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SABER ANCESTRAL

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Movimento Plus Size ganha força em Brasília e resgata a autoestima de mulheres acima do peso

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JOYCE JARDIM

Aautoestima é a capacidade de o ser humano se gostar, se aceitar e admirar as próprias qualidades. Após cinco anos em depressão, a empresária e modelo Janaína Graciele de Brito, 40 anos, viu em si todas essas qualidades após sofrer preconceito por estar acima do peso. “Tornei-me miss depois de ter engordado 30 quilos, viver um casamento falido e ficar em segundo lugar em um concurso com 27 candidatas. Vi que podia dar a volta por cima e renasci”, lembra.

Após o concurso, começou a publicar fotos nas redes sociais. Foi assim que surgiu o grupo BSB Plus Size, com dicas e sugestões para mulheres que vivenciavam problemas semelhantes. Hoje, a fanpage @calendarioPlusSizeDF conta com 35 mil curtidas. O grupo trata da autoestima para resgatar aquelas que não se sentem bem com o corpo. Promove ensaios fotográficos, reuniões, palestras, campanhas, desfiles e jantares. Janaína lembra que, até poder ajudar outras mulheres, perdeu o emprego e se sentia alvo constante de olhares preconceituosos.

A também modelo Vanusa Domingas Guimarães, 39, reclama do preconceito da sociedade por estar longe dos padrões estabelecidos pela indústria da beleza. Não sabia como reagir às críticas, tanto da família quanto da sociedade. Sobrava angústia e, para piorar, assim como Janaína, perdeu o emprego. “Foi uma fase muito difícil, por não conseguir trabalho só por causa do peso e olhares tortos”, lembra. Há três anos conheceu o projeto que mudou a vida dela. Atualmente, é modelo e Miss Brasília Plus Size 2017. O grupo a ajudou a se sentir bem, aceitar o corpo e ter mais confiança em si. “Não é o corpo que delimita o que você pode ou não fazer”, avalia. Esbanja sensualidade, autoestima e um sorriso que nunca sai de seu rosto. "Passei a me amar e ver que sou bonita e atraente, mesmo sendo gordinha".

De acordo com dados divulgados pelo Ministério da Saúde em abril deste ano, uma em cada cinco pessoas no país está acima do peso. Nos últimos anos, as empresas de moda passaram a

VANUSA, VERÔNICA e Janaína fazem parte do grupo BSB Plus Size

investir no setor para suprir a necessidade do público. Em geral, para calcular se a pessoa está acima do peso, é usada uma calculadora para medir o Índice de Massa Corporal (IMC), tabela da Organização Mundial da Saúde calculada a partir do peso dividido pela altura, com esta multiplicada duas vezes. O resultado considerado normal deve estar entre 18,5 e 24,9.

A consultora de beleza Verônica de Lima Silva, 31, tem IMC de 28,34. Desde os 9 anos lembra ter passado por preconceito por estar acima do peso. Os apelidos começaram na escola, mas o que mais a magoava era saber que em casa eles continuavam. A adolescência foi conturbada e o início da vida adulta também. Fazia academia, caminhada, mas sempre ouvia comentários sobre o

“É muito triste viver em uma sociedade na qual o diferente é tratado como lixo” Janaína Graciele, empresária e modelo Plus Size

peso por onde passava. Emagrecer virou obsessão. Começou a pegar pesado nos exercícios e o resultado foram sintomas de bulimia. “Tudo que comia eu corria para o banheiro e vomitava. Cheguei a tomar laxantes e remédios para perder peso”, lembra.

Com ajuda de um amigo, após desabafar todas as suas angústias e problemas, encontrou um ponto de apoio. Começou a mudar, a se amar e a gostar do que via no espelho. A partir daí, começou a postar fotos e se aceitar cada dia mais. Foi nesse período que ela conheceu o grupo da Janaína e vários relatos similares aos dela. Entre idas e vindas no grupo, encontrou coragem para atuar como modelo. “Todas as meninas me receberam muito bem. Voltei com tudo, com mais coragem, com vontade de me jogar. Fui convidada para fazer grandes ensaios fotográficos por vários profissionais”, revela. Foi assim que ganhou o concurso de Miss Ceilândia. A endocrinologista Michele Borba explica que é possível ser saudável mesmo estando com sobrepeso ou obesa. Mas alerta que, a longo prazo, os quilos a mais podem trazer doenças. “O biotipo e o peso tornam-se um problema sociocultural quando limitam a produtividade do indivíduo, o seu convívio em família”, observa a médica. Para ela, os padrões impostos pela indústria fitness não

OBESIDADE CRESCE 60% EM DEZ ANOS NO BRASIL

Dados divulgado pelo Ministério da Saúde revelam o aumento da obesidade no Brasil. Segundo o levantamento, uma em cada cinco pessoas no país está acima do peso. A obesidade passou de 11,8%, em 2006, para 18,9%, em 2016. O índice de obesidade aumenta com o avanço da idade, mas, mesmo entre os brasileiros de 25 a 44 anos, o indicador é alto: 17%. O excesso de peso também cresceu entre a população das capitais. Passou de 42,6% para 53,8% em 10 anos. Os números fazem parte da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), realizada em todas as capitais brasileiras.

ENDOCRINOLOGISTA MICHELE Borba explica que é possível ser saudável mesmo acima do peso Foto: Arquivo Pessoal

SOBREPESO

Com base em dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o sobrepeso em adultos no Brasil passou de 51,1% em 2010, para 54,1% em 2014. A tendência de aumento também foi registrada na avaliação nacional da obesidade. Em 2010, 17,8% da população era obesa; em 2014, o índice chegou aos 20%, sendo a maior prevalência entre as mulheres, 22,7%. Outro dado do relatório é o aumento do sobrepeso infantil. Estima-se que 7,3% das crianças menores de cinco anos estão acima do peso, sendo as meninas as mais afetadas, com 7,7%.

se encaixam em toda a população. “As pessoas perdem o parâmetro de hábitos saudáveis para seguir regras e desejos ditados pela mídia”, afirma Michele.

Os padrões de beleza impostos pela mídia e publicidade hoje já passam por transformação. A variação estética visa garantir espaço para novas fatias de mercado. Para o publicitário Carlos Leonardo Gomes, o cenário da indústria tenta impor um corpo que considera perfeito, com mulheres excessivamente magras. “Acredito que não existe um corpo perfeito, corpo perfeito é o seu”, afirma.

Segundo dados da Associação Brasileira do vestuário (Abravest), o mercado plus size cresce 6% anualmente e movimenta cerca de R$ 5 bilhões. Esse percentual corresponde a cerca de 300 lojas físicas e aproximadamente 60 virtuais. A expectativa, segundo a associação, é de um crescimento de pelo menos 10% ao ano. Cerca de 30,4% das 19.434 empresas que fabricam moda feminina já incluem o plus size nas linhas de produção. A jornalista e modelo plus size Rafaella Ferreira, 30, descobriu este universo ao buscar roupas para si. "Antigamente era muito difícil achar roupa, aí a gente começa a pesquisar e procurar e saber que o mundo Plus está muito na moda", comenta.

O projeto BSB Plus Size foi um incentivo para que ela encontrasse voz na sociedade e, dessa maneira, pudesse demonstrar que vai além do rosto bonito. "A gente tem um corpo, uma beleza, educação. A gente sabe andar, falar, conversar e não é só um rostinho bonito”. A modelo ainda conta que conheceu o projeto após vencer o concurso miss Paranoá Plus Size em 2016.

Naquele ano, também conquistou o título de Princesa do Distrito Federal na categoria. Apesar das vitórias, o preconceito ainda está presente em pequenas situações do dia a dia. "As pessoas torcem para você não passar na catraca do ônibus, olham torto quando entra em uma loja e pergunta se tem determinado modelo do seu tamanho", diz. "Eu me sinto bonita e o concurso veio para elevar a minha autoestima" Rafaella Ferreira, jornalista e miss Paranoá

Denise Comel, 37, é designer de acessórios. Nunca deixou que a autoestima fosse abalada por estar acima do peso, apesar de se sentir mal até mesmo entre os familiares. Para tentar ajudar as mulheres que passavam pelo processo de não aceitação do corpo, Denise criou um perfil no instagram chamado @cadeseujeito. Ela posta frases motivacionais que incentivam as mulheres a se aceitarem do jeito que são. Já ajudou muitas mulheres a superar o preconceito e a levantar a autoestima com dicas de beleza, acessórios e roupas. Mas não é só as mulheres que a procuram, ela já aconselhou vários homens casados que tentam auxiliar as esposas. Para Denise, a mídia tem uma grande responsabilidade por algumas pessoas se sentirem assim e não conseguirem se aceitar. “A própria mídia é muito taxativa, sempre coloca o gordo associado a problemas de saúde”, destaca. O perfil dela no instagram, no qual dá dicas de look do dia a dia e empoderamento, tem 239 seguidores.

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