Terceiro debate

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Revista do 3ยบ EM - maio de 2015


Expediente:

Arte:

Gabriel Sanchez Jade Dangel Luisa Tucat Pedro Mariano Rafael Barbosa

Edição:

Caiuá Ortiz Flora Kountouriotis Victoria Travitzki

Pesquisa: Isabella Farah Katharine Prado Laura Costa Luiza Politi Luiza Guizzo Maria Fernanda Pedro André Vitória Bacelar

Editorial: A discussão sobre a redução da maioridade penal tem sido uma das principais pautas debatidas no Congresso Brasileiro e, se aprovada, afetará diretamente a sociedade e, sobretudo, os jovens. A PEC 171\1993, de autoria do parlamentar Marcos Rogério (PDT-RO), sugere que seja reduzida a idade permitida de aprisionamento de um jovem, de 18 para 16 anos. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou, no último dia 31 de março, o primeiro passo para o andamento da proposta na Casa, em que os deputados avaliaram que o texto não fere a Constituição. O placar da votação foi de 42 deputados favoráveis e 17 contrários. A proposta, agora, será analisada pela CCJ do Senado e depois votada no Plenário. A população está dividida. Boa parte acredita que a medida será a solução para o fim da violência no país, enquanto o outro lado alega que sua aprovação trará graves consequências. Engajados nesse debate, nós, alunos do 3º ano do Ensino Médio da Cooperativa Educacional de Ubatuba, preparamos este especial, trazendo uma coletânea de dados e opiniões para contribuir com a circulação da informação e a construção de um posicionamento perante essa delicada questão.

Escolhemos o nome Terceiro Debate por sua ambiguidade. Assuntos debatidos na imprensa e em casa encontram, na escola, um espaço privilegiado para a continuação dos debates; portanto, vem daí a sugestão de que na Cooperativa ocorreria um ´Terceiro Debate´. E também tem o fato de ser o Terceiro Ano quem debate. 2

Equipe de Edição maio de 2015 3


Redução da maioridade penal Por que dizer sim?

Por que dizer não?

Os joven s" consciên de hoje" têm cia podem se de que não r como ad presos e punidos ultos. Po r is a comete r crimes so continuam

de O índice ia nas c reincidên 70% de prisões é Educar é ma is eficiente do que pun ir

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Fonte: G1 Ilustração: Luisa Tucat

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nal ade pe d i r o i a am Reduzir efeito não a o é tratar causa

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A favor da redução Dados:

Por que sim? Fizemos uma pesquisa virtual em sites da imprensa e nas redes sociais, a fim de selecionar os principais argumentos usados por quem é a favor da redução da maioridade penal. Eis o que dizem:

“Se tem idade para ser bandido, tem idade para estar na cadeia”

“Julgar pela condição econômica ou escolaridade é preconceito, pois nem todos os jovens carentes e pobres são criminosos”

“Instituições que acolhem menores infratores não conseguem ressocializar seus detentos, que saem das instituições e vão para as cadeias quando adultos”

“Não é justo uma pessoa ter direito de tirar a vida de outra e não ser punida por isso, porque é menor de idade e não sabe o que está fazendo” “Proteger o menor da prisão leva a seu recrutamento ao crime”

“A impunidade é a mola propulsora da violência. Os jovens de hoje sabem que não podem ser presos e punidos como adultos”

Ao todo, 87% dos brasileiros são favoráveis à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, segundo pesquisa do Datafolha divulgada no mês de abril. Ainda segundo o Datafolha, a maior aprovação à proposta de reduzir a maioridade está nas regiões

centro-oeste (93%) e norte (91%) do país. Na comissão da Câmara que analisa o tema, 14 dos 27 deputados defendem a redução para jovens de 16 e 17 anos que cometerem crimes hediondos, como homicídio qualificado, latrocínio, estupro e sequestro.

No Brasil menor pode: - Roubar - Matar - Estuprar - Se prostituir

- Formar Quadrilha - Agredir os pais - Agredir professores - Votar

No Brasil menor não pode: - Trabalhar - Responder pelos - Levar palmadinha próprios crimes

“A legislação que deveria defender o menor faz exatamente o contrário, coloca-o à mercê da rede do crime para servi-la, assumindo a autoria de crimes que não cometeu”

“A redução da maioridade penal iria proteger os jovens do aliciamento feito pelo crime organizado, que tem recrutado menores de 18 anos para atividades relacionadas, sobretudo, ao tráfico de drogas” 6

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Quadro reproduz uma visão compartilhada em redes sociais


Contra a redução

Por que não?

O jovem delinquente não surge espontaneamente, ele é fruto de uma sociedade desigual, que historicamente exclui boa parte da população

“R e d u z i r

Primeiramente, pode-se dizer que esse projeto de lei seja inconstitucional, por ferir uma cláusula pétrea da Constituição Federal, que garante o direito à liberdade de toda criança e adolescente. Portanto, não deveria ser motivo de deliberação por parte do Poder Legislativo. Ao contrário do que vários meios de comunicação têm divulgado, fixar a maioridade penal em 18 anos é uma tendência mundial. Diversos órgãos internacionais, como a ONU, repreenderam o projeto em votação no Brasil. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) já prevê uma série de medidas para jovens infratores. Elas são: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, que devem ser aplicadas de acordo com a gravidade do delito e a capacidade do jovem de cumprilas. Essas medidas, porém, muitas vezes não são aplicadas e, se são, acabam por prejudicar o jovem, já que o sistema das instituições de reeducação não funciona corretamente. Portanto,

a maioridade penal para 16 anos é tratar o efeito, não a causa

não basta criar novas leis, mas fazer as leis existentes funcionarem. O mesmo pode-se dizer a respeito do sistema carcerário brasileiro, que se encontra superlotado, com mais de 500mil presos (a terceira maior população carcerária do mundo). Isso mostra como ele é ineficiente, já que não cumpre sua função social de controle, reinserção e reeducação dos cárceres. O índice de reincidência nessas instituições ultrapassa os 70%, funcionando assim como uma verdadeira “escola do crime”. 8

Vale lembrar que o índice de reincidência no sistema socioeducativo para jovens se encontra abaixo dos 20%. Por fim, podemos notar que reduzir a maioridade penal para 16 anos é tratar o efeito, não a causa. O jovem delinquente não surge espontaneamente, ele é fruto de uma sociedade desigual, que historicamente exclui boa parte da população, marginalizando-a. A criança que nasce e cresce no meio criminoso tem muito mais chances de se tornar uma infratora. Portanto, o problema da violência só será solucionado quando a comunidade aprender que o

marginal não deve ser preso, mas sim educado. Educar é melhor e mais eficiente do que punir, porém o Brasil insiste nessa tradição de apenas “curar” a consequência. “Para o Estado, é mais fácil prender do que educar”.

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Pesquisa realizada na escola com 52 jovens de 14 a 18 anos Você sabe o que é o projeto sobre a redução da maioridade penal?

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Selecionamos trechos de dissertações avaliativas que nós, alunos do Ensino Médio, escrevemos sobre o tema “redução da maioridade penal”, assim como opiniões de adultos pertencentes a nossa comunidade escolar. As citações sintetizam a posição de jovens perante uma questão delicada, que atingirá toda a sociedade, principalmente a nossa geração. “Não adianta comparar o Brasil com a Inglaterra, onde a maioridade penal é de 10 anos. Não temos o mesmo legado histórico, tampouco as mesmas condições financeiras e políticas.” Caiuá Giffoni, 17

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Sim

Entre aspas

“Por volta de 80% da população brasileira é a favor da emenda, induzida claramente pelos meios hegemônicos de comunicação. Afinal é muito mais simples colocar menores infratores no absurdo sistema carcerário do que reorganizar a educação de base e a reintrodução desses adolescentes na sociedade.” Flora Kountouriotis, 17

Não

Você apoia a proposta de redução da maioridade penal? 8% 11% Sim Não

“Alguns adolescentes roubam, matam, estupram e sabem que não lhes acontecerá nada, pois a impunidade reina no nosso país... O povo brasileiro reclama quando é vítima, reclama quando vê absurdos criminais e deve se sentir feliz pelo país buscar leis compatíveis.”Gustavo Barros, 17 “Enxergar o jovem como verme da sociedade e castigá-lo, jogandoo numa cela com mais 30 pessoas, é muito fácil, porém isso não é de jeito algum a solução para a criminalidade.” Isabella Farah, 17

Não souberam responder

81%

“O investimento em educação, saúde e condições básicas para todos deve ser independente de raça, idade ou classe social.” Jade Dangel, 17 Ilustração: Rafael Barbosa

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“Educais as crianças e não punirás os homens. A frase de Pitágoras resume muito o que o Brasil realmente precisa.” Kim Camps, 17 11


Entre aspas “A maior parte das internações de jovens é devida a tráfico e roubo. Desta forma, conclui-se que o problema está no ambiente em que eles crescem.” LuisaTucat, 17

“As pessoas deixam de fazer coisas erradas quando há punição, mas não é só isso que vai fazer diminuir a criminalidade, mas um conjunto de ações que devem ser adotadas, desde o controle da natalidade à educação das crianças e jovens'’. Flávia Parodi, empresária

“Devemos lembrar que os adolescentes não são os principais responsáveis pelos crimes graves no Brasil.” Maria Fernanda, 17

"Esporte, música e artes desviam a mente da criminalidade'’. Juliana Marangon, advogada e filósofa

“O simples fato dessa proposta ter sido feita já demonstra a incapacidade do poder público em lidar com a criminalidade e com a violência crescentes na nação.” Pedro André, 16

"A redução da maioridade penal fere as cláusulas pétreas". Jandira Marangon, cirurgiã dentista (trabalhou em escolas públicas por 15 anos)

“É necessário fornecer educação para esses jovens e, principalmente, fazer um trabalho para a desglamourização da vida do crime.” Rafael Barbosa, 17 “Medidas socioeducativas devem ser tomadas em uma sociedade que tenta tirar o jovem do mau caminho, em vez de enfatizar sua presença nele.” Victoria Travitzki, 17 “Para nos aproximarmos dos índices de países desenvolvidos, como os EUA, precisamos rever toda a organização política e social do Brasil, e não mudar apenas uma pequena parte da legislação. Diante de uma política envolvida em tantos escândalos, uma sociedade com as riquezas extremamente mal divididas, uma educação completamente defasada e a 4ª maior população carcerária do mundo, não está parecendo que o foco do problema sejam os menores de 18 anos, a maioria de origem simples, sem acesso à educação de qualidade, que tem como exemplo políticos corruptos, capazes de roubar os cofres de seu próprio país e saírem impunes’’. Vitória Bacelar, 16 12

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Pesquisa realizada na escola com 16 adultos acima de 30 anos Você sabe o que é o projeto sobre a redução da maioridade penal? 14 12 10 8 Você sabe o que é maioridade penal?

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A voz das ruas Fomos às ruas perguntar o que as pessoas acham da redução da maioridade penal. É uma amostragem sem rigor científico, mas eis os resultados: De seis pessoas entrevistadas no bairro do Itaguá, três são contra a medida e três são a favor, porém, independentemente da opinião, todos os entrevistados criticam o sistema judiciário e a educação pública do país. “Na verdade, tudo começa dentro de casa”, Irania, 29.

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“Eu acho que passa responsabilidade para as pessoas que são realmente culpadas", Janice, 27.

2 0 Sim

“Acho que não é a solução, a solução é investir na educação. A gente vai ter cadeias mais lotadas e isso não é a solução”, Caroline, 41.

Não

Você apoia a proposta de redução da maioridade penal? 19%

“Você acha que a redução vai diminuir a violência? Talvez não diminua, mas vai fazer repensarem no assunto. Eu acho que se prende pouco e, quando prende, solta rápido”, Carla, 38.

12%

Ilustração: Jade Dangel

A favor Contra Não sabe 69%

Ilustração: Rafael Barbosa

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Entrevista: Em entrevista à reportagem do Terceiro Debate, a socióloga, professora e estudante de direito Cláudia Costa de Souza posicionou-se contra a redução da maioridade penal, prevendo que serão catastróficas as consequências da medida, caso seja aplicada. Segundo ela, a condição do sistema penitenciário no país não cumpre a função que deveria, de reabilitação do indivíduo para que seja reintroduzido na sociedade.

A socióloga cita o documentário O Grito das Prisões, filme chocante que expõe as condições dos presídios em cinco estados brasileiros, para demonstrar o quanto o Brasil está longe do ideário. Ela comenta, ainda, sobre a existência de leis que não são aplicadas, devido ao caos no sistema, como a que garante ao preso 1 dia a menos na pena por 3 dias trabalhados ou 12h estudadas.

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Ilustração: Gabriel Sanchez

A redução da maioridade penal na visão da socióloga Cláudia Costa de Souza


Entrevista: A redução da maioridade penal na visão da psicóloga social Daniela Cavalcante Bacelar Qual é a sua experiência profissional?

ser em formação. O sistema prisional brasileiro está falido e não dá conta de acolher toda a população carcerária existente, muito menos de reabilitar essas pessoas para saírem melhores. Com o jovem sendo criminalizado, aumentará ainda mais a população carcerária nos presídios, onde efetivamente não há estrutura adequada para acolhê-lo.

Eu acompanhava e avaliava famílias vulneráveis, em situação de risco, de pobreza ou de segurança, justamente por conviverem com o crime, seja dentro de suas próprias famílias, seja na vizinhança. Como profissional, como você avalia a redução da maioridade penal?

O jovem é vitima de uma sociedade, de um Estado falido e incompetente com suas obrigações. Todos os impostos que pagamos, que são muitos, deveriam ir para educação e saúde, que são direitos básicos do cidadão. Sem isso, não se pode falar em uma sociedade razoável, nem em qualidade de vida. A consequência é a criminalização e m a rg i n a l i za çã o d o s m e n o s favorecidos, de baixa renda e pouca escolaridade.

todos esses problemas. Mas, para isso, serão necessárias algumas décadas até se obter um resultado inicial. O desarmamento também ajuda, mas a base é a educação, que vai ensiná-lo a não usar armas. Arma não é meio de solução pra nada! Só cria mais problemas, mais crimes.

O art. 5º da Constituição assegura aos presos o respeito à integridade física e moral. A Lei de Execução Penal (LEP), no seu art. 88, estabelece que o cumprimento da pena se dê em cela individual, com área mínima de seis metros quadrados.

Que alternativas haveria para não ter de reduzir a maioridade penal? Educação, educação, educação. É a única solução para

Não concordo com a redução. A cadeia será “pósgraduação” no crime para o jovem. O adolescente vai para o crime cedo porque o processo da educação falhou. É um problema social crônico, que precisa ser resolvido, mas a solução não é prender o jovem, que ainda é um 18

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Estatuto do desarmamento: na mira da indústria da bala E agora tem mais essa: bancada da bala quer facilitar a compra de armas No Brasil, o Estatuto do Desarmamento é uma lei federal de 22 de dezembro de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. Atualmente, uma comissão especial discute mudança no estatuto, que tornaria mais fácil a compra de armas. Governo e especialistas são contra a mudança. E afirmam que a lei atual evitou milhares de mortes. O projeto é defendido pela indústria de armas e propõe mudanças que podem levar ao fim do Estatuto, como por exemplo: A proposta é reduzir de 25 anos para 21 anos a idade mínima para comprar armas, liberar a compra de armas para quem já esteve preso e também para pessoas investigadas por crimes violentos, o que hoje é proibido.

As pessoas poderiam voltar a andar armadas nas ruas. Hoje, o Estatuto do Desarmamento autoriza apenas policiais e outros profissionais da s e g u ra n ça e d a J u st i ça a circularem armados. O projeto torna o registro da arma definitivo. O estatuto exige renovação a cada três anos. A proposta acaba com a perda automática do porte para quem for pego armado sob efeito de álcool ou drogas, e libera a publicidade de armas e munição, que hoje é proibida no país. O projeto também autoriza a compra de até nove armas por pessoa. O autor da proposta defende que desarmar a população não reduz a violência. Segundo ele, não se pode negar ao cidadão o direito de ter uma arma para enfrentar criminosos.

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Foto: Reprodução Internet

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Entrevista:

Embora eu não acredite que a questão resida em uma cláusula pétrea, entendo que a redução da maioridade penal não resolveria o problema do crime no Brasil, onde apenas 7% dos homicídios são resolvidos, de modo que a redução apenas agravaria as estatísticas. O problema, na realidade, é a falta de estrutura e o aparelhamento dos órgãos incumbidos de tratar da matéria. Não basta normatizar, é preciso criar mais varas criminais, incrementar a defensoria pública, 22

unificar as informações sobre registros criminais e fomentar as entidades direcionadas à ressocialização, uma vez que só o caráter punitivo da pena vem sendo utilizado. Outro aspecto importante seria o cumprimento da lei de execuções penais, em que os presídios respeitassem a integridade dos presos, uma vez que hoje, como disse o próprio ministro da justiça, José Eduardo Cardozo, só temos masmorras. Cabe ressaltar que casos como o do menor Champinha (ele matou um casal em Embu-Guaçu, na Grande São Paulo) são exceções. Além disso, quando ocorrerem, podem ser tratados c o m o a t o s i n f ra c i o n a i s , a demandar medidas socioeducativas pelo ECA. O caminho mais viável, paralelo à reforma do sistema, seria aumentar a previsão do período de internação para atos infracionais que resultem na morte de alguém ou que envolvam violência sexual; e para tanto bastaria reformar o ECA.

Usuários de drogas

Frequentavam a escola antes da internação

25%

43%

75%

Não 57%

Usuários

Sim

Não Usuários

Ilustração: Rafael Barbosa

Fonte: DFM e DPJ/CNJ

Divisão por crime cometido por adolescentes no Brasil Ilustração: Rafael Barbosa Fonte: Sinase

A redução da maioridade penal na visão do especialista em Direito Penal, Direito Constitucional e Filosofia, Roberto da Silva Teixeira Jr., que também é membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e funcionário da 8ª Vara Criminal Federal de São Paulo,

Perfil do adolescente infrator

2%

2% 1% 2%

Roubo

8%

Tráfico de drogas Homicídio

3% 3%

40%

Ameaça de morte Furto

6%

Tentativa de homicídio Porte de arma de fogo

9%

Latrocínio Tentativa de roubo Estupro Outros

24%

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Artigo de opinião

Presídios brasileiros A realidade dos presídios brasileiros é que são superlotados, sem a mínima infraestrutura para todos os seus “moradores”, portanto um local desumano e incapaz de possibilitar uma reabilitação. Um lugar onde se cultiva o ódio, alimentado pelo progressivo aumento da criminalidade e falta de segurança encontrados no Brasil. Não existe lugar para todos, os presos se revezam para dormir, existem milhares de casos de espancamento, estupro e fome dentro dos presídios. A maioria dos funcionários tem medo de estar ali e por isso deixa que essas barbaridades aconteçam.

O Brasil é um dos primeiros no ranking de piores presídios, perdendo apenas para países da Ásia e do Leste Europeu, sem falar na população carcerária, que é a terceira maior do mundo, estando atrás dos E.U.A, Rússia e China. Estar preso na teoria significa ficar separado por um tempo do convívio social, para que se possa refletir sobre os erros, aprender sobre o que é certo e, após uma reabilitação, sair uma pessoa melhor, que encontre oportunidades. Porém, não é isso o que acontece na prática, ainda mais porque o povo brasileiro tem preconceito com ex presos, que acabam não conseguindo emprego quando voltam a ter liberdade e acabam retornando ao crime. Isabella Farah

Ilustração: Gabriel Sanchez

De acordo com balanço do Ministério da Justiça, em 2014 havia no país uma média de 1,69 preso para cada vaga. A típica prisão brasileira abriga cerca de 17 detentos num espaço onde caberiam 10. Uma das consequências são as rebeliões. Pedrinhas, no Maranhão, recentemente ocupou as manchetes dos jornais por causa das decapitações e esquartejamentos de presos no Complexo Penitenciário do município. Um fator importante que contribui para a superlotação dos presídios brasileiros é o confinamento de presos não condenados, que representam cerca de um terço da população carcerária. 24

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Entrevista: A redução da maioridade penal na visão da exfuncionária da Fundação Casa, Cristina Dangel Como Funciona a Fundação? As unidades recebem adolescentes e os separa por centros, de acordo com idade, infração cometida e compleição (constituição) física.

Sobre a Fundação Casa

Qual são os tipos de crime mais frequentes? Tráfico de drogas, roubo e furto são os mais comuns, porém existem casos de homicídio, latrocínio e estupro. Qual a classe social predominante dos detentos? A classe predominante é a mais pobre. Os adolescentes geralmente vêm das favelas e bairros afastados. Na maioria das vezes, deixam a escola bem cedo, mal sabem ler e escrever, não são qualificados para trabalhar e não têm valores consolidados.

Há casos de violência dentro da instituição? Existem muitos casos de violência na Fundação, entre os adolescentes e entre eles e os funcionários. Os jovens saem reparados? Nos casos de reabilitação, percebe-se uma grande participação da família, psicólogos e assistentes sociais, além do interesse do adolescente em se profissionalizar, estudar e sair daquela realidade social. 26

A Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) é uma entidade vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da C i d a d a n i a . Te m a m i s s ã o primordial de aplicar medidas socioeducativas de acordo com as diretrizes e normas previstas no E stat u to d a C r i a n ç a e d o Adolescente (ECA) e no Sistema N a c i o n a l d e At e n d i m e n t o Socioeducativo (SINASE). A Fundação CASA presta

assistência a jovens de 12 a 21 anos incompletos em todo o Estado de São Paulo. Para os jovens que precisam ficar privados de liberdade, a CASA iniciou um programa que prevê a construção de 61 centros socioeducativos no Interior – destes, 59 já estão funcionando. Em 2006, na época da antiga Fundação Estadual do Bem Estar do Menor (FEBEM), 29% dos jovens em internação reincidiam. Hoje, a taxa está em torno de 13%. Charge extraída da Internet trabalha com o argumento de que os presídios funcionam, hoje, como escolas do crime 27


Entrevista:

A redução da maioridade penal na visão da Assistente Social Erika Lunardi Longo, coordenadora do Projeto Namaskar, em Ubatuba

Qual a sua experiência profissional nas comunidades?

É inacreditável que existam pessoas que ainda acham que esse é o caminho

bola ou participar de alguma aula de teatro. Sem opção nenhuma, fica muito limitado. Qualquer coisa que tenha é na cidade, fica distante e coloca as crianças em risco por terem de atravessar a rodovia para vir do Ipiranguinha para o centro. Muitas mães não permitem, então deixam as crianças presas no bairros e sem acesso a nada. Aí aumenta o risco de caírem no mundo do tráfico. O mesmo problema pode ser visto no bairro do Sesmaria, que fica na região centro-oeste de Ubatuba. Não há nada de lazer e esporte naquele pedaço. A única quadra que existe no bairro é uma que não tem iluminação, não é adequada. Na verdade, é apenas um terreno, com barro batido,

Eu trabalhei com dois bairros populosos e bem carentes aqui em Ubatuba, o Ipiranguinha e, agora, Sesmaria. O Ipiranguinha é um bairro muito populoso, bem carente, mas o projeto só atendia 80 crianças. Havia, na época, 300 crianças na lista de espera, fora as que nem entravam na lista, só de saber que seriam acima de 300. O que eu percebi é que o Estado é ausente. No bairro do Ipiranguinha, por exemplo, não tinha uma quadra esportiva e nada em relação a esporte e lazer. Muitas vezes essas crianças frequentavam o projeto para jogar 28

mas em tal país, com 14, 12 anos já é punido como adulto”. Só que em muitos países desses o Estado fornece acesso a tudo o que acabei de falar, então é diferente, o jovem teve oportunidade de aprender, de ter acesso à tecnologia, a vários esportes, à cultura. Nessa fase, o adolescente está em formação, não é uma pessoa formada. Que alternativas haveria para não ter de reduzir a maioridade penal?

onde as crianças fazem alguma atividade esportiva. Qualquer coisa relacionada a cultura e arte é dentro do projeto Namaskar, só que a gente consegue atender somente 150 crianças, em um bairro que tem de 2 mil a 3 mil. O E s t a d o e s t á ausente, não oferece acesso a lazer, esporte, cultura, o que colaboraria para afastar o menor do crime.

Pensando na nossa realidade, em que o Estado, como eu disse, está ausente, meter na cadeia, em uma cadeia que não tem estrutura nenhuma, que mal dá conta de atender o que já tem, vai resolver ou só vai lotar ainda mais? Não é uma solução viável. É inacreditável que existam pessoas que ainda acham que esse é o caminho. Se algum dia o Estado fizer a parte dele, as cadeias tiverem condições de acomodar os presos e cumprirem realmente a proposta de prepará-los para a reinserção na sociedade, já será diferente. Mesmo assim, tem que se considerar que são indivíduos em formação.

Contando com sua experiência profissional, o que você tem a dizer sobre o tema “redução da maioridade penal”? Acho que, primeiro, fica muita gente comparando: “Ah, 29


“ O que, então, poderia ser feito para esses adolescentes pagarem pelos crimes cometidos?

Ilustração: Gabriel Sanchez

Hoje, eles já são punidos, já existem as medidas socioeducativas, mas não acho que sejam de qualidade, pois falta um acompanhamento psicológico mais intenso, falta acompanhamento familiar, afinal não adianta trabalhar só o adolescente, tem que ter um assistente social que acompanhe a família, entenda porque esse adolescente muitas vezes volta para a Fundação Casa. Tem que ter um acompanhamento bem próximo desse adolescente, além de cursos que atraiam e que sejam adequados para aquela realidade local. Por exemplo, se o adolescente, que mora em Ubatuba e vai para a Fundação Casa, de repente é enviado para uma unidade em São Paulo, ele acaba fazendo um curso que não lhe será útil quando voltar para a sua cidade, daí não resolve. Então é preciso conhecer a realidade local, que tipo de trabalho esse adolescente poderia conseguir em 30

É preciso conhecer a realidade local, que tipo de trabalho esse adolescente poderia conseguir em sua região, e preparálo para isso

sua região, e prepará-lo para isso, junto com um acompanhamento psicológico e social bem intenso, que continue quando o adolescente sair, por um período, afinal ele volta para a sua vida normal, para o espaço onde cometeu o crime. Ele vai andar com os mesmos amigos, no mesmo bairro, então, se não houver um acompanhamento, que ele vá pelo menos durante um ano no psicólogo, fica muito difícil, a chance de ele voltar a cometer o crime é muito grande. Tem que haver, ainda, aquele atendimento de assistente social próximo à família. A família inteira tem que e s ta r c o m p ro m e t i d a n e s s a transformação.

A ONU é contra a proposta de redução da maioridade penal. O argumento é o seguinte: 1% dos adolescentes no Brasil são responsáveis por homicídios e 36% são vítimas, principalmente jovens e negros da periferia

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