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Do Barroco à Transparência From Baroque to Transparency A espetacularização está cada vez mais presente no cotidiano das sociedades atuais. O espetáculo pode ser observado em diversos locais, como no espaço midiático e na política. Um dos objetivos dessa mostra é fazer uma reflexão sobre o espetáculo com base no olhar de Guy Debord sobre o tema do seu livro, A Sociedade do Espetáculo. O caráter contestatório da obra de Debord nos incita a uma luta acirrada contra a perversão da vida moderna, que prefere a imagem e a representação ao realismo concreto e natural, a aparência ao ser, a ilusão à realidade; sobre o fetichismo da mercadoria; sobre a alienação do público através da espetacularização e sobre a opinião pública. O barroco veio nos apresentar como estilo para o desenvolvimento dessa mostra. Primeiro, por conter em sua essência o poder do espetáculo; e segundo por ser um estilo formador da nossa cultura e estar ainda tão próximo de nós. O barroco é um estilo que desenvolveu nos meados do século XVII, na Itália. Sua ênfase é colocada sobre o equilíbrio, através da harmonia das partes em sua subordinação ao conjunto. É típico das obras barrocas que empreguem vários meios para ativar a participação corporal e emocional do observador. A pintura e a escultura, para atingirem tal objetivo, necessitam, antes de mais nada, criar a ilusão da realidade dos temas representados. O barroco apega-se à substância, às cores, e às texturas das coisas, para criar um espaço, onde o tema e o espectador podem unir-
Spectacularization is increasingly present in the daily life of modern societies. The spectacle can be seen in several places, such as in the media and politics. One of this exhibition’s goal is to discuss the spectacle, based on Guy Debord’s views put forward in his book, The Society of the Spectacle. The contestatory character of Debord’s work invites us to a fierce fight against the perversion of modern life, which favours the image and the representation over the natural and actual realism, the appearance over the essence, the illusion over the reality; above the commodity fetishism; above the alienation through the spectacularization and public opinion. Baroque presented itself as the style to the development of this exhibition. First, for it contains, at its core, the power of the spectacle; and second, for being a style which shaped our culture and which is still so close to us. Baroque is a style that originated in Italy in the mid-seventeenth century. The emphasis is on balance, through the harmony of parts in subordination to the whole. Baroque works typically make use of several means to activate the body and emotional involvement of the observer. In order to achieve such goal, painting and sculpture need, above all, to create the illusion of reality of the represented themes. Baroque clings to the things’ substance, colours, and textures to create a space where the subject and the viewer can come together on a specific moment in time, sometimes a dramatic one. This
se num momento temporal específico e por vezes dramático. Essa emergência física do barroco é obtida de modo particular pelo uso calculado da luz e da sombra, do cheio e do vazio, de curvas ou diagonais marcadas, pela quebra das expectativas e dos planos. Os artistas convidados para compor essa mostra tiveram como desafio traduzir essas diversas passagens de tempo, espaço e pensamentos, em obras que refletissem o seu universo atual. E eles a produziram em suportes transparentes, caracterizando assim a leveza e transposição dos assuntos abordados. Suas tênues imagens são deixadas a cargo da luz que insinuam a finitude de um momento bem como a continuação da nossa cultura. A transparência é a passagem de um momento para o outro, de uma cena para outra, a permitir a perpetuação através de vestígios que a luz imprime sobre as paredes. Os artistas criariam imagens que seriam alteradas por outras e outras possibilidades. Um exercício de imaginação. Gaston Bachelard nos diz que imaginar é a faculdade de deformar as imagens fornecidas pela percepção. É, sobretudo, a faculdade de libertarmos das imagens primeiras. “Se uma imagem presente não faz pensar numa imagem ausente, se uma imagem ocasional não determina uma prodigalidade de imagens aberrantes, uma explosão de imagens, não há imaginação.” Esse foi o objetivo básico dessa exposição experimental. Essa mostra nasceu, há mais de um ano, durante uma conversa informal entre eu, Tânia de Filippo e Juçara Costa, cuja ideia Luiz Alberto de Filippo moldou, formatou e transformou na exposição que hoje se apresenta. Foi ele que arrebanhou os artistas; tramou cumplicidade com Celestino Sobral (instalação) e com o iluminador Toninho Rodrigues; criou a sonorização do ambiente; enfim, tornou viável o que antes eram apenas palavras. Partiu de Celestino as formas dos suportes transparentes, cujas imagens geradas pelos artistas se transformariam em sombras e espectros. Recebemos de suas mãos esses suportes nos dando total liberdade para criar neles o que bem quiséssemos.
physical emergence of the Baroque is achieved in particular by the calculated use of light and shadow, full and empty, marked curves or diagonals, by breaking expectations and plans. The artists invited to join this exhibition were challenged to translate these various passages of time, space and thoughts on works that reflect their current universe. And they made them on transparent substrates, characterizing the lightness and transposition of the topics. The subtle images are left in charge of the light that imply the finiteness of a moment as well as the continuation of our culture. The transparency is the passage from one moment to another, from one scene to another, to allow the continuation through the traces that light prints on the walls. The artists would create images that would be changed by others, and by other possibilities. An imagination exercise. Gaston Bachelard tells us that imagination is the ability to deform images presented by perception. It is, above all, the ability to liberate us from basic images. “If a present image does not recall an absent one, if an occasional image does not give rise to a swarm of aberrant images, to an explosion of images, there is no imagination.” That was the basic goal of this experimental exhibition. This exhibition arose, more than a year ago, from a casual conversation between me, Tania de Filippo and Juçara Costa, and it was Luiz Alberto de Filippo who moulded, formatted and transformed it into the exhibition that we see today. It was he who gathered the artists, conspired with Celestino Sobral (installation) and the lighting designer Toninho Rodrigues and created the sounding system. In short, he turned what were once just words into reality. Celestino came up with the shapes of the transparent supports, where the images generated by the artists would become shadows and spectres. He handed us these supports and gave us freedom to create on them whatever we wanted. Daniel Moreira was probably the only artist in the group to make a striking and baroque image, through a picture of his new-born son. A baby wrapped in a chiaroscuro, between blood and the sacred, eloquently showing the basic features of the Baroque style.
Daniel Moreira talvez tenha sido o único artista do grupo que produziu uma imagem contundentemente e barroca, através de uma foto de seu filho acabando de nascer. Um bebe envolto no chiaroscuro, entre o sangue e o sagrado, evidenciando com eloquência as características básicas do Barroco. Samuel Oliveira se autorretratou em sobreposições de imagens, deixando que a leveza e os espaços falassem por si. Dentro desses universos diáfanos, em contraponto com a delicadeza da foto, colocou em seu peito um empalhado gafanhoto. Talvez uma referência a Kafka; talvez uma alusão ao canibalismo (cultural) do qual esse animal é vítima, cuja cabeça é devorada pela sua parceira de vida. Os conhecidos trabalhos maciços e pesados de Leandro Gabriel agora é visto de forma diferente, flutuando tranquilo e translúcido no meio do ambiente da galeria. Poderíamos ver ali o símbolo gráfico de infinito (∞); ou a estrutura de um DNA a apontar a nossa cultura como uma prisão evolutiva. Porém, é melhor admitir como verdade as duas (ou mais) vertentes de interpretação que essa escultura se apresenta. Daniel Pinho invade com sua câmara o novo templo barroco: os supermercados. Grava imagens que correm velozmente pelas gôndolas registrando uma profusão de cores e formas, projetando-as em telas transparentes e sobrepostas, que vão se dissolvendo ao longo de seu percurso de projeção, até transformá-las em espectros de luz. Seu vídeoinstalação alonga a perspectiva do espaço expositivo num misto de intenção Barroca e Pop, simultaneamente. Já Juçara Costa parece buscar seus grafismos na cultura negra africana. Produz uma tela rendilhada de texturas e cores que ao ser penetrada pela luz transcende em misticismo e magia. Sérgio Vaz joga no espaço, através do seu desenho, corpos que caem (ou ascendem), opondo a leveza dos seus traços com massas negras e disformes que parecem abocanhar e negar a transparência do suporte. Alexandre Rato nos apresenta uma pintura delicada, lúdica, oriunda de seu estilo urbano,
Samuel Oliveira made a self-portrait with overlaying images, letting the lightness and the spaces speak for themselves. Within these diaphanous universes, as opposed to the subtlety of the picture, he put on his chest a stuffed grasshopper. Perhaps a reference to Kafka, perhaps a hint of (cultural) cannibalism from which this animal is a victim, and whose head is devoured by his life partner. The well-known heavy and dense works of Leandro Gabriel are now viewed differently, translucent and quietly floating in the middle of the gallery. There we could see the graphic symbol of the infinite (∞), or the structure of a DNA pointing to our culture as an evolving prison. However, it is best to admit as true the two (or more) interpretations that this sculpture presents. Daniel Pinho together with his camera invades the new baroque temple: the supermarkets. He records images that run fast through the shelves, registering a profusion of colours and shapes, projecting them on transparent and overlapping screens that dissolve throughout its projected path, until they are transformed into light spectra. His video installation extends the perspective of exhibition space simultaneously mixing Baroque and Pop intents. Juçara Costa, on the other hand, seems to seek her artwork in the black African culture. She makes a fabric of textures and colours that, as it is penetrated by light, transcends into mysticism and magic. Sérgio Vaz throws in the space, through his drawing, bodies that fall (or rise), opposing the lightness of his lines to black and shapeless masses that seem to snatch up and deny the transparency of the support. Alexandre Rato presents a delicate painting, playful, derived from his urban style, whose support allows the viewer to change and interfere in the design of his work. Jônatas Campos produced an object-poem that seems to want to scale time. A clock, an astrolabe, a sextant, or a time machine from a work of Jules Verne? It does not matter. Subtle layers of acrylic protect a red sphere -
cujo suporte permite ao espectador alterar e interferir na concepção de seu trabalho. Jônatas Campos produziu um poema-objeto que parece querer dimensionar o tempo. Um relógio, um astrolábio, um sextante, ou uma máquina do tempo saída de uma obra de Júlio Verne? Não importa. Sutis camadas de acrílicos protegem uma esfera vermelha – ora sol, ora coração, ora um simples coágulo – regida por um pêndulo a quase esbarrar o chão. Mara Martins desdobra sua obra em sete triangulo que ascendem pelo espaço da galeria, onde um completa o desenho do outro e cuja luz do ambiente os destroem e os confundem. Só uma leitura cuidadosa e próxima ao seu trabalho é que podemos observar desenhos dos profetas de Aleijadinho a compor essa delicada urdidura.
sometimes sun, sometimes heart, sometimes a simple clot - governed by a pendulum that almost bumps on the ground. Mara Martins unfolds her work in seven triangles, which climb the gallery space, one completing the other one’s drawing, and with the ambient light destroying and confusing them. Only through a close and careful reading of her work can we see drawings of Aleijadinho’s prophets that compose this delicate plot. The work of Angelo Issa brings the social weight of our tragedies. Its support has bullet holes and only a bloody shirt is presented to us. The daily life of our urban violence. I would rather not think so. I want to believe that the artist just showed us the blood and drama that are so characteristic of this school of art we are addressing.
A obra de Angelo Issa trás o peso social das nossas tragédias. Seu suporte é furado a tiros e apenas uma camisa ensanguentada nos é apresentada. O cotidiano urbano de nossas violências. Prefiro não pensar assim. Quero crer que o artista nos apresentou apenas o sangue e o drama que são tão característicos dessa escola de arte da qual estamos abordando.
Miguel Gontijo removes from a shapeless and heavy pachyderm the lightness and beauty it contains, offering movement and variation possibilities. The eternal recreation, be it through the shadows projected on the walls, or the images that are merged and renewed, or in the groaning of the Duchampian gadget that constantly spins in search of an eternal statement.
Miguel Gontijo retira de um disforme e pesado paquiderme a leveza e a beleza contida nele, oferecendo-o movimento e possibilidades de variações. O eterno recriar, seja através das sombras projetas nas paredes, ou nas imagens de se fundem e se renovam, seja no gemido da engenhoca duchampiana que gira incessantemente em busca de uma eterna afirmação.
Paulo Torres paints the support as if it was a transparent stained glass. A washed and colourful paint allowing the invasion of lights, except for a small space reserved for a mirror that makes the viewer the actor of his work.
Paulo Torres pinta o suporte como se fosse um transparente vitral. Uma pintura lavada e colorida permitindo toda a invasão de luzes, exceto num pequeno espaço reservado a um espelho que faz do espectador o ator de sua obra. Já Léo Brizola fez com que sua pintura tomasse conta de todo o suporte, não dando permissão que a luz invadisse e penetrasse sua obra. Gordas camadas de tinta deixam surgir uma figura de mulher a nos espiar, arredia e indiferente. Todas essas possíveis interpretações se reduzem a uma só concepção que é a de se permitir transpor limites, testar conhecimentos, ousar novos suportes. Afinal, essa é a função básica de qualquer manifestação artística. Devemos, por fim, salientar que essa exposição também levou em conta o conceito original da palavra barroco, que é: “pérola irregular, deformada e imperfeita” e que transparência é a virtude que impede a ocultação de verdades.
Leo Brizola’s painting took the whole support, not letting the light invade and penetrate his work. Fat layers of paint let appear a woman’s figure to spy on us, aloof and indifferent. All of these possible interpretations are reduced to a single concept, which is to be allowed to transpose limits, to test knowledge, to venture new supports. After all, this is the basic function of any art form. Lastly, we should point out that this exhibition also took into account the original concept of the word baroque, which is “an irregular, distorted and flawed pearl” and that transparency is the virtue that prevents hiding truths. On this exhibition, these words become complementary, in search of a more effective method of approach between the private and the universal or pure ideas. And with Marx we wrap up and conclude: “all that is solid melts into air.” Miguel Gontijo
Artist - August 2015
Nessa mostra essas palavras tornam-se complementares a procura de um método mais eficaz de aproximação entre as ideias particulares e as ideias universais ou puras. E é Marx que vem bater o martelo e encerrar: “tudo que é sólido desmancha no ar”. Miguel Gontijo
Artista plástico - agosto de 2015
Angelo Issa
Alexandre Rato
Daniel Moreira
Daniel Pinho
J么natas Campos
Juรงara Costa
Leandro Gabriel
Leo Brizola
Mara Martins
Miguel Gontijo
Paulo Torres
Samuel Oliveira
SĂŠrgio Vaz
Artistas: Alexandre Rato Angelo Issa Daniel Moreira Daniel Pinho Jônatas Campos Juçara Costa Leandro Gabriel Leo Brizola Mara Martins Miguel Gontijo Paulo Torres Samuel Oliveira Sérgio Vaz
Idealização: Luiz De Filippo. Suportes e instalação: Celestino Sobral Criação de luz: Toninho Rodrigues Produção executiva Airam Resende Boa Morte Assistente de produção Tânia De Filippo Foto e vídeo Samuel Macedo Montagem de luz Ton Light Design catálogo Clara Gontijo Texto Miguel Gontijo Tradução Eneida Lathan
Exposição realizada em setembro e outubro de 2015 no Viaduto das Artes. Belo Horizonte, MG, Brasil.
Projeto realizado com os benefícios da Lei Estadual de Incentivo a Cultura