Travessia 53 – Setembro 2021 - Notícias do São Francisco

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travessia Notícias do São Francisco

JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / SETEMBRO 2021 | Nº 53

Estudo aponta perda de superfície de água em oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras Página 3 Entrevista: Maciel Oliveira – novo presidente do CBHSF Página 8

CBHSF empossa novos membros para Gestão 2021-2025


Editorial NOVOS DESAFIOS, MESMO COMPROMISSO A Edição n° 53 do informativo Travessia traz, em seu conteúdo, todas as informações sobre a nova composição do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. Em plenária, que aconteceu de modo híbrido (presencial e virtual), tomaram posse os 124 membros, entre titulares e suplentes e foi eleita a nova diretoria, que conduzirá os trabalhos nos próximos quatro anos. Antes disso, foi realizada a última Plenária Ordinária do mandato anterior. O evento, marcado pela emoção da despedida, girou em torno de balanços da gestão 2016-2020, gestão essa que foi prorrogada por um ano, até 2021, por causa da pandemia da Covid-19.

Essa edição também traz à tona o assunto crise hídrica, considerada a maior e mais grave acontecida no Brasil, nos últimos 90 anos. Um levantamento inédito realizado pelo MapBiomas entre 1985-2020 em todo o território nacional revela que as perdas de superfície dos principais rios que nascem em Minas Gerais são alarmantes, entre eles, o rio São Francisco. Abordamos também os trabalhos realizados pelo CBHSF em relação ao Enquadramento das águas da Bacia Hidrográfica dos Afluentes do Alto São Francisco. Previsto para ser finalizado em outubro de 2022, este importante instrumento de gestão deverá ser estendido às demais regiões fisiográficas da Bacia. E, por último, mas não menos importante, trazemos, em primeira mão, uma entrevista com o novo presidente do CBHSF, José Maciel Nunes de Oliveira, onde ele relata seus planos e expectativas para a condução dos trabalhos na gestão 2021-2025. Boa leitura!

Participe do XXIII ENCOB, o maior evento de águas do Brasil Com o tema Água: Fator de Vida, Saúde e Desenvolvimento o XXIII Encontro Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas acontecerá de forma virtual, entre os dias 04 e 07 de outubro. Serão tratados temas como o Plano Nacional de Recursos Hídricos como instrumento integrador dos Comitês

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de Bacias Hidrográficas; Águas Urbanas; Águas Costeiras; Água e Saneamento; e Água e Educação Ambiental. O ENCOB é realizado pelo Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas e Governo do Estado do Paraná. Participe!


XLI Plenária Ordinária encerra gestão 2016-2021 Texto:Juciana Cavalcante / Foto: Léo Boi

A última Plenária Ordinária dos ex-membros do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, realizada no dia 09 de setembro, de forma online, teve como tema CBHSF – 20 ANOS DEFENDENDO O VELHO CHICO. Em tom de despedida, o ex-presidente Anivaldo Miranda fez um grande balanço de sua gestão (2016-2021). Ele destacou a atualização do Plano de Recursos Hídricos da Bacia, a execução do novo modelo financeiro e orçamentário com a aprovação do PAP 2021-2025 e do POA 2021, além da adoção da nova metodologia de cobrança. Em relação ao Pacto das Águas, Miranda ressaltou que o objetivo é harmonizar a gestão das águas entre todos os Estados da Bacia e universalizar os instrumentos da gestão hídrica na bacia, sub-bacias e microbacias do São Francisco. Neste processo, os estados da Bahia, Minas Gerais, Alagoas, Sergipe e Pernambuco já assinaram termos de cooperação com o CBHSF. O então presidente falou sobre os projetos piloto de abastecimento de água nas comunidades indígenas Pankará e Kariri-Xocó, e no município de Pirapora (MG), e a construção de fossas agroecológicas em Sítio Nazaré, área rural de Penedo (AL). Ele destacou também a criação da Câmara Técnica de Águas Subterrâneas (CTAS), e os estudos realizados sobre Aquífero Urucuia e Cárstico. Em sua gestão, com o objetivo de aproximar a academia e o Comitê, foram realizadas expedições científicas, simpósios, fóruns e consultorias sobre temas como a transposição, UHE Formoso, estudos sobre a cobrança, Pacto das Águas, rachaduras em Lapão, estudos na Lagoa de Itaparica, entre outros. Na comunicação social, o CBHSF ampliou a campanha Eu Viro Carranca para

Defender o Velho Chico, vencedora do prêmio ANA 2020, apoia o Circuito Penedo de Cinema e publica regularmente a Revista Chico e o Boletim Travessia com as notícias e informações do Comitê, além das publicações e livros e atualização das redes sociais. Durante a Plenária, o gerente de projetos da Agência Peixe Vivo, Thiago Campos, apresentou os números e elencou as principais ações da gestão 2016 – 2020. Ele falou sobre os avanços na implementação do Sistema de Informações da Bacia, o SIGA-SF, que já está em funcionamento e disponível para acompanhamento, sobre os investimentos em projetos de saneamento básico, destacando a elaboração dos projetos básicos executivos de esgotamento sanitário em quatro municípios da bacia, sobre o monitoramento de qualidade e quantidade da água da bacia, projetos que visam a melhoria da oferta hídrica e sustentabilidade no semiárido, requalificação ambiental com proteção de nascentes, conservação de solo, restauração florestal, recuperação de áreas degradadas. CCRs Atuando como o braço do CBHSF nas regiões fisiográficas, os coordenadores das Câmaras Consultivas Regionais pontuaram as ações de destaque em suas gestões. No Médio São Francisco, o coordenador Ednaldo Campos destacou as ações realizadas na Lagoa de Itaparica, na região de Xique-Xique (BA), onde em 2017 a estiagem fez o lago secar por completo provocando a morte de milhares de peixes. “Desde então não paramos e conseguimos reunir uma força-tarefa para que aquela cena de 2017 não volte a se repetir. E para isso, foi fundamental a atuação do Comitê e de todos que deram o suporte e

apoio para que as ações acontecessem”. No Alto São Francisco, o coordenador Altino Rodrigues e o secretário Adson Ribeiro agradeceram a participação dos membros da CCR que trabalharam e batalharam pelo Rio São Francisco. “Foi uma tarefa árdua com muitos desafios mas conseguimos realizar inúmeras questões através da união que nos fortaleceu e entendo que é nesse espírito que o Comitê precisa trabalhar, neste espírito de coletividade”, ressaltou Altino. No Submédio São Francisco, o coordenador Julianeli Lima pontuou os principais desafios que passaram pela garantia de recursos para executar mais ações em prol da bacia servindo como exemplos a serem replicados como modelo para os Estados e Municípios, ampliação das ações de educação ambiental e ampliação da divulgação das ações e relação com as comunidades, entre outros. Finalizando as apresentações das CCRs, o vice-presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, apresentou as ações da região do Baixo São Francisco, destacando a realização do projeto de construção de fossas agroecológicas para o tratamento de efluentes. Também elencou, entre os desafios da gestão, a execução da política de vazões e atendimentos aos múltiplos usos, resolução de conflitos, desenvolvimento sustentável e proteção da biodiversidade, entre outros. “Precisamos mostrar que o Comitê não é uma instituição longe das pessoas e é o que a próxima gestão deve levar também em suas metas”.

Durante a plenária, foi apresentado um vídeo em homenagem aos membros do CBHSF, destacando as ações e projetos do Comitê: bit.ly/20AnosCBHSF

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Novos membros do CBHSF tomam posse em Maceió Texto: Deisy Nascimento / Fotos: Edson Oliveira

O novo colegiado do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco tomou posse na no dia 16 de setembro, para um mandato de quatro anos, de 2021 a 2025. A solenidade foi realizada de modo híbrido, tendo a parte presencial ocorrido no auditório da Associação Comercial em Maceió (AL), e transmitida pelo canal do CBHSF no youtube. Os novos “guardiões do Velho Chico” terão como desafio dar continuidade à tão sonhada revitalização do rio São Francisco por meio de ações sustentáveis que vão desde a implantação de obras de infraestrutura hídrica, Planos Municipais de Saneamento Básico, projetos de esgotamento sanitário, até trabalhos de mobilização social, educação ambiental, simpósios e seminários, ao longo deste que é o maior rio genuinamente brasileiro. Todo o processo de renovação dos 124 membros, distribuídos entre titulares e suplentes, foi conduzido pela Câmara Técnica de Articulação Institucional (CTAI), que assegurou ao processo a eleição dos segmentos representativos da entidade, como abastecimento urbano, indústria e mineração, irrigação e uso agropecuário, hidroviário, pesca, turismo e lazer, hidroeletricidade, organizações não governamentais, organizações técnicas de ensino e pesquisa, comunidades tradicionais, povos indígenas,

Ex- presidente e atual coordenador da CCR Baixo SF, Anivaldo Miranda

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consórcios, associações intermunicipais ou de usuários, além dos poderes públicos municipais, estaduais e federal. Antes da solenidade de posse, o então presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, fez um discurso de despedida. Em sua fala, ele destacou que nestes dez anos em que esteve à frente do Comitê o clima foi de democracia. “Desde o momento em que assumi, assegurei todas as condições para que as instâncias do Comitê funcionassem dentro do seu espaço regimental com inteira liberdade de debates e exercendo suas prerrogativas desde as Câmaras Consultivas Regionais, Câmaras Técnicas, Grupos de Trabalho, Grupos de Avaliação do Contrato de Gestão, bem como a plenária do Comitê que é soberana. A nova gestão vai receber um colegiado totalmente estruturado, encontrará os instrumentos de planejamento do Comitê completamente concluídos, um plano orçamentário anual, um contrato de gestão com a Agência Peixe Vivo – entidade delegatária do CBHSF - e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, firmando o Comitê como interveniente desse contrato e com um plano de recursos hídricos em andamento. Portanto, a diretoria que assumirá poderá, de forma ainda mais livre, se dedicar quase que inteiramente aos desafios estruturais da bacia e do Comitê”, disse.

Da esquerda para direita: Almacks Luiz, Maciel Oliveira e Marcus Polignano, compondo a nova Direc

Nova DIREC No período da tarde, os membros elegeram a nova Diretoria Colegiada do CBHSF, integrada pelo presidente, vice-presidente, secretário e coordenadores das Câmaras Consultivas Regionais do Alto, Médio, Submédio e Baixo São Francisco. O mandato também será de quatro anos. Concorrendo em chapa única, foram eleitos para presidente, José Maciel Nunes de Oliveira, para vice-presidente, Marcus Vinícius Polignano e para o cargo de secretário, Almacks Luiz Silva. Para a coordenação das Câmaras Consultivas Regionais foram eleitos, na região do Alto, Altino Rodrigues e Adson Ribeiro, no Médio, Ednaldo Campos e Cláudio Pereira, no Submédio, Cláudio Ademar e Abelardo Montenegro e, no Baixo, Anivaldo Miranda e Rosa Cecília. O novo presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Maciel Oliveira, iniciou sua fala cumprimentando a todos, tanto os que estavam presencialmente quanto os que se encontravam no virtual. “Comecei aos 18 anos no Comitê e 20 anos depois estou como presidente eleito por vocês. Foi um processo longo e difícil, que contou com a participação de pessoas importantíssimas. Anivaldo está deixando um legado incrível, bem como os


membros que se mobilizaram para a execução de muitas ações e projetos no decorrer desses anos. Nessa gestão queremos trazer os entes para cá, e diante disso definiremos as pautas de forma democrática. Daremos continuidade ao que aprendemos e buscaremos nesta gestão fazer ainda melhor. A gestão desse Comitê será de todos vocês. Discutiremos os problemas regionais, uniremos forças, traremos todos para junto de nós. Jamais iremos permitir que o que construímos seja destruído. Começaremos a discutir na base e continuaremos esse trabalho baseado no diálogo. Com a união dessa diretoria, iremos fazer muito pelo Rio São Francisco. Um dos pilares dessa gestão será a defesa da política pública para a melhoria da qualidade e quantidade de águas do Velho Chico. Será uma gestão participativa e democrática. As ações e projetos que terão prioridade serão os planos municipais de saneamento. Nosso papel agora será o de cobrar dos municípios esses planos municipais de saneamento. Além disso, a política de resíduos sólidos precisa ser respeitada. Outro ponto vai ser a ampliação dos projetos hidroambientais e de requalificação ambiental nos municípios, pois percebemos que eles têm trazido grandes benefícios às populações de todas as regiões onde foram implementados”, explicou. O vice-presidente eleito, Marcus Polignano, destacou em sua fala os desafios que a nova gestão vai enfrentar. “Temos todo um problema em relação à gestão das águas e o uso e ocupação de territórios. Isso é o que determina a disponibilidade hídrica, além das demandas e do modelo energético que acaba consumindo as águas do rio São Francisco. O grande desafio é trabalhar isso, sabendo que ainda temos os fatores aquecimento global e mudanças climáticas. Teremos também que investir na mudança dos

entes em termos de políticas públicas, não só em obras ou intervenções que o Comitê possa fazer diretamente, pois há situações que são ligadas ao planejamento dos estados, ao fortalecimento dos comitês de afluentes. Precisamos entender que todos nós somos parte do território e não podemos fugir da realidade. As políticas públicas deverão ser compartilhadas e isso terá que ser negociado, articulado. O Comitê tem suas possibilidades e competências, e essa articulação com os entes federados se tornará inevitável”. Polignano pontuou também que a escassez hídrica tem que ser entendida muito mais como uma questão estrutural do que momentânea. “Ela faz parte de um desenho, de um modelo de apropriação de território que está se mostrando ineficaz para o resultado, que é a produção de água para o coletivo. E aí vão sofrer desde as populações ribeirinhas, que vão ter biodiversidade e peixes em menor quantidade, até a questão do consumo da água pelos humanos, da dessedentação de animais e dos fatores econômicos que dependem da água para sua produção”, finalizou. Já o secretário, Almacks Luiz, destacou a necessidade de uma gestão mais proativa. De acordo com ele, dentre as várias atribuições da diretoria, está o acompanhamento das atividades na sala de Situação da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). “Ficaremos sempre atentos aos debates em relação ao rio São Francisco. Outro problema a ser resolvido é a questão das 56 barragens de rejeitos e nós precisamos cumprir as leis e desmontar essas barragens. Sabemos que grande parte dessas barragens se encontra em Minas Gerais e, em oito delas, está sendo estudado o reaproveitamento do material. Cerca de 1.347 pessoas terão que ser removidas da região

Na manhã do dia 17/09, os novos membros tiveram a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre o Comitê. Além da apresentação dos canais de comunicação utilizados na divulgação das ações e projetos do CBHSF, a nova gestão recebeu explicações sobre a formação das Câmaras Técnicas e CCRs, as competências da Agência Peixe Vivo e o Contrato de Gestão, o Plano de Aplicação Plurianual – PAP e Plano Orçamentário Anual – POA e o Sistema de Informações da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – SIGA SF.

em que vivem, por estarem expostas ao risco de rompimento de barragem. Dialogaremos com os membros do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) para que eles tornem as informações mais transparentes. Estes são alguns dos grandes desafios dessa nova diretoria. Vamos conciliar o prefixo eco, que forma o nome economia e, ao mesmo tempo, estabelecer o limite para esse prefixo eco que forma o nome ecossistema. Será uma missão difícil, mas buscaremos dar o nosso melhor para a proteção do rio São Francisco”.

Ouça as entrevistas dos membros da Direc em: bit.ly/PodTrav110

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Realizado diagnóstico para o enquadramento dos corpos d’água, no Alto São Francisco Texto: Luiza Baggio / Fotos: Cristiano Costa e Léo Boi A Política Estadual de Recursos Hídricos (Lei 8149/2004), estabelece como um de seus fundamentos que a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. Pensando nisso, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) realizou uma série de consultas públicas virtuais, nos dias 8 e 9 de setembro, sobre o enquadramento dos corpos de água das bacias dos rios Pará, Paraopeba e do Entorno da Represa de Três Marias, três cursos d’água do Alto São Francisco. O então presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, participou das consultas públicas e disse que o enquadramento dos corpos de água em classes é um importante instrumento de gestão. O estudo, iniciado na região do Alto São Francisco, será, segundo Miranda, ampliado para as outras regiões da Bacia. Anivaldo Miranda esclareceu que o enquadramento deve considerar os aspectos técnicos, econômicos, sociais e políticos. “O processo de enquadramento deve considerar todos estes aspectos para que sejam estabelecidas metas de qualidade das águas factíveis de serem alcançadas no horizonte de planejamento estabelecido. Se forem estabelecidas metas muito ambiciosas, os custos podem ser excessivamente altos e de difícil realização. Por outro lado, se as metas forem muito modestas, algumas situações de degradação da qualidade das águas podem se tornar irreversíveis, impedindo os usos múltiplos das águas”, explicou. Vale ressaltar que o enquadramento é um processo decisório onde estão em jogo a qualidade da água (que condiciona os usos da água), as cargas poluidoras e os custos para redução da poluição. Quanto melhor a qualidade da água desejada, menores devem ser as cargas poluidoras e maiores serão os custos para tratamento de esgotos. “O enquadramento dos corpos hídricos em classe segundo seus usos é uma ferramenta de planejamento que estabelece metas de qualidade de água a serem alcançadas ou mantidas para que se possa ter os usos pretendidos dessa água. As metas de qualidade devem ser pactuadas entre a sociedade levando em conta as prioridades do uso da água”, explica a professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Yvonilde Medeiros. 6

Além disso, é referência para o planejamento da gestão das águas e do meio ambiente, embasando diversas condutas e decisões como a outorga de direito do uso da água, definição da cobrança por esse uso, licenciamento e monitoramento ambiental. Nas consultas públicas, o engenheiro civil responsável pelo estudo, Leonardo Mitre, apresentou os resultados do diagnóstico do estudo de enquadramento de corpos de água em classes das três bacias.

“Os dados mostraram os ‘rios que temos’, ou seja, a condição atual do corpo d’água, a qual condiciona seus usos. A partir do diagnóstico, vamos analisar os ‘rios que queremos” que representa a vontade da sociedade, expressa pelos usos que ela deseja para o corpo d’água, geralmente sem consideração das limitações tecnológicas e de custos. Em outras palavras, representa uma visão de futuro para a bacia”, explicou Leonardo Mitre.

“O processo de enquadramento deve considerar aspectos para que sejam estabelecidas metas de qualidade das águas factíveis” Anivaldo Miranda

Rio Pará, em Conceição do Pará – MG


Em 30 anos, Minas Gerais é o terceiro estado que mais perdeu água superficial O estado que já foi chamado de caixa-d’água do Brasil está ficando cada vez mais seco, consequência da degradação ambiental e das mudanças climáticas. Um levantamento inédito realizado pelo MapBiomas entre 1985-2020 em todo o território nacional revela que o estado já perdeu 16% da superfície de água, o equivalente a uma perda de 118 mil hectares, atrás apenas do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Texto: Luiza Baggio/ Foto: Léo Boi O levantamento nacional aponta a perda de superfície de água em oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras, com redução em 23 das 27 unidades da federação e em todos os biomas. Um dos pesquisadores do MapBiomas Água, o professor Luís Fernando Guedes Pinto, diretor de Conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica, lembra que, das 23 unidades da Federação que sofreram redução hídrica, Minas Gerais está entre as 10 que mais tiveram perdas nas últimas três décadas. “O quadro gera maior apreensão Rio da Velhas, em Honório Bicalho (MG), já perdeu 40% de água superficial

pelo fato de o estado concentrar nascentes de bacias hidrográficas importantes, como as do São Francisco e do Doce”, disse. Segundo o MapBiomas as perdas de superfície dos principais rios que nascem em Minas Gerais são alarmantes. As bacias hidrográficas mineiras com maior redução superficial no período analisado foi a do Rio Urucuia, com queda de 45%, seguida pelos rios das Velhas e Verde Grande, com perda de superfície de água de 40% cada um, e o Paracatu, que encolheu em 25%. As quatro bacias são afluentes do Rio São Francisco.

Ainda de acordo com o estudo, a bacia federal do Rio São Francisco também sofreu diminuição global de 15% na área ocupada por suas águas. A pesquisa aponta que o complexo teve perda de 125.369 hectares de superfície hídrica, saindo dos 832.115 ha, em 1990, para 706.746 ha, em 2020. O especialista Luís Pinto aponta o desmatamento como um dos principais responsáveis pela queda na disponibilidade hídrica. “O fato de Minas Gerais ter mais nascentes significa que os efeitos da perda de águas superficiais são mais impactantes no estado. Com a continuidade dos desmatamentos, a tendência é ter cada vez menos água, uma preocupação para o futuro. Isso acende uma luz amarela”, alertou. No Norte do estado, dezenas de rios que fazem parte da Bacia do São Francisco, que há 30 anos eram perenes, tornaram-se intermitentes e estão completamente secos, assemelhando-se a estradas. É o caso do Rio das Pedras, no município de Glaucilândia. Mudanças climáticas O aumento de temperatura global de 1,5º C, com contribuição significativa pelas ações humanas, segundo o relatório recente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC), pode estar contribuindo para esse processo de redução de superfície de água no Brasil. Vários casos indicam os efeitos combinados do uso da terra e das mudanças climáticas. Esse é o caso do Rio São Francisco que corre por áreas de Cerrado e Caatinga. Os dados analisados mostram que há tendência de decréscimo na superfície de água, especialmente na margem esquerda, onde ficam as regiões de fronteiras agrícolas. A redução foi notada nos últimos 15 anos, que coincidem com o período de expansão agrícola no Matopiba, região formada por áreas majoritariamente de Cerrado nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. O maior consumo de água dessas atividades, combinado ao assoreamento da calha do rio devido a fortes intervenções e períodos de seca típicos da região por onde o Velho Chico passa, resultou em uma redução de 10% em sua superfície de água nos últimos quinze anos. Em sua foz, as comunidades já sentem os efeitos, com a invasão do rio pelo mar. 7


Dois

Como o senhor pretende conduzir os trabalhos ao longo dos próximos quatro anos? De agora em diante vamos trabalhar de forma muito democrática e participativa, ouvindo as bases, e voltado para as bases. Temos que mostrar para elas o trabalho que o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco vem desenvolvendo e como podemos ainda fazer mais. Vamos discutir muito com o governo federal e com os governos estaduais a questão da revitalização do São Francisco, pauta prioritária deste Comitê, e fazer com que ela saia do papel. Vamos discutir também o nosso Plano de Recursos Hídricos, principal instrumento de gestão, não só do Comitê, mas de todos que tem ações previstas para esta bacia, sejam os governos municipais, estaduais ou o governo federal, e a iniciativa privada. É preciso observar a forma como está sendo discutida a questão dos reservatórios. Nós ampliamos essa discussão, participamos da Sala de Situação da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, que foi extraordinária.

dedos de

prosa

Quais ações em prol da revitalização da Bacia serão priorizadas? Fizemos um trabalho incrível, que foi a elaboração dos Planos Municipais de Saneamento Básico, encaminhando-os aos municípios e fazendo parcerias. Agora, nós vamos fazer o inverso: vamos cobrar dos municípios a execução desses Planos. Precisamos fazer com que eles não fiquem na gaveta e que sejam colocados em prática, para diminuir a quantidade de esgoto que é lançado no rio São Francisco. Precisamos que a política de resíduos sólidos seja respeitada. Em relação ao abastecimento humano, muitas regiões e populações nas margens do São Francisco ainda não são atendidas por abastecimento de água. Também vamos ampliar os projetos de requalificação ambiental, pois já temos várias experiências exitosas. Precisamos ampliar para o semiárido, que ocupa mais de 60% do território da bacia do São Francisco. Vamos ter um olhar de revitalização sobre o semiárido e sobre as nascentes dos rios afluentes. Vamos trabalhar na recomposição das matas ciliares.

José Maciel Nunes de Oliveira Eleito em chapa única no dia 16/09/2021, José Maciel Nunes de Oliveira assume o cargo de presidente do CBHSF para a gestão 2021-2025. Graduado em Comunicação Social e especialista em Recursos Hídricos e Gestão Pública (mestre e doutor), Maciel traz em seu currículo passagens pela Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas, Escritório Regional da Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA), em Salvador, Prefeitura de Penedo, entre outros. Além disso, coordena a Fiscalização Preventiva Integrada (FPI), uma ação do Ministério Público e conquistou o 1° lugar do Prêmio do Conselho Nacional do Ministério Público, com o Projeto Nascentes do São Francisco. Conversamos com ele sobre os planos e expectativas para os próximos quatro anos. Leia:

Entrevista: Mariana Martins

travessia Notícias do São Francisco

Presidente: José Maciel Nunes Oliveira Vice-presidente: Marcus Vinícius Polignano Secretário: Almacks Luiz Silva

Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607

Comunicação

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Apoio Técnico

Outra prioridade são as populações indígenas e quilombolas, pois são elas que cuidam dos rios e das matas e queremos aprender também com essas comunidades. Fale um pouco sobre a sua trajetória no Comitê e nas causas ambientais. Cheguei como um jovem aprendiz, aos 18 anos, em 2001, época em que discutíamos a criação de um Comitê. Então fizemos todo um trabalho de mobilização para a criação do CBHSF, que era algo esplendoroso e muito sonhado. A criação virou um marco: o CBHSF foi o único comitê de bacia que subiu a rampa do Palácio do Planalto para tomar posse, e eu estava lá. Eu sempre fiquei nos bastidores, nas mobilizações. Fui membro da Câmara Técnica de Articulação Institucional (CTAI). Trabalhei no escritório Regional da ANA, em Salvador, prestando serviço ao Comitê. Eu organizava as Plenárias, as reuniões técnicas, todo esse trabalho de bastidor, que não aparece. Tínhamos a questão da implantação da cobrança pelo uso da água e, em 2010, fui convidado por vários membros do Comitê a me tornar membro da Secretaria Executiva. Fiquei surpreso na época, pois era um Comitê que tinha como presidente um Ministro de Estado e a diretoria era composta por secretários de Estado, autoridades muito maiores. Mas naquele momento, o pessoal disse: precisamos de pessoas que conhecem o rio, que conhecem o povo do rio e que saiba defender isso. Então eu assumi o compromisso em 2010, quando fui secretário do Comitê. Fui reeleito neste cargo e depois fui eleito vice-presidente. Agora, assumo o cargo de presidente de um colegiado que representa um dos maiores colegiados de bacia hidrográfica do mundo, em atividade. Então é com muito orgulho que eu chego até aqui, com muita história, com muito estudo, madrugadas perdidas em aeroportos, muito chão, falta de dinheiro, porque não tínhamos recursos antes da implantação da cobrança. Mas chegamos aqui, e daqui pra frente teremos um trabalho muito bacana pra realizar.

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF – Tanto Expresso comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Deisy Nascimento, Juciana Cavalcante, Luiza Baggio e Mariana Martins Fotos: Cristiano Costa, Edson Oliveira e Léo Boi Diagramação: Sérgio Freitas Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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