: Luise Weiss Assistência de curadoria e produção: Fabiola Notari/Marília Lourenço Expografia: Adrienne Firmo/ Marcia Gadioli Realização:
março/2014