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Segunda Edição
MODA - PARTE 2
Introdução Se nos permitirmos avaliar o termo “moda” de maneira mais ampla, poderemos entender esta como um reflexo direto do modo de vida de seu usuário, que, mesmo antes de ser chamada de “moda” já espelhava as características sociais e culturais da sociedade em que está inserida, sendo diferenciando a população comum dos membros da nobreza ou clero ou as culturas orientais das ocidentais. Mais do que tendências que caracterizam a forma de se vestir e portar de alguém como “bela”, “elegante” ou “chique”, propomos aqui que enxerguemos a moda como um movimento cultural ou contracultural, bem como os movimentos artísticos que vemos na pintura, literatura, entre outros. Ao entender a moda como um quadro geral de apresentação pessoal e não apenas como tendências propostas por estilistas, abrimos a possibilidade de utilizá-la como um ferramenta para estudo da sociedade como um todo e o indivíduo em suas particularidades.
História da Moda Só é considerado moda quando um grupo de pessoas passam a usar ou fazer algo em comum. A moda permeia pelo nosso guarda roupa, pelas mudanças comportamentais, políticas e sociais. Através das suas modificações ao longo do tempo podemos descrever a história da humanidade. O ciclo da moda iniciou no século XIV na corte de Borgonha-França, quando os burgueses (comerciantes considerados novos ricos sem berço) passaram a copiar a indumentária dos nobres, por esse motivo as grandes alterações começaram a surgir para diferenciar um dos outros. Foi instrumento diferenciador das camadas sociais, alterada e registrada por movimentos artísticos, dividas em tribos urbanas. Já foi mercado de estilo e agora descreve o life style do que você é ou desejar ser. Moda é assim, de muitas faces e fases. Passou a ser considerada profissão de formação no século XX, mas com muitas restrições e de visões diversas. Entretanto, o aumento do consumo e investimentos na inovação do mercado criativo tem impulsionado a implantação de novas instituições de ensino, para formar profissionais qualificados na área. Esses profissionais com conhecimento amplo e diversificado, que não se restringe a roupa, mas a diversos mecanismo de um grande ciclo até chegar ao consumidor final. Esse perfil de profissional surgiu nos anos 80. Moda é história, arte, comportamento, fonte de rentabilidade e deve ser levada a sério, a partir do momento que vive dela e para ela. Desde o seu surgimento, a moda sofreu inúmeras modificações. Antes do século XX estas mudanças eram menores e aconteciam em intervalos de tempo bem mais longos do que estamos acostumados hoje, pois o mundo encontrava-se num momento em que as classes sociais estavam estagnadas e divididas em camadas bastante distintas. A observação do vestuário servia basicamente para distinguir os que viviam no luxo dos trabalhadores pobres. Temos pequenas modificações nas tendências que marcaram épocas, mas as grandes mudanças começaram a ocorrer mesmo na segunda metade do século XVIII, com a ascensão da burguesia. Foi ao longo do século XIX que a moda, no sentido moderno do termo, instalou-se. A partir do momento em que, na teoria, crescer socialmente tornou-se um sonho possível de ser alcançado por qualquer trabalhador, o ato de vestir-se bem deixou de ser exclusividade de uma minoria para caminhar em direção a uma popularização cada vez maior. Já no século XX temos uma moda que apresenta novas características. Ela é industrial, popular, egocêntrica, e ao mesmo tempo elemento chave na diferenciação social. Nesta época, além de alterações físicas nas vestimentas temos também uma grande mudança na forma de se comercializar os produtos de moda: surgem as lojas, que popularizam a venda de peças antes apenas obtidas através de encomendas e esperas que poderiam durar semanas. Fica mais fácil e barato conseguir peças novas, e esta dinamicidade faz com que as pessoas queiram inovações que acompanhem o estilo de vida que se leva e o momento pessoal em que o indivíduo se encontra. A moda começa então a apresentar tendências que se transformam num espaço de tempo que podemos dividir por décadas:
Anos 10
Marcados pela ostentação, excessos e por uma onda oriental. A roupa ganha uma silhueta mais solta.
Anos 20
Formas tubulares, tecidos leves e moles e cinturas baixas. Alegria e libertação do pós-guerra, com grande influência do jazz.
Anos 30
A grande crise desta década influenciou na confecção do vestuário. O glamour se concentra nas telas do cinema e as grandes musas inspiram as mulheres. O preço das roupas cai devido a aplicação de tecidos sintéticos. Há o uso das mangas largas e peças drapeadas, a cintura volta para o lugar e surgem marcos como o shorts, a roupa de banho e o rosa shocking.
Anos 40
Tempos de guerra e de roupas enxutas, por conta da economia de tecidos. Presença da silhueta militar e sapatos pesados. Época marcada pela saia lápis e os tailleurs.
A Moda nos Anos 40
Anos 50
O new look de Dior, que surgiu na verdade no pós-guerra ainda na década de 40, está em alta, com as longas saias rodadas e cintura bem marcada. As peles, cashmere, mohairs e jóias marcam a volta dos tempos de luxo.
Anos 60
Primeiro momento em que o jovem é realmente enxergado, e os olhos se voltam para a moda da rua. Vestidos de linha “A” e as brincadeiras com a androgenia estão em alta, assim como as botas de cano longo. Nascem as minissaias.
Anos 70
Calças bocas de sino, coletes, estampas florais e peles de animais vêm à tona com o movimento hippie. A luta pelos direitos femininos se reflete no visual unissex, assim como a valorização do negro no uso de cabelos em estilo black power e na miscigenação de culturas. Tribos urbanas aparecem em todo lugar.
Anos 80
Década controversa, de exageros e cores fortes, pluralidade de tribos urbanas e música com intensa influência na moda. O culto ao corpo alcança seu auge e traz para o dia-a-dia os tecidos e modelagens das academias. Há também o uso de ombreiras femininas em demasia.
Anos 90
Transparências e decotes e ascensão do uso das calças, com destaque para as jeans bem largas. Também temos a camisa xadrez e os tênis esportivos. Por outro lado, a elegância e o minimalismo se contrapõem à moda jovem. As tribos urbanas continuam em evidência.
A Moda Hoje No período em que surgiram as tribos, surgiu também a noção de que a forma como o indivíduo se veste e se apresenta ao mundo transparece tanto a personalidade deste quanto suas ações o fazem. Entramos agora em um momento de total revolução. A sociedade, as pessoas, as percepções, os gostos, tudo está se transformando, e assim também muda-se a forma de ver, produzir e consumir a moda. Chegamos a um ponto em que as tendências podem ser observadas em qualquer lugar, e estilo é algo muito pessoal. Presença de várias tribos, novos movimentos ganhando força, influencia da música e do cinema, evidenciação da diferença entre a criança, o jovem e o adulto, valorização do que é antigo e exaltação do novo, tudo isto está presente no século XXI.
Moda e Arte “Enquanto a pintura oriunda da sensibilidade do artista nos emociona, a moda, como redesenha da história da arte, nos seduz.” (Dina Bueno Pezzolo) A arte e a moda sempre estiveram ligadas, da Idade das Pedras aos tempos atuais. O homem no início da sua espécie encontrou um mecanismo para registrar acontecimentos antes mesmo da escrita, esse mecanismo foi o desenho. Com as ilustrações em cavernas, pirâmides, templos, paredes rochosas, das estátuas, e da arte em cerâmica podemos conhecer o modo de vida de um povo tão antigo. Através desses registros conhecemos os cultos, as divisões sociais, do que se alimentavam, costumes e a forma de vestir. As indumentárias representavam o que a arquitetura significava. O exemplo disso é o período gótico em que as pessoas queriam alcançar Deus
por isso as roupas eram longilíneas e os chapéus cônicos como as cúpulas das Igrejas do período. As pinturas registravam a angústias humanas e seus paradoxos, bem resumidos nas obras de Bosch. A escuridão não era apenas nos tecidos, mas num período de trevas que passou com o surgimento do Iluminismo, das perspectivas, luz e sombra e pensamentos Renascentistas. As expansões náuticas trouxeram um novo mundo de renovações na arte e nas vestes. Foi o encontro do Ocidente com o Oriente. A figura feminina ficou mais forte com a presença de Elizabeth I. Rufos, vertugadins, volume, riqueza. Homens se deslumbravam e viraram referência, como um Sol, Luís XIV destaque na moda representou o Sol numa peça teatral. Tudo registrado e detalhado pelas mãos dos grandes mestres. O barroco do séc. XVII e o rococó do séc. XVIII, cheios de rocailles, pompas, ouro, cores e peso tanto na arte, como na arquitetura, que se adaptou as roupas por causa dos enormes paniers. A decoração também mudou, pois uma mulher ocupava o lugar de três pessoas, de tão grande que eram suas saias. A arte neoclássica trouxe a simplicidade greco-romana para forma de se vestir. Chega de volumes! O romantismo fez o contrário: babados, chapéus bonecas, flores. Mas um estilo perpetuou no final do século XIX até o começo do século XX, a Art Nouveau cheia de arabescos por todas as partes, aponto de transformar a silhueta feminina em S. Muitas morreram pelo sacrifício da beleza por usar espartilhos, de tão apertados quebravam suas costelas que perfuravam os pulmões, e nomearam esse período de Belle Époque. A Art decor trouxe a simplicidade linkando com o shape da nova mulher dos anos 20. O surrealismo trouxe a excentricidade de Schiaparelli. E tudo passa a ser releitura dos registros do passado, por meio do olhar do artista, fonte de riqueza e inspiração. Com cores e texturas surpreendentes, não só o passado, mas os movimentos atuais como o Arstsy renovam os ares criativos. E os estilistas igualmente grandes artistas transformam a moda em arte.
Moda e Linguagem Se há algo que podemos dizer que é muitíssimo interessantes sobre a moda, esta seria a maneira como ela nos oferece uma leitura da época em que ela está inserida e do indivíduo que faz uso dela. Cada peça, cada acessório, tudo na moda pode ser enxergado como uma narrativa visual. É como se o vestuário de cada pessoa, de cada época, de cada lugar, pudesse ser enxergado como páginas de um livro, que somadas formam o todo que conhecemos como moda. Quer entender melhor? Damos um exemplo: Vamos aqui fazer uma breve análise de um quadro geral da moda nos anos 40. De um lado podemos observar a produção de peças enxutas, com cortes retos e silhuetas militares, sapatos pesados, uso de materiais como a viscose, o raiom e as fibras sintéticas, e os resistentes, como o tweed. As mulheres usavam cabelos de comprimento médio, presos em forma de cachos por grampos, sendo eles quase mais importantes que seus acessórios. Os lenços também foram muitos usados nessa época. Peças como a saia lápis e os taileurs também são desse tempo. E ainda, no final da década, podemos observar o surgimento do “prêt-à-porter”, derivado do termo em inglês “ready to wear” (em ambos os casos, pronto para vestir). Do outro lado, temos a ascensão do estilo que seria chamado, pela primeira vez em 1941, de “pin-up”. Certo, mas e qual é o significado disso tudo? Se pararmos de olhar exclusivamente para as peças de roupa a acessórios, e expandirmos nossa visão para o contexto da época, todas as tendências desta década farão muito mais sentido. Os anos 40 foram marcados pela Segunda Grande Guerra, tempos de escassez, de economia. O estilista francês Lucien Lelong, então presidente da câmara sindical em Paris, teve um papel importante nesse período ao preparar um relatório defendendo a permanência das maisons em seu
país. Durante a guerra, 92 ateliês continuaram abertos em Paris. Mesmo assim, muitos estilistas se mudaram ou mesmo fecharam suas casas. A alta costura ficou restrita às mulheres dos comandantes alemães, dos embaixadores em exercício e àquelas que de alguma forma podiam frequentar os salões das grandes maisons. O material tinha que ser muito bem utilizado pelos estilistas, o que justifica a presença dos cortes retos, bem como o uso de tecidos alternativos da época, e os mais pesados, como o já citado tweed. Os penteados passam a ter mais importância do que os acessórios pois as mulheres viram-se obrigadas a se desfazer de suas jóias bem como demais coisas de valor. A dificuldade em encontrar (e mesmo encontrando, em poder frequentar) um cabeleireiro foi que popularizou os cabelos mais longos com cachos que podiam facilmente ser feitos em casa, bem como o uso de lenços e chapéus. A saia lápis, os taileurs, o uso de todos estes produtos está justificado pela situação em que a economia e a sociedade se encontravam na época. Mas e o estilo pin-up? Ele também! Este termo, que na moda descreve um estilo, deriva exatamente da finalidade para qual as fotos, desenhos, pinturas e outras ilustrações que reproduzem imagens de mulheres sensuais eram feitas: pendurar (em paredes, portas, etc.). Na década de quarenta, os modelos mais populares deste estilo (mulheres com lábios vermelhos e olhos contornados no estilo “gatinho”, cabelos volumosos com cabelos encaracolados nas pontas e roupas curtas, muitas vezes em versões femininas de uniformes militares, como o look de marinheiro, ou estampas de bolinhas) eram consumidos pelos soldados, que, longe de casa, de suas namoradas, esposas, longe das mulheres, penduravam essas imagens em seus dormitórios e afins, devido à sua conotação sexual. Ainda nesta linha de pensamento, podemos entender porque na década de 50, os anos dourados, o New Look, de Dior, se tornou tão popular. Depois da Segunda Grande Guerra, é preciso romper com as amarras do
passado e procurar novas tendências que apontem para o futuro. O design reflete a vida moderna e a tecnologia. O Plástico, que até então era encarado apenas como um substituto para outros materiais que ficaram mais escassos nos tempos de guerra torna-se cada vez mais importante, alterando muito o visual dos produtos, uma vez que ele oferece uma infinidade de possibilidades em termos de formas e cores. Investia-se muito na publicidade, na criação de produtos que prometiam facilitar a vida das pessoas, como eletrodomésticos, por exemplo. Era a volta dos tempos de sofisticação, de diversão, de cuidar das aparências. A coleção, que mais tarde ficou conhecida por New Look, foi lançada em 1947, e propunha a volta do glamour, do uso não racionado de tecidos, que pode ser observado em longas saias rodadas, e de artigos mais luxuosos, como luvas, peles, saltos altos e jóias. Deu pra entender, não? O contexto (histórico, social e cultural) na moda é tudo. Agora imagine todo este conhecimento aplicado em áreas como a criação de personagens de quadrinhos, de figurinos para o cinema e programas de televisão, na a análise do vestuário do indivíduo em seu dia a dia. As possibilidades são infinitas!
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