Revista CFMV 65

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Abril A Junho 2015 ano xxI brasília df ISSN 1517-6959

Revista

Educação em Saúde Conheça projetos de saúde pública e iniciativas das universidades

Empresas Rurais Profissionais são determinantes para maior eficiência e competitividade

Profissão

responsabilidade técnica Saiba mais sobre a área que emprega um quarto dos Médicos Veterinários e Zootecnistas do Brasil ENTREVISTA

Mauro Lantzman

Especialista em comportamento de cães e gatos



SUMÁRIO

nº 65 Abril a Junho 2015

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CAPA 30 Entendendo a Responsabilidade Técnica

05 ENTREVISTA Mauro Lantzman - especialista em comportamento de cães e gatos 08 Os novos campos de atuação da Medicina Veterinária 10 Como influenciar políticas públicas? 12 Transdisciplinaridade na conservação da vida no planeta 14 Meio ambiente: perspectivas e desafios para Médicos Veterinários e Zootecnistas 19 Quem é o Zootecnista? 20 CFMV na mídia 21 Construção conjunta das metas 22 Destaques CFMV 24 Mudança em resolução ajuda a ampliar procedimentos de controle populacional de cães e gatos 25 Inovações tecnológicas em incubatórios 38 Interação com o tratador reflete na produção 41 Educação em saúde 49 Interface entre bem-estar e maus-tratos 52 Maior demanda por gestores nas empresas rurais 55 O herpesvírus bovino tipo 1 e sua ação em receptoras no estado do Acre 59 Em dia com a fiscalização 60 Suplemento científico

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41 49


EDITORIAL

Marcar terreno

A Responsabilidade Técnica é uma das atribuições da Medicina Veterinária e da Zootecnia e está diretamente relacionada à garantia da saúde da população, bem-estar dos animais e qualidade dos serviços prestados com padrão ético. É um segmento no qual estamos investindo e trabalhando para que a atuação tenha sua importância reconhecida pela sociedade, mas muito ainda é preciso ser dito e feito. A Responsabilidade Técnica emprega, pelo menos, um quarto dos profissionais do Brasil. Sabemos que esses números podem ser ainda maiores, pois são dezenas de setores que dependem do aval e garantia de um Médico Veterinário e Zootecnista. Precisamos estar mais presentes e tomar nossos espaços, pois temos formação ampla e generalista, que nos permite realizar uma gama de ações. É preciso marcar terreno e essa batalha é de todos. No Congresso Nacional, o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) está atento para garantir que os Médicos Veterinários e Zootecnistas estejam elencados nos projetos de lei de sua área de atuação. Nos estados, os Conselhos Regionais fazem o papel de orientadores e fiscalizadores. Nesta edição, além da ampla discussão sobre o assunto, fala-se sobre importantes exemplos da educação e da atuação em saúde pública. Há artigos sobre perspectivas e desafios no meio ambiente e a importância da transdisciplinaridade nessa área. Diversos outros temas técnicos completam a pauta. Boa leitura!

Benedito Fortes de Arruda Presidente do CFMV

A Revista CFMV é trimestral e destina-se à divulgação de ações do CFMV, de promoção da educação continuada e de valorização da Medicina Veterinária e da Zootecnia. Distribuída a todos os

AGRIS L70 CDU619 (81)(05)

É permitida a reprodução de artigos da revista, desde que seja citada a fonte. Os artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores, não representando, necessariamente, a opinião do CFMV. As fotos enviadas serão automaticamente cadastradas no banco de imagens do CFMV com o devido crédito.

EXPEDIENTE

profissionais atuantes, está disponível em www.cfmv.gov.br. É indexada na base de dados Agrobase.

Conselho Federal de Medicina Veterinária SIA – Trecho 6 – Lotes 130 e 140 Brasília-DF – CEP 71205-060 Fone: (61) 2106-0400 Fax: (61) 2106-0444 www.cfmv.gov.br cfmv@cfmv.gov.br Tiragem: 100.000 exemplares Diretoria Executiva Presidente Benedito Fortes de Arruda CRMV-GO no 0272 Vice-Presidente Eduardo Luiz Silva Costa CRMV-SE no 0037 Secretário-Geral Marcello Rodrigues da Roza CRMV-DF no 0594 Tesoureiro Amilson Pereira Said CRMV-ES no 0093 Conselheiros Conselheiros Efetivos Adeilton Ricardo da Silva CRMV-RO no 002/Z Cláudio Regis Depes CRMV-SP no 4010 Gerson Harrop Filho CRMV-PE no 0678 Gilmar Nogueira Rocha CRMV-AM no 0195 Moacir Tonet CRMV-SC no 0837 Sérgio Carmona de São Clemente CRMV-RJ no 1537 Conselheiros Suplentes Felipe José Feitoza Bastos CRMV-AL no 0451 Flávio Pinto de Oliveira CRMV-PB no 0385 Laudélio Santos Fonseca CRMV-BA no 0599 Nordman Wall Barbosa de Carvalho Filho CRMV-MA no 0454 Reginaldo Santos Nogueira CRMV-TO no 0164 Rísia Lopes Negreiros CRMV-MT no 1379 Conselho Editorial Presidente Marcello Rodrigues da Roza CRMV-DF no 0594 Líder da Área de Comunicação Lívia Domeneghetti Davanzo Editor Ricardo Junqueira Del Carlo Subeditora Flávia Tonin Revista CFMV Editor Ricardo Junqueira Del Carlo CRMV-MG no 1759 Jornalista Responsável Flávia Tonin MTB no 039263/SP Projeto e Diagramação Ideorama Comunicação Ltda Impressão Azul Editora e Indústria Gráfica Ltda


ENTREVISTA

Há uma mudança nos critérios de definição de uma família tradicional. Se, antes, os laços eram estritamente de sangue entre pai, mãe e filhos, hoje, são ligações afetivas que unem pais, filhos e pets. Quais são as consequências disso para os animais? É importante entender que vivemos um período de mudanças sociais e econômicas, com melhora do poder aquisitivo, redução do espaço de moradia e produção cultural, que ampliam a relação entre animais e pessoas. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em junho, mostram que 44% dos domicílios do Brasil possuem pelo menos um cachorro e a média é de 1,8 por domicílio. Todos esses elementos trouxeram como consequência um aumento na intimidade, que, somado às diferenças nas necessidades de bem-estar e forma de comunicar, levou ao surgimento de queixas relacionadas ao comportamento do animal de estimação. As dificuldades de relacionamento se ampliam, pois os profissionais e as pessoas envolvidas não conhecem o comportamento do animal, ocasionando distúrbios de relacionamento e de educação.

Mauro Lantzman No início de sua carreira, o Médico Veterinário (CRMV-SP nº 3828), formado em 1982, não imaginava que seguiria para a área de comportamento animal nem que ela seria promissora nos dias atuais. Sob influência da homeopatia, psicologia e etologia, buscava respostas científicas para suas indagações, como, por exemplo, o “sintoma mental”, fator a ser considerado no diagnóstico de qualquer enfermidade. Doutor em Psicologia Clínica, em 2004, aliou o conhecimento de comportamento animal ao entendimento do ser humano e da dinâmica das famílias e, com isso, conseguiu ampliar o índice de acerto em suas intervenções. Seu trabalho não é o adestramento, mas a intervenção no comportamento dos pets em conjunto com a família. Atualmente, também é professor assistente da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Quais são os principais distúrbios comportamentais da atualidade? O principal é a ansiedade de separação, pois as pessoas trabalham o dia todo e o animal fica sozinho em casa. Outros são: agressividade, medo de fogos de artifício e desobediência, todos com frequência cada vez maior. Quais são as principais causas que levam a esses distúrbios? O principal motivo está na falta de orientação dos tutores ou na orientação errada quando vão adquirir um animal. Por exemplo, escolhem ter um animal por estarem sozinhos, mas não consideram que trabalham fora de casa o dia todo; optam pela raça da moda ou exemplo da novela e não consideram as necessidades mínimas de comportamento peculiares. Os Médicos Veterinários, por sua vez, fazem orientações sobre alimentação, saúde e higiene, mas pouco sabem e falam sobre comportamento social, aprendizagem e comunicação do animal. Como é a dinâmica do diagnóstico de problemas comportamentais? É importante ir até o ambiente do animal. Vou até a casa e converso com o proprietário sobre as queixas, relatos e

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ENTREVISTA Mauro Lantzman

questões específicas. A partir da

principalmente os princípios da

sultado é o uso indiscriminado ou

conversa e observação, que duram

etologia, enquanto a segunda tem

inadequado de estímulos aver-

uma hora e meia, identificamos a

uma abordagem mais próxima da

sivos ou punitivos, que podem

intervenção necessária. Veja, não

psiquiatria. De qualquer modo, a

levar à piora do comportamento

falamos em tratamento, mas em

medicina do comportamento é

animal. Por outro lado, o adestra-

intervenção. A pessoa é orientada

uma especialização do Médico Ve-

dor que tem boa formação é um

sobre como proceder no que diz

terinário recente. Essa é uma área

parceiro importante do Médico

respeito à forma de se relacionar,

em que a pesquisa está cada vez

Veterinário consultor em compor-

comunicar, ensinar, dar limites, mas

mais avançada, com revisão con-

tamento animal. O adestramento

os protocolos são adequados à rea-

tínua de suas teorias e constante

é parte da intervenção do com-

lidade de cada família. A psicologia

atualização de seus protocolos

portamento e seu uso deve ser

me orientou sobre o que e como

de intervenção.

planejado e acompanhado com

falar com as pessoas. É preciso

Existe

relação

cação

de

comprometimento, uma vez que a intervenção é feita, na maioria dos casos, pela família. No início, como ainda não compreendia o sistema familiar e seu papel no desenvolvimento e manutenção do comportamento do mascote, meus resultados eram desanimadores, mas, atualmente, tenho sucesso na quase totalidade dos casos, pois entendo melhor a família, suas relações e

entre

modifi-

comportamento

e

adestramento? O adestramento é um método que tem como objetivo instalar ou modificar o comportamento de

cuidado pelo Médico Veterinário. A terapia medicamentosa é necessária? Quais são os princípios para sua aplicação em animais portadores de distúrbios comportamentais?

um animal por meio de técnicas

É muito comum o Médico Vete-

que derivam dos estudos de B. F.

rinário

Skinner (1904-1990). No Brasil,

como, por exemplo, ansiolíticos

são poucos os adestradores que

para o “tratamento de ansiedade

recebem formação técnica. O re-

de separação”. De fato, esses fár-

receitar

medicamentos,

a forma de nos comunicarmos com as pessoas. O que são questionários e testes comportamentais? São métodos para abordagem do comportamento animal, que utilizam o tutor como fonte de informação (questionários) e instrumentos de observação e análise do comportamento (testes comportamentais). É preciso ressaltar que o uso dessas metodologias varia de acordo com a linha de abordagem e intervenção – a anglo-saxônica ou a francesa. A primeira segue

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Há maior intimidade e interatividade entre pessoa e animal, o que reflete em seu comportamento


ENTREVISTA Mauro Lantzman

macos reduzem a ansiedade, mas não tratam realmente o “problema”. Para que a atuação do profissional seja eficaz, é necessária a combinação do fármaco com uma intervenção que considere o ambiente físico, o animal, o tutor e sua família. Há uma expectativa de que a população de gatos supere a de cães em 2020. Como o senhor vê essa mudança e as consequências? O Médico Veterinário precisa estar preparado para orientar sobre as particularidades dos gatos, responsabilidades e necessidades de bem-estar. Se não houver uma conscientização, o reflexo será a frustração do tutor e sua familia, o aumento do comprometimento do bem-estar dos animais e, pior, o abandono, como se vê com os cães. Os Médicos Veterinários e Zootecnistas estão preparados para lidar com problemas comportamentais dos animais? Quais são as consequências? O despreparo tem por base a formação, uma vez que, até os dias de hoje, não se dá o devido valor ao comportamento animal. A disciplina de etologia (básica e aplicada) deveria ser, pelo menos, optativa nos cursos. Como o profissional pode promover o bem-estar se não conhece o comportamento animal normal? Em sua publicação Recommendations on the competencies of graduating veterinarians,

Um distúrbio de comportamento é a ansiedade de separação, pois os animais ficam sozinhos em casa

a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) indica que o Médico Veterinário deveria receber formação específica em bem-estar animal. Quantas são as faculdades de Medicina Veterinária que seguem essa recomendação e têm em seus currículos essas matérias? Em todos os eventos em que sou convidado a dar palestras, aulas e minicursos percebo a demanda de alunos e profissionais formados. Eles vêm em busca de respostas e orientações para perguntas e queixas associadas ao comportamento, cada vez mais frequentes em seus consultórios. Como é o mercado de trabalho na área? Pode deixar algumas palavras para o graduando que se interessa pelo assunto? São dois mercados: o clínico geral, que agrega esse conhecimento no seu cotidiano, e o profissional que

atua na área de medicina do comportamento. Em relação a este, tenho observado o crescimento no seu número e também de alunos interessados em se especializar na área. É um mercado com potencial forte e em crescimento, mas que precisa ser desenvolvido. Depende da conscientização e indicação do Médico Veterinário clínico que, muitas vezes desconhece como orientar ou indicar o profissional competente. Quem quer entrar na área deve buscar muita informação e estudo. Para quem quer se formar nela, recomendo cursos de especialização e mestrado na Inglaterra, Espanha e Estados Unidos. No Brasil, temos alguns cursos de curta duração a distância e estamos iniciando alguns projetos para cursos presenciais de especialização. Quanto maior for o conhecimento, maiores serão a conscientização e o mercado de trabalho.

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ESPECIAL Institucional

Os novos campos de atuação da Medicina Veterinária Em comemoração aos 20 anos da Revista CFMV, convidamos autores para que fizessem uma releitura de seus textos publicados em edições anteriores. Nesta edição, o artigo aborda os desafios da profissão, principalmente na saúde pública to Suplemen

TÉCNICO

O artigo abordou que a produção de proteíofissão r p a m u e na animal, para atender à demanda da população esafios d d e s e 1 c a f las mundial, que cresce, por vezes, a índices alarmanAs múltip Veterinária Graça Becker Dutra 2258 a in ic d e M Maria da MV-RS n . tes em muitos lugares, e a necessidade de produzir terinária, CR chamada ta do Médica Ve sora Adjun o

ologia que to e de tecn pessoas portamen s m da co de da ções ente, a vi s. A das altera cessantem ais diferentes povo s e as profun caram, in m ifi s e do od do A evolução m es var a saúd edad mundo ci er no so es s pr m o ta ra distin l missã ocorre u perfil. As eguinte, as mo principa ificou o se de e, por cons rinária, que tinha co humanidade, mod os índices Vete a da aumentar , na ia ra nc pa üê Medicina m ra eq odutiva e uí ns pr rib co ia nt de co em ca muito rado ças na animais e, al, encont ias, que em asionaram mudan im og an ol e cn ad te novas missão de na densid idade, oc e produtiv ce a trans o aumento produção que favore orações intensivas s animais. s do re to da fa vi de dos ssas expl entos qualidade ões, é um dejetos de ão dos alim um s exploraç ém disso os para a contaminaç em muita idor exige nicos, e al m um gê ue ns to rib co pa nt s te do agente ente e co o, o merca deve estar conscien meio ambi No entant poluem o safios que veterinário produtiva. o de ia ic s de éd do ca m e e o senvolao longo da qualidade. nal junto à sociedad odutor, de ócuo e de profissio junto ao pr rebanhos, com produto in sabilidade o inicia no campo s on do sp ria re de tá a da su trabalh ade sani e através frentar. o m a qualid espécie produtora deverá en e melhore entos com da qu im ca al es de de ad id ão erta vendo ativ limites de exploraç ssidades ação e of s na elabor prir as nece respeito ao utivos adequados; ades ideais para su biente. od am tid pr o an ei as qu m e em sistem ão do inocuidade e na proteç blica. garantia de es atuais e futuras s, saúde pú laçõ , alimento das popu en ambi te o ei m , io veterinár : médico unitermos

RESUMO

ta, Profes UniEspecialis terinária da ) edicina Ve Curso de M ana do Brasil (ULBRA ter Lu cretaria de versidade blica da Se Pú ria ná Funcio - RS. dência: Agricultura ra correspon 302 Centro Endereço pa do 386/ ha ac M 0 do Rua Fernan P: 90010-32 e – RS - CE Porto Alegr ra@uol.com.br ut E-mail: mgd

alimentos, não associada aos padrões de sustentabilidade, exercem uma pressão cada vez mais intensa sobre as condições que tem o planeta de sustentar a vida. Perseguir o equilíbrio entre incremento de produção e ecossistemas protegidos é

UçãO INtrOD uma a ser elaborada e executada por todas as s ravémeta de 1968, at o br tu ou ária rin te Em 23 de Ve a icin nações, em prol do desenvolvimento sustentável 517, a Med éda Lei nº 5. rasil e aos M entada no B estabelecifoi regulam 2000). ube o (OLIVEIRA, co s io ár s dicos Veterin as atividades inerente rs ve ia da mento de di o, a histórOutro ponto abordado, na ocasião, foi a atuação s . Entretant à profissão remonta ao ia ár in er et V ade, id an m Medicina hu da do Médico Veterinário na fiscalização da sanidade os tempos em mais remot ando o hom olítica - qu o olhar imal,produtos na Era Mes de origem animal. Considerando que ro ande ei im pr o , se domesticou embrionário , ainda que asdeEnfermidades da o nh se Transmitidas por Alimentos (ETAs), veterinário vo te nesse no ção fazia presen . Essa rela al d m ni lle /a ca em o n m na sua maioria, têm origem nos produtos iada egrande relação ho professio o ampl CT nges of a ente foi send do convívio ABSTRA paulatinam and challe rueir subprodutos de origem animal, a fiscalização s e uf ce in in us fa ic d a le rre ed ou ip cu ss de ym nology oc homem pa The mult sas relações veterinar as its r and tech pécies. Des , that had e behavio humano e de várias es ersocumprimento tions in th y medicine alth, iv ra ar he un te rin do de normas e leis para produção, ’s o al te ity ve tre ep an en ão ality. The ntly hum ion and de intimidade cil a obtenç prove the conseque society’s re The evolut ava mais fá a necessámuch to im fic health and anged the al so ’s ch n. e al im ai ld ut im an ch or rib er w o an e e comercialização desses alimentos the ais uctiv erve at cont . Não mmanipulação a ion to pres new technologies th changes in the prod at do alimento o dantes. O couro e main miss d e e factors th profile. Th , occasione orations is one of th s com aiuma ion of r m ct ça s je ca õe changes its tes and productivity de pl constitui importante função do Médico Veo aç e ex ri liz many ra CFMV 37:46-49, Revista es that, th d in 2006 ram às civi bitacionais facility of and besid production nsity foun lã permiti to this, the oduct. ha ic agents animal de ng as en di of ri og ad ho ise d th el ra pr an pa m o d The terinário. ion of onment and qualifie society primitivas io. Por outrAs ETAs têm sido, nos últimos anos, foco transmiss te the envir innocuous contra o fr favor the a ation pollu ility in the mands an ive explor e a proteção cessidade de manter uctor l responsib od g market de na pr in sio e this intens um th es ne de discussões, havendo preocupação e busca por ns a ith prof ion of co country w do, havia a are of his la entes e, aind thetexto awescrevemos sc nsidering in o na be contaminat m ts co t ar os s, us st 2006, As múltiplas faces e rd nh m k he reba um s e wor the arian r, e do Th of rin ze tiv . e te di ity uc ce úd ve al m fa od sa e Th will ry qu por assi suitable pr se, estratégias the sanita allenges he com-que permitam o seu controle e, assim, d through não houves sness in at improve and the ch desafios queVetel e qual é chamada g specie an of innocuou Medicina activities th de uma oducinprofissão terinário ta in the ssos ve garantee d o no an ith ic developing ploration of each pr w ns em éd l ly tio m la a garantia de colocação de produtos seguros no iona ex food supp ture popu esse profiss os se the limits ofcom ation and ent and fu rinária, oorobjetivo de participar do concurso promovipres preendido e aos pouc s of in the elab qu ed s; – ne s e em ai th st ly im mercado (DUTRA, 2006). sy ies to supp dias, os an

E

tit

l quan idea do pelo ItCongresso Nacional de Saúde Pública Veterinária.da premiação na área: A Medicina protection. environmen participar ência para como exigda Conforme Dos Anjos (2005), a cada dia o merrinária Na ocasião, levantaram-se pontos essenciais Veteatuação terinária, e Pública dicina Ve deral de Me

nselho Fe

úd

nal de Sa

sso Nacio

Congre MV- Co rante o I ado ao CF do raMédico humasentVeterinário 06 orrido ducomo profissional da saúde balho apre à mesa oc /Abril de 20 ¹T po ia do cam Veterinár

cado de alimentos é inundado por novos produtos

na e animal, além de uma visão holística sobre a produção f - Ano

e formulações e cabe ao Médico Veterinário pro-

de alimentos de origem animal e o ambiente, em que o

por e exercer o controle e a vigilância das boas

grande desafio era o aumento da produção sem preju-

práticas de fabricação, identificando estabeleci-

dicar o meio ambiente, considerando também a questão

mentos irregulares, com o objetivo de prevenir a

asília/d fMV - Br Revista c

8

/Março

/fevereiro

Janeiro XII - Nº 37

do desenvolvimento sustentável, temas que continuam

incidência de agravos. Tal abordagem não deve

atuais e importantes.

ser entendida como estigma da pequena e média

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A cada dia, o mercado de alimentos é inundado por novos produtos e cabe ao Médico Veterinário propor e exercer o controle e a vigilância das boas práticas

de doenças e promoção da saúde. A referência passou a ser a atenção integral na busca da integralidade da saúde (SOUZA, 2011). Posteriormente, o Ministério da Saúde, por meio da Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, aprovou a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo novas diretrizes e normas para a Estratégia da Saúde da Família, que inclui o Médico Veterinário como um dos profissionais habilitados a compor as equipes, entendendo que seus conhecimentos de epidemiologia muito contribuem para a Saúde Única. O movimento busca a conscientização de profissionais em relação ao conceito de que para as doenças não há separação entre os animais, o homem e o ambiente.

Por fim, a pauta foi sobre os novos desafios da Medicina Veterinária. Neste ponto, deu-se ênfase ao bem-estar animal, pois alerta Figueiredo (2002) que as obrigações com os animais dizem respeito a princípios bioéticos, focados no bem-estar da sociedade e dos animais.

A Medicina Veterinária, assim como as demais profissões que compõem o NASF, deve desenvolver estratégias multiprofissionais em relação à prevenção e controle de doenças e agravos à saúde. Entretanto, cabe ao Médico Veterinário o manejo das questões ambientais e a adoção de medidas para o controle de agentes e patógenos no território e domicílio, visando à diminuição de riscos e agravos à saúde, além de fiscalizar os processos de boas práticas de produção, armazenamento, transporte e comercialização de alimentos junto às famílias, uma vez que a maior ocorrência de toxi-infecção se dá em domicílios.

De acordo com Moleto (2003), embora todas as profissões enfrentem obrigações morais com seus clientes, colegas de profissão, e para consigo mesmo e sua família, as obrigações com os animais são inerentes ao Médico Veterinário.

Novos campos de atuação foram delineados, com novos desafios a ser enfrentados, porém cabe aos Médicos Veterinários ocupar esses espaços com competência e dignidade, mostrando mais uma vez a sua importância no contexto social.

iniciativa empresarial, pois há igualmente grandes empresas na área do comércio de alimentos, as quais, em busca pelo lucro voraz, expõem a saúde das populações.

Mesmo que, na época, tivéssemos a certeza de que o pensar sobre os saberes da profissão do Médico Veterinário não tinha se esgotado, mais tarde, por meio do trabalho incessante dos integrantes da Comissão Nacional de Saúde Pública e do Conselho Federal de Medicina Veterinária, fomos agraciados com a conquista da atuação do Médico Veterinário junto ao Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF). Esses núcleos devem ser constituídos por equipes de profissionais de diferentes áreas do conhecimento, atuando com os profissionais já existentes na Estratégia da Saúde da Família, na ótica do zoneamento. Tal objetivo visa a trabalhar com um determinado número de imóveis ou residências, criando e estreitando o vínculo com a população, para melhor conhecer os indivíduos e os determinantes da saúde e da doença local, criando as bases da referência territorial. Buscaram-se as pessoas para os serviços de atenção básica à saúde, intervindo na prevenção

REFERÊNCIAS DOS ANJOS, C.B. Da produção ao consumo de alimentos: A Inspeção e a Vigilância Sanitária na Promoção da Saúde. In: SEMINÁRIO REGIONAL DE SAÚDE PÚBLICA VETERINÁRIA, Porto Alegre, 2005. 1 CD-ROM. DUTRA, M.G.B. As múltiplas faces e desafios de uma profissão chamada medicina Veterinária. Revista CFMV, n.37, p.46-49, 2006. FIGUEIREDO, J.R. Princípios básicos, abrangência e relação da bioética com as biotécnicas da reprodução. Revista CFMV, n.27, p.17-24, 2002. MOLETO, C.F.M. Medicina Veterinária e o bem-estar Animal. Revista CFMV, n.28/29, p.15-20, 2003. OLIVEIRA, P. A. Desejos; uma escolha difícil. Informativo de Centro Nacional de Pesquisa de Suínos e Aves, n.23/24, p.8, 2000. SOUZA, P. C. A. A Saúde Pública e a Veterinária, Revista CFMV, n.54, p. 20-23.2011.

AUTORA Maria da Graça Becker Dutra Médica Veterinária CRMV-RS nº 2258 Dsc, Docente na Universidade Luterana do Brasil, Canoas, RS mgdutra@uol.com.br

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ASSUNTOS POLÍTICOS

Como influenciar políticas públicas? Cabe aos Médicos Veterinários e Zootecnistas uma posição de vanguarda e protagonismo, não só pela riqueza de seus conhecimentos, mas pelo papel único quando se trata da interação entre animais, homens e natureza

A

lém das áreas específicas de atuação profissional, Médico Veterinário e Zootecnista devem estar fo-

para um setor ou para o país. Frente a isso, Médicos

cados na dinâmica do mercado do agronegócio, pois o des-

processo de discussão e contribuem para a melhoria

taque do Brasil no cenário internacional, entre os maiores

desses instrumentos ou, se necessário, buscam argu-

exportadores de carne bovina, de frango e suína, levanta

mentos e aliados que demonstrem a sua relevância e,

constantes debates entre os integrantes dessas cadeias pro-

às vezes, até as suas reprovações. Nesse sentido, os

dutivas. Assim, são frequentes a pressão e a reação por novos

parlamentares atuam como mediadores ou conduto-

marcos regulatórios ou mudanças na legislação vigente, com

res desses processos.

participação dos Poderes Legislativo e Executivo.

Veterinários e Zootecnistas são chamados a entrar no

O Conselho Federal de Medicina Veterinária

De outra parte, assuntos como meio ambiente, éti-

(CFMV), por meio da Comissão Nacional de Assuntos

ca no uso de animais no ensino e na experimentação,

Políticos e demais comissões assessoras, com os Con-

bem-estar dos animais e sistemas de fiscalização e controle

selhos Regionais, tem constituído uma liderança no

da produção de alimentos de origem animal geram posicio-

aperfeiçoamento de novas legislações vinculadas às

namentos da sociedade, com consequente pressão sobre

suas áreas de atuação. Tem sido rotina a manifesta-

parlamentares. Dessa forma, o Congresso Nacional tem se

ção do CFMV ao chamamento por parte do governo

mostrado sensível a essa demanda e os parlamentares res-

ou dos congressistas sempre que algum tema de in-

pondem propondo projetos de lei.

teresse entra em discussão. Somente nos últimos três

Obviamente, por questões intrínsecas e pela ausência de conhecimento especializado, muitos desses projetos poderão gerar distorções e até proposituras equivocadas se porventura vierem a ser aprovados. Portanto, necessita-se de um auxílio técnico, a partir de Médicos Veterinários e Zootec-

anos, a Comissão Nacional de Assuntos Políticos analisou 150 projetos de lei, elegeu 30 como relevantes e prioritários para as profissões e a sociedade e, ainda, participou de 23 audiências com parlamentares no Congresso Nacional.

nistas, para a construção de propostas legislativas mais bem

Por outro lado, as ações do CFMV não se atêm

alinhadas com o desejo da população. Esse auxílio pode se

somente a esse chamamento, mas também são pro-

dar na forma de emissão de pareceres técnicos, reuniões com

positivas, à medida que sugerem procedimentos

os pares, audiências públicas e debates com os interessados.

regulatórios ou leis. Um exemplo é a participação

Com isso, é possível construir uma relação de confiança e

do Médico Veterinário no Núcleo de Apoio à Saú-

cumplicidade pelo bem da sociedade.

de da Família (NASF), de importância para a saúde

No que diz respeito ao Executivo, órgãos públicos como Ministério da Agricultura, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Instituto Brasileiro do Ministério do Meio

humana. O aperfeiçoamento e regulamentação, incluindo o Médico Veterinário na equipe multidisciplinar que cuida da prática da equoterapia, são

Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ministério da Saúde, Ministério da Ciência e Tecnologia, Ministério do Meio Ambiente, entre outros, frequentemente propõem

10

Por falta de conhecimento especializado,

novos instrumentos regulatórios ou normativos. Esses instru-

muitos projetos de lei podem gerar

mentos invariavelmente trazem consequências às profissões,

distorções e até proposituras inadequadas

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Foto: Assessoria da Senadora

SENADORA

ANA AMÉLIA LEMOS (PP-RS) Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado

Como a senadora analisa as manifestações sociais para alterar marcos legais? Como Médicos Veterinários e Zootecnistas podem opinar nas atividades parlamentares? Numa democracia, a participação popular é fundamental. Sem ela você não pode avaliar a eficácia dessas políticas ou do próprio trabalho e da qualidade da produção legislativa. São fundamentais o trabalho e assessoria desses profissionais e especialistas em diversas áreas, pois aqui somos generalistas. Os profissionais também podem contribuir participando, sugerindo e interagindo com os parlamentares. Existem pressões para alterar a legislação vigente com relação ao uso do espaço rural, rastreabilidade dos rebanhos, um novo sistema de fiscalização dos produtos de origem animal etc. Como a senadora analisa esse cenário de mudanças? A evolução, seja da agricultura, seja da pecuária, está exigindo de todos nós muita atenção à questão da sustentabilidade e da produção com maior qualidade. Em primeiro lugar, temos que nos preocupar com a sanidade dos produtos. Então, de novo, os Médicos Veterinários são importantes no controle sanitário. Também, as autoridades têm que estar atentas a irregularidades. Isso vale para toda produção que tem impacto sobre o ambiente, sejam defensivos agrícolas, sejam medicamentos veterinários, sejam fertilizantes, sejam todos os insumos usados na agropecuária. É nesse cenário de exigência que temos que estar atentos para que a qualidade seja cada vez maior. Além disso, os mercados consumidores externos estão incluindo as chamadas barreiras não tarifárias, que são cláusulas sociais, como trabalho escravo, cuidado com saúde animal, bem-estar dos animais; tudo isso está na pauta das exigências do importador e, por isso, temos que ter um olhar diferenciado. A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado, da qual sou presidente, está aí para isso. De forma operacional, como os profissionais e suas entidades de classe podem atuar nas relações com o Senado? Primeiramente, acompanhando o funcionamento da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, sugerindo alguma pauta e participando ativamente da comissão. Na presidência, democraticamente aceitamos as propostas de todos os segmentos.

outros exemplos de melhoria de um projeto de lei. A lei que criou medicamentos genéricos de uso veterinário e a criação do Simples Nacional também foram contribuições importantes, gerando um novo marco para a legislação. A relevância dessas profissões para o desenvolvimento do país e o compromisso com as instituições e poderes constituídos são evidências inquestionáveis da necessária e proativa participação política nos diferentes fóruns de discussão. Portanto, cabe a Médicos Veterinários e Zootecnistas uma posição de vanguarda e protagonismo participativo, não só pela riqueza de seus conhecimentos em diversos temas, mas pelo papel único quando se trata da interação entre animais, homens e natureza.

AUTORES

Comissão Nacional de Assuntos Políticos (Conap/CFMV) comissoes@cfmv.gov.br Júlio O. J. Barcellos (Presidente) Médico Veterinário CRMV-RS nº 3185

Ricardo Pedroso Oaigen Médico Veterinário CRMV-PA nº 2272

Carlos Humberto Almeida Ribeiro Filho Médico Veterinário CRMV-BA nº 0454

Roberto Baracat de Araújo Médico Veterinário CRMV-MG nº 1755

Geraldo Marcelino Carneiro Pereira do Rêgo Médico Veterinário CRMV-RN nº 0015

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Medicina de conservação

Transdisciplinaridade na conservação da vida no planeta Se o objetivo de cada ser vivo é manter a sua própria espécie, nós estamos lutando contra isso, estamos nos matando em busca do nosso equilíbrio, que nunca se atinge!

É

verdade que estamos vivendo uma fase de caos. A história da humanidade passa por um momento de

tamanho desequilíbrio que se torna difícil enumerar todos os problemas do mundo. Seria a fome, a falta de acesso à educação e saúde, habitação, emprego, distribuição de renda? Ou seria tudo isso junto? E quem é responsável pelo momento que a nossa civilização está vivendo? Nós mesmos? O mundo vive em constante mudança. O planeta testemunha continuamente alterações geográficas, sociais, políticas, econômicas, ambientais e luta desesperadamente para se adaptar. Algumas vezes, são eventos que não podemos controlar ou prever, como as intempéries, outros são reflexos da nossa existência, como a urbanização. As mudanças climáticas produzem um impacto substancial nas populações. As atividades vulcânicas, terremotos, tsunamis, enchentes, secas, queimadas, nevascas, extremos de frio e de calor trazem perdas, morte e devastação. A Terra quase não tem tempo de se acostumar com os efeitos da fúria da natureza. Ser ambientalista deixou de ser um idealismo para ser necessário para a sobrevivência da nossa espécie. Os seres humanos interferem no meio ambiente durante sua luta pela sobrevivência. Os desafios eram fugir de predadores, produzir alimentos, se proteger das intempé-

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ries e gerar descendentes férteis. Agora, o avanço tecnológico e a luta pelo poder, por territórios, em defesa de credos, na busca por espaço social, desestruturaram a dinâmica e a motivação para se defender das ameaças. Se o objetivo de cada ser vivo é manter a sua própria espécie, nós estamos lutando contra isso, estamos nos matando em busca do nosso equilíbrio, que nunca se atinge. O desequilíbrio surgiu justamente da tentativa de proporcionar bem-estar ao homem, que, inocentemente, se achou (ou ainda se acha) soberano numa intrincada rede de relações interespecíficas, do nível molecular ao global. A espécie humana é apenas uma das que interagem com a fauna, a flora e os seres microscópicos que compõem a dinâmica do ambiente. O homem não se reconhece como parte do todo, destrói o seu substrato e não garante a continuidade do ciclo da vida. Na tentativa de manter a espécie, eliminamos as distâncias, e colocamos todos os seres vivos em contato e proporcionamos a possibilidade de deslocamento de patógenos pelo mundo globalizado. Deixamos de ter saúde para ter a informação. O estudo da inter-relação entre saúde humana, saúde animal e meio ambiente é foco da Saúde


Outro conceito, paralelo ao de Saúde Única é o da Medicina da Conservação, praticada há pouco mais de 20 anos e que enfatiza como a Saúde Única é uma verdade. Mostra a transversalidade dos conhecimentos na luta pela redução de impactos provenientes da ação antrópica nos diferentes ecossistemas. A saúde do planeta está em crise, gerando ameaça para a sobrevivência de muitas populações animais. No Brasil, por exemplo, a desertificação e exploração da caatinga levaram à extinção da ararinha-azul na natureza; na Mata Atlântica, a redução das populações de mico-leão determinou o quase desaparecimento de várias espécies; a poluição e destruição dos ecossistemas marinhos aumentaram a incidência de viroses em tartarugas marinhas e a pesca predatória diminuiu alguns cardumes de peixes, afetando a população de aves marinhas pela redução do alimento. Num mundo em destruição, seres generalistas ecológicos têm melhores oportunidades, em detrimento dos especialistas na busca por alimentos e ambientes que estão em áreas fragmentadas. A interferência humana favorece a circulação de patógenos, que se adaptam a novos hospedeiros, transformando-se nos agentes das doenças emergentes e reemergentes. Doenças vêm sendo diagnosticadas em novas espécies e, algumas vezes, resultam em muitas mortes, como nas gripes suína e aviária, influenza, micoplasmose, tuberculose, raiva e tantas outras enfermidades comuns a muitos grupos animais, incluindo nós, os primatas humanos. A saúde humana depende da saúde das espécies domésticas e selvagens, que habitam o mesmo ambiente e sofrem as mesmas influências externas. A saúde dos ecossistemas só vai existir se houver saúde em todos os níveis e em todas as formas de vida. Precisamos juntar as nossas habilidades e competências para reverter os danos. É uma questão de ética e de responsabilidade, profissional, social e cidadã. Preservar e conservar para sobreviver, em

Foto: Instituto Marcos Daniel

Única, conceito reafirmado recentemente, mas que vem sendo discutido e praticado há pelo menos 200 anos. O paradoxo se forma justamente porque os limites entre as espécies não são fixos, não são gavetas que se abrem e fecham, independentes umas das outras. No planeta, o que acontece com uma espécie vai gerar repercussão em todas as outras.

Pesca predatória reduziu alimentos das aves marinhas

Poluição aumentou a incidência de viroses em tartarugas

A saúde dos ecossistemas só vai existir se houver saúde em todos os níveis e em todas as formas de vida

conjunto, cada um auxiliando para que o somatório seja efetivo. O Médico Veterinário e o Zootecnista estão engajados nesse processo, pois o bem-estar da população é inerente ao trabalho desses profissionais, possuidores da visão da interação entre os seres humanos, os animais e o meio ambiente. Os desafios são lançados para todos ao mesmo tempo e a recuperação frente a um desequilíbrio só terá chance de ser alcançada se o trabalho for coletivo, unindo esforços e conhecimentos de todas as áreas: Medicina Veterinária, Zootecnia, Medicina, Agronomia, Engenharia Florestal, Biotecnologia, Segurança, Direito, Engenharia e todas as demais profissões, que em conjunto, lutam para manter a própria espécie, que, não está aqui sozinha, pelo menos por enquanto, se pudermos evitar.

AUTORES Comissão Nacional de Animais Selvagens (CNAS/CFMV) comissoes@cfmv.gov.br Carlos Eduardo do Prado Saad (Presidente) Zootecnista CRMV-MG n° 0772/Z Débora Rochelly Alves Ferreira Médica Veterinária CRMV-PB n° 0693

João Luiz Rossi Junior Médico Veterinário CRMV-SP nº 11607 Valéria Natasha Teixeira Médica Veterinária CRMV-PR nº 3925

Isaac Manoel Barros Albuquerque Médico Veterinário CRMV-AL nº 0479

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SUSTENTABILIDADE

Meio ambiente: perspectivas e desafios para Médicos Veterinários e Zootecnistas Contribuir positivamente é uma responsabilidade que se impõe a todo cidadão, a toda atividade humana e a todos os profissionais. É necessária uma reflexão sobre como os profissionais podem se posicionar e atuar nesse cenário

A

modernidade trouxe consigo um ser humano cuja conexão com a natureza passou a ser um

símbolo de atraso. Em séculos recentes, esse indivíduo autônomo, já organizado em países, começou a buscar o desenvolvimento, ou seja, o crescimento econômico. Dessa forma, o meio ambiente transformou-se em um entrave ao desenvolvimento e, não, parte dele. Alterações ambientais e sua influência na dinâmica das doenças

Situações de transformações ambientais e demográficas são as que mais favorecem o aparecimento de novas doenças e a alteração do comportamento epidemiológico de antigas, em especial, as doenças infectocontagiosas (SALES, 2010).

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A dispersão de doenças é um fenômeno influenciado pelo adensamento de populações e pode acometer tanto animais em vida livre quanto cativos Entre as características relacionadas com o aparecimento das doenças emergentes, a degradação ambiental é citada como condição primordial, porém é pouco considerada em estratégias de políticas públicas, em que a terapêutica é a regra, antes da prevenção (SCHMIDT, 2007; AGUIRRE; TABOR, 2008). Nessa conjuntura, as zoonoses, doenças ou infecções que se transmitem naturalmente entre os animais vertebrados e o homem, ou vice-versa (SILVA, 2004), possuem caráter emergencial, uma vez que as agressões que o homem vem praticando contra o meio ambiente produziram condições para a disseminação de patógenos e a existência de ambientes modificados e degradados propícios ao aparecimento de novas doenças (SALES, 2010). Aproximadamente 75% das doenças consideradas emergentes durante as últimas duas décadas têm uma fonte de vida selvagem. Tanto microparasitas (bactérias, vírus, fungos e príons) quanto macroparasitas (helmintos e ectoparasitas em geral) atingem a espécie humana, de forma direta ou indireta, por meio de vetores (BENGIS et al., 2004; FENTON; PEDERSEN, 2005; MONTEIRO, 2008). Segundo Pignatti (2004), os habitats que foram alterados pelas atividades humanas ou naturais são mais vulneráveis, pois, quando predadores e competidores são eliminados, são criadas oportunidades para novas espécies se instalarem. As mudanças climáticas afetam tanto os vetores quanto os agentes infecciosos que transmitem doenças (MENDONÇA, 2003), sendo várias delas influenciadas por temperaturas mais elevadas, portanto, restritas às zonas tropicais, como malária, tripanossomíase, leishmaniose, filariose, amebíase, oncocercíase, esquistossomose e diversas verminoses. Para Schmidt (2007), novas e antigas doenças estão relacionadas com diferentes contextos ecológicos e sociais, principalmente quando ocorre o desequilíbrio das relações entre hospedeiro, ambiente e agente.

Alterações ambientais e dispersão de doenças

A dispersão de doenças é um fenômeno influenciado pelo adensamento de populações e pode acometer tanto animais em vida livre quanto cativos. Em habitats naturais fragmentados, as populações coexistem mais próximas devido às restrições espaciais, favorecendo o maior contato com fontes naturais de infecção, como fezes, saliva e urina e consequente transmissão direta de doenças (PRIMACK; RODRIGUES, 2001; ANDRIOLLO, 2006). Outro fator a ser considerado é que em ambientes degradados ocorre uma significativa diminuição da qualidade de vida dos indivíduos devido à redução da disponibilidade de alimento e abrigo, aumento da competição e da predação, entre outros eventos, que fazem com que os animais se encontrem em estado permanente de estresse, com consequente compro-

Atividades antrópicas e as doenças DOENÇA

reservatório/ VETOR

Relação ambiental

Raiva

Interação de animais domésticos com morcegos hematófagos, principalmente Desmodus rotundus

A alteração ambiental e a introdução de animais domésticos, alimento farto para os morcegos hematófagos, desequilibram essa comunidade, favorecendo o aumento de sua população (WHO, 2007).

Leishmaniose

Mosquitos flebotomíneos do gênero Lutzomia

O desmatamento irracional transforma o flebótomo num vetor peridomiciliar, quando seu nicho ecológico é selvático (WHO, 2007). Alguns vetores hematófagos, como Lutzomia whitmani, (transmissor da leishmaniose tegumentar) e Lutzomia longipalpis (principal vetor no Brasil), adaptam-se ao homem como fonte de alimentação (Molyneux, 2002).

Febre maculosa

Carrapatos do gênero Amblyomma, ectoparasitos de capivaras

Capivaras que se desenvolvem nas regiões urbanas (BARCI; NOGUEIRA, 2006).

Hantavirose

Roedores silvestres dos gêneros Akodon e Necromys

Crescente expansão em razão das mudanças antropogênicas de ocupação de ambientes naturais (FIGUEIREDO et al., 2009).

Dengue

Mosquito Aedes aegypt e Aedes albapictus

Mosquito domiciliar que se prolifera em aglomerados urbanos desorganizados

Mosca-de-Estábulo

Mosca-de-estábulo (Stomoxys calcitrans)

Alterações ambientais, principalmente nos meses quentes do ano, favorecem o ataque de insetos, levando a surtos e epidemias, principalmente nas proximidades de atividades sucroalcooleiras.

Gripe aviária e gripe H1N1

Vírus H5N1 ocorre em aves aquáticas com potencial de adaptação, acometendo frangos domésticos

Ocupação humana irregular, modificando ecossistemas naturais, tornando o ambiente mais suscetível e, dessa forma, influenciando a relação estoque silvestre versus estoque doméstico versus homem, facilitando o aparecimento de doenças.

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metimento do sistema imune, tornando o organismo mais suscetível ao desenvolvimento de doenças (PRIMACK; RODRIGUES, 2001; ANDRIOLLO, 2006; AGUIRRE; TABOR, 2008). Os vetores também passam por processos de modificações biológicas e comportamentais, possibilitando uma adaptação a ambientes e hospedeiros novos e/ou modificados. Nesse contexto de alterações ambientais, os vetores biológicos são classificados como vetores emergentes e vetores ressurgentes (FORATTINI, 1998). Diante de um cenário que marcou o século XX e atingiu níveis críticos no século XXI, de intensa expansão de diversas atividades antrópicas, como mudanças climáticas, desmatamento e extinção global de espécies animais, houve o agravamento e ressurgimento de várias doenças no mundo. Desafios e oportunidades para o Médico Veterinário e o Zootecnista

São inerentes ao conceito ambiental as relações de causa/efeito, a interface, a interdependência, a coexistência dos seres e do meio em que vivem. Sabe-se que um ambiente equilibrado e saudável é fundamental para a saúde e o bem-estar dos seres humanos, dos animais e de toda a biodiversidade, assim como a recíproca é verdadeira, ou seja, um ambiente degradado,contaminado e desequilibrado certamente afeta, em grau variado e proporcional, a qualidade de vida de todos que ali vivem. Da mesma forma, a abordagem da temática ambiental, por sua complexidade e inter-relação multifatorial e sistêmica por excelência, depende de diferentes análises, conhecimentos, profissionais e olhares. Trabalhos em equipes interdisciplinares e multiprofissionais são premissas para se lograr sucesso na área ambiental. Contribuir é uma responsabilidade que se impõe a todo cidadão, a toda atividade humana e a todos os profissionais. A questão ambiental não é exclusividade de nenhuma profissão. Necessário se faz realizar uma reflexão de como Médicos Veterinários e Zootecnistas podem se posicionar e atuar nesse cenário. No amplo campo de suas atuações, há forte inserção tanto em atividades urbanas quanto rurais, com amplo espectro de alcance.

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O desequilíbrio entre hospedeiro, ambiente e agente está relacionado ao aparecimento de doenças

É importante que saibamos que novos instrumentos legais surgiram e vão promover importantes mudanças: •

Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), que instituiu a obrigatoriedade dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos e da logística reversa das embalagens;

Lei Complementar nº 140/2011, que fixou normas ambientais de competência para a União, estados e municípios, ou seja, estados e municípios recebem atribuições de licenciamento ambiental, gerenciamento da fauna etc.;

Lei Florestal (Lei nº 12.651/2012), que instituiu o Cadastro Ambiental Rural, obrigatório para toda propriedade rural do país;

A degradação ambiental é condição para doenças emergentes


SUGESTÃO DE TEMAS A SEREM ABORDADOS EM UMA DISCIPLINA ENVOLVENDO TEMÁTICA AMBIENTAL

Introdução à ecologia.

Gerenciamento de Resíduos Sólidos de Serviços de Saúde (GRSS) e de águas residuárias.

Biologia e medicina da conservação de animais selvagens.

Legislação ambiental.

Biodiversidade e ecossistemas.

Licenciamento ambiental, Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).

Desenvolvimento e utilização racional dos recursos naturais de forma sustentável. Impacto das atividades agropecuárias sobre ecossistemas e comunidades. Estudo dos processos sistêmicos para conservação das condições ambientais em sistemas agropecuários.

Impactos ambientais nos diferentes campos de atuação da Medicina Veterinária e Zootecnia

Educação ambiental.

Ecotoxicologia.

Manejo da fauna selvagem.

Planejamento de projetos ambientais.

Principais problemas ambientais resultantes das atividades antrópicas.

Análise e perícia ambiental.

Gestão ambiental.

Noções sobre auditoria ambiental.

Poluição e contaminação da água, ar e solo.

em trâmite no Congresso Nacional, está o Projeto de Lei nº 7.735/2014, que dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios para conservação e o uso sustentável da biodiversidade.

Essas regulamentações são instrumentos de forte impacto, nas áreas urbanas e rurais, que o Médico Veterinário e o Zootecnista precisam conhecer e dominar, pois cumpri-las é tanto um desafio quanto uma oportunidade de trabalho. O conhecimento dos instrumentos e das interfaces e interdependências existentes entre meio ambiente, sustentabilidade, qualidade ambiental e saúde humana e animal podem contribuir positivamente para que o Médico Veterinário e o Zootecnista compreendam e definam como empreender ações em sua área profissional, integrar equipes multiprofissionais e agir de forma proativa, na promoção do bem-estar do ser humano e na proteção da biodiversidade. A saúde ambiental na formação de Médicos Veterinários

Na Lei nº 5.517, de 23 de outubro de 1968, que dispõe sobre o exercício da profissão de Médico Veterinário e cria os Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária, embora não esteja explícito, toda e qualquer área de atuação desses profissionais apresenta potencial risco de causar impactos ambientais. Trabalho realizado pelo Médico Veterinário Luciano Ferreira Menezes (2011), membro da Comissão Nacio-

Meio ambiente equilibrado e saudável é fundamental para a saúde de toda a biodiversidade

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(1,2%) acredita que, frequentemente, essas questões são abordadas de forma adequada. Em contrapartida, 8,7% responderam que isso nunca acontece na formação de Médicos Veterinários e o restante não opinou. Observou-se a presença de pelo menos uma disciplina com foco no ambiente (Ecologia), geralmente ministrada no início e que se perde ao longo da graduação, seja por falta de sensibilização ao assunto, seja por falta de ligação de sua importância à atuação profissional. Poucas escolas, no Brasil, possuem disciplinas que abordam o meio ambiente (quadro na p. 17). Também, é importante que a temática ambiental seja abordada transversalmente em todas as disciplinas, permitindo que o assunto seja discutido durante toda a graduação. A abordagem do tema não deve ser restrita à formação dos novos profissionais, sendo preciso que o assunto seja discutido e oportunizado aos profissionais atuantes no mercado. Programas de educação continuada, especialiAs queimadas promovem restrição espacial e favorecem contato com fontes naturais de infecção

zações e pós-graduações na área ambiental são realidades e podem ser acessados com facilidade.

nal de Meio Ambiente (CNMA/CFMV), com relação às questões de saúde ambiental na formação em Medicina Veterinária (dados não publicados) estabeleceu que, dos 434 Médicos Veterinários entrevistados em todo o Brasil, 54,4% opinaram que raramente as questões ambientais são adequadamente abordadas, seguidos por 32,3% que responderam que isso ocorre eventualmente. Uma porcentagem pequena

REFERÊNCIAS

AUTORES

FENTON, A.; PEDERSEN, A.B. Community Epidemiology Framework for Classifying Disease Threats, Emerging Infectious Diseases v.11, n.12, p.1815-1821, 2005.

AGUIRRE, A.A.; TABOR, G.M. Global Factors Driving Emerging Infectious Diseases - Impact on Wildlife Populations, Animal Biodiversity and Emerging Diseases. Annals of the New York Academy of Sciences n.1149, p.1-3, 2008. ANDRIOLLO, A. Desafios para a conservação da fauna, In: CUBAS, Z.S.C.; SILVA, J.C.R.; CATÃO-DIAS, J.L. Tratado de animais selvagens: medicina veterinária. São Paulo: Roca, 2006. Cap.3, p.19-25. BENGIS, R.G.; LEIGHTON, F.A.; FISCHER, J.R. et al. The Role of Wildlife in Emerging and Re-emerging Zoonoses, Rev. Sci. Tech. off. Int. Epiz. v.23, n.2, p.497-511, 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. Situação epidemiológica da hantavirose em 2007. Informe técnico n.1. Brasília: Secretaria de Vigilância e Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação Geral de Doenças

FORATTINI, O.P. Mosquitos Culicidae como vetores emergentes de infecções. Rev. Saúde Pública v.32, n. 6, p.497-502, 1998.

Maria Izabel Merino de Medeiros Médica Veterinária CRMV-SP nº 13293 Presidente CNMA mariamedeiros.cnma@cfmv.gov.br Cintia Mara Miranda Dias Médica Veterinária CRMV-RJ nº 11799 Membro CNMA Elma Pereira dos Santos Polegato Médica Veterinária CRMV-SP nº 7012 Membro CNMA Heitor David Medeiros Médico Veterinário CRMV - MT n° 0951 Membro CNMA

MCTI. Estimativas anuais de emissões de gases de efeito estufa. 2ed. 2014. MENDONÇA, F. Aquecimento global e saúde: uma perspectiva geográfica – notas introdutórias, Revista Terra Livre Ano 19, v.1, n.20, p.205-221, 2003. MONTEIRO, R.V. Biossegurança na manipulação de animais silvestres - zoonoses de animais silvestres, Ciência Veterinária Tropical v.11, sup1, p.170-173, 2008. PIGNATTI, M.G. Saúde e ambiente: as doenças emergentes no Brasil, Ambiente & Sociedade, v.II, n.1, 2004. PRIMACK, R.B.; RODRIGUES, E. Biologia da conservação. Londrina, Vozes, 2001. 327p. SALES, I.S. As influências das alterações ambientais nas zoonoses emergentes e reemergentes transmitidas por vetores. 2010. 35f. Monografia (Especialização Latu sensu em Clínica Médica e Cirúrgica de Animais Selvagens e Exóticos) – Universidade Castelo Branco, Rio de janeiro, 2010. SCHMIDT, R.A.C. A questão ambiental na promoção da saúde: uma oportunidade de ação multiprofissional sobre doenças emergentes, PHYSIS: Revista de Saúde Coletiva, v.17, n.2, p.373-392, 2007. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). The World Health Report 2007 – a Safer Future: Global and Public Health Security in the 21st Century. New York. 2007.

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Quem é o

Zootecnista? O

Dia do Zootecnista é celebrado, anualmente, em 13 de maio. Em 2015, a data foi comemorada com a campanha “Quem é o Zootecnista?”. As ações tiveram início em abril e buscaram revelar a abrangência da atuação desse profissional, que passa pela nutrição e manejo alimentar, melhoramento genético, conservação dos recursos ambientais, manejo de pastagens e da fauna, ensino e pesquisa, administração de eventos agropecuários, entre outras. Uma das ações movimentou o Facebook, com o intuito de mostrar o cotidiano da profissão. Profissionais de todo o país participaram com o envio de fotos representando sua atuação profissional. As melhores foram selecionadas. Confira!

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1. Luiz Fernando Canazaro Trindade CRMV-BA nº 0348/Z Trabalha há 25 anos na pecuária leiteira. Graduado na primeira faculdade de Zootecnia do Brasil, atualmente presta consultoria na bacia leiteira da Bahia sobre a sustentabilidade e a qualidade do leite.

4. Leonardo Willian de Freitas CRMV-RO nº 0201/Z Com atuação em uma granja de postura na cidade de Vilhena, RO, em núcleo de cria e recria, é responsável pela nutrição, qualidade dos ovos e manejo das aves.

2. Débora de Oliveira Strider CRMV-RS nº 0943/Z O estudo do comportamento animal visa, entre outros, a avaliar interações que possam alterar ou não o desempenho dos animais dentro do sistema em que se encontram. Em campo, a Zootecnista faz estudo do comportamento ingestivo de novilhas da raça Holandesa.

5. Paula Gomes Rodrigues CRMV-SE nº 0047/Z Zootecnista em atuação na área de equinocultura. Outra espécie que requer a atuação de um profissional para os melhores resultados.

3. Katia Fernanda Gobbi CRMV-PR nº 03954/Z Zootecnista desenvolvendo um ensaio experimental para avaliação do desempenho de bovinos com e sem suplementação, em área de integração lavoura-pecuária no Instituto Agronômico do Paraná, em Paranavaí, PR.

6. Marcello Cappio Nunes Silva CRMV-GO nº 1427/Z No interior da Bahia, animais mestiços de corte, em fase de recria. Com controle dos indicadores animais, pastagem e suplementação, o Zootecnista decide o melhor momento para entrada no confinamento.

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CFMV NA mídia

Mercado pet no Brasil

Assunto: Resolução nº 1.069

O crescimento do mercado pet no Brasil foi tema do programa Economia e Negócios, da Record News. O presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária,

Benedito Fortes de Arruda, participou do debate, falou sobre o conceito de saúde única e destacou as diferentes áreas de atuação de Médicos Veterinários.

Em vigor desde janeiro, a resolução que trata da exposição de animais para comercialização ainda segue sendo notícia nos veículos de comunicação. O Conselho Federal de Medicina Veterinária esclareceu algumas dúvidas que surgiram em reportagens nos veículos Hoje em Dia (MG) e R7.

Sentimentos nos animais

Inspeção agropecuária

Residência chancelada

O presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária, Animais têm sensações e percepções conscientes sobre o que acontece consigo e ao seu redor. O material, destacando a preocupação do conselho com o bem-estar animal, fez parte de uma reportagem da Agência Rádioweb, divulgada para mais de 150 rádios de todo o país.

Benedito Fortes de Arruda, falou com o Jornal da Pecuária, do Canal Rural, sobre o apoio à proposta do Ministério da Agricultura de mudança na fiscalização e inspeção dos frigoríficos. Para o conselho, a mudança garante a qualidade dos alimentos consumidos pela população. Matéria vinculada também no Portal do Agronegócio, Portal Dia de Campo, Correio Braziliense, Jornal do Parabrisa e Jornal Agora.

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As instituições de ensino interessadas em oferecer Programas de Residência e de Aprimoramento Profissional poderão obter a chancela do Conselho Federal de Medicina Veterinária. Os critérios de avaliação foram definidos pela Resolução CFMV nº 1.076. O tema foi destaque no Portal do Agronegócio, Portal Dia de Campo, além dos jornais Correio Braziliense, Jornal do Parabrisa e Jornal Agora.


Foto: Arquivo CFMV

CFMV EM AÇÃO

Construção conjunta das metas

Embasamento técnico e vivência dos diretores, conselheiros e membros de comissões assessoras foram essenciais para definição do planejamento estratégico da atual gestão

E

m sua estrutura organizacional, como órgão máximo decisório para as regulamentações

das profissões, o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) tem a plenária, formada por quatro diretores e 12 conselheiros, Médicos Veterinários e Zootecnistas. Para o subsídio às informações técnicas, são nomeadas comissões assessoras formadas por especialistas de todo o Brasil. Esses profissionais vivem a realidade de cada segmento das profissões e trazem para o CFMV os principais pontos que merecem atenção nas respectivas áreas. Para unidade dos trabalhos da gestão 20142017, o CFMV reuniu todos os profissionais em um encontro no início do ano, que teve por objetivo integrar as diversas vozes e pontos de vista para a construção conjunta do planejamento estratégico. O presidente do CFMV, Benedito Fortes de Arruda, avalia como “positiva a experiência de agregar visões de diferentes especialistas para trazer melhorias nas diversas frentes das profissões”. Os objetivos foram detalhados, bem como foram estabelecidas metas e ações prioritárias. Elas se

Comissões

Para a próxima gestão, foram criadas duas novas comissões: Fiscalização, que tem como objetivos propor diretrizes para as ações de fiscalização, revisar e propor atualização da legislação referente à fiscalização do Sistema CFMV/CRMVs, inclusive dos modelos de instrumentos e formulários de fiscalização, tais como termos e autos de infração e multa; e Especialidades Emergentes, que tem como atribuições identificar áreas e especialidades emergentes da Medicina Veterinária e Zootecnia; propor projetos e iniciativas relativas às áreas e especialidades emergentes; sugerir ações a ser realizadas junto a coordenadores de cursos, parlamentares e entidades ou órgãos públicos e privados relativas às áreas e especialidades emergentes; e, ainda, propor a criação de grupos de trabalho para análise e discussão de temas. As demais existentes atuam nas áreas de animais selvagens; assuntos políticos; educação em Medicina Veterinária; educação em Zootecnia; ética, bioética e bem-estar animal; meio ambiente; saúde pública veterinária e residência em Medicina Veterinária.

tornarão a base de ações para serem implementadas

Os grupos reúnem-se regularmente na sede do CFMV

nos próximos anos. Entre elas, estão a valorização

em Brasília, DF, e entre outras atividades relatam, discutem

dos profissionais, a melhoria do ensino e educação

e emitem pareceres sobre processos que lhes são atribuí-

continuada e o aperfeiçoamento da legislação das

dos. Também contribuem para ações do CFMV, como cam-

profissões. As comissões também puderam integrar-

panhas, planejamentos, eventos e atividades de educação

se e definir ações comum, o que permite otimização

continuada. Informações detalhadas sobre cada comissão

de recursos e maior efetividade de resultados.

estão em www.cfmv.gov.br.

Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

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Destaques Cfmv

CFMV e CRMVs padronizam processos de trabalho As experiências vivenciadas pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) na modernização organizacional são compartilhadas com os Conselhos Regionais (CRMVs). Como parte da segunda etapa do mapeamento de processos, o CFMV coordenou reuniões para elaborar os Procedimentos Operacionais Padrões (POPs). O trabalho, que teve início em abril, foi realizado em diferentes estados, na sede dos CRMVs.

co-profissional, de atendimento a

Foram construídos os POPs de julgamento de processo éti-

mos cada etapa e obtemos resul-

clientes, da área de finanças, de compras e contratações, da gestão de documentos, bens patrimoniais e infraestrutura, e de serviços de tecnologia da informação. Segundo o presidente do CFMV, Benedito Fortes de Arruda, ao mapear os processos, é possível detectar pontos que precisam ser retirados, reorganizados ou melhorados. "Assim, racionalizatados positivos", ressalta.

Códigos de Ética do Médico Veterinário e do Zootecnista terão seu texto atualizado A atualização de dois importantes documentos que orientam a atuação dos profissionais está em andamento no Conselho Federal de Medicina Veterinária. Trata-se do Código de Ética do Médico Veterinário (CFMV), cuja última versão entrou em vigor em 2002, e do Código de Ética do Zootecnista, de 1982.

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Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 64 Janeiro a Março 2015

O CFMV identificou a necessidade de revisar os documentos, tendo em vista as mudanças dos últimos anos na legislação e na ampliação das áreas de atuação das profissões. A participação dos profissionais de Medicina Veterinária e de Zootecnia durante o processo tem sido fundamental. Acompanhe o andamento pelo portal do CFMV (www.cfmv.gov.br).


Ampliadas parcerias para desenvolvimento das competências humanísticas Em 2015, o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) continua firmando parcerias com instituições de ensino do país para implantar o projeto Estratégias de Ensino-Aprendizagem. A ideia é contribuir para o desenvolvimento das competências humanísticas dos futuros Médicos Veterinários, como liderança, atenção à saúde, comunicação, tomada de decisão, administração, gerenciamento e educação permanente.

Entre as instituições incorporadas ao projeto este ano, estão o Centro Universitário Filadélfia (UniFil), em Londrina (PR), o Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal, no estado de São Paulo, a Universidade Luterana do Brasil, em Canoas (RS) e a Universidade Comunitária Regional de Chapecó (UNOChapecó), em Chapecó (SC). O CFMV acompanha o projeto, que tem a duração de um ano, com avaliação a cada semestre.

Seminário de Educação da Zootecnia leva coordenadores e docentes a refletir sobre novas estratégias de ensino

pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), ocorreu nos dias 27 e 28 de maio, em Fortaleza (CE), e reuniu cerca de cem pessoas. O evento levou coordenadores de curso e docentes a refletir sobre novas estratégias de ensino. As competências profissionais, com

minário é parte do XXV Congresso Brasileiro de Zootecnia (Zootec). Premiação - Durante a abertura do Zootec 2015, a Zootecnista Maria Norma Ribeiro recebeu o prêmio Professor Octávio Domingues de 2014 - Zootecnista do Ano. O prêmio é entregue anualmente pelo CFMV a Zootecnistas brasileiros que tenham realizado relevantes

destaque para as humanísticas,

serviços ao desenvolvimento agro-

também foram debatidas no semi-

pecuário do país.

Foto: Arquivo CFMV

O V Seminário Nacional de Educação da Zootecnia, organizado

nário, com a apresentação do projeto Estratégias de Ensino-Aprendizagem, que desde 2013 está em ação em instituições de ensino de

www

Cadastre-se em www.cfmv.gov.br e receba o boletim CFMV Informa. twitter.com/CFMV_oficial

facebook.com/cfmvoficial

Medicina Veterinária do país. O se-

Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

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Legislação em pauta

Mudança em resolução ajuda a ampliar procedimentos de controle populacional de cães e gatos Com a entrada em vigor da Resolução CFMV nº 1.080/2015, publicada no Diário Oficial de 26 de maio, as Unidades Móveis de Esterilização e Educação em Saúde (UMEESs) vinculadas a instituições privadas poderão realizar a esterilização de animais. A norma é aplicada, por exemplo, nas mobilizações coletivas programadas, que envolvem a realização de procedimentos de esterilização de cães e gatos (machos e fêmeas) associados a ações de educação em saúde e guarda responsável.

ponsável Técnico (RT), com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica. O profissional deverá encaminhar um relatório com informações mínimas sobre cada programa realizado aos CRMVs.

A Resolução nº 1.080/2015 alterou o art. 6º da Resolução nº 962/2010, que previa apenas a vinculação das UMEESs a instituições públicas. "Essa modificação tem relação direta com a preocupação com a saúde pública. Quanto mais entidades estiverem envolvidas no processo, melhor será o atendimento para o controle populacional, evitando a transmissão de doenças dos animais para o homem e viceversa", afirma o presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), Benedito Fortes de Arruda. O CFMV considera a saúde animal um dos pilares da saúde única, com reflexo direto nas saúdes ambiental e pública. A Resolução nº 962/2010 normatizou os procedimentos de contracepção de cães e gatos em programas de educação em saúde, guarda responsável e esterilização para garantir o controle populacional com eficiência, segurança e bem-estar animal. Para poder atuar adequadamente, a UMEES deve estar devidamente regularizada perante o Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV) e demais órgãos competentes, como Departamento de Trânsito e Prefeitura Municipal. Desde a entrada em vigor dessa resolução, também é esperado que sejam possíveis o mapeamento e o gerenciamento de dados populacionais e de saúde sobre a população canina e felina no âmbito municipal, estadual e federal. Isso é possível, uma vez que é obrigatório que os programas tenham um Médico Veterinário como Res-

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Com mais envolvidos no processo, melhor será o atendimento para o controle populacional, evitando a transmissão de doenças, principalmente de animais abandonados


Avicultura

Inovações tecnológicas em incubatórios Uma falha na incubação de ovos pode causar séria quebra na cadeia de criação de frangos e, consequentemente, na lucratividade. Dessa forma, é essencial utilizar equipamentos que forneçam garantias de confiança, desempenho, tecnologia e serviços, assegurando controle total da incubação, tanto agora quanto no futuro

O

fim do século XX e início do XXI podem ser caracterizados como épocas do domínio da ciência e da tecnologia, marcadas pelo avanço do conhecimento de forma geral e, principalmente, com foco voltado aqui, para a produção de alimentos. Na avicultura industrial, o principal fator que permitiu o aumento na produção de frangos de corte foi a troca da incubação natural (realizada pela galinha) pela incubadora artificial. A história da incubação artificial representa um dos capítulos mais importantes dentro do cenário do desenvolvimento da avicultura brasileira. As primeiras incubadoras utilizadas no país vieram importadas nos anos 1960, sendo que apenas na década de 1980, tivemos a primeira empresa instalada em solo nacional, possibilitando uma tecnologia de fácil acesso aos produtores locais. Os resultados finais desse processo podem ser facilmente mensurados pela qualidade do produto (eficácia) e produtividade (eficiência), que nos colocam hoje como importante produtor mundial de proteína animal, em especial, de carne de frango.

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Diversos fatores podem afetar a qualidade do processo de incubação: idade e nutrição da matriz, qualidade dos ovos, aspectos sanitários etc. Nesta revisão, vamos abordar somente os aspectos relativos à incubadora. Os equipamentos de incubação artificial, as chamadas incubadoras, devem proporcionar o controle de temperatura, umidade relativa, fluxo de O2 e CO2. Desvios desses fatores em relação aos respectivos valores ótimos para a espécie ou linhagem e à sua duração podem inviabilizar o desenvolvimento do embrião dentro do ovo, resultando em aumento da mortalidade, consequentemente, diminuição da eclodibilidade. Pintinhos de alta qualidade garantem ganhos no desempenho

Uma incubadora é uma máquina de grande durabilidade, que não pode ser trocada com facilidade, pois seu valor e a disposição do incubatório muitas vezes impedem essa mudança. Dessa forma, uma máquina mal escolhida pode trazer problemas futuros continuados. Ao estudar a escolha de uma incubadora, o primeiro ponto a ser certificado é o desempenho da máquina. Isso não é fácil, pois a medida desse desempenho é sempre comparativa. No entanto, em uma incubadora em atividade pode-se fazer a avaliação de seu funcionamento, principalmente pela análise dos resultados de incubação, em que a porcentagem de nascimento só tem valor se compa-

rada, em mesmas condições, com outras incubadoras, de fabricação diferente. A incubação de ovos é uma atividade complexa. Uma falha nesse processo pode causar séria quebra na cadeia de criação de frangos e, consequentemente, na lucratividade. Dessa forma, é essencial utilizar equipamentos que forneçam garantias de confiança, desempenho, tecnologia e serviços, assegurando controle total da incubação, tanto agora quanto no futuro.

Melhores índices para avaliação do desempenho de uma incubadora Prazo de incubação correto 21 dias + seis horas, com a grande maioria dos pintos saindo das cascas a partir do 20º dia + seis horas. Uma dispersão de nascimentos pode indicar um mau funcionamento ou defeito intrínseco da incubadora.

Qualidade dos pintinhos

Quanto à aparência, vivacidade e hidratação.

Bandejas com resultados muito diferentes das outras

Uma ou mais bandejas com poucos pintos, de má qualidade, muito atrasados ou muito adiantados.

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São máquinas recomendadas para organizações em que o controle sanitário é extremo e conduzido com aves livres de determinados agentes patogênicos. O sistema de estágio único, em que cada incubadora é carregada de uma só vez, é o sistema mais antigo, porém o mais caro. Tem como vantagem a limpeza, que é total após cada ciclo de 19 dias. O sistema de estágio único deve ser utilizado, principalmente, para ovos de alto risco e ovos que podem explodir durante o ciclo de incubação, como ovos sujos, colhidos em cama, ovos lavados, ovos de galinhas velhas, ovos mantidos por mais de 20 dias em câmeras frias etc. É também usado, em suas versões menores, em granjas de seleção ou reprodução genética, pela facilidade de separação de lotes menores.

Bandejas de incubação

TIPOS DE INCUBADORA SISTEMAS DE INCUBAÇÃO

Para entender o processo de incubação, inicialmente temos que caracterizar os tipos de maquinário utilizados. Na primeira etapa, os ovos são levados para a sala de incubação, permanecendo nesse local de 18 a 19 dias, com temperatura, umidade, viragem dos ovos e troca de ar constantes. Nos últimos dois ou três dias, os ovos são levados para a sala de nascedouro, com maior troca de ar, pressão negativa e temperatura mais baixa. Antigamente, ainda se utilizava o espaço da incubadora para nascedouro, sendo atualmente todas dotadas de nascedouros isolados.

Incubadoras frontais

Incubadoras de tambor

Incubadoras túnel

Incubadoras de corredor

São máquinas operadas pela frente, ou seja, abrindo a porta, todos os ovos são acessíveis pela frente.

Todas as bandejas são colocadas em um tambor de viragem e acessíveis pelas portas dianteiras.

Sistemas principais de incubação: •

por estágio múltiplo;

por estágio único.

Na incubação por estágio múltiplo, a incubadora é carregada por partes, inserindo-se novos ovos e retirando aqueles em final de desenvolvimento todos os dias, sendo a mais utilizada industrialmente, pois permite o emprego de incubadoras de grande porte e maior economia de energia, por utilizar o calor gerado pelos embriões mais velhos para aquecer os mais novos. A desvantagem desse método é que, caso precise desligar o maquinário para manutenção ou limpeza, se perde muito em produtividade.

O carregamento é feito por carros de incubação completos, que se movem ao longo da incubadora nos 18 dias de processo. Entram pela frente e saem pela traseira. Possuem vantagens quanto ao controle de limpeza sobre as incubadoras de corredor, sendo, porém, críticas quanto à uniformidade dos ovos incubados e devendo trabalhar sempre completas.

Sistema de maior uso no mundo por suas vantagens de custo, simplicidade e desempenho. Todo o trabalho de carga e descarga é feito pelo corredor e todos os componentes de aquecimento, viragem, umidade e ventiladores estão montados em chassi interno sobre o corredor.

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Foto: Petersime

Uma incubadora de estágio único não deve ser vista como solução para granja que produza ovos com riscos graves de contaminação, tanto bacteriana, quanto virótica ou fúngica. Nesse caso, esse tipo de máquina poderá, às vezes, circunscrever um efeito, sem, no entanto, corrigir a causa. Ademais, ela consome mais energia elétrica para incubar a mesma quantidade de ovos que uma incubadora de estágio múltiplo, pois não aproveita o calor gerado pelos embriões, a partir do 13º dia de incubação, para aquecer os mais recentes. Uma carga única vai exigir, até aproximadamente o 12º dia, um acionamento frequente das resistências e, a partir do 15º dia, o acionamento constante do sistema de refrigeração e, se este for por água gelada, o consumo de energia também é alto. SITUAÇÃO DA INCUBAÇÃO MUNDIAL

A incubação moderna está migrando do conceito de estágio múltiplo para estágio único, rapidamente em algumas partes do planeta e de maneira relativamente morosa em outras, como é o caso da América Latina. O estágio único é a escolha mais natural para as linhagens atuais de alto rendimento e metabolismo (BOERJAN, 2004), pois algumas etapas da pré-incubação são automatizadas, diminuindo-se o manejo nos incubatórios, como é o caso do pré-aquecimento dos ovos antes da incubação. Seguramente, a maior parte dos incubatórios brasileiros adota modelos de incubação denominados estágio múltiplo e, pior do que isso, a idade média das máquinas utilizadas em nosso país ultrapassa 15 anos. Em outras palavras, incubamos embriões cuja evolução genética avançou 15 anos, em máquinas cuja evolução eletrônica e de design (principalmente em relação à ventilação e capacidade térmica para aquecimento e refrigeração) remonta ao século passado. Algumas máquinas com design diferenciado já estão disponíveis no mercado. Vê-se que, por muito tempo, a avicultura brasileira perdeu oportunidades de melhorar seus resultados zootécnicos por meio da compreensão e atendimento das necessidades fisiológicas do embrião moderno, condições oferecidas pelos atuais equipamentos de incubação em estágio único. Felizmente, tais equipamentos já estão disponíveis no Brasil e a presença de fornecedores é relativamente ampla, havendo alguns equipamentos que atendem à fisiologia embrionária.

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Sistema de escaneamento de ovos

ma, a temperatura da incubadora é ajustada continuamente em resposta à temperatura real da casca do ovo, permitindo a manutenção da temperatura embrionária ideal/desejada e o controle, com precisão, da taxa de desenvolvimento metabólico do embrião. O escaneamento de ovos minimiza a mortalidade embrionária e aperfeiçoa a eclodibilidade. Pintinhos de um dia de alta qualidade também garantem ganhos significativos no desempenho pósnascimento (viabilidade, crescimento e taxa de conversão alimentar). Os ovos precisam perder uma determinada quantidade de peso durante a incubação para alcançar a eclodibilidade e qualidade ideais dos pintinhos de um dia. Isso exige que água seja transportada do ovo para o ambiente através da casca. O sistema de perda de peso dinâmico realiza a pesagem on-line dos ovos e ajusta o nível de umidade na incubadora, com base em medições da perda de peso dos ovos durante o processo de incubação. Ao controlar o nível de umidade na incubadora, a taxa dessa perda de água (e peso) pode ser gerenciada, levando em consideração a condução de vapor de

NOVAS TECNOLOGIAS UTILIZADAS NA INCUBAÇÃO

água da casca do ovo do lote específico.

Um dos mais inovadores sistemas tecnológicos utilizados na incubação é o escaneamento de ovos. Nesse siste-

perfis do nascedouro ao processo de nascimento.

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A tecnologia de embriorresposta sincroniza os


las resfriadas, sendo ideal que não se estoquem ovos por mais de 15 dias. Nas operações que adotam o sistema de incubação de estágio múltiplo, uma etapa que aumenta a eficiência do sistema é o aquecimento dos ovos de oito a 12 horas antes da incubação, prática denominada pré-aquecimento ou aclimatação, que evita o choque térmico na entrada dos ovos. A análise dos ovos não eclodidos, conhecida como embriodiagnóstico, permite verificar em qual idade ocorreu maior mortalidade embrionária, determinando, assim, em qual processo pode estar havendo algum problema. Por último, selecionar ovos antes da incubação permite eliminar ovos trincados e defeituosos, que podem se contaminar e servir de meio de propagação de bactérias para dentro das incubadoras. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Qualidade dos pintinhos: aparência, vivacidade e hidratação

Com a redução da idade de abate em frangos de corte, torna-se cada vez mais significativo o tempo que esses animais permanecem em desenvolvimento no processo de incubação e toda tecnologia empregada para maximizar essa etapa reflete diretamente no desempenho futuro.

Detecta, automaticamente, o momento exato de 100% da bicagem interna da casca e inicia uma se-

REFERÊNCIAS

quência de modificações no ambiente de incuba-

BOERJAN, M. Single Stage is the most natural choice. Pas Reform Academy, 2004.

ção para estimular o nascimento simultâneo. Além disso, reconhece, automaticamente, quando todos os pintinhos já saíram da casca. Essas ações reduzem o tempo de eclosão e concentram o nascimento muito próximo da hora da retirada dos pintinhos, resultando em animais mais uniformes, com menor taxa de mortalidade. Outras tecnologias de monitoramento permitem a redução do consumo de energia pelos

BOERJAN, M. Incubação em estágio único para melhorar a uniformidade. In: Conferência APINCO 2006 de ciência e tecnologia avícolas. ANAIS. p.325-333, 2006. CHIOCCHETTA, O. & FILHO, J.I. Avicultura de corte: viabilidade técnica e econômica nos diferentes sistemas de produção. in: SOBER – Sociedade Brasileira de Economia Rural. Anais, 2001. CORRÊA, W.; JACINTO, P.; SILVA, A. Descrição e previsões de series de preços e índices de produção agrícola no Brasil: uma abordagem através dos modelos estruturais de séries de tempo e redes neurais artificiais. In: SOBER – Sociedade Brasileira de Economia Rural. Anais, 2001. FRANCISCO, D.; GUAHYBA, A.; SALLE, C.T. Utilização de Redes Neurais Artificiais na Avaliação de Dados Sorológicos de Reprodutoras Pesadas para DNC, BI e IBD em uma Empresa Avícola e a sua Relação com os Parâmetros de Produção. In: XII Salão de Iniciação Cientifica e IX Feira de Iniciação Cientifica. Anais, Porto Alegre, 2000.

motores, durante os estágios menos críticos da incubação, aumentando a eficiência do processo e possibilitando até 50% de redução no consumo de energia do maquinário, além de prolongar substancialmente a durabilidade de várias

AUTORES

peças mecânicas. Entretanto, os incubatórios brasileiros levarão anos, quem sabe décadas, para se adequarem completamente aos novos conceitos de incubação. Assim, o que podemos fazer é adequar ou adicionar novos manejos de incubação para maximizar a

Luiz Fernando Teixeira Albino Zootecnista CRMV-MG nº 018/Z MSc, DSC, Docente da Universidade Federal de Viçosa (UFV) lalbino@ufv.br Bruno Reis de Carvalho Acadêmico em Nutrição e Produção de Monogástricos na UFV

produtividade das incubadoras, como, por exemplo, a estocagem de ovos para incubação em sa-

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Responsabilidade Entendendo a

Técnica

Os Médicos Veterinários e Zootecnistas, ao assumir a Responsabilidade Técnica de uma empresa, permitem que a sociedade tenha a certeza de que pode consumir produtos com qualidade sanitária e de respeito ao animal, como também comprar bons serviços Por: Flávia Tonin e Ricardo Junqueira Del Carlo

A

Responsabilidade Técnica é uma atividade exercida por Médicos Veterinários e Zootecnistas de extrema importância para o bem da sociedade e ambiente. Pelo aval profissional, a sociedade tem a certeza de que

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pode consumir produtos com qualidade sanitária e de respeito ao animal, como também comprar bons serviços. A consequência da segurança proporcionada pela Responsabilidade Técnica está presente na rotina das pessoas: em visitas ao supermercado;


compra de produtos de origem animal; aquisição de produtos para seu animal de estimação; visita a um hospital veterinário, entre tantas outras atividades. Dentro das empresas, os profissionais desempenham importante papel de orientação. Uma empresa na qual exista um profissional inscrito no Sistema CFMV/CRMVs terá maiores chances de sucesso. Os consumidores de bens, produtos e serviços exigem, cada vez mais, maior qualidade do que lhes é oferecido e cabe aos empresários se aprimorar sempre, em busca de qualidade superior e para surpreender positivamente seus clientes. O Médico Veterinário e o Zootecnista seguem normas de orientação técnico-profissional que são destinadas aos que desempenham a função. Eles serão responsabilizados pelos atos que, no exercício da profissão, praticarem com dolo ou culpa, respondendo ética, civil e penalmente pelas ações que venham a causar dano. São esses os motivos que levaram os legisladores à elaboração e publicação de leis que obrigam a presença de profissionais Responsáveis Técnicos (RTs). Relação com o Sistema CFMV/CRMVs

A Responsabilidade Técnica é uma das áreas de atuação que mais empregam profissionais no Brasil. No Sistema CFMV/CRMVs, existem 57.249 contratos

Responsabilidade Técnica - etapas

de Responsabilidade Técnica corretamente registrados ou ativos. Eles são de responsabilidade de 29.194 Médicos Veterinários e Zootecnistas, o que corresponde a 25% dos profissionais ativos em todo o sistema. Há uma média de quase dois contratos por profissional, pois, dependendo das exigências da atividade, ele pode ser responsável por mais de uma anotação. Do total, 60% são homens e 40%, mulheres. Com a fiscalização dos Conselhos Regionais de Medicina Veterinária (CRMVs) nos estabelecimentos, esse número tende a ser ainda maior. Cabe aos CRMVs adotar todos os procedimentos administrativos e de fiscalização para orientar, implantar, coordenar, supervisionar, avaliar e executar a aplicação dos respectivos regulamentos. Por parte do profissional, ele deverá apresentar ao CRMV de sua jurisdição a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) firmada com o estabelecimento para que seja submetida à análise e homologação. O profissional que deixar de ser o RT de pessoa jurídica que exerça atividade vinculada à profissão é obrigado a comunicar essa ocorrência de imediato ao CRMV. A pessoa jurídica terá um prazo de 20 dias para promover sua substituição temporária ou definitiva. As atividades próprias do RT variam em função da natureza do empreendimento e de seu estado. Além da legislação federal, existem regras específicas estaduais publicadas pelos CRMVs. Vale lembrar, entretanto, que na execução do seu trabalho o profissional não deve se ater somente a elas, uma vez que no dia a dia da empresa acontecem situações cujas soluções não estão contempladas em manuais. O profissional deve estar ciente de que as atribuições técnicas e legais da inspeção e fiscalização dos produtos e insumos são da competência do poder público, sendo, portanto, distintas das atividades do RT. Ainda, ao consultar a legislação, deve estar atento à possibilidade de revogação, alteração e surgimento de novas normas que regulem o assunto de seu interesse, bem como variações estaduais.

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Abrangência da Responsabilidade Técnica no Brasil Estado

O que é o RT? É o profissional capacitado, prestador de serviço autônomo ou empregado, que responde técnica, ética e legalmente pelos seus atos profissionais e pelas atividades peculiares à Medicina Veterinária ou Zootecnia exercidas pelas empresas nas quais atua. Já a atividade Responsabilidade Técnica trata do exercício profissional com vistas a garantir ao consumidor a qualidade dos serviços prestados.

o Médic io inár Veter

e atant contr

art crMV

M as nor t de r

dade

socie

> Garantia de bons produtos > Qualidade dos serviços

Profissionais ativos

Contratos ativos*

AC

23

32

AL

178

284

AM

208

479

AP

14

19

BA

982

1.960 679

CE

361

DF

527

878

ES

601

1374 3.123

GO

1.551

MA

262

417

MG

3.640

8.154

MS

635

833

MT

687

1113 771

PA

488

PB

114

134

PE

805

1.648

PI

121

177

PR

3.206

6.841

RJ

2.862

5.428

RN

105

162

RO

332

672

RR

26

39

RS

3.535

7.915

SC

1.768

4.056

SE

134

199

SP

5.844

9.438

TO

185

424

TOTAL

29.194

57.249

* O mesmo profissional, dependendo da exigência da atividade, pode ter mais de um contrato. Fonte: Siscad/CFMV e CRMV -MG. Maio/2015

> desenvolvimento empresarial

Atribuições gerais do RESPONSÁVEL TÉCNICO ▶

Manter relacionamento adequado com os órgãos oficiais de fiscalização.

Comunicar as autoridades sanitárias da ocorrência de doenças de notificação compulsória.

Propor revisão de normas legais ou decisões, sempre que estas venham a conflitar com aspectos científicos, técnicos e sociais.

▶ Emitir Termo de Constatação e Recomendação sempre que comprovar problemas técnicos ou operacionais ou para formalizar sugestões ao responsável legal ou preposto do estabelecimento. ▶ Emitir o Laudo Informativo quando o proprietário ou o responsável pela empresa negar-se a executar as recomendações prescritas ou colocar obstáculos para o desempenho da sua função. ▶

Orientar a adoção de medidas preventivas e reparadoras a possíveis danos ao meio ambiente.

No caso de cancelamento da ART, comunicar imediatamente ao CRMV.

O RT poderá consultar profissional especialista para emissão de laudos ou realização de serviços para os quais haja impedimento pessoal, técnico ou legal.

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Elevado padrão ético

Q

uando escândalos sobre carne abatida e mal conservada estouram na mídia ou quando maus-tratos são filmados por câmeras escondidas em pet shops, o primeiro profissional lembrado é o RT, carregando a imagem negativa para toda a profissão por ele representada. Cumprir a Responsabilidade Técnica vai além de responder civil e legalmente pelos atos técnicos da empresa que o contrata: significa ser responsabilizado eticamente pelo que é realizado. A ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos seus objetivos é a busca de justificativas para as regras propostas pela moral e pelo direito. Ela é diferente de ambos – moral e direito –, pois não estabelece regras. A reflexão sobre a ação humana é que a caracteriza. Além da ética própria de cada ser humano, a Medicina Veterinária e a Zootecnia têm seus Códigos de Ética orientadores, além das legislações para áreas específicas. Essa junção de regras, tendo por maestro a consciência humana, nunca deve ser deixada de lado ao assumirmos nossas responsabilidades.

Benedito Fortes de Arruda Presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV)

CFMV

Legislação do CFMV e CRMVs para o tema ▶ 1.069/2014

▶ 831/2006

▶ 1.041/2013

▶ 683/2001

COMO TRABALHAR NA ÁREA ▶ Especializar-se.

▶ 923/2009

CRMVs

▶ Procurar diretamente as empresas para

CE 05/2013 DF 6/2014 e 7/2014 ES 001/2015 GO 461/2007, 475/2011 e 484/2013 MA 03/2015 MG 345/2011 e 352/2014

MS 35/2008, 32/2008 e 57/2015

RS 2/2005, 7/2008 e 13/2010

MT 01/2007, 06/2007, 37/2015, 39/2015 e 40/2015

SC 042/2007 e 079/2010

PR 4/2011, 10/2013 e 12/2014 RJ 039/2013

SE 002/2009 SP 1.753/2008, 1.873/2009 e 015/2011 TO 15/2004 e 19/2011

Fonte: CFMV e CRMVs em maio de 2015.

candidatar-se. ▶ Buscar vagas em bancos de empregos e no

site de alguns CRMVs. ▶ Cadastrar currículos no site de alguns CRMVs.

Os CRMVs oferecem cursos e seminários para qualificação na área. Em alguns estados eles são obrigatórios. Fique atento!

O Manual de Responsabilidade técnica está disponível aos profissionais em todos os sites dos CRMVs!

A legislação está em constante atualização. Consulte o CRMV de sua jurisdição.

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Particularidades das Responsabilidades Técnicas São dezenas as atividades que necessitam de um Médico Veterinário e Zootecnista como RT. Elas têm especificidades que apenas quem está no ramo pode ajudar a entender.

Hospital veterinário

Em seu dia a dia, o RT de um hospital gerencia, principalmente, os processos de atendimento, que precisam ser controlados para que seja mantida a qualidade final. O trabalho é feito por meio de auditorias, monitoramento de indicadores de desempenho e treinamento de profissionais. Esse gerenciamento e controle são necessários para padronização do trabalho da equipe envolvida. A gestão adequada da qualidade dos atendimentos permite a oferta de serviços de maior qualidade, a valorização do profissional, além da segurança das famílias que receberão os serviços veterinários prestados.

▶ Conhecer o planejamento e processos de trabalho. ▶ Acompanhar e orientar a equipe. ▶ Estar atualizado sobre a legislação e normas. ▶ Utilizar ferramentas que garantam o padrão e qualidade dos procedimentos.

Mário Marcondes dos Santos

Médico Veterinário (CRMV-SP nº 12618). MSc e DSc. Diretor clínico e RT pelo Hospital Veterinário Sena Madureira, em São Paulo, SP.

BIOTÉRIOS

Com uma legislação nova que obriga a presença de um Médico Veterinário em biotérios, tornou-se um mercado em crescimento. O RT deve garantir a saúde, bem-estar e boas práticas de manejo e experimentais em animais de laboratório. Também é sua atribuição supervisionar, coordenar e orientar as atividades desenvolvidas no biotério, além de avaliar os procedimentos experimentais e orientar o pesquisador, visando ao bem-estar animal. Acredito que apenas pesquisadores e pessoas envolvidas na área possuam conhecimento sobre a atuação do Médico Veterinário como RT em biotérios.

Claudia Madalena Cabrera Mori

Médica Veterinária (CRMV-SP nº 8527). MSc, DSc. Trabalha há 19 anos com animais de laboratório no Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP),, sendo contratada como Médica Veterinária de 1996 a 2013 e, a partir de fevereiro de 2013, professora das disciplinas de Animais de Laboratório.

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▶ Ter formação específica e experiência na criação e manejo de animais de laboratório. ▶ Conhecer aspectos fisiológicos, anatômicos e reprodutivos das espécies convencionais de laboratório. ▶ Planejar considerando aspectos construtivos e de gestão, bem como enfermidades em animais de laboratório e sanidade animal. ▶ Conhecer a fisiologia, anatomia, comportamento e manejo, bem como sanidade das principais espécies não convencionais de laboratório (cães, mini pigs, aves, peixes e primatas não humanos). ▶ Conhecer procedimentos experimentais, como anestesia, analgesia, cuidados pré e pós-operatórios. ▶ Conhecer sobre genética, controle genético de animais de laboratório e desenvolvimento de modelos animais.


ANIMAIS SELVAGENS - CETAS ▶ Orientar a construção e manutenção de instalações. ▶ Visar à saúde e bem-estar dos animais, garantindo também a integridade física de funcionários. ▶ Proceder à avaliação clínica e ao tratamento de enfermos oriundos de apreensões. ▶ Acompanhar ações para reintrodução ao habitat natural. ▶ Notificar as autoridades sanitárias acerca de ocorrências relevantes de saúde pública (como zoonoses, por exemplo). ▶ Manter-se atualizado, acatar e fazer cumprir as normas e a legislação. ▶ Agir de forma integrada com os profissionais que exercem a fiscalização oficial em órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Nos Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) o RT atua principalmente com a medicina da conservação. Trabalha essencialmente pela manutenção da saúde da fauna silvestre oriunda do tráfico de animais para a reintrodução desses animais na natureza ou sua destinação a programas de conservação de espécies. Ainda são poucos os profissionais na área e a demanda tem aumentado com a implantação, exigida por lei, de CETAS criados por instituições privadas relacionadas a empreendimentos passíveis de impacto ambiental. A sociedade ainda está conhecendo a atuação desse profissional.

Ana Carolina Fredianelli

Médica Veterinária (CRMV-PR nº 10221). MSc. Atuou em ações de resgate de fauna. Desde 2012, é responsável técnica e coordenadora do único Ceta em atividade no Paraná, em Tijuca do Sul, PR.

PET SHOPS E ESTABELECIMENTOS VETERINÁRIOS Nas lojas e pet shops, o RT deve zelar pela prática das normas e legislações. Também deve treinar as pessoas para cumprir as boas práticas. Ele deve sempre buscar atualização em cursos do CRMV, como também realizar pesquisas, principalmente sobre legislações, pois estas estão em constante mudança. Há demanda de trabalho, pois o mercado está percebendo a importância do profissional, cuja atuação vai além de assinar documentos e registros. A sociedade ainda tem pouco conhecimento da atuação profissional nas lojas. Quando ocorrem problemas, na maioria das vezes se procura o gerente ou dono da loja.

▶ Garantir o bem-estar animal em primeiro lugar. ▶ Orientar a equipe . ▶ Prevenir doenças e acidentes com os animais vendidos nos pet shops e com os atendidos pelos tosadores. ▶ Verificar os produtos vendidos na loja (vencimento, avarias, contaminações, conservação etc.). ▶ Ter conhecimento sobre o manual de legislação.

Valéria Pires Correa

Médica Veterinária (CRMV-SP nº 6671). Atuando na área há 24 anos, é professora na Universidade Anhembi Morumbi e responsável pela seleção de RTs das lojas Pet Center Marginal/Petz desde 2004. Atualmente, é diretora técnica da rede.

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SUPERMERCADO Em um supermercado, o profissional é responsável, principalmente, pela manutenção da qualidade dos alimentos. Para atuar, é importante gostar da área de alimentos e se aprofundar em estudos que envolvem tecnologias de produção e de conservação. A sociedade consumidora precisa ser conscientizada, ou seja, precisa compreender o impacto que a atividade do RT em supermercado pode ter em sua saúde. Dessa forma, a fiscalização pública e a educação do consumidor são importantes e fundamentais no processo. Quando houver essa sociedade conscientizada e preocupada com a saúde, haverá ampliação do mercado de trabalho. Também é necessário que os profissionais gerem resultados positivos para seus empregadores.

▶ Observar a qualidade dos produtos. ▶ Garantir o controle e segurança de processos. ▶ Fiscalizar a higiene e limpeza de instalações, equipamentos e pessoal. ▶ Conhecer e cumprir as legislações locais, estaduais e federais.

Jeferson Lydijusse

Médico Veterinário (CRMV-AM nº 0270). MSc. Proprietário da MMVA, que faz a Responsabilidade Técnica para o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Carrefour e Grupo Nova Era, em Manaus, AM.

Estabelecimentos Avícolas

FáBRICA DE RAÇÃO

Eliane Junqueira Horning

Médica Veterinária (CRMV-PR nº 5960). Atua como supervisora na Aurora Cooperativa Central Oeste Catarinense desde 2005, em Chapecó (SC), e coordena a equipe de Médicos Veterinários e técnicos agrícolas.

O mercado de trabalho tem capacidade de absorção de profissionais, pois todas as empresas e estabelecimentos que fabricam alimentos de origem animal necessitam de um RT para produzir e colocar seu produto no mercado. Ele é um profissional de grande importância para a sociedade por garantir a saúde e bem-estar, porém há pouco conhecimento em relação à sua existência. É nosso dever divulgar a importância do RT para a sociedade. ▶ Executar projetos de avicultura. ▶ Manter registro de dados relativos à produção (manejo zootécnico e sanitário). ▶ Orientar e treinar a equipe de trabalhadores. ▶ Assegurar o isolamento da granja de possíveis contatos externos. ▶ Manter controle rigoroso de acesso de pessoas e veículos ao interior da granja. ▶ Assegurar a higiene das instalações e adjacências. ▶ Ter conhecimento de biossegurança. ▶ Destacar a importância da higiene e saúde do pessoal responsável pelo manuseio de aves e qualidade higiênico-sanitária das instalações. ▶ Orientar o tratamento dos resíduos orgânicos. ▶ Estabelecer programa de controle integrado de pragas. ▶ Elaborar e fazer cumprir cronograma de vacinação.

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José Otávio Ferreira de Paula

Zootecnista (CRMV-MG n° 1664/Z). Responsável Técnico pela unidade de Lavras e Coordenador do Controle de Qualidade das sete unidades da Trouw Nutrition Brasil.

A atuação do profissional como RT em fábricas de ração está diretamente relacionada à sua formação e ao conhecimento adquirido sobre alimentação animal, matérias -primas, práticas de produção. Deve se aprofundar nas necessidades especificas da nutrição, evidenciando tanto a produção quanto a suplementação alimentar, para antecipar-se a possíveis problemas e propor soluções. O mercado de trabalho é amplo e as empresas se interessam por profissionais com esse perfil.

▶ ▶ ▶ ▶

Princípios da alimentação animal. Boas práticas de fabricação. Legislação sobre alimentação animal. Exigências de normas internacionais.


FRIGORÍFICOs

▶ ▶ ▶

▶ ▶

▶ ▶ ▶

Fiscalizar desde a propriedade rural. Sugerir e fiscalizar condutas de boas práticas no transporte. Conhecer os processos e procedimentos sanitários operacionais de abate para inspeção e orientação. Atentar-se para a higiene das instalações, equipamentos e pessoal. Monitoramento de temperatura, PH e controle microbiológico de carcaças, cortes, superfícies, equipamentos e utensílios. Preocupar-se com a qualidade da água. Monitorar o tratamento e destino de efluentes. Garantir que os Programas de Autocontrole - Procedimentos Padrão de Higiene Operacional (PPHO), Procedimentos Padrão de Higiene Pré Operacional (PPHPO), Procedimento Sanitário Operacional (PSO) - e registros sejam eficazes e gerem evidênEduardo Antônio Xavier cias de processos sob controle Médico Veterinário (CRMV-GO nº 1364) e segurança alimentar. Iniciou a atuação como RT em unidade frigorífica da Sadia, no Mato Grosso, hoje pertencente ao grupo JBS. Atualmente é RT da Goiás Boi e diretor da Multiplicar, empresa de consultoria e assessoria no segmento de alimentos.

O RT atua no frigorífico e no segmento industrial, com impacto direto de seu trabalho na saúde pública. Ele acompanha desde a sanidade animal no campo até o processo de abate, participando da inspeção e a fiscalização. Tem o ponto-de-vista higiênico-sanitário e tecnológico dos frigoríficos. É importante para a indústria por seu conhecimento técnico que proporciona crescimento e melhoramento da produção, seleção de fornecedores, qualificação e treinamento de pessoal. A responsabilidade técnica de uma unidade frigorífica é a base para a cadeia de alimentos que utilizam cárneos. A partir dela se faz a distribuição de matéria-prima para processamento por outras indústrias, como fábricas de derivados e de conservas, chegando ao consumidor por diversas vias. Portanto, uma matéria-prima mal processada ou manipulada de forma errada pode veicular doenças, zoonose ou até mesmo implicar em fraudes. A formação na graduação fornece o básico e o profissional deve buscar aperfeiçoamento. Existem cursos e pós-graduação, mas são importantes os estágios e atuações na área de alimentos. Há mercado e espaço para todos. Infelizmente, a sociedade não reconhece o trabalho do RT capacitado em segurança alimentar.

ESTABELECIMENTOS/ATIVIDADES QUE REQUEREM RESPONSABILIDADE TÉCNICA • Indústrias de carne, laticínios, pescados e produtos de uso veterinário.

• Zoológicos, parques nacionais, criadouros de animais selvagens ou exóticos e afins.

• Supermercados.

• Empresas de controle e combate de pragas e vetores (dedetizadoras).

• Estabelecimentos avícolas. • Casas agropecuárias, aviários, pet shops, lojas de aquariofilia e outros estabelecimentos que comercializam ou distribuem rações e medicamentos de uso veterinário. • Estabelecimentos que industrializam rações, concentrados, ingredientes, sais minerais e outros produtos para consumo animal. • Planejamento, consultoria veterinária e consultoria zootécnica. • Aglomerações de animais com ou sem finalidade comercial (exposições, feiras, leilões, rodeios e outros eventos pecuários). • Estabelecimentos de reprodução animal.

• Hospitais, clínicas, consultórios e ambulatórios veterinários. • Prestação de serviço com uso da biologia molecular. • Serviços na área de rastreabilidade e certificação de origem. • Produção de animais de laboratório/biotérios. • Estrutiocultura (criadouros e incubatórios de ratitas), minhocultura, apicultura e suinocultura. • Hotéis para animais de companhia, canis e gatis.

• Produção de ovos e larvas de bicho-da-seda.

• Laboratório de diagnóstico e produção de bacterinas autógenas.

• Fazendas e criatórios de produção animal .

• Perícias judiciais.

• Piscicultura e demais organismos aquáticos.

• Tipificação de carcaças.

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Suínos

Interação com o tratador reflete na produção Estresse nas primeiras semanas de vida, como a presença de um tratador aversivo, pode influenciar negativamente a habilidade de reconhecimento social e dificultar o manejo na granja Entender o comportamento e as particularidades de cada espécie é necessário para ajustar o manejo e facilitar a vida dos animais e dos trabalhadores rurais. Na suinocultura brasileira, tipicamente familiar, a relação do tratador com o animal é estreita e influencia a produção e o bem-estar dos animais e dos granjeiros. Suínos têm alta capacidade exploratória e, para isso, seu olfato e audição são bem desenvolvidos. Eles usam esses atributos para reconhecer/distinguir coespecíficos e humanos. Porcos são animais que vivem em grupos e mantêm uma hierarquia estável e linear, por reconhecerem facilmente seus colegas. Tendem a ser agressivos com não familiares, mas não costumam demonstrar comportamento agressivo direcionado a animais conhecidos. A capacidade cognitiva e o desenvolvimento cerebral do suíno (e de outras espécies) sofrem influência direta do ambiente que o cerca, desde o nascimento. Estresse nas primeiras semanas de vida, como a presença de um tratador aversivo, pode influenciar negativamente sua habilidade de reconhecimento social. Esses animais podem apresentar problemas de aprendizado e memória e, assim, pobre bem-estar, dificultando o manejo na granja.

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Cinco formas como humanos são percebidos por suínos 1) Predador 2) Presa 3) Parte do ambiente (sem significado social) 4) Cooperador (simbiose) 5) Outro suíno (coespecíficos)


Os animais podem generalizar ou distinguir humanos diferentes. A generalização ocorre quando o animal responde a todos da mesma forma, sem distinção. Alguns estudos sugerem que suínos são capazes de discriminar pessoas, utilizando suas habilidades sensoriais para distingui-las. O tamanho da pessoa e sua postura estão mais associados ao reconhecimento do que a sua face, mas ainda não se sabe quais pistas os animais usam para distinguir pessoas. Todavia, esse reconhecimento parece depender da intensidade da interação entre humanos e animais. Aplicação prática

Um trabalho realizado no Laboratório de Bioclimatologia e Etologia da Universidade de São Paulo evidenciou que suínos reconhecem um tratador aversivo e o evitam como resposta ao medo que sentem. Os animais não generalizam esse comportamento a outras pessoas, sejam elas conhecidas ou desconhecidas. Além de reconhecerem o tratador aversivo, demonstraram se recordar dele após três semanas sem contato, evitando-o e mantendo a mesma resposta de medo que tinham quando esse tratador cuidava de suas rotinas. O medo é um estado emocional em resposta à percepção do perigo, manifestando-se nos animais por meio de luta ou fuga. Esse estado está ligado a estímulos que podem trazer risco ao bem-estar, ocasionando respostas físicas e psicológicas. Quando o animal sente medo de alguém ou de um objeto, evita a convivência e, quanto maior for a evitação, menor será seu bem-estar. Quando as práticas negativas são frequentes, elas podem aumentar o medo sentido pelos animais em relação aos humanos. Dessa forma, os animais podem ver a pessoa como uma possível ameaça e reagir negativamente à sua presença, dificultando o manejo ou trazendo riscos ao tratador.

Tratamentos negativos ocasionam: • menor taxa de crescimento; • maior concentração de cortisol plasmático (hormônio indicativo de estresse); • menor taxa de prenhes; • problemas comportamentais (brigas, mordeduras e tentativa de fuga); • má qualidade da carne e menor tempo de validade.

Suínos reconhecem um tratador aversivo e o evitam como resposta ao medo que sentem Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

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Melhorar o fator humano na relação humano-animal pode ser a chave para a melhoria do bem-estar animal e o aumento da satisfação em trabalhar com produção O humano, por sua vez, vai tratar esse animal de forma ainda mais negativa em retaliação à dificuldade de manejo, o que vai gerar um processo de retroalimentação indesejável caracterizado pela insatisfação do tratador e prejuízos para o bem-estar de ambos: tratador e animal. Vários trabalhos correlacionam a interação negativa entre tratador e animal com o medo e produtividade. Nos suínos, o tempo despendido para interagir com o humano foi mais elevado em animais tratados de forma negativa do que nos tratados de forma positiva. Os tratados de forma negativa tiveram menor taxa de crescimento, maior concentração de cortisol plasmático (hormônio indicativo de estresse) e menor taxa de prenhes quando comparados com animais que receberam tratamento positivo ou neutro. Uma relação negativa entre tratador e animal também pode trazer problemas comportamentais indicativos de estresse, como brigas, mordeduras e tentativa de fuga da baia. O estresse pode ser responsável pela má qualidade da carne e menor tempo de validade, causando prejuízos econômicos. Por outro lado, interação positiva entre animais e humanos, mesmo em um ambiente desfavorável, pode amenizar o estresse crônico sofrido pelos animais. Assim como os tratadores de animais foram treinados para realizar e observar técnicas especificas, como detecção de cio, coleta de sêmen e inseminação artificial, podem e devem ser treinados para observar o comportamento dos animais e melhorar sua relação com eles. Melhorar o fator "humano" na relação humano-animal pode ser a chave para a melhoria do bem-estar animal e o aumento da satisfação em trabalhar com produção. Simples mudanças no trabalho com os animais podem surtir grandes efeitos. As principais, para evitar interação negativa, seriam: evitar movimentos bruscos, abolir a gritaria durante a rotina e nunca agredir os animais. São passos simples, fáceis e baratos, que refletem na melhoria do manejo e da produtividade.

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Teste de aproximação humana realizado pela equipe de pesquisa em Biometeorologia e Etologia da Universidade de São Paulo

AUTORES

Roberta Sommavilla Médica Veterinária CRMV-SC nº 4462 MSc, Doutoranda na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo (FZEA/USP) Evaldo Antonio Lencioni Titto Médico Veterinário CRMV-SP nº 2338 MSc, DSc, Docente da FZEA/USP


Educação em saúde Cabe aos Médicos Veterinários elaborar projetos de saúde pública veterinária com reflexo na proteção e manutenção da saúde do homem. As ações não podem se resumir a uma prática assistencialista, mas é também importante estimular práticas construídas numa perspectiva mais inclusiva e relacionadas à realidade local. Nesse contexto, surgem também os problemas ambientais e de saneamento. Para isso, é importante que a formação aconteça desde a graduação

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Foto: J. R. Modolo

Por que planejar a saúde?

A

implantação de um planejamento de saúde só será possível após terem sido caracterizados os fatores relacionados às enfermidades ou problemas diagnosticados; as características da área, ecossistema ou território; as dinâmicas das populações animal e humana e sua condição socioeconômica e cultural. As populações envolvidas devem conhecer a importância das ações propostas, aceitar, do ponto de vista social e epidemiológico, os métodos de controle e, ainda, entender que isso só poderá ser conseguido por meio de uma eficaz educação permanente em saúde.

A Lei nº 5.517 dispõe como competências privativas do Médico Veterinário: a assistência técnica e sanitária aos animais, sob qualquer forma; o planejamento e a execução da defesa sanitária animal; o estudo e a aplicação de medidas de saúde pública no tocante às doenças de animais transmissíveis ao homem.

Planejamento de saúde pública veterinária

Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASFs) têm uma constituição multiprofissional que deve atuar de maneira integrada a outros profissionais da Equipe da Saúde da Família e da Equipe de Atenção Básica à Saúde, contribuindo para a integralidade dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).

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Estudo das características da área de um município para elaboração de planejamento de saúde pública veterinária

apropriados, métodos determinados e objetivos e metas definidos, além do efetivo controle e domínio desses procedimentos. O planejamento de saúde pública veterinária deve ser periodicamente avaliado e monitorado para realização de pequenos ajustes em função da meta proposta, de modo que o Médico Veterinário realiza a prestação de seus serviços como um intraempreendedor. O Médico Veterinário que dá alta prioridade para a saúde animal, objetivando a saúde pública, realiza uma das suas mais importantes funções profissionais e sociais. Torna-se, então, imperioso consignar que essa atuação, na origem do problema, assim como sua atuação na veterinária de produção, continua sendo o procedimento mais racional e econômico de proteção e manutenção da saúde humana, proporcionando, por consequência, melhor qualidade de vida para as pessoas em várias dimensões.

A Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, que aprova a Política Nacional de Atenção Básica para o SUS, inclui o Médico Veterinário no NASF. Entre as várias atuações desse profissional, faz-se necessário destacar o desenvolvimento de projetos de saúde com foco nas enfermidades transmitidas dos animais para os seres humanos. Paradoxalmente, uma pesquisa de opinião publicada pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), em 2012 (Rev. CFMV n. 57), mostra que, no Brasil, 33% dos Médicos Veterinários entrevistados afirmaram não conhecer o NASF, que se encontra inserido no SUS, e que 62% gostariam de aprofundar seus conhecimentos de atuação nesse programa.

Planejamento da saúde para a veterinária de produção

É sabido que 80% das enfermidades que acometem direta e indiretamente os seres humanos, na atualidade, têm origem nos animais. A intervenção só pode ser feita por meio de um planejamento de saúde com roteiros de ações

Uma das necessidades do homem é ter uma fonte confiável de alimentos e, entre suas grandes aspirações, está a eficiente produção de animais zootécnicos, capazes de produzir proteína de qualidade.

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Uma boa formação profissional, com comportamento de empreendedorismo, contribuirá para um processo de transformação da nossa sociedade, com reflexo direto na melhoria da qualidade de vida pessoal e igualmente da coletividade. Será possível, assim, ocupar um espaço diferenciado e importante no mercado de trabalho e na sociedade atual e futura.


Planejamento Saúde Pública Veterinária Saúde para a Veterinária de Produção

Antes da intervenção

• Obter dados • Reunir informações • Identificar problemas • Conceituar • Decidir

UMA INTERVENÇÃO EFICAZ DEPENDE de...

• Roteiro apropriado de ações • Objetivos e metas definidos • Ações apropriadas • Métodos determinados • Controle e domínio dos procedimentos

Como consequência da globalização, têm ocorrido mudanças de hábitos de consumo e aumentado as exigências sanitárias. A empresa e a indústria, por sua vez, têm percebido que, para melhorar sua lucratividade, precisam interagir com o setor produtivo desde a origem, ou seja, na propriedade rural. Esse aspecto confirma o fim da visão segmentada da cadeia de produção, em que cada setor se preocupa apenas com a gestão de seu próprio negócio. Reafirma, ainda, a necessidade de integração, visando à obtenção de melhores produtos, uma vez que a indústria não tem condição de transformar em excelente uma proteína animal de péssima qualidade. É preciso chamar atenção, contudo, para a produtividade, que é um sistema complexo, constituído por um grande número de eventos e fatores, todos reagindo entre si, e, ao mesmo tempo, dinâmico. Alguns fatores exercem influência apenas nos animais, isoladamente; outros operam no rebanho; outros são externos aos animais, mas com reflexos neles.Sendo assim, as assistências médicoveterinárias não podem ser encaradas como de caráter emergencial a indivíduos doentes, atitude que priva o proprietário rural e o Médico Veterinário de uma apreciação objetiva da saúde do rebanho, do manejo e da produção. Essas situações sugerem a atuação do Médico Veterinário na origem da cadeia de produção, dentro da porteira, para que seja possível, dessa forma, transformar a produção animal em fator positivo tanto para a saúde de rebanhos quanto para a saúde pública. Dessa forma, atendem-se as exigências sanitárias, diminuindo as barreiras co-

merciais, valorizando os animais e seus produtos, viabilizando processos industriais e protegendo a população humana dos agravos transmitidos, direta e indiretamente, pelos animais de produção, integrando, enfim, a cadeia de produção animal com saúde. Sem a efetiva conscientização de saúde de populações, feita no início da produção animal, a integração da cadeia produtiva estará comprometida e, quando o produto atingir o mercado de produção, depois da porteira, o insucesso do produtor rural será revelado. Evidentemente, esse aspecto causa prejuízos, alguns até imensuráveis. A base da prestação de serviço pelo Médico Veterinário, como intraempreendedor, é a vigilância constante, ou seja, a administração e monitoramento planejados da saúde do rebanho, de tal modo que sejam periodicamente identificadas as razões de não estarem sendo alcançados certos resultados projetados e esperados, discutindo-as, então, com o proprietário rural para que possam ser satisfeitas as necessidades dele como empreendedor. As doenças populacionais são fatores importantes que concorrem para a interrupção ou quebra da produção, tendo-se, consequentemente, aumento dos custos. Por meio do planejamento, será possível administrar a saúde do rebanho, de modo que sejam alcançadas metas predeterminadas de desempenho e controle de enfermidades e, ainda, identificadas as razões para não terem sido alcançados certos objetivos ou metas da propriedade rural, com condições economicamente viáveis, aplicáveis na prática, aceitáveis pelo produtor e com efetivo controle e domínio desses procedimentos. Desse modo, há amplas evidências de que os Médicos Veterinários que dão alta prioridade à saúde do rebanho são também capazes de proporcionar um serviço de veterinária preventiva, orientado para a produção eficiente, colocando à disposição das indústrias e dos consumidores produtos higiênicos e, sobretudo, livres de agentes zoonóticos, reconhecendo, ainda, os efeitos das doenças populacionais para uma produção eficiente e econômica.

AUTOR

José Rafael Modolo Médico Veterinário CRMV-SP n. 2180 Docente da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual Paulista (FMVZ/Unesp), Câmpus Botucatu Conselheiro do Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo (CRMV-SP) e gestor pela parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP)

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Saúde pública veterinária aplicada ao SUS/NASF é disciplina da graduação O Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual Paulista (FMVZ/Unesp), Câmpus Botucatu, propõe um modelo de ensino e aprendizagem que conta com atividades práticas realizadas na Secretaria Municipal de Saúde de Botucatu na área da saúde pública veterinária, e que complementam a formação do acadêmico

A

profissão de Médico Veterinário habilita a atuar como administrador da saúde coletiva, a exercer atividades de gestores da saúde e, ainda, dá competência para tomada de decisões no âmbito de todos os setores envolvidos, local, regional ou nacionalmente, incluindo inserções importantes em políticas públicas, sociais e econômicas.

Planejamento de saúde pública veterinária aplicado ao Sistema Único de Saúde (SUS)/nasf

TEORIA • • • •

O SUS e o NASF para o Médico Veterinário. Atenção básica e estratégica de saúde da família - NASF. Comportamento de empreendedorismo na Medicina Veterinária. Ética e legislação veterinária na saúde pública - NASF.

PRÁTICA • Participação nas atividades dos agentes comunitários de saúde/ agentes de saúde ambiental. • Participação nas atividades de intervenção em saúde no âmbito das unidades de saúde e da vigilância ambiental em saúde.

TEORIA • Territorialização e mapeamento para planejamentos de saúde. • Técnicas de abordagem para coleta de dados e informações na população. • Análise de dados epidemiológicos para diagnóstico e tomada de decisão. • Geoprocessamento para planejamentos de saúde.

PRÁTICA • Oficina no laboratório de informática. • Análise de dados epidemiológicos para diagnóstico e tomada de decisão.

TEORIA • Pareceres técnicos em saúde pública veterinária. • Importância das caracterizações qualitativa e quantitativa na população. • Educação permanente em saúde pública veterinária - NASF. • Elaboração de planejamentos de saúde pública veterinária. • Estratégias de comunicação para sensibilização e apoio.

PRÁTICA • Participação nas reuniões dos NASFs. • Participação na elaboração de estratégias para controle de enfermidades de interesse em saúde animal e humana. • Participação na elaboração e execução das atividades de educação em saúde.

J. R. Modolo

As determinações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para seus países-membros estabelecem a necessidade de participação do Médico Veterinário no planejamento, coordenação e administração de programas de saúde. Por sua vez, em evento realizado no Brasil, em 2013, a Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) instituiu o Primeiro Dia (Day1), aquele que define que os recém-formados, já no primeiro dia pós-conclusão da graduação, apresentem, além de conhecimentos competentes, atitude, aptidão, capacidade de comunicação, habilidades para promoção da saúde animal e saúde pública veterinária por meio de programas de controle de enfermidades populacionais. Já os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASFs), estabelecem que os Médicos Veterinários devem atuar de maneira integrada a outros profissionais da Equipe da Saúde da Família e da Equipe de Atenção Básica à Saúde, qualificando, assim, melhor os acadêmicos para poderem estar mais bem preparados para a atuação nessa nova e importante oportunidade profissional da Medicina Veterinária.

Programa analítico

AUTORES

Aplicação de inquérito sobre saúde a dono de cão em campanha de vacinação contra a raiva.

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Cassiano Victória Médico Veterinario CRMV-SP nº 11495 Docente da FMVZ/Unesp, Câmpus Botucatu

José Rafael Modolo Médico Veterinário CRMV-SP nº 2180 Docente da FMVZ/Unesp, Câmpus Botucatu. Conselheiro do CRMV SP e gestor pela parceria com o SEBRAE-SP


Fotos: UFV

Inserção do profissional na Estratégia Saúde da Família: experiência do Programa de Residência em Medicina Veterinária da Universidade Federal de Viçosa (UFV) É necessário que os programas se adaptem às exigências dos ministérios, propondo novas configurações de seus projetos pedagógicos. O desafio é articular à formação do Médico Veterinário que pretende atuar em áreas exclusivas, como as clínicas médica e cirúrgica, competências que permitam um diálogo efetivo com a saúde pública

A

s recentes mudanças na conformação dos programas de residência em área profissional da saúde instituídas pelo Ministério da Educação (MEC), em consonância com as diretrizes do Ministério da Saúde de 2012, que implicam a formação do profissional para atuação no Sistema Único de Saúde (SUS), vêm impondo desafios aos programas de residência em Medicina Veterinária. De forma geral, os programas nessa área, no Brasil, privilegiam a formação técnica orientada para a prática profissional liberal, a exemplo da atuação em clínicas e hospitais veterinários, não sendo prioridade a formação para atuação no SUS. Vale ressaltar que a formação em Medicina Veterinária prevê o desenvolvimento de habilidades específicas para atuação em saúde pública, a exemplo das ações relacionadas à vigilância em saúde, inspeção de produtos de origem animal, controle sanitário de animais de produção, entre outras.

Nesse contexto, é necessário que os programas se adequem às exigências dos ministérios, propondo novas configurações de seus projetos pedagógicos. No que diz respeito à Medicina Veterinária, a recente incorporação dessa ocupação nas equipes de profissionais que podem compor os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASFs), instituída pela Portaria MS nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, é mais um incentivo para repensar as concepções e conformações dos programas de residência, contribuindo para maior efetivação da participação desse profissional na saúde pública. Aliás, essa é uma necessidade que vem sendo cada vez mais sinalizada, haja vista a crescente importância que zoonoses, bem como problemas relacionados ao expressivo aumento da população de animais de companhia, vêm adquirindo em diferentes contextos, nacionais e internacionais, produzindo e reconfigurando perfis epidemiológicos de doenças e impondo desafios complexos que requerem necessariamente abordagens multiprofissionais e interdisciplinares.

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Caminhadas transversais realizadas junto a Agentes Comunitários de Saúde nas visitas domiciliares.

Esse desafio não é de fácil superação, pois, se por um lado a exigência de atuação no SUS impõe a necessidade de formação em saúde pública, não significa a proposição de residência específica nessa área, que, a bem da verdade, já existe, a exemplo de programas de residência multiprofissional em saúde coletiva, nos quais se inclui o profissional de Medicina Veterinária (Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz), ou programas de residência em Medicina Veterinária que preveem como campo/área de atuação a Medicina Veterinária preventiva e/ou saúde pública (Universidade Estadual de Londrina e Universidade Estadual Paulista, Câmpus Jaboticabal). O desafio que apontamos é articular à formação do Médico Veterinário que pretende atuar em áreas exclusivas, como as clínicas médica e cirúrgica, competências que permitam um diálogo efetivo com a saúde pública. Essa perspectiva de formação nos parece particularmente interessante, na medida em que não é raro vermos profissionais que dividem a jornada de trabalho em atividades de assistência à saúde animal, como prática privada, e em serviços de saúde pública, principalmente no nível municipal. Na UFV, o Programa de Residência em Medicina Veterinária (PRMV/UFV), vinculado ao Departamento de Veterinária (DVT), vem, desde 2014, experimentando modos de inserção do residente em campos da saúde coletiva, tendo como cenário de ação/intervenção a atenção básica desenvolvida no município de Viçosa no contexto da Estratégia Saúde da Família (ESF). Este relato pretende apresentar os principais eixos de atuação desse programa, problematizando alguns limites e desafios.

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Modos de ação e intervenção

Em Viçosa, as atividades do PRMV/UFV, no contexto da ESF, envolvem três Unidades de Saúde da Família (USFs), que contemplam cinco equipes, com cobertura aproximada de 2.600 famílias (12.000 habitantes) residentes em bairros/regiões localizados na periferia do município. Participam da ação 26 Médicos Veterinários vinculados ao PRMV/UFV, área de concentração clínica e cirurgia de pequenos animais (13 residentes nível 1 e 13 residentes nível 2), em sistema de rodízio nas três USFs. Para atuação junto às equipes, são realizadas atividades de formação dos residentes envolvendo temas como Política Nacional de Atenção Básica, sistemas de informação em saúde, vigilância em saúde, educação popular, posse responsável e controle populacional de cães/gatos não domiciliados, entre outros. As atividades de campo incluem caminhadas transversais com os Agentes Comunitários de Saúde (ACSs) para reconhecimento do território de atuação da equipe de saúde e diagnóstico da área, identificando problemas e dificuldades relacionados à atuação do profissional em Medicina Veterinária e que poderão ser trabalhados em atividades posteriores. O diagnóstico contempla o olhar sobre questões ambientais da população e de animais. As atividades nos PSFs ocorrem todos os dias da semana, mas cada unidade é visitada com intervalo de 21 dias, por dois residentes, sendo um do primeiro e outro do segundo ano do curso (R1e R2).


As ações desenvolvidas nas USFs são planejadas e discutidas com a equipe de saúde e com a coordenação acadêmica das atividades de campo do PRMV/UFV. De forma a orientar esse planejamento e definir prioridades de intervenção, cada residente é estimulado a registrar suas opiniões, percepções e sentimentos em um caderno de campo, que também é consultado como instrumento de acompanhamento e avaliação das atividades. Durante as caminhadas transversais com os ACSs, os residentes participam das visitas. Nesse momento, têm a oportunidade de conversar e orientar as famílias sobre cuidados gerais com os animais domésticos, posse responsável e outros temas que porventura são demandados e que dizem respeito ao campo de atuação do profissional em Medicina Veterinária. Nas visitas, também é realizado o cadastramento das famílias em duas fichas de registro, sendo uma destinada à caracterização da microárea pertencente à determinada USF e a outra ao cadastro dos animais domésticos existentes na residência, em que também é registrado o interesse do proprietário em castrá-los. Uma característica comum às áreas cobertas pelas três USFs diz respeito ao elevado número de animais (cães, principalmente) com acesso à rua, sendo essa questão apontada como importante problema pelas equipes de saúde e também pela população. Assim, paralelamente às ações descritas, iniciou-se, em setembro de 2014, o procedimento de castração (cães e gatos), tendo como orientação o cadastro realizado sobre a população animal. Esse procedimento inclui a visita do residente, acompanhado pelos ACSs, às residências dos interessados, para coleta de amostras de sangue e exame clínico dos animais para avaliação do risco cirúrgico. As cirurgias são realizadas no Hospital Veterinário (HVT) do DVT, sendo o proprietário responsável pelo transporte do animal para o procedimento cirúrgico. O pós-operatório é realizado no domicílio, com duas a três visitas do residente até a retirada dos pontos cirúrgicos. As caminhadas transversais permitiram observar vários problemas ambientais, relacionados à ausência ou precariedade de serviços básicos de saneamento, bem como o desconhecimento de práticas de cuidados gerais, como alimentação, amamentação, vermifugação, vacinação, entre ou-

A castração dos animais, ainda que tenha essencialmente um caráter assistencialista, foi fundamental para pactuar e reforçar vínculos do Médico Veterinário com a equipe de saúde e a população

tras, que poderiam melhorar o convívio com os animais de estimação, prevenindo, dessa forma, seu abandono nas ruas. Os registros nos cadernos de campo, além do papel funcional de orientação e planejamento das ações e atividades, confirmam o grande potencial reflexivo dessa prática, na medida em que os relatos vão desde aspectos descritivos da realidade e de formas de vida das pessoas a sentimentos e emoções, contraditórios muitas vezes, sobre incapacidades pessoais e técnicas para lidar com determinadas demandas. Por outro lado, essas mesmas limitações são muitas vezes revistas pelos residentes, na medida em que também trazem nos relatos formas que encontraram para contorná-las ou superá-las.

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Considerações

A experiência de articulação da formação do residente em Medicina Veterinária junto ao trabalho de equipes de saúde da família vem permitindo o contato e a reflexão sobre desafios que se impõem à atuação desse profissional no contexto da atenção primária. Ainda que tenhamos registrado resultados significativos no período, a participação desse profissional foi, a princípio, vista com estranhamento, desconfiança e também expectativa. No início das atividades, os residentes foram muitas vezes questionados por integrantes da equipe de saúde e também pela população – o que estariam fazendo ali, uma vez que a equipe não tinha condições de incorporá-los por falta de espaço ou estrutura? Por outro lado, quando era valorizada a presença do residente, esta era quase sempre associada ao “doutor de cachorro”, indicando a concepção mais reconhecida de atuação como restrita ao campo da clínica médica-cirúrgica de animais domésticos. Em se tratando dos residentes, também foi evidente o estranhamento e resistência iniciais, o que inclusive foi registrado em vários relatos nos cadernos de campo.

A presença do residente nas equipes de saúde da família contribuiu como elemento de reconfiguração das práticas, na medida em que os ACSs passaram a identificar situações ou casos em que se supunha interessante a presença do Médico Veterinário Com o avançar da experiência, os ACSs começaram a organizar e pautar atividades para os residentes, registrando os domicílios que deveriam ser visitados. Também, quando os "resultados" começaram a ser demandados, principalmente pela equipe de saúde, decidiu-se por ante-

48

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cipar o início dos procedimentos de castração. Essa decisão foi bastante significativa, pois, atualmente, as ESFs do município são intensamente assediadas como parceiras em atividades de formação de estudantes da área da saúde (enfermagem, nutrição, medicina, educação física, mencionando apenas os cursos da UFV), o que não só impacta a rotina do serviço, como também cria expectativas. Registram-se, ainda, dificuldades de caráter estrutural, como o acesso precário (por meio de transporte público) a determinadas localidades, limitando o deslocamento dos residentes; o fato de algumas áreas de atuação serem caracterizadas por elevadas taxas de criminalidade e violência; e a estrutura curricular do curso previamente existente, que não permite maior flexibilidade e permeabilidade para lidar com a dinâmica da vida cotidiana, por certo diferente do ambiente ambulatorial e hospitalar. Por fim, a efetiva incorporação do profissional em Medicina Veterinária no SUS não apenas é desejável, como também necessária, na medida em que ações de promoção de saúde, dada sua complexidade, exigem atuações que requerem um olhar e intervenção multiprofissionais, interdisciplinares e intersetoriais, a exemplo, no contexto desta experiência, dos problemas ambientais e de saneamento identificados. Vale a pena ressaltar, também, que as ações não podem se resumir a uma prática assistencialista, uma vez que as demandas são reais e urgentes, sendo também importante estimular práticas construídas numa perspectiva mais inclusiva e relacionadas à realidade local, vislumbrando maior participação dos sujeitos na promoção da saúde.

AUTORAS

Andréa Pacheco Batista Borges Médica Veterinária CRMV-MG nº 2772 MSc, DSc Docente da UFV Paula Dias Bevilacqua Médica Veterinária CRMV-MG nº 3604 MSc, DSc Docente da UFV


Fotos: C. Molento

Diagnóstico

Interface entre bem-estar e maus-tratos O diagnóstico de bem-estar animal pode oferecer um instrumento útil ao trabalho de perícia médico-veterinária em situações de suspeita de maustratos. Uma intenção relevante é que a Medicina Veterinária possa, por intermédio de um protocolo simplificado, dar apoio à atuação dos policiais que estão à frente do contato inicial com as situações denunciadas

B

em-estar animal refere-se ao estado de um indivíduo em relação às suas tentativas

se caracteriza por uma agressão física intencional, de ca-

de se adaptar ao ambiente em que vive (BROOM;

de maus-tratos requer uma avaliação mais refinada por

MOLENTO, 2004). Maus-tratos aos animais são

parte de um Médico Veterinário.

proibidos em nosso país desde a Constituição Federal de 1988, que veda a crueldade em seu art. 225, incluindo a Lei Federal de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605), de 1998. E qual é a relação entre bem-estar e maus-tratos? O conceito de bem-estar animal apresentado é especialmente adequado para se realizar diagnóstico. Como o diagnóstico de bem-estar tem por objetivo principal entender uma determinada situação a partir da perspectiva do animal, podese imaginar uma interface entre tal diagnóstico e a verificação de situações de sofrimento. Essa constatação é particularmente importante, tendo em vista que aproximadamente 80% dos casos de maus-tratos contra animais são classificados como

ráter mais óbvio. Portanto, muitas vezes o reconhecimento

Sobre a relação entre bem-estar animal e maus-tratos, em termos de atuação técnica, pode ser ressaltada a importância da caracterização de maus-tratos a partir de perícia veterinária em animais vivos, ao se combinar uma avaliação detalhada de bem-estar com um ponto de corte, abaixo do qual uma situação de maus-tratos fica identificada. Com tal diagnóstico de bem-estar, aumenta a segurança na deliberação sobre a existência de maus-tratos, aprimorando as decisões jurídicas a partir de perícia médico-veterinária. Dessa forma, o suporte veterinário para a verificação da ocorrência de maus-tratos constitui um facilitador para a proteção dos animais no Brasil, realçando mais uma forma de colaboração de nossa classe profissional para as demandas sociais atuais.

negligência (MERCK, 2013). Em outras palavras, na

A partir da compreensão de que o diagnóstico de

maioria das vezes a ocorrência de maus-tratos não

bem-estar animal pode oferecer um instrumento útil ao

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80% dos casos de maus-tratos decorrem de negligência, não sendo de caráter óbvio. Reconhecimento requer

avaliação

refinada por parte de Médico Veterinário.

Estabelecer um ponto de corte entre bem-

estar e maus-tratos.

Comprovados os maus-tratos pela perícia, há

segurança nas decisões jurídicas.

Visão geral do protocolo de perícia em bem-estar animal para situações de suspeita de maus-tratos O protocolo de perícia em bem-estar animal é composto por quatro conjuntos de indicadores:

1

2

3

trabalho de perícia médico-veterinária em situações de suspeita de maus-tratos, foi publicada, no ano de 2012, uma dissertação de mestrado incluindo uma análise retrospectiva de denúncias de maus-tratos contra animais na região de Curitiba, estado do Paraná. Na referida dissertação, foi desenvolvido um protocolo para perícia em

4

bem-estar animal (HAMMERSCHMIDT; MOLENTO, 2014), que foi utilizado em primeira instância para

Nutricionais

Conforto

Saúde

Comportamentais

Para cada conjunto de indicadores, existem critérios que determinam o parecer como adequado, regular ou inadequado. Classificação do conjunto de indicadores Adequado

Regular

Inadequado

• • •

Integração de acordo com a classificação Todos os grupos de indicadores Um conjunto de indicadores (outros conjuntos classificados como adequados) Dois ou mais conjuntos de indicadores (outros conjuntos classificados como adequados)

Grau de bem-estar Muito alto Alto

cães domiciliados e semidomiciliados no município de Campo Largo, Paraná. Desde então, o protocolo vem sendo aprimorado e aplicado em diversos cenários, envolvendo diferentes espécies de animais. A adequação por espécie é muito importante, uma vez que o protocolo requer a consideração de particularidades, tanto fisiológicas quanto comportamentais. Uma intenção relevante dos profissionais da

Regular

área é que a Medicina Veterinária possa, por inter-

Um ou dois conjuntos de indicadores

Baixo

médio de um protocolo simplificado apenas para

Três ou mais conjuntos de indicadores ou na ocorrência de agressão física intencional

Muito baixo

o contato inicial com as situações denunciadas. Tal

Graus de bem-estar baixo e muito baixo são considerados inaceitáveis e devem ser descritos como maus-tratos. Grau de bem-estar regular é considerado aceitável se medidas corretivas são asseguradas. Graus de bem-estar alto e muito alto são considerados desejáveis para o bem-estar animal.

Uma vez conhecido o grau de bem-estar, a terminologia deve ser transposta pelo Médico Veterinário para aquela utilizada na legislação local de proteção animal, de forma que o protocolo seja útil para as decisões judiciais relacionadas a maus-tratos.

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verificar a existência de maus-tratos em relação a

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triagem, dar apoio à atuação dos policiais que têm apoio ocorre mediante a oferta de cursos sobre a utilização do protocolo de triagem no momento da averiguação de uma denúncia de maus-tratos contra animais. A utilização do protocolo de triagem tem por objetivo servir de apoio aos policiais, auxiliando -os na tomada de decisão quanto à necessidade de chamar um Médico Veterinário para averiguar detalhadamente a situação em pauta. Quando a aplicação do protocolo de triagem indicar ao policial necessidade de diagnóstico por


Médico Veterinário, este será chamado e emprega-

demanda da sociedade. Essa demanda por competência

rá o protocolo completo de perícia em bem-estar

também é crescente nas áreas de animais usados para

animal. Essa configuração de atendimento pode,

produção de alimentos, para pesquisa, para saúde pública

potencialmente, facilitar o trabalho dos policiais,

e meio ambiente e para animais de estimação, ou seja, a

auxiliar seus esforços para a melhor compreensão

tendência é que, onde haja a presença de animais, o Médi-

de cada cenário de denúncia e estimular o envol-

co Veterinário seja valorizado como profissional capaz de

vimento dos Médicos Veterinários como peritos

atuar em prol de seu bem-estar.

nessas situações, tanto proporcionando um maior contato entre polícia e profissional quanto organizando essa área de atuação.

As autoras manifestam agradecimentos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), às instituições participantes do Fauna Legal, incluindo a

Tudo indica que o diagnóstico de bem-estar

Universidade Estadual Paulista, Câmpus Botucatu, a à Uni-

animal para perícia de crimes contra animais será

versidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), à Polícia

consolidado como uma área importante de atua-

Federal e às Polícias Militares Ambientais dos Estados de

ção médico-veterinária, visto que passa a ser uma

São Paulo e do Paraná.

FAUNA LEGAL Recentemente, o projeto A Medicina Veterinária Legal Aplicada à Perícia nos Crimes Contra a Fauna, com nome fantasia Fauna Legal, foi aprovado no edital CAPES Forenses, permitindo considerável ampliação da pesquisa nessa área e a interação com Médicos Veterinários de outros países, o que revelou a originalidade do projeto no âmbito da Medicina Veterinária brasileira, suscitando grande interesse em parcerias e intercâmbio. A área relativa a bem-estar animal do projeto Fauna Legal tem por objetivos adaptar e implantar o protocolo de perícia em bem-estar animal para verificação das denúncias de maus-tratos, estudar o histórico das ocorrências de maus-tratos contra animais domésticos registradas pela Polícia Militar Ambiental, integrar e refinar o protocolo de perícia em bem-estar animal a partir de preceitos científicos, para aprimorar a determinação da linha de corte para considerar uma suspeita caso efetivo de maus-tratos. O projeto também contempla outros objetivos na área de patologia forense. As instituições participantes do projeto são a Unesp Botucatu, a UFRPE, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Polícia Federal e a Polícia Militar.

REFERÊNCIAS

AUTORAS

BROOM, D.M.; MOLENTO C.F.M. Bem-estar animal: conceito e questões relacionadas - revisão. Archives of Veterinary Science v.9, p.1-11, 2004. HAMMERSCHMIDT, J.; MOLENTO, C.F.M. Protocol for expert report on animal welfare in case of companion animal cruelty suspicion. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science v.51, n.4, p.282-296, 2014. MERCK, M.D. Veterinary Forensics: Animal Cruelty Investigations. 1.ed. Iowa: Blackwell Publishing, 2007. p.368.

Janaina Hammerschmidt Médica Veterinária CRMV-PR nº 8642 Laboratório de Bem-estar Animal da UFPR (LABEA/UFPR) Carla Forte Maiolino Molento Médica Veterinária CRMV-PR nº 2870 LABEA/UFPR

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Agronegócio

Maior demanda por gestores nas empresas rurais A bovinocultura de corte deixou de ser uma atividade especulativa, com altos ganhos inflacionários e ilusórios, para se tornar um negócio de baixa a média rentabilidade e que demanda uma maior eficiência e competitividade. Os Médicos Veterinários e Zootecnistas podem ser determinantes na resolução dessa equação

O

agronegócio brasileiro é um dos setores mais dinâmicos da economia, representando cerca de

25% do Produto Interno Bruto (PIB) e cerca de 40% dos empregos. Entre as atividades desenvolvidas, a bovinocultura de corte apresenta destaque, pois o Brasil é o segundo maior produtor e o maior exportador mundial, fruto de um rebanho de cerca de 200 milhões de cabeças espalhadas nas diferentes regiões do país. No entanto, após a estabilização da economia, em 1994, com o Plano Real, a bovinocultura de corte deixou de ser uma atividade especulativa, com altos ganhos inflacionários e ilusórios, para se tornar um negócio de baixa a média rentabilidade e que demanda uma maior eficiência e competitividade. Nesse contexto e a partir das transformações que as fazendas têm sofrido nas últimas décadas, existe uma grande demanda por Médicos Veterinários capacitados para realizar a gestão das empresas rurais e não serem apenas meros executores de tarefas rotineiras, como vacinações, manejos reprodutivos, melhoramento genético, entre outras.

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É importante enfatizar que o fator gestão depende, sobretudo, da capacidade do profissional envolvido e isso requer uma formação universitária sólida, capacitações constantes na área gerencial/ administrativa, visão empreendedora e inovadora e, acima de tudo, proatividade e vontade de mudar - sair da “zona de conforto”. Os cursos de Medicina Veterinária, de modo geral, não incentivam a formação de profissionais com essa visão contemporânea e o perfil do acadêmico que ingressa tem pouca atratividade para a área de gestão. O principal papel do administrador é planejar, controlar, decidir e avaliar os resultados, visando à maximização dos lucros, à permanente motivação, ao bem-estar social dos empregados e à satisfação dos clientes. O conceito de gestão, por sua vez, é extremante complexo e envolve dimensões dentro de uma fazenda, como a produção animal, as finanças e os recursos humanos. Cada dimensão apresenta ferramentas ou proces-


Conjunto de atividades orientadas à utilização eficaz dos recursos para atingir metas ou objetivos organizacionais por meio de pessoas.

GESTÃO

Conjunto de princípios, normas e funções que têm por fim ordenar os fatores de produção (terra, capital e trabalho) e controlar sua produtividade e eficiência, objetivando a obtenção de resultados específicos. aos custos de produção e despesas. Fica a pergunta: como gerenciar um empreendimento sem o conhecimento do seu patrimônio e/ou das características intrínsecas do próprio sistema de produção?

Foto: F.A.C.Villadiego

O estabelecimento de controles (zootécnicos, financeiros etc.) é um pré-requisito para mensurar a eficiência e competitividade das atividades desenvolvidas, pois, como diz a máxima, "quem não mede não controla, quem não controla não gerencia". No entanto, é fundamental nessa etapa a capacitação dos recursos humanos envolvidos,

Ferramentas de gestão na bovinocultura de corte Definir o estoque de animais é parte do processo de estabelecimento de controles

sos que visam a tornar a atividade mais eficiente, porém é necessário por parte do gestor (Médico Veterinário) o entendimento da melhor estratégia a ser tomada e, para isso, o conhecimento sistêmico e/ou holístico é fundamental, pois somente a visualização de todos os fatores que incidem em uma empresa rural o subsidiará na tomada de decisão. O CICLO DA GESTÃO EM FAZENDAS

Afirmar que a gestão e o planejamento de qualquer atividade são importantes para o sucesso é um tanto quanto repetitivo. Dessa maneira, pretende-se enfatizar três conceitos e/ou processos que ainda são extremamente deficientes na rotina de empresas rurais que atuam com bovinocultura de corte: a organização, o estabelecimento de controles e a análise de resultados. É comum, quando se faz o diagnóstico de empresas rurais, o desconhecimento em relação ao estoque de animais, ao inventário de máquinas, à área total e/ou área útil da propriedade rural ou, ainda,

• • • •

GESTÃO DA PRODUÇÃO

GESTÃO FINANCEIRA

GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS

Identificação animal Pesagens estratégicas Indicadores zootécnicos Tecnologias de processos e insumos Objetivos e metas

• • • •

Fluxo de caixa Custos de produção Indicadores financeiros Comercialização e marketing (estratégia de compra e venda de animais e insumos)

Capacitações e treinamentos Bem-estar social Meritocracia Motivação Seleção de pessoas

• • • •

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pois o uso adequado de qualquer sistema de gestão depende do conhecimento e do comprometimento do pessoal que coleta e processa os dados e as informações. Existem, atualmente, inúmeras ferramentas gerenciais que dão suporte à controladoria de empresas rurais. A organização é um processo contínuo, sistemático, criterioso e que necessita de constante atenção. É comum ouvirmos: por que mudar, se sempre fiz dessa forma e sigo na atividade? A resposta é simples: porque o mundo mudou! Cabe uma reflexão aos Médicos Veterinários, que muitas vezes são meros difusores de tecnologia, não possuindo conhecimento da organização das funções e/ou atividades que estão gerenciando. A gestão de pessoas e processos auxilia na otimização da mão de obra e estrutura disponíveis no empreendimento, aumentando sua capacidade produtiva, sendo fundamental mensurar o desempenho do negócio por meio de indicadores zootécnicos e financeiros. Os sistemas de controle são conduzidos com base nos dados de desempenho. Já a análise de resultados é a etapa final de todo esse processo e visa à tomada de decisão, fechando-se o ciclo do gerenciamento da empresa pecuária. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É papel das universidades, órgãos de extensão rural, centros de pesquisa e/ou outras esferas institucionais atentar para uma formação sólida, não capacitando apenas em tecnologias já exaustivamente trabalhadas e

Um dos objetivos do gerenciamento é a busca de indicadores de produtividade e rentabilidade excelentes

comprovadas, mas motivando o desenvolvimento de novas competências, como empreendedorismo, custos de produção, planejamento estratégico, gestão de recursos humanos, comercialização, entre outras. Em outras palavras, a missão está em transmitir ferramentas de gerenciamento existentes e comprovadas em outros setores para as propriedades rurais, sendo o Médico Veterinário um dos profissionais que reúnem virtudes necessárias para esse fim. De outra parte, cabem as seguintes indagações: por que alguns profissionais gerenciam fazendas que apresentam indicadores de produtividade e rentabilidade excelentes? Por que outros apresentam indicadores aquém do potencial e estão sempre reclamando da conjuntura econômica, do clima, entre outras dificuldades? A diferença está nas atitudes, na visão empresarial e empreendedora. Refletir é necessário! REFERÊNCIAS

CICLO DA GESTÃO Mede o desempenho da empresa rural

Auxilia sistemas de controle

PLANEJAR

ANTUNES, L.M.; ENGEL, A. Manual de Administração Rural, Editora Agropecuária, Guaiba-RS, 1999. BARCELLOS, J.O.J et al. Bovinocultura de corte: cadeia produtiva e sistemas de produção, Editora Agrolivros, Guaiba-RS, 2011. OAIGEN, R.P; GOTTSCHALL, C.S.; BARCELLOS, J.O.J; CHRISTOFARI, L.F. Gestão na bovinocultura de corte, Editora Agrolivros, Guaiba-RS, 2014.

AUTORES

AGIR

EXECUTAR

CHECAR Organização

Gestão de pessoas e processos

O ciclo da gestão em empresas rurais (PDCA – plan, do, check e act)

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Ricardo Pedroso Oaigen Médico Veterinário CRMV-RS nº 8451 Docente da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) Membro da Comissão Nacional de Assuntos Políticos (CONAP/CFMV) Júlio O. J. Barcellos Médico Veterinário CRMV-RS nº 3185 Docente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Membro da CONAP/CFMV


Fotos dos autores

Reprodução

O herpesvírus bovino tipo 1 e sua ação em receptoras no estado do Acre Um fator com grande impacto na eficiência reprodutiva dos rebanhos bovinos é a presença de infecções que, direta ou indiretamente, acometem o trato reprodutivo de fêmeas e machos e comprometem o desenvolvimento de embriões e fetos

A

Fotos: Arquivo dos autores

pesar de a pecuária bovina brasileira passar por um processo de tecnificação, ainda coexistem duas situações distintas no estado do Acre. Por um lado, parte dos produtores faz uso de tecnologias de produção, como melhoramento e/ ou rotação de pastagem, alimentação intensiva, cruzamento industrial, seleção genética, manejo zootécnico-sanitário, Inseminação Artificial (IA), Transferência de Embriões (TE) e Fertilização In Vitro (FIV), com o objetivo de aumentar os índices zootécnicos e reprodutivos do rebanho. Por outro lado, existem rebanhos submetidos a pastos nativos, sem suplementação, com pouco ou nenhum controle sanitário e sem controle reprodutivo. A produção de leite, no ano de 2011, envolveu 42.254 litros por dia, nos 22 municípios (IBGE/PPM, 2011) e a importância econômica da pecuária leiteira não pode ser negligenciada para o estado do Acre. Entretanto, a atividade convive com baixa aplicação de tecnologia por parte do produtor, além de déficit de técnicos para instalação e acompanhamento de manejo e boas práticas de produção.

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A ampliação da produção de leite, para atender ao mercado local, é o principal objetivo das ações desenvolvidas pelo governo do estado, por meio da Secretaria de Produção (SEAP). Os investimentos na cadeia produtiva e na modernização da bacia produtora das regiões do Alto e Baixo Acre vão desde a instalação de tanques comunitários de resfriamento de leite, acondicionamento e transporte, até cursos de capacitação aos produtores, atendendo à demanda de centenas de produtores familiares. O agronegócio é o principal fator na economia do setor primário do estado do Acre (VALENTIN; ANDRADE 2007). Objetivando auxiliar o seu desenvolvimento, estão sendo aportados investimentos para a distribuição de ordenhadeiras mecânicas, a implantação de queijarias, a potencialização das ações da Estação de Melhoramento e Difusão de Genética Animal (EMDGA) e a industrialização do setor, inclusive com incentivos para que empresas de laticínios se instalem no estado, aliados aos cursos de capacitação direcionados aos produtores (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC-IFAC). Reconhecer a necessidade e ter sensibilidade dessas ações é importante, uma vez que, entre as 27 unidades da Federação, apenas os estados do Acre, Pará, Rio Grande do Norte e Alagoas tiveram reduções na produção de leite em 2010, quando comparada a 2009 (PPM, 2010). Alia-se aos investimentos aportados e necessários a importância de tornar mais racional o aproveitamento das áreas de pastagens já existentes, a fim de reduzir o impacto negativo do desmatamento sobre a floresta e, ainda, estimular a permanência das famílias nas propriedades rurais, medidas alinhadas com o desenvolvimento sustentável. HERPESVÍRUS TIPO 1 E DOENÇAS DA REPRODUÇÃO

Inquéritos soroepidemiológicos realizados em vários estados do Brasil têm evidenciado altos percentuais de herpesvírus tipo 1 (BoHV-1) em fêmeas bovinas (JUNQUEIRA et al., 2006). Entretanto, a ocorrência no estado do Acre é pouco discutida. O BoHV-1 pode causar doença respiratória, conhecida como rinotraqueíte infecciosa bovina (IBR), além de conjuntivite, vulvovaginite pustular

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Alia-se aos investimentos a importância de tornar mais racional o aproveitamento das áreas de pastagem para reduzir o impacto negativo do desmatamento

infecciosa (IPV), balanopostite pustular infecciosa (IPB), reabsorção embrionária, aborto, infertilidade temporária, nascimento de animais fracos e infecções sistêmicas, que podem resultar em meningoencefalite (CERQUEIRA et al., 2000; VIEIRA et al., 2003). A doença pode, ainda, ser caracterizada por repetições de estros em intervalos regulares/ irregulares (RUFINO et al., 2006). Infecções latentes podem ser reativadas com a liberação de partículas virais e a disseminação acontece pelo contato direto entre infectados e suscetíveis. Após infecção natural e/ou uso de vacina atenuada, o vírus pode permanecer de forma latente, indefinidamente (KATHOLM; HOUE, 2006). A porta de entrada do BoHV-1 no bovino é representada, normalmente, pelas mucosas respiratória, ocular e genital e está também associada à IA com material contaminado (CALDERON et al., 2003). A infecção viral pode comprometer não somente o feto em qualquer estágio do seu desenvolvimento, como também oócitos e, portanto, embriões produzidos in vitro ou in vivo (MAKAREVICH et al. 2007). CONSTATAÇÃO DO BOHV-1 E SUA RELAÇÃO COM BAIXA EFICIÊNCIA REPRODUTIVA NO ESTADO DO ACRE

Foi conduzido um trabalho de pesquisa, entre agosto de 2011 e novembro de 2012, destinado a realizar um inquérito sorológico para enfermidades do aparelho reprodutor em 11 propriedades rurais, distribuídas em seis


% 20,00 15,00 10,00 5,00 0,00 2

4

8

16

32

64

128

256

512

1024

Titulação para IBR

FIGURA 1. Titulação das amostras de receptoras reagentes no teste qualitativo pela virusneutralização para IBR – Rio Branco – 2013 (reagente ≥ 2).

municípios do estado do Acre. Foram utilizadas como re-

As taxas de aproveitamento do protoco-

ceptoras de embrião 235 vacas mestiças (Bos taurus taurus

lo, de prenhez e de perda embrionária para a

x Bos taurus indicus), autóctones do Acre, não sensibilizadas para BoHV-1, uni ou pluríparas, com idade entre três

transferência em tempo fixo (TETF) foram de

e seis anos, não lactantes, criadas em regime extensivo e com escore de condição corporal entre três e quatro.

(11/54), respectivamente.

67,23% (158/235), 34,18% (54/158) e 20,37%

A Tabela 1 relaciona a taxa de aproveitamento

Também foram avaliadas as possíveis relações entre os animais com sorologia reagente e as taxas de aprovei-

de protocolo de TETF, denominada desempenho

tamento de protocolo de sincronização hormonal, de prenhez e de perda embrionária.

para IBR. Assim sendo, das 158 vacas que respon-

Para a pesquisa de anticorpos antivirais, as amostras foram processadas pela técnica de virusneutralização e os diagnósticos sorológicos foram realizados no Laboratório de Virose de Bovídeos do Instituto Biológico de São Paulo. Os embriões utilizados foram produzidos in vitro, com oócitos obtidos por aspiração folicular de doadoras pertencentes à EMDGA, em cujo laboratório todos os procedimentos foram efetuados. As doadoras e o sêmen utilizados foram da raça Gir leiteira. No 16º dia após o início do protocolo, um embrião foi transferido e foi colhida uma amostra de sangue para obtenção do soro. No dia 41, fez-se o diagnóstico de gestação e o exame foi repetido no dia 71. Foram diagnosticados como sororreagentes ao BoHV1 43,82% (103/235) e como não reagentes 56,17% (132/235), nas amostras analisadas. Evidenciaram-se altas concentrações de anticorpos nas receptoras (91/103), que

reprodutivo, com o diagnóstico de positividade deram ao protocolo hormonal, quantas foram positivas e quantas foram negativas para o inquérito imunossorológico para IBR; dos animais que não responderam ao protocolo hormonal, quantos foram positivos e negativos e assim por diante. Foi considerada a perda embrionária, pois ao realizar o primeiro diagnóstico as vacas estavam prenhez e depois de, aproximadamente, 30 dias não havia gestação. Ao realizar o teste estatístico para taxa de perda embrionária, observou-se que as variáveis eram dependentes. Desse modo, as perdas que ocorreram dependeram da soropositividade das receptoras para a presença de, pelo menos, uma das espécies de vírus (Tabela 1). Verificou-se que oito receptoras tiveram perdas embrionárias (72,73%), cujos títulos no teste qualitativo pela virusneutralização, apenas

apresentavam título entre 16-1024 (Figura 1). As altas con-

frente ao BoHV-1, foram 1.024 (25%), 512 (25%),

centrações de anticorpos para IBR nas receptoras significam alta carga viral, supostamente responsável pelas perdas

256 (37,5%) e 128 (12,5%), havendo, assim, altas

embrionárias, nesse caso.

brionária (Tabela 1).

concentrações de anticorpos no grupo de perda em-

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REFERÊNCIAS CALDERON, S.J.J.; CORREA, S.V.M.; CORREA, S.J.C. et al. Seroprevalence of and risk factors for infectious bovine rhinotracheitis in beef cattle herds of Yucatan, Mexico. Preventive Veterinary Medicine v.57, p.199-208, 2003. CERQUEIRA, R.B.; CARMINATI, R.; SILVA, J.M. et al. Serological survey for bovine herpesvirus 1 in cattle from different regions in the state of Bahia, Brazil. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science v.37, n.6, p.1-8, 2000. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE. Produção da Pecuária Municipal. v.38, p.1-65, 2010.

A infecção viral pode comprometer embriões produzidos in vitro e in vivo

Reagentes

Não reagentes

IBR

IBR

Sincronizadas

103 (43,83%)

TETF

JUNQUEIRA, J.R.C.; FREITAS, J.C.; ALFIERI, A.F. et al. Semina: Ciências Agrárias v.27, n.3, p.471-480, 2006. KATHOLM, J.; HOUE, H. Possible spread of bovine viral diarrhoea virus by contaminated medicine. Veterinary Record v.158, n.23, p.798-799, 2006.

Total de animais

MAKAREVICH, A.V.; PIVKO, J.; KUBOVICOVA, P. et al. Development and viability of bovine preimplantation embryos after the in vitro infection with bovine herpesvírus-1 (BHV): immunocytochemical and ultrastructura studies. Zygote v.15, p.307-15, 2007.

132 (56,17%)

235 (100%)

RUFINO, F.A.; SENEDA, M.M; ALFIERI, A.A. Impacto do Herpesvírus bovino 1 e do vírus da Diarreia viral bovina na transferência de embriões. Archives of Veterinary Science v. 11, n.1, p.78-84, 2006.

70 (44,30%)

88 (55,70%)

258 (100%)

Protocolos rejeitados **

33 (42,85%)

44 (57,15%)

77 (100%)

Taxa de prenhez

20 (37,04%)

34 (62,96%)

54 (100%)

Taxa de abortamento

8 (72,73%)*

3 (27,27%)

11 (100%)

Atividades

VALENTIM, J.F.; ANDRADE, F.C.R. Produção e potencial para a Agropecuária no Acre. Programa Estadual de Zoneamento Econômico-Ecológico do Estado Acre – face II 2007. VIEIRA, S.; BRITO, W.M.E.D.; SOUZA, W.J. et al. Anticorpos para o herpesvírus bovino 1 (BHV-1) em bovinos do estado de Goiás. Ciência Animal Brasileira v.4, n.2, p.131137, 2003.

*p < 0,05. ** Ausência de CL.

TABELA 1. Frequência de receptoras de embrião segundo a natureza dos resultados dos 235 imunodiagnósticos para IBR em relação às atividadesreprodutivas – Rio Branco – 2012

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Além dos aspectos peculiares que remetem à baixa produtividade da atividade leiteira no estado do Acre, o levantamento sorológico realizado evidenciou altas taxas de soropositividade para IBR e, nas receptoras sororreagentes, observou-se a influência do vírus IBR na taxa de perdas embrionárias. Também, as altas concentrações de anticorpos nessas receptoras mostram a circulação do vírus da IBR, supostamente responsável pelos abortamentos e que, possivelmente, pode ser responsabilizado por interferência na continuação da prenhez. Esta é a primeira vez que se relaciona a soropositividade para qualquer enfermidade com a questão da aplicação hormonal com a finalidade da sincronização da ovulação.

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Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

AutorES

Jefferson Viana Alves Diniz Médico Veterinário CRMV-AC nº 0160 Doutorando na Universidade Estadual Paulista (Unesp), Câmpus Botucatu Rodolpho Satrapa Médico Veterinário CRMV-SP nº 0045 Docente da Universidade Federal de Uberlândia Edviges Maristela Pituco Médica Veterinária CRMV-SP nº 4770 Instituto Biológico Ivo Pivato Médico Veterinário CRMV-SC nº 0623 Universidade de Brasília (UnB) Eunice Oba Médica Veterinária CRMV-SP nº 1517 Docente da Unesp, Câmpus Botucatu


EM DIA COM A FISCALIZAÇÃO Quem pode se candidatar para algum cargo no Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV)? O Médico Veterinário ou Zootecnista interessado deve ter nacionalidade brasileira, estar regularmente inscrito e em dia com as obrigações perante o conselho em que mantém a sua inscrição principal e ter pleno gozo dos direitos profissionais, civis e políticos. Deve preencher as condições de elegibilidade, apresentar o Requerimento de Registro de Candidatura dentro do prazo fixado e ter o seu pedido deferido na forma da Resolução CFMV nº 958/2010.

Qual é o intervalo de tempo entre as eleições? Os componentes do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) e dos CRMVs e seus suplentes são eleitos por três anos e o seu mandato é exercido a título honorífico. As eleições das Diretorias Executivas e conselheiros efetivos e suplentes dos CRMVs devem ocorrer até 60 dias antes do término do mandato vigente.

O voto é obrigatório? O voto é obrigatório, salvo caso de doença ou ausência plenamente comprovada. O profissional que não puder comparecer pessoalmente para votar remeterá o seu voto por correspondência. São eleitores os Médicos Veterinários e Zootecnistas possuidores de inscrição principal na jurisdição, em dia com a tesouraria e que não estejam impedidos em face de decisões administrativas ou judiciais.

Como faço para votar? O eleitor tem direito a um voto. O profissional que não puder comparecer pessoalmente para votar remeterá o seu voto por correspondência postada, obrigatoriamente, em agência da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, registrada, em dupla sobrecarta, opaca, fechada, endereçada ao presidente da Comissão Eleitoral Regional, utilizando-se única e exclusivamente do material devidamente fornecido pelo CRMV. O voto presencial acontece em urnas eletrônicas, cedidas pelo Tribunal Regional Eleitoral, ou em cédulas de papel.

Como proceder se não votei na última eleição? Os profissionais devem apresentar justificativa pela ausência em até dez dias úteis. Caso não apresentem justificativa e esta seja acatada, estarão sujeitos à multa de 30% do valor da anuidade. A justificativa poderá ser protocolada na sede ou nas Delegacias Regionais do CRMV e deverá ser acompanhada de documentação suficiente para comprovação do fato. É necessário guardar os documentos originais até o encerramento do processo de aprovação/rejeição da justificativa, pois poderão ser instados a apresentá-los para conferência de autenticidade. A legislação que dispõe sobre a apresentação de justificativas por não comparecimento ao processo eleitoral é a Resolução CFMV nº 948/2010.

A legislação está em constante atualização e existem particularidades entre estados.Para mais detalhes, consulte o CRMV de sua jurisdição.

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Suplemento científico Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

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Conservação prolongada do sêmen do varrão em diluentes alternativos

67

Epidermólise bolhosa em um filhote de gato brasileiro sem raça definida

73

Processamento e envio de biópsia renal em cães e gatos

78

Ambiguidade e ambivalência: percepção ética e emocional do Médico Veterinário sobre eutanásia

O Comitê Científico é formado por presidente das comissões assessoras do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV). Antônio Felipe Paulino de Figueiredo Wouk (CNEMV) Benedito Dias de Oliveira Filho (CNRMV) Carla Forte Maiolino Molento (CEBEA) Carlos Alberto Muller (CNEE) Carlos Eduardo do Prado Saad (CNAS) Elis Aparecido Bento (CNEZ) José Pedro Soares Martins (CNAF) Júlio Otávio Jardim Barcellos (CONAP) Maria Izabel Merino de Medeiros (CNMA) Sthênia dos Santos Albano Ámora (CNSPV)

As normas para apresentação dos artigos estÃO em www.cfmv.gov.br e a tramitação é exclusivamente eletrônica.


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

CONSERVAÇÃO PROLONGADA DO SÊMEN DO VARRÃO EM DILUENTES ALTERNATIVOS LINGERING CONSERVATION OF BOAR SEMEN IN ALTERNATIVE EXTENDERS RESUMO

Com a finalidade de melhorar a conservação do ejaculado do varrão, o presente trabalho teve por objetivos testar três diluentes e avaliar sua influência no sêmen refrigerado. Para tanto, foram utilizados os diluentes: Beltsville (BTS), Água de Coco Estabilizada (ACE) e Beltsville adicionado de ácido 3-indol acético (IAA). O sêmen foi conservado entre 15 e 18 ºC, durante sete dias, com análises em: D0, D1, D4 e D7, e avaliado quanto ao vigor, motilidade e morfologia espermática. A análise estatística foi feita por avaliação das médias e desvios padrões, por meio dos testes Students, Tukey e o qui-quadrado corrigido (5%). Quanto às características de vigor e motilidade espermática durante o período de conservação do sêmen, não houve diferença entre BTS e IAA. No entanto, o tratamento com ACE apresentou resultados inferiores para ambas as características. Todos os diluentes determinaram queda nos valores do vigor e da motilidade espermática durante o período de conservação do sêmen. Quanto à morfologia espermática, não houve diferença entre os diluentes no D0 (p>0,05). Já no D4, o ACE obteve os melhores resultados para preservação celular e, no D7, o IAA obteve o pior resultado, diferindo dos demais diluentes. Apesar de os melhores resultados terem sido encontrados com o uso do BTS, o ACE abriu novas possibilidades de conservação do sêmen de varrão. Palavras-chave: Conservação. Sêmen refrigerado. Suíno. Diluentes.

ABSTRACT

In order to improve the conservation of the boar ejaculate, this study aims to test three extenders and assess your influence in cooled semen. Thus, the extender Beltsville (BTS) was used, coconut water stabilized (ACE) and the Beltsville added of indole3-acetic acid (IAA). Semen was maintained between 15-18 °C for seven days with analyzes on: D0, D1, D4 and D7, and rated for vigour, motility and sperm morphology. Statistical analysis was performed by evaluating the means and standard deviations, through Students, Tukeyand the corrected chi-square tests (5 %). As the characteristics of vigour and sperm motility during the semen storage, there was no significant difference between BTS and IAA. However, the same can’t be seen to the ACE treatment, since this showed lower results for both evaluated characteristics. All extenders showed a decrease in the values of vigour and sperm motility during the semen storage. As sperm morphology, there was no significant difference between the extenders in D0 (p>0,05). In D4, the ACE extender achieved the best results in terms of cell preservation, and D7 IAA obtained the worst result, differing from the other diluents. Despite the best results were found using the BTS extender, the thinner ACE has opened new possibilities for preservation of boar semen. Keywords: Conservation. Cooled semen. Swine. Extender.

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INTRODUÇÃO A reprodução de suínos tem passado, nos últimos anos, por um grande desenvolvimento, notadamente no que se refere à utilização de técnicas que permitem melhor controle reprodutivo (LEVIS, 2000). A Inseminação Artificial (IA) tem a vantagem de utilizar os melhores reprodutores em grande número de fêmeas, facilitando o melhoramento genético do rebanho. Entretanto, na espécie suína, ela não foi amplamente utilizada de forma comercial até os anos 1980, quando protocolos de inseminação começaram a ser padronizados (JOHNSON et al., 2000). A IA em suínos utilizando sêmen fresco e refrigerado é uma técnica amplamente utilizada em todo o mundo. No final da década de 1990, constatou-se que 99% das inseminações eram realizadas com sêmen refrigerado entre 15 e 18 ºC (JOHNSON et al., 2000). É uma biotecnologia que se afirmou definitivamente nas granjas comerciais em nível mundial (BORTOLOZZO et al., 2005), proporcionando aumento da produção (PORKWORLD, 2009). A difusão dessa técnica na espécie suína, utilizando sêmen refrigerado, se deu graças ao desenvolvimento de diluentes que permitem a conservação do sêmen por períodos de até sete dias, com resultados de fertilidade adequados (ALKMIN et al., 2011). O diluente permite a conservação do ejaculado em baixas temperaturas, pois protege o espermatozoide contra choque térmico, fornece substratos necessários ao metabolismo espermático, mantém o pH e inibe o crescimento bacteriano, o que é necessário à manutenção da viabilidade dos espermatozoides até sua introdução no trato reprodutivo da fêmea (CORRÊA et al., 2001). O presente trabalho tem como objetivo testar a influência dos diluentes Água de Coco Estabilizada (ACE) e Beltsville adicionado de ácido 3-indol acético (IAA) na qualidade do sêmen suíno conservado sob refrigeração. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Reprodução Suína e Tecnologia do Sêmen da Universidade Estadual do Ceará (UECE), utilizando o sêmen de dois reprodutores adultos em sistema rotineiro de coleta, das raças Duroc e Landrace, coletado, semanalmente, pela técnica da mão enluvada, em copo térmico com capacidade para 500 mL e

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Fotos: Arquivo dos autores

SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Figura 1. Análise do ejaculado sob microscopia óptica

coberto por papel-filtro. Foram feitas duas coletas semanais, durante oito semanas (n=32). Avaliação do ejaculado (sêmen in natura) Em seguida à coleta, o ejaculado foi avaliado quanto à concentração (x106 sptz/mL em espectrofotômetro), volume (mL em balança digital) e total de espermatozoides (x109 sptz). Para o exame do vigor espermático (notas de 0 a 5) (TONIOLLI, 1996) e da motilidade espermática (total de células móveis, em porcentagem), uma amostra do sêmen (15 µL) foi colocada entre lâmina e lamínula e levada ao microscópio óptico em aumento de 200x (Figura 1). Após a primeira avaliação, foram utilizados para o experimento somente os ejaculados que apresentaram valores ≥80% de espermatozoides móveis e ≥3,5 de vigor espermático (TONIOLLI, 1996). Diluentes, diluição e conservação do sêmen Foram utilizados, no experimento, três diferentes diluentes: Beltsville (BTS) – controle –; ACE (50% de água de coco, filtrada em gaze proveniente de frutos colhidos previamente aos cinco meses de idade; 25% de água destilada; 25% de solução de citrato de sódio a 5%; além de gentamicina 80 mg/100 mL); e IAA (100 µg/mL). Todos os diluentes estavam regulados para osmolaridade entre 290 e 310 mOsm e pH entre 6,8 e 7,2. Após a coleta (Figura 2), o ejaculado foi levado ao laboratório e colocado em banho-maria a 37 ºC. Os diluentes a ser testados já se encontravam à mesma temperatura e após


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

15 minutos de incubação o sêmen foi misturado a todos os diluentes, respeitando a concentração de 35 x 106 sptz/mL. O ejaculado de cada macho foi dividido entre os diferentes tratamentos (BTS, ACE e IAA), tendo sido separado de cada ejaculado o total de 2,10 x 109 sptz, repartido, equitativamente, entre os diferentes tratamentos (700 x 106 sptz/tratamento). O volume final de cada tratamento (20 mL) foi dividido em tubos de ensaio com capacidade para 5 mL, num total de quatro tubos por tratamento (1 tubo/dia de análise). Após a diluição, cada tubo de ensaio apresentou o total de 175x106sptz. O dia de coleta foi considerado dia zero (D0), sendo o sêmen conservado por até sete dias (D7) à temperatura entre 15 e 18 °C (PURSEL et al., 1973), dos quais foram quatro os dias de análise (D0, D1, D4 e D7). A cada dia de análise, foram retirados os tubos de ensaio equivalentes ao ejaculado de cada macho em cada diluente. Dessa forma, todos os tratamentos, de cada animal, foram testados em cada dia de conservação. Avaliação do sêmen durante a conservação Visando à avaliação das características de vigor espermático (0 a 5) (TONIOLLI, 1996) e motilidade espermática (0 a 100%) (MARTIN RILLO, 1996), o sêmen foi incubado em banho-maria a 39 °C, com análises feitas após dez minutos de incubação, em microscopia óptica e aumento de 200x. Para a análise morfológica, esfregaços de sêmen foram feitos, sempre aos dez minutos de incubação, nos seguintes dias de conservação: D0, D4 e D7. Cada amostra de sêmen foi diluída em solução salina a 0,9%, formolizada a 0,1%, na proporção de 0,5 mL de sêmen para 1,5 mL da solução. Colocou-se uma gota dessa mistura entre lâmina e lamínula e foram contadas 200 células por lâmina. Foram avaliadas as características morfológicas na cabeça, peça intermediária, cauda e flagelo, em exames de microscopia de contraste de fase, em aumento de 1000x (VALE FILHO, 1980). Espermatozoides sem problemas nas partes descritas foram considerados morfologicamente normais. Análise estatística O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso. A análise estatística foi feita por avaliação das médias e desvios padrões, aos quais foram aplicados testes de análise de variância. Os testes utilizados foram o de Students, Tukey e o qui-quadrado corrigido (valores

expressos em porcentagem), todos à tolerância de 5% (p<0,05). A análise das diferenças entre médias foi realizada por variância multifatorial no programa de estatística StatView, versão 5.0. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para conservar os espermatozoides durante períodos prolongados, se faz necessário manter a integridade celular, reduzir a atividade metabólica e controlar o desenvolvimento de microrganismos; para tanto, precisa-se que a diluição do sêmen seja feita em meio adequado (SÁNCHEZ, 2003). Para ser eficiente, um diluente deve prover nutrientes para manter o metabolismo espermático, proteger do choque pelo frio, controlar o pH do meio e a pressão osmótica, além de inibir o crescimento bacteriano (ESTIENNE et al., 2007). Na IA suína, o diluente mais utilizado e que apresenta os melhores resultados de fertilidade e prolificidade é o BTS (BLICHFELD et al., 1988). Entre os três diluentes testados, os tratamentos com BTS e IAA não apresentaram diferenças (p>0,05) para a característica de vigor espermático, durante todo o período de conservação do sêmen (Tabela 1). O mesmo não aconteceu com o ACE, que apresentou valores mais baixos Tabela 1. Valores médios do vigor espermático do sêmen suíno, conservado a 39 ºC durante sete dias (D0 a D7), em três diferentes diluentes (BTS, ACE, IAA) BTS

ACE

IAA

D0

2,4±0,6a

1,5±0,9b

2,0±0,9ab

D1

2,2±0,8a

1,2±0,9b

1,8±0,9a

D4

1,3±0,8a

0,1±0,3b

1,2±1,0a

D7

1,0±0,7a

0,2±0,1b

0,8±0,6a

* Diferenças significativas expressas por letras diferentes nas linhas (p<0,05).

para essa característica (p<0,05), em relação aos outros dois diluentes, durante todo o período de conservação do sêmen. Os resultados de vigor espermático do sêmen conservado em ACE foram inferiores aos encontrados em outros trabalhos (TONIOLLI, 1996; TONIOLLI et al., 1998), possivelmente devido ao fato de que, já no primeiro dia de conservação (D0), a qualidade espermática (vigor e motilidade) do ejaculado conservado nesse diluente era inferior à dos demais, proporcionando queda mais rápida dos valores durante o período de conservação.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Observando-se os valores médios durante o período de conservação do sêmen (D0 a D7), uma mesma tendência (p=5%) pode ser observada para os valores da motilidade espermática (Tabela 2) nos resultados alcançados com o uso de ACE. Nesse caso, entretanto, houve equivalência de resultados (p>0,05) em relação ao IAA, até o segundo dia de conservação (D1). Vijayakmaran e Neelakanta Lyer (1980), também utilizando diluente à base de água de coco, conservado a 15 ºC, obtiveram resultados melhores que os do presente trabalho. Nesse caso, entretanto, a diferença pode ser explicada pela adição de gema de ovo ao meio de conser-

Figura 2. Coleta de sêmen de varrão.

vação, fato que conferiu proteção adicional aos espermatozoides, além de a composição do diluente utilizado por esses autores ser diferente, o que pode também ter contri-

Tabela 3. Valores médios do percentual de espermatozoides morfologicamente normais, do sêmen suíno conservado a 39 ºC durante sete dias (D0 a D7), em três diferentes diluentes (BTS, ACE, IAA)

buído para a diferença entre os resultados. Isso indica que

ACE

IAA

68,6a

68,7a

67,6a

66,6ab

71,1a

63,5b

68,7a

62,8b

D0

do ejaculado do varrão, em decorrência de uma possível

D4

variação da composição do diluente, fato que abre possi-

D7

68,9a

bilidades de pesquisa de novos diluentes. Tabela 2. Valores médios da motilidade espermática do sêmen suíno, conservado a 39 ºC durante sete dias (D0 a D7), em três diferentes diluentes (BTS, ACE, IAA) BTS

ACE

IAA

D0

61,5±19,0a

32,0±28,8b

49,0±25,0ab

D1

48,3±25,4a

28,0±26,4b

45,3±27,7ab

D4

33,0±25,1a

2,5±10,1b

24,5±26,8a

D7

18,3±18,1a

0,3±1,1b

13,8±13,7a

* Diferenças significativas expressas por letras diferentes nas linhas (p<0,05).

Já os resultados com BTS, para as duas características estudadas, estão de acordo com aqueles obtidos por Reed e Curnock (1991), apesar de os autores terem feito as análises após 30 minutos de incubação do sêmen a 37 ºC. Nesse caso, pode-se ver que os resultados dos dois trabalhos se complementam, mostrando que, mesmo após determinado tempo de incubação do sêmen, o BTS consegue ainda manter o vigor e a motilidade espermática nos mesmos níveis do tempo de início da análise. Toniolli et al. (1998) também encontraram resultados semelhantes aos deste trabalho, comprovando mais uma vez que o diluente de uso comer-

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BTS

é possível conseguir melhores resultados na conservação

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* Diferenças significativas expressas por letras diferentes nas linhas (p<0,05).

cial BTS apresenta excelentes condições para conservação do sêmen suíno e que os diluentes alternativos (ACE e IAA) precisam de testes adicionais, a fim de se fixar uma composição definitiva para poder ser utilizada, rotineiramente, em programas de IA. Todos os diluentes apresentaram queda nos valores do vigor e da motilidade espermática durante o período de conservação do sêmen. Entretanto, essa queda foi muito mais acentuada quando foi utilizado o ACE, que foi incapaz de manter níveis mínimos de motilidade (80%), aceitáveis e compatíveis com uma boa qualidade espermática (TONIOLLI, 1996). De acordo com os resultados expressos nas Tabelas 1 e 2, a adição do ácido 3-indol acético ao BTS não apresentou nenhuma influência sobre as características estudadas, uma vez que os resultados foram semelhantes aos do BTS, não correspondendo às expectativas com relação à ação de um possível poder conservante sobre a célula espermática, pois, quando comparados aos resultados de Toniolli et al. (1998), houve maior queda nos valores da motilidade. Essa diferença pode ser explicada por dessemelhanças na qualidade inicial do ejaculado, bem como na ge-


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

nética dos varrões utilizados, podendo apresentar diferen-

lento de movimento espermático, lesões nas membranas,

ças quanto à resistência dos espermatozoides ao choque

redução do metabolismo, além de perda de componentes

térmico e tempo de conservação.

intracelulares (AURICH, 2005). Quaisquer modificações na

Com relação à característica morfologia espermática (Ta-

organização da membrana podem provocar alterações em

bela 3), verificou-se que, no primeiro dia de análise (D0), as

suas funções. A membrana plasmática afetada pelo frio

diferenças encontradas não foram significativas (p>0,05)

pode sofrer mudanças na sua permeabilidade, resultan-

entre os três diluentes testados, não demonstrando, dessa

do em alterações funcionais e metabólicas, prejudicando

forma, influência deles em manter maior número de célu-

a motilidade e a capacidade fecundante dos espermato-

las espermáticas morfologicamente normais. Após quatro

zoides (AMANNE; GRAHAM, 1993). Nessa óptica, a adição

dias de conservação (D4), verificou-se que os diluentes

do ácido 3-indol acético ao BTS prejudicou as caracterís-

BTS e ACE, em relação ao IAA, conseguiram preservar me-

ticas espermáticas avaliadas, que se acentuaram com o

lhor a célula espermática (p<0,05), mostrando-se mais ati-

decorrer do período de conservação. Provavelmente, a

vos nessa função.

concentração utilizada da substância pode explicar esse

A redução ou o aumento da temperatura, assim como a manipulação do sêmen durante o processo de conserva-

comportamento do sêmen, sugerindo a necessidade de testar outras concentrações.

ção, promovem, inevitavelmente, redução na motilidade

Com relação ao BTS, quando comparados seus resulta-

espermática, causando também danos ultraestruturais,

dos de porcentagem de espermatozoides normais com os

bioquímicos e funcionais nos espermatozoides (SALAMON;

do ACE, as diferenças encontradas não foram significativas

MAXWELL, 1995). O estresse térmico causa danos estrutu-

(p>0,05); durante todo o período de conservação. Comparan-

rais diretos, como a ruptura de membranas, devido às alte-

do-se com o IAA, apenas no D0 houve equivalência (p>0,05),

rações na morfologia celular, ou indiretos, por alterações das

já para o restante do período de conservação do sêmen, o

funções celulares (SQUIRES et al., 1999); dessa forma, o de-

BTS apresentou maior percentual de células morfologica-

senvolvimento de diluentes alternativos que possibilitem a

mente normais (p<0,05). Após uma semana de estocagem

minimização dos danos morfológicos durante o período de

em geladeira, à temperatura entre 15 e 18 ºC, percebeu-se

conservação do sêmen é de grande importância.

que o sêmen diluído no IAA apresentou maior número de cé-

Encontrar a melhor composição para o diluente de sêmen, que permita a baixo custo melhores condições de armaze-

lulas com problemas morfológicos, sendo as diferenças em relação aos dois outros diluentes significativas (p<0,05).

namento, é de suma importância, apesar de que é conhecido

A conservação da viabilidade espermática por pelo

que a viabilidade espermática diminui em torno de 72 ho-

menos 24 horas é importante, pois este é, na maioria

ras de estocagem, independentemente do diluente utilizado

das vezes, o tempo necessário para que as amostras de

(SEVERO, 2009). Entretanto, a maior sensibilidade dos es-

sêmen sejam transportadas e utilizadas na IA (POMMER

permatozoides do varrão, a temperaturas inferiores a 18 ºC,

et al., 2002); dessa forma, o BTS se adapta perfeitamen-

bem como a diferença de ejaculados de diferentes varrões

te nesse perfil de funcionalidade. Esse diluente continua

no processo de resfriamento, pode ser razão suficiente para

sendo um produto que apresenta resultados difíceis de

justificar o desenvolvimento de novos diluentes. A eficiência

serem superados. Por outro lado, a possibilidade de po-

dos diluentes quanto aos resultados de fertilidade tem sido

der conservar o ejaculado por um tempo maior e em con-

extensivamente avaliada. Contudo, estudos do sêmen de

dições de ser utilizado em programas de IA, sem perdas

varrões têm sido conduzidos em condições diferentes (GA-

do seu poder fertilizante, é muito importante e possibilita

DEA, 2003), sendo necessário levar em consideração a raça,

a difusão de material genético em maiores distâncias e

condições ambientais, número de IA, número de espermato-

também para maior quantidade de criadores.

zoides por dose e momento da IA.

Evidenciou-se com os resultados deste trabalho, compa-

As mudanças de temperaturas podem acarretar choque

rados aos da literatura, que ainda existe inconsistência com

térmico e, como consequência, um modelo anormal e mais

relação à capacidade dos diluentes ACE e IAA de manter

Revista CFMV Brasília DF Ano XXI nº 65 Abril a Junho 2015

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

níveis de qualidade espermática após a conservação do sêmen. Possivelmente, ainda é necessário testar esses diluentes em maior número de ejaculados, visando a resultados mais homogêneos e consistentes. CONCLUSÕES Entre os diluentes testados, o BTS continua sendo aquele de eleição para o uso na diluição do sêmen suíno. Os melhores resultados de morfologia com o uso do IAA abrem novas possibilidades com relação à sua utilização. O ACE permite novas possibilidades de conservação do sêmen suíno. Outros estudos são necessários para esclarecer a ação da água de coco e seus derivados sobre o espermatozoide suíno.

AUTORES Ricardo Toniolli Médico Veterinário CRMV-CE nº 1136 UECE

Tatyane Bandeira Barros Estagiária do Laboratório de Reprodução Suína e Tecnologia do Sêmen da UECE

Faviano Ricelli da Costa Moreira Médico Veterinário CRMV-RN nº 0340 Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte

Dayanni Barboza Guimarães Estagiária do Laboratório de Reprodução Suína e Tecnologia do Sêmen da UECE

Luciana de Souza Toniolli Estagiária do Laboratório de Reprodução Suína e Tecnologia do Sêmen da UECE

Alina Viana Dias Estagiária do Laboratório de Reprodução Suína e Tecnologia do Sêmen da UECE

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

EPIDERMÓLISE BOLHOSA EM UM FILHOTE DE GATO BRASILEIRO SEM RAÇA DEFINIDA EPIDERMOLYSIS BULLOSA IN A BRAZILIAN SHORTHAIR KITTEN RESUMO

A epidermólise bolhosa é uma dermatose mecanobolhosa hereditária, pouco descrita na Medicina Veterinária, em que ocorrem formações de vesículas, bolhas e úlceras cutâneas secundárias a traumatismo físico pouco intenso em áreas de fricção. Nessa enfermidade, a apresentação clínica é variável, com prognóstico associado ao número de lesões, que incluem vesículas e bolhas em mucosa oral, orofaringe e pele, garras distróficas, ulceração em coxins, hipoplasia dentária, distúrbios no crescimento e ulceração de córnea. A enfermidade é decorrente de mutações nos genes que codificam os componentes estruturais da junção dermoepidérmica, estruturas proteicas presentes na zona da membrana basal e queratinócitos basais. Neste trabalho, descreve-se um caso de epidermólise bolhosa distrófica em uma gata de cinco meses de idade que apresentou ulceração oral e de pele causada por trauma friccional moderado. A partir de fragmento de pele rompida, foi realizado exame dermo-histopatológico, em que foi observada a presença de fendas na junção dermoepidérmica e bolhas e vesículas com separação dermoepidérmica. Na microscopia eletrônica de transmissão, foi observada clivagem na lâmina lúcida, deixando a junção epiderme-derme suscetível à separação. Estabeleceu-se neste estudo, por meio de técnicos histopatológicos e ultraestruturais, associados com a baixa idade do animal, diagnóstico de epidermólise bolhosa juncional, uma enfermidade pouco descrita na Medicina Veterinária de pequenos animais. Palavras-chave: Epidermólise bolhosa juncional. Dermatose mecanobolhosa. Ulceração oral.

ABSTRACT

Epidermolysis bullosa is an inherited mechano-bullous dermatosis, rarely described in veterinary medicine, where occur formations of vesicles, blisters and skin ulcers secondary to some intense physical trauma in areas of friction. In this disorder, the clinical presentation is variable, prognosis are associated with number of injuries, including blisters, and blisters in oral mucosa, oropharynx, and skin, dystrophic claws, ulceration on cushions, dental hypoplasia, growth disorders and corneal ulceration. This disease is caused by mutations in genes that encoding structural components of dermal-epidermal junction, protein structures present in basement basal membrane and keratinocytes area. In this paper we describe a case of dystrophic epidermolysis bullosa in a female cat with 5 months of age who presented oral ulceration and skin ulcer caused by moderate frictional trauma. From skin fragment, dermohistopathological examination was performed, where the presence of cracks in the dermo-epidermal junction, vesicles and bullae characterized by dermo-epidermal separation was observed. On transmission electron microscopy was observed cleavage of lucid lamina, leaving the epidermal-dermal junction susceptible to separation. Established in our study, through histopathological and ultrastructural techniques, associated with low animal’s age, diagnosis of junctional epidermolysis bullosa, a rarely disease described in veterinary medicine for small animals. Keywords: Junctional epidermolysis bullosa. Mechano-bullous dermatosis. Oral ulceration.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

INTRODUÇÃO

-histopatologia, são de fundamental importância para

Os casos dermatológicos representam significativa

a confirmação do diagnóstico clínico e direcionamento

parcela do atendimento na clínica médica de felinos,

do tratamento (MILLER et al., 2012).

sendo importante a identificação de lesões que ofe-

A membrana basal está localizada na junção entre

reçam as informações necessárias para a elaboração

a epiderme e a derme, sendo responsável por man-

diagnóstica e definição de quais testes devem ser rea-

ter a adesão epiderme-derme. Ultraestruturalmente, é

lizados (MILLER et al., 2012).

composta por estruturas que se combinam e formam

As lesões ulcerativas podem apresentar inúmeras

complexos de ancoragem. Nas porções superiores da

causas, como poxvírus ou herpersvírus felino, imunode-

zona da membrana basal, os filamentos intermediários

ficiência viral felina (FIV), leucemia felina (FELV), mico-

(compostos por queratina 5 e 14) do citoesqueleto das

se sistêmica, micetoma, esporotricose, micobacteriose,

células basais se inserem na membrana plasmática das

leishmaniose, pododermatite plasmocitária felina, pên-

células basais (hemidesmossomos) (JERÁBKOVÁ et al.,

figo, penfigoide, lúpus eritematoso, vasculite cutânea,

2010). Os filamentos de ancoragem conectam os hemi-

erupção por drogas, carcinoma de células escamosas,

desmossomos (formados pelas proteínas placoglobina,

astenia cutânea, epidermólise bolhosa, necrólise epi-

placofilina, desmoplaquina, caderinas desmocolina e

dérmica tóxica, eritema multiforme maior, fragilidade

desmogelina) (MASTUNAGA, 2006) à lâmina densa e fi-

cutânea adquirida, dermatose idiopática ulcerativa feli-

brilas de ancoragem, atravessando a lâmina lúcida.

na, piodermatite superficial ou dermatose vesiculopus-

A membrana basal é dividida em hemidesmossomos

tular, defeito ectodérmico e úlcera idiopática cervical

(placas interna e externa), lâmina lúcida e lâmina densa

(VAL, 2013). Dessa maneira, os testes diagnósticos labo-

(CRISTIANO; UITTO, 1996). A placa interna é composta

ratoriais, como o raspado de pele, a citologia e a dermo

pelas proteínas HD1/plectina e BP230 e conectada aos filamentos intermediários no interior do citoplasma dos queratinócitos basais. A placa externa é composta pela integrina α6β4 e BP180. A lâmina lúcida é formada pela membrana plasmática, placa sub-basal e filamentos de ancoragem (colágeno XVII e laminina 332) e a lâmina densa por colágeno IV (MCMILLAN et al., 2003). O colágeno VII, presente nas fibrilas de ancoragem, se estende da lâmina densa, em direção à derme papilar e se combina com Fotos: Arquivo dos autores

fibrilas de colágeno intersticial da der-

Figura 1. Úlcera cutânea secundária a traumatismo físico por fricção em região torácica dorsal e estomatite. Região torácica dorsal com pele rompida, de onde foram retiradas amostras de tecido para exame dermohistopatológico e microscopia eletrônica de trasmissão

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me, promovendo a sustentação da pele (MASUNAGA, 2006). A epidermólise bolhosa é uma dermatose mecanobolhosa, caracterizada pelo surgimento de bolhas ou vesículas aos mínimos traumas sobre a pele (SAWAMURA et al., 2010). Essa enfermidade é causada por mutações nos genes que codificam os componentes estruturais da junção der-


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

moepidérmica, estruturas proteicas presentes na membrana basal e queratinócitos basais. As epidermólises bolhosas são classificadas em quatro grupos: simples, juncionais, distróficas e mistas (FINE et al., 2008). Na simples, as mutações acometem os genes que codificam as queratinas 5 e 14, plectina, α6β4 integrina, placofilina 1 e desmoplaquina, levando à clivagem intraepidérmica (KOSS-HARNES et al., 2002; SPRECHER et al., 2004; JONKMAN et al., 2005; SIAÑEZGONZÁLES et al., 2009; NATSUGA et al., 2010; SPRECHER, 2010). Na juncional, as mutações acometem os genes que codificam a laminina 332, colágeno XVII e α6β4 integrina, levando à clivagem na lâmina lúcida, e, na distrófica, o defeito reside na síntese de colágeno VII, levando à clivagem na lâmina densa. Neste trabalho, está descrito um caso de epidermólise bolhosa juncional em um gato do sexo feminino com cinco meses de idade, com histórico de ruptura da pele após fricção branda e ulceração em mucosa oral. MATERIAL E MÉTODOS Animal Foi atendido um gato do sexo feminino de cinco meses de idade, vacinado, vermifugado e sem acesso à rua, com ruptura da pele após fricção branda e ulceração em mucosa oral (Figura 1). Após anamnese completa e exame clínico detalhado, o animal apresentava bom estado geral, não sendo solicitado hemograma, urina tipo I, função renal ou hepática. No exame dermatológico, não foram encontrados ectoparasitas; no tricograma, os pelos se apresentaram em estágio telógeno; o raspado de pele foi negativo para ácaros e fungos e a utilização de aparelho de luz de Wood não revelou fluorescência positiva para dermatófitos. Foram realizados cultura e antibiograma para bactérias aeróbicas a partir de material de margem de pele rompida, coletado com swab estéril, e coleta de sangue para sorologia de FIV, FELV e Peritonite Infecciosa Felina (PIF) por metodologia ELISA (Quadro 1).

Quadro 1. Resultados de exames realizados a partir de material coletado de margem de bolha rompida com swab estéril e de sangue coletado por punção de veia periférica Staphylococcus intermedius

Bactéria isolada

Antibiograma

Amoxicilina + ácido clavulônico

Resistente

Azitromicina

Resistente

Cefadroxil

Resistente

Cefalexina

Resistente

Cefalotina

Resistente

Cefovecin

Resistente

Ciprofloxacin

Resistente

Clindaminica

Sensível

Cloranfenicol

Resistente

Doxiclina

Sensível

Enrofloxacina

Resistente

Eritromicina

Resistente

Gentamicina

Sensível

Neomicina

Sensível

Norfloxacina

Resistente

Oxacilina

Resistente Sorologia

FIV

Negativo

FELV

Negativo

PIF

Negativo

e fixadas em formol tamponado a 10%. As amostras foram embebidas em parafina e coradas com hematoxilina e eosina (H/E). Fragmentos da pele rompida foram submetidos ao tratamento histoquímico do ácido periódico-reativo de Schiff (PAS), com contracoloração

Dermo-histopatologia Após tricotomia, amostras de tecido cutâneo foram removidas da margem da pele rompida, com utilização de pinça de Adson e tesoura curva de Metzembaum,

nuclear pela hematoxilina de Harris. Os exames dermo-histopatológicos (Figura 2) foram realizados no laboratório Histopet Anatomia Patológica Veterinária, São Paulo, Brasil.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Microscopia eletrônica de transmissão Para microscopia eletrônica de transmissão, fragmentos removidos da margem de pele rompida foram fixados em glutaraldeído a 2,5% (tampão cacodilato de sódio 0,1 M/pH 7,4). Os blocos foram pós-fixados em solução de tetróxido de ósmio a 1% (tampão cacodilato de sódio 0,15 M/pH 7,4) e embebidos em Epon 812. Cortes ultrafinos (Figura 3) foram contrastados com citrato de chumbo e acetato de uranila e examinados em microscópio eletrônico Zeiss EM 109 de 80 kilovolts. A microscopia eletrônica de transmissão foi realizada no Departamento de Microscopia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, Brasil.

Figura 2. Microscopia de fragmento de pele, da região torácica dorsal. (a) Área de separação dermoepidérmica: a epiderme está destacada da derme, formando fissuras subepidérmicas; presença resença de neutrófilos dispersos nas dermes superficial e profunda e colônias de cocos. (b) Bolha caracterizada por separação dermoepidérmica e infiltração neutrofílica. H/E, 10X. (c) Separação dermoepidérmica formando vesícula com clivagem em região de membrana basal, a qual permanece na base da vesícula aderida à derme. PAS, 40X

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RESULTADOS E DISCUSSÃO No estudo, foi verificado que as alterações microscópicas e ultraestruturais predominantemente presentes nas secções de pele, em associação à presença de ulceração em pele e mucosa oral e baixa idade do animal, foram compatíveis com a epidermólise bolhosa juncional. Inicialmente, suspeitou-se que o animal apresentava fragilidade cutânea associada à dermatose vesiculopustular, sendo solicitados cultura e antibiograma. Outras hipóteses foram FIV, FELV, PIF, descartadas pela sorologia por metodologia ELISA, e astenia cutânea, descartado pelo exame dermo-histopatológico. A epidermólise bolhosa é uma enfermidade cutânea hereditária (SPIRITO et al., 2002; SOLOVAN et al., 2005; MATSUNAGA, 2006), pouco descrita pela Medicina Veterinária em felinos (JOHNSTONE et al., 1992; WHITE et al., 1993; OLIVRY et al., 1999; O’DAIR; HENDERSON, 2004; ALHAIDARI et al., 2006; SAWAMURA et al., 2010), com ocorrência de formações de vesículas, bolhas e úlceras cutâneas secundárias a traumatismo físico pouco intenso em áreas de fricção. A apresentação clínica é variável e o prognóstico está associado ao número de lesões, que incluem vesículas e ulceração em mucosa oral, orofaringe e pele, garras distróficas, ulceração em coxins, hipoplasia dentária, distúrbios no crescimento e ulceração de córnea (SAWAMURA et al., 2010). No estudo, foi verificada no ato do atendimento clínico a perda de continuidade da pele após fricção autoinfligida pelo animal, um felino jovem, de pequeno porte para a idade, acompanhada de ulceração em


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Figura 3. (a) Separação da derme ao nível da lâmina lúcida. Fla = Filamentos de ancoragem; Fa = fibrilas de ancoragem; Ld = lâmina densa. Barra = 1μm. (b) Clivagem dos filamentos de acoragem (seta) ligados aos himidesmossomos mal definidos. Barra = 1μm

de bolha íntegra. Esse tipo de exame pode diferenciar a epidermólise bolhosa simples de outras formas, uma vez que a enfermidade é a única cuja clivagem é intraepidérmica. No estudo, foi verificada, no exame da lâmina corada com PAS, a separação dermoepidérmica, formando vesícula com clivagem em região de membrana basal. A membrana basal permaneceu na base da vesícula aderida à derme, confirmando o diagnóstico de epidermólise bolhosa juncional. Uma vez definido o diagnóstico, não foi realizado o sinal de Nikolsky (POLIFKA; KRUSINSKI, 1980). Os diferentes planos de clivagem podem ser caracterizados pelo imunomapeamento (imunofluorescência indireta) ou microscopia eletrônica de transmissão, que é o método laboratorial considerado padrão ouro para

mucosa oral. Em função das lesões frequentes em pele e dificuldade de alimentação pelas feridas em mucosa oral, o animal foi eutanasiado um ano após o diagnóstico. Na Medicina Veterinária, foram reportados dois defeitos distintos que levam à epidermólise bolhosa em gatos: a epidermólise bolhosa juncional e a epidermólise distrófica. Esses defeitos, herdados, acarretam o descolamento da superfície epitelial e a exposição da derme ou submucosa por traumas mecânicos, levando à formação de pústulas, necrose de tecidos mais profundos e infecções bacterianas secundárias. Os achados histopatológicos da pele e mucosas são similares em todos os tipos de epidermólise bolhosa, mas diferem conforme a evolução clínica, local da lesão e infecções oportunistas. Inicialmente, é observada separação subepidérmica com mínima inflamação. Em lesões mais avançadas, observa-se extensa separação da epiderme da derme, formando fissuras que eventualmente podem conter neutrófilos, hemácias e bactérias (PÉREZ et al., 2011). As fotomicrografias, representando cortes histológicos corados com H/E, descritas no estudo destacam a separação da epiderme da derme, formando fissuras, acompanhadas de infiltrado inflamatório de infecção bacteriana secundária. O diagnóstico da epidermólise bolhosa é clínico e laboratorial e o exame laboratorial mais executado é o anatomopatológico, oriundo de material de biópsia

análise de alterações ultraestruturais nos queratinócitos e na junção dermoepidérmica características dos subtipos de epidermólise bolhosa. O diagnóstico diferencial para a enfermidade inclui pênfigo bolhoso, pênfigo vulgar, penfigoide cicatricial, lúpus eritematoso sistêmico e bolhas friccionais (CERQUETELLA et al., 2005). Na microscopia eletrônica de transmissão, foi observada clivagem na lâmina lúcida, além de filamentos de ancoragem ligados aos hemidesmossomos reduzidos, fazendo com que as células basais permaneçam no teto da bolha, como também lâmina densa e sublâmina densa conectadas à derme, formando o assoalho da bolha. Esses achados ultraestruturais estão de acordo com os achados dermo-histopatológicos observados na lâmina corada com PAS. Achados ultraestruturais de epidermólise bolhosa juncional foram descritos em bezerro, na forma de filamentos de ancoragem reduzidos, hemidesmossomos pequenos e em menor número, sem clara demarcação e placa densa sub-basal atenuada (MEDEIROS; RIET-CORREA, 2014). A epidermólise bolhosa juncional é descrita em felinos, sendo causada por expressão defeituosa de hemidesmossomos-filamentos de ancoragem, como colágeno XVII, integrina alfa-6 e laminina-5 (ALHAIDARI et al., 2006). Essas alterações nas proteínas componentes dos filamentos de ancoragem, que se conectam aos hemidesmossomos e às fibrilas de ancoragem, favorecem a clivagem na lâmina lúcida.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

CONCLUSÃO O diagnóstico de epidermólise bolhosa juncional foi estabelecido por meio de técnicas de microscopia óptica comum e microscopia eletrônica de transmissão, associadas com a baixa idade do animal.

AUTORES Paolo Ruggero Errante Médico Veterinário CRMV-SP nº 6920 Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo

Priscyla Taboada Dias da Silva Médica Veterinária CRMV-SP nº 11732 Histopet Anatomia Patológica Veterinária

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

PROCESSAMENTO E ENVIO DE BIÓPSIA RENAL EM CÃES E GATOS PROCESSING AND SHIPPING RENAL BIOPSY OF DOGS AND CATS

RESUMO

As doenças glomerulares são importantes causas de insuficiência renal terminal em animais de companhia. A histopatologia renal, envolvendo a microscopia de luz, a análise imunofluorescente e a microscopia eletrônica, possibilita o pronto reconhecimento de lesões renais, a elucidação de mecanismos fisiopatológicos e o estabelecimento da terapia mais adequada. A interpretação das alterações renais é, muitas vezes, difícil, mesmo quando não há limitações da qualidade e disponibilidade de tecido renal. Assim, além dos fatores inerentes à obtenção da amostra, o planejamento, armazenamento, encaminhamento e processamento adequados contribuem para melhores resultados no diagnóstico e tratamento das glomerulopatias. Palavras-chave: Glomerulopatia. Processamento de amostras. Exames microscópicos.

ABSTRACT

Glomerular diseases are important causes of end stage renal disease in small animals. Renal histopathology performed by light microscopy as well as immunofluorescence analysis and concomitant electron microscopy enables the early detection of renal lesions to elucidate the pathophysiological mechanisms and the most appropriate treatment. The interpretation of the histopathological changes of the kidneys is often difficult, even when there are no limitations to the quality and kidney tissue available. Therefore, it is evident that in addition to factors related to obtaining the sample of kidney tissue, adequate planning and understanding on how these samples should be properly stored, shipped and processed, facilitating the diagnosis and contribute to better treatment of glomerulopathies. Keywords: Glomerulopathies. Processing samples. Microscopic exams.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Introdução A avaliação histopatológica renal tem sido importante para o crescimento da nefrologia veterinária nos Estados Unidos e países europeus e, após a criação do International Veterinary Renal Pathology Service, a comunicação e interação entre pesquisadores têm proporcionado excelentes resultados e progresso na

por ultrassom (Figura 1a). Ademais, pode-se optar pela utilização de dispositivos automáticos ou semiautomáticos, por meio de agulha cortante tipo Tru-cut, calibre 18, 16 ou 14 gauge (Figura 1b), ou, ainda, obter o fragmento do parênquima renal na forma de cunha, após a realização de pequena incisão com auxílio de lâmina de bisturi (VADEN, 2004, 2005).

área. No Brasil, com a especialização profissional nas diversas áreas, a biópsia renal será um importante alvo para as próximas décadas e, com isso, é necessário que o Médico Veterinário tenha conhecimento das diferenças do processamento e envio de amostras de fragmentos renais para posteriores exames. Fotos: Arquivo dos autores

As doenças glomerulares são importantes causas de insuficiência renal terminal tanto em humanos (HUMPHREYS et al., 2005; LIMA; BARROS, 2006) quanto em animais (LESS, 2004; HEIENE et al., 2007). Entre os mecanismos que conduzem ao seu desenvolvimento, destacam-se os de natureza imunológica, sendo a proteinúria o marco tanto da doença quanto de sua perpetuação (VADEN, 2004; HEIENE et al., 2007; CRIVELLEN-

Figura 1. (a) Biópsia renal guiada por ultrassom com dispositivo automático. (b) Inserção da agulha horizontalmente na superfície da cortical renal durante laparotomia

TI et al., 2013a). A doença tubuloglomerular, de ordem imune, pode ocorrer de duas maneiras: por deposição do complexo antígeno-anticorpo nos glomérulos ou pela adesão de antígenos à parede capilar glomerular, estimulando a produção de anticorpos e causando lesão (GRANT; FORRESTER, 2001). Assim, em função de uma estimulação continuada, estabelecem-se uma reação inflamatória e a consequente destruição progressiva dos glomérulos e túbulos, que são substituídos, paulatinamente, por tecido cicatricial afuncional (LIMA; BARROS, 2006). Seja qual for a modalidade específica assumida pelas glomerulopatias de origem imunológica, sua evolução natural determinará hialinização, fibrose e oclusão das alças glomerulares, consequentes à produção excessiva de elementos da matriz extracelular. A lesão perpetua-se mesmo quando a agressão inicial é descontinuada, tornando esse processo um dos principais promotores e mantenedores da doença renal crônica (LEES, 2004; GRAUER, 2005). As biópsias renais em cães e gatos podem ser realizadas por laparotomia, videolaparoscopia ou guiadas

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A histopatologia renal, tanto em nível da microscopia de luz quanto na análise por imunofluorescência e microscopia eletrônica, possibilita o reconhecimento da lesão (LIMA; BARROS, 2006; VADEN et al., 2004, 2005), a elucidação dos mecanismos fisiopatológicos e o estabelecimento da terapia adequada (ARESU et al., 2008). Considerando a importância do planejamento adequado da biópsia renal, este artigo enfoca pontos-chave para o adequado armazenamento, envio e processamento de amostras de biópsias renais de animais de companhia. AVALIAÇÃO INICIAL DAS AMOSTRAS OBTIDAS A inspeção dos tecidos obtidos de biópsia utilizando agulhas do tipo Tru-cut objetivando verificar a presença de glomérulos (ou seja, se as amostras a ser submetidas à avaliação são oriundas do tecido cortical) é um passo crucial, que por vezes é negligenciado. A melhor forma de realizar essa avaliação inicial é ampliando a imagem do material coletado (10-40x), o que pode ser conseguido utilizando microscópio de dissecação, lupa ocular e lente de mão, sob adequada iluminação.


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Sob ampliação, vários aspectos da aparência do material oriundo da biópsia ajudam a diferenciar a cortical da medular renal. Muitas vezes, os glomérulos podem ser vistos na cortical como pequenas estruturas esféricas ou meramente como interrupções esféricas em torno dos túbulos. Mesmo quando não é possível o reconhecimento individualizado dos glomérulos, a cortical pode ser distinguida da medular baseando-se na arquitetura geral do tecido, pois os túbulos no tecido cortical apresentam-se desordenados, em padrão irregular, ao passo que os da medula são retos e dispostos paralelamente (WALKER, 2008; LEES et al., 2011). Adicionalmente, as amostras devem ser mantidas umedecidas em solução salina e manipuladas suavemente e sem uso de pinças. De maneira geral, são colhidos pelo menos dois fragmentos de aproximadamente 10 mm de comprimento ou até três fragmentos, quando forem de comprimento inferior. As amostras obtidas por agulha não precisam ser cortadas em fragmentos menores, exceto se for necessário subdividi-las para avaliações separadas (microscopia de luz, imunofluorescência e microscopia eletrônica). Já as amostras obtidas em cunha devem ser cortadas em pequenos fragmentos (1-2 mm), antes de serem colocadas em fixadores (LEES et al., 2011).

O processamento histotécnico dos fragmentos, geralmente, é realizado por laboratório específico, uma vez que os procedimentos para permitir análise são peculiares e de alto custo.

ARMAZENAMENTO E SEPARAÇÃO DAS AMOSTRAS As amostras, separadas, devem ser transferidas para frascos individualizados e adequadamente identificados, contendo Bouin alcoólico ou formaldeído a 10%, aldeído glutárico e solução de Michel para avaliação por microscopia de luz, microscopia eletrônica de transmissão e imunofluorescência, respectivamente (Figura 2).

Figura 3. (a) Glomérulos evidenciando expansão de matriz (seta) em corante tricrômico de Masson verde. (b) Glomérulo impregnado com PAMS; em maior evidência, espículas sugerindo a presença de alterações de membrana basal glomerular devido à presença de imunocomplexos subepiteliais

Microscopia de luz A amostra deve ser fixada em Bouin alcoólico ou formaldeído por no mínimo cinco horas. Após esse período, deve ser desidratada em álcool, diafanizada em xilol e incluída em parafina. Os cortes histológicos das biópsias renais devem ser mais finos que os realizados para análise de outros órgãos (3 µm de espessura) e corados com hematoxilina-eosina, tricrômico de Masson e vermelho do Congo e impregnados com prata metenamina (PAMS) (Figura 3). As lâminas de microscopia devem ser recobertas por lamínulas antes da análise (VADEN, 2004; LEES et al., 2011; CIANCIOLO et al., 2013).

É importante salientar que, além da necessidade do uso dos supracitados corantes, é preciso confeccionar mais de uma lâmina para cada tipo de corante, pois a profundidade da amostra pode evidenciar novos glomérulos e, com isso, há maior precisão da análise. Imunofluorescência O líquido ou solução de Michel é bastante utilizado para envio de amostra destinada à imunofluorescência. É uma substância não fixadora, usada para preservação do mate-

Figura 2. (a) Fragmentos renais obtidos por dispositivo semiautomático (Tru-cut). (b) Meios utilizados para conservação e transporte de amostras: aldeído glutárico, solução de Michel e Bouin alcoólico, da esquerda para a direita, destinados à microscopia eletrônica, imunofluorescência e microscopia de luz, respectivamente

rial, pois o fragmento pode permanecer estável por até uma semana, em temperatura ambiente (WALKER, 2008). A amostra destinada ao laboratório deve ser congelada em nitrogênio líquido. Assim como na microscopia de luz, os cortes de congelamento devem ter entre 2 e 3 µm de

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

espessura e ser processados em criostato, a -20 °C. Após incubação, por 30 minutos, em temperatura ambiente, em câmara úmida com antissoros policlonais anticão ou antigato de IgM, IgA, IgG e C3, são conjugados ao isotiocianato de fluoresceína. As lâminas são montadas em glicerina tamponada em pH 8,5 e examinadas ao microscópio universal, equipado com sistema para microscopia de imunofluorescência (CRIVELLENTI et al., 2013b).

gy Initiative. A descrição dos capilares glomerulares e do mesângio deve sempre ser informada, constando a membrana basal glomerular, hipercelularidade, infiltração leucocitária, expansão de matriz, presença de depósitos etc., e fazer parte da análise sob microscopia de luz (WALKER, 2008).

Microscopia Eletrônica A amostra, geralmente, é fixada em aldeído glutárico a 1-3%, devendo a solução ser mantida sob refrigeração (WALKER, 2008; CIANCIOLO et al., 2013). Posteriormente, deve ser pós-fixada em tetróxido de ósmio a 1% em tampão cacodilato de sódio 0,2 M. A desidratação deve ser realizada em uma série crescente de acetona e, ao final, o material precisa ser incluído em resina araldite. Após inclusão em resina, são realizados cortes semi-finos, corados por azul de toluidina, permitindo avaliações e seleção dos glomérulos de interesse para os cortes ultrafinos produzidos para microscopia eletrônica (Figura 4). Figura 5. Histopatologia renal. (a) Amostra de baixa qualidade (fragmentos e artefatos) para análise corada em tricrômio de Masson. (b) Amostra de boa qualidade para análise corada em HE

A avaliação de imunofluorescência está mais comumente relacionada com a presença ou ausência de reações imunes (IgG, IgM, IgA, C3 etc.) (LEES et al., 2011). É classificada em granular ou linear, com a inclusão da localização

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Figura 4. (a) Corte semifino corado por azul de toluidina para avaliações e seleção dos glomérulos (setas). (b) Presença de depósitos eletrodensos e fusão de pedicelos (setas)

dos depósitos (mesângio, membranas basais, túbulos e va-

ANÁLISE DO MATERIAL O fragmento é considerado satisfatório para avaliação sob microscopia de luz quando possui mais de 5-10 glomérulos e não tem artefatos (Figura 5) (RAWLINGS et al., 2003; VADEN, 2004, 2005; VADEN et al., 2005; ZATELLI et al., 2005; MANASHIROVA et al., 2011). As análises podem ser classificadas segundo critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS), conforme artigos de Medicina Veterinária (VADEN, 2004; ZINI et al., 2004; HEIENE et al., 2007; ARESU et al., 2008) ou, mais recentemente, segundo a International Veterinary Renal Patholo-

usando a escala semiquantitativa de de traços) (Figura 6)

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sos sanguíneos), distribuição (focal, difusa, segmentar ou generalizada) e intensidade (graduada em campo escuro (CIANCIOLO et al., 2013). Muitas doenças renais, especialmente as doenças glomerulares, são patologicamente definidas, pelo menos em parte, por distintas alterações na morfologia das células renais e/ou matrizes extracelulares, que somente podem ser detectadas sob microscopia eletrônica, pois é possível identificar alterações na membrana basal glomerular, presença ou ausência de depósitos e processos infiltrativos, estado dos pedicelos e alterações no endotélio (WALKER, 2008; CIANCIOLO et al., 2013).


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

amostra do tecido renal, a conscientização sobre como essas amostras devem ser armazenadas, transportadas e processadas facilitará o diagnóstico e tratamento das glomerulopatias.

AUTORES

Figura 6. Moderada positividade granular de IgM em mesângio associada com extensão para alça capilar e forte positividade segmentar (seta)

CONSIDERAÇÕES FINAIS A interpretação das alterações histopatológicas dos rins é, muitas vezes, difícil, mesmo na ausência de limitações da qualidade e tecido renal disponível. Assim, é evidente que, além dos fatores inerentes à obtenção da

Leandro Zuccolotto Crivellenti Médico Veterinário CRMV-SP nº 22038 MSc, DSc, PosDoc e docente da Universidade de Franca (Unifran)

Guilherme de Paula Lemos Técnico Laboratório de Patologia Renal da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP

Sofia Borin-Crivellenti Médica Veterinária CRMV-SP nº 21828 MSc, DSc, PosDoc e docente da Unifran

Gyl Eanes Barros Silva Médico Nefropatologista CRM-SP nº 109712 MSc, DSc e docente da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP

Flávio Henrique Leite Técnico Laboratório de Patologia Renal da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP)

Aureo Evangelista Santana

Médico Veterinário CRMV-SP nº 2105 MSc, DSc e docente da Universidade Estadual Paulista, Câmpus Jaboticabal

referências

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

AMBIGUIDADE E AMBIVALÊNCIA: PERCEPÇÃO ÉTICA E EMOCIONAL DO MÉDICO VETERINÁRIO SOBRE EUTANÁSIA AMBIGUITY AND AMBIVALENCE: ETHICAL PERCEPTION AND EMOTIONAL VETERINARIAN ABOUT EUTHANASIA RESUMO

Na sociedade atual estima-se que, em 85% dos casos, o animal de estimação ocupa lugar de membro da família. Essa situação contribui para o dilema ético do Médico Veterinário na clínica de pequenos animais frente à eutanásia, criando uma nova fonte de estresse. O objetivo deste trabalho foi avaliar a percepção ética e emocional do Médico Veterinário sobre eutanásia e seu conhecimento quanto às normas reguladoras do Guia Brasileiro de Boas Práticas para a Eutanásia de Animais 2012, do Conselho Federal de Medicina Veterinária. A pesquisa demonstrou que 75% dos entrevistados não estão familiarizados com o guia, bem como desconhecem os traços de desgaste emocional que podem comprometer a qualidade do trabalho, os protocolos adequados e quais devem ser usados com restrição, além de haver falta de preparo para lidar com questões éticas e dilemas profissionais. Palavras-chave: Estresse moral. Ética. Antrozoologia.

ABSTRACT

In today’s pets are seen as a family member in 85% of cases. These changes contribute to an ethical dilemma for the veterinary working at a small animal’s clinic creating a new source of moral stress either. The objective of this study was to evaluate the ethical and emotional perception of the veterinarian, on euthanasia and his knowledge about the rules of the Brazilian Good Practice Guide for Euthanasia of Animals 2012 of the Federal Council of Veterinary Medicine. A survey showed that 75% of respondents reported not being familiar with the Brazilian Guide, traces of emotional distress that can compromise the quality of work of the respondents, lack of proper protocols and which ones should be used with restraint and lack of preparation to deal with ethical and professional dilemmas. Keywords: Moral stress. Ethics. Anthrozoology.

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

INTRODUÇÃO

Os princípios éticos também são relativamente novos na medicina. Em 9 de dezembro de 1946, no Tribunal

Havendo, pois, o Senhor Deus formado da terra todos os animais

Internacional, em Nuremberg, das 23 pessoas julgadas,

do campo e todas as aves do céu, trouxe-os ao homem, para ver

20 eram médicos. Todo o mundo científico estava horro-

como este lhes chamaria; e o nome que o homem desse a todos

rizado com as atrocidades praticadas em nome da ciên-

os seres viventes, esse seria o nome deles. Deu nome o homem

cia pelo regime nazista em seres humanos (REBUELTO,

a todos os animais domésticos, às aves dos céus e a todos os

2008). Foi a partir do Código de Nuremberg que surgiu a

animais selvagens; para o homem, todavia, não se achava uma

ética na pesquisa com seres humanos (MORAIS, 2010).

auxiliadora que lhe fosse idônea (Gen 2:19-20).

Contudo, apenas por meio da Declaração de Helsinque, redigida em 1964, o Código de Nuremberg realmente

Este, talvez, seja o relato mais antigo de uma classi-

passou a integrar a relação médico-paciente. O parágra-

ficação biológica das espécies, mas não apenas isso; é

fo 11 da Declaração de Helsinque afirma que o bem-es-

o retrato fiel de que a relação homem-animal sempre

tar dos animais utilizados na pesquisa deve ser respei-

ocupou um lugar de extrema importância no cotidiano

tado (REBUELTO, 2008).

daquele, tanto quanto a sua relação com o seu seme-

Com tantas mudanças, o papel dos animais de com-

lhante. O texto, também, demonstra que sua relação

panhia também passou a ter uma nova dimensão. Atual-

com os animais é tão antiga quanto a que ele tem com

mente, eles são prestadores de apoio social e emocional,

os de sua própria espécie.

assistem aos proprietários com necessidades especiais,

O homem se relaciona com os animais desde a Era Pa-

auxiliam pessoas com deficiência física ou mental, aju-

leolítica e animais não humanos vêm, continuamente,

dam no desenvolvimento social e na recuperação de

moldando a cultura humana e seu comportamento deste

pacientes, são capazes de detectar picos de glicemia e

então. Atualmente, estima-se que, em 85% dos casos, o

avisar seus donos em casos de hipoglicemia, melhorando

animal de estimação ocupa o lugar de membro da família

a independência e a qualidade de vida dessas pessoas.

(PODBERSCEK, 2005; FERNANDEZ-MEHLER, 2013).

Por tudo isso, sua morte pode ser extremamente doloro-

Até bem pouco tempo, os animais eram vistos como

sa para seus donos (EDNEY, 1995; ROONEY, 2013).

autômatos, colocados na Terra apenas pelos seus bene-

Apesar de essas mudanças serem louváveis, elas criam

fícios econômicos à humanidade. Os estudiosos manti-

uma nova fonte de estresse moral para os Médicos Ve-

nham o pensamento de que o relacionamento afetivo

terinários. Dilemas éticos são constantes, seja diante da

entre pessoas e animais era detestável e depravado e a

difícil decisão de uma eutanásia por conveniência, seja

ideia de estudar esse relacionamento era tratada como

diante do embate com o proprietário quando ele reluta

heresia (PODBERSCEK, 2005). Esse pensamento mudou

em considerar a possibilidade de eutanásia em animal vi-

durante as últimas três décadas e a relação entre o ho-

sivelmente moribundo (ROLLIN, 2011). Sendo a rotina da

mem e o animal virou objeto de estudo (EDNEY, 1995).

clínica veterinária repleta de contradições, é justamente

Para entender melhor esse comportamento, surgiu uma

na ética que o Médico Veterinário deve se apoiar para

nova ciência, a antrozoologia, que envolve campos da

tomar decisões. A ética lida com justificativas ou pensa-

antropologia, sociologia, biologia, história e filosofia

mentos por meio do ponto de vista dos princípios. Não

(PODBERSCEK, 2005). As mudanças foram tantas que

é uma questão de sentimentos, gostos ou preferências,

as pesquisas não estão mais focadas em descobrir se

mas o estudo sistemático dos valores, virtudes, conceitos

animais não humanos possuem pensamento consciente

morais e práticas que ajudam a determinar o que deve

de maneira simplificada, comportamento comunicativo

ser feito (MILLS, 2010).

ou lembrança de eventos específicos em seu passado,

Apesar de a eutanásia constar da rotina do Médico Ve-

mas em descobrir o grau, a complexidade e a extensão

terinário, ela não é parte de sua formação acadêmica. Por

dessas descobertas (GRIFFIN, 2001; PREMACK, 2007).

essa razão, muitos são inadequadamente treinados para

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

lidar com situações que envolvem dilemas e questões éticas (ROLLIN, 2011; SILVA, 2007). Faltam habilidade e competência para lidar com más notícias, dar apoio emocional ao proprietário, monitorar e avaliar a qualidade de vida, auxiliar na decisão da eutanásia, discutir protocolo e procedimento, bem como as opções de cuidados com o corpo do animal após o óbito (REBUELTO, 2008). Cabe ao Médico Veterinário a responsabilidade pela eutanásia, que deve levar em consideração a qualidade de vida do animal, o tratamento e, em última análise, uma morte oportuna e pacífica para um doente terminal ou gravemente ferido. Só ele tem competência para executá-la e deve saber quais são os métodos apropriados, que procedimentos são inaceitáveis ou devem ser usados com restrição. Deve, ainda, demonstrar segurança e falar claramente sobre o assunto com o cliente (JORGE, 2009), esclarecer ao proprietário os critérios para tomada de decisão, além de atuar como mediador entre cliente e paciente, sendo responsável pelo bem- estar do animal (ROLLIN, 2011). O luto pode incluir tristeza, culpa e raiva. Pesquisas indicam que 70% dos clientes são afetados emocionalmente pela morte de seu animal de estimação e que 30% experimentam dor severa antes ou após a morte do animal. Ainda, aproximadamente 50% dos clientes se sentem culpados por sua decisão relativa à eutanásia do animal. O suporte fornecido pelo Médico Veterinário contribui para aumentar ou diminuir a intensidade desses eventos, pois a maneira como oferece atendimento ao cliente tem o potencial valor de aliviar ou agravar a dor (SHAW, 2007). Os Médicos Veterinários também são afetados negativamente pela eutanásia. Em 2010, uma pesquisa dos artigos publicados depois de 1970, no PubMed (incluindo MEDLINE) e Google Scholar, indicou aumento dos casos de suicídio entre esses profissionais, apontando que lidar com a questão da eutanásia, como parte da rotina profissional, pode desencadear uma atitude diferente em relação ao suicídio em comparação com a população em geral (BARTRAM, 2010). Embora essa conexão venha sendo desvelada em artigos científicos internacionais, no Brasil sua abordagem ainda é incipiente. A dificuldade deve-se a inúmeros fatores, entre eles, a insuficiência de

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recursos técnicos e pesquisas que identifiquem a limitação na formação humana do Médico Veterinário para lidar com questões éticas e emocionais (SILVA, 2007). Outro fator importante está na essência da eutanásia, o ato de levar o animal a óbito por métodos que induzam à rápida inconsciência e morte, sem sofrimento, segundo a própria etimologia da palavra grega, eu (boa) e thanatos (morte). Sendo assim, para o animal ela deve ser indolor, produzindo inconsciência instantânea e morte rápida; para o executante, o método deve ser seguro e não provocar choques emocionais (JORGE, 2009). Agentes e métodos de eutanásia devem resultar em rápida perda de consciência, seguida de parada cardíaca ou respiratória e consequente perda da função cerebral. A perda da consciência deve preceder a perda do movimento muscular. As características desejáveis de um agente para eutanásia são: promoção de indução rápida e suave, não causando alterações comportamentais que indiquem dor ou ansiedade, devendo a inconsciência e a morte ocorrer de forma instantânea ou dentro de pouquíssimos minutos; segurança e fácil empregabilidade para o profissional que o manipula. Agentes e métodos que impedem o movimento por meio da paralisia muscular, mas não bloqueiam ou interrompem o córtex cerebral, não são aceitáveis como agentes únicos para a eutanásia por resultarem em sofrimento e consciente percepção da dor antes da morte (AGOSTINHO, 2009). O objetivo deste trabalho é avaliar a percepção ética do Médico Veterinário diante da eutanásia e como isso o afeta emocional e psicologicamente, sua habilidade em tratar do assunto com o cliente e seu conhecimento quanto às normas reguladoras de procedimentos relativos à eutanásia em animais, segundo o Guia Brasileiro de Boas Práticas para a Eutanásia de Animais, do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV, 2012). MATERIAL E MÉTODOS Optou-se por uma pesquisa qualitativa, por ser uma importante ferramenta para avaliar percepções e experiências, além de auxiliar no conhecimento de habilidades para resolução de conflitos. Os estudos qualitativos abordam, entre outros temas, os mecanismos de adaptação, adesão e não adesão a tratamentos, estigmas, cuidados, reações e papéis de profissionais, além dos


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

fatores facilitadores e dificuldades frente à profissão, ao tratamento e às condições de trabalho (TURATO, 2005). A pesquisa foi realizada por meio de um questionário qualitativo estruturado, com questões abertas e fechadas. As entrevistas foram individuais, algumas por contato telefônico, com profissionais que atuam na clínica de pequenos animais, na microrregião do Vale do Paraíba Fluminense. Como se trata de uma pesquisa com referencial qualitativo, a limitação do número de entrevistas se deveu ao critério de saturação teórica e não por cálculo amostral estatístico (FONTANELLA, 2008). Por questões éticas, os profissionais participantes da pesquisa não foram identificados, fato que foi esclarecido no momento da entrevista. Optou-se por dividir o questionário em quatro seções: percepção sobre ética e bem-estar animal; identificação dos níveis de estresse e percepção emocional sobre eutanásia; conhecimento quanto aos protocolos adequados na prática da eutanásia; e interação e relação do profissional com o cliente. RESULTADOS E DISCUSSÃO A maioria dos entrevistados (75%) relatou não estar familiarizada com o guia do CMFV (Gráfico 1). Quanto ao procedimento de exigir do proprietário o termo de autorização formal para realizar o procedimento, 70% dos entrevistados responderam positivamente; 90% disseram que permitem que o proprietário ou responsável pelo animal acompanhe o procedimento, porém 20% deles mostraram desconforto com a situação. Todos eles afirmaram que procuram esclarecer ao responsável pelo animal como será o procedimento. Consideram importante, durante a eutanásia, manter o animal calmo, tranquilo, confortável e livre de dor, bem como

Sim 25%

realizar o procedimento de forma rápida, em ambiente adequado, levando o animal à inconsciência imediata, seguida de morte. Antes de decidir sobre a eutanásia, todos os entrevistados responderam que procuram ter certeza do diagnóstico e do prognóstico, se certificam de que o proprietário está seguro da decisão e discutem com o cliente todas as possibilidades de tratamento e o que deve ser feito com o corpo do animal após o procedimento. Da mesma maneira que todos disseram levar em consideração a opinião do especialista (no caso de o animal estar em tratamento específico), 60% procuram ouvir a opinião de outro clínico, 90% avaliam se o dono do animal tem conflitos pessoais relacionados à eutanásia e 85% procuram sempre a melhor forma de abordar o assunto com o proprietário. Ao serem questionados se existe alguma situação em que se recusariam a realizar a eutanásia, todos responderam que sim, porém as justificativas foram variadas e muitos deram mais de uma resposta: “só quando o prognóstico é desfavorável”; “só em estado terminal”; “não faço quando existe possibilidade de tratamento” e “quando não há indicação”. Quanto ao que mais incomoda durante o procedimento, as respostas foram variadas, porém 90% sentem desconforto pelo “sofrimento do proprietário” e 10%, com “os espasmos”. Quanto à rotina profissional diante do procedimento e como isso os afeta emocionalmente, os resultados demonstram que a percepção sobre o estresse pode ser difícil. Questionados quanto à frequência do procedimento no exercício da clínica, 70% responderam que a eutanásia não é rotineira em seu trabalho. Contudo, 60% afirmaram reali-

15% 60% 20%

Não 75% Mensalmente Gráfico 1. Percentagem dos que conhecem o guia do CFMV

Quinzenalmente

Semanalmente

Gráfico 2. Frequência de eutanásia na rotina de trabalho

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SUPLEMENTO CIENTÍFICO

zar o procedimento mensalmente, 20%, quinzenalmente e 15%, semanalmente (Gráfico 2). Metade dos entrevistados, 50%, não considera a eutanásia um procedimento estressante, porém 95% relataram apresentar sintomas de estresse (Gráfico 3); destes, 65% apresentam pelo menos um sintoma, como angústia, tristeza e palpitação, e conceito negativo sobre si mesmo e 30%, vários sintomas, entre eles, irritabilidade, dor no peito, conceito negativo sobre si mesmo e dificuldade de concentra5% ção, durante ou logo após a eutanásia .

grande lacuna quanto ao Código de Ética e o consequente desconhecimento sobre os protocolos adequados para eutanásia. Também é importante destacar que apenas 50% dos entrevistados preconizam o uso da sedação e anestesia, seguidas de um agente letal; a outra metade ofereceu respostas que se converteram em uma amostragem heterogêNão souberam responder Respostas inadequadas

100%

Usam um protocolo adequado Usam um protocolo inadequado

30%

Ao menos um sintoma

65%

Vários sintomas

Não se incomodam

O estresse é definido como um desgaste geral do organismo que resulta na diminuição progressiva da capacidade de um indivíduo de manter a homeostase, causado por alterações psicofisiológicas. Os sinais e sintomas que ocorrem com maior frequência são tensão muscular, taquicardia, angústia, insônia, dúvidas quanto a si próprio, inabilidade de concentrar-se, dificuldades de relaxar, tédio, depressão, hipersensibilidade emotiva, entre outros. Um alto nível de estresse contínuo no trabalho pode gerar um quadro de esgotamento físico e emocional caracterizado por pessimismo e conceito negativo sobre si mesmo e em relação ao trabalho, conhecido como síndrome de Burnout, que acomete profissionais que atuam em contato direto com o indivíduo, com maior incidência nos profissionais da área da saúde (PAFARO, 2004). Apesar de a maioria das respostas ter demonstrado bom senso e preocupação com o bem-estar animal, quando questionados sobre o protocolo adequado e os agentes que devem ser utilizados com restrição, 35% não souberam responder e 65% não conseguiram responder adequadamente (Gráfico 4), o que significa totalidade de desconhecimento sobre o assunto, mesmo entre os 25% que afirmaram conhecer o guia do CFMV. Isso reflete uma

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35%

50%

Gráfico 4. Quanto às perguntas sobre os agentes que devem ser utilizados com restrição e o protocolo adequado

Gráfico 3. Sintomas de estresse relatados durante ou logo após o procedimento da eutanásia

82

50%

65%

nea de protocolos inadequados e que não são capazes de promover uma “boa morte”. Entre os agentes de eutanásia, existem os que são recomendados, os métodos aceitáveis, os que podem ser usados com restrições e os inaceitáveis. Os recomendados pertencem à classe dos barbitúricos, são considerados agentes de eutanásia humanitária e podem ser utilizados como único meio. Possuem ação rápida, com perda de consciência seguida de parada cardíaca. Os métodos aceitáveis são os que produzem uma morte igualmente humanitária, porém com limites práticos, necessitando de grandes volumes ou altas concentrações; o recomendável é que sejam associados a tranquilizantes ou sedativos (AVMA, 2013). Algumas drogas devem ser usadas com restrição, por não serem agentes únicos promotores de morte humanitária, como o T-61®, que provoca a morte por falência respiratória devido à paralisia do diafragma e dos músculos intercostais, resultando em asfixia e dor intensa anterior à perda de consciência. Da mesma forma, o cloridrato de cetamina, classificado como anestésico dissociativo, que induz a rigidez muscular, produz um estado alterado de consciência, mas não leva à sua perda. Esses agentes devem ser combinados com outras drogas para produzir analgesia e apenas são aceitáveis se os animais são previamente anestesiados. A sedação prévia é insuficiente para alcançar insensibilidade, necessitando de analgesia para bloquear os efeitos dolorosos. Drogas com restrição são inaceitáveis quando usadas como agentes únicos da eutanásia (TASKER, 2008).


SUPLEMENTO CIENTÍFICO

Na análise da conduta profissional, todos os entrevistados consideraram importante conversar com os clientes sobre a eutanásia. Entretanto, 95% se consideraram indevidamente preparados na faculdade para enfrentar os dilemas da relação médico-cliente; 80%, para enfrentar os dilemas da relação médico-paciente; e 95% para discutir sobre eutanásia com seus clientes. CONCLUSÕES Métodos de eutanásia, conhecimento científico e opiniões evoluem com o tempo, devendo o panorama ser baseado em evidências científicas, sempre passíveis de novas revisões. A decisão pela eutanásia é uma questão complexa que envolve muitos fatores, sendo de responsabilidade do Médico Veterinário garantir que, quando a decisão for tomada, seja realizada com critérios éticos bem conhecidos, utilizando métodos verdadeiramente humanitários, administrados por pessoas responsáveis e devidamente qualificadas. É relevante o fato de que, na avaliação da percepção dos entrevistados sobre o protocolo adequado para eutanásia e quais devem ser usados com restrição, o item "nenhuma das respostas" atendeu satisfatoriamente ao que está estabelecido nos guias éticos contemporâneos sobre o assunto.

Uma das maiores lacunas, tanto na formação acadêmica, considerando que a maioria disse não ter sido adequadamente preparada na faculdade para lidar com questões éticas e dilemas profissionais, quanto no que diz respeito à busca pela informação profissional, refere-se à necessidade de estabelecimento de uma cultura ética, com o estudo sistemático dos valores, virtudes, conceitos morais e de responsabilidade, que promova o autocuidado e o equilíbrio para prevenir o estresse e a fadiga e, ainda, promover um ambiente de respeito e bem-estar para o Médico Veterinário e o animal. A pesquisa sugere que a lacuna na formação acadêmica acaba sendo preenchida pela rotina de trabalho e pelos desafios da vida profissional. De forma empírica, expressiva parte dos entrevistados desenvolveu uma técnica para a prática da eutanásia, escolhendo o protocolo que achou melhor, o que, provavelmente, determinou mais uma fonte de estresse. AUTORAS Simone de Carvalho Dutra Graduanda de Medicina Veterinária Centro de Ensino Superior de Valença (Cesva)

Sylvia Cristina Silva de Azevedo Médica Veterinária CRMV-RJ nº 7198 MSc e docente do Cesva, RJ

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opinião

Luiz Augusto Ribeiro do Valle Médico Veterinário CRMV-AC nº 0062 Vice-presidente da Federação da Agricultura, Presidente do IInstituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Acre (IDAF/AC) em 2011 e 2012. Pecuarista desde 1980.

Indignação Formei-me em Medicina Veterinária pela Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na turma de dezembro de 1979. Orgulho-me muito disso e trago boas lembranças. Grandes amigos, colegas e professores. Algumas perdas, Lucenio... uma pena. Esteve aqui no Acre comigo e depois se foi. Sim, formei-me e vim para o Acre em busca de um sonho: ser pecuarista num dos estados mais vocacionados para a atividade. Na época, havia crédito, terras boas e baratas, tudo que um jovem com pouco ou quase nenhum capital e muito sonho e vontade precisava. A Amazônia era a grande fronteira a ser explorada e de-

Será que é realmente assim? Não devemos nos questionar minimamente sobre isso? Tem boa ciência por trás disso tudo? Um tempo atrás, em reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente, em que discutíamos a política de águas para o estado, apareceu o tal número: 15.000 litros de água por quilograma de carne produzida. Achei um disparate e solicitei os dados. Fui informado de que a fonte era a Agência Nacional de Águas (ANA). Tudo bem, mas a ANA não produz pesquisa! Até hoje não conheço as pesquisas, mas o número usado passou a ser esse. De tanto repetir, vai se tornando verdade, por ignorância ou má-fé.

senvolvida. Assim incentivava o Governo Federal. Nunca imaginava que, 30 anos depois, seria o causador de todos os males da humanidade. Pois é, hoje, se falta chuva, somos nós da Amazônia os culpados – também já fomos quando choveu demais. As queimadas para abertura de novas áreas são responsáveis por 70% das emissões dos gases do efeito estufa, apesar de os índices serem hoje bastante baixos e, na sua grande maioria, em decorrência da pequena produção, em boa parte ilegal, o que deve ser coibido. As emissões de metano do metabolismo ruminal dos bovinos, quase imensuráveis, são o grande responsável pelo aquecimento global. Um quilograma de carne, para ser produzido, gasta 15.000 litros de água. Ufa!

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Intensificação da pastagem. Exemplo de floração em consórcio com arachis (amendoim forrageiro)


As emissões de metano do metabolismo rumenal dos bovinos também é questionada

E as tais emissões de gases do efeito estufa? Atri-

um amigo pesquisador que já foi chefe de unidade

buídas em grande parte ao desmatamento, não levam

da Embrapa, fiz esses questionamentos. Por que os

em consideração todo o carbono retido na biomassa

dados que já temos não são considerados? Ele res-

das pastagens. Por que não fazer o balanço adequado?

pondeu que publicamos pouco em revistas científicas

Noutra oportunidade, na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), mais uma vez discutíamos o assunto (o assembleísmo, no país, é uma loucura). Dessa vez, era a contribuição do metano nas emissões globais. O dado que se usa é que o metano emite o correspon-

internacionais para que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) possa usá-los. Poucos pesquisadores teriam essa capacidade. Achei um absurdo. Como não temos dez, 20 pesquisadores publicando seus papers?

dente a 25 vezes mais que o dióxido de carbono, porém

Em que pese todo o respeito que tenho pela

já existem pesquisas indicando que essa relação é de

Academia, não sei se já não é muito tarde para cor-

apenas quatro vezes. Mas não importa, valem os 25.

reções. O ambientalismo já é um business de muito

Mais uma vez me pergunto: tem que ser assim? Penso que a pecuária, assim como a agricultura, a indústria, o comércio, enfim, toda a economia, é acima de tudo um patrimônio nacional. São milhões de pecuaristas de diversos portes em todos os estados. Milhões de empregos. Bilhões de reais e dólares. Sem contar a

peso nas decisões globais. É preciso equilíbrio, é preciso que todos se sintam igualmente responsáveis pela preservação dos recursos naturais, é preciso eliminar esse maniqueísmo, em que os produtores são o mal e os preservacionistas são a salvação.

importância histórica da pecuária na formação da nação

Sei que o assunto é bastante polêmico e mui-

brasileira. Vamos desconsiderar tudo e nos penitenciar

to mais amplo do que estas poucas linhas e que a

por termos feito tudo errado?

maioria tem opinião a respeito, mas trago aqui para

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e as universidades públicas não teriam que se envolver mais diretamente nessas questões? Com pesquisas de boa qualidade, sem comprometimento econômico e, como, principalmente, ideológico, certamente dariam grande contribuição para dirimir dúvidas e diminuir os conflitos. Recentemente, conversando com

reflexão, afinal, o Médico Veterinário e o Zootecnista estão intimamente ligados ao tema, devido às suas várias atribuições profissionais, sendo eles, portanto, importantes atores no uso inteligente da natureza em benefício da humanidade. Uma vez que falamos de natureza, tiremos as pedras do bolso.

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Publicações

A história da suplementação mineral no Brasil

Fernando Antonio Nunes Carvalho Editado pelo autor fernandoancarvalho@uol.com.br

Gestão na bovinocultura de corte Ricardo Pedroso Oaigen Carlos Santos Gottschall Júlio Otávio Barcellos Luciana Fagundes Christofari Agro Livros agrolivros@agrolivros.com.br

Bem-estar dos suínos Caio Abércio da Silva Cleandro Pazinato Dias Xavier Manteca Editado pelos autores casilva@uel.br

Afecções cirúrgicas emergenciais em pequenos animais Leonardo Martins Leal Alessandro Rodrigues de Carvalho Martins MedVet www.medvetlivros.com.br

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O livro descreve com riqueza de detalhes e imagens preciosas os minerais sódio, potássio, iodo, cobalto, cálcio e fósforo. Apresenta a história das deficiências minerais e da suplementação de uma forma muito clara e de fácil entendimento. Não se restringe a enfatizar a importância da suplementação mineral, apresentando a importância de fornecer suplementos minerais de alta qualidade. As bibliotecas das instituições públicas de ensino de Medicina Veterinária podem entrar em contato com o autor para receber um exemplar gratuitamente.

A complexidade que muitos atribuem ao agronegócio fica desmistificada pela grande habilidade dos autores em expor, de maneira clara e simples, todas as oportunidades que a pecuária pode oferecer. Trata-se de um tratado que permite uma capacitação para enfrentar desafios. Os temas estão bem apresentados em cinco capítulos, em uma lógica didática que facilita o planejamento das atividades a partir do conhecimento de cada etapa do processo.

A obra serve de manual para produtores rurais, Zootecnistas e Médicos Veterinários interessados em técnicas avançadas no manejo de suínos. Traz orientações de bem-estar, considerando, por exemplo, a infraestrutura logística, com itens como transporte e alojamento, além de sugerir condições melhores de criação e manejo, o que se reflete na qualidade do produto que será oferecido ao consumidor. Com 403 páginas e totalmente ilustrada, a obra tem tiragem inicial de 1,2 mil exemplares.

Esta obra propicia aos estudantes, residentes e clínicos de pequenos animais uma consulta rápida de como intervir diante de afecções cirúrgicas emergenciais. Além dos conceitos teóricos básicos, este guia apresenta dicas práticas de experiência clínico-cirúrgica dos autores. O livro é dividido em três partes: Parte I: ABC da Vida; Parte II: Afeccções Cirúrgicas Emergenciais; e Parte III: Técnicas Cirúrgicas Emergenciais e Protocolos Anestésicos.


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Eduardo Pedroso

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Franklin Riet Correa

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