FalaCalafate 01

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E T A F LA

A C A L FA Jornal FALACALAFATE Primeira edição, Novembro 2014 Tiragem: 3.000 exemplares Edição, redação e projeto gráfico: micrópolis / www.micropolis.com.br

Colaboradores: Fausto Pena Nívea Caroline Paulo Marcelo Oz

Nº1

para colaborar ou opinar, escreva para: fala@bairrocalafate.org ou visite www.bairrocalafate.org www.facebook.com/bairrocalafatebh

micrópolis é formado por: Belisa Murta, Felipe Carnevalli, Fernanda Gomes, João Carneiro, Marcela Figueiredo, Mateus Lira, Vítor Lagoeiro

operação urbana consorciada

Entenda como este tipo de projeto afeta nosso bairro p. 3

café da manhã na praça carlos marques Já pensou em usar a praça como sua casa? p.5

o calafate de cada um

Conheça nosso bairro a partir da memória e das rotas diárias dos moradores de longa data. p.6

SEJA BEM VINDO! No dia 9 de abril de 1978, o extinto Jornal de Casa já anunciava: “Sobreviver - é por isso que o Calafate está lutando”. Nessa época, os tradicionais becos do bairro já se espremiam entre as obras viárias feitas pelo governo. Quase quarenta anos depois, as preocupações que o jornal relatava ainda são as mesmas. Mas a edição do jornal está guardada como peça de coleção pelos moradores mais antigos, junto com fotos amareladas do que um dia foi o Calafate que eles conheceram. Por muito tempo, o Calafate ficou sem voz, apesar de alguns projetos de comunicação que acabaram se desmanchando pelas adversidades do tempo. É o caso da rádio comunitária da Sociedade Musical Carlos Gomes, que chegou a erguer sua

antena nas proximidades da Igreja mas não demorou a ser denunciada para a Anatel e encerrou suas atividades. Houve também o jornal Calafatos que, por cerca de dez anos, foi o jornal de bairro mais conhecido das redondezas. A partir de agora, nosso bairro ganha um novo jornal, o FalaCalafate. Editado por micrópolis, um grupo de arquitetura em articulação com parceiros locais, moradores, comerciantes e a UFMG, o periódico pretende abordar as questões do cotidiano do bairro, transitando entre a rica memória do Calafate e propostas de como ele poderia ser no futuro. Diferente dos jornais de massa, o FalaCafalate, além de noticiar os fatos do dia-a-dia, quer também explorar a dimensão afetiva entre seus leitores, estreitando os vínculos entre os moradores e tornando públicos seus desejos para o bairro. Em nossas páginas, que chegarão na sua caixa de correio a cada dois meses, vamos narrar as histórias que merecem

ser contadas, mostrar acontecimentos do cotidiano do bairro e dar voz à nossa gente, que, das calçadas da Platina aos bancos da praça do Bernardão, faz do Calafate o que ele é hoje. Acreditando que mudanças na cidade podem depender menos do governo e mais dos cidadãos, o FalaCalafate quer também funcionar como uma praça, onde projetos locais de interesse coletivo sejam amplamente debatidos entre os interessados e comunicados à toda a vizinhança. Para isso, queremos descobrir os modos criativos de viver e transformar o bairro que já acontecem por aqui, de modo a inspirar outras iniciativas que tornem nossos espaços mais agradáveis. Mas claro, não vamos deixar de lado as notícias externas que afetam a nossa comunidade, pois o centro é logo ali e o Calafate não é só destino, mas também caminho para muitos.

décadas de 60 e 70

Descubra como eram os bailinhos que agitavam as noites do bairro. p.8

guia da rua

O guia de nossa primeira edição explora os segredos da Rua Dr. Thomaz Muzzi. p.9

O FalaCalafate quer ouvir você falar, seja você morador de longa data ou visitante ocasional.

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Fausto Glória Pena transporta o leitor ao Calafate dos anos 50 e 60, quando as radiolas tocavam canções românticas nas ‘horas-dançantes’, crianças brincavam na rua e todos festejavam juntos o Carnaval e os Festivais.

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nov/dez 2014

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Já ouviu falar em operação Urbana Consorciada? O Nova BH, lançado em outubro de 2013, é um dos mais impactantes e polêmicos projetos da Prefeitura de Belo Horizonte atualmente em discussão. O seu objetivo era transformar 25 km² do território da cidade, atingindo 170 mil habitantes, nas regiões próximas às Avenidas Antônio Carlos e Pedro I, além do Corredor Leste-Oeste, que inclui Av. dos Andradas, Av. Tereza Cristina e Via Expressa. Uma boa parte dos bairros Prado e Calafate estava incluída no projeto, especialmente devido à previsão da construção de uma grande bacia de contenção onde hoje se encontra a Vila Calafate. A idéia era aumentar o adensamento da cidade — o que significa mais prédios, mais comércio e mais moradores. Além disso, acarretaria mudanças nos espaços públicos, chamadas pela Prefeitura de “renovações urbanas”.

Mas de onde vem o dinheiro para executar este tipo de empreitada? A cartilha do Nova BH, divulgada pela Prefeitura, informa que o projeto seria executado por meio de uma Operação Urbana Consorciada (OUC). A OUC é um instrumento urbanístico previsto na lei brasileira que possibilita a participação de investidores privados em grandes transformações urbanas coordenadas pelo poder público municipal, com a participação dos moradores e usuários permanentes. Além disso, a Operação Urbana Consorciada permite, excepcionalmente, que se ultrapasse os limites construtivos que geralmente devem ser respeitados por novos edifícios, e, desta forma, aumenta-se o adensamento da cidade. Vamos explicar melhor como isso funciona. Geralmente, o Plano Diretor determina a área máxima de uma nova construção de acordo com tamanho do terreno. No linguajar urbanístico, este limite, que varia de acordo com as zonas da cidade, se chama Coeficiente de Aproveitamento (C.A.). Por exemplo: se um lote de 100 m² está em uma

área onde o C.A. é 1, pode-se construir no máximo 100 m²; se este mesmo lote está em uma zona onde o C.A. é 2, pode ser feita uma construção de até 200 m², e assim por diante. Já na Ope ração Urbana Consorciada, a prefeitura vende um Potencial Construtivo adicional, também chamado de CEPAC. Em outras palavras, as construtoras compram da Prefeitura o direito de construir edifícios maiores do que o que geralmente é permitido. É com esse dinheiro que a Prefeitura pretende realizar a “renovação urbana” prometida pelo Nova BH, executando obras de infra-estrutura e nos espaços públicos do entorno destas novas construções. Apesar de aproveitar o capital privado para realizar renovações no espaço público, essa é uma estratégia altamente controversa. Com a venda das CEPAC’s, a Operação Urbana Consorciada estimula a chegada de investidores de peso no mercado imobiliário local. Desta forma, a “renovação” do bairro pode acabar priorizando os interesses destes novos atores, preparando o local para receber edificações de grande porte e alta sofisticação, mas deixando de lado as necessidades de quem já é morador. Algum tempo depois, os imóveis e o custo de vida podem aumentar a ponto de tornar a permanência no bairro impossível para boa parte dos moradores, especialmente aqueles que moram de aluguel e as populações mais pobres. Este processo é chamado de “gentrificação”. Este processo é muitas vezes entendido como um resultado inevitável do crescimento e do desenvolvimento da cidade. Afinal de contas, o próprio crescimento da população acarreta necessariamente a construção de novos edifícios para abrigar mais moradores e uma maior atividade econômica. Mas esta lógica está longe de ser uma verdade inquestionável. O centro da cidade, com alto índice de edifícios degradados e vazios, tem o potencial de

Coeficientes de Aproveitamento propostos para a proposta descartada do Nova BH:

Area do parque Bacia do Calafate

Quadra de preservação C.A. máximo 1,5 rua p

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Quadra Galeria C.A. máximo 4,8 Quadra Bairro C.A. máximo 3,0

Quadra Bairro C.A. máximo 3,0

Perspectiva do projeto para o Setor Parque Bacia do Calafate / PBH 2014

suprir grande parte desta demanda. No entanto, o mercado imobiliário prefere concentrar-se em novas construções, já que os investimentos na construção civil são de baixo risco e altos lucros, especialmente quando facilitados e incentivados pelos governos. Enquanto isso, a cidade vai ficando cheia de prédios cada vez mais altos, ao mesmo tempo em que falta moradia a custos acessíveis no centro. É nesse sentido que, muitas vezes, o desenvolvimento imobiliário aparece na cidade não para atender às necessidades dos cidadãos, e sim para garantir que a roda da economia continue girando. O Nova BH previa a remoção de várias casas para que os novos projetos pudessem ser construídos. A Vila Calafate, por exemplo, seria removida inteiramente para a construção da polêmica bacia de contenção do rio Arrudas, ou piscinão do Calafate, com a intenção de se acabar com as enchentes. Outro ponto controverso do projeto é a participação popular no processo de sua elaboração. O Estatuto da Cidade determina que haja envolvimento das populações afetadas no desenvolvimento de Operações Urbanas Consorciadas, de modo a tornar os projetos mais condizentes com as necessidades da população. No entanto, a Prefeitura de Belo Horizonte não promoveu encontros amplos e abertos a todos antes da definição do projeto Nova BH, limitando-se a diálogos com poucas pessoas tidas como lideranças, e deixando a decisão sobre o futuro de muitos na mão de poucos.

PARALISAÇÃO Em audiência no dia 5 de novembro, a Prefeitura de Belo Horizonte admitiu que o projeto do Nova BH foi elaborado com pouca participação e discussão com a sociedade, levando à paralisação do projeto. O projeto será recomeçado do zero e promoverá oficinas com as comunidades urbanas para garantir maior contribuição dos moradores de cada região ao projeto. O projeto vai também mudar o nome. Ao invés de Nova BH, será OUC Antônio Carlos/Pedro I e Leste Oeste e será submetido, mais uma vez, à votação no Conselho Municipal de Políticas Urbanas (Compur) antes de ser encaminhado à Câmara Municipal. Apesar dos curtos prazos para realizar grandes mudanças na proposta, a prefeitura publicou um cronograma de oficinas e audiências que serão realizas em cada regional de Belo Horizonte, nas quais ocorrerão debates, visitas aos locais onde estão previstas obras e intervenções e oficinas em que os cidadãos poderão opinar sobre o projeto e apresentar propostas. FIQUE LIGADO! A primeira oficina na regional Oeste acontece no dia 11 de novembro, a partir das 19 horas, na Secretaria de Administração Municipal Regional Oeste, localizada na Av. Silva Lobo, 1280, Nova Barroca. Na ocasião, será realizado o debate regional com esclarecimento de dúvidas e apoio na elaboração de propostas.


FALACALAFATE

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ONTEM E HOJE: PRAÇA INÁCIO DA FONSECA O surgimento da praça Inácio da Fonseca coincide com o começo bairro Calafate. Os moradores da nova capital foram fazendo suas casas nas redondezas da igreja São José do Calafate, mas nada foi construído no espaço ao lado, onde até hoje há uma praça. A paróquia sempre foi uma referência para os moradores, que a frequentavam não só para as preces, mas também para encontrar amigos e vizinhos.

Todos os fins de semana, depois da missa, acontecia o footing: os homens ficavam de pé no passeio enquanto as moças circulavam ao redor. Seu Etel conta que o footing do Calafate era tido como um dos maiores da cidade e atraia jovens de vários bairros, que lotavam a praça. Nessa época, o estacionamento era usado somente pelos carros de praça (taxis), que saíam na parte da noite, deixando espaço para a paquera.

Os fiéis aproveitavam o largo da igreja para fazer eventos em datas especiais. Rita, Eny e Solange contam que todos os anos, era feita uma festa junina, organizada pela turma de jovens para arrecadar fundos para a paróquia. A praça Inácio da Fonseca ficava cheia de barraquinhas e as pessoas se amontoavam para jogar bingo, disputando um frango assado como prêmio. Na semana santa, armava-se um palco na praça e os jovens apresentavam uma peça de teatro. Quem assistia ficava em pé, ou trazia um banquinho de casa.

Uma vez por mês acontecia o Cine Grátis. O caminhão estacionava na praça e armava o telão e costumava passar desenhos animados. Os filmes demo- ravam para começar, porque era preciso subir no poste e cobrir a luz que atrapalhava a projeção. Nessa época, ninguém tinha televisão em casa, então o cinema chamava muita atenção e os telespectadores enchiam a praça. A Banda Carlos Gomes, vizinha e parceira da igreja, também é parte importante da praça. Os músicos já se apresentaram

várias vezes na porta da sede. Todos os anos a praça se alegrava com o som dos trompetes, trombones e baixos na comemoração do aniversário da banda. Atualmente, os eventos da igreja acontecem no salão comunal ou na quadra, espaços considerados mais seguros e confortáveis. A festa junina e o teatro continuam animados e ainda atraem vários moradores do bairro. O footing acabou não só no Calafate, mas em toda a cidade, pois os tempos são outros. O Cine Grátis nunca mais aconteceu, já que agora as pessoas assistem a filmes em casa, ou vão ao cinema nos shopping centers. Os músicos da banda Carlos Gomes têm saudades das apresentações ao ar livre e pensam em voltar com essa prática. O único remanescente dos velhos tempos é o ponto de taxi. Os taxistas descansam na sombra das árvores enquanto esperam o próximo cliente, provavelmente um mora-

1973 2014 o a a caç o r u o s e t

Na nossa primeira edição, a caça ao tesouro desafia todos os leitores a encontrar o lindo ladrilho hidráulico da foto ao lado, que está incrustado em uma de nossas ruas. Tem pistas de onde seja? O primeiro leitor a encontrar a peça e enviar um email com a localização para fala@bairrocalafate.org pode escolher entre ganhar um creme de açaí 500 g em plena Rua Platina ou um corte de cabelo no Salão Platina!

dor do bairro. Durante a corrida, taxistas jovens conversam com os idosos sobre o dia-a-dia e histórias do passado. É marcante na praça a presença dos caminhões de mudança, cujos motoristas também ficam esperando por potenciais clientes. Muitas pessoas reclamam da falta de organização do estacionamento que ocupa hoje a maior parte do espaço. Atendendo a pedidos dos moradores, recentemente foi aprovado no Orçamento Participativo o projeto de revitalização da Praça Inácio da Fonseca, que inclui uma melhor sinalização das vagas e a manutenção dos jardins. Mas será que os carros vão ocupar a praça para sempre? Algum dia voltaremos a ter festas e eventos no largo da igreja?


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o que você acha da praça carlos marques?

A Praça Carlos Marques é um dos principais espaços públicos do Calafate. Mesmo sendo caminho cotidiano de muitos moradores, não são todos que param realmente por ali. Geralmente as idas à Praça acontecem para pequenos passeios com crianças ou cachorros, banhos de sol para os idosos e bate-papos. Apesar de toda a tranquilidade, é comum encontrar moradores que vêem a praça com maus olhos. As reclamações geralmente passam pelo uso de drogas, moradores de rua e, principalmente, o descuido em relação à manutenção da praça. Mesmo com várias lixeiras, não é difícil encontrar lixo no chão. Há bancos quebrados e o gramado se extingue com o tempo pela falta de água. Essa é uma das principais reclamações de Dona Eny, que diz que a Praça deveria ser um belo jardim colorido de flores. Mas ela também admite ter receio que, caso fosse implantado o jardim, ele não durasse muito tempo pela falta de cuidado da comunidade. Antigamente, a Praça foi palco de muitos eventos, como o Cine Grátis, que exibia filmes e séries gratuitamente à noite, e campeonatos de voleibol que povoavam as tardes. Hoje, práticas como essas são

cada vez mais raras em nossa praça. Com excessão de alguns eventos, como a Procissão de Ramos organizada pela Igreja São José do Calafate, é difícil ver alguma coisa acontecendo ali. Durante uma manhã de sábado de setembro, a redação do jornal convidou os moradores para uma feira de trocas de objetos domésticos usados. Aproveitamos a ocasião para conversar com os moradores e frequentadores sobre a praça. Foram diversos os comentários de pessoas que afirmavam que a Praça precisava deste tipo de movimento. Muitos mostraram sentir falta de oportunidades de encontro e apreciação e alguns outros relembraram da época em que a Banda Carlos Gomes tocava no coreto. “Era muito gostoso ouvir músicas aqui”, recorda Dona Lúcia, que se mudou para perto da Praça justamente por saber que ali era um espaço agradável de convivência. De maneira geral, há um descontentamento em relação aos espaços públicos do bairro, cuja manutenção é delegada ao governo, que realmente não parece atuar muito por ali. Por outro lado, a comunidade parece não saber como poderia agir para deixar aquele espaço ainda mais povoado e gostoso. Durante a feira

LOTES VAGOS: PROBLEMA OU POSSIBILIDADE? Basta espiar através dos pequenos buracos no muro para vermos o capim e outras ervas daninhas que crescem em meio a sacos de lixo e pequenas pilhas de materiais de construção. Hoje no Calafate os lotes vagos são muitos, e os problemas que trazem à população são também numerosos. Acúmulo de lixo e entulho, queimadas constantes, insegurança e presença de animais indesejados são algumas das reclamações comuns da vizinhança em relação a esses locais fadados ao esquecimento. Mas, ao contrário do que muitos pensam, os lotes vagos também podem ser uma possibilidade de tornar a cidade em que vivemos mais agradável. Em Betim, os moradores do bairro Granja Verde se articularam para fazer uma horta comunitária em um lote vago pertencente à CEMIG. O terreno que antes servia de acúmulo de entulho, hoje beneficia cerca de cinquenta famílias que cultivam hortaliças usadas para o seu próprio sustento e também como fonte de renda extra. Em 2005 e 2006, o arquiteto Breno Silva e a artista Louise Ganz realizaram em Belo Horizonte um trabalho cujo objetivo era transformar lotes de propriedade privada em espaços públicos temporários negociando a ocupação em troca de manter o local limpo e utilizável. Neste período, vários lotes foram cedidos e transforma-

dos em locais de uso coletivo como salas de estar a céu aberto, área de piscinas e espaços de descanso. O projeto, batizado de “Lotes Vagos”, ganhou tanta visibilidade que até o prefeito de Belo Horizonte àquela época, Fernando Pimentel, negociou um serviço gratuito de limpeza urbana pela SLU para os proprietários que cediam seus lotes para o projeto. Já imaginou se todos esses lotes vagos à espera de uma construção no Calafate abrigassem temporariamente usos coletivos como hortas, sessões de cinema a céu aberto, pomares, feiras de trocas, festas familiares ou bibliotecas públicas, em troca da manutenção do local ou até da redução do IPTU do lote negociada com a prefeitura? Eduardo Correia, dono da EMBRACORS Corretora de Seguros, localizada na praça Inácio Fonseca, compartilha dessas ideias. Pensando no futuro, ele nos revela que gostaria de transformar o terreno dos fundos da casa, hoje usado como estacionamento, em um pequeno espaço cultural. “É difícil encontrar na cidade esses lugares de respiro, que lembram os quintais das casas de antigamente. São ótimos para espairecer!”.. E você, possui algum lote vago ou tem ideias de usos para esses locais? Fale com a gente através do e-mail fala@bairrocalafate.org!

de trocas, algumas ideias foram aparecendo entre as conversas de vizinhos. Além do plantio de jardins mais floridos e ouvir a banda tocar novamente, muitos moradores manifestaram interesse em equipamentos de ginástica para a terceira idade, playground para as crianças e também uma feira que acontecesse com frequência. Será que temos mesmo que esperar a ação do poder público para transformar nosso espaço público? É claro que grandes obras devem ter respaldo da Prefeitura, mas, quando olhamos para o passado do bairro, percebemos que o que tornava a praça mais convidativa eram eventos que partiam do esforço coletivo dos moradores. Afinal, quando usamos a praça intensamente, conseguimos inibir episódios criminosos que acontecem quando ela está vazia. Que tal pensarmos juntos nessas possibilidades de ocupação? Envie para nosso jornal ideias para publicarmos na próxima edição e já começarmos a organizar estes eventos, rumo a uma praça mais pulsante, alegre e segura.


O CALAFATE DO

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SEU ADÃO A cada edição do jornal, vamos descobrir o bairro através do olhar de um morador. Para estrear, Seu Adão nos revela memórias de uma paisagem que já não existe mais e convida a conhecer seus pontos favoritos na Rua Platina.

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Começamos nosso trajeto no quintal do Seu Adão, onde ele nos mostrou as minas d’água que ali afloram. O terreno foi um dia a chácara de sua família. Naquela época, plantava-se de tudo no bairro e para pegar frutas dos vizinhos não precisava nem de permissão. Com o crescimento de Belo Horizonte, as chácaras foram loteadas, dando lugar às ruas que conhecemos hoje.

5 Foi na Rua Custódio Carreira que tivemos contato com o primeiro rio de nosso trajeto. Mas como era de se esperar, só pudemos escutá-lo através da boca de lobo acinzentada que cobre o rio para os carros poderem passar.

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A Silva Lobo é hoje uma via de fluxo intenso, mas Seu Adão relembra o tempo em que nela passava um córrego rodeado por árvores frutíferas onde se podia nadar e pescar. Se hoje atravessar a via até o outro lado do bairro é muito custoso, no passado bastava atravessar a ponte de madeira para vencer a correnteza.

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As vias alargadas e os viadutos construídos no bairro, além de terem se saturado muito rapidamente, tornaram o espaço urbano cinza, árido e impessoal. Seu Adão, contudo, desbrava as pistas nem um pouco convidativas com a mesma serenidade de sessenta anos atrás.

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8 Do viaduto que passa sobre a Avenida Tereza Cristina, observamos o Rio Arrudas que um dia recebia banhistas e pescadores que também aproveitavam para colher gabiroba, araticum, pequi, mamão e manga e, em dias mais animados, caminhavam até a Cidade Industrial ao longo do rio.

Seu Adão nos revelou também que o sacolão é seu lugar favorito na Platina. Ele o visita três vezes ao dia, mesmo sem precisar, só para encontrar seus vizinhos.

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No lugar dos campos de várzea onde aconteciam os campeonatos de futebol do bairro no passado, encontramos um bota-fora onde algumas pessoas buscam resíduos apara reaproveitamento. Seu Adão vê essa prática com bons olhos: “pelo menos esse lixo não está solto por aí”.

Já na Rua Platina, Seu Adão nos mostrou sua construção favorita. Na frente do edifício, que hoje abriga três comércios diferentes (lojas de móveis, calçados e materiais elétricos), Seu Adão apontou com orgulho para a data da construção gravada na fachada: 1919.

O passeio terminou no antigo Cine Eldorado, que hoje se encontra fechado à espera de um novo uso. Em seus anos dourados, o edifício acolheu uma intensa programação de cinema e séries, servindo como principal ponto de encontro para muitos moradores e frequentadores do bairro.


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OS MUROS E O BAIRRO Já não se sabe ao certo, mas foi entre 2006 e 2008 que se concluía a última etapa de aumento do muro da Escola Bernardo Monteiro, separando de vez as atividades espontâneas da praça das atividades disciplinadas que tradicionalmente se espera de uma escola. Hoje, esse mesmo muro está coroado por um rolo de arame farpado, a cereja do bolo dos aparatos de segurança.

muros começaram a ser erguidos para separar as casas umas das outras e da rua. Esses muros ainda eram baixos, e portanto podiam ser usados como ponto de contato entre o espaço público e a casa, servindo de apoio para conversas entre vizinhos e possibilitando que os pais, de dentro de casa, tomassem conta das crianças que brincavam na rua.

Entretanto, a sensação de insegurança na praça e na escola persiste, o que levou a Associação de Moradores do Prado e Calafate (AMAPRAC) a convocar a Polícia Militar a ter uma presença mais incisiva por ali — tanto na praça, quanto dentro da escola. O Tenente Cordeiro, por outro lado, sugere intervenções mais sutis como resposta aos episódios criminosos da escola e de seus arredores: basta que as pessoas, alunos ou não, usem os espaços da praça e da escola mais intensamente e menos pontualmente, visando a uma maior integração entre escola, espaço público e comunidade. Tal integração é, contudo, citada como desafio pela AMAPRAC. Isto porque, segundo seus representantes, os alunos, em sua maioria não residentes do bairro, são muitas vezes estigmatizados pelos moradores e vinculados precipitadamente às ocorrências criminosas.

Com o aumento da sensação de insegurança nas cidades, os muros passam a servir para isolar as casas do espaço público, com a intenção de evitar roubos. O aumento de um muro faz com que os vizinhos de muro ainda baixo se sintam mais vulneráveis à violência e, em efeito dominó, os dispositivos de segurança se multiplicam pelos bairros.

Segundo a diretora da escola, Dorilene Bechir, e a professora de inglês Luanda Pena, os muros do Bernardão delimitam o espaço do controle e da disciplina ditados pela escola, e o mau comportamento dos alunos ali dentro é muitas vezes resultado de rebeldia em relação às regras impostas. As educadoras relataram que alunos tidos como desordeiros já surpreenderam positivamente em atividades escolares fora dos muros da escola, já que queriam provar que tinham autonomia para se portar no espaço público de socialização. OS MUROS DAS NOSSAS CIDADES Com o surgimento dos afastamentos laterais e frontais das casas, que antes eram construídas com as laterais coladas, os

Pouco se questiona, contudo, os efeitos colaterais dessa cultura do isolamento. As casas perdem sua conexão com o espaço público. E caminhar por essas ruas é cada vez mais um ato solitário e suscetível aos episódios criminosos. Locais de uso coletivo, sejam de propriedade privada ou pública, têm também se excluído cada vez mais da rua por meio da adoção dos mais variados dispositivos de segurança e controle, sendo o muro a opção mais popular. Em nosso bairro, a Escola Estadual Bernardo Monteiro representa bem essa situação, e seu muro assume uma dupla função: além de controlar o acesso dos alunos, tenta impedir intrusos fora dos horários de funcionamento da escola, isolando a escola da praça que fica logo em frente a ela. OUTRAS POSSIBILIDADES Por outro lado, a relação fragmentada entre escola e espaço público não é unânime no Brasil. Temos como exemplo o CEU (Centro Educacional Unificado), em São Paulo, cujas unidades têm seus edifícios sempre construídos em torno de uma praça pública, e cujas atividades, que incluem até piscinas públicas aos finais de

semana, são abertas à comunidade. Assim, a noção de “invasão” do espaço escolar deixa de existir, e o espaço público penetra a escola e vice-versa. Desta forma, o próprio espaço público se torna um componente educador na formação dos alunos e no dia-a-dia da vizinhança. E o nosso Bernardão começou também a discutir essas possibilidades de maior abertura. Desde o começo do ano, algumas atividades realizadas na escola começaram a experimentar uma maior integração com o Calafate. Em abril, foi realizada uma oficina de fotografia, na qual os alunos estudaram a paisagem do bairro por meio de fotos que exploravam temas como arquitetura, natureza, lazer, comida, reaproveitamento e retratos. Nesse mesmo mês, foi realizado um café da manhã comunitário para o qual os vizinhos trouxeram frutas e bebidas, a escola assou bolos e padarias

o café da manhã comunitário Por Nívea Caroline, aluna do terceiro ano do ensino médio do Bernardão

Criado no município de Sabará, o Bernardão foi transferido para Belo Horizonte em 08 de Junho de 1909, dando início às suas atividades somente com duas salas e dois professores. Com o aumento do bairro, o governador de Minas resolveu aumentar algumas salas e criou o grupo escolar, no dia 5 de Janeiro de 1914. A escola, sentindo a necessidade de fortalecer os vínculos com as pessoas do seu entorno, decidiu fazer no mês de abril deste ano um café comunitário para a comunidade do bairro Calafate — a primeira de muitas ações com esse objetivo. Contou para isso com a articulação e ajuda da Associação de Bairro e seus moradores.

Na ocasião, alunos de arquitetura da UFMG junto com os alunos da escola Bernardo Monteiro fotografaram o bairro. Essa intervenção teve como objetivo interagir com a comunidade, destacar os espaços de interesse cultural no bairro e, ao mesmo tempo, mostrar a força e a beleza da juventude que é educada neste espaço geográfico. Compareceram para o café diversas pessoas, inclusive ex-alunos da escola. Nos corredores era possível ver a alegria e o entusiasmo dessa equipe de trabalho que, juntamente com a comunidade, manifestou o desejo de estreitar os laços sociais e defender a escola como um patrimônio cultural do seu bairro.

locais, com a ajuda da AMAPRAC, forneceram pães e biscoitos. A grande mesa de banquete foi posicionada entre a escola e a praça, atravessando o muro que, geralmente, separa as atividades da escola do restante do bairro. O muro vai continuar sendo tema de outras atividades da escola nesse ano. Primeiro, está prevista para os próximos meses uma oficina de pintura, que vai estampar o muro com texturas desenhadas pelos alunos a partir de desenhos que representam o rompimento desta barreira. Além disso, o muro vai também servir como suporte para atividades de lazer, como a exibição de filmes. Rumo a uma cidade onde exista menos medo e segregação, talvez o primeiro passo não seja usar a marreta, mas sim explorar ao máximo atividades que tornem as barreiras invisíveis e as ruas mais vivas.


FALACALAFATE

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GABINETE DE CURIOSIDADES: poemas sem palavras

Fausto Pena, autor do livro Jornada Sentimenal ao Calafate Atribui-se a Horácio, filósofo e poeta romano, os seguintes dizeres: “Uma pintura é um poema sem palavras”. Escolhi como tema para este artigo imagens do bairro que são testemunhas pictóricas de histórias nele vivenciadas. Cada pessoa fará a sua própria leitura das imagens materializadas e imortalizadas nas telas. Ciente das mudanças ocorridas na nossa Capital e consciente de que não ficaria pedra sobre pedra, solicitei, em 1987, as telas ao amigo e pintor Diógenes Sodré, que é citado às páginas 158 do livro “Jornada Sentimental ao Calafate”. Munido de talento inato para a pintura, Diógenes Sodré armou o cavalete, sentou-se no banquinho, acendeu o primeiro de muitos cigarros e imortalizou as estações ferroviárias que, alguns anos adiante, deixariam de existir fisicamente. Fez o mesmo com a casa do Agente da Estação, até hoje preservada, mantendo as cores originais dos imóveis. Quanto à igreja, a pintura coube à sua aluna Maria de Fátima, sob a supervisão diária do mestre.

tenho lembranças, pois deixou de existir há mais de oitenta anos. Imagino, porém, os antigos calafates (calafetadores) fabricando tonéis e vedando pisos, telhados, janelas etc. Quando olho para a pintura da igreja, vejo surgir o catecismo, missas, primeira comunhão, semana santa com o adro apinhado de gente, barraquinhas, o footing, a paquera, os namoros, casamentos, cine-grátis e outros eventos. Das estações ferroviárias e da casa do agente, aproveito também as informações do Sérvio Túlio, cujo pai foi Chefe da Estação do Calafate, e começo a reviver o “inflamável”, que era um prédio onde se estocava “material perigoso” da Central do Brasil; o antigo curral, onde descarregavam os bois para o matadouro do Carlos Prates; a boiada subindo a Rua Manhumirim, rumo ao matadouro; a “descarga de piche” e coisas mais.

Igreja do Calafate, Maria de Fátima

Tenho certeza que o leitor acrescentará outras lembranças ao esquadrinhar aquelas pinturas com o olhar saudoso dos tempos idos, que não voltam mais.

A minha leitura dessas obras não será muito diferente da que farão meus contemporâneos do bairro. Da velha capela não

Estação do Calafate, Diógenes Sodré

Casa do Agente da Estação, Diógenes Sodré

como eram os BAILINHOS DO CALAFATE? A cena noturna do bairro Calafate se transformou bastante ao longo das últimas décadas. Hoje movimentada por bares localizados principalmente nas ruas Platina e Turquesa, anteriormente contava com festas distribuídas pelo espaço do bairro. Populares nas décadas de 60 e 70 e organizados pelas turmas de amigos que cresceram ali, os bailinhos, também conhecidos como horas dançantes, eram uma constante na programação dos fins de semana daqueles jovens calafateiros. Ao som da Jovem Guarda e do Rock, as bebidas mais frequentes eram a boa e velha cerveja, o ponche e também a cuba libre, drink de muito sucesso na época. Qualquer motivo, fosse ele um aniversário ou a aquisição de uma radiola por um dos integrantes da turma, era um bom motivo para reunir os amigos. Fausto Pena, antigo morador do bairro nos conta que “normalmente, o evento ocorria na sala de estar das residências do bairro. Como aquele espaço em geral não era muito grande,

cumpria-se um ritual: a mesa era afastada para um canto e as cadeiras colocadas na varanda, surgindo daí a pista de dança. O piso tinha que ficar brilhando para a turma de pés-de-valsa se esbaldar.” Já a turma de José Lauro, antigo morador da rua Calcedônia, além de frequentar os bailinhos nos quintais e varandas das casas, era protagonista nos bailes das Igreja São José do Calafate. Após a missa da juventude, ali mesmo, no Salão Paroquial, Chiquinho tocava guitarra, Danilo tocava saxofone e Maurício, com a bateria, conduzia a banda que animava os bailinhos. Outra peculiaridade da turma de José Lauro que trazia vida às ruas no período da noite eram as serenatas ofertadas por eles às garotas vizinhas.­ “Em cada casa que a gente passava, era deixada uma rosa na janela da menina para quem a gente estivesse fazendo a serenata. Essa rosa não era comprada, era roubada das casas da região. Nessa época, todas as casas tinham jardins na frente, os muros eram baixinhos.

Então a gente entrava rapidinho, pegava uma rosa e saía sem problema nenhum.” Ainda nas redondezas, porém embalados por um ritmo diferente, havia também os bailinhos ofertados pela Banda Carlos Gomes. A mais antiga banda de Belo Horizonte – mais antiga até do que a própria cidade – sediou, entre as décadas de 1970 e 1980, apresentações de chorinho. “A nossa proposta era seguir o nosso estilo, manter a tradição do chorinho, da valsa, da música tradicional mesmo. Aquela que traduz o que a pessoa tem no coração. E com esse propósito, na época, a casa lotava. Tinha dia que a pessoa chegava na porta e não entrava. Todo sábado nós tínhamos os nossos bailes até que chegou a uma situação de não comportar todas as pessoas aqui dentro. A gente instalava mesas e cadeiras, mas grande parte ficava em pé mesmo”, relembra o maestro Belmiro. De lá pra cá, à medida em que os anos passaram, o bairro se adensou e a vizi-

nhança cresceu juntamente com a altura dos muros de divisa das casas. A relação de vizinhança já não era tão familiar, o que resultou num aumento da sensação de insegurança. O som do chorinho não foi bem aceito pelos novos moradores e teve que acabar. Assim, teve fim toda sorte de bailinhos que ali aconteciam. Hoje, o destino de grande parte dos jovens moradores são os diversos bares e restaurantes da região. Aline, atual moradora da rua Alterosa considera um ponto muito positivo a grande presença desses estabelecimentos: “os bares são bem distribuídos no bairro, todo dia tem evento de inauguração de um novo. Abriram muitos restaurantes de comida japonesa por aqui, por exemplo”. Com clientes da região e de vários outros cantos da cidade, eles mantém acesa a vida noturna dos bairros Calafate e Prado.


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GUI A DA RUA

dr. thomaz muzzi

Sejam serviços, histórias ou curiosidades, a cada nova edição vamos contar o que as ruas do nosso bairro têm a oferecer.

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A Igreja São José Calafate sempre foi uma importante referência para os moradores do bairro. Nos anos 1950 e 1960, os frequentadores da igreja se encontravam após as missas para ir aos cinemas ou aos bailinhos. Atualmente, ela continua funcionando como um ponto de encontro. Grande parte da vizinhança se conhece através da igreja onde, além das missas, são organizados festivais de comida, festas juninas e almoços comunitários. 3 A Sociedade Musical Carlos Gomes teve sua origem antes mesmo da inauguração da capital mineira. Já teve sua sede em diversos lugares em Belo Horizonte, mas, desde que chegou a no Calafate, ocupa o segundo andar da casa de número 57 desta rua. Antigo palco de shows de chorinho nas décadas de 1970 e 1980, hoje o local abriga os ensaios da Banda e oferece aulas de diversos instrumentos musicais. 4 ”O prédio foi embargado porque afundou. Essa região aqui era um

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A praça Inácio Fonseca, mais conhecida como praça da Igreja, é um ponto muito importante do bairro. Ela concentra taxistas, caminhões de mudança, e, nas terças e quintas-feiras à noite, ela é o local onde se concentra um grande número de ciclistas. O grupo, liderado por Sérgio, dono da Platina Bikes, sai da praça e vai até a região da Pampulha.

brejo, então tem água debaixo desse bairro todo, tem mina por todos os lados. Aí, o que aconteceu foi que eles não aterraram direito a parte de trás, não fizeram a drenagem e ai afundou. Embargaram pra não ocorrer rachaduras, se já não tiver acontecido! Ele está abandonado tem uns dois anos”, disse Aline, moradora da Rua Alterosa. 5 Todos os dias, de 18h até a meia noite, o portão vermelho da casa de esquina se abre para dar lugar a um restaurante de comida japonesa, o BH JAPA.

6 E a moradora Aline nos ajuda mais

uma vez: “O povo penou pra fazer todos esse prédios. Por causa da água subterrânea, né? Tem que fazer as fundações muito profundas, é bem complicado! Esse prédio da esquina, por exemplo, eles pagaram até caro pelo lote na época, aí viram que era uma coisa fora do comum porque essa rua inteira virou um canteiro de obras e cada hora que eles cavacavam faziam mais buracos, a calçada cedeu, o poste caiu… Foi uma luta pra ele ficar em pé!” 7 A grande árvore da Praça Padre Rabelo faz sombra em quase toda sua área. Ela recebe ocasionalmente a visita de Seu Adão (pg. 6), um antigo morador que reside nas vizinhanças e leva seu passarinho na gaiola para passear por ali.

o baile da BANDA A Sociedade Musical Carlos Gomes é a banda mais antiga da cidade. Um ano mais velha que Belo Horizonte, seus primeiros músicos trabalharam na construção da capital. Famosa na década de 70 por suas apresentações de chorinho, hoje ela está impossibilitada de realizá-los. Para que as apresentações voltem a acontecer, ela precisa de sua ajuda para a construção de uma escada que funcionará como saída de emergência, adaptando sua sede atual para a volta dos bailinhos ao bairro Calafate. Para viabilizar essa reforma, um plano de financiamento coletivo está sendo articulado. O sistema proposto funciona da seguinte maneira: a Banda venderá “tickets” de diferentes preços para os apoiadores do projeto. Esses tickets, adquiridos por pessoas que queiram ajudar a financiar o projeto, serão trocados na sede da Banda por brindes de acordo com o seu valor: com R$20,00 a pessoa ganha uma faixa bordada com seu nome para ser amarrada no guarda corpo da escada,

com R$30,00 ganha-se a faixa e um CD da Banda, por R$40,00 adquire-se a faixa e um pôster da Banda, pelo valor de R$50,00 compra-se a faixa e uma camisa da Banda e, por último, ao apoiar a banda com R$100,00 obtem-se a faixa e aulas ministradas pelo professor Vanildo de um instrumento a sua escolha. Além da faixa, todos os tickets valem também como ingresso para o Baile da Banda. Esses valores foram calculados de modo a pagar o valor dos brindes e ainda ter uma margem de lucro para financiar o projeto. Ao mesmo tempo que esse plano de financiamento coletivo ajuda a conseguir fundos para a realização da reforma, seus brindes, além de servirem como um incentivo para que as pessoas contribuam e se sintam parte do projeto, servem como uma forma de divulgar a Banda para além dos muros de sua sede. Para saber como adquirir seu ticket e ser um colaborador, é só dar uma passada na sede da banda, logo ali na Rua Thomaz Muzzi!

Projeto da escada de emergência que viabilizará a volta dos bailes


FALACALAFATE

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C

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A CA SA DO BA I RRO um novo espaço para a comunidade do calafate

AFICH AL

Já imaginou se o Calafate tivesse um espaço comunitário que pertencesse a todos do bairro? O que você gostaria que acontecesse nele? No dia 24 de outubro, aconteceu na Praça Carlos Marques um evento que promoveu o debate a respeito da possibilidade de existir um espaço comunitário no bairro. Batizado de Dia Do Suco, a atividade reuniu moradores e frequentadores assíduos do bairro na saída da Escola Estadual Bernardo Monteiro. Ao longo da manhã, sucos naturais eram feitos na hora a partir das mais variadas combinações de frutas compradas no sacolão da Rua Platina. Mas não era por dinheiro que se trocavam os sucos. Para se refrescar naquela manhã, os transeuntes tinham que fazer uma colagem que representasse ideias de atividades para um futuro espaço comunitário no bairro ou depositar ideias para a Praça Carlos Marques. Uma vez feitas as contribuições, os participantes ganhavam uma Calaficha que podia ser trocada por qualquer um dos refrescantes sabores disponíveis. O espaço para a Casa do Bairro, em si, ainda não existe, mas a busca continua. E não se busca somente o lugar, mas também ideias de atividades que, inclusive, já podem começar a ser ensaiadas. Afinal, não é difícil escutar nossos vizinhos reclamarem que a praça precisava de mais movimento e de atividades frequentes. E você? Conhece algum lugar para abrigar a Casa do Bairro? Quer sugerir atividades para acontecer lá? Envie-nos um e-mail compartilhando suas ideias!

s a t i rece o r r i a do b 1. C

No livro Jornada Sentimental ao Calafate, Fausto Pena revisita o Calafate dos anos cinquenta e sessenta, relembrando uma paisagem cotidiana composta por pequenos hábitos e grande afeto. É nesse livro que ele nos conta sobre o Bar do Jorge Aramuni, que durante muito tempo funcionou na Rua Platina, perto da Igreja São José do Calafate, servindo o tradicional Caol - preparado com couve, arroz, ovo e linguiça. Por mais que tenha sido criado no

Nossa equipe saiu pelo bairro em busca deste saboroso prato e, para nossa surpresa, não conseguiu encontrar bares que ainda o preparam. A última esperança foi a Lanchonete e Sorveteria do Flávio, na Rua Oeste, que, apesar de ainda manter o

arroz

anúncio do Caol impresso na entrada, já não serve o prato há algum tempo. Por que será que este prato, que já acompanhou tantas noites boêmias Platina adentro, é hoje tão difícil de encontrar no bairro? Quem sabe não nos juntamos para prepará-lo para a festa de lançamento de nossa próxima edição do nosso jornal?

4. L

3. O

2. A couve

tradicional Café Palhares, que o nomeou Kaol com “K”, no centro da cidade, a versão do prato do Calafate já foi muitas vezes descrita como insuperável.

ovo

linguiça


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E U Q O O N A T L FA O R R I BA A D N AGE TE A F A CAL

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Para Camila, 29, pipoqueira da estação de metrô Calafate, o bairro precisa de uma creche. Moradora do Calafate desde que nasceu, não encontra um transporte escolar que faça o trajeto até a creche de sua filha, que a pé dura 40 minutos e atrapalha Camila a trabalhar. “No bairro, só tem particular, então quem tem menos condições financeiras tem que se deslocar até as creches dos bairros vizinhos, e isso toma muito tempo”.

Petrônio, 78, diz faltar transporte coletivo de qualidade, como um dia já houve. Segundo ele, nos tempos em que o bonde descia a Rua Platina, chegando do centro da cidade, o transporte tinha preço mais acessível e hoje, além de o preço ser mais alto, o transporte público parece estar sempre lotado.

Larissa, 17, cresceu no Prado mas passa a maior parte de seus finais de semana na Savassi. Segundo ela, apesar de nossa região abrigar muitos bares, alguns conhecidos em toda a cidade, estamos carentes de opções de lazer noturnas que ofereçam música e ambiente alternativos.

PEDAL NOTURNO

BAZAR DA PECHINCHA

100 ANOS DO BERNARDÃO

Todas as terças e quintas, Sérgio Luís, da loja Platina Bikes, organiza uma pedalada noturna com cerca de 40 ciclistas. A concentração acontece às 20h, na Praça Inácio Fonseca (da Igreja São José), e o passeio explora a noite de Belo Horizonte em cima de duas rodas. São oferecidos aluguéis de bikes para o evento.

No terceiro domingo de cada mês, a Associação de Caridade da Igreja São José organiza um bazar de roupas usadas a preços baixos. O foco é em roupas, mas às vezes se consegue também encontrar objetos que, apesar de antigos, ainda funcionam e podem ser muito utéis, como câmeras fotográficas analógicas e móveis domésticos.

A Escola Estadual Bernardo Monteiro, localizada na Praça Carlos Marques desde janeiro de 1914, já passou por muitas transformações e sua arquitetura atual quase não manteve traços do edifício antigo da foto acima, de 1920. Para relembrar sua história e celebrar o seu presente, o Bernardão convida para seu centenário, que será celebrado no dia 22 de Novembro.


FALACALAFATE

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Dona Maria

gente nossa -------------

A Avenida Guaratan era apenas barro e capim quando Dona Maria se mudou para sua atual casa em frente à estação Calafate. Quem passava por ali tinha que dobrar os capins no chão para não pisar no barro, resultado do esgoto das casas da Rua Platina, que corria por baixo das linhas da Central e desembocava direto no ribeirão Arrudas. - Aí meu marido arrumou aguapé e plantou. Mas ficou bonito, menino, você precisa de ver! Ainda mais quando os aguapés davam flor. Era uma flor lilás, linda! Aí ficavam aquelas folhas verdinhas, tudo no meio da sujeira. Meu marido adorava plantar, dava gosto de ver. Mas não era só o marido que apreciava o verde. Dona Maria, que veio da roça, tomou gosto desde cedo pelo cultivo, e contagiou também seus filhos e netos. Basta

IMAGINA NO CALAFATE!

COLABORE!

olhar para os arredores de sua casa para perceber a enorme variedade de árvores e plantas que compõem um pequeno oásis em meio à aridez da Avenida Guaratan. Ipês, jambo, café, manjericão, cebolinha, manga e abacate são apenas uma amostra do que encontramos no jardim da calçada de Dona Maria, iniciado porque já não havia mais espaço para plantar dentro de casa. E o jardim foi ficando tão bonito que até os vizinhos mais próximos adotaram a ideia: em poucos anos, a vegetação, antes restrita à calçada de Dona Maria, se espalhou para todas as casas ao redor. Atualmente, Dona Maria também está comprometida com o restante da área do metrô. Todas as manhãs ela enche metade do regador - para não ficar muito pesado - e faz várias viagens para dar conta de toda extensão da avenida, que agora

também virou seu jardim. - Aquelas árvores do outro lado da rua, no muro do metrô, tudo fui eu que plantei. Os pés de manga, abacate… Plantar para os passarinhos come-rem e para os netos também, não é? O muro do metrô quase desaparece em meio aos três pés de manga, um de jambo, uma castanheira mais conhecida como sete copas e um pé de abacate, todos plantados por Dona Maria. - Se tivesse espaço eu plantava mais ainda! Eu estou com uma muda de acácia amarela pra plantar, que trouxe de uma casa em frente ao colégio Piedade, mas não tem lugar para ela. Vou ver onde eu vou enfiar ela ali na frente! Se não fosse o asfalto aí eu ia plantando no meio da rua afora! Ia fazer uma floresta!

como seria se a floresta de dona maria virasse realidade?

FALACALAFATE Estamos em busca de colaboradores para o FALACALAFATE! Se você tem boas histórias para contar, fotos que queria compartilhar ou ideias para as ruas do bairro, envie-nos um e-mail com suas sugestões e contribuições. Esse é um jornal de todos e para todos do bairro. fala@bairrocalafate.org


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