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Não tem rebocadores? E agora?
Henk Hensen FNI
Manobras regulares e saídas em emergência
Nos anos 1960, o porta-aviões holandês Karel Doorman escalou no porto de Fremantle, o que demandou manobra de giro com assistência de rebocadores. Havia, no entanto, um problema − os rebocadores estavam em greve. As aeronaves foram peadas ao convés de voo, e o navio foi girado e trazido ao berço empregando os motores das aeronaves como “propulsores”. Naturalmente, essa não é uma opção para a maioria dos navios que esperam manobrar com rebocadores e descobrem que não há nenhum disponível, seja por quebra, emergência, conflito político ou qualquer outro motivo. Outras opções, porém, podem ser viáveis, dependendo da situação e da experiência e confiança do comandante.
Em todos os casos, é necessária a presença de práticos experientes, embora, no caso de uma emergência real, possa vir a ser preciso deixar o porto sem um.
Apesar de não haver limitações quanto ao comprimento de navio, de um ponto de vista prático este artigo considera um comprimento máximo de cerca de 225m, a menos que seja especificado algo diferente. A praticabilidade da manobra dependerá obviamente do traçado do porto e das condições ambientais − um navio de 225m pode ser considerado muito grande em alguns portos e relativamente pequeno em outros.
Aviso
Da mesma forma que os portos diferem, também serão diversificadas a construção de atracadouros e a disposição de defensas. Em um mesmo porto, as manobras abordadas adiante poderão ser possíveis em um berço ou terminal, mas não em outro, devido a esses fatores, capazes de avariar o navio. Guindastes que possam atrapalhar as manobras devem ser removidos a tempo.
Além disso, as condições de manobrabilidade devem ser plenas, o que significa inexistência de limitações ao emprego de máquinas ou bow/stern thrusters. Hoje em dia, com o aumento da automação no funcionamento dos motores, mais da metade dos navios têm limitações no emprego da máquina, mesmo no que diz respeito a manobras no porto. Esse é um problema sério e crescente.
Intensidade e direção do vento são fatores cruciais em todas essas situações. Os ventos que incidem na direção do cais são os mais problemáticos, sua intensidade deve ser zero ou mínima no caso de navios sensíveis ao vento. Ventos de outras direções, contudo, podem ajudar na manobra. É importante, portanto, dar uma boa observada no vento e em suas consequências.
Caso não haja rebocadores maiores disponíveis, navios graneleiros carregados podem ser manobrados com sucesso empregando rebocadores de potência inferior à daqueles que normalmente seriam empregados, apenas demorando algum tempo a mais. Isso pode ser expresso pela fórmula
F = m x a em que 'F' é a força do rebocador, 'm' a massa do navio, e 'a' a aceleração. Quanto menor a força do rebocador, menor será a aceleração/desaceleração para uma correção de rumo ou redução de velocidade, por exemplo. Navios afetados pelo vento só devem ser manobrados quando a força do vento estiver abaixo da soma das forças dos rebocadores disponíveis.
Considera Es Para Quando N O Houver Disponibilidade De Rebocadores
Algumas vezes, pode não haver rebocadores disponíveis devido a quebra ou greve. Navios maiores, equipados com bow thrusters, mas que usualmente empregam rebocadores, podem ainda conseguir chegar e sair empregando os métodos discutidos adiante.
Do ponto de vista da Autoridade Portuária, recomenda-se que sejam tomadas medidas apropriadas de modo a remover quaisquer possíveis dificuldades que possam afetar navios atracando e desatracando. A chegada e a saída de qualquer navio que habitualmente utilize rebocadores deve ser discutida por comandante, prático e Autoridades Portuárias, a fim de determinar quais manobras serão possíveis e sob quais condições.
Os pontos a considerar com atenção incluem, embora não se limitem a: 1. informação ao controle de tráfego do porto.
2. vento e corrente favoráveis.
3. boa visibilidade.
4. navegação diurna e/ou noturna.
5. planejamento adequado do tráfego de outras embarcações.
6. ausência de obstruções por material de dragagem, embarcações de sondagem etc.
7. autorização para uso do ferro.
8. berço livre em comprimento suficiente.
9. berço livre de guindastes.
10. portainers levantados.
11. disponibilidade de amarradores e de botes de amarração.
12. condições dos arranjos para atracação, cunhos, cabeços e espias.
Em muitos casos, o ferro − o “rebocador de emergência” − poderá ser de muita utilidade para girar, atracar ou desatracar sem propulsores laterais, mesmo navios um tanto grandes. Geralmente, apenas uma manilha é o suficiente para girar ou atracar, atuando eficazmente com um ferro que garra. Por exemplo, na antiga fábrica de alumínio da Suralco, no Rio Suriname, graneleiros de cerca de 200metros de comprimento giravam em torno do ferro no rio relativamente pequeno e atracavam por bombordo no terminal sem assistência de rebocadores.
CHEGADA: ENTRADA DE POPA NA BACIA DE MANOBRA
Navios com bons bow thrusters (ver página seguinte), como muitos porta-contêineres, podem facilmente entrar na bacia de manobra. No entanto, manobrar de popa, conforme mostrado na Figura 1, adiante, tem muitas vantagens. Com velocidade de cerca de 4 nós, o navio manobra de popa em direção ao berço, governado pelo bow thruster
Ao se aproximar do berço, dá-se máquina adiante com leme todo a bombordo e bow thruster para boreste. O navio pode, então, ser manobrado para atracar de forma que se aproxime e atraque em paralelo ao berço, com baixa velocidade de aproximação.
Breve Guia Para Propulsores Laterais
Propulsores laterais podem melhorar consideravelmente a manobra do navio – é essencial, porém, que eles sejam corretamente instalados e utilizados.
Existem diversos tipos de propulsores no mercado. Os utilizados em navios mercantes podem ser movidos a eletricidade, força hidráulica ou a diesel, embutidos, com hélices de passo fixo ou variável. Os mais comuns são os elétricos, com passo variável –controllable pitch propeller (CPP)
Algumas questões principais que colocaremos incluem:
• por que o mesmo tipo de propulsor lateral funciona melhor em um navio do que em outro?
• por que o bow thruster perde eficiência tão rapidamente com o aumento da velocidade a vante?
• por que o bow thruster funciona muito melhor quando o navio tem seguimento a ré?
• e quanto a um stern thruster?
Projeto E Instala O
Ao projetar e instalar um propulsor lateral, o ideal é que:
• a parte superior do bow thruster fique ao menos de meia a uma vez o diâmetro do propulsor abaixo da superfície da água;
• a distância da parte mais inferior do túnel à quilha deve ser ao menos igual ao diâmetro do bow thruster;
• o costado do navio próximo à entrada do túnel deve ser tão paralelo quanto possível, tanto vertical quanto longitudinalmente – de preferência não em forma de V;
• o comprimento do túnel deve ser de duas a três vezes o seu diâmetro; mais do que isso, se o túnel for em forma de V;
• o hélice deve estar localizado no meio do túnel – ou ele funcionará perceptivelmente melhor para um bordo do que para o outro;
• a entrada/saída do túnel deve ser bem arredondada ou chanfrada para evitar vórtices, que podem causar perda considerável de eficiência;
• muitos túneis têm aberturas em forma de ‘concha’ com chanfros mais acentuados a ré do túnel, para reduzir a resistência quando da navegação – essas aberturas dirigirão o fluxo da água adequadamente para dentro do túnel quando o navio estiver se movendo a ré;
• grades de proteção em frente à entrada/saída do túnel devem ser construídas de modo a diminuir a resistência na entrada do túnel quando o navio estiver em movimento, porém interferindo o mínimo possível no fluxo de entrada da água quando o propulsor estiver em uso;
• stern thrusters geralmente têm menos potência do que bow thrusters
Se esses requisitos não forem atendidos, um bow thruster poderá apresentar desempenho inferior ao de outro de igual potência, instalado em um navio em que esses requisitos tenham sido observados.
Navio Com Seguimento A Vante
Um bow thruster perde muita eficiência quando o navio ganha seguimento a vante. Em geral, a eficiência do propulsor diminui cerca de 50% a 2 nós, com desempenho mínimo a 5 nós.
A Figura 1A mostra um navio com seguimento a vante, com o bow thruster para boreste. O bow thruster cria um fluxo de água para dentro e para fora do túnel. A figura mostra as áreas de baixa e alta pressão daí resultantes.
Segundo a Lei de Bernoulli, um aumento na velocidade da água resulta em diminuição na pressão da água, e vice-versa. O fluxo acelerado de água para fora do propulsor gera um campo de baixa pressão ao longo do costado de bombordo a vante. Enquanto o bow thruster tenta mover a proa para boreste, essa área de baixa pressão opera em direção oposta, contrapondo-se a ele.
Quanto maior a velocidade do navio, mais de perto o fluxo da água seguirá seu casco. A uma certa velocidade (relativamente alta), o fluxo poderá seguir todo o comprimento do navio, criando um campo de baixa pressão ao longo de todo seu costado. Isso não neutralizará a ação do bow thruster
A distribuição do campo de baixa pressão ao longo do costado do navio afetará o desempenho do bow thruster para girar o navio, dependendo da velocidade, do calado, do trim e da folga abaixo da quilha. Em alta velocidade, poderá até contribuir para o desempenho de giro do bow thruster
Alguns navios têm um túnel antissucção a ré do bow thruster ou entre dois bow thrusters. Esse túnel conecta os campos de pressão em ambos os bordos, reduzindo a diferença de pressão bem como o efeito negativo exercido pelo grande campo de baixa pressão sobre a eficiência do bow thruster
Ao iniciar um giro, outro efeito neutralizador em atuação também faz com que o desempenho do bow thruster diminua com o aumento da velocidade a vante – conforme mostrado na Figura 1B.
O bow thruster é posto para boreste e gera a força b. Essa força b cria um momento de giro a-b, juntamente com uma força lateral (ver seta vermelha). O momento de giro a-b tenta rotar o navio para boreste.
A força lateral tenta mover o navio para boreste. Isso é contrariado pela força hidrodinâmica centrada a vante (ver marcas+), que tentará girar o navio para bombordo. Essa força hidrodinâmica aumenta com a velocidade.
O resultado é que, quando o bow thruster de um navio com seguimento a vante é posto para boreste, simultaneamente:
• desenvolve-se um campo de pressão negativa, que se opõe à atuação do bow thruster;
• a força hidrodinâmica centrada na proa opõe-se à atuação do bow thruster
Ambos os efeitos aumentam com a velocidade do navio. Como consequência, o efeito do bow thruster diminui rapidamente com o aumento da velocidade.
NAVIO MOVENDO-SE A RÉ
Quando em movimento a ré, o bow thruster funciona perfeitamente!
Olhando novamente a Figura 1A, quando o bow thruster é acionado para mover a proa, e o navio está se movendo a ré, o campo de baixa pressão criado fora do túnel pelo fluxo não será direcionado ao longo do costado do navio. Consequentemente, não afetará o desempenho do bow thruster
Outro efeito importante do movimento a ré é que a água próxima ao casco é arrastada junto a ele por fricção e, portanto, sugada mais facilmente pela abertura do túnel, mesmo a velocidades mais altas.
A força hidrodinâmica que atua lateralmente sobre o navio (seta vermelha, Figura 1B) deslocou-se para a parte de ré do navio e tenderá, nesse caso, a girar o navio para boreste, contribuindo para o funcionamento do bow thruster
Stern Thruster
força do bow thruster
O stern thruster geralmente tem menos potência do que o bow thruster. Toda essa teoria se aplica também a um stern thruster, porém sua localização torna mais difícil atender aos requisitos de construção. O stern thruster pode ainda perder eficiência quando se dá máquina atrás devido à esteira do hélice do navio.
Todos esses fatores significam que a eficiência de um stern thruster será baixa.
A vantagem dessa manobra é que o navio pode ser facilmente manobrado pelo bow thruster e pode ser parado imediatamente pela máquina; caso necessário, a máquina pode também ser usada a vante, combinada com o leme, a fim de levar a popa para a direção desejada.
Em alguns poucos navios com hélice de passo variável, pode ser difícil parar com seguimento a ré. Caso se tenha conhecimento desse problema, ele poderá ser evitado dando-se máquina adiante antecipadamente.
Essa manobra de aproximação pode ser realizada desde que os ventos sejam favoráveis e que não haja correntes.
ESTUDO DE CASO: VENTOS FORTES
Em caso de ventos fortes na direção do cais, poderá ser necessário governar com um grande ângulo para compensar a deriva. A Figura 2 mostra um navio feeder de cerca de 120m de comprimento com contêineres empilhados a três alturas no convés. A máquina principal tem 8.000HP (6.000kW) e o bow thruster , 500HP (aproximadamente 380kW). Sopra um vento pelo través de força aproximadamente 6 na escala Beaufort.
O navio está manobrando de popa para entrar na bacia de manobra do porto com máquina devagar atrás, cerca de 1.000HP (745kW). O efeito transversal do hélice de passo fixo direito pode ser de cerca de 10%, o que representa uma tonelada.
Para governar com um ângulo que compense a deriva, o bow thruster é posto para bombordo com meia força, o que representa de duas a três toneladas de força. Temos, então, uma força de 1 + 2,5 = 3,5 toneladas atuando pelo través do navio em direção à terra. Considerando um vento pelo través de força 6 na escala Beaufort (12m/s), teremos uma força adicional de cerca de 15 toneladas. No total, 18,5 toneladas atuam em direção ao lado de terra, o que exige que se governe com um grande ângulo. A uma certa força de vento − dependendo do porte, potência e área vélica do navio − o ângulo de deriva necessário poderá ser tão grande que inviabilize a manobra.
Sa Da Com Espringue De Vante E Bow Thruster
A Figura 3 mostra um método para desatracar de um berço empregando um espringue de vante. Esse método pode vir a ser necessário para navios menores, quando atracados a ré de um navio grande, por exemplo.
Todos os cabos são largados, menos o espringue de vante. O bow thruster é posto para o lado oposto ao cais − nesse caso, para boreste −, e a máquina em muito devagar adiante, com leme a bombordo. Caso seja bem regulado, o navio ficará paralelo ao berço. Isso ocorrendo e estando o navio com distância suficiente do berço, a máquina poderá ser parada, o espringue largado, e o bow thruster mantido para boreste. O navio girará então em torno do ponto vermelho, na popa.
Uma vez que sua proa esteja suficientemente fora para passar pela embarcação que está a vante, o navio que desatracou poderá sair. Essa manobra requer um bom espringue com alguma flexibilidade, para evitar picos de esforço, e uma partida da máquina com calma em muito devagar adiante.
SAÍDA – NAVIOS GRANDES COM BOW THRUSTER
À primeira vista, pode parecer que trabalhar com o ponto pivô seria um bom método para desatracar do berço sem rebocadores − ver Figura 4. No entanto, saiba que esse método não funciona para saídas de cais sólido ou fechado.
Figura 4: Utilizando o ponto pivô para desatracar (não se deve usar em cais sólido ou fechado)
Em situações em que seja viável, todos os cabos são largados, exceto o espringue de vante. A proa é trazida para o cais (no caso, para boreste) pelo bow thruster. O centro de giro é a bochecha do navio, apoiada no cais – o ponto vermelho a vante. Quando a proa tiver girado suficientemente para boreste, o espringue de vante pode ser largado, e o bow thruster posto para bombordo. O navio girará então em torno do ponto indicado com um círculo vermelho em sua popa. Quando a proa tiver girado suficientemente para longe, o navio poderá zarpar.
A razão mais provável pela qual isso não funciona para saída de um cais sólido ou fechado é que, à medida que a proa se move para longe do atracadouro, a água flui ao longo do casco do navio, preenchendo a lacuna criada pela proa que se move para fora. Esse fluxo de água cria uma zona de baixa pressão, em consequência do que o casco do navio é empurrado novamente em direção ao cais.
O que funciona nessa situação é dar máquina devagar atrás e pôr o bow thruster com toda força para bombordo, uma vez que o navio esteja na posição 2.
Devido ao efeito transversal do hélice e do bow thruster, o navio girará para bombordo e se afastará do cais. Quando a velocidade a ré for de 1 a 2 nós, poderá ser dada máquina adiante com o bow thruster para bombordo pelo tempo necessário. O navio poderá então zarpar. Se, por alguma razão, a popa chegar muito perto do cais, pode ser dado leme a boreste. Tenha em mente que essa manobra só pode ser efetuada com segurança com um navio com hélice de passo direito atracado por boreste.
A manobra de saída mostrada na Figura 4 pode também ser empregada quando um navio porta-contêineres tiver que sair de popa de um berço do porto – Figura 5. Novamente, essa manobra só pode ser efetuada com segurança com um navio com hélice de passo direito atracado por boreste. Quando a proa tiver sido suficientemente empurrada para o cais, o espringue poderá ser largado e dada máquina a ré.
Figura 5: Empregando o espringue para sair de popa de um berço Devido ao hélice de passo direito, o navio poderá girar para boreste. Se necessário, utilize o bow thruster para compensar.