Anita Colli Beatriz Nogueira Edilaine Brum Edu Silva Lucimar Bello Ruth Alvarez Selma Fukai Sheila Kracochansky
Curadoria: Marcelo Salles
DISSENSOS “Pluralismo não é igual a uma convivência pacífica; é apenas entender que existem mais versões numa discussão1.” Pode parecer provocação uma exposição denominada DISSENSOS quando o que se parece buscar, notadamente no Brasil, é um consenso, algo que estabeleça um apaziguamento de corações e mentes. Todavia, não seria nesse momento tão particular que deveríamos trilhar um caminho que, ainda que mais difícil sem dúvida, levasse à uma compreensão do que vivemos? –esse caminho é íngreme, acidentado, mas talvez seja o único possível já que o outro que nos é apresentado é plano, uniforme, mas é um caminho circular: nos leva aos mesmos lugares onde já estivemos. Para irmos a novos lugares é preciso colocar em questão o que já sabemos ou está estabelecido; é preciso discutir, pensar de uma maneira não usual sobre o que nos aflige individualmente ou enquanto pertencentes a uma sociedade; é desta maneira que o dissenso contribui, não como crítica negativa à uma convivência pacífica, um consenso, mas como um entendimento de visões de mundo diferentes das nossas ou do senso comum que levam a um convite para pensar junto ao outro. ... Os trabalhos dos artistas integrantes desta exposição estão dispostos de maneira a confrontar-se, seja com o local seja com os outros trabalhos, No jardim estão cerâmicas de Selma Fukai que não buscam mimetizarse à ele mas integrar-se mantendo suas características; na fachada, Ruth Alvarez expõe um desenho em grande formato; é também dela o trabalho A0 (projeção e vinil adesivado), que vemos ao entrar na parte interna, onde a própria questão do desenho vai dialogar não só com a representação do real mas da auto-apropriação. A sala esquerda configurou-se como um local de aspecto, digamos, feminista, mas sem resvalar no panfletário. Alguns optam por linguagem mais direta como os de Edilaine Brum (Recatada e do Lar e Bandeja) e de Sheila Kracochansky (Camadas, Mitologia Pessoal e A Dança); em Anita Colli (Tempo), Lucimar Bello (Pés de um dia) e Selma Fukai (Plaquinhas) este caráter feminista tem difícil identificação. Na verdade, esta camada de informação está entremeada a outras como o mercado de trabalho ou a relação com o próprio corpo. Na sala direita as questões estão aparentemente mais ligadas ao universo próprio da arte, como cor e forma, mas também questões políticas estão representadas; seja de maneira direta e engenhosa como as telas da série Estudos sobre Mestiçagem, de Edu Silva, ou em configurações dialógicas: assim, Vestígios, de Anita Colli, dialoga com as telas de Edu Silva; as pinturas (Sem título) de Selma Fukai fazem o mesmo com os trabalhos Borboleta e As Pedras das Dunas, de Sheila Kracochansky, que, por sua vez, vão se opor em cor e forma aos trabalhos tridimensionais de Beatriz Nogueira (Enquanto a Noite Não Cai) e de Lucimar Bello (Amanhã Virará Pó). Este tipo de configuração dialógica, mesmo que na base do pensamento ocidental, creio ainda ser capaz de estimular novas reflexões. 1 “Pluralism doesn’t equal peaceful coexistence; it just means more sides to the argument” – frase citada por Roberta Smith na edição do jornal New York Times de 30 de novembro de 2007
Na escada, em direção à sala superior, à medida que vamos subindo vislumbramos o trabalho Vagantes, de Beatriz, onde ordenação e aleatoriedade convivem em um tipo de simbiose. Finda a escada vemos quatro desenhos de Ruth Alvarez e outra das assemblages de Edilaine Brum (Enfermo). Mesmo antes de entrar na sala superior é também de Edilaine a obra Berço, instalação que além de questões pessoais e coletivas evoca o conceito de ready made. Neste diálogo de opostos, ou de complementos, à direita temos as cores e formas das cerâmicas de Selma (Orgânicas, Torrinhas e Os Brancos), pinturas de Edu Silva, também da série Estudos Sobre Mestiçagem, em formatos diversos; no piso Espaço em Branco, de Anita, nos fala sobre o acumulo ou excesso, tão presentes nesses tempos; e Sheila cria uma paisagem para a janela que permita-nos estar presente em relação a área interna. Na parte esquerda, onde Berço se localiza, temos contrapontos: de cor, de formas, de acumulo. Beatriz traz os registros de Um, Dois e Já - atitudes que tomam forma de maneira singela; por fim Lucimar expõe do Nascimento de uma Montanha. A artista compartilha com todos o processo de um ano que originou esta exposição ou, como ela gosta de dizer, “compartrilha” esse caminho que não aplaina as diferenças mas faz delas estímulo ao fazer e ao pensar. … O processo que originou a exposição DISSENSOS, mas também o próprio grupo Sem nome (por enquanto), levou pouco mais de um ano, em encontros quinzenais, onde discutíamos sobre arte contemporânea e, por consequência natural, todos os outros assuntos que nos fazem estar no mundo. Este texto não pretende dar conta de toda a riqueza do processo que a exposição sintetiza nem de toda a potência e camadas de experiências que os trabalhos podem proporcionar. Sua intenção é, mesmo em tempos de descrédito generalizado como este, mostrar que não é sufocando o pensamento livre ou unificando as diferenças que nos tornaremos melhores: não é o que unifica, mas o que une que nos faz melhores e mais fortes2. A arte ainda é capaz dessa união. Marcelo Salles
2 Definição do geografo e pensador brasileiro Milton Santos.
Anita Colli
Espaço em branco
2017 Dimensões variadas Instalação (vidros e materiais variados)
Tempo
2017 Dimensões variadas Instalação (vidros e tecidos)
Vestígios, 2017, 25 x 29 x 3cm, Assemblage (vidros, tecidos e acrílico)
Beatriz Nogueira
Vagantes
2017 Instalação Carvão moldado, calcita sobre madeira e cal
Enquanto a noite não cai, 2017, Dimensões variadas, Técnica mista
Um, dois e já, 2017, 10x15 cm, Fotografia
Edilaine Brum
Berço
2017 1,10 x 1,40 x 0,80 cm Técnica mista
Enfermo, 2017, 6 x 26 x 18 cm, Técnica mista
Bandeja
2017 47 x 37 x 11 cm Técnica mista
Recatada e do lar 2017 35 x 27 x 7 cm Técnica mista
Edu Silva
Estudo Sobre Mestiçagem 2017 Dimensões variadas Acrílica sobre tela
Estudo sobre mestiçagem, 2017, Dimensões variadas, Acrílica sobre tela
Estudo sobre mestiçagem, 2017, Dimensões variadas, Acrílica sobre tela
Lucimar Bello
PĂŠs de um dia
2009 32 x 26 cm ImpressĂŁo sobre papel
Amanhã virará pó 2002 - 2017 7 x 30 x 30 cm Técnica mista
Do nascimento de uma montanha, 2017, 20 x 56 cm, Técnica mista sobre papel
Ruth Alvarez
A0
2013-2017 118,9 x 84,1 cm Vídeo sobre Impressão
4 desenhos
2017 21 x 31,37 cm Impressão Fine Art
Sem título
2017 244 x 122 cm impressão sobre poliester
Selma Fukai
Sem Título
2016 55 x 75 cm Acrílica sobre papel
Orgânicas, Torrinhas e Os Brancos, 2016/2017, Dimensões variadas, Cerâmica
Plaquinhas
2017 Dimensões variadas Cerâmica
Cinzas
2017 Dimensões variadas Cerâmica
Sheila Kracochansky
A Danรงa
2017 55x77cm Bordado , tule e renda sobre gazar de seda
As pedras das dunas
2016 56 x 42 cm Tela, gazar de seda, pedras, tule, ferro e paetĂŞs
Borboletas
2016 28 x 42 cm Cavalinha, bordados, rendas, pedras e tule sobre algodĂŁo
Camadas
2016 66x73 Pedras, fios, cobre, bordados e tule sobre tela
Mitologia pessoal
2016 - 2017 117x70cm Bordado sobre Jacqard e algodĂŁo
No tempo
2016 90x85cm Bordado, tule e cristais sobre Jacqard de seda
Curadoria
Marcelo Salles
Produção
Marcia Gadioli
Projeto gráfico Fotografia Assistente de produção Realização
Edu Silva Hector Guiñez Daniel Banin Casa Contemporânea
DISSENSOS é uma
exposição coletiva do grupo Sem Nome (por enquanto) com os artistas Anita Colli, Beatriz Nogueira, Edilaine Brum, Edu Silva, Lucimar Bello, Ruth Alvarez, Selma Fukai e Sheila Kracochansky que aconteceu na Casa Contemporânea de 11 de novembro de 2017 à 27 de janeiro de 2018.
DISSENSOS torna-se uma celebração do pluralismo e do pensar. A divergência de visões de mundo e de conceitos pode não ser uma convivência pacífica, mas é um convite à discussão, ao pensar junto do outro. Assim como é a convivência dos trabalhos nas linguagens desenho, objeto, instalações, pinturas, vídeos, cerâmicas, assemblages, contaminadas por questões sociais, políticas, econômicas e, evidentemente, estéticas.